Revista Coito Cerebral #3

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ANO 1 | N.º 3 | MAIO DE 2008 http://revistacoitocerebral.blogspot.com

Há exatos 108 anos, Frank L. Baum lançou o primeiro livro de uma série que se tornaria famosa no mundo inteiro. O Mágico de Oz, adaptado para cinema e teatro, contém muito mais do que aspectos clássicos da literatura infantil daquele período, pois revela-se, segundo estudiosos, uma parábola ao Partido Populista, movimento que marcou a economia dos Estados Unidos no fim do século XIX


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ano 1 | n.º 2 | abril de 2008

ANO 1 | N.º 3 | MAIO DE 2008 http://revistacoitocerebral.blogspot.com

Lisa Li-Lund O folk pop da francesa cantado em inglês Enfim, CéU em Porto Alegre Coluna de uma nota só Mallu Magalhães Vida de Mentira Rejane, a secretária que queria ser homem

no universo da maternidade, literatura infantil e projetos para o cinema

Björk sucesso comercial e originalidade claudia tajes: o lado b da vida o homem-máquina: dos nervos ao circuito eletrônico Filme: o amor nos tempos do cólera Otto gomes na estréia da coluna de uma nota só Vida de mentira: dois novos textos de ficção

Ricardo Rodrigues ricardopublicitario@hotmail.com

César Luciano Reginato lureginato@gmail.com

COITO CEREBRAL É UMA REVISTA EXPERIMENTAL COM PUBLICAÇÃO ON-LINE SEM FINS LUCRATIVOS.

ANO 1 | N.º 3 | MAIO DE 2008 http://revistacoitocerebral.blogspot.com

Capa: Ricardo Rodrigues Estados Unidos de

Há exatos 108 anos, Frank L. Baum lançou o primeiro livro de uma série que se tornaria famosa no mundo inteiro. O Mágico de Oz, adaptado para cinema e teatro, contém muito mais do que aspectos clássicos da literatura infantil daquele período, pois revela-se, segundo estudiosos, uma parábola ao Partido Populista, movimento que marcou a economia dos Estados Unidos no fim do século XIX

Dorothy Gale e o cachorro Totó coloridos com as cores da bandeira dos Estados Unidos, para o artigo ESTADOS UNIDOS DE OZ

Estados Unidos de

Há exatos 108 anos, Frank L. Baum lançou o primeiro livro de uma série que se tornaria famosa no mundo inteiro. O Mágico de Oz, adaptado para cinema e teatro, contém muito mais do que aspectos clássicos da literatura infantil daquele período, pois revela-se, segundo estudiosos, uma parábola ao Partido Populista, movimento que marcou a economia dos Estados Unidos no fim do século XIX


Editorial Quem somos nós

Estados Unidos de Oz

O marketing madonnico

A política econômica norte-americana no fim do século XIX descrita, curiosamente, nas entrelinhas de uma das mais clássicas histórias infantis de todos os tempos

Música / da série Cantoras Britânicas

Vida de Mentira: Rejane, a secretária que queria ser homem pt. 2

Livro O Silêncio dos Amantes

Filme Blindness

Vida de Mentira: Par de desejo

Saída A arquitetura do amor em poesia


As minhas memórias de infância são freqüentemente ativadas por elementos que passariam desapercebidos para muitas pessoas. Um perfume, um timbre de voz, uma sobremesa com gosto de festa escolar, uma criança brincando na rua, um rosto, uma música. Mas de tudo, o que mais me transporta para dias tão distantes é um filme chamado O mágico de Oz. Lançado em 1939, essa fábula sobre amizade e coragem marcou gerações e mais gerações de crianças que se identificavam com algum daqueles personagens tão cheios de humanidade e, ao mesmo tempo, realismo mágico. Talvez aí esteja a graça. Mas o que também chama a atenção, hoje, é um estudo que aponta características pouco infantis inseridas nas entrelinhas do livro que inspirou a adaptação cinematográfica. Para muitos estudiosos, a história de Dorothy e seus amigos é uma parábola ao Partido Populista, às eleições presidenciais de 1896 e ao panorama econômico dos Estados Unidos no final do século XIX. Um estudo que se mostra surpreendente, mas não capaz de apagar o encanto que o filme ainda desperta em muitas pessoas. A cara nova que Coito Cerebral apresenta em maio parece refletir uma certa filosofia criativa, ou uma ordem de fatores que desejam reger as páginas dessa revista. Mas tudo funciona de forma independente para, no fim, formar uma coisa só. É assim que muitas coisas funcionam em nosso cotidiano. No emprego, com as idéias distintas que for-

mam o trabalho em equipe; no amor, com a oposição que é o elemento mais atrativo em um casal; na família, onde ninguém nunca irá compartilhar as mesmas idéias, ao menos não em tempo integral. E é justamente a fragmentação da família que costura as linhas do novo livro de ficção de Lya Luft, O silêncio dos amantes. A crise e a falta de comunicação entre pessoas que convivem diariamente voltam a servir de guia para os vinte contos reunidos nesta obra forte e sensível sobre a difícil relação entre pessoas que parecem não conseguir dividir uma vida sob o mesmo teto. Com um pouco dessa intensidade, Laura Marling, uma mulher de apenas dezoito anos, escreve e interpreta suas canções com a propriedade de quem viveu muitas vidas em uma, talvez até tenha vivido. Algumas pessoas nasceram com esse dom de viver as coisas com intensidade, respeitando apenas a própria realização. A cantora inicia uma séria entitulada Cantoras Britânicas. A cada edição, um pouco desse novo time de jovens e talentosas artistas será mostrado em nossas páginas. Ainda, a segunda parte da história de Rejane devasta um pouco mais da confusa mente humana com seus medos e sua sexualidade, fazendo oposição ao conto Par de desejo, ambos em Vida de Mentira. Dessa forma, Coito Cerebral começa a ganhar uma forma mais definida, apesar da idéia inicial fugir de qualquer definição. Define-se o formato, não a visão. E é isso que vale. Ricardo Rodrigues ricardopublicitario@hotmail.com

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CÉSAR LUCIANO REGINATO Publicitário e músico, trabalha, ainda, com marketing esportivo.

RICARDO RODRIGUES Publicitário e acadêmico de jornalismo, nas horas vagas escreve ficção.

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Mais de vinte anos depois do início de uma carreira que poderia ter sido apenas mais uma novidade passageira, Madonna prova que é, antes de qualquer análise artística, uma experiente e bem sucedida empresária do showbis. Eu sei que o propósito dessa revista sempre foi evidenciar aquilo

tada por revistas especializadas. Analisando com um pouco de critério,

que, geralmente, não atrai atenção considerável da mídia, mas

Madonna não pode ser considerada uma excelente cantora. Apesar de

alguns fatos que não se enquadram nesse objetivo merecem al-

ter evoluído muito nesse quesito com o passar dos anos (a diferença

guns comentários. E não há quase nada no mundo contemporâneo

entre o album que leva seu nome, de 1983, e qualquer outro dos anos

que esteja mais sob os holofotes do que a cantora Madonna. Por

1990 é gritante), sua extensão vocal é baixa, como ela mesma sempre

isso, essas duas páginas serão dedicadas não à sua relevância

reconheceu. No cinema seu talento é discutível. Entre os vários papéis

artística – qualidade vocal, composições, atuações em filmes e o

pequenos que fez, o mais representativo é o da primeira dama argentina

que mais que ela faça e que, de uma forma ou outra, acaba ganhan-

Eva Perón, que lhe valeu um Globo de Ouro. Mas seus relativos fracassos

do atenção da imprensa e de todos nós (sim, de todos nós, mesmo

jamais contribuíram de forma negativa, ao menos não há tempo de

sem querer), mas sim à uma breve análise de sua incrível capacida-

Madonna colocar em prática suas armas de marketing. Não dá para dizer

del empresarial.

que o sexo foi o único elemento para impulsionar sua carreira. É claro,

Desde o início da trash década de 1980 que Madonna se destacou como uma artista nova, com atitudes ousadas e criatividade. Esses

serviu para criar uma imagem, a partir de toda a polêmica que sempre causou, mas isso não sustenta quase três décadas de sucesso.

elementos foram incorporados à sua música, a primeira grande

Em 1989, o album Like a prayer, um dos mais cultuados pelos fãs e mais

jogada da então inexperiente cantora de vinte e poucos anos. A

elogiado pela crítica, trazia justamente essa polêmica, e adicionada aos

imagem de mulher livre, que faz o que bem quer, principalmente

temas que envolviam religião transformaram Madonna em um ícone de

com o seu corpo, fez toda a diferença num mercado musical cheio

muitas coisas. O disco seguinte, a coletânea The immaculate collection,

de experimentalismos rítmicos e influências de outros gêneros.

trazia duas faixas inéditas, entre elas Justify my love. O vídeo da canção

Mas o que outros artistas não tinham era a naturalidade para flertar

esbanjava cenas de sexo com mulheres, sadomasoquismo e voyerismo.

com temas polêmicos, como o próprio sexo, em letras e coreogra-

O fato da MTV ter proibido sua veiculação possibilitou um grande negó-

fias de clipes. Em 1984, após o sucesso de seu primeiro album, a

cio para Madonna, pois a curiosidade em torno do material censurado

imagem que lhe acompanharia por toda a carreira se consolidou.

tornou o primeiro video single da história em um estrondoso sucesso de

Canções como Like a virgin e Material girl ajudaram a construir uma

vendas. A era do sexo apelativo foi concluída com o disco Erotica, de

reputação hoje, de certa forma, repudiada pela rainha do pop,

1992. O pacote de divulgação contava, ainda, com o livro de fotografias

como é chamada. Outros temas como aborto, lesbianismo e reli-

Sex e o filme Corpo em evidência. De tudo o filme foi o que menos

gião entrariam em pauta, despertando manifestações e ódio de

repercutiu em termos financeiros, ao contrário do livro. Até hoje é

puritanos e feministas. Do primeiro disco até o mais recente, Hard

disputado através de lances altos em sites de leilão, em uma infinita

Candy, lançado no dia 28 de abril, muita coisa aconteceu. Outros

curiosidade do ser humano de ver aquilo que já fez ou que habita seus

artistas surgiram, influências musicais entraram e saíram de moda,

desejos mais secretos.

algumas voltaram novamente, os conceitos sobre moral e ética ficaram obsoletos e a humanidade passou a ver as coisas com outros olhos, ou fingiam ver para não serem esquecidas pelas ondas de modernidade. E Madonna continua no topo. A pergunta é: por que outros artistas de sua geração, tão ou mais talentosos, não souberam conduzir suas carreiras?

