Painel 70

Page 1



carta do editor

EXPEDIENTE Órgão Laboratorial do Curso de Jornalismo da Unimep Reitor Clovis Pinto de Castro Diretor da Faculdade de Comunicação Belarmino Cesar Guimarães da Costa Coordenador do Curso de Jornalismo Paulo Roberto Botão Editora Rosemary Bars Mendez (MTB: 16.694) Editores Assistentes Anderson Junque Lavínia Vasconcelos Editor de Imagem e Fotografia Thiago Sanchez Gaspareto Redatores Bruno Bianchin Camila Duarte Cynthia da Rocha Daniele Zanin Débora Ferneda Fernanda Cristina Pereira Jackson Rossi Janaína Moro Karla Gigo Letícia Costa Coelho Mariane Ferreira Syndi Siqueira Diagramação e Arte Final Sérgio Silveira Campos (Lab. Planej. Gráfico) Foto de Capa Letícia da Costa Coelho Correspondência Faculdade de Comunicação Campus Taquaral, Rod. do Açúcar, km 156 Caixa Postal 68 – CEP 13.400-911 Telefone: (19) 3124-1677 Tiragem 1.000 exemplares

Visite nosso site: www.unimepjornal.com.br PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

O

s eleitores da Painel recebem hoje mais uma edição produzida pelos alunos que terminaram em junho o sétimo semestre de jornalismo. Uma etapa importante na formação desses profissionais do futuro, que se envolveram com todo o planejamento editorial. Um trabalho de equipe, apesar de ser uma produção individual – preparação da pauta, coleta de informação, elaboração do texto e produção das fotos. Durante o primeiro semestre, a turma toda se empenhou para que as reportagens contemplassem temas relevantes, com enfoques diferenciados, mas sempre informativos, a fim de proporcionar um novo conhecimento em relação ao assunto pautado. Hoje, esses alunos estão matriculados no oitavo semestre e muito perto do diploma, envolvidos com os trabalhos de conclusão de curso, preparando a festa de formatura; finalizam a organização da cerimônia de colação de grau. Eles vão levar a revista Painel como exemplo do que podem produzir como jornalistas formados, mostrando a competência que possuem nesse mercado de trabalho tão concorrido, onde o que vale é mais o resultado quantitativo do que o valor qualitativo de uma produção jornalística. Nesse mercado pesa mais a audiência do que qualquer outro item que referencie a qualidade do que se faz. Porém, a base ética desses estudantes lhes dá a sustentação necessária para compreender que ‘o vale tudo’ está longe de ser essencial para se conseguir emplacar uma reportagem. Os valores que devem emergir são interesse público e relevância social. Por isso, a formação acadêmica é preponderante na lapidação de um profissional da mídia, a fim de estipular o pensamento crítico sobre o mundo da comunicação e como esse universo se organiza. São preparados para competirem nesse espaço, mas também são estimulados a pensar, refletir, ousar e mudar. A expectativa do todo corpo docente é que esses alunos estejam empregados e possam, assim, superar seus mestres e tornarem-se profissionais ‘de ponta’, questionadores e não apenas reprodutores desse mercado midiático. A capacidade jornalística desses alunos pode ser conferida ao folhear as páginas da Painel, com reportagens que contemplam assuntos muito diferentes, já que as escolhas das pautas são pessoais, tendo como única exigência que o aluno possa aprender ao fazer; aprender ao perceber os erros que cometeu durante o processo de produção; aprender ao verificar as correções efetuadas em seu texto; aprender ao ver a revista editada e sentir-se satisfeito com o seu empenho, ou ao perceber que poderia ser melhor. Afinal, reconhecer as próprias deficiências integra parte desse aprendizado e somente aquele que é crítico consegue ver o que realmente fez. Boa leitura a todos! 3


Com a autoridade de quem já fez teatro e televisão, Roberto Vignati reconhece que tecnicamente a qualidade da produção televisa cresceu, mas alerta que na contramão desse processo está o nível cultural, com níveis “execráveis”.

4

“A imagem é PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


Anderson Junque

entrevista Roberto Vignat

Anderson Junque mfjunque@ig.com.br

A

os 70 anos de idade, o diretor Roberto Vignati está em plena atividade. Sua estréia no mundo das artes cênicas aconteceu ainda muito precoce. Aos 11 anos de idade escreveu seu primeiro espetáculo e logo em seguida colocou-o em cena. “Sempre tive vontade de escrever, de ler e de comandar”, relata. Dirigiu peças de teatro, novelas e programas infantis. Considera-se um autodidata. Dirigiu atores consagrados na televisão brasileira como Paulo Autran, Glória Menezes, Tony Ramos e Elizabeth Savalla. A primeira novela que dirigiu na Rede Globo foi Pecado Rasgado, de Silvio de Abreu, ao substituir Régis Cardoso. Trabalha no teatro desde 1961 como diretor, autor, tradutor, professor de artes cênicas, iluminador, cenógrafo, figurinista, sonoplasta, criador de trilhas sonoras e eventualmente compositor. Vignati atendeu a Painel no Centro de Cultura Ataliba Barrocas, em Cordeirópolis, numa tarde de sábado, onde dirige a trupe local Grupo de Teatro Pingo d´Água, com o espetáculo Vidas Secas, de Graciliano Ramos. Painel: O senhor já realizou de tudo no que diz respeito às artes cênicas. Se tivesse que definir essa arte, como o faria? Vignati: Infinita. Irresistível. Surpreendente. Quantas vidas eu tivesse, tantas vidas eu gostaria ainda de desvendar mais e mais o que a magia do teatro sempre exerceu e exercerá junto à platéia, desde sua origem nos primórdios da civilização, na Grécia.

Deus!” PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

Painel: Na TV dirigiu inúmeros programas, entre eles “Sítio do Pica-Pau Amarelo” e “Mundo da Lua”. Na sua concepção, a qualidade das produções dos programas televisivos evoluiu, decaiu ou continua relativamente com a mesma qualidade de 15 anos atrás? Vignati: Na parte técnica evoluiu. Na parte que mais interessa, a do conteúdo cultural, educacional, atinge hoje níveis execráveis. É assustador mesmo que os ministérios da Educação e da Cultura não façam nada para acabar com essa situação vergonhosa. E os meios de comunicação, principalmente a televisão, contribuem sim para a formação e comportamento de toda uma sociedade. Principalmente uma sociedade carente de alfabetização e cultura como a brasileira.  5


tantos outros que a sociedade moderna inventa para tentar tapar lacunas mais profundas. Claro que tudo é bom para ajudar a propagar a cultura, mas porque não exigem dos meios de comunicação que penetram imediatamente nos lares que façam uma política educacional nesse sentido. Não se formam ídolos nacionais em apenas dois ou três capítulos de novela? Por que não podem também em tão curto espaço de tempo educar o povo mostrando programas verdadeiramente voltados ao desenvolvimento cultural do país e do povo brasileiro? Por que se incomodar em descobrir chifres e cabeça de vaca, nos livros de Monteiro Lobato, propagando colocações racistas e não incentivar as discussões e diferenças entre os tempos em que esses contextos foram discutidos. Repetem os mesmo erros das novelas de época exibidas hoje. Descaracterizam os costumes e comportamentos da época, como se tudo sempre foi vivenciado de forma nua e crua, depravada mesmo, como nos dias de hoje. Se apagamos o passado, a história, viveremos sempre um presente sem perspectivas de um futuro, de buscas mais consciente.

Painel: No discurso de posse, a ministra da Cultura , Ana de Hollanda, fez a seguinte afirmação direcionada ao Congresso Nacional: “Por favor, vamos aprovar, este ano, nesses próximos meses, o nosso Vale Cultural, para que a gente possa incrementar, o mais rapidamente possível, a inclusão da cultura na cesta do trabalhador e da trabalhadora.” Na sua opinião essa é uma boa saída para o desenvolvimento cultural do país? Ou é apenas mais uma promessa de campanha que efetivamente não muda muita coisa? Vignati: É mais um artifício, um paliativo como

Painel: O nome dela para a pasta foi visto com certa desconfiança. O senhor também pensa assim. Ou endossa o seu nome? Vignati: Isso está virando moda na distribuição de cargos chaves da política nacional a escolha de pessoas que pouco ou quase nada tenham a ver com os cargos que ocupam. Novamente estamos diante dos interesses do capitalismo. Eu ainda me pergunto o que fez o Gilberto Gil (excelente músico e compositor) nos oito anos que ficou como ministro da Cultura do governo Lula, para a cultura (em todos os sentidos) nacional, além de

Fotos Anderson Junque

Painel: Isso é influência direta da indústria cultural? Vignati: A cultura brasileira hoje é a televisão. E a televisão é movida pelos interesses. Ibope, patrocinadores, anunciantes etc. Hoje, com raras exceções, tudo é comandado pelo dinheiro. A imagem é Deus! E quem tem dinheiro faz a imagem e faz o que quer nos meios de comunicação. Tudo motivado pelos interesses do capital e do poder. Painel: Ferreira Gullar, considerado um dos maiores poetas brasileiros, afirmou certa vez a seguinte máxima: “A arte existe porque a vida não basta.” Comente isso. Vignati: O Ferreira Gullar é um belo poeta. Muitos outros na nossa história são grandes também. Basta lembrar de Manuel Bandeira, um Carlos Drummond de Andrade, de um Vinícius de Moraes. Ele sabe, tem vivências e razões para chegar a essa conclusão. Eu ousaria afirmar que a arte existe, porque existe a vida. A vida é uma arte. Uma grande arte. Pena que a grande maioria das pessoas hoje tenha deixado isso de lado e esteja só destruindo a vida.

Quantas vidas eu tivesse, tantas vidas eu gostaria ainda de desvendar mais e mais o que a magia do teatro sempre exerceu e exercerá junto à platéia 6

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


O teatro não é uma arte que dá um lucro imediato (ator e também produtor) devem ter calculado tudo cientificamente. Isso sem contar os apelos de mídia que asseguraram o grande êxito do filme. E também tudo ter vindo no momento certo de acordo com o gosto e as carências populares.

ter aumentado consideravelmente o seu cachê por sua apresentação em público? Painel: O cinema brasileiro vive hoje um bom momento (ao menos no que se refere ao público). “Tropa de Elite 2” tornou-se o filme mais visto na história do cinema brasileiro com 11 milhões de espectadores (superando “Dona Flores e seus dois maridos”, de 1976). Qual é a explicação para esse fenômeno? Vignati: Eu tive um grande amigo jornalista que foi o editor chefe da extinta Última Hora, um jornal de São Paulo que dizia: “Tudo tem que ser realizado e realizado cientificamente”. com cálculos científicos. Quando produzi e dirigi o espetáculo Bent (um dos maiores sucessos do teatro brasileiro nos anos 80), segui fielmente os ensinamentos do João Apolinário, um português maravilhoso e questionador que viveu entre nós e muito contribuiu para o enriquecimento da arte do jornalismo no Brasil. O José Padilha (diretor e produtor) e Wagner Moura PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

Painel: A modalidade stand-ups se multiplica pelos teatros brasileiros, sendo apresentado por gente que não tem a menor referência (e nem qualidade) nas artes cênicas – a exemplo do comediante Sérgio Malandro. Esse fenômeno tem levado muita gente que até então nunca tinha pisado num teatro a adentrar num. No seu ponto de vista isso é bom ou ruim? Vignati: Você disse bem: sem a menor referência e nem qualidade. Mais uma vez prevalece o velho ditado: “Em terra de cego, quem tem um olho é rei!” E com o beneplácito da mídia, do quarto poder em tão... (Sic) ...Essas pústulas com slogans americanos, vão proliferando como ratos. Que pena que o Sindicato dos Artistas não tenha poder para acabar com essa mamata. Parece como certos músicos, cantores ou bandas, que não fazem mais sucesso nos seus paises de origem, logo descobrem um novo filão berrando: “Vamos para lá, para América do Sul, que as cucarachas ainda podem garantir o pão e o leite dos muitos bastardos que estamos fabricando por essa vida à fora!” Painel: Como é produzir e dirigir espetáculos fora do eixo Rio - São Paulo, como esse em Cordeirópolis. É diferente? Vignati: Em cada lugar sempre é diferente. Tem suas vantagens e desvantagens. Seus pontos positivos e negativos. Mas o resultado artístico será sempre maior, se a paixão de todos pela arte também for maior. Cordeirópolis tem tudo para ser uma cidade modelo para o resto do Brasil em todos os campos, não só o artístico. Mas é preciso lutar por realizar isso, como nós lutamos. Não basta querer, falar. Tem que fazer. Quando cheguei para realizar uma Oficina de Teatro de apenas um mês, em 2005, acabei ficando, criando o Grupo de Teatro Pingo D’Água, levando o poder público a construir o Teatro Municipal da cidade em apenas 45 dias, despertando o interesse e a curiosidade de um terço dos seus 21 7


