Roteiro 261

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BRASÍLIA É CENÁRIO DE DOIS FILMES QUE ESTREIAM EM AGOSTO

Ano XVI • nº 261 Março de 2017

R$ 5,90

ZAZ

Pela primeira vez em Brasília, a nova musa da chanson francesa é uma das atrações neste início da temporada de grandes shows


s e l p m i s Um quito s o r m a c r a m e d po a vida um • • • •

• Dor nos músculos Febre • Dor nos olhos Manchas no corpo • Coceira Dor de cabeça (mais intensa na zika) Dor nas articulações

Conheça histórias de vidas marcadas por essas doenças

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Se vocĂŞ tem alguns desses sintomas, procure imediatamente uma unidade de saĂşde.


#BrasíliaDeTodasAsMulheres

Assédio, agressão física ou moral. A violência contra as mulheres tem muitas formas e todas elas são crimes. Quando nos calamos, nos tornamos cúmplices. Denuncie. Saiba mais em www.mulher.df.gov.br


EMPOUCASPALAVRAS Tadeu Brunelli

“Se você me der uma suíte no Ritz, eu não quero; joias da Chanel, eu não quero; se me der uma limousine... o que faria com ela? Eu quero o amor, a alegria, o bom-humor. Não é o seu dinheiro que fará a minha felicidade!” Esses versos foram traduzidos da música Je veux (Eu quero), composta por Tristan Solanilla e Kerredine Soltani e responsável pelo meteórico sucesso da jovem cantora francesa ZAZ, curioso nome artístico de Isabelle Geffroy. Escolhida para ilustrar a capa desta edição, ela é a grande estrela da Semana de Francofonia, que, aliás, dura mesmo é 18 dias e abriga intensa programação cultural e gastronômica (páginas 26 a 29). A temporada 2017 de grandes shows será aberta oficialmente com a presença do lendário cantor e compositor do Supertramp, Roger Hodgson, que vem a Brasília pela quarta vez, e de outras feras nacionais, como Djavan, Elza Soares, Toquinho, Joyce e João Bosco (página 26). Além deles, bom ficar de olho nas revelações do festival Sai da rede, que o CCBB apresenta a partir do dia 25, com shows de artistas que alçaram voo na internet e só agora começam a subir nos palcos de verdade, como é o caso de Ana Vilela, a autora do sucesso Trem-bala (página 25). Quem sempre sonhou em voar de verdade foi Lu Marini, um piloto de aventuras que já percorreu mais de 15 mil km a bordo de seu paramotor, uma espécie de parapente motorizado. Lá do alto, fez belas imagens da natureza em contraste com outras não tão belas, de atentados flagrantes ao meio ambiente. O resultado desse sonho realizado está na exposição fotográfica em cartaz na Caixa Cultural até 16 de abril (página 22). Na seção Água na boca, destaque para os novos restaurantes de Águas Claras, cidade de quase 150 mil habitantes que não precisam mais ir ao Plano Piloto para ter acesso à boa gastronomia. Mais duas grifes abriram filiais ali: a brasiliense Dudu Camargo, com o Simples Assim, e a cearense Coco Bambu (página 4). Finalmente, apresentamos uma doce novidade que chegou à 408 Sul, a Arab Sweets, da brasiliense descendente de sírios Diana Salam. Quando criança, seus pais e avós reproduziam fielmente as delícias salgadas da culinária síria, mas os doces não eram iguais aos trazidos pelos tios quando viajavam para a Síria. Depois de formada, resolveu resgatar essa lembrança afetiva gastronômica e convocou para a tarefa um chef recémchegado da cidade de Aleppo, Abdel Monen (página 6). Boa leitura e até abril! Maria Teresa Fernandes Editora

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águanaboca

Esse suculento arroz com mariscos é um dos pratos tamanho-família servidos na recém-inaugurada filial do restaurante cearense Coco Bambu em Águas Claras

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picadinho garfadas&goles pão&vinho happyhour dia&noite patrimôniocultural galeriadearte graves&agudos semanadafrancofonia brasiliensedecoração queespetáculo luzcâmeraação crônicadaconceição

ROTEIRO BRASÍLIA é uma publicação da Editora Roteiro Ltda. | Endereço SHIN QI 14, Conjunto 2, Casa 7, Lago Norte – Brasília-DF – CEP 71.530-020 Endereço eletrônico revistaroteirobrasilia@gmail.com | Tel: 3203.3025 | Diretor Executivo Adriano Lopes de Oliveira | Editora Maria Teresa Fernandes Diagramação Carlos Roberto Ferreira | Capa Carlos Roberto Ferreira, sobre foto de Yann Orhan | Colaboradores Alessandra Braz, Akemi Nitahara, Alexandre Marino, Alexandre dos Santos Franco, Ana Vilela, Beth Almeida, Cláudio Ferreira, Conceição Freitas, Eduardo Oliveira, Elaina Daher, Heitor Menezes, Júlia Viegas, Laís di Giorno, Luana Brasil, Lúcia Leão, Luís Turiba, Luiz Recena, Mariza de Macedo-Soares, Pedro Brandt, Ronaldo Morado, Sérgio Moriconi, Silvestre Gorgulho, Súsan Faria, Teresa Mello, Vicente Sá, Victor Cruzeiro, Vilany Kehrle | Fotografia Fabrízio Morelo, Gadelha Neto, Rodrigo Ribeiro, Sérgio Amaral, Zé Nobre Para anunciar 99988.5360 | Impressão Editora Gráfica Ipiranga Tiragem: 20.000 exemplares. 3

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Tadeu Brunelli

ÁGUANABOCA

Mesas fartas em

Águas Claras

POR TERESA MELLO

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uas grifes gastronômicas acabam de fazer sua estreia em Águas Claras: a brasiliense Dudu Camargo, com o restaurante Simples Assim, e a cearense Coco Bambu, com unidade no novíssimo DF Plaza, shopping às margens da EPTG, na divisa com Taguatinga. Os empresários do setor apostam alto no negócio para atrair famílias, moradores e grupos de trabalho da região. No Coco Bambu, por exemplo, foram investidos R$ 7 milhões. A casa de 2.000 m2 tem capacidade para 560 pessoas e emprega 173 funcionários. Já o quinto endereço do chef Dudu Camargo remete à cozinha de avó, com pratos em ágata, copos americanos e vinho servido na jarra. Acolhe 100 pessoas, tem 30 funcionários. Nas duas casas, o cardápio exibe fartura, seja no parmegiana para quatro pessoas do Simples Assim, seja na quantidade de grandes pratos com camarão do Coco Bambu, que também ser-

vem de três a quatro pessoas. Ainda no polo gastronômico da cidade, o italiano Dolce Far Niente passou por remodelação e inaugurou amplo endereço no local do antigo Poizé. O termômetro digital pode marcar mais de 30ºC na rua, mas quem chega ao Coco Bambu é recebido por um bendito vento. No alto da Estrada Parque Taguatinga e em uma das extremidades do DF Plaza, a logomarca da empresa de Fortaleza – uma arara tomando água de coco – dá as boas-vindas. Com arquitetura de Raquel Fechina, o estabelecimento acomoda 560 clientes distribuídos em salões no térreo e no mezanino, batizados de Canoa, Jeri, Mucuripe, Beira-mar. “Criamos ambientes para eventos que comportam de 20 até 260 pessoas em espaços privativos”, explica Antonio Freire Junior, 39 anos, um dos três sócios da unidade, a terceira em Brasília. Conquistar Águas Claras, Taguatinga e Vicente Pires é a meta dos três sócios: “É um público com capacidade financeira e cultural, e

nós oferecemos um serviço de excelência, perto de casa e a preço justo”. O restaurante de madeira, cimento, vidro e tijolos aparentes exibe canoas, grandes luminárias, cadeiras de designs diferentes e atrações como uma adega para duas mil garrafas – incluindo o vinho português Coco Bambu, tinto e branco, fabricado no Alentejo – e duas jabuticabeiras indoor iluminadas por um foco de luz roxa. O cardápio da chef Daniela Barreira brinda o consumidor com frutos do mar, onde o camarão é rei. “É o nosso carro-chefe”, confirma o empresário, informando que a maioria dos produtos vem do Ceará. Há mais de 20 pratos com camarão por R$ 180, em média, e que podem servir três ou quatro pessoas. “A fartura é a nossa marca”, define o brasiliense Antonio Junior. O camarão chega à mesa no bobó, no arroz, ao coco, ao curry, ao catupiry, à grega, grelhado, flambado. Há versões mais simples, como camarões em crosta, no pão e alho, servido com salada


verde e risoto de limão-siciliano; e o Mucuripe, no espaguete italiano, com molho de tomate fresco, rúcula e tomate seco. Há criações bem-elaboradas, como o Tropical, em que ele é refogado com gengibre, coberto com molho de manga e maracujá e acompanhado por purê de abóbora gratinado com queijo coalho e arroz com alho. Quer mais? Que tal a Lagosta Coco Bambu? São duas lagostas inteiras grelhadas e acompanhadas por risoto de limão-siciliano, a R$ 212. As sobremesas completam o banquete. “A torta de banana da Daniela é famosa”, conta Junior. A grife cearense fundada por Afrânio Barreira em 2001 acumula 22 casas no país e deve abrir, ainda este ano, as filiais de Belo Horizonte, Manaus, Rio de Janeiro e Miami. Sinta-se em casa No Simples Assim, a marca do chef Dudu Camargo se faz presente no cardápio, no batismo dos pratos, nas reproduções das mais de 30 tatuagens dele na parede e na proprietária, a irmã mais nova, Lucila. A publicitária de 41 anos deixou São Paulo para morar em Brasília e todo dia faz o longo trajeto de casa, no Jardim Botânico, para o trabalho: “Venho pelo Núcleo Bandeirante, pela EPTG, no contrafluxo”, comenta. “Águas Claras é muito nova, tem público jovem, e Dudu já tem a marca dele em Brasília, por isso

novo espaço, com projeto de Tatiana Perides, agora acolhe 160 pessoas e exibe palco com piano para apresentações no jantar de terça a domingo. Dois fornos a lenha assam pizzas tradicionais, integrais, sem glúten e sem lactose. Há 15 novidades salgadas e doces, como a Filetto Belin, feita com pomodori pelati, muçarela, cogumelos, gorgonzola e orégano, por R$ 58,90 e R$ 68,90 (a grande). Além de massas frescas, recheadas ou gratinadas e risotos, a chef apresenta grelhados, como o Papelote – robalo, aspargos, tomate confit, camarão, batata e limão-siciliano – e a Lagosta Fruta Tutti, com cauda de lagosta ao molho de brie e risoto de frutas vermelhas, por R$ 94,90. Outra novidade é a integração dos cardápios. Dona do vizinho Empório Árabe, decorado com um camelo na calçada, Lídia uniu suas habilidades na culinária, e o cliente pode escolher se prefere comida italiana ou árabe. Nesta última, a salada de damasco acompanha com gosto as delícias servidas. Coco Bambu

Rua Copaíba, Lote 1, DF Plaza (3262.0559). De domingo a 4ª feira, das 11h30 às 24h; de 5ª a sábado, das 11h30 à 1h.

Simples Assim

Avenida Jacarandá, Lote 19 (3973.0234). De 2ª a 5ª, das 18h às 23h30; 6ª e sábado, das 12h às 23h30; e domingo, das 11h30 às 17h.

Dolce Far Niente

Avenida Castanheiras, 1.060, Edifício Vila Mall (3254.2263). De 2ª a 5ª, das 18h às 24h; de 6ª a domingo, das 11h30 às 16h e das 18 às 24h.

Divulgação

Diana Bracaraense

resolvemos investir aqui. O conceito do Simples é você comer fora de casa, mas se sentir em casa, lembrar as refeições em família”, traduz. Por isso, o que mais se vê no local são grupos de amigos, familiares, carrinhos de bebê. À mesa, os destaques são o Parmegiana da Casa, a R$ 159,90, e o Galeto ao Molho de Ervas do Chef, a R$ 119,90, com cinco acompanhamentos (arroz com brócolis, polenta, farofa de ovos, purê, maionese de batata), e que podem servir, em média, quatro pessoas. O chef cearense Luís Vasconcelos de Lavor, de 37 anos, veio do antigo Respeitável Burguer e afirma: “O parmegiana é o prato de mais sucesso”. Para beliscar, há linguiça assada ou acebolada na cachaça, pastel de queijo coalho, costelinha de porco, galeto destrinchado, e, para beber, Cachaça Simples, Cachaça Complicada – assim batizadas por Dudu –, sucos naturais e vinho tinto Cabernet ou Merlot, todos servido em jarras. São detalhes que remetem à infância, à casa da avó. Não à toa, uma das paredes é decorada com esquadrias coloridas de janelas. O projeto de Karla Amaral privilegiou espaços abertos, varanda ampla, cores terrosas. O nome do restaurante é um bordão de Dudu Camargo, que tem as palavras tatuadas no antebraço esquerdo. Já a casa de massas Dolce Far Niente, da chef Lídia Nasser, mudou de endereço (foto abaixo) e reformulou o cardápio. O

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ÁGUANABOCA

Novos sabores de velhas lembranças POR VICTOR CRUZEIRO

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á um provérbio árabe que conta de um fazendeiro que pediu ao galo para cantar mais cedo, ao que o galo respondeu: “Não, pois para cada coisa há um momento”. Não é possível pensar em nenhuma introdução mais sábia para a história do Arab Sweets, a nova confeitaria da capital, na 408 Sul, primeira e única de doces árabes, nascida de histórias diferentes que levaram algum tempo para se encontrar. De um lado temos Diana Salam, brasiliense filha de sírios, criada no seio da comunidade árabe da cidade, coesa nos seus hábitos, língua e, é claro, comida. A culinária de seus pais e avós era fielmente reproduzida nas fartas refeições onde todos se juntavam para saborear todo tipo de iguaria. Ou melhor, quase todo tipo. “Os doces não eram a mesma coisa”, conta Diana, lembrando da época em que aqueles que iam à Síria traziam caixas e caixas de doces sortidos que eram congelados e servidos aos poucos. “Tínhamos nossos preferidos, nos quais ficávamos de olho quando eram servidos para uma visita”, ri a jovem empresária. De outro lado temos Abdel Monen. De raiz síria, nascido e criado na hoje semidestruída cidade de Aleppo, tornou-se chef de cozinha num encontro de destino e talento. Seu pai o trouxe para o ofí-

cio aos 12 anos, e desde então ele se dedica exclusivamente à elaborada e refinada confeitaria de doces árabes, que lhe renderam os frutos de uma loja, perdida no conflito que agora assola seu país. Diana formou-se em administração nos Estados Unidos e, voltando ao Brasil, não conseguia encontrar seu real nicho, que acendesse sua paixão. Foi quando a lembrança dos doces da infância veio à tona, no encontro com o sócio Ali Osseily. “Não havia nada parecido aqui”, concluíram em suas primeiras conversas. Ela conta que as comidas árabes salgadas são feitas aqui com tanta qualidade quanto lá, além de já terem caído no gosto do público brasileiro. Mas os doces não. “Então vamos precisar de um chef de lá”, alertou Ali. Ela e o sócio concor-

daram que um chef daqui, por mais expertise que tivesse, não conseguiria deixar de lado as influências brasileiras. Foi quando surgiu Abdel. Por uma feliz coincidência, um conhecido da família sabia de um confeiteiro que havia perdido tudo em Aleppo. E sabia que Diana e Ali planejavam abrir uma confeitaria no Brasil. Sem saber uma palavra de português, mas com o savoir-faire e a coragem, Abdel abandonou a Síria para aportar em outra terra resplandecente de sol brilhante: Brasília. E aqui voltou à sua zona de conforto, comandando a cozinha do recém-inaugurado Arab Sweets. “Não adaptamos nada”, conta Diana. O objetivo nunca foi esse. “Queremos que o público conheça esses gostos únicos que me deliciaram tanto na infância, que