Depois disso Madonna entrou em uma nova fase. Tornou-se mãe, passou a estudar cabala e a direcionar sua carreira para a qualidade musical, sem qualquer tipo de apelação. Com o mercado musical “cuspindo” artistas pop (não que algum fosse durar mais de três discos), Madonna passou a investir mais na produção de seus albuns, chamando produtores afinados com o que há de mais hype no mercado musical. De Music

Não há melhor exemplo, apesar de clichê, que Michael Jackson.

até Hard Candy (com exceção de American life, um album fraco), nomes

Maior fenômeno pop de todos os tempos (talvez apenas os Beatles

como Mirwais e Timbaland fizeram toda a diferença na concepção de

tenham antecedido tamanho sucesso), ao longo dos anos suas

seus trabalhos. Empresária, Madonna entende do negócio que faz no

intempéries pessoais foram fator decisivo para o desastre que se

showbiz, conhece as pessoas que nele transitam, sabe o que acontece

tornou sua carreira. Michael foi personagem único em um mundo

nos seus batidores, sabe a hora de se aliar ou se afastar de alguém. Essa

que hoje dificilmente um artista alcança. Madonna não só alcançou,

mulher, às vésperas de completar cinqüenta anos de idade, cantou com

como continua residindo nele. Essa carreira bem sucedida é o resul-

Britney Spears (e a beijou na boca também), ditou moda, reinventou

tado de atitudes muito bem articuladas, afinadas com estratégias

seus hits antigos em turnês e está pronta para se adaptar ao que mais o

de um sofisticado sistema de marketing. Logicamente, um sistema

mercado estiver reverenciando. Não se trata de uma vendida, mas al-

que não se encaixa para qualquer artista. Madonna já possui um

guém que procura se adaptar ao universo pop, o mais mutável, descar-

nome definido no cenário artístico. Seu nome é uma marca, tão

tável e diverso. Afinal, se manter no topo não é uma tarefa fácil. E não é

rentável, lembrada e influente como a de qualquer corporação lis-

apenas questão de talento, mas sobretudo de inteligência.

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O estudo é antigo, mas 108 anos depois da primeira edição do clássico de L. Frank Baum, as comparações com a economia norte-americana do século XIX impressionam Texto e ilustrações >> RICARDO RODRIGUES

o final do século XIX, em meio às incríveis novida-

fazendo-a girar pelos ares por tempo o suficiente para que fizesse

des que antecediam o futuro do novo tempo,

Dorothy adormecer. Ao acordar, estava em um lugar totalmente

Lyman Frank Baum achava que o teor das histórias

diferente do Kansas, mais colorido e povoado por pessoas esquisitas.

infantis apresentava elementos há muito ultrapas-

Sem que ninguém soubesse indicar o caminho de volta para sua fazen-

sados. Nascido nos Estados Unidos, Baum seguia

da, Dorothy vai em busca do Mágico de Oz, o único que poderia lhe en-

uma tendência popular entre escritores europeus.

sinar a voltar para a casa dos tios. Percorrendo uma estrada de tijolos

Nesse contexto, os personagens dos contos de fada eram de-

amarelos, cercada de belas florestas e criaturas exóticas, a menina

sinteressantes, antigos, e as histórias deveriam ter como único

encontra um espantalho que queria um cérebro; um lenhador de lata

objetivo divertir os pequenos leitores, não moralizá-los. Assim, em

que desejava um coração e um leão que queria ser corajoso. Todos

maio de 1900, o escritor publicou O Fantástico Mágico de Oz.

partem em busca do mágico, numa aventura cercada de obstáculos.

O sucesso estrondoso da publicação fez com que Baum continuasse

Mas tamanhas aventuras e espetáculos coloridos citados tanto no livro

a escrever sobre o reino maravilhoso de Oz, em uma série de

quanto na adaptação cinematográfica pareciam esconder algo nas en-

quatorze livros, a qual continuou sendo escrita por outros escritores

trelinhas daquele conto infantil. Em 1964, Henry Littlefield, em um ar-

após a sua morte, totalizando quarenta obras. No primeiro volume,

tigo chamado The Wizard of Oz: Parable on Populism, publicado no

Dorothy Gale, uma menina que vivia com os tios no Kansas, perde-

jornal American Quaterly, revelou características que transformaram o

se do seu fiel cãozinho Totó momentos antes da passagem de um

conto em uma parábola ao Partido Populista e às eleições presidenciais

ciclone. Enquanto os tios refugiavam-se no abrigo, Dorothy procu-

que ocorreram no ano de 1896, mas, sobretudo, à economia norte-

rava o cachorro. Quando se dirigia ao porão com o bicho nos braços,

americana daquele período. Independente das intenções reais do

a casa foi atingida por fortes rajadas de vento, fazendo com que a

escritor, as comparações impressionam, e deixam muitas perguntas

menina caísse no chão. Então, o ciclone arranca a casa da terra,

sem respostas. Seria Baum populista ou apenas um crítico?

Capa da primeira edição do livro O Maravilhoso Mágico de Oz. Lyman Frank Baum escreveu quatorze volumes da série. Após sua morte, Ruth Plumly Thompson continuou o trabalho, e o primeiro título, The Royal Book Of Oz, foi lançado em 1921. Apesar de Baum aparecer como autor, foi inteiramente escrito por Ruth. Com estilo diferente de Baum, incorporando príncipes e princesas nas histórias, a autora escreveu dezenove livros. Ruth aposentou-se em 1939, e John R. Neil, por muitos anos ilustrador dos livros de Oz, assumiu a seqüência, e criou três títulos. Sua visão sobre o contexto das obras anteriores era mais intensa; tudo poderia ter vida, e dessa forma relevância para a história. Jack Snow publicou mais dois títulos, em 1946 e 1949, Rachel Cosgrove lançou The Hidden Valley of Oz, em 1951 e, finalmente, Eloise Jarvis McGraw e Lauren Lynn McGraw fecharam a famosa série de quarenta obras, com Merry-Go-Round in Oz, em 1963. Outros títulos relacionados ao tema foram lançados, durante a criação da série de quarenta e posteriormente ao lançamento de Eloise e Lauren. Alguns foram concebidos por Baum, Thonpson e Snow, contendo histórias curtas e crônicas sobre os personagens, outros apenas com o objetivo de pesquisa. The Runaway in Oz, escrito em 1943 por John R. Neill, deveria ser o 37° livro de Oz, mas o autor faleceu antes de terminar as ilustrações, então a editora Reilly & Lee decidiu não publicá-lo devido a recessão causada pela II Guerra Mundial. O manuscrito permaneceu em posse da família Neill até a sua publicação, em 1995, com edição e ilustrações de Eric Shanower. A última obra relacionada ao universo criado por Baum foi lançada em 2005, por Edward Einhorn, chamado The Living House of Oz.

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A modernização da indústria ocasionou um grande aumento

Democrata, em que disse: "Vocês não devem pressionar a

da colheita por unidade de área na segunda metade do sé-

fronte do trabalhador com esta coroa de espinhos. Vocês não

culo XIX. Dessa forma, era necessário a construção de uma

devem crucificar a humanidade em uma cruz de ouro".

eficiente malha ferroviária para transportar a produção, e

Raramente, desde então, os políticos trataram tão poeti-

logo criou-se uma dependência desse transporte para che-

camente as alternativas de política monetária. No entanto,

gar até os mercados mais distantes. Com o apoio dos indus-

Bryan não chegaria à presidência, pois o republicano William

triais, o Congresso aprovou tarifas alfandegárias altas de-

McKinley venceria as eleições. Os populistas mostraram grande

mais, o que contribuiu para que os fazendeiros se endivi-

força no oeste e no sul americano durante as eleições presi-

dassem rapidamente. Por volta de 1880, um movimento

denciais de 1892, onde seu candidato a presidente recebeu

chamado Aliança dos Fazendeiros tinha mais de um milhão

mais de um milhão de votos. A questão de moeda, que envolvia

de afiliados. O principal objetivo era uni-los e protegê-los

os proponentes de prata contra os proponentes do ouro, porém,

contra a elite política e econômica. Não demorou para que o

logo encobriu os demais problemas existentes. Oficiais agro-

descontentamento dos produtores agrícolas chegassem ao

pecuários do oeste e do sul exigiram o retorno da mineração

seu ápice, o que propiciou a criação de um terceiro e grande

ilimitada de prata, que fora reduzida durante a década de 1870.

