Revista de Saúde Pública de Florianópolis - 2ª Edição

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Ano 2 - Número 2

Florianópolis, dezembro de 2014

Nesta Edição Trabalhos selecionados da 2ª edição do Prêmio de Boas Práticas em Saúde de Florianópolis ISSN 2318-5783


Ano 2, número 2, dezembro de 2014 INFORMAÇÃO PARA AUTORES

A Revista de Saúde Pública de Florianópolis (RSPF) propõe-se a ser uma publicação científica da Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis e tem como objetivo estimular a produção de conhecimento científico em Florianópolis, permitindo a legitimação e compartilhamento das experiências exitosas desenvolvidas pelos profissionais e equipes, possibilitando o aprimoramento da atenção e da gestão no SUS. Para maiores informações acesse: http://www.pmf.sc.gov.br/sites/gpss/ Tiragem 300 exemplares.

Coordenação e Informações Setor de Educação em Saúde Assessoria em Gestão de Pessoas Secretaria Municipal de Saúde Prefeitura Municipal de Florianópolis Av. Professor Henrique da Silva Fontes, 6100 88036-700, Trindade, Florianópolis, SC Tel. (55 48) 3239-1593 – educaemsaude@gmail.com Editoras chefes Melissa Costa Santos Dannielle Fernandes Godoi

Prefeito César Souza Júnior Vice-Prefeito João Amim Secretário de Saúde Carlos Daniel Magalhães da Silva Moutinho Júnior Secretário Adjunto Núlvio Lermen Junior Diretoria do Fundo Municipal de Saúde e Logística Armindo Santoro Diretoria de Planejamento, Informática e Captação de Recursos Edenice Reis Da Silveira Diretoria de Vigilância em Saúde Leandro Pereira Garcia

Conselho Editorial Melissa Costa Santos Dannielle Fernandes Godoi Evelise Ribeiro Gonçalves Evelyn Cremonese

Diretoria de Alta Complexidade, Regulação, Avaliação, Controle e Auditoria Sônia Maria Polidório Pereira Diretoria de Média Complexidade, Serviços Especiais e Ações Regionais Dannielle Fernandes Godoi

Secretaria Executiva Evandro Silveira Projeto Gráfico Matheus Pacheco de Andrade

Diretoria de Atenção Primária à Saúde Jorge Ernesto Sergio Zepeda

Avaliadores Ad Hoc desta edição Aline Massaroli, Eduardo Nunes da Silva, Gisele Damian Antônio, Joyce Ribeiro Rothstein, Katheri Maris Zamprogna, Marcelo Florentino, Michelli Vitória Silvestri, Nathalia Ferraz Oliscovicz Não é permitida a reprodução de partes do conteúdo desta publicação, sob quaisquer meios, sem autorização expressa das editoras chefes da revista.

Diretoria do Centro de Controle de Zoonoses Fábio De Melo Chaves Indá Diretoria de Bem Estar Animal João Eduardo Pereira Cavallazzi

Revista de Saúde Pública de Florianópolis / Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis Ano 2, n. 2 (dez. 2014) – Florianópolis: Secretaria Municipal de Saúde, 2014 Ano 2, n. 2 ISSN: 2318-5783 1. Saúde Pública. Periódico. I. Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis, SMS-Florianópolis

Imagem da capa por Lionel Baur (oeuvre perso) [GFDL (http://www.gnu.org/copyleft/fdl.html) or CC-BY-SA-3.0 (http://creativecommons.org/licenses/by-sa/3.0/)], via Wikimedia Commons http://commons.wikimedia.org/wiki/File%3AFortaleza_Sao_Jose-Florianopolis-Brasil.JPG Impresso no Brasil Venda proibida. Distribuição gratuita


Ano 2 - Número 2

Florianópolis, dezembro de 2014

Nesta Edição Trabalhos selecionados do 2ª edição do Prêmio de Boas Práticas em Saúde de Florianópolis ISSN 2318-5783



Sumário Editorial

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Acesso Avançado à Estratégia de Saúde da Família

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O acolhimento como instrumento de humanização do atendimento em Fisioterapia no âmbito do NASF 9 Monitoramento e Avaliação como ferramentas de gestão do processo de trabalho integrado entre Núcleos de Apoio à Saúde da Família e equipes de saúde da família 14 Implantação das Práticas Integrativas e Complementares na Atenção Primária à Saúde de Florianópolis com base na cogestão e educação permanente em saúde 19 Grupo de Saúde Bucal no Centro de Saúde Agronômica: uma estratégia para ampliação do acesso e promoção da saúde

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Controle ambiental da tungíase (bicho de pé): papel integrado entre Atenção Primária, Centro de Controle de Zoonoses e Bem Estar Animal 31 A experiência de Florianópolis na construção de fluxos de acesso para a regulação das especialidades odontológicas no SUS 36 Regulação e gestão de filas de espera: uma experiência exitosa do Serviço de Fisioterapia do Município de Florianópolis 40 O monitoramento de média e alta complexidade: implicações para a gestão municipal na tomada de decisões 46



Revista de Saúde Pública de Florianópolis - Ano 2 - Volume 2

Editorial Melissa Costa Santos Dannielle Fernandes Godoi Há um ano a Secretaria Municipal de Saúde lançou a Revista de Saúde Pública de Florianópolis (RSPF), com objetivo de estimular a produção de conhecimento científico, permitindo a legitimação e compartilhamento das experiências exitosas desenvolvidas pelos profissionais e equipes de Florianópolis. Durante este primeiro ano, em parceria com a Universidade Estadual de Santa Catarina, foi possível estruturar fluxos de submissão e publicação de artigos, fortalecer a equipe editorial, iniciar a formação da equipe de revisores e ampliar as estratégias de publicização e divulgação da revista. Assim, é com satisfação que lançamos a segunda edição da RSPF, com artigos que refletem iniciativas locais individuais de trabalhadores do SUS de Florianópolis ou, ainda, trabalhos em parceria com instituições de ensino. Esta edição traz 9 artigos, sendo os 6 primeiros com enfoque na Atenção Primária à Saúde (APS) e os demais na Média e Alta complexidade. Os primeiros artigos discutem as estratégias adotadas para priorização do vínculo, acesso e qualificação dos serviços de saúde da APS. A qualificação dos serviços também é abordada no terceiro artigo, que discute a necessidade de um sistema municipal de monitoramento e avaliação das ações e resultados do NASF e maior integração com o processo de planejamento das equipes apoiadas. O quarto artigo trata sobre a implantação das PICs na APS de Florianópolis, tendo como eixos norteadores a cogestão e a educação permanente em saúde. O quinto artigo aborda a experiência intersetorial dentro da SMS no controle da tungíase no município. O sexto artigo reforça o acesso como componente essencial da qualificação dos serviços, abordando a estruturação de um grupo de saúde bucal como estratégia para a ampliação do acesso à assistência odontológica para crianças de até 12 anos. Na sequencia, dois artigos tratam da experiência de Florianópolis na construção de fluxos de acesso para a regulação das especialidades odontológicas e fisioterapia no SUS, destacando a necessidade de qualificação dos encaminhamentos da APS como estratégia de gerenciamento da fila de espera aos serviços de média complexidade. O último artigo aborda o uso do monitoramento como uma ferramenta de gestão para diagnóstico da situação real da oferta e da demanda de média e alta complexidade, auxiliando na tomada de decisões e otimizando a prestação de serviços de saúde. Mais do que falar sobre a variedade de temas e diversidade das áreas de conhecimento envolvidas, este editorial gostaria de chamar a atenção do leitor para a qualidade das experiências relatadas. A RSPF vem se constituindo em um dos meios de divulgar as experiências exitosas e pesquisas desenvolvidas em nossa rede municipal de saúde, estimulando a troca de saberes e produção científica, pilares básicos para o desenvolvimento do caráter investigativo e crítico de trabalhadores comprometidos com o SUS. Desejamos que gradativamente a RSPF contribua para a disseminação do conhecimento dos trabalhadores e parceiros do SUS de Florianópolis, potencializando o fluxo de informações e a socialização das pesquisas aqui desenvolvidas, propiciando uma maior visibilidade à produção científica local e contribuindo para a reflexão, inspiração e transformação das práticas dos trabalhadores do SUS.

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Revista de Saúde Pública de Florianópolis - Ano 2 - Volume 2

Acesso Avançado à Estratégia de Saúde da Família João Paulo Mello da Silveira (jpaulo_rs@yahoo.com.br) Ronaldo Zonta Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis - SC

Resumo O desempenho dos sistemas de saúde é condicionado à facilidade de acesso da população aos serviços de atenção primária, bem como à qualidade da atenção oferecida. As demais ações programáticas e de vigilância derivam do contato das pessoas com seus profissionais de referência. Este artigo apresenta soluções encontradas em uma unidade de Florianópolis visando adequar um modelo de atendimento ao público que priorize o vínculo e facilite o acesso aos serviços de saúde. As equipes se organizam para ofertar atendimentos para demanda espontânea e programática em todos os turnos, com escuta qualificada e vínculo visando a longitudinalidade enquanto medida de qualidade do atendimento. Este modelo segue o ideal de acesso avançado em que as consultas ocorrem em até 48 horas após a busca por atendimento, realizando priorizações de acordo com critérios de equidade e integralidade. Cada equipe conta com um profissional para avaliação da demanda e disponibiliza celular, e-mail e marcação presencial em todos os turnos como formas de acesso avançado. As melhorias dos modelos de acesso ao sistema e prestação de serviços são fundamentais na qualificação das redes de saúde. O diferencial para um serviço de qualidade está na incorporação de tecnologias leves para gestão da clínica. Palavras-chave: Atenção Primária à Saúde, Gestão da Clínica, Longitudinalidade, Processo de Trabalho. Introdução processo de trabalho devido a imposição de uma O Sistema Nacional de Saúde brasileiro ou única forma de vínculo entre a população atensistema único de saúde (SUS) é reconhecido atu- dida e os profissionais. almente pela comunidade internacional como Em unidades maiores e de alta frequentação a referência de implantação e cobertura, em gran- vinculação com as equipes se torna um problema de parte devido aos excelentes resultados e me- de difícil enfrentamento, em especial quando se lhoria de importantes indicadores de saúde do busca a continuidade das linhas de cuidado frenpaís¹. te a rotatividade de profissionais e instabilidades Sabe-se que o desempenho de sistemas nacionais de saúde está condicionado à facilidade de acesso da população aos serviços de atenção primária (APS), bem como à qualidade da atenção oferecida². As demais ações programáticas, vigilância e procedimentos, derivam de um contato efetivo das pessoas com seus profissionais de referência. Na experiência brasileira a implementação da atenção básica seguiu um desenho de adscrição por endereço, facilitando a vinculação inicial e ações de vigilância com base territorial. Este desenho fez sentido para o planejamento do sistema, mas constitui contudo, um desafio ao

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comuns à política municipal. Este artigo apresenta um relato de experiência das principais soluções encontradas em uma unidade de APS em Florianópolis visando criar e manter um modelo facilitado e eficiente de atendimento ao público articulado com a gestão inteligente das agendas profissionais. Método Com base nas ações de planejamento e a partir do empenho de dezenas de profissionais, foi possível propor, testar e optar pelas melhores formas de resolver problemas comuns à rotina das equipes em sua relação com a população.


Pautada pelos princípios de uma atenção primária forte², assim como por uma ética de solidariedade e humanização dos serviços, estas soluções procuram integrar a flexibilidade de agenda mantendo a vinculação na maioria absoluta dos atendimentos realizados pelas equipes de saúde da família (ESFs). As soluções em destaque foram consolidadas no período de 2010 a 2012 e seguem em uso até o momento atual, embora seja claro que tais ações somente foram possíveis devido à base firmada por todos que contribuíram com o processo durante seu desenvolvimento.

bilidade compartilhada pelas linhas de cuidado individual e familiar por diferentes profissionais dentro da mesma equipe ao longo dos anos4. Diariamente são ofertados atendimentos médicos, odontológicos e de enfermagem em três turnos, para demanda espontânea e programática com escuta qualificada e vínculo, ou seja, as pessoas que buscam o posto são ouvidas por um profissional da equipe ou encaminhadas preferencialmente para este, como forma deliberada de potencializar a longitudinalidade enquanto medida de qualidade do atendimento.

As consultas do mesmo turno são ofertadas O centro de saúde em questão (CS Saco Gran- de acordo com a demanda, passando por acolhide) abriga seis ESFs, e vincular cada uma das mento e classificação de risco. Parte-se do prin14.000 pessoas às suas respectivas equipes exige cípio que o agendamento de consultas eletivas habilidades de comunicação, planejamento se- deve ocorre preferencialmente em até sete dias, manal e organização coletiva dos profissionais. sendo direcionadas para vagas no mesmo turno, A coordenação da unidade durante o processo no mesmo dia ou na semana vigente sempre que é reconhecida como linha condutora de uma di- necessário. Este modelo organizativo segue o idenâmica participativa capaz de promover proposi- al de acesso avançado, em que os atendimentos ções criativas dentro de um modelo transparente ocorrem em até 48 horas após a identificação da e horizontal de gestão de pessoas e mediação de demanda. conflitos³. Dentre os principais instrumentos de Para oferta de assistência e continuidade do gestão utilizados se destacam as reuniões colegia- cuidado com máxima resolubilidade é possível das, o planejamento semanal e os espaços auto- buscar capacidade de atendimento diário e agengestionados de educação permanente. damento em 48 horas para qualquer problema Discussão No modelo apresentado, a rotina da unidade divide-se em atendimento direto ao público e as demais atividades, sendo que as primeiras são prioritárias, na maior parte dos casos, em relação às segundas. Considerando um perfil de alta pressão assistencial e de alta frequentação é imperativo buscar como meta organizacional a redução o tempo de permanência dos usuários dentro da unidade (tempo de espera), bem como o número de visitas ao posto ou profissionais mobilizados para o atendimento de uma mesma demanda. Outra meta fundamental é manter a vinculação das pessoas com suas equipes nas diferentes situações de atendimento, bem como a responsa-

de saúde, realizando priorizações e planos terapêuticos de acordo com critérios de equidade e integralidade, em que pesem determinantes sociais e ambientais da saúde. Quando o balanço entre demanda e oferta encontra limitações, ainda assim é possível organizar as agendas para atendimento programado em até sete dias, mantendo o atendimento para demanda espontânea em todos os turnos como forma de redução do absenteísmo em favor da resolubilidade das intervenções e satisfação dos usuários. Cada equipe se organiza com ao menos um profissional de referência no turno para avaliação da demanda e disponibiliza celular, e-mail e marcação presencial em todos os turnos como formas de operacionalizar o acesso avançado. Em situações de férias, licenças ou afastamentos

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busca-se o planejamento da demanda espontânea com apoio das demais equipes.

oferta de serviços de APS cujos impactos ainda não são bem reconhecidos nem quantificados, O atendimento telefônico via celular serve ainda assim evidentes num modelo em que a tanto para agendamento como para informações vinculação e a longitudinalidade são medidas de em saúde, e é realizado pelos agentes comuni- qualidade. Na organização em duplas ou “áreas tários junto com os agendamentos presenciais irmãs” como foram chamadas, o profissional de no início de cada turno, sendo que cada equipe referência (médico, enfermeiro, odontólogo ou disponibiliza seus próprios contatos telefônicos. técnico) presente no turno faz a escuta qualificaÉ neste momento também que as equipes prio- da da demanda do dia e conta com o apoio dos rizam as agendas para consultas individuais via colegas da área irmã, dispondo de interconsulta demanda espontânea. Elas devem estar aptas a médica, de enfermagem ou odontológica, bem ofertar atendimento oportuno ao longo de todo como agendamentos conforme necessidade. turno. Assim mesmo, a população é orientada Desta forma busca-se reduzir a quebra das linhas a buscar este tipo de serviço nas horas iniciais de cuidado individual e familiar, ainda comuns de abertura da unidade como forma de melhor na fase de implementação do sistema. organizar a demanda. Considerações Finais Este modelo busca adaptar o processo de traO conjunto de benefícios da oferta sustentabalho na APS à peculiaridade do serviço público da de serviços de atenção primária dentro das de Florianópolis, que tradicionalmente oferta redes de atenção à saúde justifica o aperfeiçoaserviços das 8:00 às 12:00h e das 13:00 às 17:00 mento constante dos modelos de atendimento horas, com uma hora de almoço para os profisao público, de processo de trabalho e gestão. sionais. Este desenho provoca a concentração de As evidências de redução das taxas de interdemanda em dois momentos durante o mesmo nação hospitalar e de melhoria de indicadores dia de trabalho. de mortalidade materno-infantil, atribuíveis à As tarefas de agendamento por telefone e implantação do sistema único de saúde (SUS) e e-mail são compartilhadas pela equipe num moao aumento de sua cobertura populacional por delo de revezamento e os ajustes são discutidos serviços de atenção primária constituem uma e programados nas reuniões semanais. Cada sustentação robusta para os esforços de sua conequipe possui números, aparelho e endereço solidação enquanto política de Estado e patrieletrônico próprio disponíveis para referência mônio da população brasileira. nos mais diferentes meios (cartazes, folders, carAs melhorias dos modelos de acesso ao sistetões de visita, identificação por cores). Algumas ma, atendimento ao público e prestação de serequipes já utilizam aparelhos quadriband, ofereviços são fundamentais na qualificação das redes cendo quatro números de operadoras diferentes, de saúde. O diferencial para um serviço de quapara facilitar o acesso num contexto de restrição lidade está na incorporação de tecnologias leves, de renda e fidelização pelas operadoras de telehabilidades de comunicação e gestão da clínica. fonia. A promoção de uma cultura institucional de Outra técnica importante consiste em organiinovação, adaptabilidade, compromisso social e zar as equipes em duplas para apoio multiprofisparticipação são fundamentais nos processos de sional em caso de desfalques e imprevistos. No planejamento e melhoria das práticas em saúde. estágio atual de organização do sistema ainda não é realidade a cobertura para período de fé- Referências Bibliográficas rias, licenças nem em casos de afastamento pro- 1. Gragnolati, Michele; Lindelow, Magnus; Couttolenc, longado, ocasionando restrições relevantes na Bernard. Twenty Years of Health System Reform in Brazil : An

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Assessment of the Sistema Único de Saúde. Washington, DC: World Bank. © World Bank. https://openknowledge.worldbank. org/handle/10986/15801 License: CC BY 3.0 IGO, 2013. 2. Starfield, B.Atenção primária equilíbrio entre as necessidades de saúde, serviços e tecnologia. Brasília: UNESCO, Ministério da Saúde; 2004. 3. Loch, Selma. Estudo de Caso da Unidade de Saúde do Saco Grande. In: Gestão e Liderança em Unidades Básicas de Saúde. Cunha, Cristiano J.C, organizador. Florianópolis: Pandion; 2011. 4. Fabi, Luiz Felipe; Campos, Laryssa. Qualificação do acesso e gestão da clínica: instrumentos de baixa complexidade tecnológica. In: Anais Congresso Brasileiro Medicina Família e Comunidade. Belém, 2013 Maio; 12:198.

