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Ponto de convergência [o ator no centro do palco]

metodologia de trabalho. Ela acabava por preencher o espaço entre o treinamento individual e a cena. Para Richard Schechner, improvisar é uma ferramenta ativa de pesquisa no processo de criação, no qual o artista tem a liberdade de explorar possibilidades em ensaio. Segundo o autor, ela serve como instrumento de treinamento, além de fazer emergir material pessoal, histórico ou de outras fontes, para então encontrar os caminhos para expressar essas ações e interações10. Considerada por Patrice Pavis11 como técnica do ator, a improvisação toma maior impulso na década de 1960 e 1970 como fórmula da criação coletiva, e da mesma forma, percebemos que ela vem sendo utilizada como metodologia eficiente para grupos que buscam uma dramaturgia própria. A improvisação, ao contrário do treinamento, geralmente exige um observador e é feita para ser vista. Ainda que em algumas proposições seja exigida uma participação mais ativa do observador, a improvisação é feita para uma audiência. Ela promove um espaço de liberdade onde não há certo ou errado, uma vez que ela potencializa o posicionamento do ator frente às questões da obra. A ideia é sempre um princípio que deve ser transformada em metáfora, em jogo cênico ou em ação. A improvisação amplia o repertório pessoal do ator à medida que constrói experiências ou restaura vivências. Dessa forma, ela faz emergir um campo de subjetividades que atualiza o sentido do tema da obra. A improvisação é amplamente utilizada dentro do processo colaborativo. Ela é o campo de experimentação por excelência que tem o ator como seu principal suporte. Um espaço-laboratório para a criação de protótipos decorrentes de um trabalho em construção. Ela é o veículo de comunicação entre argumento e cena. Enquanto o treinamento é o espaço do “eu”, a improvisação é o espaço do “outro”, de onde se veem os vários pontos de vista. Para concluir, arriscamos dizer que é a atitude do ator diante de práticas tão antigas quanto de treinamento e de improvisação, que poderão propiciar ao ator-criador ferramentas diferenciadas no processo de criação e que é a partir delas, ou da combinação delas, que ele poderá projetar o lugar que ocupa e quem sabe dimensionar sua expressão na cena.

Ponto de convergência [o ator no centro do palco]

A pegada e o pé!1 Sergio Zlotnic

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- Ao referir-se ao trabalho de atuação de Ivam Cabral, assim escreve Alberto Guzik:

Ivam Cabral é um ator de rara ousadia. Todo seu processo consiste em jogar com o desconhecido [...]. Ivam se atira na criação sem rede de proteção. O que o instiga em cada criação é a busca de algo que nunca fez antes. O seu jogo em cena também reflete esta disposição. É um ator que incorpora o erro, o esquecimento, a falha humana, ao processo artístico. Se o intérprete tropeça no texto, a personagem imediatamente reage a isso com uma velocidade espantosa. O jogo de Ivam Cabral é limpo, aberto, ousado. Um ator que se arrisca, que muitas vezes corre o perigo de perder o pé, tão fundo e intenso é seu mergulho no jogo da atuação [...]2.

A não ser que supuséssemos um ator que repetisse o texto burocrática e automaticamente a cada apresentação, o que evidentemente ninguém deseja

Miri am Rin al di é atriz, formada pela Escola de Arte Dramática da USP; Mestre em Artes Cênicas

CAC/ECA/USP; professora do curso de Artes do Corpo da PUC-SP; atuou por mais de dez anos no Teatro da Vertigem; atualmente tem se dedicado ao estudo da técnica de Viewpoints.

10. Richard Schechner, op cit., pp. 198-200. 11. Patrice Pavis, Dicionário de teatro. São Paulo, Perspectiva, 2001, p. 205.

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1. A tese desenvolvida neste artigo resulta de dois cursos realizados na sp Escola de Teatro em 2010 e 2011, constituindo-se num dos eixos de reflexão da disciplina, entre outros. Agradeço aos alunos das duas turmas que comigo estiveram pelas trocas imensamente férteis desta convivência. 2. Alberto Guzik, Os Satyros: um palco visceral (Coleção Aplauso – Teatro Brasil). São Paulo, Imprensa Oficial, 2006, pp. 22-23. Grifos meus.

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