partido político: o Partido Populista. Os ideais da plataforma

Estes oficiais acreditavam que seus problemas vinham da falta

concentraram-se nos problemas da terra, transportes e

de dinheiro em circulação, e disseram que ao aumentar o

financiamento, incluindo mineração ilimitada de prata. De

volume de dinheiro iriam, indiretamente, aumentar os preços

1880 a 1896, o nível de preços na economia dos Estados

dos produtos agropecuários e os salários dos trabalhadores da

Unidos caiu 23%. Como esse foi um fato inesperado, levou a

manufatura, permitindo que as dívidas dos fazendeiros fossem

uma grande redistribuição de riqueza. A maioria dos agri-

pagas por causa da inflação. Grupos conservadores e a classe

cultores do Oeste do país estava endividada, e seus cre-

financeira, em outro lado, acreditavam que uma política deste

dores eram os banqueiros do Leste. Com a queda dos preços

tipo seria desastrosa, e insistiam que a inflação, se iniciada, não

o valor das dívidas aumentou, enriquecendo os bancos. De

poderia mais ser controlada. Fundos financeiros ferroviários

acordo com o políticos populistas da época, a solução para

foram o instrumento financeiro mais importante (eles podiam

os problemas dos agricultores estaria na livre cunhagem da

ser comprados através do uso de ouro). Mas se os preços de

prata. Durante esse período, os Estados Unidos operavam

transporte de carga e passageiro fossem cobrados de forma

com o padrão ouro. A quantidade de ouro determinava a

fixa, baseados no valor da prata, cada companhia ferroviária

oferta de moeda e, como conseqüência, o nível de preços.

iria à falência em semanas, desempregando centenas de

Os que defendiam a prata livre queriam que tanto a prata

milhares de pessoas, e destruíndo a economia industrial.

quanto o ouro fossem usados. Se adotada, essa proposta

Embora os populistas tenham perdido o debate sobre a livre

aumentaria a oferta de moeda, elevando os preços e re-

cunhagem de prata, eles finalmente obtiveram a expansão mo-

duzindo o encargo real das dívidas dos agricultores. O

netária e a inflação que desejavam. Em 1898, exploradores

debate a respeito da prata foi difícil e representou um

descobriram ouro próximo ao rio Klondike, no Yukon canaden-

aspecto central da política da década de 1890. Um slogan

se, e também das minas da África do Sul. Como resultado, a

eleitoral comum dos populistas era "Estamos hipotecados.

oferta de moeda e o nível de preços começaram a aumentar nos

Tudo, menos nossos votos". Um proeminente defensor da

Estados Unidos e em outros países que operavam sob este

prata livre foi William Jennings Bryan, o candidato demo-

padrão. Em 15 anos, os preços nos Estados Unidos voltaram aos

crata à presidência em 1896. Ele é lembrado, em parte, por

níveis apresentados antes da década de 1880, e os agricultores

causa de um discurso na convenção de nomeação do Partido

se encontraram em melhor posição para lidar com suas dívidas.

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Embora jamais tenha assumido tratar-se de uma com-

Mágico: Marcus Alonzo Hanna, presidente do Partido Republi-

paração, o contexto da obra e seus personagens falam por

cano.

si. Abaixo, os principais personagens e as comparações com personalidades e fatos do período em que o livro foi escrito.

A estrada de tijolos amarelos: clara metáfora daqueles que defendiam o uso da prata. No livro, os sapatos de Dorothy são de prata, e não de rubi (no cinema, a adaptação para sapatos

Dorothy: é uma menina que vivia no Kansas, estado de maior força do Partido Populista.

de rubi é justificada apenas para evidenciar o technicolor, sem nenhuma preocupação política). Portanto, é uma forma de elevar a prata ao pisar no ouro. No final da história, essa relação é evidenciada quando Dorothy descobre que o mágico jamais poderia resolver seus problemas, e que a solução estava, o tempo todo, em seus pés (ou seja, na prata).

Espantalho: alegoria aos fazendeiros. Apesar da simbologia dos personagens, o autor jamais afirmou ser adepto do partido. Dessa forma, seu livro pode ser apenas uma sátira aos populistas, pois teorias afirmam que o escritor Lenhador de Lata: representa os trabalha-

era republicano. Em contrapartida aos ideais populistas, os

dores industriais.

personagens de Baum não representam figuras democratas. Em determinado ponto da história todos se revelam monarquistas. O Espantalho torna-se rei da Cidade das Esmeraldas;

Leão Covarde: representa a figura de William

o Lenhador de Lata é nomeado imperador dos Winkies e o Leão

Jennings Bryan, candidato à presidência pelo

Covarde, por sua natureza, assume o posto de rei da floresta e

Partido Democrata com apoio dos populistas. Perdeu

para

o

candidato

do

Partido

dos animais. Nos outros livros da série, Dorothy voltaria à terra de Oz e se transformaria em princesa.

Republicano. Bruxa Malvada do Leste: Grover Cleveland. Foi o primeiro democrata eleito para a presidência após a Guerra Civil (1861-65). Após vetar um projeto que destinava US$ 10 mil para distribuição de sementes de grãos entre fazendeiros no Texas que enfrentavam uma seca, o presidente escreveu: "Ajuda federal nestes casos encoraja a expectativa de cuidado paternal por parte do governo e enfraquece a firmeza do nosso caráter nacional...". Bruxa Malvada do Oeste: William McKinley. Foi o 25º presidente dos Estados Unidos, de 1897 até 1901, quando foi assassinado pelo jovem anarquista Leon Czolgosz. Seu mandato é lembrado pelos norte-americanos como um período de expansão dos territórios e colônias dos EUA, por meio de anexações, invasões e conquistas.

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Glinda, a bruxa boa


Não demorou muito para que a história fosse adaptada para

indicado à seis prêmios Oscar, vencendo nas categorias melhor

o cinema e teatro. A versão cinematográfica mais famosa, de

trilha sonora e melhor canção original para Over the Rainbow.

1939, entitulada O mágico de Oz, trazia Judy Garland no

Perdeu nas categorias de melhor filme, direção de arte, efeitos

papel de Dorothy Gale, e marcou, entre outros aspectos, a

especiais e fotografia. O filme teve quatro diretores. Richard

consolidação do cinema em cores. Surpreendente para a

Thorpe iniciou as filmagens e rodou por várias semanas até ser

época, o filme não carrega a mesma representatividade

demitido pelos produtores, que consideraram seu trabalho

política e econômica do livro. Os produtores, talvez sem

insatisfatório. Nenhuma das cenas rodadas por Thorpe foi

conhecimento do significado histórico que tinham em mãos,

incluída na versão final. Ainda em busca de um diretor substi-

evidenciaram apenas a fábula da história, com seus apelos

tuto, George Cukor foi contratado como diretor temporário.

emotivos e de caráter familiar e, sobretudo, para usar

Victor Fleming assumiu a direção logo em seguida, mas teve que

elementos que destacassem a cor dos cenários e figurinos.

abandoná-la após ser chamado para dirigir ...E o Vento Levou.

A MGM pagou a L. Frank Baum a quantia de US$ 75 mil pelos direitos de adaptação cinematográfica de seu livro, uma quantia recorde na época. Sucesso entre crianças e adultos,

Após a saída de Fleming, King Vidor assumiu as sequências restantes. Vidor rodou apenas as cenas em preto e branco, situadas no Kansas.

conseguiu atravessar gerações exercendo o mesmo efeito,

Recentemente, por causa deste texto, assisti O Mágico de Oz

despertando as mesmas reações, em épocas marcadas pela

depois de, pelo menos, dez anos. Havia uma certa expectativa

crescente disputa tecnológica. É difícil, hoje, pensar em pro-

com relação ao que iria achar da película depois de tanto tempo,

duzir uma história desse tipo tão livre de algum recurso que

e sentia até receio de que a magia que sempre habitou minhas

beira a pirotecnia. Sucesso absoluto de bilheteria, teve

lembranças se perdesse para sempre. Pois aconteceu o contrá-

orçamento de US$ 2,7 milhões, sendo que o filme arrecadou

rio. Não só recordei de uma época muito feliz, que foi minha in-

US$ 3 milhões em seu primeiro lançamento nos cinemas. Foi

fância, como renovei a sensação mágica que esta obra provoca.

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Uma outra versão de Over the Rainbow chegou a ser gravada por Judy Garland, quando sua personagem estava encarcerada no castelo da Bruxa Má do Oeste. Durante a cena, a atriz começou a chorar espontaneamente, devido à tristeza que roteiro pedia. Esta sequência foi cortada na edição final do filme. Em 1978, Diana Ross e Michael Jackson protagonizaram um musical no mínimo curioso chamado The Wiz, também baseado no livro de Baum, ambientado em Manhattam. Diana Ross vive uma versão moderna de Dorothy, e Michael Jockson, por sua vez, é o espantalho sem cérebro. Roteirizado por Joel Schumacher, The Wiz foi dirigido por Sidney Lumet.

