Análise da infografia jornalística

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Ricardo Oliveira da Cunha Lima

Análise da Infografia Jornalística

Dissertação de mestrado Orientador Prof. Doutor André Soares Monat Co-orientadora Profa. Doutora Carla Galvão Spinillo

Rio de Janeiro, 2009


Ricardo Oliveira da Cunha Lima

Análise da Infografia Jornalística

Dissertação apresentada à ESDI / UERJ como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Design.

Rio de Janeiro, 2009


CATALOGAÇÃO NA FONTE UERJ / REDE SIRIUS / BIBLIOTECA CTC/G

L732

Lima, Ricardo Oliveira da Cunha. Análise da infografia jornalística / Ricardo Oliveira da Cunha Lima. – 2009. 143 f. Orientador: André Soares Monat. Co-orientador: Carla Galvão Spinillo.

Dissertação (Mestrado) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Escola Superior de Desenho Industrial. Bibliografia. 1. Artes gráficas - Teses. 2. Comunicação visual - Teses. 3. Projeto gráfico (Tipografia) – Teses. 4. Jornalismo - Teses. I. Monat, André Soares. II. Spinillo, Carla Galvão. III. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Escola Superior de Desenho Industrial. IV. Título.

CDU 655.262


Ricardo Oliveira da Cunha Lima

Análise da Infografia Jornalística

Dissertação apresentada à ESDI / UERJ como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Design.

Orientador Prof. Doutor André Soares Monat Co-orientadora Profa. Doutora Carla Galvão Spinillo

Aprovada em 27 de agosto de 2009

Banca Examinadora

______________________________________________ Prof. Doutor André Soares Monat (orientador) ESDI – Universidade Estadual do Rio de Janeiro

______________________________________________ Prof. Doutor Washington Dias Lessa ESDI – Universidade Estadual do Rio de Janeiro

______________________________________________ Profa. Doutora Maria Cecilia Loschiavo dos Santos USP– Universidade de São Paulo

______________________________________________ Profa. Doutora Carla Galvão Spinillo UFPR – Universidade Federal do Paraná


Dedicat贸ria

Aos meu pais.


Agradecimentos

À André Monat, meu orientador e amigo, pelo seu apoio constante, sua paciência e estímulo à liberdade de reflexão. À Carla Spinillo, minha co-orientadora e amiga, por todo o apoio e por me revelar o potencial do design de informação. À Luciana Murad, que cuidou de mim com tanto carinho, me apoiando todos os dias e revisando cuidadosamente todo o texto da dissertação. À Ary Moraes, mestre e amigo, quem me abriu o mundo da infografia e do design jornalístico, por sempre acreditar em mim. À Leonardo Cunha Lima, meu irmão, e sua esposa Daniele, pelo seu carinho do outro lado do mundo. À professora Maria Cecília Losquiavo pela gentileza de vir de São Paulo só para comparecer à banca. À super Fátima Moreno que está sempre zelando pelo mestrado. Aos professores da ESDI: Washington Dias Lessa (pelo apoio e por dividir o seu conhecimento e entusiasmo pela linguagem Gráfica); Lucy Niemeyer, Silvia Steinberg, Pedro Luís de Souza, João Leite e Rodolfo Capeto, diretor da ESDI, pelo a amizade e interesse pelo trabalho. Aos antigos colegas do Corrreio Braziliense, Ricardo Noblat, Francisco Amaral e Fabio Sales pela oportunidade de me envolver no design jornalístico. Ao professor e amigo Amador Perez quem admiro por estar sempre estimulando a criatividade gráfica de seus alunos. Aos amigos: Romero Cavalcanti, Axel Sande, Almir Mirabeau, Adriano Renzi, Wallace Vianna, Felipe Chagas, Sandro Fetter, Elisa e Cassiano Vianna, Adriano Motta, Rubens Paiva e Marcello Rosauro. E aos professores, alunos, funcionários e colegas da ESDI que de alguma maneira ajudaram para que esse trabalho se concretizasse.


Resumo LIMA, Ricardo Oliveira da Cunha. Análise da infografia jornalística. 2009. 143 f. Dissertação (Mestrado em Design) – Escola Superior de Desenho Industrial, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2009. Com a dinâmica da atualidade, cada vez mais o texto jornalístico tradicional se mostra insuficiente para atender à crescente necessidade de síntese de informação. Tal fato tem ocasionado o aprimoramento e a difusão dos infográficos jornalísticos, peças de design de informação que vêm cada vez mais se tornando ferramentas editoriais importantes. No presente trabalho, buscamos uma definição para o termo infografia jornalística e propomos alguns pontos a serem considerados em sua análise. A pesquisa foi voltada aos infográficos jornalísticos em revistas contemporâneas.

Palavras-chave Design gráfico. Design de informação. Infografia. Jornalismo.


Abstract Increasingly, the traditional use of texts for journalism has proven to be insufficient when faced with the growing need for synthesis of information. This fact has helped the development of information graphics for journalism, which is a form of information design that is becoming an important tool in editorial communication. In this dissertation, we offer a definition for the term information graphics for journalism, and propose some points to be considered in its analysis. In this study we analyzed information graphics in contemporary magazines.

Keywords Graphic design. Information design. Information graphics. Journalism.


Lista de Ilustrações 1-1 – Infográfico interativo da versão online do jornal Washington Post. <washingtonpost.com> ____________________________________________ 19 1-2 – Páginas 78-79 e 90-91 do livro Human Body I (Britannica Illustrated Science Library). Estas duas páginas duplas são exemplos de infografia em livros didáticos. (Encyclopædia Britannica) ______________________________ 20 2-1 – Exemplo de ilustração. (Revista Aventuras da História) ________________ 26 2-2 – Exemplo de ilustração mais integrada ao texto. (Revista Aventuras da História) ____________________________________________________ 26 2-3 – Infográfico onde percebemos uma integração entre vários elementos iconográficos e o texto. (Revista Mundo Estranho) ________________________ 27 2-4 – Infográfico onde podemos ver que a informação à direita pode ser lida independentemente do texto à esquerda. (Revista Mundo Estranho) _________ 28 2-5 - Diagrama sem palavras de Nigel Holmes que descreve diferentes formas de se beijar em quatro países (Wordless Diagramas, 2005:146-147) ______________________________________________________________ 29 2-6 – Exemplo de diagrama, usado por Emanuel Araújo (ARAÚJO, 1986:462) ______________________________________________________ 30 2-7 – Exemplo de gráfico, usado por Emanuel Araújo (ARAÚJO, 1986:460) ______________________________________________________________ 30 3-1 – Variáveis gráficas definidas por Jacques Bertin ________________________ 36 3-2 – A linguagem abordada de maneiras diferentes: abordagem dos lingüistas à esquerda, e a dos designers gráficos à direita. (TWYMAN, 1982:145) ______________________________________________________ 38 3-3 – Modelo criado para acomodar as abordagens de lingüistas e designers diante da questão da linguagem (TWYMAN, 1985:145) _____________ 38 3-4 – Gravura de James Gillray de 1791, transformando um mapa esquemático da Grã-Bretanha em imagens figurativas <bibliodyssey.blogspot.com> ________________________________________ 40


3-5 – Mapa esquemático de 1833 da Bretanha Saxônica. <commons.wikimedia.org> _________________________________________ 41 3-6 – O acidente com o avião da TAM em São Paulo em 2007 <blogspot.com> __________________________________________________ 42 3-7 – Tentação através da impaciência. Ilustração de um livro tabular holandês de 1465, Ars moriendi (TWYMAN, 1985:254) ______________________ 43 3-8 – Jockeys na chuva por Edgar Degas (1886). Essa imagem sinóptica que pode ser comparadas a imagem composta de elementos distintos da fig. 39 <commons.wikimedia.org> ________________________________________ 43 3-9 – Cavalo galopando fotografado por Edward Muybridge no final do séc. XIX. Uma série de imagens discretas que podem ser comparadas a fig. 3-8 <commons.wikimedia.org> _______________________________________ 44 3-10 – Infográfico da Revista Mundo Estranho (2008): Bernardo Borges (design); Lorena de Oliveira (texto); Japs (ilustração); Artur Louback (edição de texto) <infograthinking.blogspot.com> _________________________ 45 3-11 – Ilustração do manuscrito De Materia Medica de Dioscurides (cerca 625) <commons.wikimedia.org> ______________________________________ 46 3-12 – Xilogravura de Albrecht Meyer, De historia stirpium (1542) <sciweb.nybg.org> _______________________________________________ 46 3-13 – Ilustrações usadas por Hudson (1960) respondiam às representações de profundidade em perspectiva (HUDSON apud TWYMAN, 1985) ________________________________________________ 47 3-14 – Unidade sintática. (GOLDSMITH, 1984:127) ________________________ 49 3-15 – Unidade semântica. (GOLDSMITH, 1984:128) ______________________ 50 3-16 – Unidade pragmática. (GOLDSMITH, 1984:129) ______________________ 50 3-17 – Locação sintática. (GOLDSMITH, 1984:130) ________________________ 51 3-18 – Locação semântica. (GOLDSMITH, 1984:131) ______________________ 51 3-19 – Locação pragmática. (GOLDSMITH, 1984:132) ______________________ 52 3-20 – Ênfase sintática. (GOLDSMITH, 1982:133) _________________________ 53


3-21 – Cartum de Charles Addams sobre unicórnios, publicado originalmente na The New Yorker (1956) (charlesaddams.com) _______________ 55 3-22 – Ilustração de Michel Canetti (2000). Exemplo de desenho com um traço de consistência homogênea (michelcanetti.com) _____________________ 57 3-23 – Detalhe do mapa (topográfico) do metrô de Londres de 1908 <commons.wikimedia.org> __________________________________________ 59 3-24 – Detalhe da primeira edição do mapa (topológico) do metrô de Londres por Harry Beck, 1933 <commons.wikimedia.org> ___________________ 59 3-25 – “Árvores” esquemáticas (Richards, 2000:95) ________________________ 60 3-26 – Seleção de pictogramas ISOTYPE criados Gerd Arnz <gerdarntz.org/isotype/people> ______________________________________ 61 3-27 – Modelo taxonômico para diagramas (Richards, 2000:97) _______________ 61 3-28 – Objetos pictórico e não-pictóricos (Vollmer, 2004) __________________ 63 3-29 – Pictogramas exemplificando quatro variações de objetos gráficos compostos e elementares (Vollmer, 2004)_______________________________ 64 3-30 – “Gramática básica” das placas de trânsito (Engelhardt, 2002) ____________ 64 3-31 – Como camadas se comportam, segundo Engelhardt (Vollmer, 2004) _________________________________________________________ 65 3-32 – Mapa (Vollmer, 2004) ________________________________________ 65 3-33 – Adaptação dos atributos visuais de Bertin proposta por Engelhardt (Vollmer, 2004:1) _________________________________________________ 65 3-34 –Infográfico em que podemos ver exemplos dos elementos textuais. Jornal O DIA (MORAES,1998:141) ____________________________________ 69 3-35 – Exemplo de flechas e bonecos. Jornal O DIA (MORAES,1998:146)________ 70 3-36 – Exemplo de balões, perspectiva (prédio), bonecos e pictograma (bandeira do Brasil). Jornal O DIA (MORAES,1998:144) _____________________ 70 3-37 – Exemplo de gráfico de relações de proporção. Jornal O DIA (MORAES,1998:147) ______________________________________________ 71


4-1 – Disco de Faistos (cerca de 1.700 A.C.), exposto no Museu arqueológico de Heraklion em Creta <commons.wikimedia.org> ______________ 76 4-2 – Tapeçaria de Bayeux, representando a frota invasora do Duque Guilherme da Normandia <commons.wikimedia.org> ______________________ 77 4-3 – História em quadrinhos de Winsor McCay (1871-1934), Little Nemo in Slumberland <commons.wikimedia.org> ______________________________ 77 4-4 – Exemplos de tabelas que ilustram célula 12 pelo autor (TWYMAN, 1979:128) ______________________________________________________ 78 4-5 – Coluna de Trajano (ano 112) (commons.wikimedia.org) ________________ 79 4-6 – Infográfico da Revista Mundo Estranho (Infográfico: Ricardo Cunha Lima e Bianca Grassetti) ____________________________________________ 82 4-7 – Infográfico da Revista Mundo Estranho (Infográfico: Luiz Iria; design: Renata Steffen; Texto: Dante Grecco) __________________________________ 83 4-8 – Infográfico sobre como se faz uma infografia através do fluxo de atividades no ambiente de trabalho de um Jornal <infografia24horas.blogspot.com> _____________________________________ 84 4-9 – Exemplo de descrição em ilustração _______________________________ 87 4-10 – Exemplo de narração, em ilustração ______________________________ 87 4-11 – Infográfico que mostra como funciona o sistema de abastecimento de água e combate aos incêndios através, entre outros recursos, do auxílio do avião Canadair <infografia24horas.blogspot.com> _______________________ 89 4-12 – Carte Figurative (1869) de Charles Joseph Minard da Campanha de 1812 de Napoleão à Rússia <commons.wikimedia.org> _____________________ 90 4-13 – Página de um infográfico de seis páginas (e um detalhe da página seguinte, à direita) criado no estilo-histórico das histórias em quadrinhos de super-heróis norte-americanos (Revista Mundo Estranho) _________________ 92 4-14 – Exemplo do estilo do quadrinista Jack Kirby: Hulk à esquerda, e o Surfista Prateado à direita ___________________________________________ 93 4-15 – Exemplo do estilo do quadrinista Mike Mignola para as histórias Hellboy ________________________________________________________ 94


4-16 – Exemplo do estilo do quadrinista Frank Miller para a história em quadrinhos Sin City, mostrando a gradação de textura gráfica que definiu o estilo de contraste de claro-escuro do quadrinista _________________________ 94 4-17 – Duas páginas da International Picture Language (NEURATH, 1936) _______ 95 4-18 – Diagrama do livro Desvendando os Quadrinhos de Scott McCloud, demonstrando a variedade na representação de um rosto, através de uma simplificação do tratamento do desenho (McCloud, 1995:29) _________________ 95 4-19 – Divisão do repertório de atuação de Nigel Holmes no “sumário” de seu website <nigelholmes.com> ____________________________________ 97 4-20 – Mapa alegórico de folhas de trevo de Heinrich Bünting, xilogravura (1581), homenageando a cidade de Hannover, cujo símbolo é um trevo. Jerusalém é representada no centro, com a Europa, Ásia e África circundando, formando folhas de um trevo <commons.wikimedia.org> __________ 98 4-21 – Detalhe de infográfico (da fig. 3-5), com mapa (à esquerda) mostrando a localização geral de São Paulo em relação ao Brasil, a fim de contextualizar geograficamente o aeroporto de Congonhas <commons.wikimedia.org> __________________________________________ 98 4-22 – Infográfico premiado no Malofiej de 2007 (criado por Eder Reder e Rubens Paiva para Revista Saúde!) (ed. Abril) _____________________________ 99 4-23 – Várias abordagens de gráficos estatísticos para a palestra do 1º LIDE de 2009 <weblide.com> ________________________________________ 99 4-24 – Relógio, gráfico de tempo (Engelhardt, 2002) ______________________ 100 4-25 – Diagramas de ligação (Engelhardt, 2002) __________________________ 100 4-26 – Diagramas de agrupamento (Engelhardt, 2002) _____________________ 100 4-27 – Tabela (e linha do tempo) mostrando a evolução do design em diversas áreas <guardian.co.uk> _____________________________________ 101 4-28 – Exemplos de símbolos (Engelhardt, 2002) _________________________ 101 4-29 – Mapa estatístico (Engelhardt, 2002) _____________________________ 102 4-30 – Mapa de percurso. Detalhe da primeira edição do mapa do metrô de Londres por Harry Beck, 1933 <commons.wikimedia.org> _______________ 102


4-31 – Gráfico estatístico de tempo de William Playfair, considerado o fundador das representações gráficas estatísticas. Gráfico publicado originalmente em Commercial and Political Atlas, 1786 <commons.wikimedia.org> _________________________________________ 103 4-32 – Nascimentos e mortes na Alemanha entre 1911 e 1926 é um famoso gráfico estatístico de tempo do ISOTYPE da década de 1920, que mostra a relação de mortalidade/natalidade durante a primeira guerra mundial. Retirado do International Picture Language (NEURATH, 1936) ________ 103 4-33 – Gráfico estatístico de tempo das maiores falências na historia, utilizando barcos afundando como metáforas <awesome.good.is> ____________ 103 4-34 – Diagramas cronológicos de ligação (Engelhardt, 2002) ________________ 104 4-35 – Diagrama estatístico de ligação (Engelhardt, 2002) __________________ 104 5-1 – Algumas capas da revista Superinteressante, desde a primeira edição de 1987, no alto, à esquerda_______________________________________________ 106 5-2 – Infográfico da revista Superinteressante (criado pelos Infografistas Luís Iria e Rodrigo Maroja, texto de Denis Burgierman) _______________________ 111 5-3 – Estrutura em camadas do infográfico guiando a narrativa. A função das letras é apenas evidenciar as diferentes camadas ______________________ 112 5-4 – Narrativa do infográfico dividida em começo, meio e fim _______________ 113 5-5 – Detalhe do Infográfico da revista Superinteressante dando ênfase a três linhas do tempo _____________________________________________ 115 5-6 – Detalhe __________________________________________________ 115 5-7 – Detalhe __________________________________________________ 116 5-8 – Detalhe __________________________________________________ 116 5-9 – Ambas imagens do globo terrestre, um com suas linhas de coordenadas meridionais (à esquerda) e o outro (à direita) um símbolo genérico de globo, são representações clássicas do mesmo <commons.wikimedia.org> _________________________________________ 116 5-10 – Essa ilustração é uma pintura a guache de Milton Alves


(Superinteressante, março de 1991) ___________________________________ 118 5-11 – Detalhe _________________________________________________ 119 5-12 – Seqüência clássica da evolução humana <commons.wikimedia.org> ______ 120 5-13 – Infográfico da revista Superinteressante (criado pelo infografista Luís Iria, texto de Tereza Venturoli) _____________________________________ 122 5-14 – Estrutura da configuração em matriz do infográfico __________________ 123 5-15 – Detalhe _________________________________________________ 124 5-16 – Detalhe de uma página da história em quadrinhos de Moebius e Jodorowsky (Après L’Incal, Vol.1) (MOEBIUS, 2000:7) _____________________ 125 5-17 – Terceira e quinta páginas da reportagem “Doutores da Agonia” ________ 128 5-18 – Detalhe de uma legenda do infográfico ___________________________ 129 5-19 – Infográfico da revista Superinteressante (criado pelos Infografistas Luís Iria e Rodrigo Maroja, texto de Denis Burgierman) ____________________ 129 5-20 – Detalhes de elementos que contextualizam o tema da reportagem ______ 131 5-21 – Capa da revista Raygun por David Carson <blogspot.com> ____________ 132 5-22 – Caricatura de Bruce Springsteen e Barbara Streisand, ilustrações internas para revista intertainment Weekly (1995) por Hanock Piven <blogspot.com> _________________________________________________ 132


Sumário

1.