Fotos: Divulgação

não são convencionais, mas são únicos!”. E de fato são. As balawas, denominação mais geral para os doces folhados, recheados de castanhas (de nozes a pistache) e de frutas como damascos e tâmaras, umedecidas por uma calda de água de rosas, são os carros-chefes da casa. São feitos diariamente, em variados tamanhos e, principalmente, sabores (R$ 105 o quilo). E, ainda que não tenha aberto mão da autenticidade das receitas, Diana fez ao menos uma concessão, para atrair e conquistar aqueles mais acostumados com o paladar ocidental. Há balawas de cacau com chocolate feitas pelo próprio Abdel,

que ainda não compreende bem nossa forte ligação com o chocolate, bem mais doce aqui do que na Síria. E há também cheesecakes de chocolate com pistache, damasco e romã, idealizados por outro chef, Thiago Dias. “A romã foi uma ideia do Ano Novo, aproveitando que ela é um símbolo de boa sorte aqui, mas também é um sabor forte da culinária árabe”. Deu certo! Primeiro o bolo, depois o cheesecake, com uma calda deliciosa (R$ 12,90). “Começamos mesmo a engrenar no dia 19 de janeiro”, admite Diana. A casa abriu as portas em fins de outubro e aos poucos conquistou o público. Primeiro, a

própria comunidade árabe, que recebeu com entusiasmo a novidade. De lá para cá, a Arab Sweets participou de festas em duas embaixadas e passou a fornecer doces para casas como o Empório Árabe. Os brasilienses da gema se deixam arrebatar por esses quitutes novos. Porque há, definitivamente, um momento para cada coisa, e esse é o momento de conhecer e apaixonar-se por essa iniciativa que mescla histórias, sabores, afetos e vidas. Arab Sweets

408 Sul, Bloco D (3551.4720) De 2ª a sábado, das 10 às 22h; domingo de 12 às 22h.

Delicioso

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ÁGUANABOCA

Iguaria francesa em

versão descomplicada

POR VILANY KEHRLE

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m 1981, a carioca Valéria Moraes arrumou a mochila, comprou uma passagem só de ida e, mesmo sem falar quase nada de francês, partiu para Montpellier, no sul da França. Os três anos passados no país de Asterix foram decisivos para fortalecer o amor da jovem pela boa mesa. E ela se apropriou da língua e dos costumes do país por meio do uso das receitas culinárias. Passados alguns anos dessa experiência, Valéria hoje é uma mulher que enfrenta a maturidade sem perder de vista os desafios. Depois de trocar o Rio de Janeiro por Brasília, onde vive há 13 anos, ela deu asas à imaginação e apelou para a nos-

talgia quando, em fevereiro do ano passado, abriu as portas do serviço de delivery Viva La Quiche!, “um pedacinho da culinária francesa” no seu dia a dia. Valéria, que também é funcionária pública e já foi gerente de um restaurante da família, no litoral fluminense, criou um espaço gourmet na casa onde morava, no Lago Norte. A quiche, uma torta aberta de sabor suave que tem como base farinha, manteiga e queijo Gruyère e é incrementada com recheios de variados sabores, é uma velha paixão dos franceses. O objetivo de Valéria é fazer com que essa iguaria seja incorporada ao cotidiano gastronômico dos brasilienses. Por isso, brevemente a Viva La Quiche! vai ocupar um espaço na Asa Sul. “Mesmo com a instabilidade no

atual cenário econômico do país, a gente não vai se intimidar, a empresa vai continuar a se expandir como está previsto no plano de negócios inicial”, afirma Valéria. Com apenas um ano de funcionamento, a Viva La Quiche!, que também tem no cardápio sopas e saladas feitas exclusivamente com produtos orgânicos, é o delivery mais bem avaliado da plataforma de pedidos online iFood, uma das melhores referências quando se trata de avaliar restaurantes em itens como qualidade da comida, preço, tempo de entrega, embalagem e relação custo-benefício. “O iFood deu um grande retorno para nós, pois, mantendo uma boa pontuação todos esses meses, podemos perceber que nossa empresa tem causado um bom impacto


no mercado, tanto por meio do produto como pelo serviço”, avalia Valéria. No novo endereço, onde vai funcionar a primeira loja da marca, a clientela poderá não apenas saborear as quiches, saladas e sopas, mas também usufruir de sucos, cafés, sorvetes e carta de vinhos. “Acreditamos muito no Viva La Quiche! e o desenvolvimento de nossa empresa, que é fundamentada num sólido conjunto de valores, vai até onde a gente puder garantir a qualidade dos nossos produtos e serviços e a satisfação dos clientes”, assegura a empresária. Para montar o negócio, Valéria contou com o apoio do companheiro José Augusto Valente e da filha, a designer Marcela Moraes, a quem chama de “sócia oculta”. O delivery funciona na 304 Norte, com atendimento das 11 ás 23h. O consumidor pode optar pela quiche grande, que serve oito pessoas, ou pelas individuais. As embalagens utilizadas são recicláveis ou biodegradáveis. “Tudo na nossa empresa é feito com muito carinho, e, nesse aspecto, demonstramos nosso apreço pelo meio ambiente”, enfatiza. As tortas Les Élémentaires (queijo, cebola, Lorraine e alhoporó) custam R$ 11; Les Extras (bacalhau com azeitona preta, brie com damasco, camarão com alho poró, cogumelo, espinafre com ricota e abobrinha com azeitona, frango com gorgonzola) custam R$ 13; e Les Spéciales (cogumelo e alho-poró vegana, Lorraine sem glúten e sem lactose e alho poró sem lactose e sem glúten) saem por R$ 14,30. Outra boa surpresa do cardápio são Les sucrées, as quiches doces inventadas por Valéria. Elas existem nos sabores banana com canela, praliné e morango com nutella (R$ 7,70). Esta última, para grande surpresa da proprietária, é a terceira mais pedida pelos clientes. A primeira é a Lorraine e a segunda a de frango com gorgonzola. No momento em que acontece uma onda de “gourmetização”, quando, a cada instante, os consumidores são surpreendidos com os mais variados e diversificados produtos e serviços, e alguns alimentos simples são transformados em iguarias sofisticadas, Valéria diz que uma boa novidade da Viva La Quiche! é que ela faz o caminho inverso: tenta transformar algo que é considerado sofisticado em uma coisa simples. Viva La Quiche!

Fotos: Divulgação

3033.4030 / 99287.1010 www.vivalaquiche.com.br / Facebook.com /Vivalaquiche

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Felipe Menezes

PICADINHO Dia dos food-trucks No último fim de semana os frequentadores do Parque da Cidade assistiram a uma verdadeira invasão de food-trucks. Mais de 50 caminhões, quiosques, trailers e bicicletas atracaram no estacionamento 4, entre eles Crepe Voyage, Geleia Burger, El Negro, Olivae, Sucopira, El Perro Negro, La Donna e Naked Barbecue, o que garantiu a diversidade das iguariais. Chefs renomados, como Marcelo Piucco, do El Negro, e Ronaldo Vieira, do Naked Barbecue, ministraram cursos gastronômicos oferecidos pelo Sebrae. Um dos objetivos dos organizadores foi demonstrar que os foodtrucks não são apenas carrocinhas de comida melhoradas, tendo atingido alto nível de profissionalismo.

Cardápio de Quaresma Para quem observa religiosamente os 40 dias de jejum de carne vermelha após o Carnaval, o Nebbiolo Restaurante (409 Sul, Bloco D, tel. 2099.6640) está oferecendo um cardápio especial. Os peixes, como não poderia deixar de ser, são as estrelas dos pratos criados pelo chef Fabiano Carvalho, mas há também uma receita vegetariana – essa lasanha da foto abaixo (R$ 42). São cinco pratos no total: três individuais – rondelli de bacalhau com molho de limão (R$ 59), rolls de tilápia recheados com cogumelos, acompanhados de massa ao limone (R$ 55) e a já mencionada lasanha vegetariana – e dois para compartilhar – bobó de camarão (R$ 99) e peixe inteiro assado acompanhado de amêndoas laminadas no azeite e limão com arroz três grãos (R$ 115).

Bolo no ovo pascal

Divulgação

Um novo Lo Voglio

Zuleika de Souza

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O Dia Internacional da Mulher já passou, mas segue na carta de bebidas do Paradiso Cine Bar (306 Sul, Bloco B, tel. 3526.8072) o drink Luce, que a barwoman Julia Santarosa criou sob a inspiração da protagonista feminina do filme romântico Imagine eu e você. Preparado com Bourbon Bulleit, sucos de laranja e de limão siciliano, xarope de hibisco, maçã e canela defumada, o Luce está na semifinal regional do World Class, campeonato internacional de coquetelaria promovido pela distribuidora Diageo, junto com outro drink do Paradiso, o Rubrum, do mixologista Victor Quaranta, que leva rum Zacapa 23, limão siciliano, limão tahiti, açúcar, geleia de pimentão vermelho e pimenta rosa. Eles vão disputar com profissionais do Centro-Oeste e do Norte uma vaga na final nacional. Se forem classificados, terão a chance de competir com os melhores bartenders de diferentes países na fase internacional do World Class.

Essa é a nova experiência gastronômica oferecida desde o mês passado pelo Jambu (Avenida JK, nº 2, Vila Planalto, tel. 3081.0900). Agora, os clientes podem escolher vários pratos, em porções menores que são servidas ao centro da mesa, e degustá-los em grupo. Mas não se trata da única novidade: o chef Leandro Nunes turbinou o cardápio com novas criações, algumas vegetarianas, sem glúten ou sem lactose. Entre os pratos principais, a última invenção do chef é essa rabada bovina aí abaixo, cozida a baixa temperatura com açaí e vinho tinto, acompanhada de tutu e vinagrete de feijão fradinho (R$ 66). Outros destaques, entre os calouros: peito de pato curado sobre purê de macaxeira com manteiga, farofa de castanhas e pimenta de macaco (R$ 48), costelinha suína sobre terrine de três raízes, bacon e molho barbecue (R$ 38), camarão marinado acompanhado de favas, legumes e cajuína (R$ 44) e os vegetarianos torteline de legumes ao curry e molho gorgonzola (R$ 38), foccacia de tomilho e alho com azeite de ervas e pimenta rosa (R$ 8) e crocante de beterraba com beterraba glaceada, picles de beterraba e gorgonzola (R$ 16).

Natália Jaguaribe

Divulgação

Drink para elas

Delícias compartilhadas

Na Amor aos Pedaços, verdadeiro paraíso dos chocólatras, a novidade para a Páscoa que se aproxima é o bolo no ovo. Os cinco sabores mais clássicos da doceria – crocante, mousse, bem casado, mesclado e África – são montados, à frente do freguês, dentro de meio ovo de chocolate ao leite (R$ 89). Mas segue firme no cardápio o Bolo da Páscoa – massa de chocolate meio amargo recheada com mousses de chocolate ao leite e meio amargo e pedacinhos de chocolate branco, com cobertura de chocolate meio amargo com leve sabor de rum e ovinhos de... chocolate. Ufa!!!

Em homenagem ao seu público preferencial, a gelateria Lo Voglio inaugurou no Dia Internacional da Mulher, 8 de março, seu sétimo ponto de vendas em Brasília, no Iguatemi Shopping, do Lago Norte. Fica perto do cinema, no primeiro piso, e oferece dez sabores de gelatos, todos sem conservantes, corantes e 100% naturais. Os próximos pontos de venda serão inaugurados até o final de maio no Centro Comercial Gilberto Salomão, Pontão do Lago Sul e Pátio Brasil.

Dois novos Giraffas A rede brasiliense líder nacional em sua categoria inaugurou no início do mês duas novas unidades no Aeroporto JK. Agora, são 80 apenas no Distrito Federal e 410 em todo o país, além de cinco restaurantes nos Estados Unidos. Criada na década de 1980, com uma


Lula Lopes

única lanchonete na capital federal, hoje a rede Giraffas está presente em ruas, shoppings, rodoviárias e aeroportos com seus pratos, sanduíches e sobremesas.

Três novos Dilettos A gelateria italiana acaba de lançar três novidades: o picolé e o pote de 500ml do sabor Torta de Limão, ambos com pedacinhos de biscoito e toques de limão siciliano, e o picolé de chocolate crocante, à base de chocolate italiano ao leite com cobertura de chocolate meio amargo belga e granulados crocantes. Este último tem preço sugerido de R$ 7,90 a R$ 9,90. Os dois primeiros, de R$ 27,90 a R$ 29,90 e de R$ 7,90 a R$ 9,90, respectivamente. Fundada em 2008, a Diletto está presente hoje em mais de 3 mil pontos de venda espalhados pelo país.

Ana Moreno

Terça du Vin

Rodízio de guarnições Um filé mignon, uma carne de sol, um bacalhau ou um frango na brasa, acompanhado por um rodízio de guarnições servidas em charmosas panelinhas, com preços a partir de R$ 37. É assim o novo almoço executivo do Ancho Bistrô de Fogo (306 Sul, Bloco C, tel. 3244.7125), servido de terça a sexta-feira. Há também uma opção para os vegetarianos: a kafta vegana. Após escolher o prato principal, o cliente pode se servir à vontade dos acompanhamentos sugeridos pela chef Renata Carvalho, renovados diariamente. Entre as guarnições, creme de milho defumado (foto), arroz cremoso com brócolis, batatas rosti, salada de quinoa, farofa de cuscuz e legumes grelhados.

líquido mais de uma vez, eliminando qualquer impureza e garantindo sabor único. A novidade chegou às lojas e bares no mês passado, como parte da estratégia de reposicionamento da marca, iniciada em 2016 com a reformulação das embalagens da Sagatiba Envelhecida e da Sagatiba Cristalina (foto). Além do novo sabor, que levou cerca de um ano para ser desenvolvido, a embalagem é um diferencial. Colorida e chamativa, a garrafa não vai passar despercebida pelos consumidores. A Sagatiba Mel, Lima e Limão deve ser consumida bem gelada ou com gelo. A garrafa de 700ml tem preço sugerido de R$ 40.