Das muitas lendas que cercam o trabalho de diversos mú-

tia alternativa ou, ainda, criando uma atmosfera nova para a

sicos, poucas geraram tantas especulações como a que en-

história. A comparação surgiu em 1997, espalhando-se

volve o Pink Floyd e o filme O Mágico de Oz. O album Dark

rapidamente entre fãs e interessados no assunto, e recebeu o

Side of the Moon, lançado em 1973, é considerado por

apelido de Dark Side of the Raibow. Em 2002, em um

muitos como a obra-prima da banda, superando até

programa da MTV americana, os músicos negaram que

mesmo The Wall. Marcando o

qualquer semelhança tenha

início do rock progressivo, o

sido intencional, alegando

disco é uma mistura de blues

que os recursos técnicos da

rock clássico e a até então novi-

época

dade música eletrônica. Con-

delicado processo de sincro-

tém complexas utilizações de

nização. Mas então, como

não

permitiriam

o

instrumentos e efeitos sonoros

explicar essa história? Com

existentes na época, como o

um pouco de atenção perce-

som de alguém correndo em

be-se, ainda que não pare-

volta de um microfone e a gra-

çam

vação de múltiplos relógios to-

“coincidências” estão lá, em

cando ao mesmo tempo. Outra

uma sequência de sons, mo-

relevantes,

que

as

característica do álbum são os

vimentos e falas sincroni-

trechos de diálogos entre as

zados de tal forma que é dif-

polêmica,

ícil concordar com a casuali-

então, se deve à provável

faixas.

A

grande

dade. Independente da ver-

composição do disco sobre o roteiro do filme, funcionando como trilha musical e sonoplas-

dade, os dois produtos estão No site Youtube é possível encontrar quase todo o filme sincronizado com o disco, dividido em partes. Ainda, ensina aos usuários como fazer a sincronização. Para encontrar o material, digite o título do vídeo acima.

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aí, livres para receber o seu julgamento. Divirta-se.


A partir desta edição, Coito Cerebral abre espaço para falar da nova (e talentosa) safra de cantoras britânicas que, de uma certa maneira, são influenciadas por ritmos e artistas da música negra norte-americana. Próxima artista >> Joss Stone

Nos últimos anos, o cenário musical

muito experiente. Sobre suas compo-

viu crescer o número de vozes femi-

sições, Laura afirma apenas contar

ninas que são pop em se tratando de

histórias, e durante o processo pro-

vendas, mas, curiosamente, não de

cura sentir pena de si mesma para,

qualidade artística. Ao falar em mú-

dessa forma, unir momentos de sua

sica pop logo pensamos naqueles ar-

vida à melodias fortes. Em diversos

tistas adolescentes que não cantam

momentos sua voz e estilo lembra Joni

nada, mas, por serem bonitinhos e

Mitchel, cantora que ficou famosa na

produzirem músicas com refrões gru-

década de 1970 ao misturar jazz e folk

dentos e que irão tocar à exaustão nas

rock, artista que cita como influência.

MTV’s do mundo todo, acabam rotu-

Laura destaca, ainda, Neil Young, can-

lando o gênero. Música pop é música

tor que ouvia desde criança com o pai.

popular, antes de qualquer coisa,

Recentemente, suas influências giram

independente de seus apelos extre-

em torno de Diane Cluck (muito seme-

mamente radiofônicos e televisivos.

lhante em timbre de voz e estilo musi-

De tempos em tempos artistas que-

cal) e Will Oldham. Como muitos artis-

bram essa regra, ao produzirem al-

tas desta geração jovem, a porta de

buns que conseguem agradar tanto a

entrada para a música aconteceu na

crítica quanto ao público. Nos últi-

web, através do site MySpace, en-

mos anos foi a vez da Inglaterra popu-

dereço onde os usuários (em especial

larizar artistas que seguem esse ca-

músicos) compartilham arquivos. A

minho. Amparadas na mistura do

falta de vínculo com uma gravadora de

revival da black music (inspiradas em

grande porte, porém não a falta de

grandes divas do jazz, soul e ritmos

conhecimento musical, permite ao ar-

oriundos) e do folk-pop, ou anti-folk,

tista praticar as vertentes interminá-

essas cantoras, algumas ainda ado-

veis do experimentalismo. O que é

lescentes, parecem instaurar algo que

bom, porque funciona como combus-

se mostra uma nova etapa criativa da

tível para o início de carreira. Os dois

música popular. Nos “criadouros” bri-

EP’s que lançou em 2007, The London

tânicos desse contexto, nomes como

Town e My Manic & I (esse vinha a-

Joss Stone, Corinne Bailey Rae, Duffy,

companhado por um livro de ilustra-

Adele, Amy Winehouse, Kate Nash e

ções), trazem faixas gravadas em es-

Laura Marling são alguns exemplos

túdio, com produção cuidadosa, bem

recentes. Laura, nascida em Reading,

como gravações feitas por Laura em

é uma mulher de apenas dezoito a-

sua própria casa, e foram o aperitivo

nos, mas canta com a mesma proprie-

que grandes selos esperam para lan-

dade de quem percorre a estrada há

çar um novo artista. Editados em vinil

muito tempo. Munida de seu violão e

de sete polegadas com 500 cópias

uma banda eficiente, entoa canções

cada, são hoje peças de colecionador.

quase acústicas em letras que falam

Do setlist, quatro canções não estão

de amores ganhos e amores perdidos,

no album: She’s Changed, Typical,

às vezes com o sofrimento de alguém

London Town e New Romantic.

16 Revista Coito Cerebral Ano 1 | N.º 3 | Maio de 2008


The London Town (EP)

My Manic & I (EP)

Limited 7”

Limited 7”

FORA DE CATÁLOGO

FORA DE CATÁLOGO

London Town She’s Changed Failure Tap At My Window

New Romantic Night Terror My Manic & I Typical

O album de estréia, Alas I Cannot Swim, foi produzido por Charlie Fink, vocalista do grupo Noah and the Wale (ao qual Laura fazia parte até pouco tempo). Lançado em fevereiro deste ano, reafirma um começo promissor. Com voz grave e afinada, a moça surpreende em ótimas canções, como Old stone, Ghosts, The Captain and the Hourglass, Your Only Doll e Cross Your Fingers. O folk está presente de forma mais nítida na faixa You’re no good, pontuando-se nas faixas restantes do disco, alternando o acústico com refinados arranjos de cordas. Em linhas gerais, a sonoridade de Alas... é sombria, quase depressiva, mas demonstra a sensibilidade digna de alguém que poderia falar sobre amor feliz com a mesma propriedade, sem cair em clichês típicos desse tipo de canção. Pesquisando na rede é possível encontrar canções que ficaram de fora dos EP’s e do album, de studio sessions ou interpretadas ao vivo. Dessas faixas, Mexico e Candlelight ganham destaque. Mexico é uma canção divertida que resume um espírito jovem, da vontade de largar tudo e viver uma aventura num lugar distante. Candlelight é mais profunda, seguindo temas presentes nas composições do disco. Assuntos como morte, egoísmo, religião, infidelidade e conflitos familiares são tratados de forma muito natural. Em New Romantic Laura diz: mamãe eu te culpo/ por eu tentar ser o que você é/ papai eu te amo/ mas não te perdôo por me fazer do jeito que eu sou”. O que mais impressiona em Laura é a sua maturidade musical, sem dúvida alguma. Talvez jovem demais para alguns, a moça provou que a idade não interfere no seu trabalho. Pronta para apresentar-se em uma casa noturna londrina ano passado, Laura foi barrada momentos antes do show por não ser maior de idade. Sem titubear, encostou-se com sua banda na parede de uma loja, próxima de duas sex shops, e fez o show ali mesmo, com desenvoltura e competência (fotos ao lado). Foram seis músicas (a primeira pode ser conferida no youtube, capturada pelo celular de um fã), e a soma dos fatos tornou o momento único. Assim como sua música.

Assista ao video no link http://www.youtube.com/watch?v=DwUbHy0TCsk

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Alas I Cannot Swim (Virgim Records, 2008)

Ghosts Old Stone Tap At My Window Failure You’re No God Cross Your Fingers Crawled Out Of The Sea (Interlude) My Manic & I Night Terror The Captain & The Hourglass Shine Your Only Doll (Dora)


Amores Família Desestrutura Retornando à ficção, a escritora gaúcha Lya Luft destaca relacionamentos familiares em O silêncio dos Amantes, onde o elemento principal é a dificuldade de comunicação do ser humano.


Lya Luft retrata as dificuldades de comunicação do ser humano em histórias pontuadas por indiferença e tristeza, muitas vezes beirando a tragédia.

Conhecida nacionalmente pelo sucesso editorial Perdas & ganhos, a

autora considera a vida tão interessante. A dificuldade das pessoas

gaúcha Lya Luft retorna à ficção depois de nove anos com um livro de

em se expressarem, ou serem compreendidos, cria um mundo cheio

contos onde volta-se para o lado triste e às vezes trágico do convívio

de personagens irregulares, com visão e atitudes diferentes. Em um

familiar, tema que marcou grande parte de sua obra. Inicialmente

dos contos, um menino sente-se incompreendido por todos pelo fato

pensado para ser outro ensaio (assim como Perdas & ganhos e Pensar

de ser anão. As características físicas “anormais” de uma pessoa são

é transgredir, ambos publicados pela editora Record), aos poucos o

fatores que atuam fortemente nesse sentido. Elementos triviais para

material tornou-se um romance, para então se fragmentar em vinte

alguns, pequenas coisas ganham proporções gigantescas quando en-

histórias distintas, mas iguais em essência.

tra em cena a exclusão. Não há quem se sinta à vontade diante da

A linha que costura cada história é a idéia de que nem sempre o silên-

sensação de estar no lugar errado ou da indiferença.

cio é a melhor solução em um relacionamento, seja ele qual for. E isso

O livro Reunião de família é direcionado, basicamente, para o relacio-

vale para dois tipos de situação: palavras que deveria ser ditas e não

namento familiar. Extremamente denso, em uma narrativa que com-

foram, assim como palavras que foram ditas quando não deveriam.

bina ansiedade, medo e revolta, é apenas um exemplo das ramifica-

Trata-se de da falta ou perda de uma sensibilidade muito comum en-

ções que o assunto proporciona. Não há como ficar indiferente aos

tre pessoas que se relacionam bem, de captar com naturalidade es-

processos familiares que, talvez, nunca iremos experimentar, mas

sas situações. Existe a incomunicabilidade entre mãe e filho, pai e fi-

que chocam de igual forma. Porque existem. Estão nas páginas dos

lho, marido e mulher, irmão e irmã, amigos. Sobretudo, na família

jornais, nos noticiários da TV, na escola, na casa ao lado. E, nos casos

torna-se mais inquieante. É nesse eixo que Lya Luft desdobra grande

mais surpreendentes, dentro de nossa própria família.

parte das situações descritas em seu livro.