Eu ousaria afirmar que a arte existe, porque existe a vida

mil habitantes, (que então viram o nosso trabalho). Formamos um núcleo de paixão que levou a cidade a ser chamada de ‘A nova capital da cultura teatral do interior do estado’. A Secretaria de Estado da Cultura, entre espetáculos de 101 cidades, nos deu o Prêmio Mapa Cultural em 2007, como melhor espetáculo e também melhor ator para o Célio Nascimento. O jornal O Estado de S. Paulo deu duas páginas do seu Caderno 2 para o grupo e para o espetáculo Ibicaba, a Terra Prometida, que escrevi e dirigi com 35 atores em 2008. Fato que surpreendeu a todos no meio artístico nacional, uma coisa inédita para um grupo do interior que estava apenas começando. É preciso paixão, muita paixão. E isso nem sempre encontra respaldo. O teatro não é uma arte que dá um lucro imediato. Requer paciência, dedicação, disciplina. E a urgência do mundo de hoje, trabalha tudo o que pode e não pode para destruir com o sonho e a beleza. Painel: Uma biografia da sua vida está sendo produzida pela escritora Sônia Marrach contando seus 50 anos de carreira. Qual a grande contribuição à classe artística (e também ao leitor leigo) que a obra pode oferecer do ponto de vista de um biografado? Vignati: O Brasil é um país sem memória, portanto acho que a maior contribuição é deixar para a história essa dedicação de 50 anos ao teatro brasileiro. Muitos alunos na faculdade onde leciono interpretação, direção e laboratório de montagem, não sabem nada a respeito de seus professores. Falta interesse, falta leitura, falta criar esse hábito. Creio que entre nós tudo ainda está por ser feito. Portanto, falar dos que fazem arte é importante. Acredito que se desde pequeno, nas escolas, ensinassem o que é teatro como ensinam as coisas do futebol, não teríamos tantos fanáticos que brigam, matam e se matam por campeonatos. Teríamos uma sociedade mais equilibrada, mais consciente dos seus direitos e lutariam pelo que realmente interessa no que se refere ao crescimento de uma nação. É triste saber que tramitam no Congresso leis importantes (que resolveriam muitos problemas nacionais) e que para serem aprovadas precisam de um milhão de votos e lá estão paradas anos, enquanto, numa noite apenas e pagando as ligações, o brasileiro dá 20 milhões de votos para fulana ou beltrano ganhar o Big Brother.

8

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


Fotos Anderson Junque

O futuro ainda será muito mais negro do que estamos imaginando Painel: Qual o seu posicionamento em relação às redes sociais no que se refere a divulgação de filmes e espetáculos de teatro. Ela ajuda ou atrapalha? Ou os dois? Vignati: Como já disse tudo que fale e divulgue arte é produtivo. Eu nunca me neguei a dar nenhuma entrevista por mais simples e menor que seja a revista, o jornal, por menos audiência que tenha o programa de rádio ou televisão. Sempre alguém vai ouvir ou ler e se interessar e acabará indo ver o espetáculo. Só acho que todas essas redes sociais e de comunicação poderiam ser mais profundas nas

suas divulgações e não apenas fazer um trabalho tipo serviço social, quase para desencargo de consciência ou obrigação para não passar como ausência perante a história, quando esta realmente resolver discutir a participação real de cada um. Uma coisa, como faz a televisão nas novelas que abordam certos temas tabus -- como a homossexualidade, a síndrome de dawn, o alcoolismo e tantos outros, superficialmente --, não chegando nem a dar a isso 10% do tempo que dedicam e exploram nos crimes, nos atos sexuais, nas falcatruas, na corrupção e etc. do que abordam em mais de cem capítulos. Painel: O índice de leitura per capita/ano do brasileiro não chega a dois livros. É possível fazer o brasileiro ler mais? O incentivo através da cultura é uma saída? Como fazer isso no Brasil? Vignati: Esse índice realmente é triste. Tenho alunos que não lêem nenhum pequeno livro durante um semestre. Levam zero, mas não lêem. É uma questão de hábito que deveria ser incentivado por todos os meios de comunicação, por todas as artes. Cabe aos ministérios da Cultura e da Educação procurar resolver isso com mais rigor. Que eles coloquem suas cabeças para funcionar. Estão lá ganhando muito bem para isso! E o povo brasileiro que acorde e cobre isso mais profundamente dos seus governantes. Mas, o que tudo indica, o futuro ainda será muito mais negro do que estamos imaginando. 

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

9


sumário

Solidariedade 12 Sem família, sem casa e sem

amor. Moradores de rua se unem, somam forças e dividem o sofrimento.

Subsistência 14 Catadores de lixo encontram na

42

18

reciclagem a renda necessária para cuidar da família. Dedicação Movidos pela idolatria, jovens investem tempo na construção de sites sem ganhar um centavo em troca.

Benefício 21 Bolsas do ProUni atendem 800

mil alunos matriculados no ensino superior.

Na contramão 24 Contrários à pratica do sexo e ao

28

uso de bebidas, os straight edge – movimento originário nos Estados Unidos ganha adeptos no Brasil. Multiplica-vos Pais buscam em tratamento de infertilidade a solução para realizar o sonho de ter um filho.

24 Cães sem dono 30 ONG acolhe e recolhe animais

abandonados e vítimas de maus tratos na cidade de Piracicaba.

Amada e odiada 32 Titulada como desgraçada

pela Bíblia, a serpente atrai a curiosidade das pessoas.

O valor do girassol 34 Semente da flor é utilizada como

alimento para aves e remédios para os homens e mulheres.

Produção de laranja 38 Cultivo da fruta garante liderança

do Brasil como maior produtor.

Das passarelas às ruas 42 Conheça as novidades da moda

outono inverno ditadas pelo SPFW.

12 10

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


OPINIÃO

Em apoio à ciência Lavínia Vasconcelos laboliveir@unimep.br

A

infertilidade atinge cada vez mais os jovens. Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) revelam que a taxa de fertilidade no Brasil em relação a 2010 caiu 0,46%, sendo que até março desse ano era de 2,18%. Ainda segundo a OMS, estima-se que dois milhões de casais apresentam algum tipo de dificuldade para engravidar. A infertilidade masculina é causada geralmente por problemas na produção do esperma ou em conseguir que este alcance o óvulo. Agora, a infertilidade feminina tem como causa a ovulação, sendo muitas vezes conseqüência do estresse, dieta, treinamentos esportivos e idade avançada. O tratamento existe e chega de graça para a população por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), com medicamentos ou cirurgia. Há ainda quem prefira congelar o sêmen para usá-lo no futuro no processo chamado de gravidez assistida, que nada mais é do que a fertilização do óvulo realizada em laboratório. Entretanto, esse processo é visto como um tabu em pleno século 21. Religiosos acreditam que essa prática de congelamento para uma futura gravidez

não é apropriada, já que avaliam ser Deus quem tem o poder de conceder a vida; a ciência não teria esse direito. Além disso, há várias discussões éticas sobre a maneira como esses materiais seriam utilizados pelos cientistas. Certo? Errado? Isso depende do juízo de valor de cada um. Mas não se pode fechar os olhos para inúmeros casais que têm o sonho de serem pais, ter uma família. Se a ciência evoluiu tanto ao longo dos anos, porque ela não pode utilizar todo esse aprendizado em favor desses pais? O homem ainda está longe de ser considerado Deus, mas ter o poder de gerar uma nova vida não pode e nem deve ser condenado. Para casais que sonham com a paternidade e não conseguem ter um filho, a gravidez assistida é uma opção. A adoção é outra escolha que requer muita atenção, dedicação e principalmente amor. Os pais devem criam seu filho adotivo com a mesma intensidade como se ele tivesse sido gerado nove meses na barriga da mãe adotiva. É fato que hoje em dia os preconceitos ainda pairam na sociedade, entretanto, é preciso estar abertos a novos conceitos e práticas. O cantor e compositor Cazuza em sua música ‘O tempo não para’ já dizia: “tuas idéias não correspondem ao fato”, ou seja, a evolução está aí, cabe apenas compreende-la.

Sem lenço, sem documento Anderson Junque mfjunque@ig.com.br

O

pacifista indiano Mahatma Gandhi certa vez fez o seguinte pronunciamento: “Um homem não pode fazer o certo numa área da vida, enquanto está ocupado em fazer o errado em outra. A vida é um todo indivisível”. Detentor de uma precisão invejável, a lição de Gandhi pode muito bem ser utilizada como bússola na orientação dos mandatários da política pública brasileira, que insistem e persistem em dividir de forma desigual a riqueza produzida nos quatro cantos do país. Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) dão conta que hoje no Brasil há entre 0,6% a 1% de moradores de rua. Esses números representam 1,8 milhões de pessoas nessa situação. Estatísticas que denunciam uma realidade dura e PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

cruel que o repórter Jackson Rossi foi conferir, em contexto local, nas ruas de Piracicaba. Indivíduos com família, trabalho e projetos de vida, mas que por motivos diversos foram morar nas ruas sem posses ou perspectivas – tendo a solidão como a única certeza. Seres humanos jogados à própria sorte, que muitas vezes encontram num companheiro a possibilidade de somar histórias e dividir o sofrimento. Vítimas da invisibilidade pública são sentenciados sem a menor possibilidade de defesa. Esse é o Brasil; um país que cresce economicamente a passos cada vez mais largos, possuidor de um PIB (Produto Interno Bruto) de R$ 3,675 trilhões, detentor do programa espacial mais avançado da América Latina e com uma das maiores diversidades naturais do planeta, mas que ainda insiste continuar com os mesmos erros elementares de seu descobrimento. 11


Jackon Rossi

Jackson.rossi@itelefonica.com.br

N

as ruas de Piracicaba há cerca de 100 moradores, 0,2% do total da população. No Brasil esse número pode chegar a 1,8 milhões de pessoas vivendo nessas condições de modo provisório ou permanente. Os principais motivos estão o desemprego, alcoolismo, drogas e rejeição da família. Pesquisa realizada pelo Ministério do Desenvolvimento Social em 23 capitais e 48 municípios mostra que a principal causa citada pelos entrevistados que moram nas ruas é o vicio de álcool e drogas com 35,5%, seguindo do desemprego com 30% e conflitos familiares com 29%. Eles transitam como indigentes, vivem à margem da sociedade, muitas vezes vitimas de preconceito, da violência urbana, do descaso das pessoas; enfrentam a desigualdade social e muitos são mortos. O caso mais grave foi registrado em Maceió, entre janeiro e novembro de 2010, quando 32 moradores de rua foram assassinados. Jurandir e Luiz pertencem a esse universo. Eles podem ser vistos na Praça José Bonifácio, caminhando

12

juntos. Estão sempre a olhar o horizonte, carregando seus pertences, apenas duas bolsas e algumas sacolas. Suas historias se cruzam: vivem há dois anos nessas condições. Eles se conheceram na área central da cidade, tornaram-se amigos e foram morar embaixo da ponte do Lar dos Velhinhos. Ali improvisaram um fogão, com tijolo, um varal e uma cama. Tiveram que deixar o lugar quando foram descobertos pela polícia, que jogou seus pertences no rio. A paixão por uma mulher foi a causa para Jurandir, desiludido, viver nas ruas. “Era apaixonado por uma mulher, tinha até conta conjunta no banco com ela. Um dia ela sumiu com todos os meus móveis da casa e com todo o meu dinheiro do banco. Nunca mais a vi. Nesse dia cai na vida e não me levantei mais”, conta. Luiz esteve envolvido com drogas: começou a usar crack e a vida foi desmoronando. Vendia o que tinha na casa para sustentar o vício; largou a esposa e abandonou os filhos. “Hoje não uso droga, mas ninguém confia em mim, nem os próprios familiares”, lamenta-se. Hoje, eles se protegem, a ponto de um ficar acordado enquanto o outro dorme. “Essa vida é muito PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


Jackson Rossi

Moradores de rua circulam pela cidade movidos pelo vício, desemprego e desestrutura familiar

perigosa. Já acordei com tapas e chutes uma vez. Hoje, dormimos onde geralmente ninguém vê”, diz. Luiz revela considerar Jurandir como seu pai Em seus dias não há rotina, usam o banheiro público ou qualquer canto; comem o que a igreja oferece ou esperam pela esmola de quem os vê na rua. “Acordamos sem destino e dormimos assim também”, fala Luiz. Mas, Jurandir pensa um pouco e desabafa. “Não somos bem recebidos pela sociedade. Quando passo as pessoas correm e fecham as portas”. A assistente social da Prefeitura de Piracicaba Sandra Ivani Moraes avalia existir três fatores que impulsionam e possibilitam a ida dessas pessoas à rua: a questão social, que representa um ambiente familiar desequilibrado; o psíquico, com a presença das drogas, o alcoolismo e depressão; e o econômico, que é a miséria absoluta. Segundo ela, todo morador de rua tem dificuldades de socialização, de se adaptar as regras de uma sociedade e permitir a participação da família é importante nesse processo. “Todo ser humano vive em grupo e quando o grupo básico, que é a família, não acolhe a PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

pessoa com problemas, ela procura a identificação de um grupo nas ruas”, frisa. Em sua opinião, não há uma solução a curto prazo para esses cidadãos, mas acredita que o governo se empenha para acabar com a miséria, com o bolsa família e com a renda cidadã. “Investir na educação é a melhor saída e a junção do Estado, da família e da sociedade ajudaria a amenizar o problema”, defende. A psicóloga Ligia da Cunha Martins analisa existir várias situações que levam as pessoas a viverem nas ruas como o abalo financeiro, os vícios, pessoas que migram de outros estados para tentar a sorte e até mesmo traição na família. “Sei de um caso em que a pessoa é engenheiro civil, bem formado, tinha uma família estruturada. A esposa o largou e ele entrou em depressão profunda, foi para o alcoolismo e perdeu tudo que tinha”, disse Um dos caminhos para recuperar essas pessoas das ruas, aponta, seria um trabalho psicossocial, conscientizando–as de seus valores. “Eles se colocam como isolados, se sentem excluídos e acabam por atacar a própria sociedade”, afirma a psicóloga.  13