Introdução

18

1.1.

Descrição do trabalho

21

2.

O que é infografia jornalística?

23

2.1.

Conceituando infografia

23

2.2.

Infografia jornalística

24

2.3.

Infográfico, gráfico e diagrama

29

2.4.

Infografia e design da informação

31

3.

Linguagem gráfica da infografia

34

3.1.

Jacques Bertin e a semiologia gráfica

36

3.2.

Michael Twyman e a análise da linguagem gráfica

38

3.2.1.

Linguagem Pictórica

39

3.2.2.

Descrição e localização espacial

41

3.2.3.

Narração

42

3.2.4.

Persuasão

42

3.2.5.

Imagens sinópticas

43

3.2.6.

Imagens compostas de elementos distintos

44

3.2.7.

Credibilidade

45

3.2.8.

Contexto cultural e usuário

47

3.3.

Evelyn Goldsmith e a análise pictórica

48

3.3.1.

Unidade

48

3.3.2.

Locação

50

3.3.3.

Ênfase

53

3.3.4.

Texto paralelo

54

3.3.5.

Análise do cartum de Charles Addams

55

3.4.

Clive Ashwin e o estilo

56

3.5.

Clive Richards e os diagramas

58

3.6.

Yuri Engelhardt e a sintaxe gráfica

62

3.6.1.

Sintaxe gráfica

63


3.6.2.

Atributos sintáticos

64

3.6.3.

Estrutura sintática

66

3.7.

Venkatesh Rajamanickam e a infografia

67

3.8.

Ary Moraes e a infografia jornalística

68

3.8.1.

Elementos textuais

68

3.8.2.

Elementos não-textuais

69

4.

Variáveis para análise da infografia jornalística

73

4.1.

Configuração

74

4.1.1.

Esquema de linguagem gráfica verbal (LGV)

75

4.1.2.

Estrutura de diagrama e estratégia de leitura

80

4.2.

Conteúdo informacional

83

4.3.

Tipo de informação

86

4.3.1.

Narração e descrição

86

4.3.2.

Informação temporal

88

4.3.3.

Informação espacial

88

4.4.

Estilo, generalização e particularidade pictórica

91

4.4.1.

Estilo

91

4.4.2.

Generalidade ou particularidade?

94

4.5.

Elementos gráficos do infográfico

96

4.5.1.

Tipos primários

97

4.5.2.

Tipos híbridos

102

5.

Exemplos de análise de infográficos da revista Superinteressante

106

5.1.

A revista Superinteressante

106

5.1.1.

Superinteressante e o jornalismo científico

107

5.1.2.

Corpus da análise

108

5.2.

Infográfico: A história da Terra

111

5.3.

Infográfico: E se... existisse vida em todo o sistema solar?

122

5.4.

Infográfico: O Mapa da Insensatez

128

6.

Conclusão

135

7.

Bibliografia

139


1.

Introdução


1.

Introdução

Na atualidade, o texto jornalístico tradicional cada vez mais se revela insuficiente para atender à crescente oferta de informação nas mídias impressas e virtuais. A percepção da necessidade de utilização de outros recursos além do texto escrito e da fotografia no jornalismo, no entanto, não é recente. Harold Evans (1978), ex-editor do Sunday Times inglês, já fazia uma defesa da infografia como uma importante forma de comunicação muito antes da introdução da tecnologia digital no jornalismo: Todo dia surgem notícias que não podem ser relatadas adequadamente apenas por palavras, particularmente as notícias essencialmente visuais e espaciais. Considere a manchete: equipe de resgate tenta desenterrar mineiros presos pela elevação do nível da água. A relação espacial é a essência desse drama, que alguém de fora não conseguiria entender sem o auxílio de graphics 1 (...) Uma fotografia sozinha não dá conta disso. O mesmo pode ser dito de um desenho isolado. (...) A representação gráfico-pictórica no seu grau mais básico é a marcação do X em um mapa; ou a seta direcional que indica o artigo que continua na página seguinte, ou a fotografia com marcações de identificação. Mas existem possibilidades mais sofisticadas para a infografia onde símbolos e desenhos juntos relatam um assunto complicado mais sucintamente do que é possível apenas através de palavras. (...) tais representações factuais não são meramente imagens, são informação (EVANS, 1978:60). Evans, um pioneiro na análise da infografia, nos oferece um panorama da infografia alguns anos antes da sua expansão na comunicação jornalística. Contudo, embora ele percebesse o potencial da linguagem gráfica além do seu papel tradicional, em seu discurso Evans parece estar voltado exclusivamente a um jornalismo visual para notícias diárias. No entanto, atualmente, em contato com mídias mais dinâmicas, os jornais vão perdendo a função de informar em primeira mão e passando a ter um papel mais investigativo e reflexivo em suas matérias. Com isso, ampliam-se as necessidades de explicação, para o leitor leigo, de processos e fatos complexos, o que torna imperativo o uso de recursos que vão além do texto, como peças gráficas que unem ao texto toda uma gama de imagens. O jornal Evans a considera a tentativa de definir corretamente o termo graphics uma “discussão esotérica” (EVANS, 1978:60). No entanto, costuma ser usado em um sentido mais restrito que o termo “gráfico” (no sentido, em português, de representação gráfica em geral). Graphics, então, é um termo que se refere mais à linguagem gráfica esquemática e pictórica, sem excluir o texto escrito (linguagem gráfica verbal). 1

18


contemporâneo pode, ao dar uma notícia de guerra, por exemplo, ao invés de limitar-se a citar o país, acrescentar o seu mapa, estatísticas sobre a tropa, baixas, tipos de armamento, principais batalhas, apresentando um panorama dos dois lados em conflito. Com isso, possibilita que o leitor entenda a situação e possa acompanhar a opinião expressa pelo jornalista. Esse fato tem levado os infográficos jornalísticos a evoluírem e se tornarem peças editoriais cada vez mais importantes. Pretende-se, com o presente trabalho, criar uma metodologia que seja capaz de avaliar o infográfico jornalístico como uma peça de design de informação. Objetivamos obter melhor compreensão dos infográficos jornalísticos impressos, e de seu papel no jornalismo contemporâneo, contextualizando-a dentro do campo da linguagem gráfica. Neste estudo foi enfatizando o papel da infografia em revistas impressas e, em alguns casos, em jornais impressos, apenas pela necessidade de restringir o escopo da pesquisa. A escolha não significa que infografia jornalística se limite apenas a determinados meios impressos. No design editorial podemos encontrar muitos infográficos em livros didáticos, uns até compostos por infografia em quase todas as páginas, como é possível verificar nos exemplos de páginas duplas do livro Human Body I (Britannica Illustrated Science Library) da fig. 1-2. Sem deixar de mencionar o crescimento da infografia jornalística na internet, com recursos digitais como animação em flash. Podemos ver o exemplo de um infográfico interativo da versão online do jornal Washington Post (fig. 1-1), que mostra a localização de cinco dos principais campos de prisioneiros da Coréia.

1-1 Infográfico interativo da versão online do jornal Washington Post (www.washingtonpost.com)

19


1-2 – Páginas 78-79 e 90-91 do livro Human Body I (Britannica Illustrated Science Library). Estas duas páginas duplas são exemplos de infografia em livros didáticos. (Encyclopædia Britannica)

20


1.1.

Descrição do trabalho

Essa dissertação compreende cinco capítulos, cujo conteúdo resumimos a seguir: No capítulo 2 (o que é infografia jornalística?), trataremos especificamente do conceito de infografia jornalística, ampliando e adequando o conceito de infografia a esse meio, tratando-a como um meio de comunicação independente de outro texto ou contexto. Nesse capítulo estabeleceremos, ainda, a diferenciação entre os conceitos de infográfico e o de diagrama como iconografia. A seguir, no capítulo 3 (linguagem gráfica da infografia), abordaremos algumas das teorias mais relevantes para o estudo em questão, expondo o pensamento de alguns autores que trataram da representação gráfica como uma forma de linguagem e que formularam estudos específicos que têm aplicação direta à infografia jornalística. Para essa pesquisa os autores que se mostraram mais significativos foram Michael Twyman, com seu esquema para análise de linguagem gráfica, e sua abordagem geral sobre a linguagem pictórica, e Evelyn Goldsmith, com sua teoria para análise de ilustrações. No capítulo 4, propomos algumas variáveis para a análise da infografia jornalística, como a configuração gráfica, o tipo de informação do infográfico e o estilo de representação gráfica. No capítulo 5, aplicamos essas variáveis na análise de quatro infográficos da revista Superinteresssante. Finalmente, no capítulo 6, temos a conclusão.

21


2.

O que é infografia jornalística?

22


2.

O que é infografia jornalística?

Para entendermos o que é o objeto de estudo abordado, torna-se necessário avançarmos no emaranhado de tradições terminológicas advindas de traduções e conceitos, o que demonstra a entrada recente do assunto no campo acadêmico.

2.1.

Conceituando infografia

Infografia é um neologismo que foi incorporado recentemente à língua portuguesa. Ribas (2005:2) afirma que informational graphics, termo do qual deriva infographics, é traduzido para o português e para o espanhol como “infográfico” ou “infografia”, com o sentido de “gráfico informativo”. No entanto, não é possível identificar, entre vários autores, um uso consensual do termo infografia. Para Wilbur (1998), information graphics é um termo genérico para várias formas de representação gráfica: de diagramas e interfaces digitais até a sinalização. Porém, se optarmos por uma classificação muito abrangente, o termo “infografia” poderia eventualmente ser confundido como sinônimo de representação gráfica como um todo. Não podemos negar que o termo tem sido usado para sugerir um tipo de representação gráfica diferenciada das demais. Um infográfico, então, não seria qualquer tipo de representação “gráfica”, ou apenas um “gráfico” cartesiano. Geralmente, quando se procura definir a infografia, é salientado o fato da grande maioria dos infográficos tratarem de divulgação científica ou de uma explicação de um fato complexo como, por exemplo, um acidente aéreo. Então, de forma geral, costuma-se usar o termo infografia como: Uma peça gráfica que utiliza simultaneamente a linguagem verbal gráfica, esquemática e pictórica, voltada prioritariamente à explicação de algum fenômeno. Alguns designers e autores optam por ignorar o termo “infografia”, ou information graphics. Clive Richards (2000:99), quando trata do famoso infográfico de Charles Minard de 1869 sobre a campanha de Napoleão na Rússia em 1812 (fig. 4-11), fala de um “mapa diagramático” ou ”diagrama” de forma genérica. Nigel Holmes (2001:1), profissional com uma longa carreira na área de infografia para publicações jornalísticas, tem uma proposta interessante para tratar o problema conceitual da infografia. Este autor prefere usar o termo explanation graphics (explicação gráfica), pois, para ele, se trata menos de uma representação genérica de informação do que uma forma sofisticada de explicação visual. Atualmente, a infografia é considerada uma área que pertence principalmente ao design da informação. Sue Walker (2007:1) afirma que o design da informação é uma atividade que tem se desenvolvido bastante nos últimos anos, sendo eventualmente conhecida como design da comunicação. Trata-se de uma área voltada para a o design gráfico, mas que se relaciona com

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a lingüística e a psicologia aplicada, como a ciência da informação, entre outras áreas. O design da informação está voltado aos sistemas de comunicação, com o objetivo de otimizar o processo de aquisição de informação (SBDI, 2008). A inclusão de infográficos nestes sistemas de informação ocorre quando explicações gráficas tornam mais eficiente a aquisição de conteúdos informacionais.

2.2.

Infografia jornalística

Diferentes autores tentaram determinar os limites do que vem a ser um infográfico, oferecendo diferentes terminologias, descrevendo seus elementos e quais os contextos em que é usado (RIBAS, 2005 e QUADROS, 2005). Essa é uma tarefa importante, mas o infográfico jornalístico, além de ser um conjunto de elementos identificáveis, é também uma forma de comunicação jornalística. Para compreendermos melhor a infografia, nesse contexto, devemos observar alguns elementos básicos da comunicação jornalística: a iconografia e o texto.  Iconografia é representação esquemática e pictórica, que pode incorporar textos curtos. Emanuel Araújo (1986) a define como algo que “constitui-se de imagens de natureza vária que acompanha o texto de livros, revistas, jornais, etc., com o fim de orná-lo, complementá-lo ou elucidá-lo” (ARAÚJO, 1986:460). Araújo continua explicando que a iconografia compreende ilustrações, gráficos, diagramas, desenhos e fotografias, cada um com suas características próprias.  Texto é a forma mais usual de comunicação jornalística, e é definido claramente por Frederico Porta (1958), no Dicionário de Artes Gráficas, como “a parte principal de um livro ou periódico, despida de seus títulos e subtítulos, epígrafes, gravuras, notas, quadros, etc.” (PORTA, 1958:388). Em uma publicação semelhante e mais recente, Rossi (2001), em Graphos: glossário de termos técnicos de comunicação gráfica, define “texto”, relacionando-o às ilustrações, como “matéria escrita de uma obra, em oposição às ilustrações” (ROSSI, 2001: 595). A partir dessas definições, podemos concluir que uma ilustração é considerada um elemento que não pertence a um texto, mas apenas complementa o mesmo. Entretanto, essa complementação se dá de forma integrativa, de maneira que, ao se retirar os elementos iconográficos do texto, pode ocorrer uma grande perda de sentido no produto final. No contexto jornalístico, a inserção de elementos iconográficos costuma valorizar o texto escrito como fonte principal de informação.

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Michael Twyman (1983:245-248) menciona que há uma tendência em se considerar “linguagem” e “texto” como elementos relacionados apenas às palavras, o que Twyman chama de linguagem verbal (oral) ou linguagem verbal gráfica (tipográfica ou escrita). Muitos lingüistas não aceitariam a palavra “linguagem” relacionada a imagens pictóricas, o termo “linguagem verbal” seria, para eles, uma tautologia: Não tenho qualquer desejo de promover a causa da linguagem pictórica, embora a minha experiência em vários contextos (especialmente em educação universitária) me leve a crer que a ênfase neste assunto pode ser facilmente interpretada como uma ameaça a autoridade da linguagem verbal (TWYMAN, 1983:248). O argumento de Twyman reforça a idéia de que, mesmo no meio acadêmico, há uma tendência em se considerar o texto como a fonte de autoridade da informação, e a iconografia como fonte secundária. Embora não concordemos inteiramente com esse discurso da academia, é necessário reconhecer a sua influência para que possamos compreender o papel dessas formas de linguagem no cotidiano. Para tornar mais claras estas distinções, podemos observar, no exemplo da figura 2-1, que a matéria sobre a história do lápis apresenta texto e ilustração que criam um diálogo entre si, sem necessariamente se integrarem como um único objeto gráfico. Trata-se de um caso em que o texto pode ser compreendido mesmo sem o auxílio da ilustração. No segundo exemplo, da figura 2-2, percebe-se que há uma integração maior entre o texto da matéria sobre a espiã Mata Hari e a ilustração fotográfica. Sem a ilustração, haveria uma perda de significado, embora continuasse a ser possível a compreensão do texto.

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2-1 – Exemplo de ilustração. (Revista Aventuras

2-2 – Exemplo de ilustração mais integrada ao texto.

da História)

(Revista Aventuras da História)

Nesses exemplos, e na forma tradicional de se fazer jornalismo, a matéria jornalística é caracterizada pelo texto composto por palavras, a informação verbal gráfica. Um dos elementos fundamentais do jornalismo é a matéria jornalística, definida por Rossi (2001) como “texto jornalístico que constitui uma unidade temática, destinados à publicação” (ROSSI, 391:2001). Esse mesmo autor não inclui iconografia em seu conceito de “texto”. Segundo as definições apresentadas, na prática cotidiana do jornalismo, a iconografia é descartada como fonte principal de informação. Por outro lado, ao tratar do livro, vemos que a definição de “iconografia” de Araújo (1986) também sugere uma clara separação entre a ilustração e o texto, reservando àquela um papel secundário. Na infografia, no entanto, está-se diante de uma situação diferente, uma vez que aqui ocorre unificação do texto com os elementos iconográficos, todos situados dentro de uma única matéria jornalística. Definimos então que, do ponto de vista do design jornalístico, a infografia jornalística é: Um tipo de matéria jornalística onde o texto e iconografia são interdependentes e a estratégia de leitura pode se desenvolver de forma não-linear, que se diferencia da iconografia tradicional pela possibilidade de se comportar como a fonte principal de informação na página. Portanto, os infográficos diferem da ilustração tradicional na sua forma de se relacionarem

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com o texto, e não sendo necessariamente subordinados a uma matéria. Esses infográficos são projetados, muitas vezes, para servirem como fonte autônoma de informação.

2-3 – Percebe-se no infográfico uma integração entre vários elementos iconográficos e o texto. (Revista Mundo Estranho)

No infográfico de página dupla da figura 2-3, sobre como é feito chiclete, percebemos uma integração entre vários elementos iconográficos e o texto, um exemplo típico de infografia jornalística. Já na figura 2-4, sobre a dor mais insuportável que existe, a matéria jornalística é dividida em duas colunas, sendo que a coluna à direita, que representa um infográfico, pode ser compreendida sem o auxílio do texto à esquerda. Nesse infográfico, a coluna à direita é um elemento tão contundente, e o texto, à esquerda, tão sucinto, que poderíamos considerar os dois elementos como parte de um único infográfico maior, composto por uma coluna de texto, que responde a pergunta do título, e um infográfico complementar de duas colunas, mostrando o caminho da dor.

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2-4 – Neste infográfico podemos ver que a informação à direita pode ser lida independentemente do texto à esquerda. (Revista Mundo Estranho)

É claro que uma classificação como essa não cobre todo tipo de infográfico. Muitos casos são híbridos e se torna difícil distinguir claramente se o objeto gráfico é um infográfico ou um tipo mais comum de iconografia como uma ilustração, gráfico ou diagrama. Nigel Holmes (2005), em Wordless Diagrams, por exemplo, apresenta diversos diagramas sem palavras (figura 2-5). No exemplo de Holmes, podemos observar uma seqüência de diagramas, formando uma narrativa, descrevendo diferentes formas de se beijar em quadro países. Ele usa apenas de elementos pictóricos e esquemáticos, os únicos elementos verbais (gráficos) que utilizados são numerais pontuando as sequências de beijos.

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2-5 - Diagrama sem palavras de Nigel Holmes que descreve diferentes formas de se beijar em quatro países. (Wordless Diagramas, 2005:146-147)

Dependendo do contexto em que esse trabalho é apresentado numa publicação jornalística, ele poderia ser classificado como um infográfico. Este exemplo (figura 2-5) talvez seja uma exceção entre a maioria dos infográficos. Contudo, um infográfico é uma matéria jornalística que costuma ser estruturada usando a linguagem dos diagramas, mesmo de uma forma simples ou até sem o uso de palavras. É importante salientarmos que essa proposta de definição para infografia pretende apenas enfatizar a sua potencialidade como matéria jornalística, não apenas como iconografia.

2.3.