Neste curto resumo do lado sombrio do ser humano, mas não menor

Apesar de já ter declarado fascínio por esse assunto, Lya salienta que

em impacto, a dama da literatura gaúcha, como é chamada, conse-

os contos não são escritos a partir de suas próprias experiências.

gue fazer o leitor olhar para a pessoa que está ao seu lado. É capaz de

Observadora atenta do ser humano desde criança, as páginas desse e

despertar reflexões sobre atitudes e vontades. Interioriza cada um de

outros livros que escreveu apresentam o resultado do infinito uni-

nós, no momento em que vasculhamos nossa memória em busca de

verso de situações da vida real. Pelos problemas que a falta de

algo que não tenhamos feito para, talvez, consertarmos prováveis

comunicação podem causar, às vezes até grandes tragédias, é que a

estragos enquanto o tempo ainda é, ilusoriamente, um aliado.

Trecho do conto

A Pedra da Bruxa — Pai, domingo me leva no jogo? — Ué, agora você se interessa por futebol? — o pai duvidava. — Claro, meus colegas vão com os pais deles, você me leva? O pai o encarou meio incrédulo, quem sabe participar de atividades mais masculinas dava um jeito naquele filho? Num impulso de seu coração paterno, decidiu não convidar o outro: entendeu que aquele poderia ser um momento só dos dois, o pai e o filho complicado. Comprei camiseta do clube, animei, expliquei, o menino saiu pela mão do pai, entrou no carro e acenou para mim, quase feliz. Na volta, fim de tarde, entraram em casa um pai carrancudo e um menino com rosto inchado de chorar. — Nos primeiros gritos da torcida, no primeiro gol, começou a chorar feito uma menininha. Ficou assustado,

imagine só. Passei vergonha — disse o pai, e foi se fechar no quarto. Os dois irmãos davam-se bem, mas sem intimidade. Eu raramente os via juntos. Um parecia achar graça do outro. Ele chamava o maior de troglodita, naquele tom de afetuosa implicância que acontece entre irmãos; o mais velho o chamava de queridinho da mamãe, no mesmo tom sem maldade. Quando já era um adolescente alto, magro, um pouco desajeitado, naquela manhã fatal em nossa casa na montanha, ele chegou perto do pai quando este pegava a chave do carro, e, num esforço para vencer a barreira da timidez, pediu: — Pai, a gente pode conversar um pouco? O pai, desacostumado, espantou-se. Homem racional e direto, disse algo direto e racional: — Filho, estou atrasado, preciso estar na cidade em uma hora. Na minha volta a gente fala, está bom? — E partiu sem nenhum remorso porque não imaginava o que estava por vir.

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O Silêncio dos Amantes Lya Luft Editora Record 2008 160 páginas R$ 28,00



A adaptação do romance Ensaio sobre a cegueira, do escritor portu-

chegar nesse estágio exigiu passar pelo difícil processo de excluir

guês José Saramago, revelou-se um grande desafio para o diretor

quarenta minutos de filme. Essas difíceis decisões respondem por al-

Fernando Meirelles, responsável por sucessos de público e crítica

guns dos grandes momentos descritos no blog.

como Cidade de Deus e O jardineiro Fiel, ambos indicados ao prêmio Oscar. Transpor para a película uma história onde personagens e cidades não tem nome e o tempo não é definido não se mostraram como únicos obstáculos. A fidelidade ao material original pode ser, muitas vezes, um dos principais riscos que o diretor e o roteirista precisam aceitar ou não. No caso de Ensaio sobre a cegueira, esse risco já havia sido aceito há muito tempo. Desde que leu o livro a idéia da adaptação para o cinema lhe inspirou. Fã da obra, Meirelles entrou em contato com o editor brasileiro de Saramago para comprar os direitos de adaptação. Como a resposta foi negativa, acabou comprando outra história do mesmo editor, Cidade de Deus, o seu primeiro grande sucesso, e tentou esquecer o assunto. Em junho de 2005, o e-mail de

Em novembro de 2007, na época da quarta montagem, Meirelles exibiu a película para um grupo de amigos, esperando que os comentários “gentis” pudessem ajudá-lo a corrigir alguns erros e terminar o trabalho. Porém, o que recebeu em troca foi quase uma hora de artilharia pesada, comentários que, talvez, não estivesse preparado para ouvir à queima roupa. Meirelles observa o fato como “um filme sobre cegueira onde o diretor não conseguiu enxergar o que só naquele momento se revelou. Irônico. Lembrei da expressão ‘gelatina inútil’, que é como Glocester se refere aos seus olhos em Rei Lear, por não ter enxergado que Edmundo, seu filho bastardo, o enganava. É também sobre este tipo de cegueira que fala esta história”, afirma no blog.

um produtor canadense lhe colocou diante de uma incrível coinci-

Esse significado aparece logo na epígrafe do livro de Saramago, que

dência: era o convite para dirigir um roteiro adaptado de José

diz: “Se pode olhar, veja. Se pode ver, repara". Meirelles captou essa

Saramago. Aceitou receber o material, e três dias depois o envelope

mensagem, e procurou transmitir para a equipe durante todo o pro-

com o projeto chegava em sua casa. O filme? Blindness.

cesso de filmagem, seja a partir de conversas ou exercícios de inter-

Co-produção entre Brasil, Canadá e Japão, as filmagens aconteceram em Toronto, Montevidéu e São Paulo. O time de atores conta com Julianne Moore, Mark Rufallo, Danny Glover, Sandra Oh (da série Grey’s Anatomy), Gael García Bernal e a brasileira Alice Braga.

pretação, quando vendava os atores para contestualizá-los não apenas no mundo da escuridão, mas da percepção maior deste mundo. Ele diz que é preciso “ olhar com a percepção mecânica da visão, ver como uma observação mais atenta do que nos aparece à vista, uma visão analítica, e finalmente reparar no sentido de se libertar da su-

A primeira montagem, chamada de juntão, resultou em um filme de

perficialidade da visão e se aprofundar no interior do que é o homem e

duas horas e quarenta minutos. Longo demais, segundo o diretor. O

assim conhecê-lo. Se isso faz algum sentido, este Velho da Venda Pre-

primeiro passo foi enxugar para algo em torno de duas horas. Porém,

ta será um homem que repara, que tem subjetividade e vida interior”.

21 Revista Coito Cerebral Ano 1 | N.º 3 | Maio de 2008


A idéia de utilizar um blog como ferramenta de divulgação e diário de filmagem pode não ser nova. Los abrazos rotos (Abraços Cansados), filme ainda não finalizado do diretor espanhol Pedro Almodóvar, também ganhou na rede um espaço eletrônico para chegar até os fãs mais distantes. Em seu blog, fotografias, comentários sobre roteiro e o que mais tiver relação com o filme é mostrado de maneira despretenciosa, mostrando um pouco do universo non-sense e ao mesmo tempo cheio de realidade típico de seus filmes. Já Meirelles, talvez sem querer, foi além de simplesmente abrir um canal expositivo. Cada post se configura como uma importante lição sobre cinema. Aos poucos, o internauta percebe o processo de filmagem como um engenhoso esquema onde cada peça assume proporções únicas e grandiosas. Em Blindness, essas peças precisaram ser repostas ou consertadas várias vezes, para garantir que, ao final, seriam capazes de mover a máquina inteira. Ao final da leitura, fica a certeza de que, nas próximas e quaisquer sessões, nosso olhar será diferente. Não especialista, porém mais preparado e com consciência da profundidade do cinema.

Fernando Meirelles durante as gravações em São Paulo

Mark Rufallo e Julianne Moore em cena de Blindness

Revista Coito Cerebral Ano 1 | N.º 3 | Maio de 2008


“A Julianne Moore ficou arrasada ao saber que teria que filmar a cena em que ela vem pelo corredor aos prantos depois de presenciar o estupro de 12 mulheres e matar dois dos estupradores. Difícil acertar o tom sem ter passado por estas cenas antes. Mas não tinha jeito. Era isso ou ficarmos parados, pois como nem o Gael Bernal e nem o Danny Glover haviam chegado. Estávamos sem ter o que filmar, então fomos em frente.

da apenas pela emoção. Tirando um pouco o pé do acelerador, mas sem deixar a coisa esfriar, pedi que todos os figurantes se afastassem dos atores, era mais rápido do que ensinar-lhes reações melhores, expliquei para a Winnie, a continuista, que nessa cena a continuidade não era a prioridade, não vamos perder tempo com detalhe. Dei apenas um tempo para o Guilherme trocar a bateria do microfone enquanto o César colocava mais duas câmeras para rodarmos ao mesmo tempo e evitar termos que ficar repetindo a mesma coisa por uma hora.”