Política Nacional de Resíduos Sólidos propõe Fotos Letícia Costa

cultura do desenvolvimento sustentável

14

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


Reciclado no lugar

CERTO

Letícia da Costa Coelho leticiacostacoelho@hotmail.com

P

apel jogado na grama, garrafa pet nas águas dos rios e lagos, caixas de papelão molhada e espalhadas pelo jardim e calçadas, além das latas de refrigerantes e garrafas de vidros no chão. Lixo nosso de cada dia que prejudica o meio ambiente, entope os bueiros e causam odor forte, além de danos para a saúde pública. Recolhido, torna-se fonte de renda para pessoas como Maria Jesus Gertrudes, que mora em Santa Bárbara d’ Oeste e sai todos os dias de manhã empurrando um carrinho de ferro pelas ruas da cidade. Há 10 anos ela recolhe material descartável e o vende como reciclado numa cooperativa do município. Com o dinheiro sustenta sua família, dois filhos, uma nora e um neto. Dona Maria, hoje com 59 anos, começou a recolher material descartável num dos momentos mais agudos de sua vida: doente e com problemas PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

financeiros resolveu trabalhar com lixo reciclado com apenas uma sacola, andando pelas ruas do bairro onde morava. O tempo passou e a sacola foi trocada por um carrinho de feira, pelo volume dos recicláveis que recolhia. Com o aumento do material coletado precisou de um transporte maior: foi guando ganhou de um ex-catador de reciclagem um carrinho feito a partir de uma caixa de geladeira. Mesmo com o carrinho, Maria tem que fazer várias viagens por dia - de ida e volta até sua casa – por conta do material reciclável que recolhe na região onde mora. Todo material é depositado na garagem de casa. O trabalho começa todos os dias às 6h e termina às 20h. Depois, ela limpa e separa os tipos de material em sacos plásticos - ficam garrafas pets, latinhas de refrigerantes, papéis, plásticos e até eletrodomésticos - que são fechados e ficam reservados à espera do caminhão da cooperativa que passa a cada 12 dias para recolher as sacolas com os reciclados.  15


Maria Jesus Gertrudes sobrevive com o material que recolhe no bairro onde mora

Com reciclagem, resíduos sólidos vão diminuir

Destino - A cooperativa de reciclados em Santa Bárbara d’ Oeste coleta os materiais recolhidos de 50 catadores da cidade. Quando esses materiais chegam ao galpão, são novamente separados pelos funcionários. Depois dessa etapa, os recicláveis são levados para uma empresa que os utiliza para fazer roupas, garrafas, entre outros produtos que são revendidos como novos. O trabalho rende um lucro para a cooperativa de até 40% livre das despesas de manutenção. O PAD (poliuretano de alta densidade) custa R$ 0,70 o quilo; o PET (poli tereftalato de etila), R$ 0,60; o PVC (poli cloreto de vinila), R$ 0,40; o cobre R$ 8; o metal, R$ 4 e a sucata R$ 0,15. Segundo dados da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (PNSB), realizado pelo IBGE em 2008, que afere a oferta de abastecimento de água, esgotamento sanitário, manejo de águas pluviais e de resíduos sólidos, os lixões a céu aberto ainda são o destino final dos resíduos sólidos em 50,8% dos municípios brasileiros. De modo geral, os lixos não causam problemas só para o meio ambiente, mas também para a saúde pública. Isso se explica porque, com a decomposição da matéria orgânica, os lençóis freáticos são contaminados e, consequentemente, os mananciais. Além disso, com a liberação de gás carbônico e metano 16

A cooperativa recebe por mês cerca de 150 toneladas de recicláveis; todo material é separado e levado para a indústria

na atmosfera, esses vazadouros de resíduos sólidos a céu aberto provocam fortes impactos ambientais que estão associados a doenças respiratórias. Dados da PNSB de 2008 indicam que em 1989 os lixos representavam o destino final de resíduos sólidos em 88,2% dos municípios; em 2000, esse índice caiu para 72,3%, chegando aos 50,8%, em 2008. A legislação brasileira prevê fim dos lixões e, para isso, foi regulamentada a lei sobre Resíduos Sólidos que determina a distinção entre o resíduo PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


Fotos Letícia Costa

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

(lixo que pode ser reaproveitado ou reciclado) e rejeito (o que não é passível de reaproveitamento). Os tipos de resíduos que a lei se refere são doméstico, industrial, da construção civil, eletroeletrônico, lâmpadas de vapores mercuriais, agrosilvopastoril, da área de saúde, perigoso entre outros. O objetivo dessa lei é a redução do uso dos recursos naturais; como água e energia para o processo de novos produtos e intensificarem ações de educação ambiental, aumentar a reciclagem no país, promover a inclusão social, a geração de emprego e melhorar a renda de catadores de materiais recicláveis. Com a Política Nacional de Resíduos Sólidos, os fabricantes serão responsáveis pelo destino final de um produto. Patrícia Pulcini Donaire, graduada em química com especialização em gestão ambiental, afirma que devido a estruturação e implantação da logística reversa (instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada); e a instituição da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos (conjunto de atribuições individualizadas e encadeadas dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, dos consumidores e dos titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, para minimizar o volume de resíduos sólidos e rejeitos gerados, bem como para reduzir os impactos causados à saúde humana e à qualidade ambiental decorrentes do ciclo de vida dos produtos), o fabricante passará a ser responsável pelo produto “do berço ao túmulo”: com o término do ciclo de vida do produto, o resíduo deverá ter seu destino correto, seja a reciclagem ou o acondicionamento. Isso faz com que não permaneça no meio ambiente e não gere mais poluição. Segundo Patrícia, o maior desafio da nova política no Brasil é propagar a cultura do desenvolvimento sustentável. Para tanto, a sensibilização dos cidadãos a respeito deste assunto e a implantação de uma política de educação ambiental para crianças e adultos devem ser fortemente trabalhadas. As pessoas teriam que passar a ter um consumo mais consciente, assim os resíduos sólidos passarão a diminuir. Patrícia enfatiza que a participação da sociedade neste processo tem que ser ativa, com comprometimento e não como espectador dessa nova política nacional de resíduos sólidos. O cidadão deve cobrar medidas da sociedade que o cerca, de seu vereador, deputado, de sua escola, de seu condomínio, de sua associação de bairro. “Se cada um fizer a sua parte e cobrar os que lhe são próximos, poderá ter a expectativa de alcançar o resultado desejado”, diz. 17


Emprego Fernanda Cristina Pereira fcrpereira@gmail.com

J

á pensou trabalhar por horas e nem ao menos receber um centavo para isso? Imagine passar a maior parte do dia à frente de um computador, responder vários e-mails, mexer em redes sociais e arrumar códigos HTML. Tudo isso em poucos minutos. Ou ainda ter que lidar com pessoas do Brasil inteiro com perguntas repetitivas ao longo da semana.

Jovens passam horas na frente do computador para atualizar fansites

18

Fãs gastam seu tempo livre em trabalhos online sem ganhar nada em troca PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


virtual Algumas vezes, interpretado como um tipo de ‘escravidão’, esse trabalho não remunerado se desenvolve na internet e tem nome: fan sites (traduzido como sites de fãs). Com o poder de reunir várias pessoas em apenas uma página, os fan sites são sítios criados e mantidos por fãs, dedicados a qualquer tipo de coisa, como uma celebridade ou algum fenômeno cultural particular, seja esse fenômeno um livro, algo relacionado à televisão, cinema, música, esporte, jogos etc. Esse ‘ato voluntário’ tem crescimento constante atualmente e domina a web de forma significativa. Segundo o psicólogo Isaac Rubin, o motivo para tanto sucesso é que “as pessoas geralmente preferem socializar com aqueles que são similares a elas” e encontram nesse tipo de página outros fãs que compartilham a mesma paixão por determinado assunto, o que as une quase que instantaneamente. De acordo com ele, “ao fazer parte direta ou indiretamente de qualquer tipo de comunidade que lhe chame atenção, o fã incorpora o ‘objeto de adoração’ em sua vida, o interpreta como parte de seu dia a dia e, assim, satisfaz a necessidade de participar de um grupo social para elevar sua autoestima”. Nos bastidores – Apesar de existirem sites oficiais para cada tipo específico de fenômeno cultural, fãs acham necessário se mobilizar e criar páginas para se envolverem mais com o que idolatram e se sentirem mais próximos. “Posso dizer que, além da falta de notícias e material deles no Brasil ter me motivado a ajudar na construção do site, outro fator é bastante relevante: o fato de construirmos algo para a banda fazia a gente se sentir, de alguma forma, mais próxima. E qual o fã que não gosta disso?”, conta a jornalista PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

“Sábado à Noite” esgotou em pouco tempo na 21ª Bienal do Livro de São Paulo

Clara Abdo, uma das fundadoras do site McFLY Addiction. Ao procurar sobre a banda no site de buscas Google, é possível encontrar mais de 11 milhões de resultados. O primeiro link que aparece é www. mcflyaddiction.com.br, antes mesmo do site oficial da banda, motivo de orgulho para Clara. “Em pouco tempo, o site cresceu em proporções inimagináveis. Nem mesmo nós, que cuidamos com tanto carinho, imaginávamos o quão enorme ele seria”. Hoje, com cinco anos de existência, o McFLY Addiction recebe, em média, três mil acessos diários e conta com uma equipe de 20 pessoas. Além do domínio principal, é divido em mais 12 hotsites sobre diferentes assuntos (subdomínio para cada integrante,

vindas ao Brasil, galeria de fotos etc). No site de relacionamentos Twitter, possui mais de 17 mil seguidores, uma marca surpreendente para um fan site. Com o tempo, o amor pelo produto criado se torna tão importante quanto o amor pelo motivo de o ter criado. “O Addiction para mim significa uma família. É a melhor definição que consigo encontrar. Em uma família você constrói laços afetivos, amadurece, aprende, briga, chora, sorri, evolui e eu pude passar por tudo isso no site. Fazer parte dele não tem preço”, conta Clara. Retorno positivo - Gerenciar um fan site parece fácil, mas exige trabalho duro e paciência, além de muita dedicação. Checar e-mails constantemente, procurar notícias e lidar com várias 19


Depois de três anos cuidando do McFLY Addiction, Clara Abdo (ao centro) foi escolhida para entrevistar a banda quando fez turnê pelo Brasil em 2009

pessoas de todos os cantos do país são apenas algumas das tarefas diárias. Algumas vezes, gastar mais tempo nesses projetos do que o imaginado pode incomodar os familiares. Com Clara, não foi diferente. “No início meus pais implicaram muito pelo fato de eu dedicar quase 100% do meu tempo a uma banda que não me dava nada em troca. Mas, com o tempo eles foram percebendo o quanto isso me fez crescer e me faz feliz. Conquistei muitas coisas com o Addiction e eles acompanharam tudo de perto dando todo o suporte necessário”. Porém, com tanto esforço, as chances de um bom resultado são muito altas. Estudante de Publicidade e Propaganda na USCS (Universidade Municipal de São Caetano do Sul) e webdesigner, Francine Silva conseguiu o primeiro emprego graças aos trabalhos feitos para a internet. “Meu portfolio inicial só tinha coisas que eu fiz para fan sites. E fui contratada em uma agência de publicidade graças a ele”. Ao conseguir tal feito, Francine conta que também ganhou um aliado: seu pai. Antes sendo contra a idéia da filha trabalhar tanto sem ganhar dinheiro com isso, agora a apoia e até ajuda com ideias sobre o que criar para produzir layouts (área de design ou formato de página na web). “Quando eu arrumei o estágio, ele mudou de idéia totalmente”. 20