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O acolhimento como instrumento de humanização do atendimento em Fisioterapia no âmbito do NASF Michelli Vitória Silvestre (michellisilvestre@hotmail.com) Gabriela Zanella Bavaresco Luís Rafaeli Coutinho Daniel Adriano Mafra Allana Guedes de Matos Cacilhas Mariza Dircéia Hoffmann Rigo Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis – SC

Resumo Em 2012 houve uma mudança no fluxo de acesso ao Serviço de Fisioterapia de Florianópolis e observou-se a importância do acolhimento ao usuário que procura por este atendimento. Constatou-se que, quanto mais precoce o contato, maior o esclarecimento do usuário em relação ao seu problema de saúde. Permite também a classificação da prioridade de atendimento conforme o comprometimento funcional apresentado e possibilita a orientação inicial específica, incentivo ao autocuidado e redução das complicações decorrentes do tempo de espera pelo tratamento. O objetivo deste artigo é apresentar a proposta de acolhimento adotada pelos fisioterapeutas do Distrito Sanitário Norte como instrumento de humanização do atendimento nesta especialidade. Os fisioterapeutas do NASF Norte tornaram-se responsáveis pelo acolhimento em Fisioterapia dos usuários em cada unidade (100% do acesso), oferecidos conforme demanda. Observou-se uma diminuição da demanda para a Média Complexidade, maior corresponsabilização do usuário no processo de reabilitação, e melhor entendimento do processo saúde-doença e a influência dos determinantes sociais de saúde. Além disso, contribuiu para a efetivação do papel do fisioterapeuta no NASF em Florianópolis. Palavras-chave: Acolhimento. Fisioterapia. Acesso aos Serviços de Saúde. Atenção Primária à Saúde. Introdução

o atendimento necessário não era oferecido pelo Em 2008, antes do início das atividades do município, e sim em instituições de referência Serviço de Fisioterapia no Distrito Sanitário para atendimento especializado, como clínicas Norte (DS Norte), foi feito um levantamento escolas universitárias e Centro Catarinense de da demanda existente, no qual se observou um Reabilitação (CCR). grande número de encaminhamentos duplicaCom a mudança do fluxograma do Serviço dos ou incorretos inseridos no Sistema de Regu- de Fisioterapia em Florianópolis em 2012, inilação (SISREG III). Ainda, vários usuários com ciou-se um projeto piloto com o objetivo de mecasos agudos como pós-operatórios e fraturas lhorar o acesso no DS Norte. Os fisioterapeutas aguardavam pela avaliação inicial com o fisiote- do DS Norte passaram a realizar o acolhimento rapeuta há mais de dois anos juntamente com de todos os usuários que procuravam por este centenas de casos crônicos. serviço, antes mesmo de serem inseridos no SISNesse modelo antigo, quando as avaliações iniciais eram agendadas, muitas vezes o prognóstico já não era mais favorável, devido às sequelas ortopédicas e neurológicas instaladas. Além disso, os usuários portadores de patologias neurológicas, por exemplo, demoravam a descobrir que

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REG III. O objetivo deste artigo é apresentar a proposta de acolhimento adotado pelos fisioterapeutas do DS Norte como instrumento de humanização do atendimento nesta especialidade.


O papel da Fisioterapia no NASF em Florianópolis No Brasil, o Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF) surgiu em 2008, quando foram estabelecidos os profissionais que poderiam compor as equipes NASF, entre eles o fisioterapeuta1. Em 2011, o NASF foi definitivamente estabelecido como integrante Política Nacional de Atenção Básica2.

que estes desenvolveriam ações de regulação do acesso ao Serviço de Fisioterapia, atividades de educação permanente e apoio assistencial à ESF, além do atendimento específico4. Modelo proposto no projeto piloto do DS Norte

Baseado em um modelo anterior, foram realizadas adaptações neste projeto piloto. Experiências exitosas de outros municípios como Consideram-se como NASF as equipes mulCuritiba-PR e Governador Valadares-MG, vêm tiprofissionais que atuam de maneira integrada, demonstrando que o acolhimento em Fisioterano sentido de apoiar as ações das equipes da pia reduz gradualmente a fila de espera para traEstratégia de Saúde da Família (ESF), compartamento na Média Complexidade, aumentando tilhando práticas e saberes, visando o manejo e a resolubilidade no primeiro nível de atenção5,6. resolução de problemas na atenção básica (AB)3. Cada fisioterapeuta tornou-se responsável pelo Dessa forma, o NASF atua como suporte à acolhimento dos usuários em seu território. ESF, constituindo-se retaguarda especializada na O acolhimento, na forma individual ou coAB. Suas ações são desenvolvidas em duas diletiva7, é oferecido conforme demanda, sendo mensões: clínico-assistencial (ação direta com os semanalmente nas unidades maiores e não ultrausuários) e técnico-pedagógica (apoio educativo passando 30 dias nas menores. Funciona como às equipes da AB). Na dimensão clínico-assistenuma consulta agendada, mas permite o atendicial, o fisioterapeuta pode agregar novas ações na mento da demanda espontânea também7. AB, inerentes a sua profissão, como orientação Durante o acolhimento, são realizados a de exercícios específicos e prescrição de órteses, anamnese e o exame físico, determinando o entre outros3. comprometimento funcional e a prioridade de Na reabilitação, uma das áreas estratégicas atendimento, assim como são repassadas oriendo NASF1, o fisioterapeuta pode atuar na “retações sobre o autocuidado e exercícios domicialização de avaliação funcional para definição liares. Casos simples são resolvidos em um únido serviço em que será realizado o processo de co acolhimento. Quando necessário, o usuário reabilitação (atenção básica ou serviços especiaé encaminhado para grupos de Educação em lizados)”3. Assim, evidencia-se o papel do fisioSaúde ou reagendado para acompanhamento na terapeuta no NASF como regulador do acesso própria unidade. Nos casos mais complexos ou ao “qualificar os encaminhamentos relativos que não atendem os critérios de atendimento esà sua área de atuação, tanto aqueles recebidos tabelecidos no fluxo de acesso, o usuário é oriendas equipes apoiadas, quanto os realizados por tado onde existe o serviço indicado, viabilizado outros pontos ou serviços da (rede de atenção pela articulação intersetorial nas RAS. à saúde) RAS”3. Neste sentido, o fisioterapeuta Todas as informações recolhidas, observadas deve adotar estratégias que permitam o manejo dos casos simples na AB e critérios para encami- e transmitidas durante o acolhimento ficam registradas no prontuário de cada usuário, facilinhar aos outros pontos da RAS3. tando o acompanhamento pelos atores envolviO papel da Fisioterapia no NASF em Floriados. nópolis somente se efetivou em 2012 com a publicação da Portaria nº 11/2012. Com a inclusão dos fisioterapeutas no NASF, ficou estabelecido

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nantes sociais de saúde, revelando outros fatores intervenientes no processo de reabilitação14,15.

Figura 1 – Principais desfechos dos acolhimentos em Fisioterapia no período de julho de 2012 a outubro de 2013 no DS Norte. Fonte: arquivo do Serviço de Fisioterapia do DS Norte

Resultados No período compreendido entre julho de 2012 a outubro de 2013 foram realizados 3.159 acolhimentos em Fisioterapia no DS Norte. A distribuição do desfecho dos casos atendidos está demonstrada na Figura 1. A maior parte dos casos (62%) foi resolvida na AB com consultas de retorno ou grupos de Educação em Saúde. Apenas 25% dos casos necessitaram de atendimento nas Policlínicas e foram inseridos no SISREG para atendimento individualizado. Os demais casos (13%) consistiram em orientações gerais, como informações sobre a situação da fila de espera, exercícios e cuidados domiciliares, prescrição de cadeira de rodas, encaminhamentos para instituições de referência, entre outros.

O profissional de saúde deve ser capaz de escutar e dar respostas mais adequadas aos usuários no acolhimento. Quando necessário, deve orientar os usuários em relação a outros serviços da RAS, e estabelecer articulações intersetoriais para garantir a eficácia desses encaminhamentos8,13. É o caso dos pacientes neurológicos, que não são atendidos pela rede municipal, mas são devidamente encaminhados para o atendimento necessário, de qualidade e pelo SUS, também contribuindo para a redução de complicações e possíveis sequelas decorrentes da demora pelo atendimento. Para isso, foi necessário pesquisar serviços disponíveis nas RAS, além de discutir com outros profissionais as melhores estratégias de intervenção dentro do Projeto Terapêutico Singular10,13,14. Por exemplo, nas lombalgias crônicas associadas ao sedentarismo e sobrepeso, a parceria com a Educação Física se fortaleceu a partir da criação de grupos de atividade física compartilhados entre as especialidades em unidades de referência no território.

No modelo antigo, muitos destes encaminhamentos eram inseridos no SISREG III desnecessariamente, sem indicação efetiva para Discussão tratamento fisioterapêutico especializado, o que A prática do acolhimento vem contribuin- contribuía para o crescimento exponencial da do para a melhoria do acesso à Fisioterapia. O fila de espera que, associada à carência de recuracolhimento expressa a aproximação entre pro- sos humanos, acarretava na demora pelo atendifissionais de saúde e usuários8,9, promove maior mento. Com o acolhimento houve redução da acessibilidade ao serviço e resolubilidade das de- demanda especializada, favorecendo o andamenmandas existentes10. to da fila de espera para atendimento na Média Os fisioterapeutas interagiram mais com os Complexidade. usuários e equipes ESF na AB, aumentando o Com o novo fluxo, a Fisioterapia tornou-se vínculo e a corresponsabilização. Isto favorece a 100% regulada, tornando essencial a classificaconstrução de uma relação de confiança e com- ção da prioridade de atendimento conforme o promisso entre os atores envolvidos11,12,13. comprometimento funcional apresentado e as Essa interação direta com o usuário exigiu evidências científicas para melhor prognóstico12. um aprofundamento do entendimento do pro- A melhor forma para tal classificação é a avaliacesso saúde-doença e a influência dos determi- ção presencial do quadro clínico apresentado,

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considerando o contexto biopsicossocial de cada indivíduo.

zação, pois considera que cada indivíduo é único no processo saúde-doença.

Isto contribuiu em relação aos casos agudos, em especial os pacientes com fraturas recentes ou pós-operatórios ortopédicos, que foram redirecionados para o atendimento mais adequado conforme o caso. O acompanhamento destes casos desde o início dos sintomas com orientações precoces garante uma melhor recuperação funcional14.

Aliado a facilidade no acesso com o modelo proposto, o usuário vem demonstrando maior confiança e reconhecimento do papel do fisioterapeuta na AB. Para os fisioterapeutas também se mostrou uma ferramenta de aprimoramento dentro da sua inserção no NASF, reconhecendo e identificando melhor os problemas e queixas do usuário, permitindo melhor adequação da conduta terapêutica.

A construção da autonomia e do autocuidado inicia-se na AB, com a corresponsabilização do usuário no processo de reabilitação. Discutir com os usuários novas possibilidades terapêuticas e adequadas permite o melhor manejo de cada caso10,13,14. Observa-se também que a maioria dos usuários compreende melhor o contexto atual da fila de espera e reconhece o papel do fisioterapeuta na AB durante o acolhimento.

Em síntese, a prática contribuiu para o amadurecimento profissional dentro do processo de trabalho na AB, trazendo mais segurança aos fisioterapeutas para classificar a prioridade de atendimento com base em evidências. O maior desafio inicial foi esclarecer ao usuário o real objetivo do acolhimento, uma vez que o usuário ainda não reconhecia o papel do fisioterapeuta Alguns autores comentam que a implemen- na AB, visualizando ainda apenas a reabilitação. tação do acolhimento pode gerar algumas difi- Mas no decorrer da prática e com a colaboração culdades, como falta de capacitação das equipes, dos trabalhadores dos centros de saúde, a aceitaescassez de recursos e demanda excessiva, mas ção e compreensão pelos usuários melhoraram somente assim é possível reconstruir as possibili- significativamente. dades dos serviços, ampliando as ações ofertadas Referências Bibliográficas aos usuários10,17. 1. Brasil, Ministério da Saúde. Portaria nº 154 (24 jan. 2008, O registro das informações no prontuário eletrônico também foi um aspecto positivo nesta prática. A transparência das informações favoreceu uma melhor comunicação entre a Fisioterapia na AB e na Média Complexidade. Quando o paciente inicia o tratamento na policlínica, o fisioterapeuta tem conhecimento da situação inicial e orientações recebidas, e assim consegue programar melhor a conduta terapêutica adequada. Conclusão O acolhimento em Fisioterapia como prática de atenção reconhece e considera as necessidades e os problemas de saúde de cada usuário, considerando o contexto d para melhor classificação da prioridade de atendimento, como preconizado pela Política Nacional de Humani-

republ. 4 mar. 2008). Cria os Núcleos de Apoio à Saúde da Família. Diário Oficial da União, Brasília, 4 mar. 2008. 2. Brasil, Ministério da Saúde. Portaria nº 2.488 (21 out. 2011). Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes e normas para a organização da atenção básica, para a Estratégia Saúde da Família (ESF) e o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS). Diário Oficial da União, Brasília, 21 out. 2011. 3. Brasil, Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção a Saúde, Departamento de Atenção Básica. Núcleos de Apoio a Saúde da Família – volume 1: ferramentas para a gestão e para o trabalho cotidiano. (Cadernos de Atenção Básica nº 39). Brasília: Ministério da Saúde; 2014. 4. Florianópolis, Secretaria de Saúde. Portaria SS/GAB nº 11/2012 (24 fev. 2012). Acrescenta à categoria profissional intitulada Fisioterapia ao art. 1º, da Portaria nº 084/2005. Diário Oficial do Município, Florianópolis, 29 fev. 2012. 5. Curitiba, Secretaria de Saúde. Fisioterapia na Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba. Curitiba: Secretaria de Saúde; 2004. 6. Barbosa EG, Ferreira DLS, Furbino SAR, Ribeiro EEN. Experiência da Fisioterapia no Núcleo de Apoio à Saúde da Família em Governador Valadares, MG. Fisioter Mov. 2010;23(2):323-30. 7. Brasil, Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção a Saúde,

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Departamento de Atenção Básica. Acolhimento à demanda espontânea – volume I. (Cadernos de Atenção Básica nº 28). Brasília: Ministério da Saúde; 2011. 8. Brasil, Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção a Saúde, Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. O acolhimento nas práticas de saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 2006. 9. Santos IMV, Santos AM. Acolhimento no Programa Saúde da Família: revisão das abordagens em periódicos brasileiros. Rev Salud Pública. 2011;13(4):703-16. 10. Lopes GVDO, Menezes TMO, Miranda AC, Araújo KL, Guimarães ELP. Acolhimento: quando o usuário bate à porta. Rev Bras Enferm. 2014;67(1):104-10. 11. Brasil, Ministério da Saúde, Secretaria-Executiva. Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. HumanizaSUS: Política Nacional de Humanização: a humanização como eixo norteador das práticas de atenção e gestão em todas as instâncias do SUS. Brasília: Ministério da Saúde; 2004. 12. Brasil, Ministério da Saúde, Secretaria-Executiva. Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. HumanizaSUS: acolhimento com avaliação e classificação de risco: um paradigma ético-estético no fazer em saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 2004. 13. Silva ATC, Aguiar ME, Winck K, Rodrigues KGW, Sato ME, Grisi SJFE et al. Núcleos de Apoio à Saúde da Família: desafios e potencialidades na visão dos profissionais da Atenção Primária do Município de São Paulo, Brasil. Cad Saúde Pública. 2012;28(11):2076-84. 14. Mitre SM, Andrade EIG, Cotta RMM. O acolhimento e as transformações na práxis da reabilitação: um estudo dos Centros de Referência em Reabilitação da Rede do Sistema Único de Saúde em Belo Horizonte, MG, Brasil. Ciênc Saúde Coletiva. 2013;18(7):1893-1902. 15. Nascimento DDG, Oliveira MAC. Reflexões sobre as competências profissionais para o processo de trabalho nos Núcleos de Apoio à Saúde da Família. O Mundo da Saúde. 2010;34(1):92-6. 16. Brasil, Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção a Saúde, Departamento de Atenção Básica. Diretrizes do NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família. (Cadernos de Atenção Básica nº 27). Brasília: Ministério da Saúde; 2010. 17. Mangia EF, Souza DC, Mattos MF, Hidalgo VC. Acolhimento: uma postura estratégica. Rev Ter Ocup USP 2008;19(2):121-30.

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Revista de Saúde Pública de Florianópolis - Ano 2 - Volume 2

Monitoramento e Avaliação como ferramentas de gestão do processo de trabalho integrado entre Núcleos de Apoio à Saúde da Família e equipes de saúde da família Thaís Titon de Souza (thayyts@yahoo.com.br) Débora Martini Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis - SC

Resumo O presente artigo objetiva relatar o processo de planejamento do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF) Centro 2 desencadeado pela adesão ao Pacto Municipal de Saúde (PMS), componente da Programação Anual de Saúde, no ano de 2013, bem como evidenciar os resultados alcançados. O PMS foi utilizado pelo NASF Centro 2 como uma ferramenta para qualificar o apoio às equipes de Saúde da Família vinculadas e, consequentemente, o cuidado aos usuários atendidos. Identificaram-se fragilidades nos mecanismos de monitoramento e avaliação dos resultados alcançados. Em conseqüência, desenvolveram-se mecanismos de registro, coleta e consolidação dos dados e de avaliação dos resultados, envolvendo profissionais e supervisora do Distrito Centro. Observou-se a existência de diferentes modelos de atuação no NASF e, consequentemente, resultados que variaram em função das categorias profissionais envolvidas. Concluiu-se que os indicadores preconizados não dão conta de monitorar e avaliar essas diferenças, sendo necessária discussão sobre os modelos de atuação vigentes, aprimoramento do sistema municipal de monitoramento e avaliação das ações e resultados alcançados pelo NASF e maior integração com o processo de planejamento das equipes apoiadas. Palavras-chave: Sistema Único de Saúde; Atenção Primária à Saúde; Planejamento em Saúde. Introdução Em Florianópolis, a composição dos NASF Com a implantação do NASF, profissionais é definida pelo gestor municipal a partir de um não inseridos na equipe mínima de Saúde da elenco de profissões2. No caso da equipe de que Família passaram a trabalhar na Atenção Básica trata esse artigo – NASF Centro 2 -, com oito (AB) com base no referencial do apoio matri- eSF vinculadas, a composição registrada no Cacial1. Para isso, devem compartilhar problemas, dastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde trocar e integrar saberes e práticas e buscar estra- é: pediatra, assistente social, psiquiatra, farmatégias para ações em saúde em conjunto com as cêutico, profissional de educação física, psicólogo e nutricionista3. Destaca-se que o NASF equipes de Saúde da Família (eSF) vinculadas1. Segundo a Carteira de Serviços da Atenção Centro 2 contava com fisioterapeuta e fonoaudiPrimária à Saúde da Secretaria Municipal de ólogo como apoiadores complementares no ano Saúde (SMS) de Florianópolis, os NASF são de 2013 e que o assistente social e o psiquiatra núcleos voltados para o fortalecimento das eSF ofereciam apoio também às eSF vinculadas a oue para a retaguarda assistencial no âmbito da tro NASF do município. AB2. Não se constituindo porta de entrada do Sistema Único de Saúde (SUS), o acesso a esses profissionais se dá por meio de encontros de matriciamento entre eSF e NASF, por fluxos previamente pactuados ou em situações urgentes ou imprevistas com critérios pré-definidos2.