O microfone de lapela da Julianne já estava ligado, pude ouvir pelo head-phone que, lá do outro lado do corredor, sozinha, ela se preparava respirando fortemente. Enquanto isso, preparávamos nosso lado: luz, câmera, figuração. Então ela começou a chorar e depois a chorar convulsivamente, até que um assistente entrou correndo onde estáva-mos e anunciou: ‘A Julie está pronta e pede para rodarmos já’. Nós não estávamos prontos mas, nesta hora não interessa se a mesa não está posta ou se o vinho não foi aberto. Tem que rodar. E rodamos. Na primeira tomada, ela veio pelo corredor desesperada. Berrou seu texto sem pensar, deixando vir a emoção que viesse. Pegou a nós todos desprevenidos, ao Mark Rufallo principalmente. Sem querer, ele entrou na onda e respondeu num tom lá em cima também. A cena calou todo mundo no set de tão forte. Cortamos. Apesar de estar com o coração batendo forte, me esforcei para não me deixar ser arrastado pelo tsunami que havia passado, corri para onde estavam os atores e pedi uma outra tomada num tom bem mais baixo. Julie nem me respondeu. Concordou com um gesto de cabeça e um sorriso técnico e voltando para a primeira posição, disse apenas: ‘Vamos rodar já, por favor’. Emoção é coisa viva, fugaz. Uma hora está lá, sólida, pode até ser enrolada num garfo e mastigada mas, no instante seguinte, pode se evaporar. Julie tentava não se dispersar para manter sólida essa coisa ainda viva. Algumas reações de figurantes precisavam ser corrigidas, o Guilherme veio me dizer que a bateria do microfone dela havia arriado e tinha que ser substituída e eu queria conversar com o Mark, mas tive apenas tempo de lhe pedir que não pegasse carona no tom da Julianne; e vamos nessa assim mesmo. O som a gente resolve depois. Sabia que se ficasse cozinhando essa cena por mais 5 minutos alguma coisa se perderia para sempre. Rodamos então a segunda tomada. Uma terceira e uma quarta. Tudo na apnéia, sem respirar entre uma e outra. Maquiadoras, operador de boom, assistentes, foquistas, todos desesperados para dar seus retoques após cada tomada, mas fui segurando o batalhão. Então alguma coisa cedeu. A Julie (posso chamá-la assim? É como todos a chamam) havia aprendido como deveria fazer a cena e já não precisava ser carregaFERNANDO MEIRELLES, descrevendo uma das cenas mais difíceis do processo de filmagem.

Outros filmes que concorrem à Palma de Ouro no 61.º Festilval de Cannes The Palermo Shooting, de Wim Wenders (Alemanha) La Mujer sin Cabeza, de Lucrecia Martel (Argentina) Leonera, de Pablo Trapero (Argentina) Le Silence de Lorna, de Jean-Pierre e Luc Dardenne (Bélgica) Linha de Passe, de Walter Salles e Daniela Thomas (Brasil) Adoration, de Atom Egoyan (Canadá) 24 City, de Jia Zhangke (China) My Magic, de Eric Khoo (Cingapura) Changeling, de Clint Eastwood (EUA) Che, de Steven Soderbergh (EUA) Synechdoche New York, de Charlie Kaufman (EUA) Serbis, de Brillante Mendoza (Filipinas) La Frontiere de L'Aube, de Philippe Garrel (França) Un Conte de Noel, de Arnaud Desplechin (França) Delta, de Kornel Mundruczo (Hungria) Waltz with Bashir, de Ari Folman (Israel) Gomorra, de Matteo Garrone (Itália) Il Divo, de Paolo Sorrentino (Itália) Uc Maymunm, de Nuri Bilge Ceylan (Turquia)

23 Revista Coito Cerebral Ano 1 | N.º 3 | Maio de 2008


A secretária que queria ser homem um conto de RICARDO RODRIGUES

Existem casos envolvendo a mente humana que parecem histórias absurdas extraídas de uma mente muito criativa. Mas Rejane existiu. Rejane habitou um mundo só seu, que para ela significava o único onde podia afirmar a realidade das coisas. Rejane ansiou amar, e todas as dúvidas de sua vida foram embora quando descobriu o que era de fato. Rejane amou, Rejane queria ser amada pelo que era. Mais do que uma história de amor, a história de Rejane evidencia o lado oculto do ser humano. No seu caso, o lado oculto da sexualidade. E nem sempre foi fácil assumi-lo. Rejane levou sua descoberta até as últimas conseqüências, e fez da sua identidade verdadeira uma arma contra si mesma. Essa é a vida deflorada de Rejane, uma heroína deste mundo excessivamente real.

24 Revista Coito Cerebral Ano 1 | N.º 3 | Maio de 2008


No dia seguinte, na redação da revista, Mauro foi o primeiro a notar alguma coisa estranha em Rejane. Ela não entrou em detalhes quando ele perguntou o que estava acontecendo, mas disse que estava mudada, e fez questão de não dizer que era uma nova mulher, pois não era mais mulher. Foi para a sua mesa e organizou toda a agenda, com a maior rapidez que pôde, não estava para brincadeiras naquele dia. O segundo dia louco de sua vida. Quando Gilda chegou, linda e vestida de vermelho, Rejane foi além das implicações de sua mudança interior. Agora, o fato de ser homem estava também na sua pulsão sexual, na sua libido, no seu tesão de macho. Gilda sentiu seu corpo tremer, pois qualquer pessoa sabe quando está sendo considerada um alvo de desejo. Rejane cumprimentou-a e a colocou a par da agenda do dia, e Gilda foi para sua sala atordoada. Ficou pensando naquela possibilidade, e achou a idéia totalmente maluca. Rejane era uma funcionária exemplar, eficiente como nenhuma outra, simpática, embora nunca tenha contado nada sobre a sua vida. Não que isso fosse um problema, mas é comum entre pessoas que se conhecem bem falarem dessas coisas. “Verdade seja dita”, falou Gilda pra si mesma, “Rejane é uma mulher atraente, misteriosa e interessante”, mas nunca havia pensado nisso. Mas teve que pensar, durante todo o dia, era de carne e osso. À tarde, Rejane ligou para Olivia, aflita, querendo contar a novidade, e mesmo cheia de trabalho Olivia atendeu o seu chamado. Encontraram-se para tomar um suco na lancheria em frente ao prédio da redação, mas Rejane preferiu uma cerveja. Contou tudo para a amiga, pausadamente, argumentando cada frase, não por ter que explicar algo para as pessoas, mas porque queria que a amiga lhe entendesse. Naquela tarde Olivia se encontrava dispersa e inquieta, mas prestou atenção na amiga. Em princípio Olivia achou tudo muito estranho, e continuou achando, mas apoiava aquilo que Rejane fizesse para sentir-se bem consigo mesma. Até porque não era problema nenhum alguém sentir atração pelo mesmo sexo, não para ela. Só achou estranho o fato de Rejane ser tão taxativa ao afirmar que agora é homem, como se fosse igual aos homens, como se tivesse pênis e agisse como um homem. Até soltou uns arrotos de homem, o que assustou Olivia no primeiro momento, mas fazendo-a rir logo depois. Disse que tudo bem, tudo o que melhora a nossa vida é bem vindo, só disse para tomar cuidado para que tudo não fugisse ao seu controle. Despediu-se da amiga, agora com um aperto de mão, e Rejane voltou ao trabalho. Mauro correu assim que a viu entrar, com uma revista em mãos, e todos sorriam para ela que nada entendeu. Quando abriu as páginas da revista, viu sua foto ao lado de Roberto Fish. Abaixo, uma nota dizia “O astro principal da novela das oito foi clicado ao lado de Rejane Soares da Silva, funcionária da revista GNews. Rejane é bonita, simpática, e pode estar fisgando o coração do nosso galã”. Rejane quase morreu de rir, e ninguém entendeu nada. Quando conseguiu recuperar as forças, disse que a revista só iria queimar a imagem do ator, que estava sendo fotografado com um homem. Novamente ninguém entendeu nada, mas logo esqueceram ao perceber que num ambiente onde havia tantos homossexuais um a mais um a menos não iria fazer diferença. Ainda cansada de rir, ou melhor, cansado de rir, Rejane encontrou um recado em meio a flores dizendo “Rejane, não me lembro do que aconteceu, por sorte encontrei seu número no bolso da minha calça e deduzi que estava comigo. Se puder, me ligue ainda hoje. Se não estava comigo, pode jogar o papel fora. Donatto”. Engraçado seu amigo Donatto, pensou, e ligou para ele. Tranqüilizou-o com relação a qualquer coisa, que não havia acontecido nada entre eles, pois Rejane jamais faria sexo com um amigo homem. Donatto compreendeu a sua preferência sexual, embora fosse mais do que isso, e agradeceu por tudo, e disse que estava sentindo-se melhor desde quando acordou. Rejane também, e que agora era outra pessoa, com mais ânimo, pois as coisas haviam ficado mais claras para ele. E combinaram de beber algum dia desses. Gilda ainda estava em sua sala, quieta, sem suas gargalhadas habituais, com receio de sair para a rua. Iria encontrar Rejane lhe observando como um tarado, e iria gostar, mas não queria gostar, porém iria gostar. Como não poderia ficar trancada para sempre, e já havia passado do horário de expediente, resolveu sair. Pegou sua bolsa, seu casaco vermelho e abriu a porta. Rejane não estava em sua mesa, mas perto do bebedor. Acenou de longe e caminhou na direção