Já para Clara, com sua participação no McFLY Addiction, foi possível realizar um sonho. Em 2009 a banda fez uma pequena turnê de sete shows no Brasil e ela foi uma das escolhidas para entrevista-los. “Como jornalista, foi incrível. Eu tive acesso a um ambiente que nunca havia tido anteriormente e foi maravilhoso. Uma experiência e tanto, não apenas pelo fato de eu estar exercendo o que escolhi para meu futuro, mas porque estava concretizando um sonho, que era entrevistar o McFLY”, conta. De paixão à profissão - Aos 24 anos, Barbara Dewet conquistou muito em sua vida pessoal e profissional, grande parte graças à fan sites. Formada em Cinema e dona e professora de um curso supletivo no Rio de Janeiro, Babi (como prefere ser chamada) gosta de escrever desde criança. Com 16 anos começou a escrever fanfictions (histórias inventadas por fãs) sobre personagens da saga Harry Potter, mas foi ao criar o site Fanfic Addiction que tudo começou a mudar. Ao publicar um primeiro conto no maior site de fanfics da internet, Babi “pegou gosto” pelas histórias e começou a escrever outras. Entre elas, uma em particular se destacou: a intitulada Sábado à Noite, carinhosamente chamada de SAN pela autora e uma das primeiras

fanfics interativas do Brasil. O enredo fez tanto sucesso no mundo virtual que foi transformado em obra. “A idéia de fazer com que SAN virasse livro foi sendo empurrada por anos, e a gente só se toca das coisas quando a oportunidade bate na porta. Eu gosto de livros e para mim foi a realização de um sonho”. Em 2010, Sábado à Noite deixou as telas dos computadores direto para as prateleiras. Mesmo com enorme apoio dos leitores da fanfiction e também dos amigos, Babi diz que a maior dificuldade em publicar o livro foi a aceitação do público, pois não possui editora. Mas isso não a impediu de se sair bem com as vendas. No mês de agosto, logo após o lançamento do livro, Barbara participou da 21ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo expondo SAN, que esgotou em pouco tempo. Ainda no mesmo ano, a escritora participou da 50ª Feira da Providência do Rio de Janeiro, considerada uns dos principais eventos sociais da cidade carioca. Atualmente, Babi mantém o blog (diário online) www.babidewet.com onde posta sobre cultura em geral. Com o apoio de editoras como Record, Moderna e Intríseca e da gravadora Universal, escreve resenhas de livros, filmes e álbuns musicais, divulga lançamentos e eventos, além de fazer vários tipos de promoções para os leitores. PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


Passaporte para a graduação Camila Duarte

camilafduarte@hotmail.com

O

ensino superior mudou. O ProUni (Programa Universidade para Todos), criado em 2004, possibilitou que 800 mil jovens conseguissem terminar a graduação, com bolsas integrais e parciais (entre 50 e 25% do valor da mensalidade), benefício destinado a aluno com renda per capta familiar de até três salários mínimos. Como é o caso do biólogo Daniel Pires, um dos primeiros formados pelo programa, em 2008. Pires lembra que ao terminar o ensino médio em 2004 estava desempregado e ainda não tinha definido que rumo tomaria. Não pretendia fazer graduação. No entanto, recebeu uma carta do MEC convidando e orientando para realizar inscrição no ProUni; participou do processo e conquistou uma bolsa destinada a afrodescendentes. “Embora eu não esteja empregado na área, o conhecimento adquirido foi muito grande”, diz. Débora Rafaela Ferrari Braga iniciou a graduação em 2009 com o auxílio do ProUni, mas não foi na primeira tentativa. Em 2007, conseguiu bolsa parcial de 50%, mas não teve condições de arcar com a outra metade dos custos. Hoje, cursa o 5º semestre de fonoaudiologia na Unimep (Universidade Metodista de Piracicaba), com bolsa integral. “Se não tivesse a bolsa, teria feito apenas um curso técnico, porque não teria condições de pagar”, afirma. Aos 40 anos Marcelo de Oliveira Floriano voltou a estudar e faz a gradução junto com sua filha, Alyne Stéfani Floriano. Sem a bolsa federal, não teria conseguido entrar numa faculdade. “O ProUni foi a melhor coisa que aconteceu nos últimos anos no Brasil. É um passo para o fim da desigualdade”, afirma. Ele ainda destaca que o fato de cursar uma graduação valoriza o seu trabalho, e, com isso, pretende alcançar um cargo de liderança.  PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

ProUni beneficiou 800 mil alunos, 60% deles atuando na área de formação

Débora Ferrari não teria feito graduação sem ajuda do ProUni

21


Para conseguir o benefício, fez um curso preparatório para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), junto com a filha, e hoje cursa o 5º semestre de engenharia de produção na Faculdade de Jaguariúna (FAJ). Alyne, que cursa o 5º semestre de administração na mesma faculdade, diz que mesmo se não tivesse o benefício cursaria o ensino superior, mas na instituição e no curso que os recursos permitissem. “Conheço pessoas que têm vergonha de dizer que são bolsistas. Eu não, eu tenho orgulho”, diz. Um ponto negativo do programa, na visão de Marcelo, é a divulgação. À época, teve conhecimento quase ao acaso, por meio de amigos e familiares. Mas admite que este ponto tenha melhorado. Os números comprovam: de 2004 para 2010, o aumento na procura pelas bolsas oferecidas pelo programa chegou a quase 97%. Em 2010, foram 1.054.980 inscritos, ante 535.834 em sua primeira edição. Somente no primeiro semestre de 2011 foram 1.048.631 inscritos, um crescimento de 27,53% em relação ao primeiro semestre do ano passado, em que 822.254 alunos se inscreveram. O número de bolsas oferecidas não acompanhou essa demanda. Em 2005, foram 112.416, e, em 2010, 225.488, aumento de 100,56%, que teve queda em 2011. Se no primeiro semestre de 2010 foram 165 mil bolsas oferecidas, em 2011 foram 123.170, o que representa uma queda de 25,35%. A assessoria de imprensa do Ministério da Educação (MEC) explica que esse número não inclui um percentual de bolsas que as instituições podem oferecer além das obrigatórias,

Alyne: “Tenho orgulho de dizer que sou bolsista do ProUni”

Marcelo realiza o sonho de cursar uma graduação aos 40 anos, graças ao ProUni

o que eleva as bolsas ofertadas no primeiro semestre de 2011 a 162.491. No entanto, ainda existe uma queda de 1,77%. Foram 886 mil que ficaram sem o benefício no primeiro semestre de 2011.

Fonte: SISPROUNI de 05/10/2010 Bolsas ProUni 2005 - 2º/2010

22

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


Dados do último censo da educação superior indicam que 5,9 milhões de alunos realizaram matrícula em 2009. No mesmo ano, o ProUni ofereceu 182.581 bolsas, entre o primeiro e o segundo semestre, o que representa cerca de 3% das matrículas. A assessoria de imprensa esclarece que o MEC tem, além do ProUni, outros programas, como o Fies (Fundo de Financiamento Estudantil do Ensino Superior), que entre 1999 e 2009 financiou quase R$ 6,5 bilhões a 562,9 mil alunos, e o Sisu (Sistema de Seleção Unificada), que selecionou 147.611 alunos a vagas de instituições públicas de ensino superior que utilizaram a nota do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) como única fase de seu processo seletivo. Este ano, 5.526 bolsas não foram preenchidas. Para resolver o problema, está em curso uma mudança no programa, que propõe a isenção fiscal às instituições de ensino proporcional à ocupação de bolsas e não mais a oferta, como acontece atualmente. Outra ação para a otimização da ocupação das bolsas foi a criação, a partir deste ano, da Lista de Espera do ProUni. De acordo com a regulamentação, ao fim da segunda chamada, os candidatos inscritos e não pré-selecionados e os pré-selecionados para cursos em que não houve formação de turma constarão da lista de espera. Adesão - A Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep) foi uma das primeiras instituições a aderirem ao programa, junto com a Universidade Metodista de São Paulo. De acordo com o reitor da universidade Clovis Pinto de Castro, o programa vai de encontro com a Política Acadêmica de Inclusão e Responsabilidade Social. “O ProUni é um dos principais programas de inclusão do governo. Ele é mais que bolsa família ou cesta básica, oferece possibilidade de formação em uma boa universidade”, diz. Como a instituição é filantrópica, deveria oferecer 20% da sua receita em bolsas de estudos – mas atualmente oferece 40%. Em 2011, das 605 bolsas ofertadas em Piracicaba em 12 instituições de ensino, 339 eram da Unimep. Se a esse número forem acrescentadas as bolsas oferecidas nos campi Santa Bárbara d’Oeste e Lins, o número de bolsas ultrapassa 400. Castro conta que o debate que girava em torno do ProUni, à época da sua criação, era que o aluno de baixa renda teria dificuldades em acompanhar o ritmo de uma universidade. “A experiência tem mostrado que esses alunos chegam com uma garra muito forte”, avalia. Segundo ele, os bolsistas estão interessados em formação complementar, como iniciação científica, e muitos estão conseguindo estágios nas áreas de sua formação. Tânia Alves, que cursa o 7º semestre de serviço social na Faculdades Integradas Maria Imaculada, é um exemplo disso. Natural de Monte Belo (MG), PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

O ProUni ajuda alunos como Matheus, que busca crescimento profissional

Daniel está entre os primeiros formados pelo programa. “O conhecimento adquirido foi muito grande”

mora sozinha em Piracicaba para cursar o ensino superior e faz estágio na área há três anos. “O estágio é excelente, porque o aprendizado acontece também fora da sala de aula”, diz. Tânia teve o incentivo de um funcionário da escola em que cursou o ensino médio para se inscrever no programa, e diz ser de grande ajuda para a sua formação profissional. “Na região em que morava tem instituições de ensino superior, mas não as oportunidades de carreira que tenho aqui”, compara. Matheus Millani da Silva fez o caminho inverso. Trabalha em uma empresa de comunicação visual e vê na formação superior o aperfeiçoamento. Matheus cursa o 5º semestre de publicidade e propaganda na Unimep e conta que a graduação agrega valor e credibilidade ao trabalho que já realizava. “Hoje aplico conceitos e pesquisa, que não conhecia e não trabalhava. Com isso, a qualidade é maior”. O estudante conta que sem o auxílio do ProUni, não teria a oportunidade de se profissionalizar, porque ajudava a manter a casa em que morava com a mãe e o irmão, e hoje sustenta a própria família. Pesquisa realizada pelo Ibope, a pedido do Ministério da Educação, com 1.200 ex-alunos do ProUni, indica que 80% hoje está empregado, dos quais 61% em sua área de formação. 68% dos entrevistados declararam que a sua vida melhorou muito após ter começado o curso superior e 26% afirmam que sua vida melhorou pelo menos um pouco.  23


Straight

edge

Shows de bandas straight edges são marcados por mosh pits – ato de se jogar em cima dos demais fãs - e rodas de pogo, típica dança punk

24

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


Fotos Maurício Santana

Não ao álcool, não a promiscuidade; jovens se unem na corrente contrária à vida moderna

Bruno Bianchim Martim bruno_bianchin@terra.com.br

E

squeça a bebedeira, o churrasco do final de semana e o sexo casual. Árdua tarefa para quem não está acostumado a conviver sem as luxurias da vida moderna. Essas são algumas das características que ajudam a elucidar o termo straight edge, movimento de contracultura iniciado nos idos de 1980, na cena do hardcore estadunidense. Na sociologia, antropologia e estudos culturais, uma subcultura, ou contracultura, envolve pessoas com características distintas de comportamentos que as diferenciam de uma cultura ampla a qual renegam, como explica o sociólogo e professor Carlos Vendemiatti. “São pequenos grupos ou uma cultura não totalmente desenvolvida, que cultivam ou preservam idéias relacionadas à estética religiosa, ocupacional, política ou sexual”, acrescenta. Para esclarecer o surgimento do straight edge, que recebe essa nomenclatura no Brasil, é preciso voltar ao tempo. Quando surgiu no final da década de 1970, o punk rock era revolucionário. Não faltavam letras com ideais liberais, ao melhor estilo ‘do it yourself’’ - ou seja, faça você mesmo -, guitarras distorcidas e excesso de drogas lícitas e ilícitas. O estilo fez sucesso, especialmente, na Inglaterra, onde surgiram os Sex Pistols e o The PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

Clash, e nos Estados Unidos, de onde vieram os Ramones. “Todas foram bandas seminais, que ajudaram a definir o estilo”, comenta o estudante Guilherme Junqueira. Na década seguinte, surgiu o youth crew, trazido à vida pela influência do punk e do hardcore, que, anos mais tarde, daria origem ao straight edge. A partir daí, uma série de bandas passou a compor músicas com ideologias vegans, letras que pregam a fidelidade afetiva e que não se importam com os rumos da economia mundial. A maior parte desses grupos é apolítica, ao contrário do movimento punk e do hardcore. O escopo do gênero é justamente contrapor a teoria punk. Desde 2008 como adepto da corrente, Guilherme Junqueira elenca fatores que o ampararam a compor parte da cena da cidade de Limeira onde vive. A influência pela opção ao estilo de vida straight edge, o fez mudar hábitos antes não vistos como inadequados. “Eu comia muita carne durante todas as refeições. Eram raras às vezes em que não tinha um acompanhamento de carne. A partir de 2008, as idas e vindas ao supermercado ficaram mais práticas. As sacolas ficam mais leves só com frutas e legumes”, afirma, ao detalhar o pano de fundo que o fez tornar um straight edge: o vegetarianismo. “Não sou vegano, apenas não como carne”, diz.  25