Infográfico, gráfico e diagrama

Na língua inglesa, vários são os termos usados para descrever infografia, utilizando-se infographics assim como graphics ou diagrams, o que, inevitavelmente, intensifica a confusão em volta do termo. Para Ribas (2005) o principal problema está na má tradução do inglês para “gráfico”. Em inglês, graphics pode ser o mesmo que diagram, mas diagram, mas não é o mesmo que chart ou graph, que são traduções corretas para “gráfico” na língua portuguesa (RIBAS, 2005:4). O termo inglês graphics seria o equivalente, em português, à representação gráfica, um conceito bastante genérico.

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2-6 – Exemplo de diagrama, usado por Emanuel Araújo. (ARAÚJO, 1986:462)

2-7 – Exemplo de gráfico, usado por Emanuel Araújo. (ARAÚJO, 1986:460)

Gráfico e diagrama são assim descritos por Emanuel Araújo: Os gráficos e diagramas constituem uma forma de representação cujo objetivo é demonstrar, sem utilização do discurso escrito, todas as relações que existem entre elementos rigorosamente definidos e conhecidos. (ARAÚJO, 1986:461) Gráficos e diagramas servem, no entanto, a diferentes funções. Para Araújo (1986:461), o gráfico põe em imagem a demonstração esquemática de um fato (fig 2-7), enquanto que o diagrama representa a demonstração esquemática de um objeto (fig 2-6). Essas diferenças ilustram o problema de se ignorar o fato de que graphics não deve ser compreendido literalmente como “gráfico”. Por outro lado, “diagrama” é um termo mais específico que sugere uma descrição, ou, como podemos encontrar no Dicionário de artes gráficas, a “representação gráfica de um fenômeno” (PORTA, 1954). Se diagrama é um termo mais adequado, a tradução literal mais correta de infographics seria algo como “diagrama informativo”. Nesse sentido, Ary Moraes (1998:113) considera o inglês diagrammatics mais adequado do que graphics. Essa preferência pelo termo diagram também pode ser identificada em alguns autores ingleses como Clive Richards (2000:1).

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O conceito de diagrama, do ponto de vista formal, pode variar de autor para autor. Para Richards (2000), por exemplo, mapas, tabelas e gráficos, entre outras representações gráficas, seriam tipos de diagramas. Já o cartógrafo Bertin (1983), considera que gráficos e tabelas poderiam ser incluídos no âmbito dos diagramas, enquanto que um mapa seria algo distinto (Engelhardt, 2002:146). Para tentar definir o que viria a ser um diagrama, decidimos nos basearmos na idéia de linguagem gráfica dada por Twyman (1979) (ver cap. 3.2), e também na teoria sobre estrutura diagramática de Rob Waller (1985) (ver cap. 4.1.2). Um diagrama, então, pode ser assim definido: Tipo de iconografia capaz de misturar tanto linguagem gráfica pictórica quanto esquemática, além do texto escrito (linguagem gráfica verbal), e que permite a leitura do conteúdo informacional de modo não-linear pelo leitor. Neste estudo, consideramos que a melhor opção seja aceitar as possíveis incongruências dos termos “infográfico”, “gráfico” e “diagrama”, e não optar por desenvolver ou adotar novos termos. Para evitar possíveis confusões com as traduções de termos de língua inglesa, iremos considerar: 1.

Infographics ou information graphics como equivalentes a “infografia”;

2.

A forma genérica de graphics como “representação gráfica” em geral;

3.

“Gráfico” como equivalente a graph.

Os termos diagrammatics, diagrams ou graphics têm sido usados para descrever infographics. Nesses casos, daremos preferência ao conceito e usaremos apenas “infografia”.

2.4.

Infografia e design da informação

Designers de informação também podem ser considerados “transformadores” da informação. O conceito do “transformador”, proposto nos anos de 1920 por Otto Neurath, o principal criador do ISOTYPE (International System of Typographical Picture Education), é o de um tipo de profissional que reinterpreta a informação, ou transforma a mesma, para adequá-la a contextos sociais diferentes (ver cap. 3.4). Como afirma Wilbur (1998:7), para Neurath, designers eram intermediários entre historiadores, economistas, matemáticos e seu público alvo. Em se tratando da infografia, essa analogia é especialmente importante, já que o infografista jornalístico é um misto de designer e jornalista que transforma a informação de um contexto que privilegia o conhecimento especializado para outro diferente. No caso da divulgação científica, o infográfico funciona como uma reinterpretação visual da informação científica para um contexto leigo.

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O infografista Nigel Homes (2006) declara: Na maioria dos casos, eu acredito em adaptar o que eu faço para um público específico. Eu preciso, pelo menos, conhecer quem é o público para que ele faça parte da minha forma de pensar o trabalho. Um exemplo simples disso é quando um editor de uma publicação acadêmica ou cientifica vê algo que fiz e pede que eu faça uma análise dos diagramas da sua publicação. Eles são, em geral, secos e incompreensíveis para o leitor comum, mas são totalmente adequados para os leitores daquela publicação. Mas porque eles não podem ser mais parecidos com os de uma revista como a TIME? Talvez o editor indague. Ele está confundindo quem lê o que e por quê. (...) Só porque a revista TIME utilizou um certo estilo, isso não significa que todo infográfico deva se parecer com os dela (HOLMES, 2006:15). Não devemos concluir que a infografia seja necessariamente uma simplificação de uma informação complexa, embora ela também possa ser. Sua função é contextualizar a informação para o leitor, trazendo, para primeiro plano, questões de compreensão visual e verbal muitas vezes ignoradas na tradição da linguagem verbal.

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3.

Linguagem grรกfica da infografia

33


3.

Linguagem gráfica da infografia

Vivemos em um mundo que depende consideravelmente da linguagem visual. Como existem diversas formas de linguagem visual, é importante salientarmos que até o presente momento na nossa história tecnológica, o foco do design gráfico (ou design visual, de interação, de informação, etc.) tem sido principalmente a linguagem visual gráfica. Trata-se de um tipo de linguagem que é representada de forma essencialmente bi-dimensional em seu suporte, seja ele o papel ou a tela de computador. Até hoje foram feitas poucas tentativas de estudo desse tipo de comunicação. Uma das áreas que têm se voltado para o estudo do assunto é a lingüística, utilizando-se do instrumental teórico desenvolvido para o entendimento da linguagem verbal. A abordagem lingüística, no entanto, tem se mostrado problemática aos olhos dos designers que têm se dedicado a estudar o tema, implicando em escolhas diferenciadas dos conceitos lingüísticos, para adequá-los aos estudos do visual gráfico. Um destes pesquisadores, Robert Horn (1999), formula essa crítica no texto que segue: Eu sustento que a linguagem visual é uma linguagem, porque não é possível entender sua sintaxe, semântica e pragmática usando apenas os conceitos lingüísticos desenvolvidos para analisar a linguagem falada. Nem as ferramentas de análise usadas pelas artes visuais ou a lingüística são suficientes para analisar o que está acontecendo na linguagem visual. Para criar uma verdadeira lingüística da linguagem visual é necessário se criar novos conceitos voltados para como palavras e imagens interagem juntas (Horn, 1999:28). Ellen Lupton (1999) vê a origem da subserviência à linguagem verbal no que Jacques Derrida (2004) considerava uma forma de logocentrismo, em que a palavra falada é considerada superior às outras formas de representação, inclusive a escrita (LUPTON, 1999:4-5). Na lingüística, a origem deste pensamento pode ser identificada na obra de Ferdinand de Saussure (1916/1997), para quem a idéia de uma “linguagem verbal” seria uma tautologia, pois acreditava que a escrita era meramente uma representação da fala. Todas as representações gráficas/visuais, assim como a escrita, eram tidas como inferiores à fala, raciocínio que revela um apego à idéia da existência de um significado transcendente que habitaria a fala ou, ainda, a

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própria mente. 2 Lupton parece sugerir que a tradição logocêntrica do estudo da linguagem tem afetado consideravelmente a forma como se encara o design como conhecimento. No design, as questões de forma gráfica não podem ser preteridas ao suposto conteúdo verbal. Podemos concluir, pelo argumento de Lupton, que, ao menos no campo do design, a forma gráfica deve ser encarada como parte do conteúdo informacional. Um dos pioneiros no estudo da linguagem gráfica foi o cartógrafo francês, especializado em design cartográfico, Jacques Bertin (1983), que, em seu clássico Semiologie Graphique, editado pela primeira em 1967, aplica a teoria semiótica a representações gráficas de dados (gráficos e mapas). Depois de Bertin, outros seguiram seus passos, desenvolvendo sistemas de análise linguagem gráfica. Um autor que tratou o tema de uma forma abrangente foi Michael Twyman (1982), ao estudar as relações entre linguagem verbal, esquemática e pictórica, e oferecer um modelo lingüístico direcionado especificamente à linguagem gráfica. Esse autor também se aventurou no estudo da negligenciada linguagem pictórica. Mas é na pesquisa de ilustrações de Evelyn Goldsmith (1982) que encontramos um sistema de análise pictórica revolucionário. Criado com base nos três níveis semióticos de Charles Morris, teoria originalmente direcionada à linguagem verbal, o trabalho de Goldsmith tem se mostrado surpreendentemente útil quando aplicado. No campo do estilo, Clive Ashwin (1979) propõe uma análise sintático-semântica que considera aspectos conotativos da linguagem pictórica, que complementam uma certa objetividade formalista de Bertin. Autores mais recentes desenvolveram trabalhos direcionados mais especificamente para diagramas, gráficos e infografia. Clive Richard (2000) tem um artigo essencial sobre a natureza dos diagramas, em que propõe um modelo para a compreensão da variação metafórica entre a linguagem esquemática e a pictórica. Nesse sentido, podemos perceber uma continuidade desse projeto no estudo recente do holandês Yuri Engelhardt (2002). O campo da infografia tem recebido a atenção de autores, que têm proposto análises mais específicas do tema. Venkatesh Rajamanickam (2005) propõe uma interessante tipologia de infográficos, valorizando-os como conteúdo informacional, assim como o infografista brasileiro Ary Morares (1998), que classifica os elementos textuais e não-textuais de um infográfico.

2

Esta supremacia da fala sugere a idéia de que o verdadeiro “conteúdo” de um texto gráfico, a sua substância conceitual por assim dizer, seria o pensamento por trás das palavras. Já que o mais próximo que poderíamos chegar do pensamento seria a fala, ela seria o equivalente ao “conteúdo” conceitual do texto escrito. Segundo Derrida, essa tradição ocidental logocêntrica, manifesta em Saussure, teria suas origens nas teorias metafísicas de Platão sobre as diferenças entre o sensível e o ideal. Lupton parece sugerir que a tradição logocêntrica do estudo da linguagem tem afetado consideravelmente a forma como se encara o design como conhecimento.

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3.1.

Jacques Bertin e a semiologia gráfica

Jacques Bertin, em seu texto seminal, Semiologie Graphique (1983), classificou sistematicamente o uso de elementos visuais gráficos na representação de dados e suas relações, aplicados a gráficos e mapas. Bertin inicia o trabalho propondo um sistema de análise de dados para direcionar a representação visual. Em seguida, ele se refere às dimensões espaciais básicas, como ponto, linha e área em um plano cartesiano (X e Y). A questão mais difundida do sistema de Bertin diz respeito às sete variáveis gráficas fundamentais, que propõem características que fazem parte de qualquer representação gráfica (diagrama da figura 3-1). As variáveis são: •

Forma: variação formal dentro de uma determinada área.

Tamanho: variação de dimensão da área ou do elemento gráfico.

Valor: variação de claridade da área ou do elemento gráfico.

Textura: variação na espessura dos elementos que constituem uma área gráfica.

Cor: variação de tonalidade de cor dentro de um mesmo valor (claridade).

Orientação: variação de orientação, horizontal a vertical, de linhas ou padrões.

Posição: variação de posição em um determinado espaço gráfico.

3-1 - Variáveis gráficas definidas por Jacques Bertin (apud TWYMAN, 1983:294)

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Twyman (1983:294) enfatiza a importância das sete variáveis de Bertin, considerando-as uma lista essencial de características gráficas, sejam elas pictóricas, esquemáticas ou verbais, mas reconhece a limitação desse sistema diante da riqueza formal da linguagem pictórica. Além dos sistemas de classificação e normatização projetual, Bertin (1983:2-3) propôs uma definição de linguagem gráfica onde fez uma distinção entre sistemas monossêmicos, polissêmicos e pansêmicos, conforme o que se segue:  Monossêmico: “o significado de cada signo é definido a priori da observação de um conjunto de signos”, ou seja, as imagens monossêmicas seriam aquelas que não oferecem mais de uma interpretação correta. Bertin, ao valorizar a monossemia, procura definir um conceito de objetividade gráfica, para que os designers percebam a importância da representação inequívoca de informação. Para Bertin, os símbolos matemáticos e a linguagem esquemática são exemplos ideais de signos monossêmicos.  Polissêmico: as imagens polissêmicas seriam aquelas que oferecem mais de uma interpretação correta. São as imagens mais denotativas, as ilustrações narrativas ou simbólicas.  Pansêmico: são imagens com possibilidades infinitas de interpretação, como uma pintura abstrata que contém uma infinitude de interpretações possíveis. Clive Ashwin (1979), discutindo o papel da denotação gráfica, critica a valorização excessiva da monossemia em Bertin. Para Ashwin, Bertin, ao confinar sua atenção à imagística monossêmica e descartar imagens polissêmicas, tem pouco ou nada a dizer sobre as imagens pictóricas, que são uma parcela considerável da linguagem gráfica. Para aquele autor, ambas as linguagens, polissêmica e pansêmica são desqualificadas por Bertin, por proporem significados imprecisos, ou, como ele coloca, discutíveis. Ashwin complementa então que, no âmbito da ilustração, que é um tipo de linguagem gráfica que faz parte do design gráfico, apenas uma pequena parcela das representações pictóricas pode ser considerada monossêmica, pelo menos em sua intenção (como no caso da ilustração científica/técnica e boa parte da infografia), mas quase nenhuma seria verdadeiramente pansêmica (1979:52). Tal fato não impede, no entanto, que, mesmo diante de um sistema monossêmico, o leitor venha a desenvolver sua própria interpretação do significado sobre a informação gráfica.

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3.2.

Michael Twyman e a análise da linguagem gráfica

Michael Twyman é um historiador de design que se propôs a tentar resolver algumas das questões da linguagem gráfica direcionadas ao design gráfico. Twyman constata que a lingüística praticamente desconsidera a linguagem gráfica ao propor a divisão da linguagem apenas entre a falada e a escrita (ver fig. 3-2). Twyman contrapõe que os designers têm uma percepção diferente das sutilezas da linguagem gráfica. Para eles, o foco não está na fala, e sim na variedade da linguagem gráfica, diferenciando linguagem gráfica verbal da linguagem pictórica (ver fig. 3-2). Twyman propõe, então, um modelo capaz de conciliar a visão tradicional da lingüística com a visão dos designers (ver fig. 3-3). Neste modelo, a distinção principal é feita pelo canal de comunicação. Essa comunicação é transmitida através da audição ou da visão. Twyman admite que existam outros meios como o tato, para deficientes visuais, mas opta pelas “situações mais comuns em comunicação” (TWYMAN, 1985:247).

3-2 – A linguagem abordada de maneiras diferentes: abordagem dos lingüistas à esquerda, e a dos designers gráficos à direita. (TWYMAN, 1982:145)

3-3 - Modelo criado para acomodar as abordagens de lingüistas e designers diante da questão da linguagem (TWYMAN, 1985:145)

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Em seguida, ele oferece um esquema (schema) taxonômico para se analisar a linguagem gráfica, a linguagem gráfica verbal, esquemática e pictórica (TWYMAN, 1979). A linguagem verbal é a representação gráfica da linguagem falada (seja ela tipográfica ou escrita à mão). A linguagem esquemática é formada por formas gráficas que não incluem palavras, números ou imagens pictóricas (como por exemplo, tabelas, representações abstratas de estrutura, etc.). Finalmente, a linguagem pictórica comporta imagens produzidas artificialmente “que remetem por mais remota que seja à aparência ou estrutura de algo real ou imaginado” (TWYMAN, 1985:249). No capítulo 4.1 abordaremos o esquema de Twyman detalhadamente, uma vez que ele tem sido bastante difundido por se mostrar muito adequado à análise de peças de design gráfico, possibilitando um estudo mais direcionado. Kostelnick & Hassett (2003) apontam que a abordagem taxonômica pode, eventualmente, ter suas limitações. Estes teóricos optam por uma abordagem da retórica da linguagem visual, argumentando que taxonomias como o esquema de Twyman nos permitem reconhecer padrões na linguagem visual (e variações dos mesmos), mas tendem a separar o design do seu significado. Por si só, modelos como esses não conseguiriam revelar a estrutura latente da linguagem visual, porque o significado de qualquer variação visual pode mudar dependendo do contexto e do seu observador (KOSTELNICK & HASSETT, 2003:2). Ou seja, dependendo objetivo da análise, sem uma contextualização aprofundada, os resultados do esquema podem ser insuficientes.

3.2.1. Linguagem Pictórica Em seu artigo “Usando linguagem pictórica” (1985), posterior ao schema (1979), Twyman propõe uma visão talvez mais abrangente, discutindo ainda mais a forma gráfica como conteúdo informacional e a questão da linguagem pictórica, comumente negligenciada por designers. Para entender o contexto da produção de imagens pictóricas, devemos considerar outros fatores, boa parte deles não gráficos. Twyman (1985:248-249) sugere variáveis para compreender a questão operacional de linguagem gráfica: a) propósito: se, por exemplo, há a intenção de oferecer informação ou persuadir; b) conteúdo informacional: a essência da informação ou mensagem a ser transmitida; c) configuração: diferentes formas de organizar elementos gráficos espacialmente; d) modo: seja verbal, pictórico, esquemático ou a combinação de dois ou mais;

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e) meio de produção: seja produzido à mão ou por computador; f)

recursos: habilidades, facilidades, fundos e tempos disponíveis;

g) usuários: considerando fatores como idade, habilidade, formação, interesses e experiência; h) circunstâncias de uso: se o usuário se encontra em uma biblioteca bem equipada, ou está sob condições de estresse, como em um veículo em movimento. O fato de tais variáveis refletirem a atividade dos designers e o contexto no qual o usuário se insere é muito importante para a teoria do design. O estudo tradicional de linguagem costuma valorizar o olhar do intérprete sobre o objeto de estudo, mas nem tanto as circunstancias de criação e uso do mesmo. As variáveis sugeridas por Twyman evidenciam fatores determinantes em projetos de design gráfico, podendo ser usadas como guia em uma análise gráfica. Twyman aborda também questões conceituais da sua classificação de linguagem gráfica. Definir os precisos limites do que vem a ser pictórico ou esquemático não é tão simples, já que muitas vezes um elemento gráfico pode transitar entre o esquemático e pictórico. Um exemplo disso pode ser constatado na figura 3-4, em que o cartunista James Gillray (1791) aproveita a ambigüidade das formas esquemáticas do mapa da Grã-Bretanha para transformála em um cartum, com uma velha senhora sentada nas costas de uma criatura marinha monstruosa. 3-4 – Gravura de James Gillray de 1791, transformando um mapa esquemático da GrãBretanha em imagens figurativas (bibliodyssey.blogspot.com)

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3-5 – Mapa esquemático de 1833 da Bretanha Saxônica. (commons.wikimedia.org)

Veremos mais adiante que a discussão sobre as variações entre pictórico e esquemático é aprofundada por Clive Richards, com seu conceito de “metáforas gráficas”. A identificação do tipo linguagem gráfica não depende apenas das características formais da imagem, devendo ser avaliado o contexto do usuário e as circunstâncias particulares de uso. Talvez seja mais esclarecedor questionar-se a função das imagens pictóricas. Twyman sugere livremente algumas funções, que podem vir a ocorrer simultaneamente.