Seguindo as diretrizes da gestão municipal em relação à organização do processo de trabalho do NASF, foi elaborada a matriz de intervenção e iniciado o processo de implantação, monitoramento e avaliação das ações programadas. Assim, esse artigo objetiva relatar o proces-

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so de planejamento dessa equipe desencadeado pela adesão ao Pacto Municipal de Saúde (PMS), componente da Programação Anual de Saúde, no ano de 2013, bem como evidenciar os resultados alcançados. Ressalta-se que estudos sobre essa temática ainda são escassos, assim como são pouco desenvolvidos os mecanismos de monitoramento e avaliação das ações e resultados alcançados pelo NASF4. Dessa forma, é extremamente necessário ampliar as investigações sobre as diferentes formas de implementação dessas equipes, buscando identificar em que medida os diversos modelos de atenção influenciam os modos como são operados em todo o território nacional5. Método O monitoramento e a avaliação das ações do PMS NASF foi uma iniciativa da equipe NASF Centro 2 a fim de consolidar o processo de planejamento instituído entre maio e dezembro de 2013. Para isso, elaboraram-se instrumentos específicos abrangendo objetivos e indicadores priorizados (cujas metas foram definidas previamente pela gestão municipal de saúde) e ações correlacionadas, sendo o monitoramento realizado pelos próprios profissionais com apoio da supervisora de AB do Distrito Sanitário (DS) Centro. Os registros das ações foram feitos no InfoSaúde, quando possível, ou em planilhas elaboradas de maneira participativa nos programas Microsoft Excel® e Google Drive®. O instrumento de monitoramento foi preenchido mensalmente considerando o número absoluto das ações realizadas por cada profissional para futuro cálculo do percentual alcançado. Os indicadores calculados compuseram uma base de memória apresentada bimestralmente na reunião do NASF ao longo de 2013 e à Gerência de Atenção Básica da SMS de Florianópolis no início de 2014, buscando promover a identificação e a discussão de nós críticos do processo de trabalho integrado entre NASF e eSF vinculadas.

16

Resultados/Discussão Foram monitorados todos os indicadores do PMS acordados na etapa de priorização, além de dois indicadores complementares elaborados pela equipe com o intuito de qualificar o processo de planejamento desenvolvido. As ações previstas foram consideradas cumpridas pelos profissionais quando sua atuação atendeu integralmente ao preconizado e em situações de afastamento do trabalho, como gozo de férias. Na ausência do profissional por exoneração, excluiu-se a categoria correspondente para fins de monitoramento. O quadro 1 apresenta objetivos e indicadores selecionados, incluindo situação atual, parâmetro, meta esperada e resultados alcançados. Em relação ao Objetivo 1, a disponibilização da agenda mensal de atividades é uma ação que deve promover melhor comunicação e acesso entre NASF e eSF vinculadas1. Entre maio e dezembro de 2013, a proporção de profissionais que as encaminhou no prazo determinado variou de 63,5% a 100%. Por considerar que a definição e a pactuação de critérios e mecanismos de contato direto em situações urgentes e/ ou imprevistas também segue a lógica do apoio matricial¹, cada categoria integrante do NASF responsabilizou-se em pactuar os critérios e os mecanismos específicos por área profissional, obtendo-se um percentual de 66,6% de alcance da meta prevista. No Objetivo 2, os resultados demonstraram que a realização de ações colaborativas é, ainda, um ponto frágil no desenvolvimento do trabalho integrado. Ainda que um percentual considerável de profissionais de apoio priorize em sua agenda encontros mensais com todas as eSF, a realização dessas ações se mostrou incipiente, visto que a proporção variou de 50% a 71,4% dos profissionais NASF em 2013. Nenhum profissional realizou ações colaborativas (visitas domiciliares, grupos e atendimentos compartilhados) com todas as equipes apoiadas nos meses de monitoramento, além de haver variação de


Quadro 1 - Objetivos e indicadores priorizados e pactuados pelo NASF Centro 2. Florianópolis, 2013. Objetivo

1. Melhorar o acesso das equipes de SF ao NASF

2. Realizar ações colaborativas com as equipes vinculadas

3. Realizar o gerenciamento dos casos compartilhados em conjunto com as equipes de SF

4. Instituir o planejamento estratégico da equipe NASF de forma conjunta ao planejamento das equipes de SF vinculadas, considerando as necessidades do território e as demandas dessas equipes

5. Desenvolver competências nos trabalhadores do NASF para o fortalecimento da AB

6. Consolidar o planejamento, o monitoramento e a avaliação como parte do processo de trabalho NASF

Situação inicial (%)

Parâmetro (%)

Meta (%)

1.1 Percentual de profissionais do NASF que disponibiliza sua agenda mensalmente a todas as equipes vinculadas

71

100

1.2 Proporção de profissionais do NASF com critérios e mecanismos de contato em situações urgentes e/ou imprevistas pactuados com todas as equipes vinculadas

0

2.1 Proporção de profissionais do NASF cuja agenda contempla encontros mensais com todas as equipes de SF vinculadas

Indicador

Situação alcançada (%) Min*

Max**

Final***

100

62,5

100

88,8

100

100

-

-

66,6

50

100

85

50

71,4

55,5

2.2 Indicador complementar: Percentual de categorias do NASF que realizam pelo menos 1 encontro mensal com todas as equipes vinculadas

Não definida

Não definido

Não definido

11,1

37,5

22,2

2.3 Proporção dos profissionais do NASF que realizam ações assistenciais compartilhadas com todas as equipes vinculadas

0

100

50

0

0

0

3.1 Proporção de equipes de SF que utilizam pelo menos um mecanismo de gerenciamento conjunto dos casos compartilhados com o NASF

24

100

100

-

-

100

3.2 Indicador complementar: Proporção de profissionais do NASF que utilizam pelo menos um mecanismo de gerenciamento conjunto dos casos com todas as equipes vinculadas

Não definida

Não definido

100

0

44,4

44,4

4.1 Proporção de equipes de SF com apoio do NASF para a realização de seu planejamento

0

100

100

-

-

100

4.2 Proporção de reuniões da equipe NASF em que foi realizado o planejamento e/ou a avaliação de ações conjuntas

0

Não definido

75

-

-

85,7

5.1 Percentual de reuniões da equipe NASF com ações de Educação Permanente direcionadas aos profissionais do NASF

70

Não definido

70

-

-

85,7

6.1 Percentual de relatórios de monitoramento e avaliação preenchidos

0

100

100

-

-

100

6.2 Percentual de reuniões multinível

0

100

100

-

-

200

*Min: menor valor mensal identificado no monitoramento **Max: maior valor mensal identificado no monitoramento ***Final: valor identificado no último mês de monitoramento

17


11,1% a 37,5% de profissionais que realizaram tinível junto à equipe NASF e uma em conjunto pelo menos um encontro mensal com todas as com a gestão municipal de saúde. eSF vinculadas Conclusão Para o Objetivo 3, elaborou-se uma lista de Os resultados demonstraram que o monitoragerenciamento dos casos compartilhados entre mento e a avaliação das ações desenvolvidas pelo NASF e eSF, com a finalidade de desenvolver NASF são de suma importância para orientar a gestão conjunta do cuidado na AB. As listas a integração e o trabalho colaborativo com as foram criadas por equipe, com foco usuário-cenequipes apoiadas, beneficiando simultaneamentrado, e disponibilizadas a todos os profissionais te eSF e população atendida. das eSF assistidas. Assim, foi possível registrar as Nessa experiência, foram reconhecidos difeações de maneira sintética, sem ferir o sigilo profissional, uma vez que as informações dos pron- rentes modelos de atuação do NASF, que dificultuários não foram utilizadas. O instrumento foi taram uma avaliação homogênea pelos parâmeempregado por alguns profissionais do NASF tros estabelecidos. A depender de cada categoria para retorno dos casos acompanhados em matri- profissional que compõe o NASF, distintos reciamento1, favorecendo a discussão em equipe e sultados foram identificados, apontando para a influência do modelo de atuação por categoria o planejamento das ações. e perfil profissional. Em consequência, é imporUm indicador complementar foi criado visto tante definir novas formas de monitoramento que, apesar de todas as eSF apoiadas terem acespor meio de indicadores próprios ou definir se so à lista de gerenciamento conjunto dos casos, o NASF deve ser reorientado para um modelo apenas 44,4% dos profissionais do NASF (edumais uniforme, guiado pelo planejamento de cação física, nutrição, psicologia e serviço social) 2013. fez uso desse instrumento, o que pode minimiMaior integração entre o planejamento das zar seu potencial para a promoção da coordenaeSF e do NASF no PMS/PAS também foi conção do cuidado por parte das eSF. siderado essencial para alcançar um trabalho inNos Objetivos 4 e 5, os parâmetros foram tegrado e colaborativo, especialmente quanto às atingidos. Para o planejamento e a avaliação das ações compartilhadas, que não dependem uniações em equipe NASF, utilizou-se o espaço das camente do NASF, e à utilização de mecanismos reuniões mensais do N ASF tendo-se as planilhas de gerenciamento conjunto dos casos compartide monitoramento do PMS como subsídio para lhados. Essa interdependência traz à tona a neos debates. Já o apoio às eSF vinculadas em seu cessidade de trabalhar com nós críticos intrínseplanejamento deu-se por meio da inclusão do cos ao próprio modelo de atuação da Estratégia NASF no processo de adesão dessas equipes ao Saúde da Família a fim de efetivar o apoio maPMS. Para o quinto Objetivo, organizou-se um tricial na AB. cronograma com temas levantados em equipe e Em um estudo envolvendo municípios do profissionais foram convidados para a realização Meio Oeste catarinense, também foi apontado da educação permanente. como fragilidade do processo de implantação do Por fim, quanto ao Objetivo 6, relatórios de NASF a manutenção de um trabalho em saúde monitoramento e avaliação foram preenchidos disciplinar, sem articulação entre os diferentes mensalmente a partir das planilhas elaboradas, sujeitos envolvidos6. Ressalta-se que esse resulalém de serem registrados no Sistema de Monitado pode ser, em parte, decorrente da própria toramento e Avaliação do Planejamento da SMS inadequação da formação dos profissionais (PDCA Saúde). Para discussão sobre o processo de saúde para trabalharem na lógica do apoio de planejamento, ocorreram três reuniões mul18


matricial, reforçando a necessidade de melhor entendimento sobre o processo de trabalho e o funcionamento do NASF6. No que se refere aos indicadores de monitoramento e avaliação, alguns apontamentos podem ser realizados. O principal diz respeito à necessidade de serem condizentes com o processo de trabalho preconizado, portanto, considerando as duas dimensões do apoio matricial (técnico-pedagógica e assistencial) e o impacto sobre ambos os usuários de seus serviços (eSF e população adscrita). Devem, ainda, focar na reorientação para um modelo assistencial coerente com os princípios do SUS, visando alcançar os objetivos a que se propõe o NASF, especialmente o fomento à integralidade da atenção, à interdisciplinaridade e ao aumento da qualidade e resolubilidade da AB.

em Enfermagem) – Universidade Estadual da Paraíba, 2011. Disponível em http://dspace.bc.uepb.edu.br:8080/xmlui/ bitstream/handle/123456789/784/PDF%20-%20Fernanda%20 Carla%20Magalh%C3%A3es.pdf?sequence=1 [acesso em 07 novembro 2014]. 5. Sampaio J; Sousa CSM; Marcolino EC. et. al. O NASF como dispositivo da gestão: limites e possibilidades. R brasci Saúde, v. 16, n. 3, p. 317-24, 2012. Disponível em http://periodicos.ufpb. br/ojs/index.php/rbcs/article/view/12572/7870 [acesso em 07 novembro 2014]. 6. Andrade LMB; Quandt FL; Campos DA. et. al. Análise da implantação dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família no interior de Santa Catarina, Sau. &Transf. Soc., v. 3, n. 1, p. 1831, 2012. Disponível em http://incubadora.periodicos.ufsc. br/index.php/saudeetransformacao/article/view/1471/1707 [acesso em 07 novembro 2014].

Por fim, é de suma importância a discussão sobre o processo de trabalho do NASF e os resultados alcançados, o que pode ser facilitado por meio da instituição de melhores mecanismos de registros, assim como de um sistema de monitoramento das ações realizadas. Ressalta-se que a falta de um sistema de informação adequado e a incompreensão de alguns profissionais sobre a importância do planejamento e da avaliação em saúde foram considerados fatores dificultadores para a continuidade dessa proposta. Referências Bibliográficas 1. Brasil. Ministério da Saúde. Caderno de Atenção Básica no 39 – Núcleo de Apoio à Saúde da Família, volume 1: ferramentas para a gestão e para o trabalho cotidiano. Brasília: Ministério da Saúde; 2014. Disponível em http://bvsms.saude.gov.br/bvs/ publicacoes/nucleo_apoio_saude_familia_cab39.pdf [acesso em 23 agosto 2014]. 2. Prefeitura Municipal de Florianópolis/SC. Secretaria Municipal de Saúde. Carteira de Serviços – Atenção Primária à Saúde. 2014. Disponível em https://docs.google.com/file/ d/0BxvFvjfrIbyweVlIYUtpMWRZZHM/edit?usp=sharing&pli=1 [acesso em 23 agosto 2014]. 3. Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde. Consulta Estabelecimento – Módulo Equipes/Profissionais. CNES 0019275 – Nome: CS Agronômica – Tipo Equipe: 06. Equipe: NASF1 – Núcleo de Apoio à Saúde da Família – NASF Modalidade 1. 4. Magalhães FC. Avaliação do processo de implantação dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família em Campina Grande – PB. 2011. 26 p. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação

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Revista de Saúde Pública de Florianópolis - Ano 2 - Volume 2

Implantação das Práticas Integrativas e Complementares na Atenção Primária à Saúde de Florianópolis com base na cogestão e educação permanente em saúde Melissa Costa Santos1 (melcostasantos@gmail.com) Charles Dalcanale Tesser2 Ari Ojeda Ocampo Moré1,2 Sônia de Castro SThiago1 Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis – SC1 e Universidade Federal de Santa Catarina2

Resumo A Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares foi publicada com o intuito de ampliar a integralidade da atenção à saúde no SUS. No entanto, há escassez de estudos que relatem estratégias para incorporação das Práticas Integrativas e Complementares (PIC) nos serviços de saúde. Utilizando o método de pesquisa-ação, o qual estimula estratégias de ação participativa, e baseando-se em referências de cogestão e educação permanente em saúde, o presente estudo abordou o processo de implantação das PIC no município de Florianópolis-SC em dois grandes ciclos: ciclo 1 – Regulamentação, legitimação e institucionalização das PIC e ciclo 2 – Implantação progressiva e atividades de educação permanente em saúde. São descritos os marcos principais do processo, as dificuldades, os problemas superados e as estratégias de implantação utilizadas. Ao longo do processo, registrou-se um aumento expressivo da utilização das PIC na atenção primária à saúde, promovendo a ampliação sustentável destas práticas. O estudo pretende contribuir para o fortalecimento da PNPIC e o incentivo à sua legitimação e implantação por outros municípios. Palavras-chave: gestão em saúde, terapias complementares, medicina integrativa, política de saúde, educação permanente em saúde Introdução ários, nas conferências e nos conselhos de saúAs Práticas Integrativas e Complementares de municipais, estaduais e nacional quanto ao (PIC), enquadradas no que a Organização Mun- oferecimento das PIC pelo SUS, já que suas virdial da Saúde (OMS) denomina de Medicinas tudes intrínsecas são relevantes, seu risco é relaTradicionais e Complementares/Alternativas, tivamente baixo e suas potencialidades parecem têm crescido nas últimas décadas e já existem ser promissoras como uma estratégia desmedicaevidências da sua popularidade entre usuários e lizante, ainda que limitada9. O marco na área profissionais de saúde1,2,3,4,5. Entre 70% a 95% foi a publicação, em 2006, da Política Nacioda população de países em desenvolvimento, es- nal de Práticas Integrativas e Complementares pecialmente na Ásia, África, América Latina e (PNPIC), que evoca uma “política de inclusão teOriente Médio, utilizam alguma PIC para mane- rapêutica” aberta a outros saberes e racionalidajo de problemas primários de saúde, sendo este des, o que pode favorecer a complementaridade fenômeno igualmente significante em alguns terapêutica10. Entretanto, considera-se um desapaíses industrializados, como Canadá, França, fio aos gestores públicos a efetiva institucionalização das PIC no SUS, já que diretrizes gerais Alemanha e Itália6,7,8. Desde a Conferência Internacional de não são suficientes quando há reduzido número Alma Ata, realizada em 1978, a OMS recomen- de recursos humanos capacitados, insuficiente da a inclusão das PIC nos sistemas públicos de financiamento para a maioria das práticas e pousaúde. No Brasil, é evidente a vontade dos usu- cos espaços institucionais para o desenvolvimento de novos serviços11, 12.