O veganismo e o vegetarianismo são estritamente ligados ao straight edge, já que nasceram sob essa concepção. Os veganos boicotam qualquer produto de origem animal (alimentar ou não), além dos que tenham sido testados em animais ou que incluam qualquer forma possível de exploração animal nos seus ingredientes ou processos de manufatura. Por sua vez, o vegetarianismo apenas exclui os pratos com carne da sua dieta. “Eu optei por ser uma escolha mais justa. Não acho necessário comer e maltratar qualquer tipo de ser vivo para um fim alimentar. A indústria da carne age muito incorretamente”, pontua, ao analisar questões que vão além do vegetarianismo. “É só observar quantos animais são abatidos aos montes quando alguns deles apresentam alguma doença, como a febre aftosa. Isso é um genocídio”, observa. Segundo Vendemiatti, para o vegano, cada animal é dono de sua própria vida, tendo assim o direito de não ser tratado como propriedade. “Os veganos propõem uma analogia entre especismo, racismo, sexismo e outras formas de preconceito e discriminação”, afirma. Outro fator apontado pelo estudante é o fato de não se adaptar a um estilo de vida hegemônico, similar ao que a maior parte dos jovens vive. “Não vejo muita graça em sair todas às noites para encher a cara ou simplesmente agarrar várias meninas”, descreve. O sexo e a alimentação são tão atrelados ao universo straight edge que algumas bandas só compõem músicas sobre o tema. É o caso do grupo argentino Las Palabras Quemam, que passou por Piracicaba há pouco tempo. Ao ser questionado se todos os componentes da banda são adeptos à corrente, o vocalista Ariel Pavletic é objetivo: “Sim, todos somos straight edges. Estamos totalmente comprometidos com esta opção de vida e queremos transmitir às pessoas este sentimento que nos mudou”, conta, ao destacar a proposta sonora que abraça as músicas do grupo. Ele ainda acrescenta: “É uma questão de lutar contra o sistema materialista e degradado, ressaltando valores que às vezes parecem perdidos, e tudo com respeito, sinceridade e honestidade”. 26

Fotos Maurício Santana

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


Straight edge, que surgiu em Washington (DC), na década de 1980, vai contra maior parte do comportamento dos jovens: nada de sexo casual, bebidas e carne

Outro grupo com proposta similar é a banda paulistana Live by the Fist. Porém, os membros da banda têm outra concepção sobre o emprego do termo. “O straight edge, na verdade, não chega a ser uma filosofia, ou um movimento, mas a melhor definição que eu concordo é de que seria uma idéia dentro do meio punk/hardcore”, explica o guitarrista Fábio Campos. Campos alerta que a idéia do straight edge não interfere no tipo de som produzido pela Live By The Fist. “Até porque o straight edge não é uma religião a ser pregada. Em algumas letras falamos sobre isso porque foi uma escolha que fizemos, então faz parte de nós e de nosso dia-a-dia, mas nunca temos a intenção de ‘converter’ ninguém ou dizer que o straight edge é a melhor opção”, finaliza o guitarrista. O termo - O straight edge surgiu em Washington (DC). Os membros da banda Teen Idles, todos com menos de 18 anos de idade, odiavam o fato de que não podiam frequentar a maioria dos shows punks por causa do consumo de álcool entre os jovens. E pior: eles nem mesmo queriam beber. Ao contrário da esmagadora maioria dos punks da época, os integrantes da banda não acreditavam que a atitude niilista e autodestrutiva associada ao consumo de álcool e drogas eram uma obrigação do movimento. Então, em torno da banda, toda uma onda de jovens punks foi se formando, e algo como um ‘mini-culto’ foi surgindo. Um dia, enquanto a banda produzia a capa de seu primeiro compacto, Minor Disturbance, o baterista Jeff Nelson pegou um esquadro e comparou a retitude e os ângulos do objeto com sua postura firme e ‘careta’ de viver. Esquadro em inglês é straight edge, que virou o apelido da turma de punks ‘caretas’. Pouco depois, no final de 1980, os Teen Idles acabaram, e dois integrantes, Jeff Nelson e Ian Mckaye formaram uma nova banda, o Minor Threat, banda seminal da cena hardcore.  PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

27


A vida por métodos não convencionais N

ascer, crescer, reproduzir e morrer. Esse é o caminho que quase todos estão fadados a trilhar. Entretanto, o sonho de constituir uma família nem sempre é tão simples quanto parece. No processo de desenvolvimento da sociedade, é muito comum as pessoas pensarem em construir uma estabilidade financeira por meio de uma carreira profissional sólida. Nessa correria, a fase de constituição de uma família fica em segundo plano. Assim, os casais preferem adiar a maternidade, o que pode trazer uma série de complicações futuras como a infertilidade. Enquanto a taxa de fertilidade de mulheres no Brasil é 2,18% em relação ao ranking mundial, o índice de infertilidade no mundo afeta cerca de 15% dos casais, o que representa a dimensão de que mais 70 milhões de pessoas são acometidas por este problema, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). Nos países em desenvolvimento conceber um filho é uma opção da pessoa, enquanto em outros continentes como África, onde a religião e o tradicionalismo são presentes na cultura popular, conceber uma criança torna-se um dever do individuo para com a sociedade. O fato do casal não conseguir tê-los é motivo de vergonha, especialmente para a mulher que corre o risco de ser abandonada por seu companheiro. Weiyuan Cui, consultor e repórter da OMS, realizou pesquisas com as mulheres africanas e concluiu que a falta de recursos financeiros e cuidados com a saúde, são as principais causas para a infertilidade. Considera-se infértil o casal que mantém relações sexuais por 12 meses sem qualquer método de prevenção. Se, após um ano, não ocorrer a gesta-

28

ção recomenda-se atendimento médico. A infertilidade pode ser ocasionada por diversos fatores, como o consumo de bebidas e drogas ilícitas, obesidade e magreza exagerada. Durante muito tempo a infertilidade sempre foi relacionada como um problema excepcionalmente das mulheres. Este estigma foi quebrado ao longo dos anos. Pesquisas recentes revelam que os homens também podem desenvolver problema de fertilização. Em mulheres a infertilidade é associada à endometriose e doenças sexualmente transmissíveis que podem ocasionar o câncer de colo do útero. No caso dos homens, estudos revelam que o stress é uma das principais causa da diminuição da produção de espermatozóides. O ginecologista e obstetra Paulo Padovani, que atua há 15 anos na área, explica que a incidência deste problema acomete 30% por fatores femininos e 30% masculinos, 30% podem ser de causas mistas e 10% por motivos desconhecidos, sem causa aparente. Segundo ele, de uma maneira geral 80% da população engravida sem qualquer ajuda médica. Dos 20% restantes, 7,5% somente conseguem a concepção por meio de procedimentos de alta complexidade. “Os tratamentos de reprodução assistida em ordem crescente de complexidades são coito programado, inseminação intra-uterina e o mais conhecido fertilização in vitro”, conclui. Hoje é possível dizer que a eficácia do tratamento depende de uma série de fatores e pode variar de acordo com cada caso. O médico explica que para “os resultados satisfatórios, tudo depende do tipo de tratamento proposto, fatores inerentes aos problemas de infertilidade do casal, como a idade da mulher.” Devido a eficácia do método variar, as clínicas costumam implantar mais de um óvulo para garantir que, pelo

Rafael Marcos

Débora Ferneda

debynha_ferneda@hotmail.com

70 milhões de pessoas enfrentam a infertilidade, um tratamento caro, mas hoje oferecido pelo SUS

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


menos, um destes materiais sejam fecundados. Porém, pode ocasionar a gravidez múltipla, como aconteceu com Jisele San Juan Bacchim, empresária do ramos de festas e eventos que engravidou de quíntuplos. Sua primeira tentativa foi em 2000 e não obtive sucesso. O mesmo processo foi realizado em 2002, com sucesso, quando o médico anunciou a gravidez de cinco. “Meu marido ficou super nervoso e não queria acreditar que fosse verdade. Eu fiquei feliz, querendo acreditar que o médico não estava enganado”, revela. Essa área da medicina está sempre em desenvolvimento, com novos procedimentos e técnicas para tratamento do casal que enfrenta a infertilidade. Atualmente, no país, existem cerca de 190 clínicas especializadas em reprodução humana, onde são realizados aproximadamente 15 mil ciclos de fertilização, o que resulta em torno de quatro mil nascimentos ao ano. Esse tratamento requer um investimento alto, o que afasta as pessoas do sonho da maternidade. “Eu sempre Casais saudáveis optam pela fertilização futura para ter os filhos em um momento adequado

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

torci para ter gêmeos, pois sabia que não iria realizar o tratamento novamente pelo alto custo”, revela Jisele, que comemora até hoje o fato de ter cinco filhos. “Tudo mudou. Foi uma virada de 180° graus, principalmente no financeiro com fraldas, leite e a mudança para uma casa maior”, relata. Hoje, Jisele conta com o apoio de três babas durante o dia e tiveram uma enfermeira por três meses, no período da noite. Os bebês nasceram prematuros de seis meses. “Precisavam de atenção redobrada”, conta Jisele. Hoje, Ana Helena, Milena, Ramon, Nicolas e Vitoria têm oito anos. Sem custo - Diversas clínicas e hospitais oferecem o tratamento contra a infertilidade por meio do Sistema único de saúde (SUS). A Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) fornece a casais o tratamento grátis, onde são atendidos cerca de 40 pacientes ao mês. Os interessados entram em contato por telefone, cadastram-se e assistem a uma palestra sobre o tema e depois iniciam o tratamento. A única despesa para o paciente refere-se aos medicamentos. “O SUS não arca com este tipo de custo”, explica Adisséia Almeida de Sá, assistente administrativo do setor de reprodução humana da Unifesp. Os exames para o tratamento clínico envolvem pelo menos quatro exames: espermograma, ultrassonografia - realizada na primeira fase do ciclo -, histerossalpingografia – RX contrastado do útero e das trompas, realizado na primeira fase do ciclo – e, por fim, a pesquisa de reserva ovariana, dosagens dos hormônios FSH, LH, prolactina, estradiol e TSH – realizados no terceiro dia do ciclo. O médico Paulo Padovani explica que os exames são necessários para detectar se há restrição ou risco que impede o casal de aderir ao tratamento. “A condição básica é ter pelo menos um óvulo e um espermatozóide. Se a paciente apresentar falência ovariana, óvulos de doadoras são oferecidos e, se for necessário, pode-se recorrer também à utilização de sêmen doado. A contra-indicação existe se na análise dos testes for detectado o risco de

doença genética. Nesses casos, aconselhamos o casal a não fazer”. Além de todos os recursos para os tratamentos oferecidos aos casais, é preciso que o paciente esteja apto para assegurar ao filho condições de um nascimento e desenvolvimento tranquilos. “Durante o período que estive em tratamento não fiz nenhum acompanhamento psicológico. Senti muita falta principalmente na clínica e nos dias de medicação, em torno de 19 dias. Muitas mães que conheci nesse período já vinham com uma ou várias tentativas frustradas, o que gera uma ansiedade e desconforto”, conta Jisele Bacchim. As técnicas de fertilidade geram, ainda, debates sobre questões éticas e religiosas, pela necessidade de se fazer várias coletas de materiais genéticos para estudo, muitos congelados para uso no futuro. O professor Rodrigo Batagello, assessor técnico da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa do Ministério da Saúde (Conep/MS) e professor da Unimep, avalia ser necessário destacar que a introdução das novas tecnologias na saúde provocam debate sobre os limites da vida humana. O destino dos embriões aparece no contexto das especulações e debates sobre o início da vida. “Para a biologia, no estágio pré-embrionário não existe ainda a vida propriamente dita, o que só acontecerá quando os primeiros traços no sistema nervoso começarem a se formar”, frisa o professor que é doutorando em bioética pelo PPG-Bioética da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília (UnB). “A compreensão religiosa da concepção desempenha um papel importante e influencia a opinião pública de modo determinante”, reforça. Em contrapartida, os casais que fazem o planejamento familiar e resolvem congelar materiais genéticos para fertilização futura não são criticados pela sociedade. “A técnica de fertilização in vitro e transferência de embrião (FIVETE ou FIV) não é apenas um recurso procurado apenas por quem tem problema de saúde, mas por casais saudáveis que querem esperar momento mais adequado para ter filhos”, afirma Batagello.  29


Uma vida de Cynthia da Rocha

cão

cynthia_darocha@yahoo.com.br

E

les foram abandonados. Filhotes, velhos, ou em situações adversas. Jogados em alguma rodovia à mercê da sua nova casa: a rua. Os vira-latas, como são chamados, sofrem por não terem pedigree e serem diferentes dos cães de raça. No Brasil, segundo dados do IBGE (2008), 20 milhões de cães são abandonados todos os anos. Para ajudá-los, a ONG “Vira-Lata Vira Vida”, fundada em 2009, surgiu quando voluntários se comoveram ao encontrar um abrigo de animais particular, tendo mais de 500 animais abandonados. A presidente da ONG Miriam Miranda, em conjunto com um grupo de simpatizantes, criou uma

ação coletiva de controle a doenças que atingia 90% dos animais, alguns após recuperados foram doados, mas a maioria permaneceu no abrigo. A partir daí os animais começaram a ser atendidos individualmente, ganharam identificação e prontuários. Atualmente, a entidade abriga 380 cães, dos quais 25 são especiais - idosos, os que têm sequela devido a acidentes, os deficientes visuais ou físicos. A “Vira Lata Vira Vida” organizou uma campanha de adoção paras esses cães. “Os cães especiais precisam de mais cuidados e atenção, então é mais difícil de serem adotados, por isso realizamos a campanha ‘Cães especiais, pessoas legais’para promover a adoção desses animais”, informou Miriam.