3.2.2. Descrição e localização espacial Muitas ilustrações têm por escopo descrever objetos ou fenômenos. Nesse caso, Twyman se refere aos infográficos jornalísticos como “mapas pictóricos”, e cita infográficos onde a relação espacial é determinada pela linguagem pictórica e esquemática, como podemos ver no exemplo da fig. 3-5. Em uma representação tridimensional monocromática, a descrição da direção de movimento do avião é determinada por uma seta laranja, que se destaca pela cor, guiando a narrativa pelo olhar. É importante frisarmos que descrições espaciais em infográficos costumam ser narrativas também. Para Twyman, infográficos jornalísticos são bons exemplos de uma forma rica de se utilizar a linguagem pictórica.

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3-6 – O acidente com o avião da TAM em São Paulo em 2007 (infografia24horas.blogspot.com)

3.2.3. Narração O ditado “toda imagem conta uma história” não é totalmente correto, mas Twyman lembra que na história das representações visuais, ao menos no ocidente, percebemos uma difusão de imagens narrativas. As idéias de Twyman sobre esse tópico são descritas mais detalhadamente no capítulo 4.2.

3.2.4. Persuasão O autor afirma que as imagens utilizadas em publicidade são exemplos de imagens que têm a persuasão como objetivo principal, e traz uma ilustração do séc. XV que tenta persuadir o leitor a morrer dignamente (fig. 3-6). O estudo da persuasão no design publicitário foi marcado pelo trabalho de outro teórico, Gui Bonsiepe (1999), que aborda a questão pela retórica visual. Bonsiepe, criticando a idéia de neutralidade de informação, afirma que a informação sem retórica é uma ilusão (BONSIEPE, 1999:167-172). Logo, se toda a comunicação é retórica, a persuasão é parte inevitável da transmissão de informação. Twyman parece concordar com essa afirmativa, mas sem deixar de valorizar constantemente a intenção do designer. No caso da publicidade, mesmo oferecendo informação, a intenção principal é persuadir. Já em se tratando da infografia (mesmo que não use esse termo) e da ilustração científica, a intenção principal é informar, mas nem por isso deixará de persuadir. Twyman lembra que as imagens pictóricas têm uma variedade de funções secundárias, como proporcionar prazer e humor para os leitores, solucionar problemas, além de oferecer uma

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oportunidade de expressão pessoal para os criadores (seja artista, designer ou ilustrador).

3-7 – Tentação através da impaciência. Ilustração de um livro tabular holandês de 1465, Ars moriendi (TWYMAN, 1985:254)

O referido autor também dedica bastante atenção às escolhas de representação e estilo, e em como elas afetam o conteúdo informacional, tema que será abordado no cap. 4.4. Twyman oferece, ainda, classificações das imagens pictóricas, das quais citaremos algumas relevantes:

3.2.5. Imagens sinópticas Imagens sinópticas são aquelas que oferecem uma representação unificada do mundo ou de parte dele. São imagens que propõem uma informação visual de um só golpe de vista, como no exemplo da fig. 3-7.

3-8 – Jockeys na chuva por Edgar Degas (1886). Essa imagem sinóptica que pode ser comparada a imagem composta de elementos distintos da fig. 3-8 (commons.wikimedia.org)

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3.2.6. Imagens compostas de elementos distintos: São imagens que não se comunicam de forma contínua e unificada, mas são pontuadas por elementos, ou grupos de elementos distintos. É o que se verifica na fig. 3-8, que mostra as experiências com fotografias sequenciais de Eward Muybridge, composta por diversas imagens discretas. Rapidamente fica evidenciado que essa é a mesma estratégia da linguagem seqüencial das histórias em quadrinhos. Twyman considera que a escolha de elementos distintos exige mais do leitor, por mostrar uma variedade sutil de estilo de representação e escala de elementos, sem ter necessariamente uma seqüência clara de leitura.

3-9 – Cavalo galopando fotografado por Edward Muybridge no final do séc. XIX. Uma série de imagens discretas que podem ser comparadas a fig. 3-7 (commons.wikimedia.org)

Mais uma vez, Twyman cita infográficos jornalísticos como exemplos ideais de utilização da linguagem pictórica, mostrando que infográficos costumam ser compostos por imagens discretas que podem guiar a estratégia de olhar do leitor, ou deixá-lo livre para fazer sua própria seqüência de leitura. Isso já introduz as questões essenciais, na tese de Twyman, sobre estratégia de leitura e configuração de elementos distintos, que abordaremos com mais detalhes no cap. 4.3. Um infográfico que é exemplarmente composto por imagens discretas pode ser visto na fig. 3-9.

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3-10- Infográfico da Revista Mundo Estranho (2008) (infograthinking.blogspot.com)

Para Twyman, imagens compostas por elementos distintos tendem a ser mais eficientes, como argumento visual, do que imagens sinópticas. Não é de se estranhar que praticamente todos os infográficos apresentados nessa dissertação são compostos por diversas imagens discretas. No exemplo da fig. 3-9, vemos que o infográfico é composto por diversos elementos distintos, com grande variação de estilos gráficos, misturando objetos tridimensionais fotografados com representações esquemáticas bidimensionais, seguindo uma estrutura de leitura não-linear. Além disso, para diferenciar os tipos de informação, o infografista se utilizou de variação de cores e opções tipográficas.

3.2.7. Credibilidade Twyman parece demonstrar preocupação em identificar quais os recursos que ajudariam a dar mais precisão e credibilidade aos argumentos pictóricos e esquemáticos. Podemos concluir, pelos argumentos de Twyman, que a infografia faz um detalhamento do argumento visual, através de vários elementos distintos, oferecendo uma variedade de níveis de informação (pictórica, esquemática e verbal). Isso oferece à infografia maior possibilidade de precisão e esclarecimento em comparação a uma ilustração tradicional, que é uma imagem sinóptica composta por menos elementos, e que oferece menor possibilidade de integração com a linguagem escrita e variação de informação. Twyman reconhece em sua obra que a potencialização da linguagem gráfica depende, ainda, de

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fatores tecnológicos. Para ilustrar isso, o autor cita Ivins (1969), que argumenta que a ausência de recursos tecnológicos para a reprodução de imagens pictóricas, na Antiguidade, pode ter sido uma importante causa do lento desenvolvimento científico da época. Isso se justificaria pelo fato de que a produção de diagramas e ilustrações pictóricas é essencial para o desenvolvimento e transmissão do conhecimento científico. Parte-se do pressuposto de que muito desse conhecimento é pictórico ou esquemático por natureza, e não se satisfaz apenas com a representação falada ou escrita. Assim, sem a reprodução adequada desses argumentos científicos pictóricos, não seria possível se transmitir e, conseqüentemente, se preservar certos tipos de conhecimento científico. Ivins utiliza como uma prova de sua tese uma citação de Plínio, o velho (23-79 A.C.), o naturalista mais importante da Antiguidade, que afirma que as ilustrações são propensas ao engano, pois a diversidade de copistas, com graus diferenciados de habilidade para o desenho, aumenta consideravelmente o risco de se perder a semelhança com os originais, levando Plínio a concluir que os autores deveriam se limitar a uma descrição verbal escrita da natureza.

3-11 - Ilustração do manuscrito De Materia Medica de Dioscurides (cerca de 625) (commons.wikimedia.org)

3-12 - Xilogravura de Albrecht Meyer, De Historia stirpium (1542) (http://sciweb.nybg.org/)

Na fig. 3-10 podemos ver um exemplo do tipo de problema mencionado por Plínio, sobre a

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imprecisão na representação pictórica através de copistas. Já na xilogravura da fig. 3-11, podemos constatar que, com advento da imprensa, o ilustrador botânico pôde oferecer uma identificação mais precisa das plantas através da riqueza e precisão de detalhes na representação. Como se pode verificar, nem toda informação pode ser traduzida de forma adequada verbalmente.

3.2.8. Contexto cultural e usuário Twyman lembra que o contexto cultural é o fator determinante na compreensão visual. A concepção popular de que imagens pictóricas são mais eficientes por serem supostamente compreendidas universalmente é facilmente refutada quando observamos as convenções pictóricas através de diferentes culturas. Em uma experiência com grupos de estudo do Sul da África, Hudson (1960) constatou que certas convenções pictóricas, comuns a ocidentais, não eram reconhecidas pelo grupo africano. Sugestões retóricas visuais de profundidade, através de convenções de perspectiva, como mudanças de escala e linhas convergentes em uma rua (fig. 3-12), não faziam parte do repertório de cultura visual dos grupos testados. Apenas a proximidade dos elementos no plano pictórico ajudava na interpretação das imagens para eles (TWYMAN, 1985:300). Segundo Twyman, em se tratando de contexto cultural, deve-se considerar variáveis relacionadas aos usuários, conteúdo informacional e configuração. Veremos a seguir, na pesquisa de Goldsmith (1980), como o contexto cultural é uma chave essencial para compreender a linguagem visual.

3-13 – As ilustrações usadas por Hudson respondiam às representações de profundidade em perspectiva (HUDSON apud TWYMAN, 1985-301)

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Questões como a citada por Hudson ainda surpreendem, pois problemas de educação visual são negligenciados na educação em geral e na academia. Adultos só costumam se envolver na criação de imagens pictóricas (excluindo a fotografia) quando se dedicam a áreas especializadas onde essa habilidade é necessária, como design, engenharia, botânica, geografia, etc. Além disso, Twyman critica o fato de se considerar as habilidades de se criar e de “ler” imagens pictóricas, como atividades análogas. Como vimos, a forma como se interpreta imagens gráficas depende do seu contexto cultural. Essa falta de envolvimento com a “mecânica” do mundo imagético é muito problemática, seja pela falta de desenvolvimento de percepção cultural ou pelo descaso pela habilidade e conhecimento prático de criação imagética. Para Twyman, juntamente à tradição de desvalorização lingüística do pictórico, os fatores citados contribuem para a dificuldade em se admitir que linguagem gráfica como um todo possa ser uma forma válida de conhecimento.

3.3.

Evelyn Goldsmith e a análise pictórica

Evelyn Goldsmith (1980) formulou um importante modelo de análise de ilustração em uma época em que, segundo ela, muitos consideravam que a proposta de uma análise pictórica não era sequer possível ou desejável (GOLDSMITH, 1980:1). Em sua pesquisa, procura demonstrar como a linguagem pictórica pode deixar de comunicar a mensagem intencionada. Seu modelo adota a terminologia da teoria de Charles Morris (1938), que analisa a linguagem em três níveis semióticos: o sintático, semântico e pragmático. O sintático seria o nível em que não há identificação da imagem. Os outros dois níveis tratam do conteúdo e significado de um signo, no caso, um signo pictórico. O semântico trata da identificação literal do signo e o pragmático implica na interpretação do observador, sendo considerados os aspectos culturais, entre outros similares (GOLDSMITH, 1982:124). O modelo de análise pictórica de Goldsmith é formado a partir de quatro fatores, que se desdobram nos três níveis semióticos:

3.3.1. Unidade Para Goldsmith, coesão é um fator essencial na compreensão de uma imagem. A coesão, então, seria o fato de que qualquer área de uma imagem poder ser percebida como tendo uma identidade particular, mesmo que essa identidade não seja compreensível pelo observador. Podemos dizer que, através da coesão visual, somos capazes de identificar e diferenciar elementos da realidade.

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Quadro do fator “unidade” do modelo analítico de Evelyn Goldsmith (1984)

Níveis Fator

Sintático

Semântico

Pragmático

Unidade

O reconhecimento de uma imagem é determinado pelas próprias marcas pictóricas, ou seja, pela escolha de tratamento da imagem.

O reconhecimento de uma imagem é determinado pela clareza das suas características principais.

O contexto cultural é essencial para o reconhecimento de uma imagem.

No exemplo de unidade sintática (fig.3-14), podemos perceber que a imagem à esquerda é uma fotografia sem meio-tom, que a torna quase abstrata, enquanto que a imagem à direita preserva as retículas da fotografia, oferecendo informação figurativa mais reconhecível. Embora as duas imagens sejam sintaticamente diferentes, apenas quatro dos trinta e oito entrevistados por Goldsmith não foram capazes de identificar que a primeira imagem era um rosto humano (GOLDSMITH, 1980:207). Podemos concluir que, embora a imagem da esquerda seja mais indefinida, pela escolha do tratamento gráfico, ela é sintaticamente coesa o suficiente para ser reconhecível pela maioria das pessoas.

3-14- Unidade sintática. (GOLDSMITH, 1984:127)

Na fig. 3-15, a unidade semântica não se dá pela representação detalhada de uma determinada imagem pictórica, pois as fotografias dos dois elementos possuem pouca definição. Apenas a imagem da banana, cuja caracterização geral é coesa, é claramente identificável. A primeira imagem (uma maça) sugere apenas uma forma circular, podendo também ser um pêssego ou laranja, embora uma pessoa entrevistada por Goldsmith chegasse a sugerir que seria uma ervilha (GOLDSMITH, 1980:207).

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3-15 - Unidade semântica. (GOLDSMITH, 1984:128)

No caso da unidade pragmática da fig. 3-16, percebemos que a compreensão da cena descrita se dá pelo conhecimento prévio da história do jardim do Éden. Logo, a compreensão dessa imagem não se limita à identificação semântica das figuras representadas, requerendo compreensão do contexto cultural implícito.

3-16 - Unidade pragmática. (GOLDSMITH, 1984:129)

3.3.2. Locação Trata-se de fator que aborda a relação espacial entre os elementos, envolvendo profundidade, sobreposição, distâncias relativas e diferentes formas de gradientes de tamanho, clareza, textura, etc. Quadro do fator “locação” do modelo analítico de Evelyn Goldsmith (1984)

Níveis Fator

Sintático

Semântico

Pragmático

Locação

No nível sintático, o observador percebe a locação do objeto independentemente do reconhecimento do objeto.

A compreensão de tamanho, posição e profundidade pode ser determinada pelo reconhecimento do objeto.

A compreensão do contexto cultural pode determinar a compreensão de tamanho, posição e profundidade de um objeto.

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No exemplo acima, de locação sintática (fig. 3-17), a percepção de profundidade dos objetos é determinada pela sintaxe, ou seja, pelo tratamento formal da imagem. Ao remover a textura de fundo, bolas de natal deixam de parecer estarem todas no mesmo plano.

3-17 - Locação sintática. (GOLDSMITH, 1984:130)

No caso fig. 3-18, um exemplo de locação semântica, podemos perceber que, quando cada um dos elementos é facilmente reconhecível pelo observador, e todos estão no mesmo plano, a proporção de escala entre eles pode ser relativizada. O fato de o gato parecer quase tão grande quanto o elefante não afeta a compreensão da imagem. Contudo, pode ocorrer confusão se um dos elementos não é representado de forma que não ocorra uma compreensão imediata. No topo da fig. 3-18, todos foram alinhados (estão no mesmo plano) e seus tamanhos são claramente reconhecíveis. No entanto, o primeiro elemento não foi claramente representado, podendo ser confundido com uma caixa grande, já que está proporcionalmente alinhado á um animal grande, o elefante. Na parte inferior da fig. 3-18, um selo é adicionado ao primeiro elemento da fileira inferior, e essa pista visual modifica a informação semântica da imagem, sendo possível reconhecê-la como uma carta. Uma vez que a carta é reconhecida corretamente, sua relação de escala é relativizada em relação ao elefante.

3-18 - Locação semântica. (GOLDSMITH, 1984:131)

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Na fig. 3-19, a locação pragmática se dá através de uma justaposição problemática. Ambos os quadros possuem a mesma locação sintática e semântica, ou seja, o mesmo tratamento gráfico e todos os elementos estão presentes em ambos os quadros, basicamente nos mesmos lugares.

3-19 - Locação pragmática. (GOLDSMITH, 1984:132)

No entanto, a primeira imagem sugere uma justaposição da xícara na mão da figura principal com os pincéis ao fundo, possibilitando a interpretação problemática de que os pincéis estariam dentro da xícara, quando na realidade estão atrás da figura. O mesmo não ocorre na segunda imagem. A extensão em que uma justaposição indesejada interfere no valor informacional da imagem pictórica depende de dois fatores: a experiência de leitura de imagens do observador e a aceitação da situação retratada (GOLDSMITH, 1980:209). Curiosamente, podemos notar mais um exemplo das possibilidades variadas nas interpretações pragmáticas na fig. 3-19. No segundo quadro, a figura principal se abaixa, não 52


havendo mudança significativa na ação, mas a justaposição da cabeça da figura principal com os pincéis, ao fundo, cria uma nova leitura, possivelmente cômica, para a imagem.

3.3.3. Ênfase Fator que se refere às relações entre as imagens, em um sentido hierárquico, mais do que espacial. Trata-se, basicamente, de atrair e direcionar a atenção do observador, o que pode ser feito de forma sensorial ou intelectual (pelo significado do objeto retratado). Para se compreender a ênfase sobre os elementos, é importante se considerar o contexto da imagem. Quadro do fator “ênfase” do modelo analítico de Evelyn Goldsmith (1984)

Níveis Fator

Sintático

Semântico

Ênfase

Ênfase através de fatores que Ênfase através de elementos sugerem contraste como de atração universal, como os forma, cor, tamanho, etc. olhos, direção do olhar, seres humanos, etc.

Pragmático Ênfase que depende de hábitos culturais, como direção de leitura, significado de certas cores, etc.

Como exemplo, na fig. 3-20, a Ênfase sintática se dá através do contraste entre os elementos representados. A imagem da esquerda não recebe qualquer atenção, enquanto que a figura da direita quebra o equilíbrio de organização sintática em um dos elementos. Essa pequena variação não tem um sentido semântico definido, mas ela provoca um contraste que chama a atenção do olhar.

3-20 - Ênfase sintática. (GOLDSMITH, 1982:133)

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3.3.4. Texto paralelo Esse fator se refere à relação entre o texto e a imagem pictórica. Avalia-se quais elementos textuais podem ser representados pictoricamente de forma direta ou de forma indireta, e quais não podem ser representados. Quadro do fator de texto paralelo do modelo analítico de Evelyn Goldsmith (1984)

Níveis Fator

Sintático

Semântico

Pragmático

Texto Paralelo

Fator determinado pela posição do texto e a imagem, guiando o olhar.