20


Em Florianópolis, pesquisa realizada entre 2008 e 200913 revelou que 81,4% de médicos e enfermeiros da Atenção Primária à Saúde (APS) eram favoráveis à PNPIC e 59,9% demonstraram elevado interesse na utilização de PIC, sendo este um importante primeiro passo para a construção sustentável de políticas locais de oferta das PIC no SUS. A pesquisa também constatou a existência de diversos profissionais habilitados em alguma PIC, porém sem exercê-la por falta de legitimação, incentivo à prática e ausência de apoio institucional no município13.

populacional de cerca de 90%. A rede está dividida em cinco Distritos Sanitários, com área de abrangência e geoprocessamento definidos. Apesar de, à época da pesquisa, não haver apoio institucional à implantação das PIC na APS, as VI, VII e VIII Conferências Municipais de Saúde apresentaram resoluções e moções de apoio à inclusão das PIC e um projeto nesse sentido já havia sido elaborado quase duas décadas antes, que todavia não se concretizou ao longo do tempo. O tema finalmente obteve consistência institucional com a nomeação da Comissão de Neste contexto, o objetivo deste artigo é Práticas Integrativas e Complementares (CPIC), descrever o processo de implantação das PIC na por iniciativa do gestor municipal, em março de APS do município de Florianópolis, de abril de 2010, estimulada por discussões iniciadas cerca 2010 a abril de 2012, destacando as principais de um ano antes por um grupo de profissionais dificuldades e soluções desenvolvidas para sua a interessados pelo tema. superação. Para uma análise qualitativa da inserção das PIC na APS do município de Florianópolis, Contextualização do Campo e Percurso optou-se pela escolha do método da pesquisaTeórico-Metodológico -ação, que constitui-se em um tipo de pesquisa Florianópolis, com população de 421.203 social com base empírica, concebida e realizada habitantes, adota a Estratégia de Saúde da Fa- em estreita associação com uma ação ou resolumília como modelo de APS e possui cobertura ção de um problema coletivo14, 15, possibilitando

FASE EXPLORATÓRIA

AVALIAÇÃO

Diagnóstico da situação atual; levantamento de profissionais formados; discussão de estudos; informações trazidas por informantes-chave

Avaliação do efeito da regulamentação; divulgação da regulamentação; discussão do plano de implantação; monitoramento do efeito da legitimação.

5 meses

FASE PLANEJAMENTO

3 meses

Necessidade de legitimação profissional e regulamentação; 4 seminários com profissionais; 2 reuniões com gestores.

CICLO 1 – Regulamentação, legitimação e institucionalização das PIC

FASE EXPLORATÓRIA Discussão com profissionais e gestores sobre o plano de implantação das PIC; proposta de implantação progressiva e contextualizada.

Visitas periódicas nas unidades de saúde sensibilizadas; monitoramento dos efeitos das oficinas, capacitações e treinamentos

1 mês

Elaboração da regulamentação; discussão de propostas; negociação entre as partes interessadas, publicação da regulamentação; institucionalização das PIC

3 meses

1 mês

FASE AÇÃO

FASE

AVALIAÇÃO

8 meses

FASE

FASE AÇÃO

FASE

Realização das Oficinas de Sensibilização em PIC; elaboração do plano local de implantação; apoio da CPIC; atividades de educação permanente em saúde.

PLANEJAMENTO

3 meses

Discussão com todos os coordenadores de unidades de saúde; indicação das primeiras unidades de saúde.

CICLO 2 – Implantação progressiva e atividades de educação permanente em saúde

Figura 1 - Os dois grandes ciclos de pesquisa-ação que ocorreram no decorrer do período da pesquisa (abril/2010 a abril/2012).

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o desenvolvimento da cogestão dos envolvidos e trazendo à tona informações sutis e significativas, já que os dados são mais facilmente acessíveis pela ampla inserção dos pesquisadores no contexto da pesquisa16, em torno da concretização de um interesse comum que é a implantação das PIC na APS de Florianópolis.

CICLO 1 – Regulamentação, Legitimação e Institucionalização das PIC com Base na Cogestão

O primeiro ciclo (ciclo 1, figura 1), que compreendeu basicamente o primeiro ano de análise, envolveu a regulamentação, legitimação e institucionalização das PIC, entremeado por A pesquisa foi conduzida por um núcleo ciclos menores, gerados a partir da necessidade de pesquisadores, como orienta a pesquisa-ação, de resolução de problemas menores que foram formado pelos membros ativos da CPIC, in- emergindo, tais como: consensuação do fluxo e cluindo os autores deste artigo. Como caracte- prioridades no acesso na APS; regras para forrística principal da pesquisa-ação, as atividades necimento de agulhas de acupuntura/insumos; foram centradas no “seminário”, técnica que caráter permanente na CPIC; criação de códigos consiste em examinar, discutir e tomar decisões de registro dos atendimentos, etc. Os primeiros acerca do processo de investigação, identifican- seminários da CPIC tiveram caráter de solidifido problemas e prioridades, planejando e reali- car e homogeneizar o grupo e mapeou-se, com zando ações e avaliações das mesmas, e também auxílio dos Distritos Sanitários (DS), os profiscoordenar atividades com os demais participan- sionais formados em alguma PIC e criou-se espates envolvidos no processo. O processo de prio- ços de discussão com estes profissionais. Ainda rização e resolução de problemas trabalhados em 2010, foram realizados 4 seminários temátinos seminários ocorreram na lógica dos ciclos cos, com cerca de 60 profissionais, com o objetide pesquisa-ação, compostos de quatro grandes vo de problematizar a atuação das PIC na prátifases: fase exploratória; fase principal ou de pla- ca profissional, tendo o compilado do resultado nejamento; fase de ação; fase de avaliação16. A das discussões no Quadro 1. Com a unânime partir da experiência vivida, registrada e refletida necessidade de legitimação profissional, a CPIC (diário de campo), dos dados gerados pelos tra- elaborou um documento inicial para a institubalhos da CPIC (atas, relatórios e documentos cionalização das PIC, que inicialmente trouxe institucionais), realizou-se uma análise crítica receio aos gestores, já que poderia gerar novas retrospectiva e sintética do processo de implan- demandas e acesso desigual aos usuários . A solutação das PIC, compreendendo um período de ção discutida, como tentativa de minimizar esse receio, foi planejar capacitação aos interessados, 2 anos (abril/2010 a abril/2012). expandindo gradativamente a oferta das PIC. A De forma ilustrativa e a fim de registrar CPIC reforçou a concepção de que não estaria a lógica de desenvolvimento desta pesquisa-ação, criando um novo serviço, mas ampliando os reverificou-se a ocorrência de dois grandes ciclos cursos terapêuticos dos profissionais, tal como no período investigado, representados pela fipropõe Cunha22, ou seja, proporcionando mais gura 1, considerados os mais relevantes para a um recurso para o profissional generalista, que superação dos problemas relacionados à implanelege o recurso terapêutico mais adequado, potação das PIC em Florianópolis, que serão apredendo, inclusive, associar terapêuticas. Um novo sentados, analisados e discutidos a seguir. seminário com profissionais e gestores definiu a versão final do documento, que foi publicado ao final de 2010, implantando normas gerais para o desenvolvimento das ações na área.

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Quadro 1 - Principais aspectos discutidos em cada um dos seminários temáticos desenvolvidos com os profissionais da rede municipal de saúde de Florianópolis/SC. Principais pontos negativos relatados

Principais pontos positivos relatados

Soluções apontadas

SEMINÁRIO 1: ACUPUNTURA E OUTRAS PRÁTICAS INDIVIDUAIS (auriculoterapia, reiki, massoterapia, etc). Ata: 10/06/2010

Falta apoio institucional; Não fornecimento das agulhas de acupuntura e outros materiais de apoio; Sem espaço e macas adequadas para sessões acupuntura; Falta de legitimação profissional.

A existência de duas referências secundárias para a APS para encaminhamento de pacientes; Aceitabilidade da técnica pelos usuários;

Legitimação/regulamentação; Apoio institucional; Organizar agenda com reserva de turno quando houver consultório livre (ex: dia de visita domiciar do colega) Fomentar cursos e ampliar uso de acupuntura para outros profissionais e unidades de saúde; Integrar às atividades da ESF.

SEMINÁRIO 2: PRÁTICAS COLETIVAS (yoga, terapia comunitária, biodança, etc). Ata: 27/05/2010

Resistência por parte dos colegas e coordenação; Falta de Recursos humanos para as atividades básicas de atenção; Falta de local adequado; Falta de apoio institucional e formação continuada.

Grande procura e aceitação dos usuários.

Legitimação/regulamentação; Apoio institucional à educação permanente e continuada

SEMINÁRIO 3: FITOTERAPIA/ PLANTAS MEDICINAIS Ata: 11/06/2010

Desvalorização do saber popular e ignorância de profissionais de saúde.

Inserção na prática profissional diária, sem necessidade de reorganizar o serviço.

Discussões no contexto local, com envolvimento dos ACS e comunidade; Atividades de sensibilização e capacitação de profissionais.

SEMINÁRIO 4: HOMEOPATIA E ANTROPOSOFIA Ata: 28/05/2010

Necessidade de um tempo de consulta superior ao praticado na Atenção Primária; Não disponibilidade de medicamentos.

Oferta informal de homeopatia no município desde 1998

Criar referência secundária em homeopatia Qdo profissional atuar na APS, poder organizar o processo de trabalho, de forma a reservar 1 ou 2 turnos para a PIC e atender somente sua unidade de saúde (não ser referência local ou colaboração horizontal) Desenvolver registro na APS para validar a prática Fornecer medicamentos homeopáticos

Ainda que a gestão participativa tenha tido limitações, o compartilhamento na gestão dos problemas e a escuta aos profissionais de saúde, sobre suas vivências, dificuldades e conflitos na inserção das PIC, foi importante para a valorização e empoderamento profissional em seus locais de trabalho, reforçando o sentido de “pertencer” ao processo e fortalecendo a rede como um todo. Isso reflete em vantagens potenciais como melhoria do grau de envolvimento e de compromisso dos trabalhadores com a instituição, criação de um sistema de informação e de educação continuada (espaços formais de troca de saberes), além da melhoria sensível das relações interpessoais19. Com a publicação da Normativa, realizou-se um encontro em fevereiro de 2011 com gestores, profissionais, conselho municipal e conselhos locais de saúde, no intuito de apresentar a publicação, conhecer os novos fluxos institucionalizados, compartilhar o resultado parcial das discussões iniciadas meses antes e definir a estratégia de implantação. Neste espaço, as reações foram as mais diversas, desde a grande aceitação, no

sentido de que iria trazer algo novo que modificasse e estimulasse o serviço, até a reprovação por este “novo” ser impossível em um momento de escassez de recursos humanos. Como reflexo, dois distritos sanitários não indicaram unidades de saúde para iniciar o processo de implantação. CICLO 2 – Implantação Progressiva com Base na Educação Permanente em Saúde O ciclo anterior preparou o terreno institucional para a um novo e prioritário problema: a necessidade de implantação propriamente dita das PIC, gerando mais um amplo ciclo de discussões. Este novo ciclo (figura 1, ciclo 2), envolveu discussões para a implantação progressiva das PIC e as atividades de educação permanente em saúde (EPS) que dessem sustentabilidade e permanência às novas ações, de forma a superar as dificuldades verificadas em outros municípios, as quais vinculam as iniciativas à vontade do gestor municipal ou ao protagonismo obstinado de profissionais isolados. Neste ciclo foram necessárias bases e opções teórico-metodológicas adequadas aos desafios e coerentes com o processo

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participativo já desenvolvido no ciclo 1, as quais convergiram para os referenciais teóricos de cogestão de Campos17,18,19 e de EPS de Ceccim20,21, e que também estão no modelo proposto por Santos e Tesser23. A implantação desenvolveu-se por meio da “Oficina de Sensibilização em PIC” em cada uma das seis unidades de saúde indicadas, de julho a setembro de 2011, com objetivo de estabelecer um Plano Local de Implantação das PIC (PLI-PIC), na lógica de que o processo de implantação fosse contextualizado, considerando as peculiaridades e a diversidade de atores sociais envolvidos, promovendo o planejamento ascendente19. A partir dos PLI-PIC, elaborou-se uma plano de atividades de EPS, refletindo os desejos e necessidades dos trabalhadores, fundamentando-se na concepção de educação como espaço de problematização, reflexão e diálogo, com porosidade à realidade mutável e mutante das ações e dos serviços de saúde e a geração de auto-análise, autogestão, implicação, mudança institucional, pensamento e experimentação20.

com clientela adscrita e seguimento de longo prazo, podendo contribuir para a ampliação da clínica, já que um conjunto de sintomas “inexplicáveis” e de difícil manejo para a Biomedicina, pode fazer sentido para o modelo explicativo da Medicina Tradicional Chinesa ou Homeopatia, por exemplo, possibilitando um outro olhar para o problema e novas ferramentas terapêuticas22, podendo trazer ação mais rápida ou menos iatrogênica que a biomedicina22 e facilitando a construção da clínica ampliada.

A institucionalização das PIC motivou inúmeros profissionais a aplicarem na prática seus conhecimentos, organizando seus processos de trabalho para assim fazerem. O que se percebe é que a mera legitimação profissional já contribui para a expansão das PIC na APS, uma vez que o reconhecimento, valorização, diálogo e empoderamento desses profissionais estimula que pratiquem o que sabem, em termos de PIC, mas também que passem a contribuir com sua expertise na sensibilização aos demais colegas e gestores. Resultado disso é que, progressivamen As atividades de EPS em PIC tiveram te ampliou-se o número de unidades de saúde intuito que o desenvolvimento profissional ge- ofertando alguma PIC, com destaque à acupunrasse atores comprometidos com o objeto e a tura, ampliando sua oferta para quase 40% das sua transformação, e não profissionais mais ilus- unidades de saúde de APS ao final do período trados sobre o tema objeto das capacitações21. analisado. Para isso, buscou-se a valorização das potencialiConclusão dades já existentes na rede municipal de saúde, Em um período de 2 anos (abril/2010 a de forma que aqueles profissionais interessados abril/2012) foi possível observar uma alteração pudessem ser facilitadores, e também parceria significativa e positiva no cenário das PIC em com a Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis/SC, período em que a normatisendo estas estratégias também uma tentativa va municipal foi publicada, as discussões foram de superação da deficiência de financiamento levadas a todos os âmbitos e instâncias da Seespecífico, até aquele momento, para a implancretaria Municipal de Saúde, foram sensibilizatação das PIC. Como em todas as unidades de das seis unidades de saúde para implantação de saúde sensibilizadas houveram pactuações de PICs, ofertando treinamentos em acupuntura, ações relacionadas à fitoterapia e à medicina auriculoterapia, automassagem e fitoterapia, tradicional chinesa, o rol de atividades de EPS além de oficinas locais de plantas medicinais ofertado pela CPIC destacou estas áreas. para Agentes Comunitários de Saúde e comu A implantação das PIC em Florianóponidade, resultando em crescimento da oferta lis foi priorizada na APS e parece compatível com a dinâmica desse serviço, principalmente

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destas terapias aos usuários, monitorado via sistema informatizado. A experiência aqui descrita suscintamente pretende contribuir para o fortalecimento da PNPIC e o incentivo à sua legitimação e implantação por outros municípios. A perspectiva é a ampliação para mais unidades de saúde a cada ano, mantendo a lógica de gestão participativa e contextualizada, possibilitando a expansão racional e sustentável dessas práticas para toda a APS de Florianópolis/SC. Têm-se observado que a coparticipação de profissionais e gestores no desenvolvimento de ações em PIC tem sido tão importante quanto os resultados obtidos, fomentando o protagonismo dos sujeitos, democratizando a gestão e refletindo em mudanças na percepção e comprometimento dos envolvidos. As atividades de EPS contextualizadas parece facilitar a permanência e sustentabilidade de novas ações, para que de fato a inserção das PIC possa refletir na ampliação da resolubilidade da APS e na qualificação dos serviços, na perspectiva da integralidade da atenção à saúde da população, tal como preconiza a PNPIC. Referências Bibliográficas 1. NOGALES-GAETE, J. Medicina alternativa y complementaria. Rev Chil Neuro-Psiquiatria, v.42, n.4, p.243-250, 2004. 2. HILL, F. J. Complementary and alternative medicine: the next generation of healyh promotion? Health Promotion International; v.18, n.3, p.265-272, 2003. 3. EASTWOOD, H. Why are Australian GPs using alternative medicine? Postmodernisation, consumerism and the shift towards holistic health. Journal of Sociology; v.36, n.2, p.133156, 2000.

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Revista de Saúde Pública de Florianópolis - Ano 2 - Volume 2

Grupo de Saúde Bucal no Centro de Saúde Agronômica: uma estratégia para ampliação do acesso e promoção da saúde Marina Leite Souza1 (marinaleitesouza@gmail.com) Elisa Da Cunha Fujii2 Viviane Paiva Bock Cavasini1 Daniela Schwabe Minelli2 Nathaliê Egues Moraes2 Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis – SC1 e Universidade Federal de Santa Catarina2

Resumo O Grupo de Saúde Bucal (GSB) é uma estratégia de ampliação da atenção à saúde das crianças do território de abrangência do Centro de Saúde Agronômica (CSA). O GSB tem como objetivos: ampliar o acesso à assistência odontológica para crianças de até 12 anos, encaminhar para consultório as crianças que necessitam de tratamento curativo e realizar ações coletivas de promoção à saúde. São realizadas atividades educativas, ações de higiene bucal, detecção do risco individual e exame bucal. A atividade em grupo possibilita que as crianças realizem comparações sociais, avaliem seus comportamentos e favorece a construção coletiva de novos conhecimentos. De outubro de 2012 a agosto de 2014, participaram do GSB 685 crianças. Os dados obtidos com os exames bucais revelaram que 55,9% das crianças não necessitaram de encaminhamento para atendimento individual e 44,1% foram encaminhadas para o atendimento clínico. O GSB proporciona a ampliação do acesso à assistência odontológica para crianças de até 12 anos, otimização das agendas e estabelecimento de vínculo entre profissionais e usuários. O GSB se estabelece como uma ação permanente por ser uma proposta de fácil execução e reprodutibilidade na Atenção Básica. Palavras-Chave: saúde bucal; ampliação do acesso; promoção da saúde; atividade coletiva Introdução

No bairro Agronômica, segundo dados O Centro de Saúde Agronômica (CSA) está do Sistema de Informação da Atenção Básica localizado no município de Florianópolis, San- (SIAB), em 2013, o número de crianças de 0 a ta Catarina, e atende uma população de aproxi- 12 anos era de aproximadamente 1600. A partir madamente 17 mil habitantes1. Esse centro de desse contexto, as dentistas do CSA planejaram saúde conta com 4 Equipes de Saúde da Família e desenvolveram uma proposta para melhor (ESF) e 3 Equipes de Saúde Bucal (ESB). O seu aproveitamento das consultas ofertadas à poputerritório de abrangência é dividido em 4 áreas lação de até 12 anos: o Grupo de Saúde Bucal e, embora o número de ESB não corresponda (GSB). Essa proposta de atendimento em grupo ao número de áreas de abrangência do territó- teve início em outubro de 2012. rio, as ESB se comprometem a dar cobertura Objetivos total às 4 áreas. O GSB tem como objetivos ampliar o acesso Uma das atribuições das ESB é realizar a à assistência odontológica para crianças de 0 a atenção integral em saúde com ações de pro12 anos, encaminhar para consultório apenas as moção, prevenção, assistência e reabilitação, crianças que necessitam de tratamento odontode forma individual e coletiva, a todas as famílógico curativo e realizar ações coletivas de prolias, indivíduos e grupos específicos, como, por moção de saúde e prevenção de agravos. exemplo, as crianças2.