Erramos 1 A matéria que publicamos sobre a Padaria Castália em nossa edição de fevereiro cometeu o grave pecado de confundir a formação dos três casais que estão à frente do empreendimento. Vamos nos redimir: a companheira de Pedro

Galvão é a barista Caroline Lazaroto; Eduardo Tavares namora Manoella Otero, arquiteta que assina o projeto da casa; e o par perfeito de André Tavares é Joana Guimarães, comunicóloga que atende a clientela na mesa e no balcão. Nosso erro, felizmente, não com- prometeu a harmonia dos casais, que seguem tocando a padaria com amor e criatividade. Agora mesmo eles colocaram dois novos produtos no cardápio: a torta de chocolate preparada sem farinha de trigo (R$ 9 a fatia) e o folhado recheado de presunto e queijo (R$ 8).

Erramos 2 Na mesma edição, na matéria Deliciosas obras de arte, sobre a doceria da pâtissier Renata Diniz, erramos nos preços de alguns produtos. Os preços corretos são: mini cupcake, R$ 2,50; cupcake R$ 5,50; cupcake para pasta americana, R$ 6,50. Nosso pedido de desculpas a Renata e aos nossos leitores.

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Capacidade para 100 pessoas sentadas, vista privilegiada para o Lago Paranoá e petiscos de “comer rezando”, segundo opiniões insuspeitas. É assim a varanda da churrascaria Steak Bull (SCES, Trecho 2, ao lado do Pier 21, tel. 3228.8818), inaugurada em meados do mês passado. Uma nova opção para a happy hour, ao som de boa música, tomando um drinque e saboreando iscas de peixe (400 gramas por R$ 49,90), bolinhos de bacalhau (12 unidades também por R$ 49,90) ou uma variada tábua de frios (R$ 54). Toda noite tem som ambiente e eventualmente música ao vivo, como o jazz executado pelo músico Jonas Campelo, 35 anos, saxofonista que já participou de concertos em vários países da Europa.

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Happy hour na varanda

Marvada com mel, lima e limão É essa a composição da nova cachaça saborizada lançada pela Sagatiba. A cachaça é a Sagatiba Cristalina, que é multidestilada – um processo de produção que destila o

Rótulos garimpados pelo sommelier Átila Ribeiro, da importadora Trilix, foram servidos na primeira edição deste ano da Terça du Vin, dia 14, no C’est la Vie (408 Sul, Bloco A, tel. 3244.6353). Além de duas degustações às cegas, para relaxar o ambiente, foram oferecidos seis vinhos de diferentes cepas e diferentes países produtores, entre eles o argentino Triade Malbec Rosado 2015, o espanhol Palacio Quemado Tempranillo 2013 e o chileno Vistamar Late Harvest Moscatel. Para acompanhar, uma seleleção de pratos especiais da casa, como esses dadinhos de tapioca com pimenta biquinho.

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GARFADAS&GOLES

Carnavais passados

LUIZ RECENA

lrecena@hotmail.com

e saudade pelo braço

E lá se foi mais um Carnaval. Lavado e fechado literalmente pelas águas do fim do verão, as águas de março, que também fecham fevereiro. Contas são feitas igualmente quando Momo dobra a curva e perde-se na poeira do tempo para só voltar no próximo ano. São dezenas de carnavais, muitas dezenas, pois reza a lenda que o colunista sassaricou na pança materna em bailes pré-carnavalescos. Dias depois veio ao mundo já na condição de folião veterano. Então, tirante os exageros, mais de meio século de serpentinas vos contemplam. E por aí seguem os bailes da vida.

Morreu ou não morreu

A Sociedade Armorial Patafísica e Rusticana morreu. O velho Pacotão não morreu. Se quiserem inverter a ordem dos fatores chegaremos ao mesmo produto: nada nem ninguém morre no Carnaval. Carlão, Bolão, Lucas, Lysias e outros tiveram pressa e foram antes. Outros ficaram. Para brigar entre si, com os espíritos dos primeiros e com quem mais se apresentasse, contra ou a favor do bloco. O importante é que domingo e terça gorda ela estava lá, a aglomeração desorganizada e feliz que atende pelo nome de Pacotão. “Ah, mas ele mudou, não é mais o mesmo”, diz um chato. “Todos mudamos, nenhum de nós é mais o mesmo”, respondi, ainda mais chato...

Os bares não mudam

O Chorão não está mais lá na concentração da 302 Norte. Nem o vizinho dele. Mas o Chão de Estrelas e o Picanhas do Sul dominam o pedaço. Normais na escala dos botecos em tempos carnavalescos, quer dizer: cheios, médios, felizes. Não me venham dizer que foram lá para lautos almoços e sofisticadas doses. Foram para a esbórnia, os apertos, o chope quase gelado, os petiscos de boteco. E isso tinha! Sejamos honestos porque fomos felizes, rimos e encontramos pessoas e falamos bem e mal de um monte de gente. O ambiente dos bares continua o mesmo. Só os nomes diferem.

Belas e feras

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No domingo elas chegaram para juntar-se à minha, que não estava para requebros sambeiros em asfalto molhado. As belas cariocas endossaram assim a alforria do velho e voyeur folião. Na terça foram ao Zoo visitar as feras e voltaram a liberar o Pierrô apaxonado, que vive só cantando. Entre um dia e outro, três registros: o bar da piscina do complexo Life Resort, a hamburgada do Madrid e a beira-lago do Bier Fass. Todos competentes e atentos, com menção especial para o primeiro, por ter sido a descoberta do feriado.

Duas confirmações

A primeira é pré-carnavalesca e atende pelo nome de Trow, uma simpática entidade nórdica que baixou no Lago Norte e materializou-se em cervejaria e grelhados. O setor estava precisado e merecia. Cozinha e atendimento, se o carvão não dá sustos, sobram em simpatia e eficiência. Vale visita. A segunda é pós-carnavalesca e também segura a descoberta: o Mercado 153, no aeroporto. Recupera com louvor a velha tradição de um bom lugar para beber e beliscar enquanto se espera um avião ou se despede de um amigo. Nem tudo está perdido. Evoé!

Últimas linhas

Para dar uma força aos shoppings da cidade que incentivam seus bares e restaurantes a investir na clássica happy hour. Promoções e músicas. Há bons locais e momentos. Voltaremos ao tema.


PÃO&VINHO

Ítalo-americano Embora não faltem exemplos de realizações de grande qualidade desse binômio em todas as áreas, inclusive na vitivinicultura, não são desses que falaremos hoje e sim de alguns bons vinhos de uma e de outra origem. São os escolhidos deste enófilo de plantão para o momento, que estão a ser chamados de ítalo-americanos. Das terras de Tio Sam são duas as regiões que mais me atraem: o Napa Valley e o Oregon. Aquele, apesar de bom produtor de diversas castas, especializadíssimo na Cabernet Sauvignon e na Chardonnay, e este o local no globo fora da Borgonha que melhor produz aquela casta mais difícil, mas também a mais fantástica quando bem produzida – a Pinot Noir. Mas, desta vez, resolvi, ainda que inspirado naqueles Pinots, trazer um exemplar da região de Santa Bárbara, enaltecida pelos seus Pinot Noir no famoso filme Sideways, pessimamente traduzido para “entre umas e outras”. Para mim, e para muitos, o Cabernet Sauvignon produzido no Napa é um dos melhores do mundo e já o provou no chamado “desafio de Paris”, quando venceu em degustação às cegas os melhores de Bordeaux. Trouxe diretamente da fonte, há alguns anos, uma garrafa muito apreciada pelos locais, o 2480, da vinícola Hollywood & Vine Cellars, da safra de 2008. O ator e diretor de cinema Doug Barr e seu amigo Bruce Orosz se uniram para produzir um vinho de exceção e sua primeira propriedade se localizava em um endereço cujo número era 2480, daí o nome do caldo, simples assim. Esse vinho, como um bom exemplar de Cabernet do Napa, é de um rubi intenso, quase púrpura, e traz ao nariz belas impressões de frutas negras maduras, algum floral e menta. Uma estrutura de gigante em taninos bem domados se traduz em boca com maciez e uma sensação aveludada. Grande vinho, recebeu belos 92 pontos do todo poderoso Robert Parker. Nosso exemplar de Pinot Noir é o Belle Glos da Las

ALEXANDRE FRANCO pao&vinho@agenciaalo.com.br

Alturas Vineyard, safra 2011, de Monterey County. Um vinho muito bom, carnudo além do que devia se comparado a um Borgonha, mas um caldo gostoso de se beber. Cor rubi, com aromas de frutas negras, baunilha e coco. Palato rico, com algo de terra e carne. Diferente dos Pinots mais tradicionais, mas bastante saboroso. Da nossa querida Bota trouxe um Barolo de boa estirpe, o Priore 2011 da Cantine Povero, e uma grande novidade, ao menos para mim, um vinho de sobremesa do Marche ao mais puro estilo de Sauternes, feito de uvas botritizadas. O Barolo é um vinho do Piemonte, um dos grandes ícones Italianos, produzido a partir da casta Nebiolo, conhecido como “o rei dos vinhos e o vinho dos reis”. Trata-se de um caldo concentrado, destinado a guarda e que acompanha muito bem a gastronomia mais rica, com carnes e molhos. De cor rubi não muito intensa, como convém à casta, traz ao olfato toques de frutas vermelhas e negras, baunilha, alguma especiaria e especialmente um agradável chocolate. Em boca é já macio, apesar da pouca idade, e bem estruturado. Ótimo vinho! Finalmente, o Máximo 2008, da Umani Ronchi. Um vinho da região de Marche feito a partir de uvas atacadas pela Botrytis Cinerea, o fungo mágico que produz os melhores vinhos de sobremesa do mundo. Essa metodologia surgiu na Hungria e foi assimilada majestosamente pela região de Sauternes, ao sul de Bordeaux, e pelo visto copiada com competência por essa bodega italiana no Marche. Chamado por alguns de “o Sauternes italiano”, o Máximo, cuja maior diferença para o Sauternes esteja talvez na casta utilizada, que aqui é a Sauvignon Blanc, traz uma cor dourada e notas de mel, damasco e pessegos. Na boca é bem equilibrado, com uma suave doçura e boa acidez, confirmando seus aromas, especialmente o mel. Excelente vinho doce natural.

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HAPPY HOUR

As harmonias da cerveja

RONALDO MORADO @ronaldomorado

"Mesmo quando tudo faltar teremos a música. E, mesmo se ela falhar, ainda haverá a cerveja!” James Hauenstein

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Há quem acredite que os melhores casamentos são entre iguais ou semelhantes. Outros acreditam que a complementariedade é o segredo para uma união duradoura e feliz. Penso eu que tudo na vida vibra e encontra ressonâncias – sejam elas por contraste ou por similaridade. O universo é caótico e harmônico ao mesmo tempo. A percepção agradável do prazer, da paz e do belo é traduzida como harmonia. É uma sensação estranha de calma e de sintonia que advém do encontro de duas ou mais situações prazerosas que provocam um encanto maior do que a soma dos prazeres daquelas mesmas experiências separadas. Como o maior valor que esperamos a cada momento vivido é o prazer proporcionado pela experiência, a harmonia é o parâmetro fundamental. Nosso corpo é dotado de capacidades para interagir com o mundo exterior (coisas, pessoas, cheiros, sabores, sons, texturas etc.) que não apenas isoladamente, mas principalmente em conjunto, nos transmitem sensações que denominamos experiência. Ou seja, o contexto é capaz de alterar a percepção. Degustar uma cerveja é um ato composto de um conjunto de sensações – algumas simples, outras complexas – que ao final, processadas pelo cérebro, nos proporciona uma experiência ampla, única e particular. As características individuais podem privilegiar as texturas, as cores, os cheiros, o paladar ou qualquer informação sensorial que se faça mais presente no momento da interação organoléptica. Acrescenta-se a isso a presença ou ausência das pessoas ao redor, o ambiente, a atmosfera do local, as motivações, os humores, os preconceitos, enfim, o universo em torno do simples ato de degustar a cerveja. As interações mais óbvias da bebida são com as comidas, o que compõe a experiência organoléptica em si. Não que sejam mais simples, ao contrario, mas acontecem a partir de um encontro que ocorre nos mesmos lugares – nariz, boca e estomago. Mas, considerando as características próprias da cerveja e sua rica cultura, é importante levar em conta o contexto – ambiente, companhias e motivação.

Cerveja e ambientes O clima da região diz muito sobre a preferência de estilos de cerveja. Climas frios favorecem ambientes fechados que, mesmo aquecidos, pedem cervejas mais alcoólicas e encorpadas, tais como Porter, Imperial Porter, IPAs, Belgian Strong Ale, Tripel, Quadrupel, Barleywine etc. Encontros para happy-hour (pós-trabalho ou escola), tipicamente, são acompanhados de rodadas de Pilsen, Pale Ale e até de Stout, com alta “bebabilidade” (drinkability). Na praia, na balada, nos shows e na arquibancada preferimos cervejas leves e refrescantes – em geral Standard American Lager ou Pilsen com alta bebabilidade. Cerveja e música É muito difícil isolar os sons em torno da mesa de um bar. Mas a música de fundo tem uma importância fundamental na percepção do que se come ou bebe. Alguns gêneros musicais sintonizam-se muito bem com certas situações e contextos – outros não. Nesse sentido, definir previamente os pares de cerveja e música é muito mais difícil. E, de novo, não há regras e o que fazemos é encontrar sintonias. Essas harmonias ocorrem por parentesco de raízes – polca (gênero musical da República Checa e Alemanha) combina com estilos de cerveja mais leves e maltadas (Pilsen, Helles, Weizen, Dunkel etc..). Rock, blues e jazz têm afinidade com cervejas de mais corpo e teor alcoólico, tais como as Pale Ale, IPAs, Scottish Ale etc... O gênero de música clássica e medieval tem forte parentesco com as Trapistas e Belgian Ale. Escapando da origem cultural dos estilos percebemos, naturalmente, a proximidade dos estilos mais leves – como Standard American Lager, Pilsen, Helles etc – com samba, reggae, salsa e sertanejo, por exemplo. Convido o leitor a buscar continuamente sua melhor experiência, sempre nova, sempre rica e harmônica. Em algumas ocasiões a cerveja será o coadjuvante e não o astro principal da experiência. Mas, com certeza, a bebida se adaptará perfeitamente.


Glênio Lima

DIA&NOITE

diásporavemaí Retratos em óleo sobre tela e pastel de personalidades marcantes da cultura brasileira, como Pixinguinha, Milton Santos, Clementina de Jesus, Cartola, Elza Soares, Luiz Gonzaga, Gilberto Gil e muitos outros, estarão na exposição Diáspora, que ocupará a galeria da Caixa Cultural entre 21 de março e 14 de maio. Nela, o artista plástico Josafá Neves, nascido no Gama e morador de Goiânia, apresentará uma contundente obra que trabalha, de forma poética, a influência de povos negros que ajudaram a conformar a cultura brasileira. Esculpidos em madeira estarão orixás como Oxóssi, o senhor das florestas, que acolhe o visitante em seu passeio pela mostra; e Xangô, o rei absoluto, senhor da justiça, o orixá do raio e do trovão. Oxalá, com sua sabedoria ancestral, aparece retratado numa pintura em óleo sobre tela. Durante quatro anos o artista pesquisou o tema diáspora, que significa dispersão, retirada de povos do seu local de origem, seja por motivos políticos ou religiosos. A diáspora negra, que no primeiro momento ocorreu por força do tráfico de escravos, levou os negros para diversos continentes. De terça-feira a domingo, das 9 às 21h, com entrada franca.

espaçoparaarte

Entre 1949 e 1954, o artista plástico Athos Bulcão produziu 26 fotomontagens nas quais flerta com o surrealismo. Esse lado desconhecido do artista está na exposição Fotomontagens, em cartaz até 8 de abril na Fundação Athos Bulcão (404 Sul). Ele procurava e recortava fotos de revistas da época, colando-as num fundo comum e refotografando a cena composta. A série de obras foi produzida em um momento bem específico da vida do artista. Era início da década de 50 e o Brasil experimentava uma efervescência no campo da fotografia. “Athos Bulcão retornava da França e estava em crise, pois havia descoberto que não poderia viver de pintura no Brasil”, lembra Valéria Cabral, secretária executiva da fundação. De segunda a sexta-feira, das 9 às 19h, e sábado, das 10 às 17h, com entrada franca.