Fator determinado por características significativas de um objeto e problemas de identificação.

Uma contextualização adequada pode ajudar nos casos dos conceitos difíceis de serem ilustrados.

No caso do nível sintático, um dos problemas principais não é a identificação incorreta da imagem, mas a variedade de possíveis palavras para identificá-la. Em uma experiência com ingleses, se uma imagem de maça fosse apresentada, os observadores faziam a correlação com a palavra apple facilmente. Mas, no caso de uma imagem de um suéter, os observadores sugeriam diferentes nomes: jumper, jersy, pullover, woolly e sweater (GOLDSMITH, 1980:212). Referente ao nível pragmático, Goldsmith sugere que alguns conceitos são muito difíceis de serem ilustrados como, por exemplo, o conceito de “esperança”. Alega a autora, no entanto, que, se fornecido o contexto adequado, algumas dessas dificuldades podem ser superadas. Segundo Goldsmith, o conceito de “resfriado” não é facilmente representado literalmente, mas se tentarmos representar graficamente o fenômeno pelo seu contexto, ou seja, os sintomas e o comportamento das pessoas resfriadas, existem chances de se encontrar uma solução pictórica. No entanto, nesses casos, a linguagem denotativa (literal) não abarca as sutilezas do contexto cultural, sendo necessária uma abordagem mais conotativa, o que exige do ilustrador a capacidade de perceber pistas contextuais nos textos que vem a ilustrar. Outra forma de solucionar o problema é acrescentar um texto escrito contextualizando a imagem, o que pode tornar o conceito original menos ambíguo. Para Goldsmith, a atenção a esses fatores pragmáticos é o que torna a correlação entre texto e imagem pictórica possível. Embora o modelo de Goldsmith tenha sido criado especificamente para ilustrações editoriais, ele se mostra muito útil na análise de aspectos pictóricos de infográficos jornalísticos, oferecendo um vocabulário de análise semiótica simples e perspicaz, que pode ainda ser ampliado pelas variáveis sintáticas de Clive Ashwin, que veremos em seguida. No entanto, é curioso que o sistema de Goldsmith, construído em cima da teoria semiótica 54


de Morris, que foi criada visando a linguagem verbal, se revele tão perceptivo às questões de design gráfico. Sem dúvida, a experiência de Goldsmith no estudo da ilustração e sua compreensão de linguagem visual são a razão principal disso. Mas talvez o fato dela ter desenvolvido sua teoria sobe uma visão semiótica menos taxonômica, também seja um fator decisivo. Ou seja, os três níveis semióticos de Morris são simples em sua aplicação, e ao mesmo tempo se revelam ferramentas úteis na compreensão da comunicação visual.

3.3.5. Análise do cartum de Charles Addams O uso dos níveis semióticos pode ser exemplificado brevemente em um exemplo, oferecido por Goldsmith, a partir de um cartum de Charles Addams, famoso cartunista criador da “Família Addams”, ver figura 3-21.

3-21 - Cartum de Charles Addams sobre unicórnios, publicado originalmente na The New Yorker (1956) (charlesaddams.com)

Neste cartum, dois unicórnios estão debaixo de chuva, em uma pequena ilha, observando desamparadamente a arca navegando em direção ao horizonte. Goldsmith sugere que esse desenho é facilmente interpretado no nível sintático, contudo, em um nível semântico, uma criança poderia não ser capaz de identificar a arca, vendo-a apenas como um barco. Isso se deve ao nível pragmático, pois se o leitor não conhece o conto bíblico da arca de Noé, e o fato de unicórnios serem criaturas mitológicas (sua raridade está expressa no cartum), não será capaz de reconhecer os personagens do cartum. O conhecimento prévio do contexto cultural (pragmático) é essencial no reconhecimento pictórico (semântico). É importante percebemos que, enquanto muitos autores se voltam às questões de sintática ou

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semântica da linguagem gráfica, Goldsmith parece nos indicar que o princípio da compreensão visual está na relação com o leitor, ou seja, no seu contexto cultural. Portanto, é parte essencial de um projeto de uma ilustração (ou de qualquer projeto gráfico) a capacidade de prever, ou melhor, compreender o seu leitor previamente. Essa breve análise de um cartum parece sugerir que não é apenas pela taxonomia tradicional de elementos gráficos, mas através da análise das relações pragmáticas, que se pode chegar a uma compreensão da linguagem gráfica.

3.4.

Clive Ashwin e o estilo

Clive Ashwin (1982) considera que o conceito de “estilo”, especialmente na teoria das artes plásticas, é relacionado apenas a características de determinados artistas e movimentos artísticos. Para Ashwin, essa abordagem não é bastante para tratar da questão do estilo de forma satisfatória. Em se referindo à famosa pintura de Jacques-Luis David (1794), Marat Assassiné, Ashwin propõe: Nós reconhecemos que essas formas contrastantes de se lidar com a figura humana são partes inerentes aos estilos Neoclássicos e Românticos, mas, no entanto, são características essencialmente semânticas: pois não é possível se ler uma figura, em plano pictórico (...) sem antes lê-la como uma figura (ASHWIN, 1979:56). Para reforçar esse ponto, Ashwin cita Ivins (1969:61), que afirma que mudanças na “sintaxe gráfica”, ou seja, no desenho, resultam em mudanças no significado de uma imagem, concluindo, então, que uma análise de estilo deve considerar a forma gráfica também como um conteúdo semântico. Portanto, em sua abordagem mais ampla das características estilísticas de ilustrações, Ashwin (1979:51-67) sugere sete variáveis: consistência, gama, enquadramento, posicionamento, proximidade, cinética e naturalismo. Variáveis de Ashwin: o Consistência (homogeneidade/ heterogeneidade) Avalia-se se a sintaxe da representação sugere homogeneidade ou heterogeneidade. Um desenho de linha constante, por exemplo, pode ser considerado homogêneo, enquanto que uma composição com uma variedade de técnicas pode ser heterogêneo. Muitos trabalhos podem não ser caracteristicamente homogêneos ou heterogêneos, nesses

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casos a consistência não é uma variável relevante. É importante salientar que em muitos infográficos há uma tendência à heterogeneidade, uma vez que há uma mistura de texto e imagem pictórica. Além disso, há casos em que diferentes tratamentos gráficos são combinados, como fotografias juntamente com mapas, figuras descritivas desenhadas, etc.

3-22 – Ilustração de Michel Canetti (2000). Exemplo de um desenho com um traço de consistência homogênea (michelcanetti.com)

o Gama (contraída/expandida) Avalia-se se a sintaxe da representação sugere contração ou expansão. Como explica Ashwin, o estilo de desenho do cubismo analítico pode ser considerado altamente contraído, pois manifesta uma gama restrita de variações no desenho, representando um tipo de solução pictórica que trabalha a síntese da forma. Por outro lado, uma ilustração que procurar representar informação copiosa e detalhada pode precisar de um desenho sinteticamente detalhado, com bastante variação de luz e sombra. Uma sintaxe mais naturalista, como esta, é uma opção por uma gama estendida. No caso dos infográficos, a heterogeneidade pode levar a coexistência de elementos com gama contraída e expandida. o Enquadramento (disjuntivo/conjuntivo) O enquadramento conjuntivo situa os elementos principais da ilustração dentro de um ambiente, sugerindo um determinado contexto. Uma figura com um fundo branco, por exemplo, sugere uma disjunção entre a figura principal e um ambiente, focando na figura principal. Em alguns casos, a falta de ambiente no desenho (disjunção) pode ajudar à ilustração se integrar mais à diagramação.

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o Posicionamento (simétrico/casual) O posicionamento, ou arrumação, dos elementos pictóricos principais pode sugerir ordem simétrica ou casualidade. o Proximidade (perto/distante) Uma relação de escala dos elementos pictóricos principais pode sugerir proximidade ou distância. o Cinética (estática/dinâmica) Essa é uma variável que analisa a representação gráfica dentro de um contexto de tempo-espaço. Embora a representação gráfica seja estática, é possível sugerir movimento (dinâmico) pictórico de diversas maneiras. o Naturalismo (naturalismo/não naturalismo) Variável que situa os elementos pictóricos dentro de uma concepção da relação física com o mundo em que vivemos. Questões de naturalismo consideram elementos figurativos como “correção” anatômica ou relações espaciais de perspectiva. Certas ilustrações refletem a opção por uma representação não naturalista para conseguir efeitos retóricos. As variáveis propostas por Ashwin são úteis na compreensão da questão de forma e conteúdo de uma imagem pictórica, e representam uma crítica necessária às análises artísticas baseada essencialmente em movimentos artísticos. Além disso, essas variáveis são muito úteis se integradas com o sistema de análise de ilustrações proposto por Evelyn Goldsmith, como foi sugerido pela própria autora (GOLDSMITH, 1980:213). Contudo, a questão pragmática, ou seja, o contexto cultural e histórico, parece ser excessivamente desvalorizado na proposta de Ashwin. O conceito de estilo na visão tradicional da teoria das artes plásticas, no entanto, está diretamente relacionado a um contexto histórico. Por isso, como veremos no cap. 4.4, optamos por trabalhar o conceito de estilo tentando identificar tradições de estilo pictórico, mesmo que essa abordagem se utilize de métodos que sejam de alguma forma semelhantes à tradição teórica das artes plásticas. A pesquisa sobre a linguagem infográfica de Ashwin parece ter mais a oferecer como um aprofundamento da análise sintática da imagem pictórica, do que como uma análise dentro de um rótulo de estilo, como o autor propôs.

3.5.

Clive Richards e os diagramas

Clive Richards propõe uma abordagem teórica para a análise de diagramas em geral. Como definimos que a infografia seria praticamente um tipo de diagrama, a abordagem de Richards

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se mostra especialmente relevante. Além disso, podemos perceber semelhanças conceituais entre as definições de infografia e diagrama, já que Richards (2000:93) considera que os diagramas estão no meio do caminho entre textos escritos e o puramente pictórico. O conceito mais interessante para o presente estudo, em sua abordagem, é o da “metáfora gráfica”. Para Richards (2000:93), o diagrama está inserido dentro de um contexto maior, o da linguagem pictórica. Para o autor, o que distingue o diagrama de outras formas pictóricas é a capacidade de representar relações. Essas relações podem ser espaciais e não-espaciais. Nas relações espaciais, os diagramas podem ser mais ou menos literais, enquanto que nas nãoespaciais os diagramas oferecem um espaço metafórico. Richards também esclarece que o grau de correspondência dos elementos do diagrama àquilo que pretendem representar pode ser determinado dentro de uma gradação entre literal e não-literal.

3-23 - Detalhe do mapa (topográfico) do metrô de Londres de 1908 (commons.wikimedia.org)

3-24 – Detalhe da primeira edição do mapa (topológico) do metrô de Londres por Harry Beck, 1933 (commons.wikimedia.org)

Para exemplificar esses conceitos de variações espaciais e literalidade, podemos ver que na figura 3-23, um mapa de metrô de Londres de 1908, a representação procura fidelidade às relações espaciais da topografia de Londres. Contudo, na figura 3-24, podemos ver a proposta radical de Harry Beck para o mapa de metrô de Londres, onde as relações são topológicas, e não literais. Beck, que era engenheiro de formação, procurou uma solução gráfica semelhante aos diagramas esquemáticos de circuitos elétricos, que não utilizam 59


relações espaçais literais. No mapa de Beck, as distâncias entre as estações não correspondem proporcionalmente às distâncias topográficas de Londres. Beck procurou uma representação das distâncias de forma que a informação ficasse mais clara para o usuário do metrô, mostrando uma seqüência clara entre estações. Essa relação não-espacial é um tipo de metáfora gráfica. Outra variação fundamental na representação gráfica de um diagrama é entre a descrição figurativa e a não-figurativa. O exemplo dado por Richards (2000:95) para demonstrar essa variação é o da fig. 3-25, onde podemos observar que ambos os diagramas utilizam a metáfora da ramificação para mostrar relações lingüísticas. A esquematização das duas árvores é, no entanto, diferente, pois a árvore a é rica em detalhes figurativos, como folhas e galhos, enquanto que a árvore b é menos figurativa.

3-25 – “Árvores” esquemáticas (Richards, 2000:95)

Podemos sintetizar essa variação de descrição em três categorias:  Figurativo: imagem pictórica figurativa, que tende a um algum tipo de “realismo”.  Semi-figurativo: imagem esquemática.  Não-figurativo: forma abstrata. Podemos observar, também, que o sistema pictográfico ISOTYPE, desenhando por Gerd Arnz para Otto Neurath, propõe metáforas gráficas em que representações de seres humanos são reduzidas a formas sintéticas, objetivando serem as mais esquemáticas (semi-figurativas) possíveis e ainda preservar características figurativas.

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3-26 – Seleção de pictogramas ISOTYPE criados Gerd Arnz. (gerdarntz.org/isotype/people)

Embora atualmente se disponha de diversos recursos gráficos práticos, os pictogramas, inspirados no trabalho do ISOTYPE, continuam sendo mais eficientes do que fotografias ou renderizações em 3D, quando aplicados à sinalização sanitária. Uma representação figurativa que propõe fidelidade objetiva levanta o problema da especificidade de representação, ao contrário da representação menos figurativa dos pictogramas que sugerem pessoas em geral (ver cap. 4.5.2). Richards salienta que, muitas vezes, uma elaboração visual excessiva pode empobrecer o conteúdo informacional ao invés de enriquecê-lo (Richards, 2000:100).

3-27 – Modelo taxonômico para diagramas (Richards, 2000:97)

A partir destas variáveis de representação de diagramas, Richards propôs um modelo taxonômico. Observando a figura 3-27, verifica-se que o movimento vertical desse modelo

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mostra a extensão do uso de metáfora gráfica, ou seja, a variação do literal para o não-literal. O movimento horizontal, vindo do eixo central do modelo, representa o movimento do figurativo para o não-figurativo, indicando a extensão de esquematização gráfica. Finalmente, na periferia do modelo, Richards propõe três modos fundamentais de organização gráfica, mais evidentes em diagramas não-literais e não-figurativos, que são organização em agrupamento, ligação ou variação:  Agrupamento: ocorre quando elementos gráficos parecem pertencer a um mesmo grupo. Ex. apresentação de elementos que possuem uma mesma cor, forma ou limitação gráfica.  Ligação: se verifica quando elementos gráficos sugerem conectividade. Ex. através de linhas conectivas.  Variação: verificável quando os elementos sugerem gradação de valor. Ex. através de variações de tamanho, distância ou intensidades de cor. A partir do modelo proposto, é possível se fazer uma tipificação de diagramas em geral. Um diagrama de Venn, que é um exemplo de esquematização não-literal e não-figurativa, possui uma organização gráfica de agrupamento cuja aplicação característica seria a classificação de grupos de elementos. Embora as forma esquemáticas não-literais tenham uma gama de variações mais limitada do que as pictóricas literais, os problemas de compreensão de tais representações não devem ser subestimados, pois aspectos não-literais podem eventualmente ser interpretados como literais por alguns leitores. Uma criança, por exemplo, poderia ler um diagrama mostrando a evolução de um mamífero ao longo de milênios de forma literal, e imaginar que se trata da maneira como os mesmos crescem a partir do nascimento (RICHARDS, 2000:98). Como já vimos em Goldsmith (1982:124), a contextualização é essencial na leitura “correta” de qualquer imagem.

3.6.

Yuri Engelhardt e a sintaxe gráfica

Yuri Engelhardt (2002) desenvolveu uma teoria de sintaxe gráfica em sua tese doutorado, The Language of Graphics, em que propôs um sistema complexo de estrutura gráfica e uma tipologia de diagramas. Engelhardt procura conciliar teorias gráficas sintáticas anteriores, como a de Bertin (1983) e a de Richards (2000), em uma teoria sintática unificada.

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O modelo teórico de Engelhardt, no entanto, é muito complexo para ser sinteticamente explicado, por isso tentamos simplificá-lo consultando, como base, uma adaptação do modelo por Vollmer (2004), aprovada por Engelhardt.

3.6.1. Sintaxe gráfica Como Vollmer (2004:1) coloca, para Engelhardt, a sintaxe gráfica descreve a disposição dos elementos gráficos. A representação gráfica é dividida em elementos individuais e o espaço, o que ele chama de “estrutura espacial”. Estes elementos individuais, que são os ingredientes básicos da teoria de Engelhardt, são os objetos gráficos.  Objeto gráfico seria toda e qualquer representação gráfica. Um objeto gráfico, por sua vez, pode conter sub-objetos gráficos que podem ser objetos gráficos elementares ou objetos gráficos compostos.  Objeto gráfico elementar seria a unidade primária gráfica, um equivalente na teoria lingüística ao conceito de morfema, os menores componentes de significação da fala que compõem a estrutura lexical e gramatical, ou seja, a palavra. Sobre seu modo de expressão, o objeto gráfico elementar pode ser:

Objeto pictórico, que varia entre realístico e abstrato.

Objetos não-pictóricos são formas abstratas (esquemáticas), palavras e números. Ou seja, não oferecem uma correspondência literal com um objeto físico ou cena. (Engelhardt, 2000:119)

3-28 – Objetos pictórico e não-pictóricos (Vollmer, 2004)

 Objeto gráfico composto consiste em um espaço gráfico que é ocupado por objetos gráficos. Estes objetos gráficos estão envolvidos em uma série de relações gráficas.

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3-29– Pictogramas exemplificando quatro variações de objetos gráficos compostos e elementares (Vollmer, 2004)

Podemos perceber, então, que na essência da sua teoria, Engelhardt sugere que a estrutura gráfica é baseada em uma relação na qual um elemento gráfico vem a conter outro. Ou seja, um objeto gráfico pode conter outro objeto gráfico dentro de um espaço gráfico. No exemplo dado por Engelhardt (2004:47) para pictogramas (fig. 3-30), podemos ver a composição gráfica de um objeto gráfico. Nesse exemplo, sobre “gramática básica” das placas de trânsito, à esquerda tem-se o objeto recipiente (que indica permissão, proibição, atenção), no meio, o objeto conteúdo (correspondente ao tipo de veículo, tal como bicicleta, carro, avião) e, à direita, o objeto gráfico resultante (placa de trânsito). Essa relação entre as partes que resultam num todo completo define a sintaxe de um pictograma.

3-30 – “Gramática básica” das placas de trânsito (Engelhardt, 2002)

3.6.2. Atributos sintáticos  Espaço gráfico é o meio que os objetos gráficos habitam. Esse espaço é composto por 64


camadas, onde a primeira camada recebe a atenção principal.

3-31 – Como camadas se comportam, segundo Engelhardt (Vollmer, 2004)

No mapa abaixo (fig. 3-32), podemos perceber como o fenômeno gráfico das camadas pode estimular a imaginação do leitor, criando o que Clive Richards (2000) chamaria de “metáfora gráfica”. Neste exemplo, a camada do rio “flui” abaixo da camada da rua, sugerindo uma ponte (Vollmer, 2004:1).