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Metodologia O GSB está estruturado em 4 subgrupos de acordo com a faixa etária dos participantes: 0 a 6 meses; 7 meses a 2 anos; 3 a 6 anos e 7 a 12 anos. Essa divisão mostra-se importante para propiciar uma abordagem direcionada a cada momento da vida, já que apresentam peculiaridades e necessitam de atenção diferenciada. Os encontros do GSB acontecem semanalmente no auditório do CSA, com duração aproximada de 1 hora e 30 minutos, contando o tempo de organização (30 minutos) e execução da ação (1 hora). A periodicidade de cada subgrupo é mensal e não há limite de participantes. Para realização das atividades são utilizados materiais disponibilizados pela SMS, como es-

covódromos portáteis, macro-modelos de arcadas dentárias, escovas dentais, dentifrícios fluoretados, fantoches, jogos educativos, somado aos materiais produzidos pela equipe envolvida no grupo, como folhetos referentes às diversas temáticas e vídeos informativos. O GSB é coordenado pelas ESB e conta com a participação das ESF, de profissionais da Residência Multiprofissional em Saúde da Família da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) - assistente social, enfermeiro, farmacêutico, nutricionista, odontólogo e profissional de educação física, além de alunos de graduação do Curso de Odontologia da UFSC. A participação da equipe multiprofissional ocorre por meio de reuniões para planejamento das

Figura 1 - Fichas odontológicas utilizadas nos GSB

Fonte: elaborado pelas autoras, 2012.

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atividades educativas e atuação na execução das ações, possibilitando a troca de saberes e a construção coletiva das propostas a serem aplicadas. Cada encontro do GSB é organizado em 4 momentos: Momento 1 - Atividades educativas: realização de atividades interativas, de caráter lúdico-pedagógico, apropriadas a cada faixa etária, que proporcionam o compartilhamento de experiências e construção de saberes3 entre crianças, seus responsáveis e profissionais. São abordados além de temas referentes à odontologia, assuntos relacionados ao conceito ampliado de saúde, como amamentação, alimentação, higiene, hábitos saudáveis e deletérios, estilo de vida ativo e cuidados no uso de medicamentos, reforçando a importância dos responsáveis resgatarem esses assuntos no cotidiano familiar e na cooperação dos cuidados, resultando em ações de promoção de saúde e prevenção de agravos. A atividade em grupo possibilita que as crianças realizem comparações sociais, avaliem seus comportamentos e favorece a construção coletiva de novos conhecimentos4,5,6. Momento 2 - Higiene bucal: orientação e demonstração da higiene bucal para os responsáveis das crianças de 0 a 6 meses com utilização de gaze ou fralda de tecido ou dedeira de silicone com água potável. Para as crianças entre 7 meses e 2 anos os profissionais realizam higiene com escova dental e mínima quantidade de dentifrício fluoretado, demonstrando a prática aos responsáveis. Os participantes acima de 3 anos realizam a escovação com a colaboração dos responsáveis, sob supervisão dos profissionais, com auxílio do escovódromo e espelho fixo, no qual a criança se visualiza e desenvolve auto-percepção e habilidades para o auto- cuidado. A atividade prevê fornecimento de escovas dentais e demonstração do uso racional de dentifrício fluoretado. Momento 3 - Detecção do risco individual: preenchimento de fichas odontológicas, elaboradas pelas ESB (Figura 1), para coleta de dados

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referentes à determinação do risco de desenvolvimento de alterações bucais, contendo campos para registro de informações como: nome da criança e data de nascimento, nome do responsável, fatores de risco aos agravos bucais (amamentação exclusiva, alimentação complementar, mamada noturna, dormir com a mãe, uso de chupeta, consumo de sacarose, frequência de escovação, uso de fio dental), exame clínico e encaminhamento. Momento 4 - Exame bucal: realização do exame e registro em ficha odontológica sobre a condição de saúde bucal das crianças. A ação é realizada com acompanhamento dos responsáveis, permitindo esclarecimento da necessidade ou não de encaminhamento para tratamento em consultório. Os responsáveis das crianças que necessitam do encaminhamento recebem um lembrete impresso para marcação de consulta individual, a ser apresentado na recepção do CSA para agendamento prioritário da criança. Assim, as crianças saem do GSB com data agendada para o tratamento odontológico individual com a dentista da área. Pode-se considerar que nos momentos 3 e 4 do GSB acontece a primeira consulta odontológica programática, prevista pelo Ministério da Saúde (MS), momento em que o exame odontológico do paciente é realizado, com finalidade de diagnóstico e, necessariamente, com a elaboração de um plano preventivo-terapêutico (PPT), no âmbito de um programa de saúde2. Resultados e Discussão O desafio encontrado pelos profissionais envolvidos no GSB foi a resistência da população com relação à reorganização do processo de trabalho, que ocorria por meio de agendamento de consultas individuais e passou a ser realizado por meio de atendimento coletivo. O enfrentamento dessa dificuldade ocorreu de maneira gradual, por meio de esclarecimentos aos usuários do serviço quanto aos benefícios gerados por essa modificação.


A ampliação do acesso à assistência odontológica ao público de 0 a 12 anos surgiu como a principal vantagem da implementação do GSB, constatada por possibilitar aumento no número de atendimentos, já que não existe limite de participantes e, consequentemente, nas primeiras consultas odontológicas programáticas, que passaram a ser realizadas nesse grupo, e não no consultório, reservando-o apenas para o tratamento curativo dos agravos de saúde bucal. Vale ressaltar que essa estratégia de atendimento permite trabalhar com importantes indicadores da área de saúde bucal, redefinidos em 2006, pelo Pacto de Indicadores da Atenção Básica do MS2, entre eles, a cobertura de primeira consulta odontológica programática e cobertura da ação coletiva de escovação dental supervisionada. Além disso, em um estudo realizado no ano de 2008, em Porto Alegre, identificou-se a percepção dos pais ou responsáveis acerca dos cuidados com a saúde bucal das crianças. Dos 235 entrevistados, 45% consideraram que as ações de higiene bucal deveria ser iniciada antes dos seis meses de idade7, o que tem sido desenvolvido no GSB do CSA. No período de outubro de 2012 a agosto de 2014, participaram do GSB 685 crianças, com média de 8,4 participantes por subgrupo (Tabela 1). Os dados obtidos com os exames bucais revelaram que 44,1% precisaram de atendimento individual para procedimento curativo e 55,9% não necessitaram de encaminhamento e foram orientadas a retornar ao GSB para acomGrupo de Saúde Bucal por faixa etária

Total de participantes

Número de GSB realizados

Média de participantes por GSB

0 a 6 meses

118

20

5,9

7 meses a 2 anos

124

20

3 a 6 anos

186

7 a 12 anos TOTAL

panhamento e monitoramento, com periodicidade de acordo com o risco individual detectado (Tabela 2). Na prática clínica do CSA, os atendimentos odontológicos têm duração média de 30 minutos. A partir disso, para a primeira consulta individual das 685 crianças que participaram do GSB seriam necessárias aproximadamente 342,5 horas de atendimento em consultório. Considerando que cada encontro do grupo se desenvolve em 1 hora e 30 minutos, nos 81 encontros realizados de outubro de 2012 a agosto de 2014, foram utilizadas 121,5 horas de trabalho. Desta forma, restaram aproximadamente 221 horas, ou seja, o tempo utilizado para a realização das primeiras consultas odontológicas das crianças no GSB foi 64,5% menor do que se fossem feitas individualmente. Isso permitiu um aumento de aproximadamente 440 vagas para consultas odontológicas destinadas a toda população da área de abrangência do CSA. Como consequência, ocorreu otimização do tempo de trabalho das ESB e permitiu um melhor aproveitamento das agendas de atendimento individual à população em geral (urgências, gestantes, diabéticos, idosos, adolescentes, adultos, entre outros), além de ter favorecido a participação das ESB em outras ações em saúde, a exemplo da participação em programas governamentais, na Atenção Básica, como o Programa Saúde na Escola e os Grupos de Tratamento aos Fumantes. Com relação à realização de ações coletivas, no que diz respeito às temáticas de promoção de saúde e prevenção de agravos, consEncaminhamento

Frequência Absoluta

Frequência Relativa

6,2

Retorno ao GSB

383

55,9%

20

9,3

Tratamento curativo em consultório odontológico

302

44,1%

257

21

12,2

TOTAL

685

100%

685

81

8,4

Tabela 1 – Média de participantes por Grupo de Saúde Bucal, entre os meses de outubro de 2012 e agosto de 2014. Florianópolis, SC, 2014.

Tabela 2 – Número de participantes entre 0 e 12 anos nos Grupos de Saúde Bucal, distribuídos de acordo com o encaminhamento. Florianópolis, SC, outubro de 2012 a agosto de 2014.

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tatou-se que o GSB aparece como um potencial espaço para abordagem de assuntos relacionados ao conceito ampliado de saúde, utilizando estratégias diferenciadas de compartilhamento de saberes e experiências entre todos os envolvidos nessa atividade, profissionais, crianças e seus responsáveis, possibilitando além de uma construção coletiva sobre o entendimento de saúde e integralidade dos cuidados, a valorização do conhecimento popular, somado ao conhecimento científico. Kuhn8 e Faustino-Silva e colaboradores7 constataram que os pais e responsáveis de crianças na fase de primeira infância desconhecem os cuidados com a saúde bucal e o risco de desenvolvimento de doenças, como a cárie dentária, nessa faixa etária. Dessa forma, é imprescindível a realização de ações educativas voltadas a esse público no contexto da saúde pública, uma vez que a diversidade sociocultural das famílias tem um grande impacto no desenvolvimento de hábitos de saúde bucal das crianças. A constatação desse fato pelas ESB do CSA justifica e reforça a metodologia desenvolvida no GSB na atenção básica, com planejamento e execução de atividades de educação em saúde específicas para cada grupo etário.

desenvolvimento infantil. Essa percepção foi identificada a partir dos relatos emitidos pelos participantes às ESB em momentos posteriores, tanto em atendimentos individuais, quanto em grupos subsequentes. Conclusão A estruturação do GSB proporcionou a ampliação do acesso à assistência odontológica para crianças de 0 a 12 anos e otimização do tempo e espaço para realização de outras atividades das ESB. A realização de ações coletivas de promoção de saúde e prevenção de agravos, considerando o conceito ampliado de saúde, buscou melhorar a qualidade de vida às crianças e suas famílias, além de ter oportunizado a interação entre moradores de diferentes localidades da área adstrita, favorecendo o seu desenvolvimento afetivo-social.

A estratégia de intervenção com esse público deixou de ser apenas instrucional e passou a ser participativa e dialógica, e estimulou a busca de autonomia dos sujeitos. A aplicação de atividades lúdico-pedagógicas apareceu como determinante para facilitar o entendimento e aprendizagem dos assuntos abordados, uma vez que a interação desses participantes nas atividades educativas do GSB os torna parte da constru O apoio da equipe multiprofissional no ção coletiva de saberes e corresponsabilização planejamento e execução das ações, no GSB, dos cuidados, favorecendo o fortalecimento de qualificou o processo de tomada de decisão com vínculo entre profissionais e usuários. relação à escolha do tema e metodologia aborPor fim, o GSB se estabeleceu como uma dados em cada subgrupo, atentando-se para a seleção de assuntos e estratégias lúdico-pedagó- ação permanente no CSA, em razão de ser uma gicas que facilitassem a participação efetiva de proposta de fácil execução e reprodutibilidade crianças e seus responsáveis nas atividades e o nos contextos da Atenção Básica. Nesse sentido, para sua implantação são necessários apenas: loentendimento do assunto. cal para desenvolvimento dos grupos, recursos Os assuntos relacionados à saúde, abordamateriais de baixo custo e apoio de profissionais dos no GSB, por meio de diversas atividades de outras áreas de conhecimento e da coordenaeducativas, favorecem a reflexão sobre hábitos ção da unidade. e comportamentos familiares, além de incentiComo metas para os próximos anos os provar os sujeitos envolvidos a pensarem sobre a corresponsabilização dos adultos nos cuidados fissionais envolvidos planejam alcançar a amda criança e manutenção do acompanhamento, pliação do número de participantes dos GSB e de forma longitudinal, garantindo a saúde e o extensão das atividades aos adolescentes.

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Referências Bibliográficas 1. Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis. População Florianópolis 2013. Distrito Sanitário Centro. Centro de Saúde Agronômica. Disponível em: http://www.pmf.sc.gov.br/ sistemas/saude/unidades_saude/populacao/uls_2013_index. php. Acesso em: 08 set 2014. 2. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Cadernos de Atenção Básica n° 17. Brasília: Ministério da Saúde, 2008. 92 p. – (Série A. Normas e Manuais Técnicos) (Cadernos de Atenção Básica; 17). 3. Torres H, Hortale VA, Schall V. A experiência de jogos em grupos operativos na educação em saúde para diabéticos. Cadernos de Saúde Pública. 2003; 19 (4): 1039-1047. 4. Cruz ELC, Dias PCC, Mancebo PC. A criança no grupo: os benefícios da psicoterapia de grupo com crianças de 03 a 05 anos. CES Revista. 2007; 21: 141-152. 5. Dias VP, Silveira DT,Witt RR. Educação em saúde: o trabalho de grupos em atenção primária. Rev. APS. 2009; 12(2): 221-227. 6. Pekelman R. Caminhos para uma ação educativa emancipadora: a prática educativa no cotidiano dos serviços de atenção primária em saúde. Revista de APS. 2008; 11 (3): 295-302. 7. Faustino- Silva DD, Ritter F, Nascimento IM, Fontanive PVN, Persici S, Rossoni E. Cuidados em saúde bucal na primeira infância: percepções e conhecimentos de pais ou responsáveis de crianças em um centro de saúde de Porto Alegre, RS. Revista Odonto Ciência. 2008; 23 (4): 375-379. 8. Kuhn E. Promoção da saúde bucal em bebês participantes de um programa educativo-preventivo na cidade de Ponta Grossa - PR [Dissertação]. Rio de Janeiro: Escola Nacional de Saúde Pública. FIOCRUZ; 2002.

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Revista de Saúde Pública de Florianópolis - Ano 2 - Volume 2

Controle ambiental da tungíase (bicho de pé): papel integrado entre Atenção Primária, Centro de Controle de Zoonoses e Bem Estar Animal Paulo Vinícius Nascimento Fontanive (paulofontanive@gmail.com) Fábio de Melo Chaves Indá Eva Terezinha dos Santos Ota Caroline Ricci Muller Márcio Cardoso Wilmar do Nascimento João Eduardo Pereira Cavallazzi Leandra Martinha Mariano Lilian Silvério Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis

Resumo A tungíase, ectoparasitose causada pela pulga Tunga penetrans, conhecida como bicho de pé, é endêmica especialmente em comunidades urbanas sócio vulneráveis. Neste estudo foram realizadas ações intersetoriais em uma região de Florianópolis que apresentava alta infestação ambiental e indivíduos com carga parasitária elevada. Os casos clínicos foram identificados e tratados pelo Serviço de Atenção Primária do Cento de Saúde Santinho. Uma área de 35.000m2 recebeu tratamento químico pelo Centro de Controle de Zoonoses para controle da infestação. Os cães e gatos pertencentes à comunidade receberam medicamentos antiparasitários e foram submetidos à castração pelo Bem Estar Animal. Os dados mostraram que após as intervenções houve redução significativa da infestação por bicho de pé. A doença precisa ser reconhecida como problema de saúde pública e necessita de ações de controle e monitoramento no âmbito coletivo, aliado às melhorias da educação, do trabalho e da infraestrutura urbana nas comunidades mais carentes. Palavras-chave: Atenção Primária à Saúde, Saúde da Família, Tungíase, Controle de Zoonoses, controle ambiental Introdução O município de Florianópolis apresenta grande diversidade territorial como áreas de floresta atlântica, restinga, manguezais, dunas e outros biomas. Da mesma forma, a população encontra-se heterogeneamente distribuída. Há locais de adensamento populacional, áreas de grande urbanização e regiões cuja densidade remonta a característica de populações rurais. O território do Distrito Sanitário Norte conta com quatro áreas de interesse social: A comunidade do Papaquara (Canasvieiras), a vila União (Vargem do Bom Jesus), a região das Dunas da Rua Adão dos Reis e a Comunidade do

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Arvoredo (Ingleses), sendo essa última a área de estudo. O Centro de Saúde Santinho, serviço de Atenção Primária que assiste à população da comunidade do Arvoredo, há alguns anos presta atendimento repetidamente a indivíduos que apresentam Tungíase, zoonose parasitária ocasionada pelo contato com ambiente contaminado com a pulga Tunga penetrans, conforme figura 1. O problema existente na comunidade do Arvoredo foi notificado pela Atenção Primária ao Centro de Controle de Zoonoses (CCZ), que desenvolve ações voltadas para vigilância, prevenção e controle de zoonoses e de agravos cau-


Figura 1 - ciclo biológico da Tunga penetrans.(Fonte: CDC)

sados por animais sinantrópicos, peçonhentos e venenosos, de relevância para a saúde pública.