O cão Paçoca foi atropelado na rua e recolhido pelo guarda civil Thiago Trevisam. Ele procurou um veterinário na cidade para ajudá-lo. Porém, o profissional disse que não teria como mexer no cachorro. Pela amizade que Trevisan tinha com Miriam, presidente da ONG Vira Lata Vira Vida, entrou em contato com ela e o cão passou por uma avaliação e foi constatada a necessidade de uma cirurgia de urgência. Paçoca foi salvo, mas o acidente o deixou sem moVeludo foi atropelado e teve que passar por uma cirurgia,e ficou com uma perna mais curta que a outra

Vítimas de violência, cães abandonados são recolhidos por ONG que providencia adoção 30

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


Fotos Cynthia Rocha

Mesmo com deficiência, Vitória é uma cadela carinhosa e super ativa

Pingo foi recolhido das ruas cego dos dois olhos

vimentos na parte traseira do corpo. A ONG providenciou uma solução para que Paçoca pudesse se movimentar - uma cadeira de rodas especializada, que permitiu que ele pudesse voltar a andar. Depois de tudo, Trevisam, resolveu adotá-lo. A esteticista Aline Carla Netto adotou a vira-lata Mel há três anos. “Eu tinha a Kiara que acabou morrendo e isso me deixou muito mal. Quinze dias depois estava indo para casa da minha avó e encontrei um filhote de cachorro abandonada na rua, que lembrava muito a Kiara. Eu o trouxe para casa, foi amor à primeira vista”, contou. Mel é muito querida e já ganhou dois concursos na categoria ‘Cão enfeitado’. Aline conta que, no primeiro

Miriam e o cão Menino que recepciona todos que visitam a ONG PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

Zoin estava num lixão com um ferimento na cabeça

concurso, achou que Mel não ganharia, por ser uma vira-lata. “Só tinha cães de raça e eu achei que ela não ganharia, mas no final me surpreendi com o resultado”. Ela confessa preferir adotar cães do que comprar. “Não é pelo dinheiro. Quando se adota é mais pela identificação, pelo sentimento”, disse. A professora Carla Guidolim Moraes integra a Assopar (Associação Protetora dos Animais de Rio das Pedras) e au-

Após adoção, Mel ganhou dois concursos de cão enfeitado

xilia cães vira-latas abandonados, em estados de maus-tratos. Em sua casa possui sete cães, dos quais cinco são de ruas e três especiais - entre eles a vira-lata Vitória, que tem três das quatro patas. A cadela foi encontrada com problemas na pata, há dois anos, nos fundos de uma casa abandonada por onde permaneceu sob sol e chuva por dois anos. Recebia apenas água e comida. Vitória perdeu a pata devido a uma amputação necessária. Ela foi machucada quando seu ex-dono a amarrou numa caminhonete e a arrastou por um longo trajeto e sua pata foi quebrada em vários locais. Quando encontrada nos fundos da casa, ela já tinha comido uma parte da pata. A amputação foi necessária. Apesar da deficiência, Vitória é muito ativa, meiga e dócil. Carla conta que tentou doá-la por ser muito sapeca e acabar irritando os outros cães. “Tentei doá-la, ofereci para muita gente, mas ninguém a quis. As pessoas querem cães bonitos, procuram cães de raça, bibelôs, mas esquecem que são cachorros. Os cães com deficiência são os mais difíceis de serem adotados”, contou. Segundo a psicóloga de cães Carine Eleutério, os cães que moram nas ruas ou sofreram traumas costumam ser mais apegados aos donos e são mais carinhosos, mas isso não é uma regra geral. “Tem aqueles que sentem falta da liberdade que tinham na rua, uma vez que um apartamento, por exemplo, é um lugar mais restrito”, disse. Já Carla, acredita que só quem tem um cão que já foi abandonado consegue entender a relação que existe. “O carinho que o animal abandonado oferece, nenhum ser humano dá. As pessoas não vêem o lado do amor e do carinho que eles têm”, confessou. 31


Cobra Criada SERPENTÁRIO EM RIO CLARO VISA ATENDER NECESSIDADE AMBIENTAL E DESMISTIFICA MEDO MILENAR A ESSES RÉPTEIS

32

Janaina Moro

janaross1@hotmail.com

V

ocê já imaginou encontrar uma serpente pela frente? Para muitas pessoas a idéia não soa com ares agradáveis, mas existem também aquelas que admiram esses répteis e conseguem enxergar os benefícios que oferecem. Esse encontro acontece, normalmente, de forma inesperada e pode ser assustador. Mas há quem se programe só para ver, conhecer e observar as serpentes reunidas num serpentário, local onde são domesticadas. As instalações para as serpentes devem ser adequadas, em baias ou em aquários. O ambiente deve atender as necessidades do animal e garantir a segurança dos visitantes. E como pode ser interessante ter uma cobra em casa ou em um criadouro? A história do Diego Oliveira, engenheiro agrônomo, começou na faculdade, quando conheceu o serpentário de Botucatu e se interessou pelo assunto, ao ponto de desenvolver o tema no trabalho de conclusão do curso. Depois disso, decidiu implantar o próprio criadouro, mas com foco ecológico e visando a educação ambiental. “Entrei com o projeto no Ibama, órgão que autoriza a implantação, fiquei no processo de avaliação por cerca de um ano e meio, até ser aprovado”, diz o profissional que desenvolve o trabalho desde 2003. Segundo ele, a idéia é conscientizar as pessoas. “Uma serpente não vai te atacar se você não atacá-la”, explica. Isso porque a reação de muitas pessoas quando se deparam com o réptil é agredi-lo por medo e até matá-lo. O serpentário de Oliveira está localizado em Rio Claro, o único particular na região. Hoje, podem ser vistas cerca de dez serpentes, entre jibóia (não venenosa) e cascavel (venenosa), mas

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


Oliveira chegou a ter 600 serpentes, a maioria venenosa e todas provenientes de doação e que também foram doadas para outro serpentário, de Ribeirão Preto. O engenheiro destaca que para garantir a proveniência das serpentes todas são chipadas, uma exigência do Ibama para o controle desses animais, principalmente se algum conseguir fugir. A criação de serpentes visa atender uma necessidade ambiental e desmistificar o medo que permeiam as pessoas. Segundo especialistas, esses répteis têm suas importâncias para o meio ambiente e até para os seres humanos. Algo que para muitos é difícil de compreender, já que o medo fica em primeiro plano. “Todos os animais têm sua importância na cadeia ecológica e no equilíbrio ambiental. As serpentes em especial se alimentam de roedores, portanto controlam sua população. Sem elas, plantações poderiam ser devastadas”, diz Rui Seabra, pesquisador do Centro de Estudos de Venenos e Animais Peçonhentos (Cevap). Uma jibóia, por exemplo, pode comer cinco ratos cada vez, num intervalo de 15 dias. Além disso, as serpentes são alimento para muitos animais, entre eles as aves. O Cevap, tem sede no campus da Faculdade de Ciências Agronômicas da Unesp, em Botucatu, com dois prédios reservados para serpentários. “Nós utilizamos os venenos extraídos das serpentes para a pesquisa de biomateriais e sua utilização em medicina, além do soro antiofídico”, declara Seabra. Além desses locais especializados e preparados para criar serpentes, tem sempre quem se arrisca a ter uma serpente em casa. O cinegrafista Angelo Rossini se interessou em conhecer mais sobre esses animais desde criança e, quando adulto, assim que teve oportunidade não hesitou e adquiriu uma jibóia. “Não tinha medo, para mim era normal tê-la em casa”, diz. Rossini ainda afirma que a serpente era atração na rua

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

onde morava e todos tinham curiosidade em ver o animal de perto. Chegou até a leva-lá a escola para e expor em uma feira de ciência. A estudante Aline de Souza Silva chegou pela primeira vez próxima a uma serpente há cerca de três semana. Ela disse que achou a sensação de acariciar o réptil um tanto ‘estranha’. “Confesso que não tive medo”, afirma. Já a comerciante Caroline Strudiara Oliveira nunca visitou um serpentário e confessou que deseja conhecer. “Quando fiquei sabendo que existe esse lugar aqui em Rio Claro me interessei. Quero ir com minha família e levar minha filha de 10 anos para ver como funciona”, conta. O Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais) autoriza a visitação pública aos serpentários há apenas dois anos. Para que isso ocorra é obrigatório que as serpentes estejam devidamente inseridas nas baias ou em redomas. Nenhuma delas pode ser peçonhentas, ou seja, que contenham veneno. Tratamento

Fotos Janaina Moro

A alimentação de uma Jibóia, por exemplo, é de cinco ratos vivos a cada 15 dias com água constante. O ambiente com temperaturas altas é o preferido por esses répteis. Trocam de pele até quatro vezes por ano, processo que leva até 15 dias. Nesse período elas não comem e desenvolvem o tamanho: ficam maiores. Os serpentários particulares trabalham na extração e venda do veneno para a produção de vacinas. O localizado na cidade Rio Claro já realizou esse processo, mas hoje trabalha apenas na educação ambiental.

Diego Oliveira: “Uma serpente não vai te atacar, se você não atacá-la”

33


Girassol semente que vale para tudo Karla Gigo

kmorato@hotmail.com

S

e existe uma planta da qual tudo se aproveita, o girassol está bem próximo dela: 95% da planta é aproveitável, mas segundo o professor da área de plantas oleaginosas da Esalq-USP, Gil Miguel de Souza Câmara, “por não ser uma planta tóxica, o girassol pode ser totalmente aproveitado. Basta saber usá-lo”. Há várias espécies de girassóis, porém a Helianthus Annuus é a única espécie cultivada no Brasil. O desenvolvimento da cultura de girassol esta focado na agroindústria moageira, onde é extraído o óleo. Conforme seu material genético, e por ser híbrido, a variação em termo desse óleo pode chegar a 45%. Na escala do agronegócio de girassol, as maiores lavouras são feitas para a produção de grãos, transportados para uma indústria moageira que fará a extração de óleo das sementes. Há um nicho de mercado na linha nutracêutica, que utiliza produtos de origem vegetal, os chamados alimentos funcionais, que além do valor nutri-

34

cional é terapêutico. “Hoje temos uma linha de melhoramento genético do girassol surgindo no mercado, chamado de auto leico, mais ricos em ácido graxo leico, menos insaturado e mais saudável na linha de qualidade de óleo e de vida. O melhoramento surgiu nos Estados Unidos, “onde um material de girassol se apresentou muito rico nesse ácido, foi melhorado e a partir dele foi tirado linhagens e híbridos”, aponta Souza Câmara. Essa tecnologia, novidade no Brasil, é usada em indústrias brasileiras obtentoras da genética de girassol. “Tais indústrias estão estimulando alguns produtores a fazerem lavouras específicas para extrair esse óleo mais rico em ácido leico”, explica o pesquisador. Pequenos produtores ou produtores de agricultura familiar extraem o óleo de girassol através da prensagem a frio; em pequenas prensas manuais ou mecânicas, colocam-se as sementes de girassol e se extrai a frio o óleo por prensagem de grão recém colhido, sem

a adição de produtos químicos, resultando no óleo virgem de girassol. “O óleo virgem é muito rico em qualidades organolépticas e medicinais, podendo ser embasado em embalagens de 400 ml ou 500 ml e podem ser distribuídos para nicho de mercado farmacêutico ou nutricional”, completa. E se o produtor for apicultor pode associar as duas culturas: quando os girassóis florescem pode-se colocar uma

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


Capítulo em fase final (que não gira) com flor e com as abelhas polinizadoras

la ar

go

Gi

K

caixa de abelhas Apis mellifera - abelha européia, conhecida como abelha real, alemã, comum ou negra -, na lavoura para estimular a produção de mel. E junto com a produção de girassol pode-se tirar de 20kg a 30kg de mel por hectare. “Se colocarmos a R$10 o quilo de mel, teremos de R$200 a R$300 de receita adicional”, calcula o professor. Para produzir os grãos a flor de girassol tem que ser

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

fecundada pelo pólen. Este é pesado, o que dificulta a disseminação pelo vento, para isso as abelhas são essenciais na produção de girassol. “Os insetos são os agente polinizador do girassol e as mais eficientes são as abelhas do mel. Por isso as flores são visitadas por elas, pois são fundamentais para a produção”, relata Souza Câmara. Outro nicho da cultura de girassol é o da agricultura orgânica e pode ser cultivado para utilização da planta inteira na produção de silagem para o gado, podendo substituir a silagem de milho que é a mais comum. A silagem é o processamento de uma lavoura e das plantas que estão no campo, tudo é picado em pequenas partículas que são levadas a um armazém de chão horizontal, chamado silo, onde se compacta essa massa picada para que fermente. Segundo o pesquisador da Esalq-USP, a silagem é usada durante o inverno ou em épocas de seca ou frio e o pasto não esta volumoso para o gado. A silagem de girassol é rica em energia, carboidratos e contém um pouco de proteína. “É de costume fazer isso com milho, mas hoje as folhas de girassol que são destinadas para isso”, conta o professor. A haste do girassol contém uma fibra vegetal que, ao ser processada vira uma espécie de isopor vegetal. Essa fibra de girassol tem efeito de isolante térmico e acústico principalmente. As sementes de girassol englobam outro nicho de mercado: além dos benefícios para a saúde, as sementes fazem parte da alimentação de algumas aves. Segundo Luciana de Novais Rocha Menezes, comerciante de uma loja de ração para animais no Mercado Municipal de Piracicaba, são vendidos 44 kg de sementes de girassol por mês.