3-32 – Mapa (Vollmer, 2004)

 Atributos visuais são forma, tamanho, cor e textura, etc. Estes atributos visuais são análogos às variáveis gráficas fundamentais de Bertin (1983), conforme fig. 3-33.

3-33 – Adaptação dos atributos visuais de Bertin proposta por Engelhardt (Vollmer, 2004:1)

65


3.6.3. Estrutura sintática A estrutura sintática de um objeto gráfico composto é uma série de relações gráficas em que os objetos gráficos constituintes estão envolvidos (Engelhardt, 2002:30), podendo essas relações ser de:  Objeto-ao-espaço, que são as relações espaciais entre o objeto e a sua posição no espaço gráfico. Ou seja, a relação métrica, etc.  Objeto-ao-objeto, que são relações espaciais entre objetos e as baseadas em atributos visuais, tais como: agregação espacial (clustering), sequenciamento linear (lineup), ligação (linking), etc., como podemos ver na quadro a seguir. Quadro de Relações espaciais objeto-ao-objeto (Vollmer, 2004:1)

Distribuição arbitrária espacial

Separador

Sequenciamento linear (lineup)

Ligação (linking)

Setas

Sobreposição

Recipiente (contâiner)

Elementos pictóricos complementares

A teoria de Engelhardt propõe uma visão dos elementos visuais distintos e de suas relações entre si e com o meio, o que é útil para compreender a complexidade dos infográficos. No capítulo 4.5, utilizaremos uma classificação de elementos sintáticos comuns a diagramas e, conseqüentemente, a infográficos, proposta por Engelhardt. 66


3.7.

Venkatesh Rajamanickam e a infografia

Já é possível percebermos algum padrão na aplicação da infografia jornalística em estudos dedicados especificamente a esse tema. Alguns autores propõem classificações de infografia como Venkatesh Rajamanickan (2005) e o brasileiro Ary Moraes. A classificação proposta por Rajamanickan (2005:9) sintetiza a infografia pelo tipo de informação e pelas formas de se representar essa informação: Tipos de informação  Espacial, descrevendo posições relativas e relacionamentos espaciais num local físico ou conceitual.  Cronológica, expondo posições seqüenciais num local físico ou conceitual.  Quantitativa, narrando escala, proporção, mudança e organização de quantidades no espaço, tempo ou ambos. Artifícios infográficos  Diagramas, mapas e gráficos (ver cap. 3.4. para uma descrição mais detalhada) Métodos de informação  Estático, que tem a informação apresentada na sua totalidade em um relance.  Animado, que possui a informação apresentada progressivamente numa seqüência linear.  Interativo, em que a informação é apresentada seletivamente baseada nas escolhas do leitor. A classificação de Rajamanickan é bastante simples e abrange não só a infografia em meios tradicionais, mas também o design digital, podendo ser facilmente aplicada por teóricos e profissionais do ramo.

67


3.8.

Ary Moraes e a infografia jornalística

O designer brasileiro Ary Moraes (1998) é um infografista experiente que trabalhou em diversos jornais brasileiros (entre eles, O Dia, Extra, Correio Braziliense e Estado de Minas), e que propõe uma tipologia dos elementos que compõem um infográfico. Para Moraes, a função principal do infográfico é esclarecer rapidamente algum assunto, através da utilização tanto de elementos textuais quanto não-textuais (MORAES, 1998, 138-149).

3.8.1. Elementos textuais São os elementos que compreendem a palavra escrita:  Título: Elemento que costuma introduzir um infográfico, de forma simples e curta.  Abertura: Conhecido no jargão jornalístico como “gravata”, é um pequeno texto usado para introduzir o tema de que trata o infográfico. Essa abertura não deve ser confundida como o lead jornalístico, que pretende resumir as informações indispensáveis para o entendimento da matéria.  Subtítulos: Entradas das partes do trabalho, podendo ser marcadas por subtítulos igualmente curtos e bastante diretos quanto à identificação dos elementos aos quais se relacionam. Os elementos textuais servem também para descrever e identificar aspectos do conteúdo da matéria. A descrição pode ser de um objeto, processo ou ação, estabelecendo relações com elementos pictóricos e textuais. Os elementos textuais descriminam funções, estabelecem relações de causa e efeito ou determinam a ordem de uma sequência. Além disso, textos pontuais, relacionados a elementos pictóricos, têm também a função de identificar tais elementos (ver fig. 3-34).

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3-34 – Infográfico em que podemos ver exemplos dos elementos textuais. Jornal O DIA (MORAES,1998:141)

3.8.2. Elementos não-textuais São os elementos de linguagem pictórica e esquemática que, segundo Moraes, já são identificáveis na prática da infografia brasileira:  Mapas: localização geográfica do fato descrito na matéria. Costumam ser sintéticos e diretos, apresentando pontos de referência facilmente identificáveis pelo leitor.  Pictogramas: são elementos usados para identificar áreas, assuntos e funções, de maneira clara e rápida (ver fig. 3-36).  Sinais Gráficos: elementos para indicar direção, movimento, localização ou destaque. Os mais utilizados são as setas (que transmitem a idéia de movimento) e as flechas (que indicam sentido, como na fig. 3-35). Além desses sinais, existem os sinais de explosão (indicando acidentes ou conflitos) e os balões (que servem para destacar alguma informação no conjunto do trabalho, ver fig. 3-36).

69


3-35 – Exemplo de flechas e bonecos. Jornal O DIA (MORAES,1998:146)

 Plantas: planificação de um espaço ou objeto importante para a compreensão da notícia.  Perspectivas: trata-se da representação tridimensional de um objeto ou local, para torná-lo mais compreensível (ver fig. 3-36).

3-36 – Exemplo de balões, perspectiva (prédio), bonecos e pictograma (bandeira do Brasil). Jornal O DIA (MORAES,1998:144)

 Bonecos: elementos gráficos, representando seres-humanos, que estabelecem uma relação de proporção, movimento ou contextualização.  Retratos: representação, inteira ou parcial, de uma determinada pessoa, podendo ser desenho ou fotografia.  Gráficos de relações de proporção: gráfico que mostra a relação de proporção entre as partes de um todo, ou a variação de tamanho de dados referentes a um elemento (ver fig. 3-37). 70


3-37 – Exemplo de gráfico de relações de proporção. Jornal O DIA (MORAES,1998:147)

 Outros desenhos: outras representações figurativas que não tenham as mesmas funções simbólicas de elementos já mencionados. A classificação de Moraes é ainda mais específica do que a proposta por Rajamanickan na sua descrição dos elementos constituintes, pois não procura abarcar a infografia como um todo, enfocando principalmente a infografia jornalística de jornais impressos.

71


4.

Variáveis para análise da infografia jornalística

72


4.

Variáveis para análise da infografia jornalística

A infografia, como já foi colocado, não é apenas um conjunto de elementos gráficos informativos, mas uma forma de comunicação jornalística. Embora atualmente exista a possibilidade de se identificar características comuns a todos os infográficos, os avanços tecnológicos têm viabilizado cada vez mais o uso de recursos visuais em matérias jornalísticas, levando a infografia a se modificar consideravelmente durante os últimos anos. Logo, o que se tem hoje como características específicas de um infográfico, pode se modificar bastante em pouco tempo. No entanto, ao lado do que é variável, temos como característica fundamental da infografia a união de imagem pictórica, esquemática e texto escrito em uma matéria jornalística, se manifestando dentro das necessidades e limitações da comunicação jornalística, sem necessariamente se fixar em uma estrutura pré-definida. Por essa razão, escolhemos privilegiar os estudos de linguagem gráfica, ao invés de ater-nos a apenas uma tipologia fixa dos infográficos. Contudo, no capítulo 4.6, oferecemos uma classificação de alguns elementos comuns a diagramas e infográficos, sugeridos por Engelhardt (2002). Como vimos anteriormente no capítulo 3, existem diferentes formas de se analisar a linguagem gráfica. No levantamento realizado, percebemos que poucas dessas formas estão voltadas especificamente para a infografia jornalística. Em razão disso, decidimos incluir alguns aspectos de diferentes classificações para que o sistema de análise abranja o conjunto dos infográficos, permitindo examinar uma variedade de espécimes ao invés de propor uma visão unificada, que se mostra pouco adequada para este tipo de objeto. Dessa forma, acreditamos estar representando de forma mais ampla a infografia jornalística. As variáveis propostas por nós definem alguns aspectos que podem se revelar fundamentais em uma análise, contudo essas variáveis não independem, necessariamente, uma da outra. Algumas podem se complementar, precisando ser analisadas em conjunto. As variáveis são: 

Configuração (cap. 4.1) A forma como a informação gráfica é configurada em um infográfico tende a ser não linear, seguindo uma estrutura semelhante à dos diagramas. Na análise da configuração da infografia, optamos por utilizar o esquema de Twyman (1979) como uma maneira de se compreender inicialmente as relações estruturais em cada infográfico. A descrição de elementos gráficos comuns a diagramas e infográficos, proposto por Engelhardt (2002), pode servir como uma complementação do esquema.

73


Tipo de Informação (cap. 4.3) 

Narração (cap. 4.3.1) Procuramos abordar o infográfico como um tipo de informação que tende a ser mais narrativa, embora muitas vezes sua característica preponderante seja descritiva.

Descrição (cap. 4.3.1) Já que boa parte dos infográficos se propõe a explicar visualmente algum fenômeno, quase todos os infográficos possuem alguma função descritiva.

Informação Temporal (cap. 4.3.2) A variável do tempo é essencial na infografia, seja para contextualizar historicamente um fato ou objeto, como acontece na linha do tempo, ou na sugestão de movimento de elemento pictórico.

Informação Espacial (cap. 4.3.3) Uma característica muito comum na infografia, em se tratando da localização de determinado fato, no entanto, a própria configuração de elementos gráficos pode sugerir relações espaciais.

Estilo, generalidade e particularidade pictórica (cap. 4.4) O estilo é a forma como qualquer uma das variáveis acima se manifesta sintaticamente. Fatores histórico-estilísticos podem ser essenciais para se entender as escolhas de tratamento em um infográfico. Além disso, a generalidade ou particularidade sugerida na representação pictórica é um aspecto determinante no estilo de um infográfico. Além dessas variáveis, propomos que há alguns elementos gráficos que são comuns à maioria dos infográficos. Elencamos alguns desses elementos no capítulo 4.5.

4.1.

Configuração

Vamos tratar adiante dos critérios para descrever a configuração de um infográfico, ou seja, a forma como elementos gráficos são organizados em um infográfico numa tentativa de identificar a estratégia de leitura de um infográfico. Para tanto, é necessário entendermos a sua estrutura. Nessa parte da análise decidimos introduzir a matriz, do esquema proposto por Twyman (1979), oferecendo uma visão geral da construção do infográfico. Para, em seguida, tentarmos compreender as escolhas de configuração do mesmo.

74


4.1.1. Esquema de linguagem gráfica verbal (LGV) Para melhor situar a complexidade construtiva dos infográficos jornalísticos, iniciaremos utilizando o Esquema de Michael Twyman (1979), procurando determinar quais as casas ocupadas na matriz por ele proposta (ver abaixo). Com isso, espera-se obter uma visão sintética da amplitude dos recursos de linguagem gráfica verbal operados simultaneamente nesse tipo de material.

Esquema para o estudo da linguagem gráfica proposto por Twyman (1979)

Modos de Simbolização

Métodos de Configuração Linear puro

Linear interrompido

Lista

Linear ramificado

Matriz

Não-linear dirigido

Não-linear aberto

Verbal Numérico

1

2

3

4

5

6

7

Pictórico & Verbal Numérico

8

9

10

11

12

13

14

Pictórico

15

16

17

18

19

20

21

Esquemático

22

23

24

25

26

27

28

Modos de simbolização Compreendem números, palavras, imagens pictóricas e esquemáticas:  Verbal numérico: diz respeito a palavras e números, em conjunto ou separadamente.  Pictórico e Verbal numérico: nessa linha da matriz, são colocadas as combinações de imagens pictóricas com palavras e/ou números.  Pictórico: refere-se a imagens pictóricas, incluindo desenhos de qualquer técnica e fotografias.  Esquemático: compreende os gráficos e tudo que não for decididamente verbal ou pictórico.

75


Métodos de configuração dizem respeito à forma de organização da informação. São os seguintes os métodos de configuração: Linear puro, Linear interrompido, Lista, Linear ramificado, Matriz, Não linear dirigido e Não linear aberto. Para melhor entendimento dessa taxonomia, recorremos, com fez Twyman, a exemplos de aplicação nas células de sua matriz.

 Célula 1- Verbal numérico / Linear Puro: de um modo geral, a linearidade do texto costuma ser interrompida nas margens do suporte. Mas alguns exemplos, como o Disco de Faistos (Creta, cerca de 1.700 A.C.) mostram a escrita se desenrolando continuamente, em espiral, de dentro para fora. 4-1 – Disco de Faistos (cerca de 1.700 A.C.), exposto no Museu arqueológico de Heraklion em Creta (commons.wikimedia.org)

 Célula 2 - Verbal numérico / Linear Interrompido: é a maneira mais comum de tratamento de textos, dividindo a linha de palavras e números de acordo com o espaço da página. Os programas de processamento de textos apresentam quatro possibilidades de organização destas interrupções: à esquerda, à direita, centralizado e justificado. Mas basta abrir uma página de revista para verificarmos que, em contato com imagens, os textos se adaptam às margens daquelas, em inúmeras possibilidades.  Célula 3 - Verbal numérico / Lista: as listas se caracterizam pela apresentação em cada linha de “unidades semânticas separadas”.  Célula 4 - Verbal numérico / Linear Ramificado: um dos exemplos mais tradicionais dessa célula são as árvores genealógicas.  Célula 5 - Verbal numérico / Matriz: nas matrizes, as células se relacionam entre si na vertical e em linha horizontal. Twyman chama atenção para as tradicionais tabelas de resultados de jogos de futebol, cujo conteúdo é numérico.  Célula 6 - Verbal numérico / Não Linear dirigido: as fronteiras entre as células 6 e 76


7 são indefinidas, sendo uma questão bastante subjetiva. A publicidade costuma usar recursos como tipos em negrito para encaminhar o olhar do leitor para partes do texto, embora a configuração deste seja linear interrompido.  Célula 7 - Verbal numérico / Não Linear aberto: não há uma quebra precisa, o que tem sido explorado pela poesia concreta.  Célula 8 - Pictórico & Verbal numérico / Linear Puro: o exemplo que Twyman dá é o da tapeçaria de Bayeux (1066), que é considerada por ele como um exemplo de imagem linear pura, com textos espalhados por toda a peça. A tapeçaria foi bordada como um contínuo narrando a conquista da Inglaterra pelos normandos, e assim está exposta em uma sala na cidade de Bayeux, cobrindo as paredes sem interrupções.

4-2 – Tapeçaria de Bayeux, representando a frota invasora do Duque Guilherme da Normandia (commons.wikimedia.org)

 Célula 9 - Pictórico & Verbal numérico / Linear Interrompido: quando essa tapeçaria é reproduzida em livros, normalmente apresenta-se em páginas, divididas de acordo com o espaço para impressão. As histórias em quadrinhos, cujas seqüências são interrompidas ao encontrarem o fim da página são um exemplo mais comum deste tipo de configuração.

4-3 – História em quadrinhos de Winsor McCay (1871-1934), Little Nemo in Slumberland (commons.wikimedia.org)

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 Célula 10- Pictórico & Verbal numérico / Lista: um dos exemplos mais comuns são as listas de pictogramas em guias de viagem, indicando as condições de acomodação em determinados hotéis ou pousadas.  Célula 11- Pictórico & Verbal numérico / Linear Ramificado: árvores demonstrando a estrutura de empresas são exemplos desta célula.  Célula 12- Pictórico & Verbal numérico / Matriz: O autor nos fornece os exemplos de tabelas, em que as células foram ocupadas ora por imagens ora por textos, o mesmo acontecendo com a identificação das células (ver fig. 4-4).

4-4 – Exemplos de tabelas que ilustram célula 12 pelo autor (TWYMAN, 1979:128)

 Célula 13- Pictórico & Verbal numérico / Não Linear dirigido: nessa célula estão situações onde a visão do leitor é atraída de diferentes maneiras simultaneamente, como é comum na publicidade e nos jornais populares.  Célula 14 – Pictórico & Verbal numérico / Não Linear aberta: o autor teve dificuldade em encontrar exemplos dessa célula, escolhendo uma foto de um campo de futebol, publicada em um jornal, na qual os jogadores eram identificados por legendas. Ficava a critério do usuário encontrar quem desejava localizar.  Célula 15 - Pictórico / Linear Puro: nessa célula estão as imagens em linha que não são interrompidas, como “a história esculpida em relevo que espirala para cima na Coluna de Trajano” (TWYMAN, 1979:130), do ano 112, situada em Roma.

78


4-5 – Coluna de Trajano (ano 112) (commons.wikimedia.org)

 Célula 16 – Pictórico / Linear Interrompido: quando pinturas formam conjuntos, como as cenas da Paixão de Cristo, por exemplo, que costumam ser colocadas em seqüência obedecendo às interrupções propostas pela arquitetura do edifício.  Célula 17 – Pictórico / Lista: a consulta a guias turísticos leva a listas de pictogramas indicativos dos serviços oferecidos pelos hotéis.  Célula 18 – Pictórico / Linear Ramificado: são raras as ramificações puramente pictóricas, tendo Twyman localizado uma ilustrando um verbete de uma enciclopédia.  Célula 19 - Pictórico/ Matriz: dificilmente as informações são apresentadas desta forma. No exemplo dado, são comparadas as condições de saúde de uma criança sem e com a assistência de um médico.  Célula 20 - Pictórico/ Não Linear dirigido: desenhos e fotografias são normalmente planejados para dirigir o olhar do leitor, embora o autor lembre que não há garantia de que isso aconteça como foi esperado.  Célula 21- Pictórico/ Não Linear aberta: é quase impossível não dirigir o olhar do observador, mas isso talvez seja conseguido em fotos aéreas.  Célula 22- Esquemático/ Linear Puro: mapas de rotas e os traçados de espectrógrafos são os exemplos apresentados para esta célula.  Célula 23- Esquemático/ Linear Interrompido: notações musicais, tradicionais ou modernas seguem este método de configuração.  Célula 24- Esquemático / Lista: Twyman não encontrou nenhum exemplo para essa célula.