dificuldades de locomoção, perda de unhas, deformações dos dígitos, edema e fissuras que Diante da demanda o CCZ solicitou a par- podem servir de entrada para microorganismos 4 ticipação do Bem Estar Animal (DIBEA) para patogênicos . O tétano é complicação comum, intervir na saúde e no controle populacional estimando-se que cerca de 50% dos casos de tédos cães e gatos pertencentes à área de estudo. tano nas áreas endêmicas sejam secundários à 5 O agravo tem sido registrado nas regiões infestação pela Tunga penetrans . A Tungíase casubsaarianas da África, no Caribe e na América racteriza-se por ser auto-limitante, com duração do Sul. No Brasil, ocorre do Amazonas ao Rio de quatro a seis semanas, porém, a reinfestação Grande do Sul, sobretudo nas áreas mais po- constante é a regra, e os indivíduos afetados bres da Região Nordeste e em áreas indígenas1. podem apresentar algumas dezenas de parasiÉ mais prevalente em assentamentos urbanos tas em diferentes estágios de desenvolvimenprecários, áreas rurais e comunidades de pesca- to. Ainda hoje, é causa de patologia grave em dores em todo o país2. A doença, popularmente comunidades urbanas com baixos indicadores conhecida como bicho de pé, é uma ectoparasitose negligenciada causada pela penetração permanente da pulga Tunga penetrans na pele de seu hospedeiro. Depois da penetração, mais comumente localizada nos pés, a pulga se hipertrofia, e alguns dias depois seus segmentos abdominais atingem o diâmetro de até 1 centímetro3. A Tungíase caracteriza-se por lesão na derme (figura 2) ocasionada pela penetração do parasita que causa incômodos como prurido, dor, Figura 2 - Lesão ocasionada por Tunga penetrans (Fonte: CDC)

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de desenvolvimento humano, e que nessas condições essa ectoparasitose precisa ser considerada como um importante problema de saúde pública4. A ação foi realizada com a interação da Atenção Primária em Saúde, CCZ e DIBEA, com o objetivo de reduzir a morbidade e melhorar a saúde ambiental da comunidade. Metodologia Área de estudo: o estudo foi realizado nas micro-áreas 02 e 03 da área 980 da Unidade de Saúde Santinho, conhecida como comunidade do Arvoredo, localizada nas dunas próximas à beira mar da praia dos Ingleses. A população é de aproximadamente 680 moradores em condições socioeconômicas precárias, que convivem com um grande número de cães semi domiciliados e outros animais domésticos. Os moradores usam as dunas como acesso a outras regiões do bairro. Há nessa comunidade uma prevalência histórica de infecção por bicho de pé. População e desenho de estudo: os casos de Tungíase foram registrados a partir de relatório extraído do prontuário eletrônico INFO Saúde, que relacionava o número de casos de Tungíase (CID B88.1) ocorridos no período entre outubro de 2012 a outubro de 2014. Dois relatórios foram gerados considerando a população da microárea 02 e 03, truncado para o CID B88.1 e para o período em questão. Não foram considerados os casos ocorridos em pacientes com cadastros provisórios, ou ainda os atendimentos realizados a usuários nas condições de turistas. A partir de relatório e solicitação encaminhados pela equipe de Saúde da Família do CS Santinho e do NASF Norte ao CCZ, que posteriormente envolveu a DIBEA nas ações, houve visita à comunidade da Vila do Arvoredo em junho de 2013 com definição de estratégias para o combate à Tungíase. Foi realizado busca ativa, identificação, tratamento e controle dos indivíduos parasitados. O Centro de Saúde e equipe NASF mantiveram o cuidado dos pacientes com Tungíase.

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Controle químico ambiental: A informação referente a data de aplicação do inseticida foi divulgada por meio do Conselho de Saúde e por meio de cartazes afixados em locais estratégicos na comunidade. Neste sentido a participação dos agentes comunitários de saúde garantiu que a população estivesse ciente dos objetivos do controle ambiental e evitando casos de intoxicação. Uma área de 35000 metros quadrados foi pulverizada com produto químico (Lambda Cialotrina) pelo CCZ, reaplicado quinze dias após. Controle no animal: Foi realizado tratamento antiparasitário com Nitenpiram dos cães e gatos pela DIBEA. Além disso, a castração desses animais foi preconizada como forma de diminuir a população canina e felina e evitar a transmissão de zoonoses. Educação em saúde: Outro importante passo foi a busca por meios alternativos de controle. Neste sentido, os vários setores como a saúde, a habitação e educação (por meio da Escola Gentil Mathias) realizaram de forma integrada trabalho de esclarecimento e controle de reservatórios não humanos e ações de educação para a saúde6. Resultados e Discussão A Tabela 1 demonstra a diferença no perfil sociodemográfico entre as micro-áreas 02 e 03 da área de abrangência 980 do Centro de Saúde Santinho. Há evidente predominância de indivíduos pardos/pretos e vivendo com menos de 1 salário mínimo na micro-área 02. Esta informação demonstra que mesmo a comunidade abrangendo as duas microáreas há predomínio de indivíduos em situação de maior vulnerabilidade na área 980-02. Isto vem ao encontro da localização dos casos de Tungíase e a maior precariedade das condições sanitárias e também maior proximidade com a areia e as dunas. É importante salientar que 55% dos indivíduos da área 980-02 apresentam renda inferior a 1 salário mínimo mensal.


Figura 1: Perfil demográfico e de renda da população das áreas 980-02 e 980-03 que compreendem a comunidade do Arvoredo de acordo com a projeção do IBGE 2012. Microárea Microárea Total (980-02) (980-03) N % N % N Sexo Homens residentes 293 48,9 296 51,1 599 Mulheres residentes 308 51,2 303 48,8 601 Cor Pessoas Residentes e cor ou raça – branca 352 40,8 510 59,2 862 Pessoas Residentes e cor ou raça - preta 9 33,3 18 66,7 27 Pessoas Residentes e cor ou raça - amarela 3 37,5 5 62,5 8 Pessoas Residentes e cor ou raça - parda 237 78,2 66 21,8 303 Renda (Salários Mínimos) Sem Rendimento mensal 212 61,1 135 38,9 347 Até ½ Salário Mínimo 18 78,3 5 21,7 23 De ½ a 1 Salário Mínimo 103 65,2 55 34,8 158 De 1 a 2 Salários Mínimos 106 41,4 150 58,6 256 De 2 a 3 Salários Mínimos 10 13,2 66 86,8 76 De 3 a 5 Salários Mínimos 7 9,6 66 90,4 73 De 5 ou mais Salário Mínimos 145 54,3 122 45,7 267

Tabela 1: Perfil demográfico e de renda da população das áreas 980-02 e 980-03 que compreendem a comunidade do Arvoredo de acordo com a projeção do IBGE 2012

A avaliação do número de casos de Tungíase antes e depois da intervenção demonstrou que a estratégia de controle ambiental, seja pelo uso de inseticidas, seja pelo reconhecimento de animais reservatórios, associado a medidas de promoção da saúde por meio de atividades de educação em saúde apresentou resultado na redução global de casos próximo ao observado em outros estudos na literatura7. Desde a atividade houve redução de 53% nos atendimentos relacionados a Tungíase no Centro de Saúde quando comparado com período semelhante entre os anos de 2014 (97 atendimentos) e 2013 (206 atendimentos). Como limitações do estudo podemos citar que não se trata de um estudo de base populacional com levantamento de uma amostra da população de indivíduos por meio de coleta de dados primários nos domicílios. Os casos registrados são um proxy do impacto das ações na comunidade, podendo o impacto ser maior ou menor do que o verificado. Presume-se, no entanto, que a partir da cobertura populacional de pessoas atendidas pela Unidade de Saúde do Santinho (em torno de 83% da população estimada IBGE) que o efeito da intervenção tenha alcançado proporção próxima a isto.

netrans na comunidade da Vila do Arvoredo foi fundamental, visto a necessidade do controle ambiental, do tratamento de animais e dos pacientes. Abordagem do problema em conjunto na comunidade8 proporcionou acesso às melhorias ambientais e da saúde dos animais na região, determinando promoção na saúde da população quanto à Tungíase. O monitoramento da prática está sendo realizado de forma qualitativa, por meio da observação pela equipe do Centro de Saúde da diminuição da demanda de casos dessa zoonose parasitária na comunidade. Considerações Finais

O desenvolvimento de ações articuladas por setores da área da saúde por meio da sensibilização de atores locais apresentou resultados significativos considerando o alcance deste tipo de ação. Os resultados se materializaram na percepção de moradores da comunidade e agentes comunitárias de saúde que atuam no local por meio de relatos referentes a redução significativa da infestação por “bichos de pé”. Na opinião dos autores o resultado alcançado, foi inexoravelmente atingido por uma melhor gestão de recursos e pela adoção de uma estratégia eficiente. A responsabilidade sanitária compartilhada Ainda como resultado da intervenção, poentre os diferentes setores é um desafio para demos compreender que o estabelecimento de melhora dos níveis de saúde da população. De parcerias no manejo da infestação por Tunga peacordo o estudo de caso sugere-se identificação

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de necessidade e adoção por todos os setores da SMS, quando necessário. Referências Bibliográficas 1. BONFIM, W. M., et.al. Tungiasis in Underprivileged Communities in Natal, State of Rio Grande do Norte, Brazil: Prevalence and Associated Factors. Epidemiol. Serv. Saúde, Brasília, 19(4):379-388, out-dez 2010. 2. GATTI, F. R., OLIVEIRA, C. M; SERVILHA, et. al. Tungíase disseminada tratada com ivermectina. An. Bras. Dermatol. [online]. 2008, vol.83, n.4, pp. 339-342. ISSN 18064841. 3. HEUKELBACH, JORG. Tungiasis. Rev. Inst. Med. trop. S. Paulo [online]. 2005, vol.47, n.6, pp. 307-313. ISSN 0036-4665. 4. ARIZA, L., et al. Tungíase: doença negligenciada causando patologia grave em uma favela de Fortaleza, Ceará. Rev. Soc. Bras. Med. Trop. [online]. 2007, vol.40, n.1, pp. 63-67. ISSN 0037-8682. 5. HEEMSKERK J, et. al, . Tunga Penetrans – A case report and review of the literature. Acta Chir Belg. 2005;105:548-50. 6. BARCELLOS, C.; QUITÉRIO, L. A. D.Vigilância ambiental em saúde e sua implantação no Sistema Único de Saúde. Revista de Saúde Pública, v. 40, n. 1, p. 170-177, 2006. 7. MATIAS, R. S.Verificação da eficácia de diferentes inseticidas no controle ambiental de Tunga penetrans (L., 1758). RevSocBrasMedTrop, v. 24, p. 31-36, 1991. 8. CARVALHO, T. F. et al. Conhecimento dos profissionais de saúde sobre a situação da tungíase em uma área endêmica no município de Uberlândia, Minas Gerais, Brasil, 2010. Epidemiologia e Serviços de Saúde, p. 243, 2003.

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Revista de Saúde Pública de Florianópolis - Ano 2 - Volume 2

A experiência de Florianópolis na construção de fluxos de acesso para a regulação das especialidades odontológicas no SUS Mônica De Souza Netto Mello (monicanettomello@gmail.com) Sônia Maria Polidório Pereira Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis – SC

Resumo A Regulação busca qualificar os encaminhamentos da atenção primária de modo mais racional, equânime, pautado em critérios de priorização de riscos; assim como, disponibilizar serviços com base epidemiológica, redimensionar a oferta e coibir fluxos paralelos não científicos ou não pactuados. Todavia, as definições das prioridades e fluxos de acesso sempre foram um desafio para a regulação dos serviços odontológicos em Florianópolis devido à carência de instruções normativas no município. Com o objetivo de qualificar esse acesso, em 2013, a gestão implantou normativas com a participação efetiva dos trabalhadores de saúde bucal da rede. Entre fevereiro a setembro, reuniram-se os profissionais da assistência e gestão totalizando 75% de participação da rede em cinco etapas, a citar: Gestão e CEOs, Gestão e APS, Análise do material, Publicação no Info Saúde e Monitoramento/Avaliação. Esta ação promoveu espaços de participação, corresponsabilidade e protagonismo dos envolvidos; obtenção de um produto final mais eficiente e resolutivo e fortalecimento da articulação entre os diferentes níveis de atenção. Como produto final, obteve-se a construção de protocolos de sete especialidades odontológicas que orientam e qualificam os encaminhamentos, reduzem filas de espera, promovem transparência e melhoria do acesso aos usuários. Palavras-chave: Especialidades odontológicas, Regulação do setor público em saúde. Introdução Transcorridas mais de duas décadas do processo de institucionalização do Sistema Único de Saúde (SUS), sua implantação e implementação avançaram muito, em especial nos processos de descentralização e municipalização das ações e serviços de saúde. A descentralização vem colocando desafios permanentes aos gestores, à medida que se busca superar fragilidades do SUS e qualificar o acesso à atenção integral à saúde1,2. Nesse sentido, inúmeros desafios são vivenciados pela gestão, tais como uma maior capacidade regulatória e fiscalizatória frente aos prestadores de serviços de saúde. Se por um lado, a otimização dos recursos e a transparência da sua aplicação repercutem positivamente na gestão do SUS; por outro, a centralidade no usuário traz para pauta o acesso, a qualidade e a humanização, enquanto prioridades da sua gestão1,3,4.

Gawryszewski e colaboradores5 destacam que dentre essas prioridades, encontram-se as de regulação da atenção à saúde, que são responsáveis em reconhecer as demandas, classificá-las e dar resposta exigida a estas necessidades. O Pacto Pela Saúde define regulação como um conjunto de relações, saberes, tecnologias e ações que intermediam a demanda dos usuários por serviços de saúde e o acesso a eles efetivado por meio de centrais de regulação6,7,1. A Portaria nº 1.792/2012, que institui incentivo financeiro de custeio destinado às Centrais de Regulação organizadas no âmbito do SUS, estabelece que para se habilitar ao recebimento do incentivo financeiro, a Central de Regulação deve cumprir alguns requisitos, dentre eles, ter abrangência regional e possuir e utilizar protocolos clínicos para regulação do acesso8. As Centrais de Regulação são responsáveis pela identificação da alternativa assistencial

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mais adequada à necessidade do cidadão, fundamentada em protocolos assistenciais que podem ser categorizados como Protocolos Clínicos e Protocolos de Regulação do Acesso. Um dos recursos que pode facilitar a interface entre o Complexo Regulador e os diferentes pontos da rede assistencial são os Protocolos Clínicos e de Regulação (PCRs), termo adotado pelo Ministério da Saúde e o Conselho Nacional dos Secretários de Saúde para as orientações sistematizadas com base nas evidências científicas e nos resultados práticos que auxiliam os usuários, os profissionais de saúde e os gestores na tomada de decisão clínica e de regulação para resolver os problemas de saúde da população9. Conforme Santos, os Protocolos Clínicos são recomendações sistematicamente desenvolvidas com objetivo de orientação dos profissionais solicitantes e usuários acerca de cuidados de saúde apropriados em circunstâncias clínicas específicas. E, os Protocolos de Regulação de Acesso são diretrizes para solicitar e usar, adequada e racionalmente, as tecnologias de apoio, diagnóstico e terapias especializadas, constituindo-se como instrumento de ordenação dos fluxos de encaminhamentos entre os níveis de complexidade assistencial9.

Regulação dos Serviços Odontológicos em Florianópolis A fim de viabilizar o incremento do acesso às especialidades odontológicas no SUS, o Ministério da Saúde publicou a Política Nacional de Saúde Bucal em 2004 que busca viabilizar a oferta da atenção secundária por meio dos centros de especialidades odontológicas (CEOs). Os CEOs são estabelecimentos especializados em saúde bucal que devem ofertar, minimamente, serviços de diagnóstico bucal com ênfase no diagnóstico do câncer de boca, periodontia especializada, cirurgia oral menor dos tecidos moles e duros, endodontia e atendimento a pessoas com necessidades especiais11,12,13. No município de Florianópolis/SC, há dois CEOs, um localizado na policlínica centro e o outro, na policlínica continente. Os encaminhamentos realizados pelos cirurgiões-dentistas das equipes de saúde bucal (ESBs) são inseridos no Sistema de Regulação municipal pelo Sisreg III nos centros de saúde. Na central de Regulação, o dentista regulador avalia cada encaminhamento deste e o classifica, conforme o risco.

Sob a ótica da demanda, a regulação do acesso busca qualificá-la, disponibilizando o serviço Segundo Mendes, os protocolos clínicos de saúde mais adequado e disponível ao usuácumprem, nas redes de atenção à saúde, três rio, em momento racional, equânime, ordenafunções: a gerencial, a educacional e a legal. A do e pautado em critérios de priorização de risfunção gerencial consiste em reduzir a comple- cos. Sob o aspecto da oferta, o que se busca é a xidade do sistema pela via da padronização e disponibilização de serviços e recursos assistenem reduzir a variabilidade da oferta de serviços, ciais adequados às necessidades da população uma das características inerentes aos sistemas com base em critérios epidemiológicos14. de saúde; a função educacional decorre da utiliTodavia, as definições das prioridades por zação das diretrizes clínicas como instrumentos risco sempre foram um desafio para a regulação dos processos de educação permanente para os do acesso ao serviço odontológico especializaprofissionais de saúde e de educação em saúde do, devido à carência de instruções normativas para os usuários; e a função legal vem da utiliza- do município que norteassem e assegurassem o ção dos protocolos clínicos pelas Cortes Judiciá- dentista regulador e que garantissem a transparias em suas deliberações sobre os contenciosos rência desse processo. dos serviços de saúde10. Além disso, o excesso de encaminhamentos inadequados à regulação, com ausência de da-

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dos clínicos e/ou dados clínicos que não justificam o encaminhamento ao especialista, denotava a necessidade de adoção de ferramentas para qualificação das solicitações de consultas e exames. Para buscar resolução dessa problemática e vencer esse desafio, no ano de 2013, a gestão não mediu esforços para a implantação de instruções normativas ao acesso à odontologia especializada. Deste modo, planejou uma construção coletiva com a participação dos trabalhadores de saúde bucal da rede por entender que para a efetivação da regulação do acesso não bastam apenas a alocação de computadores, a utilização de sistemas de informação e criação de normas e protocolos verticais pelos gestores, mas é preciso que a rede incorpore a importância da regulação e sinta-se corresponsável na prestação de serviço especializado aos usuários. Metodologia O planejamento dessa prática buscou organizar e desenvolver etapas que propiciassem a reflexão, autonomia, corresponsabilidade e protagonismo de todos os atores envolvidos para a obtenção de um produto final mais eficiente, efetivo e resolutivo.

2ª etapa: Gestão e ESBs - Na segunda etapa foram realizados um total de 5 encontros, entre gestão e profissionais das ESBs, utilizando-se as reuniões de distritos sanitários já existentes. Nesses encontros foram apresentados os materiais elaborados na primeira etapa, discutidos e acolhidas as contribuições, sugestões e contrapropostas. 3ª etapa: Documento para análise de 100% da rede - Após coletadas as sugestões das ESBs e CEOs, procedeu-se à elaboração de um documento final que foi enviado a todos os odontólogos da rede, por e-mail, a fim de oportunizar nova análise, contribuições e sugestões finais. Assim como, propiciar aos profissionais que não puderam comparecer às reuniões acesso ao documento e sugestões, caso desejassem. 4ª etapa: Publicação e disponibilização dos PCR no Info Saúde - Após a terceira etapa, procedeu-se à elaboração do documento final, por especialidade odontológica, em consonância com a Instrução Normativa 005/2010. Seguiu-se à publicação e inserção no Info-Saúde, prontuário eletrônico, onde estão disponíveis para consulta das ESBs de toda a rede. 5ª etapa: Monitoramento/avaliação pelo Sisreg - Esta fase está em desenvolvimento pela Gerência de Regulação por meio do monitoramento e avaliação da aplicabilidade dos fluxos e normas por meio do Sisreg III.