A Casa de Cultura da América Latina (CAL) recebe somente até o dia 22 propostas para ocupação de suas galerias por parte de artistas brasileiros e estrangeiros que atuem no campo das artes visuais. São aceitas inscrições de projetos curatoriais e artísticos, nas seguintes linguagens: desenho, pintura, instalação, performance (com registro), fotografia, escultura, vídeo, gravura, objeto, arte computacional, intervenção urbana (com registro), entre outros, desde que possam ser instalados e/ou apresentados nas galerias. As propostas devem ser enviadas no formato PDF para o e-mail convocatoriacal@gmail.com. O resultado da seleção será divulgado no site www.cal.unb.br, que também traz informações detalhadas sobre o processo. Criada em 1987 para promover e divulgar a arte e a cultura latino-americanas, a CAL vem se consolidando como um espaço voltado para a promoção e difusão das culturas ibero-americana, latina e africana, como também de estudo e preservação do patrimônio cultural e artístico da Universidade de Brasília.

Athos Bulcão

palhaçasdomundo

Tanja Simma Anna de Lirium

Rômulo Juracy

athosinusitado

Até o dia 19 o CCBB se transforma num picadeiro genuinamente feminino. Palhaças da Áustria, Brasil, França, Portugal e México participam do festival Palhaças do mundo, que tem curadoria de Manuela Castelo Branco. Na programação estão espetáculos nacionais e internacionais, debates, invasões, oficinas e exibição de curtas-metragens. “Cada palhaça é um satélite em torno de uma poética, de um momento histórico e de experiências pessoais e estéticas muito específicas. Por isso, o festival, ainda que com a clara proposta de recorte de gênero e protagonismo feminino, é de diversidade”, explica Manuela. Entre os destaques está o resgate da memória de Xamego, a primeira palhaça negra do Brasil de que se tem registro e que se apresentava em circo, travestindo-se de palhaço numa época em que ser mulher e palhaça, no Brasil, era algo impensável. O festival traz ainda a palhaça Ferrugem (antes palhaço Ferrugem) e outras que são bufonas, como a pós-doutora Joice Aglae. Participam também a primeira mulher palhaça a integrar o Cirque du Soleil, Tanja Simma (foto), e Hélène Gustin, fundadora do Le Rire Médicin, grupo de palhaços que atuam em hospitais. Ingressos a R$ 20 e R$ 10. Programação completa em www.bb.com.br/cultura e no facebook.com/ccbb.brasilia.

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nabocadomundo

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DIA&NOITE

Esse é o nome do primeiro CD que o compositor e cantor Flávio Faria acaba de lançar. Mineiro residente em Brasília desde menino, ele explica que sua música nasce da mistura de sons e sentimentos urbanos, de uma pessoa que vive e vê a cidade por baixo: pelos bares, becos e bueiros. “Como todo candango, sou fruto da mistura de culturas, sou fruto da migração de diferentes povos que participaram da nossa vida desde a infância”, explica. Com arranjos vocais a cargo de Tânia Bernauss, o CD é uma coletânea de sua produção ao longo de quatro décadas, tendo como carro-chefe a música Yuri, um pop rock dançante. Destaque também para o violão flamenco de Toninho Maya na música Cambraia, de Flávio Faria em parceria com Aloísio Brandão, e Nanquim, em parceria com Vicente Sá. O bandolim do garoto Ian Coury, de apenas 14 anos, está presente em dois dos quatro sambas do CD, com destaque para a parceria com Fabrizio Morelo, em Melhor antes. O violão clássico de Jaime Ernest Dias aparece em Bicho-da-seda e o piano acústico do maestro Rênio Quintas está no rock/blues Elevador, dividindo espaço com os solos distorcidos da guitarra de Mário Guilhón. O CD está à venda no Espaço Cultural Leão da Serra e no site www.flaviofaria.com.br.

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Ele é o pianista contemporâneo brasileiro mais visualizado nas redes sociais e, segundo a Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro, criou um novo estilo de piano e se tornou referência da inovação musical no país. É Soares Brandão quem participa das comemorações dos 30 anos do projeto Sextas musicais, da Casa Thomas Jefferson (706/906 Sul), dia 17, às 20h. Radicado na Europa, onde estudou a música dodecafônica e eletroacústica, foi discípulo do francês Pierre Schaeffer (1910-1995), que o incentivou em suas pesquisas musicais na área de pedagogia, composição e técnica instrumental. Soares Brandão divide seu tempo entre o Brasil e a Europa, onde recebeu vários prêmios. É o único pianista goiano citado pelo maior website de piano mundial, o Pianobleu. Entrada franca.

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Sidnei Maia na flauta, Fernando Machado na clarineta e Cristina Porto no fagote formam o Nós nas Madeiras, grupo de música erudita de câmara que se apresenta dia 24, às 20h, no mesmo CTJ Hall (706/906 Sul). No repertório, obras de Bach, Vivaldi, Mozart, Haydn, Villa-Lobos e GuerraPeixe, entre outros. Compositores clássicos da música popular brasileira, como Pixinguinha, Chiquinha Gonzaga e Ernesto Nazareth, também serão lembrados no recital do grupo criado em 1998 na Escola de Música de Brasília como quinteto de sopros, e que já se apresentou também como sexteto e quarteto. A formação de trio resulta em sonoridades delicadas, maior transparência e compreensão mais imediata da movimentação das vozes em contraponto. Seus integrantes foram professores da Escola de Música de Brasília e participam de orquestras, grupos de música de câmara, música contemporânea e popular.

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osacieogirassol Um encontro entre o erudito e o popular. Assim pode ser definido o recital que o cantor André Vidal e a pianista Elisa Silveira apresentam dia 22, às 20h, no CTJ Hall (706/906 Sul). Após várias incursões pela música erudita, o duo formado em 2007 se debruça agora sobre a MPB, em seleção de canções de Chico Buarque, Edu Lobo, Tom Jobim, Dorival Caymmi, José Miguel Wisnik e Guinga. Buscando estabelecer o diálogo entre a canção popular e a erudita, André Vidal foi procurar nos diversos gêneros e períodos da canção de câmara a inspiração para os arranjos de piano desse projeto. Assim, subvertendo a regra geral em iniciativas desse tipo, a abordagem vocal se afasta tanto quanto possível do canto lírico, deixando para o piano a função de fazer a ponte com a música erudita, com acompanhamentos reminiscentes de compositores como Schubert, Debussy e Villa-Lobos. A volta do malandro, de Chico Buarque, Prelúdio, de Tom Jobim, e Acalanto da rosa, de Claudio Santoro e Vinicius de Moraes, estão no programa do recital O saci e o girassol, que tem entrada franca.


Randal Andrade

óperabufa

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Chama-se Você e eu o show que as cantoras Sabrina Parlatore e Márcia Tauil farão no dia 31, às 20h, no CTJHall (706/906 Sul), com o acompanhamento do pianista e arranjador Cleudson Assis. O espetáculo é uma homenagem à música de Carlos Lyra e Vinícius de Moraes. As composições Desafinado, Dindi, The way you look tonight e S’Wonderful ganharam releituras que transmitem a serenidade das cantoras e dão um tom intimista para suas performances. Com experiência de 20 anos de trabalho como apresentadora de televisão, Sabrina Parlatore partiu para a carreira de cantora e já dividiu palco com Léo Jaime, Jair Oliveira e Roberto Menescal. Márcia Tauil fez temporada de shows com Roberto Menescal por vários Estados e vem colecionando elogios dos críticos de música. Sementes no vento, seu segundo CD, foi lançado no Japão e, no ano passado, participou do disco Música verde, ao lado de Zé Renato, Roberto Menescal, Jane Duboc, Francis Hime, Vânia Bastos, Milton Guedes e outros. Entrada franca.

tuttichoir Em maio deste ano, as 30 vozes que compõem o coro misto brasiliense estarão ecoando no palco do Carnegie Hall, de Nova York, sob a regência do maestro Daniel Souto de Moraes e da maestrina Priscila Martins Bispo. Antes disso, dia 29 de março, eles estarão na Casa Thomas Jefferson (606 Norte, acesso pela L3 Norte) para apresentar a nova versão da Missa de Alcaçuz, de Danilo Guanais, composta há 20 anos. Tanto Daniel quanto Priscila possuem sólida formação acadêmica e longa experiência como regentes à frente de vários grupos musicais no Brasil e exterior. Do seu repertório constam peças sacras, eruditas e populares. Em maio, além do Carnegie Hall, o Tutti Choir fará outras apresentações na cidade, com repertório próprio, sob a regência do maestro Daniel Souto de Moraes. No concerto de Brasília estarão peças de Bach, Luiz Gonzaga, Beethoven e Gilberto Gil, entre outros. Às 20h, com entrada franca.

óperademozart A temporada que começou no último sábado, dia 11, na Escola de Música de Brasília segue em mais dois teatros até o fim do mês. Estamos falando da ópera La clemenza di Tito, uma montagem escrita no último ano de vida do compositor austríaco Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) interpretada por elenco de músicos e produtores brasilienses. Com direção de Francisco Frias e regência de Deyvison Miranda, a ópera conta com 60 integrantes, somando-se o coro, os solistas e a orquestra. Dias 17 e 18 as apresentações serão no Teatro Sesc Newton Rossi da Ceilândia, às 20h, seguindo na semana seguinte para duas apresentações no Teatro Sesc Paulo Gracindo, do Gama, ambas com entrada franca. Em La clemenza di Tito, Mozart transporta o público para a Roma antiga com a intenção de desvendar um complô para matar o imperador do título. Composta para a coroação de Leopoldo II, imperador da Boêmia, no fim do século 18, a ópera é a última de Mozart.

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Um empresário falido tem a oportunidade de continuar no mercado, só que de forma inescrupulosa. Mesmo com toda sua honestidade, seu assistente o convence a entrar num jogo de aparências, orgulho e ganância. Com direção de Manuela Castelo Branco, a companhia Ópera Brasília apresenta O empresário – Uma ópera bufa, baseada na obra de Mozart, em cartaz no Teatro Sesc Paulo Autran (Taguatinga) dias 16, 17 e 18, às 20h, e na Escola de Música de Brasília, dia 19, às 16h, e dias 20 e 21, às 20h. Formado pelas cantoras Vilma Bittencourt e Henriqueta Mattos, o grupo Cia. Ópera Brasília atua desde 2009 e se especializou em releituras contemporâneas de óperas tradicionais. A corrupção, o tráfico de influência, mentiras e intrigas, exigências egoicas dos artistas, são os motes principais dessa montagem com uma ácida, mas cômica, crítica de cunho político-social. Entrada franca.

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omágicodeoz

interatividademusical Lucas Casado

Um cavaquinhista e um bandolinista de Brasília estão bombando na internet com um programa de formato inovador, o Face musical. Eles pretendem levar música popular de qualidade para os usuários, além de disseminar interpretações de clássicos e apresentar trabalhos autorais dos convidados e anfitriões. Transmitido pela ferramenta Live do Facebook e exibido quinzenalmente, o programa possui formato interativo, no qual os internautas participam ativamente. As conversas vão desde a trajetória de ambos e suas composições até informações técnicas sobre os instrumentos, tudo feito de forma leve e despretensiosa. Um dos destaques é o desafio de compor ao vivo. Em suas dez transmissões na primeira temporada, o programa recebeu Marcus Moraes, Pablo Fagundes, Dudu Sete Cordas, Cainã Cavalcante, Wilson Bebel, Larissa Umaytá, Dhi Ribeiro, Sérgio Morais e Alberto Salgado, totalizando mais de 70.800 visualizações somente em programas na íntegra, fora vídeos isolados das interpretações musicais, que geram ainda mais visualizações. O vídeo em que interpretam Brasileirinho, de Waldir Azevedo (1923-1980), já passa das 800 mil visualizações, com registros de público do mundo inteiro. Victor e Márcio começaram suas carreiras muito jovens e hoje são músicos profissionais e professores de música. O programa quinzenal ao vivo é gravado em terças-feiras alternadas, às 21h30, em www.facebook.com/FaceMusical/.

Dorothy e seu cachorro, personagens que são carregados por um vento forte e chegam às terras do mágico de Oz, estarão no palco do Teatro Sesc Goldoni (208/209 Sul) todos os sábados e domingos até 2 de abril. Na montagem da trupe Trabalhe essa Ideia, uma releitura completamente moderna do clássico infantil. Cinco atrizes mirins, entre 10 e 14 anos, fazem parte do elenco, junto com Fofucho, um cachorro de verdade que faz o papel de Totó. De acordo com a diretora Paula Hesketh, o sucesso da primeira temporada, no final do ano passado, se deve à forma como o espetáculo é apresentado ao público. “O figurino e o cenário da peça são mais jovens, o enredo é uma releitura muito mais jovem, além do diferencial das crianças no palco”, comenta. Às 17h, com ingressos a R$ 40 e R$ 20. Informações: 98120.0697.

Tecer a poesia do envelhecer. Essa é a proposta do espetáculo Fio a fio, que une teatro e dança para tratar de um tema delicado: o envelhecimento. No palco, os bailarinos e coreógrafos Giselle Rodrigues e Édi Oliveira levantam questões como a intuição da morte, a perda da memória, a fragilidade física e a solidão, mas que também revelam experiências afetivas como o companheirismo e a serenidade existentes no processo natural de envelhecer. Fio a fio estreou em outubro de 2015 e no ano passado participou do Festival Brasileiro de Teatro, no Rio de Janeiro, e do Festival Internacional de Teatro de Brasília. Participou, ainda em 2016, da mostra do Prêmio Sesc do Teatro Candango, na qual foi premiado nas categorias melhor espetáculo, direção, atriz, trilha sonora, cenário e figurino. De 17 a 19 de março, na Caixa Cultural. Sexta-feira e sábado, às 20h, e domingo, às 19h. Ingressos a R$ 20 e R$ 10.