79


 Célula 25- Esquemático / Linear Ramificado: o exemplo dado por Twyman foi uma árvore esquemática das línguas do mundo cujos galhos variam de espessura de acordo com a posição evolucionária de cada uma.  Célula 26- Esquemático/ Matriz: o que caracteriza as matrizes é a procura em dois eixos simultaneamente para encontrar a informação. Gráficos de linha e de barra estão nessa categoria. Twyman exemplifica, ainda, com o conjunto de unidades de espacejamento tipográfico do sistema Didot.  Célula 27- Esquemático / Não Linear dirigido: Os diagramas de rede podem ser incluídos como “não-linear dirigido”, porque apenas algumas rotas são vistas como legais. Alguns mapas tomam a forma de diagramas de rede, como o caso do famoso mapa (topológico) do metrô de Londres.  Célula 28- Esquemático/ Não- Linear aberto: Mapas (topográficos) de superfície diferem dos diagramas de rede por deixarem a maioria das opções abertas ao usuário. Algumas informações pontuais são dadas através de código de cor, símbolos e legendas. É de se observar que não se trata de um exemplo unicamente esquemático, já que existem informações textuais, problema que se estende por vários outros exemplos. É evidente que algumas células são mais freqüentadas pelos infografistas do que outras. Antes de tudo, é preciso lembrar que jornais e revistas são basicamente vistos pelos jornalistas tradicionais como meios que utilizam o modo de simbolização verbal numérico, ou seja, texto na forma linear interrompida, dispondo-os em colunas. Essa simplificação não dá conta do que é o jornal ou a revista atual. Por outro lado, apesar de sabermos da complexidade envolvida na infografia, pretendemos verificar quais os recursos mais comuns nos infográficos da amostra, embora estejamos certos de que não esgotam as possibilidades oferecidas aos especialistas. Por exemplo, o próprio Twyman não ignorou o fato de que é comum encontrar configurações híbridas, que talvez não encaixem bem no esquema por ele proposto. Afirma esse autor que o esquema elaborado é mais do que uma taxonomia, e seu objetivo foi criar um instrumento de reflexão sobre objetos gráficos.

4.1.2. Estrutura de diagrama e estratégia de leitura Twyman (1985:271-278) argumenta que a linguagem pictórica não segue regras tão bem definidas quanto a linguagem gráfica verbal. A linguagem pictórica é caracteristicamente não linear, oferecendo mais liberdade para o leitor ao possibilitar-lhe uma estratégia de leitura própria, ou seja, o leitor passa a poder escolher a forma como irá ler a imagem ou texto. Twyman sugere (1985:274-276) que imagens pictóricas compostas por elementos distintos,

80


como imagens seqüenciais ou infográficos, por exemplo, podem unir o pictórico às palavras graficamente, pontuando e guiando a leitura. Portanto, a estrutura de diagrama, a forma mais típica de um infográfico, talvez seja a chave para a compreensão de como um infográfico é configurado. Robert Waller (1985) propõe que a estrutura linear de um texto tradicional tende a uma idéia de prosa, como uma transcrição, em comunicação gráfica, da linguagem verbal. Contudo, isso pode apresentar problemas de comunicação para certos tipos de informação ou em certos contextos. Waller afirma: Alguns autores de textos científicos, por exemplo, podem ter leitores dedicados, mas onde a dedicação e atenção são menos confiáveis, a questão da acessibilidade se torna mais significativa. Jornais e revistas talvez sejam os melhores exemplos de um tipo de texto que tem desenvolvido a estrutura gráfica de seu conteúdo. Livros de referência e manuais técnicos também tem sempre reconhecido a necessidade de esclarecer graficamente seu conteúdo, e suas condições de uso certamente pedem isso (WALLER, 1985:107). Na área das publicações jornalísticas, como Waller (1985:107-108) menciona, o conteúdo informacional é criado por uma equipe de redatores, fotógrafos, ilustradores e designers, ao contrário da situação do livro linear em que se costuma ter apenas um autor, auxiliado posteriormente por uma equipe editorial. Na área do jornalismo, onde o autor tradicional é substituído, as publicações são mais planejadas e voltadas para um público alvo. Além disso, a tipografia é tratada como elemento integral e primário do discurso, sendo que a ênfase sobre as necessidades do autor, própria do livro tradicional, muda para atender às necessidades dos leitores. Conseqüentemente, maior prioridade é dada à acessibilidade do conteúdo para leitores com objetivos diferentes. Para atender a essas estratégias variadas de leitura, Waller (1985:105-108) propõe o conceito de “texto com diagrama”, ou seja, uma estrutura de texto não linear com uma qualidade diagramática. Quando o texto é colocado na forma de um diagrama, a estrutura se torna mais acessível à leitura menos linear, possibilitando que próprio leitor guie seu olhar pelo texto e crie sua própria estratégia de leitura. Logo, esses textos possuem várias colunas e malhas tipográficas muitas vezes complexas. Na pesquisa de Waller, a questão da linearidade está voltada mais para o texto (linguagem gráfica verbal) e sua estrutura. O autor não negligencia, no entanto, o papel das imagens pictóricas nesse processo. Embora não esteja centrado na infografia, podemos perceber que o estudo por ele elaborado propõe uma análise estrutural compatível com a mesma. Podemos perceber a não-linearidade da estratégia de leitura no infográfico sobre ditadores 81


sanguinários, da fig. 4-6. Neste exemplo, a narrativa começa no título e no texto de abertura, mas em seguida o leitor pode escolher quais dos textos descritivos, sobre determinado ditador, ele deseja ler.

4-6 - Infográfico da Revista Mundo Estranho. (Infográfico: Ricardo Cunha Lima e Bianca Grassetti)

No exemplo da fig. 4-7, vemos como uma informação complexa pode ser sintetizada em uma seqüência de imagens acompanhadas por textos curtos. Trata-se de um infográfico da Revista Mundo Estranho descrevendo o processo da cicatrização. Nesse caso, o leitor tem a oportunidade de compreender a totalidade do processo rapidamente e, ao adquirir essa visão geral, pode escolher qual parte da seqüência descrita que ele deseja ler em detalhe. A visão de conjunto que se obtém nesse infográfico contrasta com a estratégia linear de um texto tradicional, no qual apenas se consegue obter a visão do todo após a leitura de todas as partes.

82


4-7 - Infográfico da Revista Mundo Estranho, dezembro de 2004, pp. 62-63. (Infográfico: Luiz Iria; design: Renata Steffen; Texto: Dante Grecco)

4.2.

Conteúdo informacional

Trata-se de critério para tentar identificar a essência da informação ou a mensagem a ser transmitida. Como o conteúdo é refletido na escolhas de comunicação, é necessário tentar definir o tipo de informação visual do infográfico. O conteúdo informacional, ou um esboço do mesmo, costuma ser definido nos primeiros estágios do projeto de um infográfico, ou seja, no momento em que a pauta jornalística é determinada e comunicada à equipe interdisciplinar escolhida para criar o infográfico.

83


4-8 - Infográfico sobre como se faz uma infografia através do fluxo de atividades no ambiente de trabalho de um Jornal (infografia24horas.blogspot.com)

Podemos também ver esse critério como uma tentativa de identificação da intenção ou objetivo do infografista. Twyman (1985:252) acredita que, ao se analisar um objeto gráfico, é necessário perguntar qual o seu objetivo. No quadro a seguir podemos ver como Rajamanickan (2005) propõe uma classificação de objetivos e características de um infográfico.

84


Quadro de classificação de objetivos e características de um infográfico

Categoria

Objetivos

Características

Narração

O objetivo é explicar proporcionando

Histórias (fato, ficção) narrando certo

ao leitor uma experiência indireta da

ponto de vista.

intenção durante a história.

Instrução

Exploração

Simulação

O objetivo é explicar permitindo que o

Explicações passo a passo de como as

leitor acompanhe seqüencialmente a

coisas funcionam ou os eventos

instrução.

ocorrem.

O objetivo é oferecer ao leitor a

Essas costumam permitir que o próprio

oportunidade de explorar e descobrir

leitor descubra a intenção através da

a intenção.

exploração e racionalização.

O objetivo é permitir que o usuário

Essas permitem que o próprio leitor

experimente a intenção através de um

experimente a intenção.

fenômeno do mundo real.

A classificação de Rajamanickan evidencia as funções essenciais de infografia em geral. Mas devemos, também, procurar os objetivos jornalísticas específicos. Harold Evans (apud ANG, 2000:107), muitos anos antes de Rajamanickan, propôs algo semelhante em se tratando do uso de imagens pictóricas e fotografias em jornalismo. A informação visual é adequada ao contexto de uma publicação de massa quando oferece: 1. Animação: sinais de vida, uma fotografia, por exemplo, não deve apenas relatar um evento, mas tentar provocar uma resposta emocional no leitor. 2. Contexto relevante: mostrar o assunto representado de forma relevante é o fator que guia toda abordagem jornalística. 3. Aprofundamento do significado: dentro do contexto informacional proposto. Para Evans, o significado da imagem é determinado pelo contexto em que é apresentado: o tipo de publicação, de leitor, etc. Evans evidencia como ponto principal a relação do leitor com o conteúdo na compreensão da 85


função das imagens como informação. Essa é a questão essencial do infográfico jornalístico e dos elementos que o compõe. Dentro dos objetivos jornalísticos, o conteúdo informacional deve ser encarado como persuasivo, e não como informação neutra, pois, como Twyman e Bonsiepe sugerem (ver capítulo 3.2), persuasão e informação são interligados. Ou seja, toda informação (visual ou não) é retórica, e sua relevância e compreensão dependem da percepção do leitor. Assim como Evans, Goldsmith (1980) propõe um sistema de análise dos objetivos das imagens na comunicação (ver capítulo 3.3) ao sugerir métodos eficazes para se compreender o contexto da comunicação visual. Podemos afirmar, então, que a compreensão do contexto de um infográfico, ou seja, da relação entre o leitor e a mensagem, é determinante para compreender a construção do seu conteúdo informacional.

4.3.

Tipo de informação

Para tentarmos compreender melhor a relação entre o leitor e o infográfico, devemos tentar definir os tipos de informação visual que um infográfico pode vir a oferecer. Escolhemos três aspectos abrangentes presentes em infográficos: informação narrativa/descritiva, espacial e cronológica. Não são aspectos excludentes, muitos infográficos possuem todas essas características simultaneamente e como veremos, alguns aspectos se complementam. Por exemplo, descrever a informação espacial envolve aspectos de informação temporal.

4.3.1. Narração e descrição Podemos considerar que todo o infográfico é, antes de tudo, um tipo de informação narrativa, já que os infográficos são essencialmente matérias jornalísticas. No entanto, se analisarmos a questão da função narrativa pela forma como construímos um infográfico, os diferentes elementos podem se revelar mais descritivos, enquanto que outros se caracterizarão por serem mais narrativos. Um infográfico sobre o funcionamento da fisiologia humana, centrado em um diagrama do corpo humano, tem uma função dupla. O diagrama estará exercendo uma função descritiva do funcionamento da fisiologia, ao mesmo tempo em que participa da narrativa do infográfico, como matéria jornalística. Já uma seqüência de imagens mostrando um assalto seria narrativa na sua relação sintática seqüencial, contudo não deixa de ser descritiva, considerando que cada imagem, e a própria seqüência, descrevem o acontecimento. Portanto, na análise proposta no presente trabalho, admitimos que o infográfico possa ter ambas as funções de narração e de descrição, conjugadas ou separadamente. No entanto, Twyman (1985), em se tratando de imagens pictóricas, parece defender uma 86


postura mais radical: Todas as imagens pictóricas narrativas são descritivas na medida em que nos permitem identificar elementos em uma história; contudo isso não significa que todas as imagens descritivas precisam ser necessariamente descritivas. (TWYMAN, 1985:258) Para exemplificar seu argumento, Twyman (1982:259-260) mostra na figura 4-9 um exemplo de uma ilustração descritiva, onde a numeração não possui qualquer função narrativa, mas apenas de identificação. Já na figura 4-10, embora a ilustração seja essencialmente descritiva, ocorre uma hierarquia entre os elementos, mostrando uma separação entre frutas e sementes.

4-9 - Exemplo de descrição em ilustração

4-10 - Exemplo de narração, em ilustração

Em se tratando de um infográfico, é difícil de imaginar um contexto em que uma imagem não seja essencialmente narrativa. Twyman (1985: 252) parece estar considerando essas questões por uma visão pragmática, ao tentar pensar no papel específico de cada imagem. Esse autor considera essencial questionar sempre o propósito das imagens usadas do ponto de vista do conteúdo informacional, das limitações técnicas e do usuário. É importante mencionar que a função descritiva dos infográficos é muito citada, já que em jornalismo muitos fenômenos são difíceis de descrever apenas com o auxílio de palavras. Um exemplo de infografia dado por Twyman são as narrativas visuais dos jogos e técnicas de

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futebol (ver exemplo de Moraes na fig. 3-35), em que as setas que descrevem os movimentos dos jogadores são recursos esquemáticos que guiam a narrativa visualmente. Embora um infográfico não precise se limitar apenas à função descritiva, ela têm se mostrado determinante no uso da infografia jornalística contemporânea. No entanto, é importante sempre se considerar, em cada elemento, o equilíbrio entre seu aspecto narrativo e descritivo para se compreender um infográfico de forma abrangente.

4.3.2. Informação temporal Outro fator importante a se considerar é a representação do tempo em um infográfico. Essa é uma questão sobre a qual Edward Tufte indaga: Como reduzir a magnífica realidade do tempo, em quatro dimensões, e do espaço, em três, em pequenas marcas em papel plano? (TUFTE, 2001:119). A representação gráfica de tempo envolve uma abstração considerável, uma vez que não é fácil, em uma folha estática de papel, criar a ilusão de movimento, que necessariamente leva em consideração a noção de tempo (como no cinema). Contudo, existem diversas maneiras de se superar essas limitações, e uma das mais conhecidas são as imagens seqüenciais dos quadrinhos, um tipo de representação que Twyman (1982) chama de imagens “compostas de elementos distintos”. Outra forma bastante difundida de mostrar tempo em um infográfico é um tipo de gráfico chamado de “linha do tempo”, ou “gráfico de tempo”. Esse gráfico tem sido utilizado para relacionar historicamente um fato. Ele é construído pela representação gráfica, verbal ou pictórica de uma seqüência de eventos divididos por uma estrutura esquemática, em que cada evento é relacionando a uma data relevante.

4.3.3. Informação espacial Outros fatores mais específicos podem ser abordados, como a representação espacial em um infográfico. Em jornalismo, a representação de espaço representa freqüentemente a localização de determinado fato. Isso pode se manifestar tanto em um mapa, quanto em um desenho de perspectiva mostrando uma localização ou uma descrição de um acontecimento. No entanto, podemos também perceber que, dentro de uma página, a disposição sintática dos elementos pode sugerir uma relação espacial pictórica. Ou seja, um objeto gráfico no topo de uma página, relacionado a outro em ponto inferior, pode sugerir a idéia de alto e baixo. Tratase de um exemplo mais óbvio de como a superfície gráfica pode funcionar como uma

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metáfora das relações espaciais do mundo verdadeiramente tridimensional. Podemos perceber isso no exemplo da fig. 4-11, onde são sugeridos movimento e deslocamento espacial através de recursos esquemáticos (como setas e variação de planos) e pictóricos (como a posição das representações do avião em seqüência e a perspectiva diagonal das copas das árvores).

4-11 - Infográfico que mostra como funciona o sistema de abastecimento de água e combate aos incêndios através, entre outros recursos, do auxílio do avião Canadair (infografia24horas.blogspot.com)

Edward Tufte (1990:12-35) lembra que, embora toda imagem gráfica esteja limitada à superfície bidimensional, o conteúdo informacional que se apresenta pode ser mais rico e variado do que as duas dimensões de uma página. Para Tufte, uma das tarefas mais importantes na visualização de informação gráfica é superar a bidimensionalidade. Por isso ele analisa vários diagramas que se utilizam de métodos para: (1) ampliar as dimensões de uma superfície plana; e (2) aumentar a densidade de informação em um espaço limitado.

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4-12 - Carte Figurative (1869) de Charles Joseph Minard da Campanha de 1812 de Napoleão à Rússia (commons.wikimedia.org)

Talvez o exemplo mais conhecido, a que Tufte se refere, seja o diagrama de 1869 de Charles Joseph Minard, da campanha de 1812 de Napoleão à Rússia (figura 4-12). Tufte (1983) cita o diagrama como uma representação gráfica narrativa de tempo e espaço que mostra: Como a complexidade multivariada pode ser sutilmente integrada em uma arquitetura gráfica integrada, tão delicada e discreta que leitores mal percebem que estão observando um mundo de quatro ou cinco dimensões (TUFTE, 1983) Como Tufte coloca, vários recursos gráficos foram utilizados para descrever a trágica campanha de 1812, da qual apenas 2% do exército de Napoleão conseguiu retornar, tendo o restante da tropa sucumbido ao frio e a uma série de eventos desastrosos. Ao partir, a tropa era composta de 442 mil homens, contudo, ao chegar a Moscou, na extremidade superior direita do diagrama, restavam apenas 100 mil. Minard representa isso com o recurso, aparentemente simples, de reduzir gradualmente a espessura da faixa clara que descreve o caminho do exército. Na retirada, representada pela faixa preta, apenas 10 mil retornam. Na parte inferior do diagrama, há um gráfico indicando a temperatura em vários trechos da retirada, através de linhas relacionando o mapa ao gráfico. Desta maneira, podemos acompanhar o esforço da tropa e as baixas ao longo do percurso. Tufte (1985) resume as diferentes variáveis utilizadas por Minard:  Tamanho do exército;  Sua localização no mapa;  Vetor de direção de movimento;

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 Temperatura;  Tempo. Podemos perceber que as dimensões do espaço e do tempo são ampliadas de forma sofisticada por Minard. O que apresenta, portanto, uma narrativa complexa, com grande quantidade de informações condensadas em pouco espaço, de forma clara e precisa.

4.4.

Estilo, generalização e particularidade pictórica

A seguir, vamos esboçar um critério para tentar determinar o significado das escolhas de representação pictórica em um infográfico. Para esse critério, enfatizamos a questão do estilo de representação de um infográfico. Para Ashwin (1979:51-67), as características estilísticas de uma imagem pictórica determinam o significado semântico da mesma como informação visual. Contudo, Twyman (1985), em seu esquema de análise, considera também a questão da generalidade e da particularidade na representação gráfica. Esses pontos serão discutidos no capítulo 4.4.2. As variáveis de Ashwin oferecem um vocabulário rico para descrever ilustrações, e nossa proposta é que elas também possam ser utilizadas para análise do estilo das imagens pictóricas de um infográfico.

4.4.1. Estilo O termo “estilo” é difícil de delimitar ou definir claramente, embora seja um aspecto importante em qualquer representação verbal gráfica ou visual. Em Encyclopaedia of Drawing, Ashwin (1982:224-226) define estilo afirmando que se refere originalmente à maneira de escrever ou de se expressar, própria da oratória, tendo sido posteriormente incorporado às teorias de representação pictórica. Embora Ashwin (1979: 56) seja bastante enfático ao criticar o uso do termo “estilo”, podemos utilizar o sistema de análise desse autor sem necessariamente excluir a forma convencional de usar o termo.