do elevador. Rejane pensava em coisas para dizer, mas era melhor observá-la, pois as mulheres preferem muito mais esse jogo da sedução do que palavras, e um homem precisa cuidar para que suas investidas não se percam no caminho. Então, incomodada com a situação, Gilda disse que se estava pensando em convidá-la para sair aceitava, mas não naquela noite, pois tinha uma recepção agendada em seu quadro de compromissos. E entrou no elevador. Rejane sorriu, Gilda já era sua. Na manhã seguinte, Mauro veio cobrar-lhe a omissão daquele fato. Rejane disse que nunca omitiu nada, pois também desconhecia essa mudança. Agora que é homem não há nada mais para esconder, e Mauro lhe desejou boas vindas ao clube dos sem-medo. A vida de Rejane estava perfeita. Na noite seguinte iria sair com Gilda, a primeira mulher de sua vida. Era, então, um homem virgem. Iriam ao cinema, depois jantar e para fechar a noite iriam dançar em qualquer lugar badalado da cidade. Estava sentindo-se um garanhão, um rei, exatamente como Donatto deveria sentir-se. Mas não deixou de ficar nervoso. Era o primeiro encontro que teria com uma mulher, e na verdade, não sabia muito bem o que fazer. Por isso ligou para Olivia, com certeza teria algum conselho, saberia o que uma mulher gosta no primeiro encontro. Olivia respondeu com o maior prazer, passando algumas dicas do que não fazer, e agir naturalmente, pois as mulheres gostam sempre de espontaneidade. Disse para que não decorasse fala nenhuma, isso sempre soa ridículo. E agradeceu. Saiu mais cedo naquela tarde para comprar uma roupa nova. Queria comprar um terno preto, como viu em uma vitrine, mas infelizmente ainda estava em um corpo com seio e sem pênis, e podia ser inoportuno vestir-se assim. Então, preferiu uma calça reta risca-de-giz e uma camisa branca. A vendedora elogiou sua escolha, e Rejane não pôde deixar de cantá-la, o que a horrorizou. Mas era normal, pensou Rejane, as mulheres, em geral, sentem-se incomodadas com cantadas. Foi para casa descansar e preparar-se para a noite seguinte, mais psicologicamente do que qualquer outra coisa. Era impossível esconder seu nervosismo de principiante. Como seria beijar a boca de Gilda? E passar a mão em seus seios? Gilda era uma mulher incrível, dessas que só por respirar já despertam reações físicas nos homens. Tinha um perfume espetacular, como se fosse seu mesmo, e não manipulado por fórmulas e essências sintetizadas. Era coisa de bicho, sentiu e pronto. Não precisa de palavras ou qualquer outro artifício para a conquista. Já estava tão envolvido por Gilda que não se conteve em expressar o que sentia em um pedaço de papel. Era um homem poeta e precisava poetar. Só lhe vinha a palavra Gilda na cabeça, mas aos poucos as outras atiravam-se do balcão de suas novas emoções. Gilda, mar sem sal, Gilda, açúcar invisível no ar, Gilda, língua sem sensor, Gilda, gosto de céu, Gilda, que gosto tem você? Foi esse seu primeiro poema para Gilda. Iria escrever loucamente no dia após o seu encontro com Gilda, e essa seria a sua terceira loucura. Gilda, Gilda, Gilda. Um dia escreveria um livro para Gilda. E de tanto pensar em Gilda foi dormir, às quatro da manhã, completamente excitado com a idéia do encontro. Quando acordou, como se tivesse dormido dias, estava feliz. Urinou de pé, escovou os dentes e bebericou uns goles de café preto do dia anterior. Tomou um banho de quinze minutos e vestiu-se, louco de vontade que estava em ver Gilda. Seria amor? Não, não podia, homens não apaixonam-se com essa facilidade. Dr. Freud, Dr. Freud, o que o senhor diria sobre isso?, pensou, mas logo convenceu-se de que era um homem dotado dos mais belos sentimentos, e era por isso que se apaixonava com tamanha rapidez. Quando entrou na redação todos já sabiam do encontro, só não sabia como essa informação havia vazado tão rápido. Gilda havia chegado mais cedo, e o seu perfume já estava em toda a sala, embora só ele sentisse. Gilda fingiu que nada estava acontecendo, pois preferiu manter uma postura mais reservada no trabalho. Mas uns olhares escaparam durante o dia, era inevitável. A cada telefonema que Rejane fazia pensava no que Gilda estava pensado lá dentro, queria estar em sintonia com seus pensamentos. Ou não, as coisas são melhores quando com segredos. Gilda saiu do serviço às três horas da tarde, e confirmou rapidamente o horário do encontro. Estaria no cinema às 17 horas para pegarem a sessão das 17:30. Rejane ficou coordenando o resto do trabalho. Precisava marcar algumas reuniões, revisar umas pautas, instruído por Gilda, e aprovar alguns en-

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saios fotográficos para o mês seguinte. Mauro não sabia qual modelo escolher para o ensaio principal, pois para ele os dois eram lindos, mas Rejane escolheu o que tinha o pênis menor. Era um rapaz de vinte e três anos, e, por ordem de Gilda, não alteraram a anatomia do seu órgão, por causa de umas conversas que teve com Rejane sobre realidade e identificação do público. Mas as pessoas querem fantasiar a vida chata e miúda, argumentou Gilda, e Rejane disse que podia até ser, mas um homem com pau pequeno iria tranqüilizar-se sabendo que existem outros iguais a ele. Mas homens heterossexuais não lêem nossa revista, rebateu Gilda, e Rejane disse Você é que pensa, as pessoas são muito mais hipócritas do que você pode imaginar. E aprovou a idéia do seu secretário. No mês seguinte, um homem com o pênis não tão avantajado estaria no ensaio principal, pela primeira vez alguém abaixo de vinte e dois centímetros de computação gráfica. Rejane estava certo. No mês seguinte, no mesmo dia que a revista chegou às bancas, dezenas de cartas e telefonemas chegaram à redação. A maioria de homens elogiando a iniciativa da revista em mostrar o real de muitos homens, outros dizendo que preferiam ver um pênis maior, outros de mulheres pedindo a forma de contato com o rapaz do ensaio, que ficou mais famoso do que podia esperar. Até porque não tinha o pênis tão pequeno, mas com relação ao que era feito antes era uma novidade no mercado editorial daquele segmento. Seria por esses dias que Rejane passaria por sua quarta loucura, o extremo de sua sexualidade. Às quatro horas já estava pronto, pois não demorou muito para ir embora depois que Gilda saiu. Tomou banho e passou um perfume cítrico. Em dez minutos estava pronto. Chegou às 16:40 no cinema, para não correr o risco de deixar Gilda esperando, que se atrasou quase meia hora. Chegou e logo pediu desculpas, mas ainda estavam dentro do horário. Rejane não se importou. A sala não estava cheia, as pessoas não gostavam muito de cinema espanhol. Sentaram-se no centro da sala e Rejane parecia um adolescente saindo com a primeira namorada. Nem prestava atenção no filme, só pensava no que iria fazer. Por seu nervosismo, Gilda tomou a iniciativa e segurou a mão de Rejane, que logo possibilitou um abraço. Ficaram assim por todo o filme. Rejane louco para beijar, Gilda louca para ser beijada. Mas não queriam precipitação nenhuma. Quando o filme acabou, o beijo quase aconteceu, não fosse as luzes se ascenderem, mas ainda deu tempo de Rejane passar a mão nas pernas de Gilda. Famintos, foram jantar em um lugar agradável, perto do cinema, onde serviam refeições rápidas e saborosas. Os dois conversaram muito sobre vários assuntos, sempre em sintonia de olhares, era como se já se conhecessem há anos. Lá por volta das 22:32 não havia mais assunto, mas a comunicação continuava. Era certo que estavam pensando na mesma coisa, e a idéia de dançar teve que ficar para outro dia. Pagaram a conta e foram direto para o apartamento de Gilda, que não ficava muito longe dali. Era um apartamento amplo, de três quartos, apesar de morar sozinha. É que um dia eu quis família, disse ela, E não me desfiz do apartamento. Rejane estava maravilhado. Gilda abriu uma garrafa de espumante e Rejane a beijou. Beijou com toda a sua força de homem, agarrando-a pelos braços sem dar tempo para respirar. Gilda correspondeu na hora, louca que estava para que esse momento chegasse. Rejane perguntou se ela queria mesmo fazer sexo, e Gilda mandou-o calar a boca e agir mais. Arrancaram a roupa um do outro e jogaram-se no tapete. Gilda pediu que Rejane mordesse seus seios, e ele mordeu-a inteira, de leve, como gostava. Esfregaram-se por mais de duas horas, no chão e na cama, e parecia que estavam fazendo sexo com mil pessoas ao mesmo tempo. Gilda era uma mulher cheia de fogo, insaciável, e lambia Rejane. Rejane lambia Gilda. E passaram a noite toda juntos. Na manhã seguinte não foram trabalhar de tão exaustos que estavam, e ninguém reclamou, pois sabiam bem o motivo. Mauro gerenciou os compromissos profissionais de Gilda, conforme suas orientação por telefone, e disse, ainda, que só iria para a revista na parte da tarde. Assistiram desenho animado durante toda a manhã e almoçaram juntos, em casa mesmo, pois Gilda era muito boa na cozinha. Enquanto Gilda cozinhava, Rejane assistia aos esportes na televisão. O almoço fora saboroso, e Gilda ficou contente com os elogios de Rejane. Contou que era a primeira vez que cozinhava para alguém, e Rejane disse que nem ao menos sabia cozinhar. Riram de bobagens por horas. No começo da