Diego Bresani

sobreavelhice

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Marcelo Dischinger

quemnãogostadesamba... ...bom sujeito não é, como bem disse Dorival Caymmi em Samba da minha terra. E quem gosta não pode perder o show de Kris Maciel, dia 29, no Pinella (408 Norte). A sambista brasiliense começou sua carreira em 1999, no grupo de pagode Unidos do Samba. Com o grupo Raça Popular, participou das aberturas dos shows do grupo Pique Novo e do músico carioca Mauro Diniz. Partiu para a carreira solo em 2006 e nos dois anos seguintes fez shows em São Luís com o grupo Regra Três. Lançou seu primeiro CD, Sou o samba, em 2012, no Clube do Choro. Kris participou também do projeto Sambar, na escola de samba Aruc, e em abril de 2013 foi batizada pelo músico do Fundo de Quintal, Bira Presidente, no Cacique de Ramos, Rio de Janeiro. Das 19 às 22h, com couvert artístico a R$ 10.


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quatroessências Acertou em cheio a curadora Celina Leite Ribeiro Kaufman ao conceber e realizar a coletiva Quatressência, que acaba de encerrar temporada de um mês no Espaço Cultural do Superior Tribunal de Justiça, reunindo trabalhos dos artistas plásticos Luiz Costa, Sonnia Guerra, Pompéia e Tony Lima. A mostra se propôs a extrair a essência da obra de cada um dos quatro artistas – e atingiu plenameente seu objetivo. A "colorescência" é essencial na obra de Luiz Costa, enquanto a transcendência, a busca da paz e da sabedoria alimentam a arte de Sonnia Guerra. O movimento contínuo dos centros urbanos, o frisson e a efervescência das cidades são forma e conteúdo na obra de Pompéia (foto), enquanto a consciência é elemento essencial no trabalho de Tony Lima, com seus perfis, vidas femininas em formatos diversos, seus pensamentos, conflitos e questionamentos.

vivamarlene

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A artista plástica Marlene Godoy é a homenageada da mostra Ecletismo na arte, que reúne quarenta pintores na Galeria de Arte do CTJ Hall (706/906 Sul), até o dia 31. Em parceria com a ACAV – Associação Candanga de Artistas Visuais – a galeria apresenta a diversidade pictórica dos artistas de Brasília e o esforço de cada um deles para mostrar seu cuidado com a linguagem, a técnica e o processo criativo. Com tema livre, iniciantes ou mestres transitam entre o figurativo e o abstrato, em técnicas e estilos diversos, “num grande movimento de cores e formas que provocarão a curiosidade e a admiração do espectador”. Nascida em Minas, em 1934, a homenageada Marlene Godoy estudou pintura no Rio e na Alemanha, morou em vários países e se radicou em Brasília há 40 anos. De segunda a sexta, das 9 às 21h, e sábados, das 9 às 12h, com entrada franca.

Diego de Santos

É assim que foi batizada a primeira exposição individual da artista plástica alemã Silvie Eidam, em cartaz no Elefante Centro Cultural (706 Norte) até 21 de abril. Suas obras, óleos sobre telas, estão inseridas na discussão atual sobre representatividade, gênero, corpo e como a sociedade determina padrões e comportamentos. A artista propõe uma desconstrução das leituras até então dominantes. “O feminino tem que ser trabalhado sempre, enquanto o masculino é tido como neutro, não tem que se performar, mas isso é um mito”, afirma Silvie. As duas séries que compõem a mostra, Coreografias e Masculinidades, exploram principalmente o jogo de luz e sombra, bem como as expressões corporais e faciais. Silvie Eidam nasceu em Frankfurt e vive atualmente entre a Alemanha e o Brasil. Seu avô foi o pintor Wilhelm Eidam, que a incentivou nas artes plásticas. Ela estudou com as artistas Andrea Simon e Beatrix Pohle-Stiehl e continuou o ensino formal no Goldsmiths College, em Londres, e na Universidade de Brasília. Com curadoria de Manuel Neves, Masculinidades tem visitação de segunda a sábado, das 14 às 18h30. Entrada franca.

Divulgação/Marlene Godoy

masculinidades

artesocial Conchas, fogo, fuligem e grafite ganham corpo em Poema 193, exposição do artista plástico cearense Diego de Santos que conquistou a nota máxima no Prêmio Funarte de Arte Contemporânea. Em cartaz até 2 de abril na Galeria Fayga Ostrower, apresenta desenhos, fotografias e vídeos produzidos pelo artista convidando o público a ativar sua vivência estética e sensorial. Com curadoria de Yana Tamayo, o projeto se baseia em intenso processo experimental, acionando o imaginário da concha, da casa, do arquétipo de morada, em confronto com o fogo e suas simbologias, para discorrer poeticamente sobre questões que permeiam tanto o campo da intimidade como os conflitos sociais. Nos vídeos é possível observar registros de conchas em chamas, em analogia com a estrutura de um lar e com o fogo saindo de seu interior. Uma forma de tratar poeticamente o problema dos incêndios criminosos que atingem favelas e moradias precárias, daí o número dos bombeiros 193 no título. De terça a domingo, das 10 às 21h, com entrada franca. Informações: 3322.2076.

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PATRIMÔNIOCULTURAL

Um país aprendiz Divulgação

Ao completar 80 anos, o Instituto do Patrimônio Histórico alerta que a preservação da memória cultural depende de todos os brasileiros.

POR MARCOS MAGALHÃES

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Brasil em crise, dividido e descrente de si mesmo, precisa marcar um encontro com Mário de Andrade. Turista aprendiz, como lembra o título de seu diário de viagens entre 1927 e 1929, o escritor paulista levou aos grandes centros notícias de um país esquecido, onde se dançava o maracatu e o coco. O contato entusiasmado com a herança cultural brasileira o inspirou a redigir, a pedido do então ministro da Educação, Gustavo Capanema, o anteprojeto de criação do Serviço de Patrimônio Histórico Brasileiro, concretizada no ano seguinte. O pioneirismo de Mário de Andrade ainda inspira o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que agora completa 80 anos. A busca das origens, diz a presidente do instituto, a historiadora Kátia Bogéa, pode ajudar os brasileiros a reconquistar a confiança no

próprio país. Ela cita como exemplo a abertura dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, em 2016. Ainda estilhaçado pelo impeachment, recorda Kátia, o Brasil por um instante olhou para si mesmo com carinho e ofereceu ao mundo um pouco do que tem de melhor: sua diversidade. A seguir, os principais trechos da entrevista de Kátia Bogéa à Roteiro. O Brasil independente ainda não completou 200 anos e tem uma população jovem. Como a senhora avalia a importância da memória para o brasileiro? É uma questão que toca o coração das pessoas? No momento da criação do Serviço de Patrimônio éramos um país jovem, que saía da proclamação da República e ainda tinha o ranço do Estado colonial português. No início do século 20 tivemos a chegada do automóvel, das fábricas, do progresso, do operariado. E tinha todo o discurso higienista, presente na reforma

do prefeito Pereira Passos no Rio, que abriu avenidas e bulevares e colocou abaixo ruelas estreitas, sobrados e mucambos. O nascimento do Iphan foi dentro desse contexto. E os intelectuais que o criaram estavam pensando no futuro. O decretolei 25, que estabeleceu o Iphan e a Lei de Tombamento, é uma verdadeira obra de arte. Já tinha a questão da preservação do patrimônio material, como também a proteção do patrimônio arqueológico e das manifestações culturais. O próprio Mário de Andrade, que preparou o decreto, viajou como turista aprendiz descobrindo a diversidade cultural do país. Esse conceito da diversidade cultural já estava ali, na origem do Iphan. Grandes intelectuais estiveram envolvidos, como Alceu Amoroso Lima, Carlos Drummond de Andrade, Lúcio Costa. Tinham esse pensamento de futuro. O Iphan nasce com esse pensamento não do passado, mas de futuro. De preservar nossas tradições, nossa memória, nossa cultura, nossa história para as gerações futuras. O decreto-lei 25 tem uma coisa espetacular: é a primeira peça jurídica que trabalha o conceito de direito difuso. Aquilo que é de todos. Ainda hoje o grande embate do Iphan é a questão do direito difuso. Imagine que você é proprietário de um imóvel que foi tombado. O imóvel é da sua propriedade, mas você divide essa pro-


Carlos Café

Wagner Araújo

Os casarios coloniais de São Luiz do Maranhão (acima) e de Goiás Velho, ambos tombados como patrimônio histórico e cultural da humanidade.

priedade não só com o povo brasileiro, mas com toda a humanidade. Pode vender o imóvel, mas tem que oferecer primeiro ao Iphan, e para fazer qualquer reforma tem que ter a autorização do Iphan. Muitas vezes isso acaba dando ao Iphan aquela imagem de pessoa chata, que vai interromper alguma coisa, não? Dou sempre o exemplo do Lúcio Costa, funcionário do Iphan, que lutou muito para fazer o tombamento do bairro da Urca, no Rio de Janeiro. Teve que mover montanhas para conseguir fazer passar esse tombamento. Imagine você: se eles não tivessem essa projeção de futuro, o que seria hoje do Pão de Açúcar? Aquilo ia verticalizar de uma forma que comprometeria toda a paisagem urbana. Hoje, não só o Pão de Açúcar está protegido, como a Urca tem uma escala humana, os prédios convivem bem com a paisagem cultural e ambiental, como o Rio foi reconhecido como paisagem cultural da humanidade. O que o Iphan apresenta ao Brasil como resultado desses 80 anos e o que projeta para o futuro? Nesses 80 anos, nesses anos mágicos, heróicos, tivemos que correr contra o tempo. Correr contra essa política higienista, contra essa ideia de progresso. Como é um país muito novo e de proporções continentais, é muito fácil ir abandonando seus núcleos centrais porque você tem muito espaço para se expandir. Um dos grandes problemas que temos hoje no Brasil é de abandono de áreas centrais dos centros históricos. Na Europa eles não têm como se expandir, então têm que revitalizar, reutilizar. Passado o período desses anos heróicos, o Iphan partiu para o tombamento de conjuntos urbanos. Nos

anos 80 o Iphan começou a trabalhar com o conceito não só de patrimônio histórico e artístico nacional, mas com o conceito da diversidade cultural. Ou seja, essa memória, essa constituição da identidade cultural só é possível por meio da contribuição de todas as etnias presentes nesse grande continente que a gente chama de país, e é exatamente esse pulo que o Iphan vai dar. Agora temos que proteger o patrimônio que representa essa diversidade cultural. Daí vem, nos anos 80, o tombamento do primeiro terreiro. Ou seja, a contribuição não só do colonizador, dos europeus, mas também dos africanos, com a sua herança cultural trazendo suas religiões de matriz africana, o sincretismo religioso, esse país todo diverso, múltiplo. Completamente diferente da maioria dos países. Hoje, o que diferencia o Brasil é essa diversidade cultural. Hoje, por mais que a gente tenha um problema muito grande no país de educação, de formação, mesmo aquela pessoa que não tenha grande formação entende o conceito de patrimônio. Isso já está muito internalizado no inconsciente coletivo. Veja a cidade de São Luís, que foi reconhecida pela Unesco como patrimônio da humanidade. Ali há um centro histórico com muitos problemas, uma população muito pobre, mas você vê que em todos os ônibus da cidade está escrito: São Luís, patrimônio cultural da humanidade. Como é que o Brasil pode hoje se apresentar ao mundo? O Iphan foi a primeira instituição de patrimônio da América Latina. Só depois veio a do México. Após a Segunda Guerra Mundial, a Europa criou a Unesco, braço cultural da ONU, justamente para enfrentar o problema do seu patrimônio,

que foi completamente destruído. Cidades totalmente bombardeadas, como Dresden, na Alemanha, foram reconstruídas do jeito que eram. Porque a população não admitia perder a sua memória, as suas referências culturais. Então o Brasil já tinha um órgão de patrimônio quando a Unesco estava nascendo. Essa instituição é muito respeitada no mundo, até porque o Iphan criou no ano 2000 a política de patrimônio imaterial, ou seja, a referência das manifestações culturais. Não é apenas um título, como o registro do ofício das baianas do acarajé. Para obter o registro tem que fazer todo um projeto de pesquisa, que relate o surgimento dessa manifestação, quem são seus detentores, quais são seus problemas. Quando todo o processo está pronto vai para o Conselho Consultivo do Iphan, que tem 80 anos e é composto por representantes da sociedade civil. Não é o Iphan que tomba, nem é o Iphan que registra. Na verdade, tanto para o pedido de tombamento como para o pedido de registro é a sociedade que toma a iniciativa. Ao Iphan, como órgão técnico, cabe a instrução do processo. Qual é o papel da preservação do patrimônio na autoestima do brasileiro? Essa política de patrimônio imaterial foi muito bem incorporada pelo brasileiro. Já se pede que se tornem patrimônio imaterial a torcida do Flamengo, o biscoito Globo, o sanduiche Bauru, a feijoada, a seleção brasileira. A população brasileira é muito consciente desse conceito de patrimônio. Todos são unânimes em dizer que é importante a preservação do patrimônio. Mas o grau de compromisso, de fato, com a preservação é que vai demonstrar o grau de civilidade deste país.

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GALERIADEARTE

A beleza e a tragédia vistas do alto POR ALEXANDRE MARINO

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u Marini nasceu com um sonho: voar. A necessidade de novas descobertas trazia implícito o desejo de fazê-las por outros ângulos, com o olhar dos pássaros ou das águias. A partir desse impulso, ele cresceu criando asas, até tornar-se o piloto de aventuras e documentarista que já percorreu, pelos ares, mais de 15 mil quilômetros do território brasileiro, a bordo de seu paramotor – veículo adaptado do parapente com motorização auxiliar, que lhe permite realizar seu antigo sonho. Lá do alto, Lu Marini traz imagens e histórias, às vezes belas, às vezes trágicas. Esse material compõe a exposição inédita Pelos ares: 15.042 km de Brasil, que estará aberta ao público até 16 de abril no Átrio dos Vitrais, no edifício-sede da Caixa Eco-

nômica Federal, no Setor Bancário Sul. São fotos, vídeos e objetos reunidos por Lu Marini em suas expedições por 22 Estados brasileiros durante nove anos. Pantanal Matogressense, Floresta Amazônica, cânion do Xingó, litoral de vários Estados, rios Paranapanema, São Francisco e Doce são alguns dos locais que ele não apenas sobrevoou, mas visitou e conheceu de perto. A exposição também oferece um simulador de realidade virtual, que permite ao visitante vivenciar a sensação de voar a bordo do paramotor – a “forma mais segura de voar”, de acordo com Marini. “Minhas expedições são guiadas por objetivos sociais e ambientais”, explica. “Cada imagem tem por trás um objetivo educativo, o de dar forma à história que conto. Não são apenas imagens vazias, eu procuro despertar a consciência sobre a realidade que encontro.” De fato, Lu Marini contempla lá de cima belas imagens da natureza brasileira, mas nem sempre a realidade social com que se depara no solo guarda o mesmo glamour. “Cruzo nesses caminhos com pessoas simples, generosas, que vivem numa rela-

ção muito próxima com a natureza, mas muitas vezes são prejudicadas pelas agressões ao meio ambiente.” A exposição na Caixa revela esse contraste entre a beleza da natureza aparentemente intocada e as feridas do ambiente agredido. As baleias francas, que periodicamente comparecem ao litoral de Santa Catarina para procriar, e a destruição do Rio Doce, o maior crime ambiental cometido no Brasil. A rodovia Transamazônica, construída para levar suposto desenvolvimento a regiões intocadas do país, e a gigantesca floresta que ela corta. A realidade de quem vive às margens do Tietê, um dos rios mais poluídos do mundo, e os encantos do Rio Paranapanema, que divide os Estados de São Paulo e Paraná. No solo estão as histórias que Lu Marini faz questão de conhecer e transmitir nessa exposição e em documentários que produz para a televisão, como as séries Rastreando e Pousos e decolagens. Nesse trabalho, registra a complexa relação entre o homem e a natureza, refletindo sobre suas consequências. Ele já captou imagens de rios, florestas, praias, monta-


Leonardo Ramadinha

nhas, cidades. Ao montar essa exposição, inédita pelos objetivos e dimensão, Marini tem o objetivo de promover um encontro entre o espectador e o personagem, promovendo a reflexão e alimentando a busca por um mundo melhor, mais justo e humano. Lu Marini foi o único piloto do mundo a sobrevoar um vulcão em atividade – o Popocatépeti, no México. Também é recordista continental de altitude, ao subir a mais de 5 mil metros a bordo de seu paramotor. É instrutor da tropa de elite da Marinha do Brasil e formou mais de 450 pilotos nos últimos anos. Suas expedições têm se transformado em reportagens transmitidas pelo Fantástico, da Rede Globo. Administrador de empresas com MBA em marketing, formou-se profissionalmente na área de comunicação. A exposição na Caixa tem curadoria de Gabriela Alejandra Nebot e é realizada pela Fly Comunicação.