“Nós vendemos os dois tipos de sementes: o grão graúdo, que custa R$5 kg e o miúdo que sai a R$2.80 kg. O graúdo é para a alimentação de aves de porte grande como papagaios e araras; já o grão miúdo é para aves menores, como a calopsytas, periquitos, agapornis e até para hamsters”, explica. O veterinário, Elienai Luis de Souza faz um alerta ao uso excessivo das sementes de girassol na alimentação de aves: “o correto é alimentar a ave com as rações especializadas para cada espécie, mas é indicado dar apenas uma colher de sopa, duas vezes por semana. Por ser oleaginosa é muito calórica, e seu uso excessivo pode desencadear problemas hepáticos nas aves”. Luiza Rosolen, também comerciante de uma banca de ervas e sementes no Mercado Municipal de Piracicaba, conta que a procura pelas sementes de girassol é grande. “Nós vendemos de 10 kg a 15 kg de sementes por mês, e temos pacotes de 200g que custam R$3,60 e R$18 o quilo. Geralmente os clientes vêm por indicação médica, com o intuito de baixar o colesterol”, explica. Combustível – O professor Gil Miguel de Souza Câmara explica também que, com o advento do biodiesel, pode-se fazer um (produto/biodiesel) de qualidade com óleo de girassol. O País investiu de longa data em algumas culturas de exportação para captar divisas. O resultado tem sacarose de cana, açúcar, etanol, óleo de soja, farelo de soja, café e suco de laranja. ”Com o crescimento na produção da soja, por ser produto fácil de produzir e processar, toda a indústria moageira de soja cresceu junto com a cultura do brasileiro, assim, a população a partir dos anos 60, 70, com a ajuda do marketing, aprendeu a consumir seus óleos e derivados. Por isso, hoje, a soja é a maior cultura oleaginosa do País, com um total de 24 milhões de hectares”, ressalta Câmara. A segunda maior cultura oleaginosa em área é da mamona, que tem 180 mil

35


hectares. A terceira é do amendoim que tem entre 100 a 110 mil hectares e a quarta maior cultura é a do girassol, que oscila entre 60 a 80 mil conforme o ano. Para que o Brasil se torne autosuficiente no abastecimento de óleo de girassol precisariam ser cultivados 700 mil hectares, número dez vezes maior que a área atual. Como não consegue produzir o suficiente para abastecer sua população, importa cerca de 70% de seu consumo da Argentina. “Com o desenvolvimento da soja não teve paralelamente um forte desenvolvimento de mercado consumidor e moageiro de girassol. Por isso, para que um produtor de girassol comece a cultura, o primeiro passo é saber se perto dele, no máximo 200 km de distância, há alguma indústria que queira ou possa processar esse girassol. Se não houver, não vale a pena produzir, pois não há segurança no retorno para a produção: se a indústria não comprar, não se planta e também não estimula alguém a produzir sementes. “Isso dificulta o melhoramento genético, que por conseqüência dificulta a produção de uma massa crítica de técnicos que conheçam a cultura do girassol e inicia um circulo vicioso”, avalia o professor.

Professor da área de plantas oleaginosas da EsalqUSP, Gil Miguel de Souza Câmara

36

Hoje há programas associados à Petrobrás estimulando a cultura de girassol no Nordeste e preocupada em treinar técnicos para conhecer a cultura, pois há um conjunto de fatores que dificultam a expansão do mercado de óleo de girassol. “O girassol é uma planta fantástica para se associar à outras culturas no sistema de produção, a rotação da cultura tem uma ampla produção primária, pode-se fazer lavouras de verão, inverno, safrinha e outono. Mas é mais cultivado em fevereiro”, conclui. Curiosidades – O óleo de girassol tem alto nível de qualidade nutricional, razão pela qual é mais caro que o óleo de soja. Segundo Gil Câmara, foi o melhoramento genético que adaptou a soja ao Brasil, pois a soja veio da China. O girassol é do hemisfério norte: Estados Unidos, Europa Leste, Ucrânia, Rússia e Argentina, países com clima temperado e solo fértil. O Brasil, com clima tropical e solo pobre, teve que fazer manejo agronômico, melhoramento na tecnologia de produção e adubação. “A espécie de girassol cultivada tem uma forte herança genética do tipo de ambiente que descende. Por isso, foi preciso adaptar o girassol às condições tropicais do Brasil”, conta o pesquisador da Esalq-USP. O programa de melhoramento genético do Instituto Agronômico de Campinas (IAC) e da Embrapa Soja lançou em 2010 três novas variedades de girassol para ser cultivado no Brasil. O próximo passo é estimular o mercado consumidor de indústrias moageiras para motivar os produtores. O manejo médio é de girassol de safrinha ou de segunda safra, que tem um custo de R$600 por hectare e dará uma produtividade de 2.500 kg por hectare. Se for semeado em outubro/novembro e for colhido em janeiro/fevereiro - o que é arriscado por causa da quantidade de chuva, que pode acarretar doenças -, pode resultar em uma produtividade de 4 mil kg em potencial. 

Por que esse n Sunflower (flor do sol), em inglês, e girassol em português e espanhol. A flor leva esse nome por causa do movimento que faz ao girar o capítulo antes dele se formar. Durante seu crescimento vegetativo inicial, cresce em altura e suas folhas tem função de interceptar a luz do sol para a produção de fotossíntese. Para isso, o girassol conta com um mecanismo hormonal, em que essas flores compensam o aparente movimento do sol (uma vez que quem gira é a terra e não o sol). Por isso, ao observar uma lavoura de girassóis ou mesmo um vaso, percebe-se que, na manhã, o girassol está virado para o nascer do sol; ao meio dia, seu capítulo está virado para o sol e, ao entardecer, virado ou semi virado para o poente. O aspecto de giro deu nome para a planta, que para de girar após desenvolver os frutos (sementes) por ficar pesada.

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


Fotos Karla Gigo

Mitos e verdades sobre o valor nutricional

ome?

Capitulo sem flores, mostrando as sementes (frutos)

Cada capítulo pode conter, de acordo com seu diâmetro, de dois mil a sete mil grãos por girassol. A massa do capítulo sem grão é rica em carboidrato, que é energético, e pode ser dado ao gado para comer. O girassol é uma planta anual e seu tempo de vida médio é de 90 dias. O tamanho ideal para girassóis de lavoura é de 2,40m, considerado alto. Há girassóis que em solo fértil e, conforme o espaçamento no plantio, podem chegar a 4m de altura. L O girassol anão mede de 50 cm a 70 cm de altura, um tipo raro de se encontrar. A massa desengordurada que sobra dos grãos depois da extração do óleo tem grande concentração de proteína, que pode ser destinada às fábricas de ração e vira farelo de girassol, entrando no lugar do farelo de soja.

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

A nutricionista Rosemeire Sacamoto explica que as sementes de girassol contêm até 25% de proteínas, são equilibrada quanto à sua composição em aminoácidos - unidades estruturais das proteínas que são polímeros de aminoácidos – e ricas em isoleucina e triptofano (aminoácidos essenciais). “Em comparação ao milho e a soja, as sementes de girassol têm boa quantidade de metionina e de cisteína”, relata. Segundo ela, entre todos os óleos vegetais, o de o girassol contém a maior proporção de alfa-tocoferol, a forma mais ativa da vitamina E. A semente contêm ferro, cálcio, fósforo, sódio e potássio, vitaminas B (tiamina, riboflavina e niacina), beta-caroteno, precursor da vitamina A e da vitamina E, os tocoferóis.

As pétalas da flor de girassol possuem dois dos aminoácidos mais presentes nas substâncias alimentícias: a valina e a isoleucina. Em razão disso, explica Rosemeire, “é um excelente alimento para o meio da tarde, por conter triptofano - percursos da serotonina -, hormônio ligado a vontade de comer doce”. Por conter estes minerais e vitaminas, auxilia na formação do esqueleto e combate a osteoporose; favorece as funções do sistema nervoso e do cérebro; previne arteriosclerose e afecções cardíacas; protege a pele contra o envelhecimento e fortalece unhas e cabelo. A nutricionista alerta que o excesso no consumo não resulta em problemas hepáticos. “Para nós humanos o excesso tornará o organismo mais sensível, podendo levar a uma intolerância ou até mesmo desencadear um processo alérgico”, explica. Mas por outro lado, aconselha a consumir de duas a três colheres de sopa de sementes por dia. “O consumo controlado ajuda na redução do mau colesterol (LDL), por conter óleo linoléico conjugado, em sua composição”, ensina. Na cozinha, a nutricionista alerta para controlar a quantidade de óleo na alimentação, podendo usar como medida até uma colher de café por preparação.

Girassol para consumo humano - a granel

37


Lar

38

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


ranja Daniele Zanin

danielezanin@ig.com.br

Fotos Acervo CitrusBr

S

A fruta mais plantada no Brasil, sendo 98% da produção exportada

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

uco concentrado, natural, óleos, ração e até etanol, este são os produtos originários da laranja que atualmente ocupa no Brasil cerca de 800 mil hectares e 165 milhões de árvores, a mais plantada do país. Seu suco é mais consumido entre as bebidas de frutas prontas, segundo dados da Associação Nacional dos exportadores de Sucos Cítricos (CitrusBR). Diante deste mercado produtor, o professor Marcos Fava Neves, coordenador da CitrusBR, faz uma analogia entre as demais plantações no país. “Os pomares de laranja ocupam uma área 20 vezes maior do que os pomares de maçã, 10 vezes superior aos de manga e às plantações de uva e quase o dobro das terras destinadas ao cultivo de laranja”, destaca. Em todos os estados brasileiros a fruta se faz presente, com uma maior ocupação no Estado de São Paulo: são 400 municípios que se dedicam ao cultivo da laranja com 70% de área plantada. O motivo desta expansão deve-se ao clima privilegiado, com distribuição das chuvas ao longo do ano. Para o agricultor Nelson Batista, houve uma modernização dos pomares e dos incrementos utilizados que facilitaram a produção. “As mudas atuais são de melhor qualidade e cultivadas com viveiros telados, há variedades para cada clima e solo”, aponta. Dentro deste cultivo, o comércio in natura aumenta gradativamente entre os consumidores brasileiros. “Mais de 100 milhões de caixas de laranja (40,8 Kg), equivalente a aproximadamente 30% da produção nacional, são consumidas pela população, que tem à sua disposição uma fruta nutritiva e saudável a um preço competitivo, o sonho de milhares de pessoas ao redor do mundo”, frisa Fava Neves. O Brasil é responsável por mais da metade da produção mundial de suco de laranja e exporta 98% da sua produção. Marcos Fava Neves destaca esta importância para o país. “A força do suco de laranja brasileiro no comércio internacional é motivo de orgulho e tem sabor e respeito único para o Brasil no mundo. Três em cada cinco copos de suco de laranja consumidos são brasileiros”, frisa.  39


Cenário econômico - Segundo dados da CitrusBR, na última safra os produtores da fruta faturaram em média US$ 1,9 bilhão. Para o país, a citricultura rendeu quase R$111 bilhões em exportação. Em 2009, foram exportados US$ 241 milhões em óleos essenciais, d’limoneno, terpenos e farelo de polpa cítrica. Enquanto os valores dos sucos concentrado e natural foram respectivamente US$ 337 e US$ 1.153 por tonelada. A Europa e Estados Unidos se destacam como principal consumidor e absorvem 90% do suco brasileiro. Outro fator que proporciona benefícios à divisa brasileira é a geração de empregos diretos e indiretos, totalizando cerca de 230 mil trabalhadores envolvidos na citricultura. Segundo a Relação Anual de Informações Sociais do Ministério do Trabalho, “os trabalhadores que estão nas fábricas de suco de laranja e possuem escolaridade maior do que os trabalhadores do campo são mais bem remunerados e recebem em média R$1.445,00 contra R$680,00 dos que se dedicam ao cultivo”. Pragas e doenças - Quatro doenças foram responsáveis pela erradicação de 39 milhões de árvores no estado de São Paulo e na região do Triângulo Mineiro na última década, segundo a associação dos citricultores. Destaca-se entre elas, o Cancro Cítrico, Mudas são cultivadas em viveiros

doença bacteriana que causa queda das folhas e dos frutos; a CVC (clorose variegada dos citros), caracterizada por afetar o tamanho das frutas; Morte Súbita capaz de matar a árvore em 12 meses e o Greening, a mais recente e preocupante entre os agricultores pela velocidade em se alastrar entre as plantações. O engenheiro de processo Ricardo Gramolini destaca a importância de evitar contaminações. “Existem barreiras naturais plantadas com árvores específicas ao redor das plantações, formando ‘quebra ventos’ que evita a contaminação”, esclarece.