Entre os meses de fevereiro a setembro de 2013, foram convidados os especialistas e profissionais da atenção primária a fim de proceder à elaboração de normas/fluxos de acesso, por especialidade odontológica. Todo o processo Resultados e Discussão de construção dos fluxos foi desenvolvido por Houve a participação presencial de profismeio de um modelo de gestão participativa com sionais dos CEOs e das EBSs de 39 unidades apoio institucional e ocorreu em cinco etapas: de saúde, representando 75% de cobertura em 1ª etapa: Gestão e CEOs - A primeira etapa relação à totalidade de unidades de saúde que ocorreu num total de 14 encontros, entre ges- possuem trabalhadores de saúde bucal, indicantão e especialistas, por grupos de especialidade. do uma significativa participação da rede neste Os materiais e bibliografias de base utilizadas processo. Contudo, na elaboração do documenforam, principalmente, o Caderno 17 do Minis- to final possibilitou-se a 100% dos odontólogos tério da Saúde, Manual de Regulação das Espe- da rede a participação no mesmo, haja vista que cialidades Odontológicas, Protocolo de Saúde fora enviado para cada profissional, por meio Bucal Municipal existente, além de modelos de eletrônico, a fim de viabilizar suas contribuições protocolos de outros municípios. e sugestões.

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Enfim, apesar de ser um processo longo e laborioso, a prática de construção das normas e fluxos de acesso à odontologia especializada revelou ser uma experiência viável e relevante para o processo de trabalho da rede. Um dos grandes méritos dessa ação diz respeito ao fortalecimento da integração, articulação e parceria entre os profissionais dos diferentes níveis de atenção em saúde bucal aos quais ela oportunizou. Da mesma forma, fomentou o desenvolvimento dos trabalhadores por incentivo à pesquisa de bibliografias, de apropriação de protocolos instituídos em outras localidades, de materiais bibliográficos e de experiências correlatas, fomentando postura pró-ativa e incorporação de novos conhecimentos a todos os envolvidos. O produto final desta ação foi a elaboração, publicação e disponibilização para a rede de sete protocolos das oito especialidades odontológicas disponíveis no município, a citar: endodontia, periodontia, prótese total, odontologia para pacientes especiais, bucomaxilofacial, radiologia e odontopediatria. Vale lembrar que a elaboração dos PCRs não tem a pretensão de se constituir em receitas fechadas, únicas e absolutas, até porque estes não são conceitos compatíveis com a prática clínica na área da saúde; mas apresentar um conjunto de princípios e recomendações elaborados a fim de facilitar uma tomada de decisão mais apropriada na atenção aos usuários, dotando o serviço de um método ordenado e qualificado nas diferentes especialidades. Considerações finais A elaboração dos PCRs e sua disponibilização no Info Saúde servem como um prático e acessível guia de referência aos profissionais que são informados sobre o quê, como, quando e para onde encaminhar nas mais diversas situações clínicas. Além disso, esse documento orienta, incentiva e qualifica a entrada dos encaminhamentos no Sisreg, consequentemente, reduzindo as filas de espera, promovendo trans-

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parência na definição dos atendimentos prioritários e contribuindo para melhoria do acesso e da qualidade da atenção à saúde, onde quem mais se beneficia é o usuário. Referências Bibliográficas 1. Brasil. Ministério da Saúde. Departamento de Regulação, Avaliação e Controle de Sistemas. Departamento Nacional de Auditoria do SUS. Curso Básico de Regulação, controle, avaliação e auditoria do SUS. Brasília: Ministério da Saúde, 2006: 256. 2. Brasil. Ministério da Saúde. O SUS de A a Z: garantindo saúde nos municípios- 3ed.- Brasília: Ministério da Saúde, 2009. 3. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria-Executiva. Coordenação de Apoio à Gestão Descentralizada. Diretrizes operacionais para os pactos pela vida, em defesa do SUS e de gestão. Brasília: Editora do Ministério da Saúde, 2006b: 72. 4. Santos FP, Mehry EE. A regulação pública da saúde no Estado brasileiro- uma revisão. Interface-Comunic, Saúde, Educ, 2006; 18: 25-41. 5. Gawryszewski BAR, Oliveira DC, Gomes AMT. Acesso ao SUS: representações e práticas de profissionais desenvolvidas nas Centrais de Regulação. Revista de Saúde Coletiva. Rio de Janeiro. 2012. 6. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Regulação, Avaliação e Controle de Sistemas. Diretrizes para a implantação de Complexos Reguladores. Brasília: 2006c. 7. Brasil. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Manual de implantação de complexos reguladores. Brasília: Ministério da Saúde, 2006d. 8. Brasil. Portaria nº 1.792, de 22 de agosto de 2012 - Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Regulação, Avaliação e Controle de Sistemas. Brasília; 2012. Disponível em URL: http// bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/ gm/2012/prt1792_22_08_2012.html [Acesso em 2012 setembro 5] 9. Santos JS. Protocolos clínicos e de regulação: acesso à rede de saúde. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012. 10. Mendes HWB; Almeida ES. Regionalização da assistência à saúde: equidade e integralidade na perspectiva de gestores. O mundo da Saúde, 2007 jan-mar; 29. 11. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Cadernos de Atenção básica nº 17. Saúde Bucal. Brasília: Ministério da Saúde, 2008a; 92. 12. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Manual de especialidades em saúde bucal . Brasília: Ministério da Saúde, 2008b; 128. 13. Chaves SCL, Barros SG, Cruz DN, Figueiredo ACL, Moura BLA, Cangussu MCT. Política Nacional de Saúde Bucal: fatores associados à integralidade do cuidado. Rev. Saúde Pública, 2010. 14.NascimentoAAM,DamascenoAK,Silva MJ,Silva MVS,Feitoza AR. Regulação em Saúde: aplicabilidade para concretização do Pacto de Gestão do SUS. Cogitare Enfermagem, 2009; 14 (2): 346-52. Disponível em URL: http: ojs.c3sl.ufpr.br/ojs2/ index. php/cogitare/article/download/.../10399. [Acesso 2014 junho 28]


Revista de Saúde Pública de Florianópolis - Ano 2 - Volume 2

Regulação e gestão de filas de espera: uma experiência exitosa do Serviço de Fisioterapia do Município de Florianópolis Michelli Vitória Silvestre (michellisilvestre@hotmail.com) Caroline Leitão Riella Gabriela Zanella Bavaresco Letícia Calado Carneiro Karina Corrêa Wengerkievicz Conceição Rodrigo José Knabben Erádio Gonçalves Júnior Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis – SC

Resumo Desde que o município assumiu a responsabilidade pela gestão dos serviços de Média Complexidade a Fisioterapia possui uma das maiores filas de espera para o atendimento especializado. Diante deste cenário, em 2012 os fisioterapeutas, com apoio da gestão, iniciaram uma mudança no modelo assistencial. As principais mudanças, até então desafios a serem implementados, foram: tornar a Fisioterapia um procedimento 100% regulado, qualificar a fila com a microrregulação dos encaminhamentos realizada em todos os centros de saúde pelos fisioterapeutas, gerenciar a fila de espera a partir das tecnologias existentes, realizar avaliação técnica para a priorização de casos, ordenar os fluxos e otimizar as vagas de tratamento fisioterapêutico nas policlínicas. Esse artigo visa relatar uma experiência de apoio às equipes da ESF pelos fisioterapeutas do NASF, com foco na regulação do acesso e gerenciamento da fila de espera para o Serviço de Fisioterapia de Média Complexidade do município de Florianópolis. O gerenciamento da fila permite o constante monitoramento das ações desenvolvidas, possibilitando reajustes na oferta conforme a necessidade. Esta prática está servindo como modelo de qualificação do serviço em outras especialidades reguladas no município. Introdução

No decorrer dos anos, tanto a demanda O Serviço de Fisioterapia no município de por Fisioterapia quanto a oferta de serviços foi Florianópolis iniciou em agosto de 2007 com crescente. A fila de espera tornou-se uma das a inauguração da Policlínica Municipal Cen- maiores entre as especialidades da Média Comtro. Nos anos seguintes, outras três Policlínicas plexidade. No Brasil, os serviços especializados (Sul, Norte e Continente) foram inauguradas constituem-se em um dos principais pontos de e todas contavam com o Setor de Fisioterapia. estrangulamento do sistema público de saúde, Desde então, a gestão municipal assumiu inte- sendo organizado basicamente pela oferta de gralmente a demanda para tratamento fisiotera- serviços1. A dificuldade no acesso a serviços pêutico, que desde esta época já acumulava em especializados decorrente das longas filas de esfila de espera. Anteriormente, os atendimentos pera configura-se como um dos indicadores de fisioterapêuticos eram realizados no Centro Ca- desumanização da assistência em saúde2 e contarinense de Reabilitação (CCR), que pertence tribui para a percepção negativa do SUS pela à gestão estadual, e em clínicas contratualizadas população brasileira1. para prestação de serviços pelo Sistema Único Com o atendimento das policlínicas munide Saúde (SUS). cipais, o primeiro contato dos usuários com os fisioterapeutas acontecia na Média Complexi-

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dade, após aguardar na fila de espera. O tempo de espera constituía uma barreira de acesso. Na tentativa de dissolvê-la, pactuou-se com a gestão municipal a inserção dos fisioterapeutas nos Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF), com o objetivo primário de apoiar as equipes da Estratégia de Saúde da Família (ESF) na regulação do acesso para o Serviço de Fisioterapia na Média Complexidade. Esse artigo visa relatar uma experiência de apoio às equipes da ESF pelos fisioterapeutas do NASF, com foco na regulação do acesso e gerenciamento da fila de espera para o Serviço de Fisioterapia de Média Complexidade do município de Florianópolis. Para essa descrição, enfatiza-se a importância da integração da Fisio-

terapia à Atenção Primária em Saúde (APS) e da aproximação deste profissional ao usuário e às equipes ESF, a partir da corresponsabilização pelo cuidado. Construindo a regulação do acesso à Fisioterapia O primeiro fluxo de acesso ao serviço de Fisioterapia (2007), onde o foco era a Média Complexidade, foi reformulado em 2010, após o desenvolvimento de uma proposta piloto que previa a inserção dos fisioterapeutas na APS. Tal proposta baseou-se em experiências similares em outros municípios brasileiros como Curitiba-PR3,4, (Figura 1). Mas somente em 2012, com a publicação da Portaria SS/GAB nº 11/2012, os fisioterapeutas

Figura 1 – Fluxo de acesso ao Serviço de Fisioterapia no município de Florianópolis (versão 2010), com ênfase na Média Complexidade. Fonte: arquivo do Serviço de Fisioterapia SMS/PMF

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Figura 2 – Novo fluxo de acesso ao Serviço de Fisioterapia no município de Florianópolis (versão 2012), com ênfase na APS. Fonte: arquivo do Serviço de Fisioterapia SMS/PMF

foram oficialmente inseridos no NASF para “desenvolver ações de regulação do acesso à fisioterapia, educação permanente das ESF ou apoio assistencial na atenção primária, adicionalmente ao atendimento específico em fisioterapia”5. Assim, o fluxo de acesso foi mais uma vez reformulado para atender o novo papel do fisioterapeuta na rede municipal (Figura 2). Na transição entre os fluxos de acesso, optou-se por um redirecionamento, sendo na APS o primeiro contato entre o usuário e o fisioterapeuta.

horas de trabalho exclusivamente ao NASF. Simultaneamente, um fisioterapeuta passou a integrar a equipe da central de regulação, atuando principalmente na regionalização e distribuição das vagas, que passaram a ser 100% reguladas.

A primeira etapa desta reorganização do trabalho foi o levantamento das demandas existentes nas filas de espera em cada centro de saúde e qualificação dos encaminhamentos. Havia usuários que constavam mais de uma vez na fila de espera, assim como outros que não necessitavam Após pactuação com as Diretorias de Aten- de atendimento fisioterapêutico e haviam sido ção Primária e de Média Complexidade, os fisio- inseridos na fila por engano. Essas inconsistênterapeutas foram lotados nos distritos sanitários, cias foram corrigidas nessa primeira etapa. com carga horária variável de atividades na APS. Seguiu-se com a qualificação da demanda por Alguns assumiram uma carga horária mínima de meio da classificação de prioridades para atendiseis horas no NASF (demais 24 horas atuando mento. Foram apropriados termos do SISREGnas Policlínicas) e outros redirecionaram as 30 -III para definir a seguinte classificação: Priori-

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dade 1 – Urgência, atendimento o mais rápido possível (para quadros clínicos agudos, com ênfase em reabilitação de fraturas e pós-operatórios) e Prioridade 2 – Prioridade não urgente (para problemas crônicos). Após essa definição, todas as solicitações de procedimento que já aguardavam na fila de espera foram encaixadas nessa classificação. Essa tarefa foi necessária para que o procedimento se tornasse 100% regulado. Para que a classificação correspondesse ao quadro atual de saúde do usuário, os fisioterapeutas consultaram o prontuário eletrônico, realizaram discussão de casos com as equipes ESF e/ou chamaram os usuários para consulta individual. Os pacientes que não atendiam a nenhuma das duas prioridades estabelecidas ou que não necessitavam de atendimento especializado de fisioterapia foram direcionados para atendimentos em grupo nos centros de saúde e/ou policlínicas (4) ou encaminhados para outros serviços especializados (CCR) e clínicas escolas universitárias na Grande Florianópolis. Os fisioterapeutas do NASF, além das habilidades inerentes da profissão, tiveram que aprimorar as competências de gestão em saúde, pois se tornaram corresponsáveis pela microrregulação da fila. Para tal, utilizaram planilhas eletrônicas (Excel®) para gerenciamento dos casos encaminhados para Fisioterapia em cada centro de saúde. Estes dados tabulados permitiram o planejamento das ações baseado nos relatórios gerenciais. Paralelamente, houve a necessidade de aprofundamento nos temas de Educação em Saúde, essencial para aumentar a resolubilidade das ações na APS. O principal desafio desta prática, por iniciativa dos fisioterapeutas, foi mudar o modelo de atenção na Fisioterapia, anteriormente voltado exclusivamente à reabilitação. Desenvolvendo o novo modelo de regulação do acesso à Fisioterapia Atualmente, os usuários têm o primeiro contato com o fisioterapeuta no próprio centro de saúde, beneficiando todos que necessitam de Fisioterapia, principalmente pacientes agudos e

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pós-operatórios, orientados precocemente sobre cuidados. No caso de pacientes crônicos estáveis, as orientações domiciliares para o autocuidado e os exercícios em grupo são fundamentais para promoção de saúde e prevenção de recidivas. Neste novo modelo, prioriza-se que somente sejam encaminhados ao atendimento especializado os casos em que não foi possível a intervenção na APS, minimizando desta forma o gargalo de assistência fisioterapêutica nas Policlínicas.

Figura 3 - Atividades práticas do Grupo de Coluna em um Centro de Saúde/ Fonte: Arquivo do Serviço de Fisioterapia SMS/PMF

A regulação do acesso já vem sendo elencada como uma importante estratégia para melhorar a acessibilidade organizacional aos serviços de saúde1,6. Desta forma, o gerenciamento quanto à inserção da oferta de vagas à Fisioterapia permite o controle da demanda, garantindo a equidade no acesso7, uma vez que a Fisioterapia no município de Florianópolis ainda circula como uma das maiores demandas da atenção especializada. Por meio do aumento do vínculo dos fisioterapeutas com as equipes da ESF, observou-se um aumento na resolubilidade das ações na APS, diminuindo o número de encaminhamentos desnecessários para a Média Complexidade. A relação entre os níveis de atenção é um dos fatores importantes na regulação assistencial. Segundo um estudo realizado com gestores de saúde no Recife-PE, constatou-se que a regulação inicia na unidade local de saúde com a qualificação dos


encaminhamentos e identificação das necessidades a partir do diálogo entre os profissionais envolvidos6.

intervenções conjuntas, discutidas nas reuniões mensais de equipes e corrobora com as diretrizes do NASF11.

Haja vista que a Política Nacional de Humanização preconiza a adoção da Classificação de Risco para prioridade de atendimento para melhorar o acesso aos serviços de saúde8, a prioridade do atendimento é determinada pela gravidade do caso e comprometimento clínico-funcional de cada usuário. Assim, a partir da adoção da classificação de prioridade, foi possível priorizar o atendimento dos usuários com quadros clínicos mais agudos (pós-operatórios, fraturas e lesões recentes, dor aguda), reduzindo o risco de cronificação dos sintomas; fato este bastante frequente no modelo de acesso adotado anteriormente no município. Vilarins e colaboradores ressaltam que “na área da saúde, a literatura demonstra que, sob o aspecto da oferta, a regulação busca a disponibilização de serviços e recursos assistenciais adequados às necessidades da população, com base em critérios epidemiológicos, mas que ainda encontra-se incipiente no SUS. Sob a ótica da demanda, a regulação busca qualificá-la, disponibilizando o serviço de saúde mais adequado ao usuário, em momento oportuno, equânime, e pautado por critérios de priorização de riscos, o que também requer aprimoramentos”9.

A avaliação e aprimoramento do processo de trabalho acontecem sistematicamente em reuniões mensais entre fisioterapeutas e bimestrais com participação de gestores.