A lucidez de

Rubem Valentim

Pelos ares: 15.042 km de Brasil

Exposição de Lu Marini. Até 16/4, de 3ª a domingo, das 9 às 21h, no Átrio de Vitrais da Caixa Cultural (SBS, Quadra 4).

Na obra do artista, símbolos ancestrais de matriz africana ganham formas geométricas. POR ANA VILELA

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ma luz sobre o sagrado, uma luz que traz à tona a ancestralidade africana impressa em imagens e esculturas que têm como referência os símbolos do candomblé. Esta é a essência da arte de Rubem Valentim (Salvador 1922 – São Paulo 1991), uma arte clara, mas somente para quem quer de fato ver. Seus traços, as cores fortes e a luminosidade não somente evidenciam a fé, mas também relembram e reforçam raízes essenciais, no entanto oprimidas e esquecidas. Por isso, a exposição Rubem Valentim – Construção e fé, aberta para visitação até 28 de maio na Galeria Vitrine da Caixa Cultural, pode ser muito mais do que uma oportunidade de conhecer o trabalho de um artista esquecido, apesar de essencial à cultura e à arte brasileiras. Pode ser o momento de um resgate histórico. Que sua “arma poética para lutar contra a violência como um exercício de liberdade contra as forças repressivas” (Valentim) atire, certeira, na consciência. “O Rubem é o exemplo de um artista brasileiro ainda pouco compreendido. Ele é fruto de um esquecimento de nos-

sas raízes”, pontua o curador Marcus de Lontra Costa. Para ele, a tentativa de descaracterizar a obra de Rubem Valentim é tão forte que mesmo a crítica tradicional a trata somente como construtivista. “O que a gente quer mostrar é a importância da imagem negra, é o fato de que, na verdade, foi o Modernismo que bebeu da arte africana”, considera. Outro importante aspecto da mostra é o resultado da passagem do artista por Brasília, onde veio residir no final da década de 1960, ocasião em que dirigiu o Ateliê Livre do Instituto Central de Artes da Universidade de Brasília. “O impacto de Brasília em sua arte é fundamental. Rubem incorporou a monumentalidade à sua obra”, analisa Lontra. De acordo com ele, “Brasília é o espaço da maturidade artística de Valentim”, foi onde sua arte se ampliou e ganhou tridimensionalidade, indo da pintura às esculturas e objetos como tótens, altares e estandartes. É dessa época o mural de mármore criado para a sede da Novacap (1972), considerado sua primeira obra pública; já em São Paulo (1979), a escultura de concreto instalada na Praça da Sé é um marco histórico. São trabalhos

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GALERIADEARTE cujas reproduções integram a exposição. Vanguardista sim, considerado um dos mestres do construtivismo brasileiro. Mas, antes de mais nada, Rubem Valentim, avesso a modismos, foi, por ideologia, um artista tradutor da cultura negra em terra brasileira, principalmente da simbologia do candomblé, um grito contra o silêncio, a violência e a tentativa de ocultar uma memória. A geometria era somente um meio para quem procurava “a claridade, a luz da luz” (Valentim). A partir de influências externas, ele – que exerceu a odonto-

logia antes de se dedicar definitivamente às artes plásticas, por volta de 1948 – criou uma arte autenticamente brasileira e lúcida. Valentim construiu sua obra a partir de imagens subjetivas, vindas do imaginário, do simbolismo, porém alcançando grande objetividade. Com autonomia, trilhou um caminho próprio, produzindo uma arte atemporal, da qual os visitantes de Rubem Valentim – Construção e fé terão acesso a cerca de 60 exemplares, entre pinturas, relevos e esculturas. A exposição é a oportunidade de re-

cuperar “uma parte afastada de nós mesmos”, diz o curador. Sim, é mais uma porta rumo à história brasileira que tantos querem denegrir, apagar, esquecer, mas que está na essência, na pele, no sangue, na memória do povo brasileiro. Valentim, que realizou sua primeira exposição individual em 1954, há 20 anos não tem uma mostra exclusiva. Que seja bem-vinda e que traga luz! Rubem Valentim – Construção e fé

De 15/3 a 28/5 na Galeria Vitrine da Caixa Cultural (SBS, Quadra 4). De 3ª a domingo, das 9 às 21h, com entrada franca.

A arte contemporânea dos Bogéa Estilos próprios marcam a obra de dois artistas unidos pela história familiar e pela criação.

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les sabiam da existência um do outro; no entanto, se conheceram pessoalmente há pouco tempo. Em comum, muito mais que parentescos e caminhos entrecruzados. A união maior entre Páris Bogéa e Solange Bogéa se deu pela arte e convergiu na exposição [entre]Laços, em cartaz no foyer do Plenário da Câmara Legislativa do Distrito Federal até 7 de abril, onde cerca de 45 telas dão amplo panorama do trabalho dos dois artistas. A espátula e o óleo sobre telas amplas compõem a técnica usada por Solange, cujo estilo é um “figurativo que não é figurativo, uma natureza morta que não é natureza morta”, como define o curador Edgard Thomas. Ao pintar elementos da fauna e da flora brasileiras, a artista, que nasceu em São Luís do Maranhão e é formada em Direito pela Universidade de Brasília, dá à natureza uma nova conotação. Com trabalhos catalogados em diversas publicações especializadas, nacionais e internacionais, Solange já realizou exposições individuais e coletivas em galerias no Brasil e em Lisboa, Paris, Londres, Madri e Atenas. E Páris, que se utiliza de técnica mista, segundo Thomas, contextualiza sua criação entre o figurativo e o abstrato, em uma proposição aberta, não delimitada nem teoricamente nem na forma, criando um modo todo próprio de ex-

pressão, de contar histórias. Para pintar o seu mundo, o artista recolhe fragmentos de vivências em todos os lugares em que morou e passou, como Espanha, França, Brasil e Grécia. Desde 2002 ele tem participado de exposições individuais e coletivas no Brasil e no exterior e já expôs em Brasília, Atenas e Madri. Mas, na arte, o que une os dois primos distantes? As cores vibrantes são ape-

nas alguns dos laços entre eles. Como criadores, ambos sabem o que querem em relação ao trabalho artístico, corrompem o estabelecido, recriam o óbvio, ligam as múltiplas possibilidades e, agora, (re)constroem vínculos familiares e iniciam uma atuação profissional conjunta. As pinturas expostas em [entre]Laços são um convite para vivenciar essa conjugação de estilos, sensações e histórias.

Acima, Paisagem onírica (2017), de Páris Bogéa; abaixo, Tangerina corte (2017), de Solange Bogéa. Fotos: Divulgação

POR ANA VILELA


Marcos Hermes

Divulgação

GRAVES&AGUDOS

Ana Vilela

Júlia Vargas e Chico-Chico

Da rede para o palco Q

uem tem medo das novas tendências musicais? Muita gente, é claro. Pois, por mais que a música seja algo desafiador e libertário, uma parte dos seres humanos dá sempre um jeito de escolher o oposto, o tradicional acomodado, conhecido e seguro. Mas para os destemidos, amantes da liberdade, para esses existe o festival Sai da rede, que, em sua quarta edição, retorna a Brasília, numa rodada de quatro noites no Teatro I do CCBB. Para os não familiarizados, o festival é aquela chance de ver de perto artistas que acontecem na web, nas mídias sociais, em produções de alta qualidade que passam longe do esquema tradicional de divulgação. Isso, independentes. Nos dias 25 e 26 de março e 8 e 9 de abril, oito artistas (Mahmundi, Rico Dalasam, Tássia Reis, Flora Matos, 13.7, Júlia Vargas, Ana Vilela e Rubel) que você encontra nessas plataformas digitais surgem em carne, osso e melodias. Novas caras? Sim. Vale, e muito, conferir. Dia 25, a rodada dupla inicial. Primeiro, Mahmundi é o nome dela. A cantora carioca aparece com um pop suave, enxuto, com batidas eletrônicas e uns teclados vintage. Hit, Eterno verão e Leve são ótimas canções. Depois, é a vez do rapper Rico Dalasam. Figuraça, gay (um engraçadinho disse por aí que ele seria o rapper favorito do pastor Marco Feliciano) e com um pé no

mundo, Dalasam tem um apelo que ultrapassa nossas fronteiras, e se a sexualidade fala mais alto é porque as coisas são assim. Dia 26, Tássia Reis abre a noite e deve mandar No seu radinho. É a hora e a vez do rap suave, aliás, um rap jazz, como diz uma canção da menina. Na sequência, outra garota, Flora Matos, brasiliense, filha do nosso Renato Matos, veste a pele de MC e manda o canto rap, desta vez mais ousado e mais sensual. Se, de repente, alguém resolver mandar uma coreografia, quadradinho de 8, essas coisas, para acompanhar a cantora no hit Pretin, não entre em pânico. No Youtube tem vários tutoriais que ensinam como fazer. Dia 8 de abril, o festival prossegue com os cariocas da banda 13.7, da qual faz parte outro rebento que tem muito a ver com Brasília. 13.7 é um dos projetos de Francisco Ribeiro Eller, o Chico-Chico, filho de Cassia Eller. Ao lado de João Mantuano (voz e violão), Miguel Dias (baixo), Pedro Fonseca (teclados) e Lucas Videla (percussão), os garotos passeiam pela MPB, folk, blues, samba e rock, tudo acústico, mas com muita energia. Reparem na voz desse menino. Em seguida, a voz firme de Júlia Vargas domina o palco. Quando mandar Canoa, canoa (Nelson Ângelo/Fernando Brant), dá para entender porque Milton Nascimento se rendeu ao talento dessa moça de Cabo Frio. Dia 9 de abril, o festival termina com mais uma rodada dupla. Ana Vilela, au-

tora do hit Trem-bala, abre a noite e deve arrastar um milhão de fãs, ainda mais depois que essa canção muito pra cima foi interpretada por Gisele Bundchen e o vídeo viralizou horrores por aí. E por último, mas não menos importante, o carioca Rubel nos dá a certeza de que a música popular brasileira tem capacidade infinita de se renovar, bastando para isso que reúnam a musicalidade, ferramentas e uma conexão que preste neste país. Festival Sai da Rede

De 25/3 a 9/4 no Teatro I do CCBB (SCES, Trecho 2). Dia 25/3, às 20h, Mahmundi e Rico Dalasam; 26/3, às 19h, Tássia Reis e Flora Mattos; 8/4, às 20h, 13.7 e Júlia Vargas; 9/4, às 19h, Ana Vilela e Rubel. Classificação indicativa: livre. Ingressos: R$ 20 e R$ 10 (à venda na bilheteria do CCBB e em web.upingressos.com.br). Mais informações: 3108.7038. Marina Sampai

POR HEITOR MENEZES

Flora Matos

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Divulgação

GRAVES&AGUDOS

Roger Hodgson

ZAZ

Começa a temporada

de grandes shows

POR HEITOR MENEZES

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ue a música, melhor dizendo, que o mercado musical seja um bom parâmetro de nossa combalida economia. Isto porque o período está recheado de atrações na cidade, shows musicais na medida, para alegrar o ouvinte/amante da boa música e movimentar a roda do dinheiro. Quando os shows aparecem, ganham o público, os artistas, os técnicos, o pessoal de apoio e quem mais estiver na roda viva desse mercado. Feita as considerações, vejamos o cardápio. O menu tem iguarias nacionais e internacionais de destaque. Desta vez a segregação é por um bom motivo.

INTERNACIONAIS

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Roger Hodgson – NET Live Brasília, dia 23, às 21h30. Anotem aí: essa é a quarta vez que Roger Hodgson, o lendário cantor e compositor do Supertramp, vem a Brasília. E que continue vindo muitas vezes, porque o alto nível de suas apresentações é um deleite para corações e mentes apaixonados pelo pop/rock/prog altamente refinado do grupo britânico. O Super-

tramp, sabemos, meio que se dividiu depois que Roger Hodgson saiu do grupo, em 1983 (faz 34 anos!). O grupo oficialmente não acabou, mas diferenças de egos entre Hodgson e Rick Davies, o outro líder, impedem a reunião. Ademais, Hodgson assina as peças mais famosas do Supertramp, daí que resolveu seguir em frente cantando sucessos da banda e da carreira solo. O Supertramp bem que tentou levar adiante sem executar as canções de Hodgson, mas o público não gostou, uma vez que um show sem as clássicas Take the long eay home, The logical dong, Give a little nit, It’s raining again, Fool’s overture e Dreamer não é exatamente um show do Supertramp. Pois o carismático e excepcional músico Roger Hodgson sabe o que o público quer. Sua turnê se chama Breakfast in America world tour, que alude ao clássico álbum Breakfast in America, lançado em 1979. Basta dizer que esse disco ganhou o Grammy de 1980, derrubando obras de Talking Heads e Led Zeppelin. Resumindo: vale cada centavo do ingresso. ZAZ – Net Live Brasília, dia 31, às 21h30. Em sua terceira passagem pelo Brasil, a cantora francesa ZAZ (nascida

Isabelle Geffroy) traz finalmente a Brasília a turnê Mise en scéne, que leva a assinatura do fotógrafo e designer Laurent Seroussi. Pode crer que é a alegria em pessoa vinda de França. Eis uma grande oportunidade de abrir olhos e ouvidos para uma artista internacional que não tem o inglês como língua dominante. Ao contrário, o idioma aqui é o francês, com toda sua linguística peculiar, inflexão e acentuação tônica que caem muito bem em se tratando de canção popular. Neste giro não deve faltar Je veux, irresistível chanson, talvez sua mais conhecida, com versos de puro hedonismo, bela tradução do que todo mundo quer da vida: “Je veux d’l’amour, d’la joie, de la bonne humeur” (“Quero amor, alegria e bom humor”). Para os pouco familiarizados com a chanson française, ZAZ nos entrega ótimas versões de peças conhecidas de Edith Piaf, como La vie en rose e Sous le ciel de Paris. O clima Django Reinhardt deve baixar com o hino Paris sera toujours Paris. E o grande Joe Dassin (E si tu n’existais pas, lembram?) é invocado com a versão não menos irresistível de Les ChampsElysée. Clichês franceses? Com tanta baixaria, é o que Brasília mais precisa.