tarde, Gilda e Rejane chegaram juntos, e não era necessário explicar coisa alguma. Mauro acabava de agendar uma reunião quando Rejane chegou e assumiu o seu posto. O amigo perguntou se tinha valido a pena, e o sorriso de Rejane explicou tudo. Mauro pediu que não contasse detalhes, pois detalhes do sexo com Gilda não lhe interessava, mas parabenizou o amigo pela conquista. Dentro da redação, Gilda agia como se Rejane fosse seu colega de serviço como outro qualquer, mais um subordinado, pois detestava relações amorosas em um ambiente de trabalho. Rejane não importava-se, pois sabia que fora dali aquela mulher era toda sua. E ligou para Olivia. Queria contar a novidade, compartilhar com uma pessoa querida o seu momento de alegria. Olivia escutou o relato, sem detalhes, claro, e realmente sentiu-se feliz por Rejane, mas havia algo em sua voz que não deixava Rejane tranqüila. Insistiu para que dissesse o que houve, pois com certeza encontraria alguma forma de poder ajudar, mas Olivia, cheia de educação, disse que não, ela precisava resolver sozinha. Desejou tudo de bom, mais uma vez, e desligou o telefone. Apesar da preocupação com a amiga, Rejane não podia deixar de sentir-se feliz com o momento de sua vida. Entre um compromisso e outro, uma conversa ao telefone e uma vistoria na agenda de Gilda, Rejane parava para escrever um poema. Poemas eróticos, poemas de amor, poemas de todos os tipos. O primeiro se chamou Entre as Línguas, e dizia assim: A lambida é doce / mas amarga / mas boa também / A lambida é no pescoço / A lambida é no corpo / Mas a minha é na alma / Bem lá no fundo / Onde ninguém enxerga / mas alcança / com carinho. E escreveu por toda a manhã. Mauro convidou-a para almoçar com ele, mas Rejane nem escutou, então, foi com Reinaldo, um novo funcionário da redação, com quem passaria a noite inteira trepando. Gilda saiu para o almoço também, e nem precisou fazer que não estava notando Rejane pra escapar dos olhares, pois esse, tão concentrado em suas incursões pela poesia, não notou-a realmente. Quando os funcionários voltaram, Rejane ainda estava em sua mesa, agora cheia de papéis com versos intermináveis. Escrevera tanto que os seus dedos indicadores estavam com pequenos cortes em suas extremidades, por causa do atrito com suas outras unhas. Mal atendia aos pedidos internos de Gilda, que ficou preocupada. Foi um dia inteiro mergulhando no universo do realismo fantástico, onde era uma personagem abstrata com bases reais entrando nos sentimentos de Gilda. Era como nos desenhos animados do Walt Disney, era como o psicodelismo dos anos 1960. Rejane invadiu um mundo sem definição, um mundo cheio de alucinações, estava como uma drogada. Sua droga se chamava Gilda, e poucas pessoas tinham acesso a ela. Pensou no tráfico de drogas, e Gilda seria a droga mais cara. Nas bocas de fumo, jovens ricos procurariam desesperados pela droga de nome sedutor, e venderiam suas almas em troca de uma prova. Rejane provara todo o seu potencial, e estava com overdose de Gilda. A polícia especializada tentaria em vão percorrer os morros e toda a cidade atrás dos responsáveis pela droga, não para prendê-los, mas para adquirir a droga também. Seria o começo do fim da saúde mental de toda a cidade, e Rejane já estava tomada por seus efeitos. Quando o expediente acabou, e ainda estava entorpecida da racionalidade, Gilda bateu em seu ombro e disse-lhe que estava na hora de ir embora. Rejane disse Tudo bem, mas só se for para a sua. Gilda levou-o consigo, e nem tiveram tempo de jantar, pois Rejane estava louca para deitar-se com sua amada. Fez-lhe um carinho no rosto e Gilda não retribuiu. Perguntou o que estava acontecendo, e disse Estou preocupada contigo Rejane, estava longe o dia inteiro, embora bem na frente de minha sala. O que há contigo? Rejane disse que estava bem, apenas feliz demais com a noite passada. E fizeram sexo, dessa vez com mais amor.

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CONTINUA...


Lorena amava os homens. Não apenas sexualmente, mas a partir de um leque muito mais amplo. Não, não era submissa, mas os amava. E não resistia. Sorriso, barba, voz modulada, voz de barítono. Voz de trovão... Mas o que mais gostava era do antebraço masculino. Lorena costumava dizer: “Do ombro até a mão são caminhos carinhosos de amores perdidos, são ligamentos rompidos só da mente. São articulados sentidos em uma desesperada vontade. O antebraço é o repouso do sossego no inverno. Os dedos, indicadores de idade, de pedidos, de persuasão positiva... O braço, membro pendurado para fora do corpo, quem sabe por acidente, gesticula para o corpo oposto, analisa medidas, agarra sua presa no coito sagrado que é o abraço...”. Enquanto relembrava suas teorias o namorado bebia uma xícara de café, e mal sabia ele que jamais, em nenhuma ocasião, nada em si fora mais importante do que seus antebraços tatuados. E Lorena nem ao menos sabia que o namorado não tinha os dentes ciso, uma enorme cicatriz nas costas e a unha do dedão do pé esquerdo acometida por fungos.

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O grupo de São Paulo, que faz muito mais sucesso na Europa do que no Brasil, prepara o lançamento de seu segundo álbum para junho. Essa faixa foi disponibilizada para download gratuito no website da banda. Soando menos experimental que os trabalhos anteriores, Rat is dead é uma faixa mais rock do que eletrônica, e, segundo a vocalista Lovefoxx, representa um disco mais maduro que o anterior.

Problemas pessoais à parte, Amy Winehouse é uma artista sensacional, disso não há dúvidas. Seu segundo album, Back to Black, lançado em 2006, é uma obra que reflete a união perfeita entre composição, voz e arranjos. Love is a Losing Game, na versão demo original, está presente no disco 2 da versão deluxe do tão aclamado album. Com apenas os acordes do violão, Amy consegue colocar ainda mais profundidade à interpretação na já excelente versão de estúdio.

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Por um bom tempo relutei em ouvir Duffy, por dois motivos: 1) achava que se tratava de mais uma cantora pop sem graça; 2) opinião errada, gerada por um grande engano com relação ao seu nome: pensei tratar-se de Hillary. O fato é que Duffy até poderia se passar por uma dessas artistas, mas a primeira faixa de seu album de estréia, Rockferry, que dá título ao disco, mostra o contrário. Mercy, single de sucesso, é uma canção super bem sacada, com vocais que lembram cantoras como Eta James.

A canção Love Song faz parte do album Little Voice, lançado este ano, mas não é exatamente a estréia de Sara Bareilles. Em 2003, o album independente Careful Confessions trazia uma amostra do talento dessa pianista norte-americana. Algumas faixas de Careful... Foram regravadas para este album, como Fairytale e a belíssima Gravity, que na versão deluxe aparece, no disco 2, interpretada ao vivo e com direito a justiticativa para a letra (segundo Sara, Gravity foi uma canção escrita sobre sua primeira decepção no amor). Love Song, sucesso na parada HOT 100 da revista Billboard, entrou na trilha sonora do filme O amigo da noiva, e já é sucesso garantido em terras brasileiras.


Perfectly Clear, o novo album da Jewel, estará nas lojas a partir do dia 3 de junho. O primeiro single, Stronger woman, reafirma um gênero que sempre influenciou sua criação musical: o folk. Apesar de ser um elemento que agrada aos fãs, neste trabalho as opiniões ficaram divididas. Mais para o lado do pop, o resultado final, porém, não decepciona.

Something is gonna change, album de estréia de Leela James, está mergulhado na soul music, num momento em que outras novas cantoras, que resolveram trilhar o caminho da música negra, preferem o jazz e R&B. A faixa Music resume o espírito do auge da gravadora Motown. O videoclipe mescla cenas antigas de um bairro negro de NY com cenas atuais, construindo um paralelo entre a infância e a vida adulta da personagem que Leela representa.

Rainha é uma canção que, segundo a cantora, é uma homenagem ao afrobeat, um de seus ritmos favoritos. Sua primeira apresentação em Porto Alegre trouxe o repertório do album entitulado CéU, em faixas como Malemolência, Lenda e Roda. Aclamada nos EUA e Europa, a cantora começa a ganhar projeção no Brasil, tornando-se uma das grandes revelações da música brasileira.

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Esta canção foi gravada no album Blue, de 1971, considerado um dos melhores discos de rock da história da música norte-americana. Com sua voz característica, Joni é um símbolo de sua geração, marcando época com a mistura de jazz e folk rock. A case of you está, ainda, na trilha sonora do filme Practical Magic, protagonizado por Nicole Kiedman e Sandra Bullok.

Night Terror está no album de estréia de Laura, Alas I cannot swim. Conhecida primeiramente através do MySpace, como muitos jovens cantores de sua geração, rapidamente foi convidada para gravar dois EPs (The London Town e My Manic & I), e o lançamento do album aconteceu logo depois a convite da Virgin Records. Preste atenção na letra e interpretação dessa faixa, e também no sofisticado arranjo de cordas no final. Leia mais nas páginas 16 e 17.


Ao arquitetar um abraço / construir um beijo / inaugurar o sexo / Abre-se portas / fecha-se olhos / no doce sabor da ignorância adquirida / desmorona a vida / nas paredes perdidas / desse amor condenado




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