Durante o procesamento, (acima e ao lado) o suco da laranja é avaliado pela quantidade de açúcar

Subprodutos - Depois da colheita, a laranja chega até as fábricas pelos grupos de fornecedores, é descarregada e armazenada em silos. Durante o armazenamento, uma amostra de cada caminhão é analisada avaliando a quantidade de açúcar presente na fruta, doçura e percentual de suco. Um sistema automatizado faz um controle sobre as laranjas correspondentes à sua característica. De acordo com estas propriedades, a fruta segue para o processamento. Ao passar pela extratora, dois produtos são obtidos: suco e polpa. Segundo o engenheiro de processo da fábrica de suco Ricardo Gramolini, “durante o processo de moagem as bolsas de óleo, que estão na casca da laranja, se rompem e originam o óleo essencial”. A emulsão capturada pelo rompimento das bolsas é encaminhada para um processo de filtração e concentração, separando o óleo da água. 40

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


Fotos Acervo CitrusBr

Essa água, por sua vez, é caracterizada como água amarela e reutilizada na obtenção de álcool combustível. Por ser procedente de um componente alimentício possuem valores diferentes do combustível comum. “No Brasil, a única empresa que mantém uma destilaria a partir do bagaço da laranja é a Citrosuco”, explica o engenheiro. Daniela Kharfan, pesquisadora em desenvolvimento de máquinas para o setor citrícola, aponta a necessidade em desenvolver equipamentos que maximizam a obtenção do produto. “O processamento de citros é focado na busca das melhores condições de extração do suco, visando a excelência no binômio rendimento e qualidade. Tem como objetivo a obtenção de maior volume de produtos e subprodutos, mas sempre atendendo aos parâmetros de qualidade exigidos pelo mercado, gerando cada vez mais valor agregado”, aponta.

O FCOJ, suco concentrado e congelado de laranja, passa por um processo de evaporação e concentração. Uma série de aromas e essências são capturados por um sistema de vácuo e dois produtos são alcançados nesta etapa: fase aquosa e fase oleosa, caracterizadas com grau alimentício, farmacêutico e cosmético. O gerente da unidade de negócios, aromas, emulsões, corantes e ingredientes saudáveis Alfredo Almeida descreve a utilização do óleo da laranja. “Na indústria de alimentos, o óleo de laranja e suas frações são utilizados para reconstituir o sabor do suco, ou na composição de aromas ou produto como balas, gelatinas, goma de mascar, bolos, sorvetes, refrigerantes, entre outros”. Atualmente, a cadeia produtiva da laranja é 100% utilizada. É contínua a busca pelo desenvolvimento de novas aplicações também em indústrias que vão além do setor de alimentos. Segundo ele, pode-se citar tensoativos, detergentes e eletrônicos. “Isto tudo devido às características físico-químicas do óleo essencial de laranja e seus subprodutos”, frisa. Entre as etapas do processamento é alcançado o NFC, suco natural, pronto para beber, que simplesmente é filtrado e pasteurizado. Distribuídos internacionalmente em sistemas integrados a granel com caminhões tanques, terminais portuários e navios que levam ao consumidor europeu, asiático e norte-americano. Muito procurada pelos consumidores, os frutos com polpa sugerem a idéia de ‘natural’. A polpa em si é um produto pasteurizado e enviado em um sistema que fará a remoção dos defeitos, entre eles, larvas e pedaçinhos de casca. Depois de resfriado são colocados em tambores, seguindo para a produção do suco. 

400 municípios paulistas plantam laranja em 800 mil hectares, um total de 165 milhões de árvores

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

41


Mariane Ferreira

mariane__mf@hotmail.com

A

palavra moda vem do latim modus, significa modo, maneira. É um sistema que acompanha o vestuário e o tempo, integra o simples uso das roupas no dia a dia. Moda é sinônimo de luxo, beleza, glamour, requinte e sofisticação, mas não se restringe apenas a indumentária, calçados e bolsas; moda significa desejo e as pessoas fazem de tudo para comprarem o que está moda e estar na moda. Para definir o que é tendência basta olhar para as passarelas dos pólos da moda como Milão, Paris e Nova York. O que eles mostram são visto depois pelas ruas do mundo todo e servem de inspiração para os fast fashions, blogueiros e amantes do bom gosto, numa mistura simples de roupas do dia a dia com o contexto social, político e sociológico. A moda acompanha o tempo, é a realidade e evolução, como explica a estilista Elizía Gottardo. “Cada época é marcada por uma evolução. Os anos 60 era mais jovem, as meninas eram mais quentes com a chegada da mini saia, as silhuetas juvenis, cores pastel e o famoso tubinho”, lembra. Os anos 70 foram marcados pela individualidade e surgiu o momento

fina estamp Estilo e conforto devem reger visual moderno

42

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


Aqui a renda e a transparência são o carro chefe. Durante o inverno e também durante o verão, a renda será o referencial. Ela pode ser usada por cima de algum tecido, ou para cobrir as costas, as pernas ou braços. Look mais indicado para festas e para a noite

pa PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

hippie, que fez decolar o flower power, duas tendência fortíssimas junto com a era disco (discotecas). Trouxe o lurex, a boca-de-sino e as plataformas, o glam rock, com David Bowie, e o fiel punk, com roupas rasgadas, alfinetes, muito preto, jaqueta de couro, coturnos e o corte moikano. A marca nos anos 80 era o volume, com as ombreiras, os tailleurs, a maquiagem marcante e muita aeróbica, seguida cegamente por homens e mulheres, para modelar o corpo. Outro ponto forte da década foi a multiplicidade das tribos urbanas como os punks, góticos, skinheads, new wavers e rappers do hip hop americano. Foi a tecnologia dos tecidos que ajudou na evolução dos estilos. Depois, na década de 90, com os costumes diferenciados e menos extravagantes, a aposta foi no minimalismo com a simplicidade e as formas retas, tirando a sensualidade feminina. O grunge imperou na década, revelando-se também na musica e acentuando a individualidade com a camiseta velha e calça jeans. Teve ainda o clubber confuso e, no final da década, liderou o luxo e a riqueza de Prada, com sua elegância, Gucci, numa representação de sexo e poder, Channel, em seu jeito clássico, e Versace, com a sensualidade. Nos dias de hoje, a moda é uma mistura de todas as décadas do século 20 com a atual, ombreiras com renda e cortes retos, ao mesmo tempo sensual, com mistura de cores fortes e opacas (dependendo da estação). Elizía Gottardo salienta existir uma releitura de estilos e modelos, ponto forte que se encontra com o criativo, o individual e a vanguarda, num estilo livre e seguro. “A palavra chave para entender a moda do século 21 é o conforto, modernidade, durabilidade, aparência, luxo e economia”, frisa. A estilista parisiense Coco Chanel já disse que a moda não tem limite nem limitações, é independente; não existe regras, basta se sentir bem e confortável. As roupas que aparecem nos desfiles, muitas vezes, surpreende pela ousadia, requinte e diversidade. O estranho, difícil de ser usado para sair com as amigas e para trabalhar, transforma-se numa tendência. A estilista Talita Berribilli explica que a maioria das roupas de passarela são conceituais. Nas lojas das marcas que desfilam no SPFW não são encontradas as peças dos desfiles. “O que se encontra são roupas que foram adaptadas para o mundo real, baseadas nas peças apresentadas nos desfiles”. Quem consome e usa as roupas de passarela são pessoas do meio artístico, como cantoras, atrizes. “Pessoas comuns, como nós, aproveitam as dicas das passarelas para estar na moda”, explica . Confira alguns looks e saiba como estar na moda: 43


Tecido metalizado e estampado não é uma opção para um look fora da passarela. A estampa pode ficar, mas o tecido tem que mudar. A opção é um tecido de fibra natural ou de cetim

O collant é a peça chave desse look. Nesse caso, é usado para complementar a peça. A idéia é uma calça preta, para haver um equilíbrio. A cor escolhida, além de deixar o look sofisticado, dá ar de leveza

44

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011


Volume nos ombros e sapato pesado num look black total. Para uma pessoa comum, que tem uma vida corrida, talvez não funcione. Então a idéia é substituir o sapato pesado por uma sapatilha básica e penteados mais leves. Assim, ficará pronta para ir em uma festa ou em uma reunião de negócios

É um look comercial, pois essa é a proposta da marca. Para um homem que não é tão ligado na moda, o ideal seria optar por uma jaqueta de couro preta mais tradicional, uma T-shirt comprida com a gola mais próxima ao pescoço e um cinto escuro

O xadrez pode aparecer tanto para os homens quanto para as mulheres. Além de ser uma forte tendência para o inverno, o xadrez continuará durante todo o verão, assim como as flores e a renda. O xadrez pode aparecer em uma camisa, saia, blusinha e até mesmo em um corpete

Fotos da produção: Mariane Ferreira - Modelo: Caroline Castro Produção de moda: Marcela Medule - Roupas: Loja Marcela Mattos. Fotos da Passarela: Fernanda Calfat

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011

45


artigo

FGTS para as mensalidades universitárias Aloysio Nunes *

O

Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), graças à crescente formalização das relações de emprego, atingiu montante tão elevado que pode suportar um número maior de benefícios dirigidos aos seus verdadeiros proprietários, os trabalhadores, sem comprometer sua solidez. O último balanço disponibilizado no site do Ministério do Trabalho, exercício de 2009, mostra que os ativos brutos do Fundo bateram na casa dos R$ 350 bilhões, sem descontar os saques, as aplicações, e empréstimos a trabalhadores, Prefeituras, Estados, Cooperativas Habitacionais, além das aplicações na Bolsa de Valores. Por este motivo, apresentei um projeto no Senado Federal para que seus recursos também possam, além dos 17 serviços e programas que hoje financiam, ser sacado para bancar os estudos universitários e técnicos profissionalizantes de trabalhadores de baixa renda. Hoje temos o ProUni, que é um bom programa. Entretanto, em que pese os benefícios ao estudante brasileiro, é de difícil acesso dado o emaranhado burocrático a que submete os interessados. Para começar, exige fiador. Milhares de brasileiros ficam à margem do programa por não conseguir um fiador dentro dos padrões exigidos pela Caixa Econômica Federal. Segundo estudantes, após o curso concluído, não conseguem emprego e deixam de pagar as mensalidades, negativando nos órgãos de proteção ao crédito, os formandos e seus fiadores, provocando aborrecimentos e transtornos sem conta. Com o financiamento através de saques do FGTS esses problemas desaparecem e evitam que milhares de estudantes se formem sem o peso de dívidas a serem pagas ao longo de anos. O FGTS nasceu em 1966 quando o país vivia uma turbulência política. Havia uma contestação generalizada do regime nascido em 1964, que implantou uma ditadura militar, que perdurou por longos 21 anos. Não se sabe ao certo o que motivou os militares a criarem o FGTS justamente em setembro de 1966. Mas esse Fundo acabou, ao longo dos anos, se transformando num grande patrimônio dos trabalhadores e a única garantia que eles têm, ao final de décadas de

46

serviços prestados, a uma indenização compatível com a atividade que prestaram. Ao longo dos anos o FGTS se transformou numa das maiores poupanças, com capacidade de investimento e de independência incalculável frente ao poder econômico de grandes grupos privados e de outros fundos, como os de pensão, que hoje, ao lado do FGTS, são importantes fontes de investimentos em nossa infraestrutura. Ao longo dos 45 anos de sua criação, o FGTS passou a financiar trabalhadores de baixa renda em 17 modalidades. Uma delas, hoje talvez a mais importante, é o financiamento do sistema habitacional para aqueles que ganham de zero a cinco salários mínimos. O seu crescimento é que possibilita a diversificação de serviços que dele pode advir. Sua configuração atual permite que 84% de seus recursos sejam destinados à compra de moradias para pessoas de baixa renda, para moradores de cidades acima de 250 mil habitantes, para Cooperativas Habitacionais ou empresas privadas que atendam aos mesmos requisitos das Cooperativas, além de bancar infraestrutura urbana a Estados e Prefeituras Municipais, ou a pessoas atingidas por catástrofes naturais tais como enchentes ou sinistros. Mesmo assim, o ativo líquido do Fundo permite vultuosas aplicações financeiras em Bolsas de Valores. A aprovação do meu projeto, frente ao compromisso assumido por mim na campanha para o Senado, não causará qualquer abalo perceptível nos ativos do FGTS. Os 33 milhões de trabalhadores instalados em quase 3 milhões de empresas brasileiras recolhem 8% do que recebem mensalmente ao caixa do Fundo. Seus recursos desde 2007 podem ser investidos na Bolsa de Valores em Fundos de Investimentos Imobiliários (FII) e Fundos de Investimentos em Direitos Creditórios (FIDC), debêntures e Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) que possuam lastro em operações habitacionais. Se o trabalhador pode, hoje, sacar de sua conta no Fundo para aplicar em ações da Petrobras, com mais razão ainda, poderá sacá-lo para investir nele mesmo, em sua formação universitária ou técnico profissional, e nos levar a um país mais igual através de salários que possam mudar nossa qualidade de vida e levar o Brasil a transpor sua condição de periferia do mundo desenvolvido. *Aloysio Nunes Ferreira Filho é senador da República pelo PSDB

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Agosto/2011




Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.