Fotos: Paulo Henrique Cruz

Joyce

João Bosco

NACIONAIS

dá uma de louca e baixa na cidade como atração da balada Mimosa. Uma figura, Alice tem a ligação instantânea com o legado da família Caymmi. Neta de Dorival, filha de Danilo e sobrinha de Nana, ela lembra o patriarca por caminhos, digamos, diferentes. Nada da coisa tradicional, o que é que a baiana tem. Ao contrário, Alice e seu vozeirão puro Caymmi têm um trabalho fincado no pop grudento, sem ser exatamente descartável, vulgar ou banal. O disco Rainha dos raios (2014) foi um bom cartão de visita. Agora, a valer pelo recém-lançado single Louca, a cantora pede assento definitivo na série A da música popular brasileira.

moradas. Não há como cansar dessas celebrações. Também é o seguinte: qualquer coisa de Tom Jobim tem o estranho poder de nos paralisar encantados. Desta vez, a fina flor da MPB (Toquinho, Joyce Moreno e João Bosco) presta homenagem revisitando o belo songbook do Tom. Os três têm autoridade para tocar e cantar Jobim, pois são praticamente alunos da grande escola fundada pelo maestro. Aqui é quando a MPB vai ao paraíso.

Capital Inicial – Bamboa Brasil, dia 24, às 22h. O rock’n’roll não é moleza e não estamos falando de rock pesado, mas de batalha, longas jornadas, altos e baixos, a vida como ela é. Quem sabe bem desses caminhos é o Capital Inicial, talvez a mais bem-sucedida banda surgida em Brasília. Junto com a Plebe Rude, uma das mais longevas, bota aí na conta uns 35 anos de estrada. Pois é esse Capital, de Dinho Ouro Preto e companhia, colhendo ainda os frutos do projeto Acústico NYC, que retorna a Brasília, em festa-show na Bamboa, reduto do pagode e do sertanejo chique. Qualquer semelhança entre o vitorioso Acústico MTV (2000) e o atual não é mera coincidência. Quem for deve testemunhar o fim de um ciclo, pois, ao que tudo indica, o Capital Inicial, ao finalizar essa turnê, deve tomar novos rumos. Como eles dizem em Olhos vermelhos: por que chorar se amanhã tudo muda de novo?

Daryan Dornelles

Alice Caymmi – Festa Mimosa, na Associação dos Servidores da Câmara dos Deputados, dia 24, às 23h. Depois de encarnar a rainha dos raios, Alice Caymmi,

O Terno + Boogarins – Teatro da Caixa, dias 25, às 18 e 21h, e 26, às 19h. O rock brasileiro vai bem, obrigado. Depois de arrancar aplausos quando dividiram o palco do auditório do Ibirapuera, a paulistana O Terno e os goianos Boogarins repetem a dose em duas apresentações imperdíveis no Teatro da Caixa. Se assim pudermos dizer, é o encontro do rock sessentista (O Terno) com a psicodelia (Boogarins), ao vivo e nas cores do caleidoscópio, com uns carinhas que realmente entendem do lance. O plus a mais, como dizem, deve ser as duas bandas juntas no palco mandando ver a bela versão de Saídas e bandeiras n° 1 (Milton Nascimento/ Lô Borges). É o Clube da Esquina psicodélico como você nunca viu e ouviu. Toquinho, João Bosco & Joyce – Tom 90 Anos – Auditório Master do Centro de Convenções Ulysses Guimarães, dia 25, às 21h. Em 25 de janeiro de 2017, Antonio Carlos Jobim (1927-1994) teria feito 90 anos. Nada mais justo que todas as datas referentes ao grande maestro da Bossa Nova sejam devidamente come-

Alexandre Eça

Toquinho

Elza Soares – Teatro da Caixa, 1º de abril, às 17h30, e 2 de abril, às 19h. Imperdível mesmo é ver Elza Soares queimando as pestanas, quer dizer, mandando ver um som todo poderoso, pouco se importando se já fez de tudo um pouco na vida. A arte é longa, mas a vida é breve, sabe como é? Fato mesmo é que Elza Soares, 79 anos, voltou a surpreender com o disco A mulher do fim do mundo, seu 34°, lançado em 2015. Composto por canções inéditas, o disco mostra Elza renovando o repertório na companhia de músicos tarimbados da vanguarda paulistana. Sob a direção artística de Rômulo Fróes, a banda formada pelo baterista Guilherme Kastrup, Kiko Dinucci (guitarra), Marcelo Cabral (baixo), Ro-

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SEMANADAFRANCOFONIA drigo Campos (guitarra) e Felipe Roseno (percussão) fornece a base sobre a qual Elza esparrama seis décadas de samba, sambalanço, MPB, rock, funk e o escambau. Tudo com muita ousadia e aquela língua afiada. Que energia! Djavan – NET Live Brasília, 8 de abril, às 22h. Djavan, o cara que eternizou Brasília numa letra de música (“Céu de Brasília/Traço do arquiteto/Gosto tanto dela assim/Linha do Equador”), volta à cidade inspiradora com a turnê Vidas pra contar, que é como se chama seu álbum de inéditas lançado em 2015. Clássico e classudo, Djavan mantém-se no topo do domínio artístico, como demonstra a atual turnê. Aqui, o autor de maravilhas do cancioneiro tupiniquim deixa um pouco de lado trabalhos mais herméticos, como Matizes (2007), e volta ao som mais leve, amálgama de pop, jazz e MPB que o consagrou, perfeito para se ouvir prestando atenção ou como trilha sonora de momentos agradáveis, sejam lá eles quais forem. Que a acústica do NET Live não estrague o som cristalino de Djavan. Divulgação

Vive la France!

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Rosa de Saron – Teatro UNIP, 11 de abril, às 18h30. Não se assustem com a Wikipedia, que afirma que a banda Rosa de Saron, formada em Campinas, é uma das precursoras do “white metal católico no Brasil”. Tudo bem, você pode até enquadrá-la como gospel, rock cristão, o que for, mas não há como negar que a banda faz um som único com canções capazes de agradar a convictos, ateus e agnósticos. Quanto aos rosarianos, como são conhecidos os fãs da banda, pode esperar uma legião deles acompanhando o cantor Guilherme de Sá em todas as letras do grupo. Como explicar esse fenômeno? Vá e veja.

POR LÚCIA LEÃO

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arece estranha a afirmação quando se pensa na organização geopolítica mundial de hoje, no poder de Hollywood e na força da indústria fonográfica americana, mas a língua de maior influência sobre todas as culturas do mundo é o francês. A conclusão é de uma profunda pesquisa do diplomata Sergio Corrêa da Costa, membro da Academia Brasileira de Letras (morto em 2015), sobre palavras e expressões que, utilizadas em todas as partes do mundo, dispensam tradução. Corrêa se debruçou sobre textos literários, jornais e revistas de 15 países e oito idiomas para selecionar 16 mil vocábulos de uso comum e significados idênticos. A maior parte são franceses, seguidos de perto pelos ingleses e com o latim em terceiro lugar. A pesquisa virou livro, publicado em 1999, que virou exposição multimídia, utilizando palavras, som, imagem e tecnologia digital. Palavras sem fronteiras – Mídias convergentes chega este mês a Brasília – dez anos depois de ser apresentada na Academia Brasileira de Letras, no Rio de Janeiro, e no Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo – como um dos principais eventos da Semana da Francofonia.

Inaugurada nesta segunda-feira, 13, no foyer do Palácio do Itamaraty, poderá ser vista até 14 abril, em visitas agendadas. E a 20ª edição da Semana da Francofonia (na verdade serão 18 dias), que ocupará vários lugares da cidade com uma intensa programação, vai mostrar que o idioma francês sedimentou ao redor do mundo uma cultura tão influente quanto diversa. Língua oficial de 33 países e falada por 542 milhões de pessoas em todos os continentes, ela é a base de uma riquíssima produção artística e cultural de incontáveis matizes, que poderá ser um pouco mais conhecida e degustada pelos brasilienses. Se começa pela erudita exposição no Itamaraty, caberá à revelação pop francesa ZAZ encerrar, no dia 31, a celebração da francofonia. Dona de uma voz encantadora e um swing único que viaja entre Edith Piaf, jazz e música cigana, a cantora se apresentará pela primeira vez em Brasília, no NET Live, com o espetáculo inédito Mise en scéne (aliás, uma das expressões sem fronteiras catalogadas por Corrêa da Costa), concebido pelo fotógrafo e designer Laurent Seroussi. Sexta-feira, 17, será a vez do hip hop em francês com o canadense Webster, que se apresentará entre acrobatas circen-


Divulgação

Exposição fotográfica Rencontré sur le chemin, de Alexis Radoux, entra em cartaz dia 16 na Aliança Francesa

ses numa festa promovida pela Embaixada do Canadá dentro do espírito da tradicional Festa de Montreal. No dia 23 sobe ao palco do CCBB o francês Marvin Jouno, autor de um trabalho que mescla cinema e música. Ele vai apresentar Intérieur nuit, onde divide o palco com um filme de média metragem que trata como sua banda, uma “bande de imagem”. A programação do artista também prevê um debate com a plateia e o grand finalle (mais uma expressão sem fronteira) com um concerto em piano e voz. Por falar em cinema, a sétima arte de países francofônicos participa da programação com 13 filmes da Bélgica, Canadá, França, Gabão, Marrocos, Suíça, Senegal, Tunísia, Eslovênia e Ucrânia, que serão apresentados entre os dia 15 e 20 no CCBB. E quem há de negar que a sonoridade francesa é tão apropriada à poesia! Para quem duvida, ela estará espalhada pelas ruas de Brasília! Nas estações do Metrô, no CCBB, nos acessos da Aliança Francesa... vários locais da cidade serão vestidos de poemas francófonos de muitas nacionalidades com traduções para o português. E também estão programados

um recital de poemas marroquinos acompanhados de alaúde (Cláudia Falluh e Bernardo Bittencourt, com direito a degustação de chás e doces oferecidos pelo Reino de Marrocos) e o lançamento do livro Bonjour Brasília, de Nicolas Beher, uma edição bilíngue em que o poeta brasiliense trata do nascimento de Brasília, sua arquitetura, seus traços geométricos e seus habitantes, que vieram de diversas regiões do país para tornar concreta a ideia utópica de uma capital no Planalto Central. O lançamento será dia 16, na Aliança Francesa, junto com a vernissage da exposição fotográfica Rencontré sur le chemin, de Alexis Radoux. Mas a atividade mais popular e esperada da Semana é mesmo o tradicional Bazar da Francofonia, onde os países francófanos contam um pouco de sua história através do artesanato e da gastronomia. Vai acontecer no estacionamento da Aliança Francesa durante todo o dia 19, um domingo, com a venda de uma enorme variedade de produtos e pratos típicos.

Claudia Falluh Divulgação

20a Semana da Francofonia

Balduino Ferreira

O rapper Webster: festa na Embaixada do Canadá

Divulgação

Até 31/3, em vários locais da cidade, com a participação de 27 países de língua francesa.

A guarda é um dos filmes que serão exibidos no CCBB

Nicolas Behr

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Lúcia Leão

BRASILIENSEDECORAÇÃO

O onipresente

Andrade Júnior

Ele começou a carreira de ator meio por acaso, mas já ultrapassou a marca de 100 filmes, além de peças teatrais e especiais para a TV. POR VICENTE SÁ

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noite de terça-feira, 30 de novembro de 2010. O ator Andrade Júnior passa em frente ao Palácio do Planalto, a caminho do Cine Brasília, onde receberá o prêmio da Associação Brasiliense de Cinema e Vídeo pelo conjunto de sua obra. São mais de 100 filmes, alguns dirigidos por nomes consagrados como Nelson Pereira dos Santos, André Luís Oliveira, Geraldo Moraes e José Eduardo Belmonte. Da janela do carro, o ator olhou mais uma vez as luzes da Esplanada e pensou que, se um dia resolvessem filmar sua vida, bem que podiam começar em 1959, quando ele, ainda menor de idade, trabalhava no almoxarifado do Palácio do Planalto. Pelo retrovisor, a cidade, aos poucos, vai perdendo o brilho das luzes e voltando a ter a cor da poeira e do barro vermelho que reinavam um ano antes da inauguração. Argemiro Gomes de Andrade Júnior, aos 14 anos, era um dos milhares de candangos que vieram atraídos pelo chamado de Juscelino Kubitschek para construir a nova capital do Brasil. Nós o

vemos. Tem os cabelos bem curtos, é alto para sua idade e nem sente o esforço de pedalar sua Monark a caminho do trabalho. “Eu morava na Vila Amauri, que hoje fica no fundo do Lago Paranoá, mas não levava nem dez minutos para chegar na Esplanada pedalando”, lembra. Um dia, o próprio Juscelino o interpelou ao sair do palácio, ainda em obras, e ele teve que explicar que, por ser menor, não trabalhava na construção, e sim no almoxarifado. O presidente sorriu e lhe afagou a cabeça grande de cearense. A cena e a cidade mudam rapidamente. Agora estamos em Sobradinho, em 1963. Falta uma semana para começar a peça em que Andrade, aos 18 anos, é assistente de direção, mesmo sem saber muito o que seja isso. Um dos atores acaba de comunicar que está de mudança e não vai poder participar da encenação. O diretor coça a cabeça e pergunta se ele, que acompanhara todos os ensaios, não quer fazer o papel. Andrade aceita, sobe no palco e descobre que nasceu para aquilo. É o início de uma carreira em que ele viverá muitas vidas diferentes e de todas levará um aprendizado, uma lição. E co-

mo um dos pioneiros do teatro do DF, ajudará na consolidação das artes cênicas na capital da República. “Eu fiz dezenas de peças em todo o DF, a maioria em curtas temporadas, mas algumas em grandes temporadas, dois, três meses em cartaz, o que é muito mais gratificante. Fiz A volta do urubu Gabiru, uma peça contra a ditadura, no auge do governo Figueiredo. Foi um clima brabo”, conta. Por anos a fio ele se apresentou em todos os palcos de Brasília. Não escolhia estilo ou diretor. Fazia. Com a Cia. Artes Cênicas Terceiro Mundo levou a peça Woyzeck, a balada dramática, de Georg Buchner, ao Chile e à Argentina, sob a direção de Tullio Guimarães. “É sempre um prazer e também muito divertido trabalhar com o Andrade. Ele é ator experiente, também um cara super pra cima e muito amigo, coisas importantes em meio às dificuldades que enfrentamos para fazer teatro no Brasil”, depõe Tullio. O cinema entrou em sua vida meio sem querer. Foi fazendo uma ponta aqui, um personagem ali e acabou seduzido pela magia da sétima arte. Fez vários longas e muitos curtas – pra mais de cem,