O novo modelo estabelecido efetivou a integração entre níveis de atenção primária e secundária, e a integração com os demais profissionais da ESF e NASF, aprimorando as possibilidades de referência e contrarreferência nos atendimentos1, e implementando outras formas de intervenção como atendimentos coletivos ou visitas domiciliares conjuntas. A ausência da contrarreferência dificulta a continuidade do cuidado, e muitas vezes acontece pelo distanciamento entre os profissionais dos dois níveis10. No modelo adotado em Florianópolis, a atuação da Fisioterapia em ambos os níveis de atenção proporciona este diálogo interdisciplinar. Esta prática interdisciplinar favorece também a elaboração de

Conclusão O novo modelo de regulação do acesso à Fisioterapia só foi possível a partir do comprometimento de todos os fisioterapeutas do município, que assumiram corresponsabilidades de regulação do acesso e gerenciamento da fila. Atualmente, percebe-se que as equipes que contém o fisioterapeuta exclusivo 30 horas no NASF apresentam resultados mais sólidos, mostrando a importância deste profissional na APS e a necessidade de ampliar essa inserção. Outros fatores importantes no desenvolvimento desta prática foi o engajamento dos fisioterapeutas e o apoio dos gestores ao longo do processo de implantação. O gerenciamento da fila permite o constante monitoramento das ações desenvolvidas, possibilitando reajustes na oferta conforme a necessidade. O aprendizado e a prática do gerenciamento da fila de espera da Fisioterapia vêm servindo como modelo de qualificação do serviço em outras especialidades reguladas no município. A prática apresentada mostra-se eficiente, pois contribui para aumentar a resolubilidade das ações na APS, utilizando de maneira mais racional os recursos em saúde e reduzindo a sobrecarga na Média Complexidade. Referências Bibliográficas 1. Solla J, Chioro A. Atenção ambulatorial especializada. In: Giovanella L, Escorel S, Lobato LVC, Noronha JC, Carvalho AI, organizadores. Políticas e sistema de saúde no Brasil. 2. ed. rev. ampl. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2012. p. 547-76. 2. Trad LAB. Humanização do encontro com o usuário no contexto da atenção básica. In: Deslandes SF, organizador. Humanização dos cuidados em saúde: conceitos, dilemas e práticas. 2. reimp. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2006. p. 185-203. 3. Curitiba, Secretaria de Saúde. Fisioterapia na Secretaria

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Municipal de Saúde de Curitiba. Curitiba: Secretaria de Saúde; 2004 [citado em 23 ago. 2014]. Disponível em: http:// www.saude.curitiba.pr.gov.br/images/orientacao_prevencao/ arquivos/fisioterapia.pdf. 4. Carneiro LC, Sanson JR, Silva MLB. Inclusão da Fisioterapia na Atenção Primária: experiência na Unidade Básica de Saúde Rio Tavares, Florianópolis. Coleção Gestão da Saúde Pública [online]. 2013:10 [citado em 24 ago. 2014]. Disponível em: http://gsp.cursoscad.ufsc.br/wp/wp-content/uploads/2013/03/ Volume-10-Artigo-06.pdf. 5. Florianópolis, Secretaria de Saúde. Portaria SS/GAB nº 11/2012 (24 fev. 2012). Acrescenta à categorial profissional intitulada Fisioterapia ao art. 1º, da Portaria nº 084/2005. [citado em 23 ago. 2014]. 6. Albuquerque MSV, Lima LP, Costa AM, Melo Filho DA. Regulação assistencial no Recife: possibilidades e limites na promoção do acesso. Saúde soc. São Paulo. 2013;22(1):223-36. 7. Ferreira JBB, Mishima SM, Santos JS, Forster AC, Ferraz CA. O complexo regulador de assistência à saúde na perspectiva de seus sujeitos operadores. Interface comum saúde educ. 2010; 14(33):345-58. 8. Brasil, Ministério da Saúde, Secretaria-Executiva. Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. HumanizaSUS: acolhimento com avaliação e classificação de risco: um paradigma ético-estético no fazer em saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 2004. [citado em 23 ago. 2014]. Disponível em: http:// bvsms.saude.gov. br/bvs/publicacoes/acolhimento.pdf. 9. Vilarins GCM, Shimizu HE, Gutierrez MMU. A regulação em saúde: aspectos conceituais e operacionais. Saúde debate. 2012;36(95):640-7. 10. Almeida PF, Gérvas J, Freire JM, Giovanella L. Estratégias de integração entre atenção primária à saúde e atenção especializada: paralelos entre Brasil e Espanha. Saúde debate. 2013;37(98):400-15. 11. Brasil, Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção a Saúde, Departamento de Atenção Básica. Diretrizes do NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família. (Cadernos de Atenção Básica nº 27). Brasília: Ministério da Saúde; 2010.

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Revista de Saúde Pública de Florianópolis - Ano 2 - Volume 2

O monitoramento de média e alta complexidade: implicações para a gestão municipal na tomada de decisões Stefanie Frank (stefanie.frank@gmail.com) Deyse Ilza de Aquino Sônia Maria Polidório Pereira Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis – SC

Resumo O monitoramento de média e alta complexidade, realizado pela Gerência de Controle e Avaliação da Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis, é elaborado a partir de dados extraídos da ferramenta SISREG – Sistema de Regulação. A análise quantitativa das informações de fila de espera, fila regulada, oferta dos prestadores e unidades próprias para consultas especializadas e exames de média e alta complexidade, revelam predomínio na proporção de procedimentos com tempo de espera para agendamento inferior a 30 dias. O monitoramento é uma ferramenta de gestão para diagnóstico da situação real da oferta e da demanda de média e alta complexidade, visando um nível cada vez melhor de saúde da população. Palavras-chave: Monitoramento; Necessidades e Demandas de Serviços de Saúde; Gestão de recursos Introdução bilizar à rede de saúde e à gestão de relatórios de A Gerência de Controle e Avaliação - GECOA foi instituída em 2009, subordinada à Diretoria de Regulação, Avaliação, Controle e Auditoria – DRAAC, e inicialmente assumiu a função de verificação da produção dos prestadores privados e coordenação do Sistema Nacional de Estabelecimentos de Saúde – SCNES. Em 2013, a GECOA reformulou suas atribuições e incorporou a programação da contratualização de prestadores de serviços de saúde complementares ao Sistema Único de Saúde – SUS, e iniciou de forma participativa as discussões sobre a Programação Pactuada e Integrada de Assistência – PPI junto aos municípios da Grande Florianópolis e Secretaria de Estado da Saúde – SES/SC1. Em 2014, foi implantado o Setor de Processamento da Produção Ambulatorial e Hospitalar, vinculado à GECOA, que assumiu o processamento da produção de toda a rede municipal de saúde pública e privada sob gestão municipal, função exercida anteriormente por empresa terceirizada. Sendo assim, a GECOA passou a trabalhar com diversos sistemas de informação de oferta, demanda e produção em saúde, e consequentemente iniciou o trabalho de elaborar e disponi-

monitoramento da atenção à saúde no âmbito da média e alta complexidade. Também subordinada à DRAAC está a Gerência de Regulação, na qual foi implantado o Complexo Regulador Municipal em 2007. Este setor utiliza a ferramenta online SISREG2, disponibilizada pelo Ministério da Saúde, com a qual é possível realizar o gerenciamento das demandas e ofertas, com maior controle do fluxo de acesso e otimização na utilização dos recursos disponíveis3. É com o SISREG que a rede de atenção primária à saúde procede ao agendamento de consultas especializadas e exames de média e alta complexidade nas unidades de referência, como Policlínicas, prestadores contratualizados e ambulatórios hospitalares. A ferramenta SISREG é configurada a partir de informações advindas da Gerência de Controle e Avaliação e da Gerência de Regulação, de acordo com as especificidades de cada setor (Figura 1). O SISREG estrutura duas filas de usuários: a fila de espera, em que os usuários aguardam o agendamento de consultas e exames especializa-

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Figura 1: Fluxo de informações para a ferramenta SISREG.

dos por ordem cronológica, e a fila regulada, em que a solicitação de cada usuário é avaliada por médicos, fisioterapeutas e odontólogos reguladores, que classificam e agendam as solicitações conforme os critérios clínicos de cada usuário. Com a utilização do SISREG passou-se a realizar o levantamento das filas para agendamento com a finalidade de identificar as necessidades de atenção a saúde no município. Porém, estes relatórios não eram sistemáticos, sendo elaborados pontualmente, de acordo com as demandas específicas da gestão. Os relatórios de monitoramento foram reestruturados em 2013 para facilitar sua operacionalização e foram realizados alguns ajustes conforme novas demandas da gestão. A partir de julho de 2013, o Relatório de Monitoramento de Média e Alta Complexidade passou a ser elaborado pela GECOA sistematicamente para identificar o quantitativo de usuários que aguardam agendamento, a oferta de consultas e exames especializados e a produção das unidades próprias da rede municipal de saúde e prestadores contratualizados. Entende-se por monitoramento, segundo Ministério da Saúde4, a “elaboração e análise de mensurações rotineiras visando detectar mudanças no ambiente ou no estado de saúde da

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comunidade” (p. 178). É com o monitoramento que se permite compilar, processar e analisar determinada atividade programada. Metodologia O trabalho de monitoramento é realizado com uma série de relatórios mensais, elaborados com dados extraídos do SISREG. Ao final de cada mês as filas de espera e regulada são compiladas para uma planilha Excel que contém o nome e Cartão Nacional de Saúde – CNS do usuário, código do procedimento, data de inserção no SISREG e Centro de Saúde de origem. A quantidade de consultas e exames produzidos é compilada para outra planilha aproximadamente 15 dias após o término do mês de referência do relatório, sendo este prazo estipulado a fim de garantir o devido registro dos procedimentos realizados. Os procedimentos realizados são confirmados mediante acesso e registro do atendimento na ferramenta SISREG pelas Policlínicas e prestadores contratualizados. A oferta de consultas e exames especializados é atualizada e disponibilizada pela Gerência de Regulação à GECOA. A oferta destinada aos municípios da 18ª Regional de Saúde de acordo com a PPI é atualizada conforme os ajustes


Quadro 1: Variáveis utilizadas para a elaboração dos relatórios de monitoramento. Variável

Descrição

Fonte

Procedimento

Consultas especializadas e exames de média e alta complexidade

Gerência de Regulação e SISREG

Prestador

Policlínicas, prestadores contratualizados e ambulatórios hospitalares

SCNES/GECOA

Oferta mensal

Oferta mensal de cada procedimento destinada ao município

Gerência de Regulação

Oferta pactuada

Oferta destinada à 18ª Regional conforme a PPI

GECOA e Secretaria de Estado da Saúde de SC

Fila de espera

Solicitações que aguardam agendamento por ordem cronológica

SISREG

Fila regulada

Solicitações que aguardam agendamento conforme critérios clínicos (prioridade)

SISREG

Projeção de dias de espera para agendamento

Tempo de espera projetado para cada procedimento

= (fila de espera + fila regulada) ÷ oferta

Procedimentos agendados

Agendamentos realizados por procedimento SISREG

Procedimentos marcados

Agendamentos confirmados (realizados)

SISREG

Faltas

Faltas a procedimentos agendados

= procedimentos agendados – procedimentos marcados

Aproveitamento

Relação dos procedimentos agendados com a oferta

= agendados ÷ oferta mensal

realizados pela Comissão Intergestores Bipartite – CIB. O relatório de monitoramento possui abordagem quantitativa, pois consolida os dados secundários extraídos da ferramenta SISREG, conforme as variáveis constantes no Quadro 1. Os relatórios de monitoramento são disponibilizados aos gestores – Secretário Municipal de Saúde, DRAAC, Diretoria de Média Complexidade, Diretoria de Atenção Primária à Saúde e Diretoria de Planejamento, Informática e Captação de Recursos. Atualmente há discussões de remodelagem de novos relatórios para disponibilização aos Distritos Sanitários e suas respectivas unidades de saúde. Resultados e Discussão A partir de 2008, identificou-se aumento representativo de prestadores privados contratualizados na rede especializada de serviços de saúde municipais (Gráfico 1). O acompanhamento do tempo de espera para agendamento de consultas especializadas revelou que houve aumento significativo da proporção de consultas com tempo de espera menor que

30 dias a partir de 2009 (Gráfico 2). Em 2014, os retornos de consultas no Hospital Universitário professor Polydoro Ernani de São Thiago – HU, até então regulados pelo Complexo Regulador Municipal, passaram a ser gerenciados pelo próprio hospital, sendo desta forma, excluídos dos relatórios de monitoramento. Como a vasta maioria dos retornos do HU eram agendados em período inferior a 30 dias, observou-se impacto na proporção de consultas especializadas em 2014, não consistindo essa diferença reflexo da diminuição real de oferta de consultas. A partir da sensibilização dos gestores com as informações apresentadas no Monitoramento de Média e Alta Complexidade, foram tomadas diversas medidas para redução do tempo de espera para as consultas especializadas com maior morosidade no agendamento. As consultas em Ortopedia e Traumatologia – Joelho e Quadril, tiveram diminuição de 133 para 15 dias (-88,72%) no tempo para agendamento, entre janeiro a julho de 2014. Este resultado foi obtido com diversas ações do Complexo Regulador, principalmente com a higienização das filas (exclusão de solicitações duplicadas).

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Da mesma forma, a especialidade Oftalmologia Pediátrica apresentou redução de 109 para 66 dias (-39,45%) de espera para agendamento, no período de janeiro a julho de 2014, após ser determinada a reorganização das agendas dos profissionais Oftalmologistas nas Policlínicas Municipais e contratualização de prestadores privados. A fila de espera para Fisioterapia, que é exclusivamente regulada, teve redução de 43,57% no mesmo período, com ações de higienização da fila e mudanças na triagem dos usuários nas Policlínicas e contratualização de prestador privado de serviço.

Assim como as consultas especializadas, os exames de média e alta complexidade também apresentaram aumento representativo na proporção de exames com tempo de espera inferior a 30 dias a partir de 2009, quando foi realizado o primeiro mutirão para reduzir a fila de espera (Gráfico 3). Não havia registro destes procedimentos em 2006, por isto a análise temporal iniciou em 2007. Os exames de média complexidade têm demandado grandes esforços da gestão para ampliação da oferta. O exame Prova de Função Pulmonar Completa – Espirometria apresentava fila de 2.691 solicitações em janeiro de 2014, e com a contratualização de mais três prestadores

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4 0 2006

6 0 2007

8

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11

11

43

40

38

37

12

12

12

12

0 2008

2009

2010

Unidades Especializadas Próprias

2011

2012

2013

2014

Prestadores Contratualizados

Gráfico 1 - Evolução da rede especializada de serviços de saúde em Florianópolis sob gestão municipal segundo tipo de serviço, 2006 a 2014. Fonte: SCNES.

Gráfico 2 - Consultas especializadas conforme o tempo de espera para agendamento, Florianópolis, 2005 a 2014. Fonte: SISREG.

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Gráfico 3 - Exames de média e alta complexidade conforme o tempo de espera para agendamento, Florianópolis, 2005 a 2014. Fonte: SISREG.

Gráfico 4 - Exames de alto custo conforme o tempo de espera para agendamento, Florianópolis, 2005 a 2014. Fonte: SISREG.

privados, em julho a fila era de 209 pessoas, ou seja, apresentou redução de 1.187,56%, com tempo de espera de 08 dias para agendamento em julho de 2014. Da mesma forma, o exame de Endoscopia Digestiva Alta apresentou redução da fila de 29,18% após a renegociação da oferta com a clínica contratualizada. Os exames Monitoramento pelo Sistema Holter 24 horas e Ultrassonografia Doppler Colorido de 3 Vasos ainda constituem entraves, pois a oferta atual depende de apenas um hospi-

tal para cada e a contratualização se torna difícil em razão dos valores de financiamento repassados pelo Ministério da Saúde. Foram realizadas chamadas públicas, porém não houve clínicas interessadas. A gestão continua estudando alternativas para a situação. Os exames de alto custo, como ressonância magnética, tomografia computadorizada, cintilografia, entre outros, dependiam da oferta estadual até 2007. Em 2008, foram realizadas as primeiras contratualizações de prestadores privados, e desde então o tempo de espera para

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agendamento predominante é inferior a 30 dias (Gráfico 4). A apreciação detalhada do tempo de espera para agendamento, de consultas e exames especializados, no período de agosto de 2013 a julho de 2014, revelou que, apesar de pequenas variações, houve estabilidade preponderante no tempo de espera dos procedimentos (Gráfico 5). Em relação à produção de procedimentos de média e alta complexidade nas Policlínicas Municipais, verificou-se aumento nos agendamentos no período de 2010 a 2013 (Gráfico 6). Por outro lado, as faltas, calculadas pela diferença de atendimentos agendados e confirmados, mantêm o índice aproximado de 37% em todo o período. Conclusões O monitoramento das filas e da produção consiste em ação sistemática e contínua de avaliação e controle da situação de oferta e demanda dos procedimentos de média e alta complexidade no município de Florianópolis. As informações levantadas para o monitoramento de média e alta complexidade servem de instrumento de gestão, para o conhecimento da situação real e atual das filas pelas diferentes instâncias da Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis – SMS; para identificação da necessidade de revisão da oferta de exames e consultas especializadas, com a contratação de pessoal para o serviço próprio, contratualização de prestadores privados e/ou revisão de contratos vigentes e; para higienização das filas, com a correção das solicitações inseridas errônea ou equivocadamente, sendo uma maneira didática de esclarecer os profissionais de saúde sobre o funcionamento do SISREG. A articulação do monitoramento de média e alta complexidade com a análise da produção da atenção primária permite a priorização da alocação de recursos financeiros, o diagnóstico das reais necessidades da população, bem a discussão dos fatores determinantes referentes aos “nós”

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da demanda reprimida na rede de saúde pública municipal. Além de possuir função estratégica enquanto instrumento de gestão, o trabalho de monitoramento acaba articulando a GECOA com diversos outros setores da SMS, de acordo com as suas atribuições, visando a constante reavaliação e acompanhamento dos processos de trabalho. Porém, ainda há necessidade de ampliação do monitoramento. A partir da implementação de instrumentos de diagnósticos de gestão e integração dos diversos setores da rede, será possível aprofundar outros assuntos pertinentes ao monitoramento de média e alta complexidade, como a análise da produção de unidades próprias e contratualizadas por procedimento e o aproveitamento das cotas pela rede de atenção primária à saúde. O monitoramento de média e alta complexidade constitui fundamental ferramenta para promover a prestação de serviços pautados pela eficiência, eficácia e transparência, premissas da administração pública, visando um nível cada vez melhor de saúde da população. Referências Bibliográficas 1. Prefeitura Municipal de Florianópolis. Memória Institucional 2005 a 2012: Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis. Florianópolis: Copiart; 2012. 2. Sistema Nacional de Regulação – SISREG [Internet]. Brasília: Datasus. [citado em 04 de setembro de 2014]. Disponível em: http://sisregiii.saude.gov.br 3. Sistema Nacional de Regulação – SISREG [Internet]. Brasília: Datasus. [citado em 10 de outubro de 2013]. Disponível em: http://portal.saude.gov.br/portal/saude/profissional/visualizar_ texto.cfm?idtxt=36608& 4. Brasil. Curso Básico de Regulação, Controle, Avaliação e Auditoria no SUS. 2ª ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.




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