garante. Ganhou prêmios, respeito e hoje é um xodó dos jovens diretores. Por não cobrar cachês muito altos e por seu estilo amigão, conquistou a turma nova do cinema de Brasília. Diz a lenda que ele aceita filmar até com celular. “Hoje eu gosto mais de fazer cinema do que teatro e tenho atuado em muitos filmes, graças a Deus. Ano passado fiz Rosinha, um curta dirigido por Gui Campos, e ganhamos prêmios em Brasília, em Gramado e em Santa Catarina”, comemora. No Florianópolis Audiovisual Mercosul (FAM), Rosinha, que trata de um triângulo amoroso na terceira idade, levou vários prêmios. Maria Alice Vergueiro, que faz o papel-título, levou o de melhor atriz e Andrade dividiu com João Antônio o prêmio de melhor ator. Ele também já fez alguns especiais para a televisão. Num deles, em 2009, viveu Nilton Santos, o lendário craque botafoguense. “Passei o dia todo batendo bola na praia, lá no Rio de Janeiro. Foi ótimo, e o personagem ficou lindo”. Dos atores de sua geração ele gosta de citar dois que considera excelentes: Gê Martu e Humberto Pedrancini. Dos novos, prefere não citar nomes, mas diz que são muitos e talentosos. De tropeços, lembra uma vez, em Anápolis, quando fazia I-Juca Pirama e enfiou a lança na lua do cenário, arrancando-a. Não percebeu e continuou em cena com a lua espetada em sua lança, provocando gargalhadas gerais na plateia. Hoje, aos 72 anos, tem um novo desafio pela frente: um longa no qual fará o personagem principal. O filme, de Camilo Cavalcanti, que terá o título de King Kong en Asunción e será filmado na Bolívia, no Paraguai e na Zona da Mata de Pernambuco, conta a história de um matador de aluguel velho, que está em crise existencial e, num momento de reflexão, decide abandonar a vida de bandoleiro em busca do paradeiro de sua única filha, que ele não conheceu e que hoje é uma mulher de 40 anos. Enquanto as filmagens do longa não começam, Andrade diz que está filmando pouco. “Só papéis que me caibam de cabelos e barba longos, pois o meu personagem corta os cabelos e a barba no meio do filme”, diz, meio contrariado. E se esta matéria fosse o filme da sua vida, a câmera se afastaria um pouco, enquanto ele manteria no rosto a expressão triste de um menino proibido de brincar.

Maíra Zannon

QUEESPETÁCULO

Sobre o amor POR PEDRO BRANDT

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amor é um tema que inspira criativamente a diretora, coreógrafa e atriz Elisa Teixeira de Souza, da Companhia Tempos DançaTeatro. Nos próximos dias 17, 18 e 19 ela leva para o palco do Teatro Garagem a montagem Eros, a primeira de três encenações que integrarão a Trilogia do amor, cada uma sobre diferentes possibilidades de expressão desse sentimento. O amor erótico está no cerne de Eros. Em uma dramaturgia de dança-teatro fragmentada e sem diálogos, os dançarinos Clara Sales, Cristhian Cantarino e Rafael Alves, além da própria Elisa, encenam situações de intimidade, como encantamento, entrega, angústia, proteção e contemplação. “Há momentos puramente gestuais e outros nos quais a dança se intercala com posturas e ações físicas, em uma espécie de teatro físico”, explica a diretora. O elenco, reunido a partir da seleção de intérpretes para o espetáculo, acabou dando início à Companhia Tempos Dança-Teatro. A trilha sonora original, composta pelo músico Luís Oliviéri, e a iluminação a cargo de Camilo Soudant trabalham no sentido de intensificar uma atmosfera de intimidade e vivacidade. O figurino de Eduardo Barón, por sua vez, procura sair do lugar-comum

quando se pensa em erotismo. Realizado com patrocínio do FAC, o Fundo de Apoio à Cultura do Governo de Brasília, Eros é inspirado em uma apresentação realizada por Elisa há mais de uma década, quando concluía sua graduação em Dança pela Universidade Federal da Bahia. Lá, ela encenou um solo inspirado no livro Fragmentos de um discurso amoroso, de Roland Barthes. “Essa experiência me incentivou a continuar investigando o tema do amor erótico na poesia cênica”. A partir daí, nasceu a vontade de criar trabalhos artísticos voltados para outros tipos de amor. Além do livro de Barthes, a montagem também bebe de outras referências filosóficas, como O banquete, de Platão, leitura essencial sobre o assunto, e o livro Amor, de Maria de Lourdes Borges, que aborda o amor na visão de diversos pensadores. Farão parte da Trilogia do amor montagens sobre o amor fraternal e o amor universal. “Acho importante discutir esse tema. A encenação é um lugar de sinestesia, tem som, corpos, movimentos, mistura de estímulos sensoriais que geram sensações. Um lugar muito propicio para discutir”, comenta Elisa. Eros

Dias 17 e 18/3, às 21h, e 19/3, às 20h, no Teatro Garagem SESC da 913 Sul. Ingressos: R$ 15 e R$ 7,50. Classificação indicativa: 14 anos. Mais informações: 98182-0527.

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LUZCÂMERAAÇÃO

A realidade da ficção Um dos grandes lançamentos nacionais do ano, novo filme de Eliane Caffé, premiado em vários festivais no Brasil e no exterior, entra em cartaz dia 16. POR SÉRGIO MORICONI

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lertando com o postulado shakespeariano, Era o Hotel Cambridge deixa filosoficamente no ar a interrogação: “ficção ou não-ficção, eis a questão”. A analogia gaiata tem tudo a ver com esse último longa-metragem de Eliane Caffé, obra que se debruça sobre a vida de refugiados recém-chegados ao Brasil. No filme, esses imigrantes se unem a um grupo de sem-teto e ocupam o prédio – daí o título – de um antigo hotel desocupado em São Paulo. O enredo é conhecido. Vários documentários brasileiros nos últimos anos abordaram a questão das ocupações de prédios públicos (ou não) pelos sem-teto e outros grupos urbanos marginalizados. O longa Leva, por exemplo, produzido em 2011, dirigi-

do por Juliana Vicente e Luiza Marques, revelava como viviam as pessoas que moravam em ocupações no centro da capital paulista. Era o Hotel Cambridge torna mais complexa a equação ao inserir, junto aos destituídos brasileiros, comunidades estrangeiras organizadas no sentido de evitar as constantes ameaças de despejo. A mescla entre o estilo documental e ficcional aqui é muito interessante. Poucas vezes se conseguiu equilíbrio tão perfeito, a ponto de nos perguntarmos a todo momento quem são os personagens reais e quem são os atores do drama construído pela diretora. O filme coloca de maneira muito convincente e crível o calvário de refugiados precariamente “acolhidos” pelo governo, já que eles não reúnem condições (e nem lhes são dadas as devidas con-

dições) para permanecerem no país. As dificuldades com a língua e a ausência de instrumentos necessários que permitam e esses indivíduos se estabelecerem como cidadãos regulares são os fatores preponderantes da inadaptação dos grupos abor-

Eliane Caffé


Fotos: Divulgação

dados no filme. Mas, afinal, ficção ou documentário? A dúvida tautológica é dirimida pela presença do ator José Dumont e da atriz Suely Franco. No entanto, a mecânica da filmagem, flanando pelos cenários, registrando o cotidiano dos moradores do (ex) Hotel Cambridge, cria uma fascinante zona cinzenta, ambígua, incerta. Eliane Caffé disse em entrevistas que seu filme chegou a ser recusado em alguns festivais estrangeiros porque não sabiam em que categoria colocá-lo. O fato não deixa de ser surpreendente, dada a enorme quantidade de produções híbridas, docudramas, ficções documentais etc, etc. «É ficção”, afirmou, categórica, “pois todos no filme estão representando, até mesmo quando estão representando a si mesmos”. E ela tem toda razão. A diferença é sutil, mas a ambiguidade tem parâmetros identificáveis, quase instrutivos. Temáticas como a de Era o Hotel Cambridge podem muito bem ser realizadas como documentários ou ficções. Caffé confessou que seu objetivo inicial era abordar o tema dos refugiados em São Paulo, “mas o leque se abriu na pesquisa de campo” e ela descobriu os movimentos de luta por moradia. O filme está ambientado às vésperas de uma reintegração de posse, envolvendo grupos de palestinos, congoleses, nordestinos, colombianos. A ação é protagonizada pela líder Carmen Silva, que interpreta a si mesma. Foi ideia da própria Carmen filmar no abandonado e ocupado Hotel Cambridge. A diretora então se dedicou a conhecer o local e seus moradores. Muitos deles participaram de oficinas, construindo personagens que continham elementos de suas vidas, das vidas de pessoas que conheciam ou de vidas das quais ouviram falar. José Dumont e Suely Franco só se integraram à equipe depois. No filme, um dos palestinos e um dos congoleses se deixam filmar enquanto conversam, pela internet, com parentes nos países de origem. De Gaza, uma mulher conta as agruras com mísseis israelenses. Do Congo, relatos sobre exploração e guerra civil. Era o Hotel Cambridge, segundo a diretora, “é fruto da fusão que embaralha o ficcional e o documentário”, assim como Narradores de Javé, de 2003, sobre moradores que resolvem preservar a história de seu vilarejo ameaçado pela construção de uma usina no local. “Os dois filmes têm estruturas

épicas, onde as ações não estão centradas num protagonista. Há uma polifonia que se abre para a criação coletiva”. Existe nos dois, também, uma intenção política, um discurso a favor da tolerância com o diferente, aliás, muito oportuno nesses tempos bicudos em que o outro se torna um inimigo que deve ser aniquilado. Era o Hotel Cambridge e Narradores de Javé são diametralmente opostos a Kenoma (1998), longa de estreia de Caffé, obra que não se encaixa em nenhum dos modelos históricos do cinema brasileiro. O filme constrói uma atmosfera estranha, à primeira vista inteiramente alheia à realidade do país. A impressão é de que, sob determinado ponto de vista, Kenoma faz uma temática extemporânea, “universal”, ser transportada para o Brasil a partir de um disco-voador. Mas, convenhamos, um pensamento dessa natureza só seria válido se considerássemos o país fora da História (assim com h maiúsculo). Em outras palavras, o filme de Eliane Caffé inverte a equação de que é falando do particular que se chega no universal. Ao centrar seu interesse na personagem de Lineu (José Dumont), um artesão obcecado pela ideia de construir a máquina do movimento perpétuo, a diretora volta sua atenção principalmente para aspectos anímicos e metafísicos. Por que isso? Ora, o fato de ambientar a ação na cidade fictícia de Kenoma dilui muito especificidades históricas e regionais.

Caffé fala da essência do humano. Portanto, o Brasil que aparece em Kenoma tem pouco a ver com o Brasil que costumamos ver no cinema, particularmente aquele que vemos em Era o Hotel Cambridge, e mesmo com a imagem que achamos que devemos fazer do país. Ele é, digamos assim, no mínimo, fruto de uma fantasia esotérica. A própria diretora disse ter saído pelo interior de Minas Gerais, na região do Vale do Jequitinhonha, em busca do que poderia ser o cenário imaginário da história que tinha na cabeça. Kenoma pode realmente ser, como é, uma variante fantasiosa de qualquer desses vilarejos perdidos nos cafundós do sertão. Os tipos físicos, seus gestos e pronúncia, nos são (quase) familiares. Porém, estamos longe do campo do realismo. Os personagens (inverossímeis) se prestam muito mais à expressão de um conceito do que a qualquer outra coisa. As máquinas (em Kenoma) nos livrariam do fardo, ou da escravidão do trabalho. A ciência seria um dos instrumentos que os homens utilizariam para se aproximar de Deus. Em Hotel Cambridge, seriam os homens em sua relação com os outros homens que buscariam uma aproximação com o divino. Era o Hotel Cambridge

Brasil/França/Espanha/2017, drama, 99min. Direção: Eliane Caffé. Roteiro: Eliane Caffé, Luís Alberto de Abreu e Inês Figueró. Com José Dumont, Suely Franco, Carmen Silva, Isam Ahmad Issa, Paulo Américo, Thaíssa Carvalho. Em cartaz a partir do dia 16.

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CRÔNICADACONCEIÇÃO

Crônica da

Conceição

Quem será este homem?

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arece mentira o que vou contar. Se eu mesma lesse algo assim, diria que é invenção de cronista. Pois posso jurar por todos os santos e em todas as crenças que foi verdade. Há perto de dois anos, um andarilho surgiu na minha rota. Das primeiras vezes em que o vi, ele margeava a Epia Sul. Era sagrado: por volta do meio-dia e meia, um homem de andar vagaroso e expressão ausente atravessava o cruzamento da Epia com a EPTG. Sempre com o mesmo blazer – entre preto e marrom, sobrando na largura e na altura. Carregava um ou dois sacos entre preto, marrom e cinza, as cores dos que peregrinam pelas vias urbanas. Negro, corpulento, mais baixo do que eu, barba espessa, porém curta. O ombro pende para o lado direito, talvez movido pelo peso de tudo o que carrega, das coisas tangíveis e intangíveis do seu viver. Nos últimos tempos, mudei drasticamente de percurso, e ele continuou a deambular ao alcance dos meus olhos, em CEPs distintos, distantes quinze quilômetros um do outro.

Algo me chamava àquele nômade urbano. O blazer compondo elegância, o rosto levemente inclinado para o chão, a mistura de tristeza e altivez, ao mesmo tempo rude e melancólico. Uma caverna escura vagando pela cidade aberta. Já me sentia próxima desse homem, sem que ele nunca me tenha visto. Pois há uns três meses, numa tarde solitária na banquinha, quem entra? Ele, o andarilho da melancolia. Entre surpresa e temerosa, experimentei a epifania do encontro com o mistério. O personagem da crônica que nunca escrevi estava a menos de meio metro de mim. Muito sério, com o mesmo blazer, saco nas costas, ombro inclinado e olhar altivo, de quem trata o outro de igual para igual. (Vale comentar que os moradores de rua, nos contatos que já tive com eles, não nos tratam, a nós, os não-moradores de rua, como iguais. Ou se fazem de vítima ou se defendem com a armadura da arrogância ou estão chapados). O meu andarilho me tratou como

uma igual: “A senhora tem Hilton?” “Não, senhor, infelizmente. Não serve outro?” “Não, obrigado”. E saiu em direção à 108 Sul. Planejei escrever uma crônica. Não escrevi. Alguns dias antes do Carnaval, deu-se o mais inacreditável: meu personagem andarilhava a menos de 500 metros da minha casa. Eu quis parar, quis fazer o retorno, quis segui-lo, mas acabei indo embora, rumo ao Plano Piloto. Pelo retrovisor, ainda o vi entrando num beco que dá acesso à minha quadra. Nada mais sei nem me cabe saber. Só sei que o andarilho da minha escolha me visitou na banquinha e me visitou na minha quadra. Ele não sabe que há mais de dois anos o observo. Aquele homem compõe a regularidade da vida, se é que existe alguma. Há forças que movimentam a vida muito além do que posso alcançar. Me vi acompanhada pelo mistério. Me fez bem. Como se alguém me dissesse: há uma ordem suprema no viver, confie nisso.



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