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4-13- Página de um infográfico de seis páginas (e um detalhe da página seguinte, à direita) criado no estilohistórico das histórias em quadrinhos de super-heróis norte-americanos (Revista Mundo Estranho)

Muitas vezes uma correlação estilística, que poderíamos chamar aqui de “estilística-histórica”, pode ser um aspecto importante para análise de um determinado infográfico. Em se tratando de infográficos, podemos acrescentar às variáveis estilísticas de Ashwin uma análise mais convencional, que poderíamos chamar aqui de “análise estilísco-histórica”. O infográfico da figura 4-13 pode ser analisado através das variáveis propostas por Ashwin. Observarmos as páginas do infográfico pela variável de naturalismo de Ashwin. O tipo de representação escolhida para o desenho sugere duas tradições naturalistas: a) O naturalismo descritivo comum aos diagramas científicos, dando credibilidade ao relato e uma estrutura lógica para compreensão do fenômeno científico. b) O naturalismo narrativo das histórias em quadrinhos, que situa o fenômeno científico dentro da fantasia científica das histórias em quadrinhos. Além do naturalismo, poderíamos abordar qualquer uma das variáveis, sempre tentando 92


compreender o significado do infográfico pelo estilo de representação gráfica. No entanto, na mesma figura 4-13, também podemos abordar as características estilísticohistóricas mais convencionais. Podemos perceber que o infográfico foi criado no estilo das histórias em quadrinhos de super-heróis norte-americanos. O significado dessa escolha formal está diretamente relacionado ao fato de descrever um fenômeno científico que parece pertencer às histórias em quadrinhos de super-heróis. Trata-se de uma escolha das mais evidentes e significativas, do ponto de vista estilístico. Essa identificação de um estilo de história em quadrinhos de super-heróis pode ocorrer pelo fato de que uma determinada forma de se desenhar e contar histórias graficamente foi marcada historicamente pelo trabalho de desenhistas como Jack Kirby (ver fig. 4-14), entre os anos de 1930 e 1960. Esse estilo de desenho contrastado de Kirby e suas texturas expressivas continuam a influenciar desenhistas de histórias em quadrinhos contemporâneas, como Mike Mignola (fig. 4-15), Frank Miller (fig. 4-16), entre outros. Podemos dizer que essa análise estilística é semelhante à convenção de se relacionar uma ilustração a uma determinada escola artística, semelhante ao costume de identificar, por exemplo, nas ilustrações de John Howe e Alan Lee, para o livro Lord of the Rings de Tolkien, reminiscências do estilo do movimento pré-rafaelista do século XIX.

4-14- Exemplo do estilo do quadrinista Jack Kirby: Hulk à esquerda, e o Surfista Prateado à direita

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4-15- - Exemplo do estilo do quadrinista Mike Mignola para as histórias Hellboy

4-16- Exemplo do estilo do quadrinista Frank Miller para a história em quadrinhos Sin City, mostrando a gradação de textura gráfica que definiu o estilo de contraste de claro-escuro do quadrinista

4.4.2. Generalidade ou particularidade? Devemos considerar se a escolha de representação de um desenho sugere generalidade ou particularidade, pois é um aspecto determinante no seu estilo. Esse é um ponto levantado por Twyman (1985: 162-265), que enfatiza a necessidade de se pensar na escolha do tipo de representação em um argumento visual. Quando Neurath e Arntz criam a representação pictográfica de um homem para o ISOTYPE (ver fig. 4-17), sem enfatizar detalhes convencionalmente naturalistas da figura, estavam sugerindo uma idéia de generalidade da raça humana. Como Ellen Lupton (1989) afirma: Um pictograma do ISOTYPE é semelhante a uma formula científica (...) essa figura, para Neurath, era uma expressão de neutralidade (LUPTON, 1989:50). Essa neutralidade era conseguida através dessa simplificação formal da imagem. Isso possibilitava que cada figura pudesse ser repetida de forma quantitativa em um gráfico, substituindo representações abstratas, como números ou formas geométricas. Neurath

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acreditava na universalidade da linguagem visual, argumentando que se basear apenas na linguagem gráfica verbal poderia criar barreiras culturais de compreensão com o público. Isso não significa que Neurath e Arntz tenham conseguido criar uma figura verdadeiramente neutra. Contudo, seus pictogramas eram construções sintáticas que atendiam, de forma eficiente, ao tipo de representação necessária aos infográficos quantitativos do ISOTYPE.

4-17- Duas páginas da International Picture Language (NEURATH, 1936)

A idéia de que a escolha do tipo de representação influencia na informação transmitida pode ser observada claramente na teoria de histórias em quadrinhos desenvolvida por Scott McCloud (1995).

4-18 - Diagrama do livro Desvendando os Quadrinhos de Scott McCloud, demonstrando a variedade na representação de um rosto, através de uma simplificação do tratamento do desenho (McCloud, 1995:29)

A figura 4-18 é um exemplo usado por McCloud em que podemos perceber que, pelo tratamento naturalista, o rosto à esquerda pode representar uma pessoa em particular, enquanto que o rosto à extrema direita, pelo tratamento simplificado, representa um rosto humano de forma generalista. Portanto, não é possível dissociar as variáveis estilísticas da questão de generalidade/particularidade da imagem. McCloud propõe que as representações icônicas pictóricas, “imagens criadas para se assemelharem aos seus temas” (McCLOUD, 1995:27), sejam uma interpretação simbólica da 95


realidade, por mais naturalista que seja o estilo de representação. Logo, dependendo do tratamento de um desenho, podemos sugerir diferentes idéias, mesmo representando conceitualmente a mesma coisa. Observando a questão estilística do naturalismo e o problema da generalidade pictórica, podemos dizer que a idéia de representação que tende ao real é relativa a um determinado contexto e padrão de representação. Portanto, tal padrão pode refletir um repertório pictórico que informa o leitor a respeito do nível de realismo ou contexto cultural da imagem. Como vimos, um desenho no estilo de quadrinhos remete a um padrão, ou generalidade, desse contexto. Já um desenho cartunesco, como do Mickey Mouse, irá sugerir outros parâmetros de compreensão. O sistema de análise de Goldsmith (1980), abordado detalhadamente no capítulo 3.3, complementa esse problema de identidade particular através da identificação de coesão pictórica, que ela chama de unidade sintática, semântica ou pragmática. Outra abordagem esclarecedora é a proposta por Clive Richards (2000), tratada no capítulo 3.4, das variações de figuratividade e literalidade, que mais tarde Engelhardt (2002) reutilizou (ver capítulo 3.5). Talvez o aspecto mais importante do critério de estilo e generalidade seja relacionar a sintaxe gráfica do infográfico com o significado proposto pelo mesmo, já que estas características influenciam no significado de uma informação visual. Como Twyman coloca, “isso nos leva a crer que a presença inevitável de características estilísticas garante que a linguagem pictórica não deva ser considerada neutra.” (TWYMAN, 1985:287).

4.5.

Elementos gráficos do infográfico

Não há um entendimento uniforme entre os autores de quais sejam esses elementos. Cada infografista elabora sua própria série de elementos que constituem o infográfico, especialmente os infografistas têm que ter um bom conhecimento da palheta de recursos de informação gráfica disponíveis. Como foi mencionado, Nigel Holmes (2001:1) prefere usar o termo explanation graphics ao invés do usual information graphics. No seu portfólio apresentado em seu website, Holmes faz uma divisão de tipos de peças gráficas que parece sugerir que os componentes de seus infográficos (ou “explicações gráficas”) seriam gráficos, diagramas, mapas, ícones e ilustrações (fig. 4-19). Seja qual for a intenção do Holmes ao organizar seu site desta maneira, podemos perceber que cada infografista experiente acaba desenvolvendo seu próprio repertório de trabalho.

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4-19 – Divisão do repertório de atuação de Nigel Holmes no “sumário” de seu website

(nigelholmes.com)

Twyman, em seu esquema para linguagem gráfica (cap. 4.1.1), nos oferece uma classificação geral, muito eficiente, para elementos gráficos a partir da sua função como estruturas de configuração. Contudo, alguns autores fizeram tentativas de definir quais seriam os elementos que costumam ser usados especificamente em infografia. Como já vimos, para Rajamanickan (2005), por exemplo, os elementos, ou “artifícios infográficos” se desdobrariam a partir de diagramas, mapas e gráficos. Já Moraes (1998) prefere dar ênfase à abordagem de elementos textuais e não-textuais. Uma proposta abrangente vem de Yuri Engelhardt (2002) que procura identificar detalhadamente uma grande variedade de elementos usados para compor sintaticamente o infográfico. Engelhardt divide essa classificação basicamente em tipos primários (cap. 4.5.1) e híbridos (cap. 4.5.2). Contudo, estes são apenas indicadores gerais no processo de análise. Podemos perceber uma variedade e inventividade que certamente escaparia a qualquer tentativa de definir uma tipologia fixa.

4.5.1. Tipos primários Os tipos primários, definidos por Engelhardt (2002:137-142), são mapa, figura, gráfico estatístico, gráfico de tempo, diagrama de ligação, diagrama de agrupamento, tabela, símbolo e texto escrito.  Mapa: é uma das representações gráficas mais antigas (6.200 A.C.). Representa, metaforicamente, uma disposição física de superfície geográfica. Essa representação pode ser mais ou menos distorcida, dependendo no nível de detalhamento necessário, sendo possível representar determinada geografia apenas simbolicamente. Pode também representar algo fantasioso ou alegórico (ver fig. 4-20). Um mapa pode conter elementos pictóricos, como símbolos (representando cidades, por exemplo), ou não-pictóricos, como palavras, símbolos abstratos, números, etc.

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4-20 – Mapa alegórico de folhas de trevo de Heinrich Bünting, xilogravura (1581), homenageando a cidade de Hannover, cujo símbolo é um trevo. Jerusalém é representada no centro, com a Europa, Ásia e África circundando, formando folhas de um trevo (commons.wikimedia.org)

4-21 – Detalhe de infográfico (da fig. 3-5), com mapa (à esquerda) mostrando a localização geral de São Paulo em relação ao Brasil, a fim de contextualizar geograficamente o aeroporto de Congonhas (commons.wikimedia.org)

 Figura ou imagem pictórica (picture): procura representar a estrutura física de objetos físicos. Assim como o mapa, a sua representação pode ser mais ou menos distorcida em relação à sua correspondência literal com os objetos físicos. No exemplo da fig. 4-22, podemos ver várias imagens pictóricas (incluindo a fotografia) se sobrepondo e criando correlações e seqüência de leitura, acompanhadas por textos explicativos.

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4-22 – Infográfico premiado no Malofiej de 2007 (criado por Eder Reder e Rubens Paiva para Revista Saúde!) (ed. Abril)

 Gráfico estatístico (statistical chart): representação gráfica cuja estrutura serve para apresentar (e comparar) quantidades. Para isso, essa estrutura utiliza eixos métricos, divisões proporcionais (como “gráficos de pizza”) e variações de atributos visuais (como variações de tamanho, cor, claridade, etc.), como no gráfico abaixo (fig. 4-23):

4-23 – Várias abordagens de gráficos estatísticos para a palestra do 1º LIDE de 2009 (weblide.com)

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 Gráfico de tempo (time chart): representação gráfica cuja estrutura serve para mostrar o transcurso do tempo, e que, segundo Tufte, é a representação gráfica mais utilizada (Tufte, 1983:28). Ela pode ocorrer em seqüência de elementos (linha do tempo, ver fig. 4-27), ou baseado em um eixo métrico como em um relógio (fig. 4-24).

4-24 – Relógio, gráfico de tempo (Engelhardt,2002)

 Diagrama de ligação (link diagram): representação gráfica cuja estrutura consiste em ligações, ou seja, em associações gráficas entre elementos (muitas vezes representadas através de setas).

4-25 – Diagramas de ligação (Engelhardt,2002)

 Diagrama de agrupamento (grouping diagram): representação gráfica cuja estrutura serve para mostrar a categorização de determinados grupos de elementos.

4-26 – Diagramas de agrupamento (Engelhardt,2002)

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 Tabela: representação gráfica cuja estrutura consiste em seqüenciamentos (lineup) horizontais e verticais. Vale lembrar que, dentro das classificações gráficas de Twyman (1979), uma tabela é um tipo de matriz.

4-27 – Tabela (e linha do tempo) mostrando a evolução do design em diversas áreas

(guardian.co.uk)

 Símbolo: representação gráfica de objetos gráficos elementares ou compostos.

4-28 – Exemplos de símbolos (Engelhardt,2002)

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 Texto escrito: O texto escrito pode ser considerado um dos elementos que compõem o infográfico. O elemento textual, no infográfico, apresenta-se reduzido e simplificado, e tem a sua compreensão facilitada pela integração com a iconografia. A tipografia utilizada não costuma ser um dos pontos principais, embora a infografia seja também tipográfica, além de esquemática e pictórica. Ary Moraes (1999) propõe uma classificação dos elementos textuais dos infográficos como: título, abertura e subtítulos (ver capítulo 3.7).

4.5.2. Tipos híbridos Os tipos híbridos, definidos por Engelhardt (2002:142-145), são: mapa estatístico, mapa de caminho ou rota, mapa estatístico de tempo, diagrama cronológico de ligação e diagrama estatístico de ligação. 

Mapa estatístico (statistical map): é uma representação gráfica que serve como gráfico

estatístico e mapa. 4-29 – Mapa estatístico (Engelhardt,2002)

 Mapa de percurso (path map): é uma representação gráfica que serve como diagrama de ligação e mapa.

4-30 – Mapa de percurso. Detalhe da primeira edição do mapa do metrô de Londres por Harry Beck, 1933 (commons.wikimedia.org)

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 Gráfico estatístico de tempo (statistical time chart): é uma representação gráfica muito difundida que serve como gráfico estatístico e gráfico de tempo, como nos exemplos das figuras que seguem.

4-31 – Gráfico estatístico de tempo de William Playfair, considerado o fundador das representações gráficas estatísticas. Gráfico publicado originalmente em Commercial and Political Atlas, 1786 (commons.wikimedia.org)

4-32 - Nascimentos e mortes na Alemanha entre 1911 e 1926 é um famoso gráfico estatístico de tempo do ISOTYPE da década de 1920, que mostra a relação de mortalidade/natalidade durante a primeira guerra mundial. Retirado do International Picture Language (NEURATH, 1936)

4-33 – Gráfico estatístico de tempo das maiores falências na historia, utilizando barcos afundando como metáforas (awesome.good.is)

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Diagrama cronológico de ligação (chronological link diagram): é uma representação

gráfica que serve como diagrama de ligação e gráfico de tempo.

4-34 – Diagramas cronológicos de ligação (Engelhardt,2002)

Diagrama estatístico de ligação (statistical link diagram): é uma representação gráfica

que serve como gráfico estatístico e diagrama de ligação.

4-35 – Diagrama estatístico de ligação (Engelhardt,2002)

Mapa estatístico de percurso (statistical path map): é uma representação gráfica

que serve como mapa de percurso e diagrama estatístico de ligação. Um bom exemplo é o infográfico de Minard (1869), na figura 4-12.

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5. Anรกlise de Infogrรกficos da Revista Superinteressante

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5. Análise de Infográficos da Revista Superinteressante

Considerando a natureza híbrida dos infográficos jornalísticos, o seu estudo levou-nos a procurar caracterizar um infográfico através de dimensões de análise que permitem categorizar e diferenciar aspectos da comunicação infográfica. Para tanto, tomamos o universo dos infográficos da revista Superinteressante que, a partir da década de 1990, tem se destacado no cenário editorial brasileiro com o seu uso constante de infográficos.

5-1 – Algumas capas da revista Superinteressante, desde a primeira edição de 1987, no alto, à esquerda

5.1.

A revista Superinteressante

A Superinteressante, da editora Abril, é uma revista focada na divulgação científica, tratando de novidades e curiosidades históricas, culturais e científicas. Com uma tiragem entre 470 e 480 mil exemplares (em 2007), ela tem se destacado no mercado editorial, concorrendo com revistas do mesmo gênero como a Galileu, da Editora Globo. A revista tem um público leitor abrangente e diversificado, mas em geral jovem. Ao tratar de temas contemporâneos como comportamento, religião, sexo, cultura, entre outros, sempre focando temáticas científicas

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(PECHULA, 2007:217), a abordagem dessa revista privilegia as matérias “frias”, ou seja, aquelas que não lidam com acontecimentos imediatos, optando por oferecer reflexão e explicação voltada aos temas de sua especialidade. Portanto, não engloba as notícias ditas “quentes”, ou seja, as notícias abordadas pelo jornalismo diário, comuns às revistas semanais e jornais. Lançada no Brasil em 1987, quando a editora Abril comprou os direitos da revista espanhola Muy Interessante, uma revista de divulgação científica bem sucedida lançada em 1981, a revista Superinteressante começou como encarte de outras revistas da editora Abril mas, em setembro de 1987, teve seu primeiro número publicado, obtendo uma rápida aceitação pelo público leitor. Embora ela fosse baseada em uma revista de espanhola de mesmo nome, desde o início as matérias foram produzidas por uma equipe brasileira. Após uma reforma em seu projeto gráfico em 1995, a revista passou a apresentar mais infográficos. Entre 1995 e 2000, 11 edições de cada ano tiveram reportagens de capa utilizando infográficos. Embora o número de infográficos tenha diminuído a partir de 2001(RINALDI, 2007:2), a revista vem acumulando prêmios na área de design jornalístico. No ano de 2002, foi considerada pelo júri do Malofiej a revista que melhor utiliza infográficos no mundo, pelo conjunto de infografias produzidas no ano anterior (TEIXEIRA, 2006:165-166). A partir de 2001, algumas das edições especiais da Superinteressante se tornaram revistas independentes. Em agosto de 2001, a edição especial Superintrigante se torna a Mundo Estranho, uma revista voltada para responder perguntas de adolescentes. A infografia da Mundo Estranho, com um olhar adolescente, procura um estilo de desenho muitas vezes próximo ao cartum. Em seguida, surgem as revistas Aventuras na História (2003), Revista das Religiões (2003) e Vida Simples (2003), todas oriundas das edições especiais da Superinteressante que encontraram boa aceitação pelo público leitor, com exceção da Revista da Religiões, que deixou de circular em 2005.

5.1.1. Superinteressante e o jornalismo científico Segundo Lage (2001: 121-124), as fontes das reportagens científicas e tecnológicas são cientistas ou pesquisadores, de ciência básica ou aplicada. Contudo, os objetivos do cientista e do jornalista costumam ser distintos, já que um é voltado para a formação do conhecimento científico, e o outro procura transformar esse conhecimento em material jornalístico. Os conhecimentos científico e tecnológico pressupõem um alto grau de abstração e especialidade que não é desejável em jornalismo. O objetivo principal do jornalismo científico é tornar os conteúdos da ciência atraentes, exigindo o mínimo de esforço de compreensão por parte do leitor. O objetivo principal do jornalismo científico é tornar os conteúdos da ciência

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atraentes, exigindo o mínimo de esforço de compreensão por parte do leitor. Um livro didático da década de 1940 dedicava mais de cem paginas para expor o modelo do átomo (Bohr), que hoje se expõe em pouco mais de uma página e de maneira infinitamente mais clara; é que se ampliou o grau de compreensão do assunto. (LAGE, 2001:124) Atualmente, talvez seja difícil imaginar um texto para leigos com conceitos complexos de física, sem o auxílio de iconografia. Para Lage (2001), a ilustração (poderíamos incluir aqui a infografia) é a forma mais usual de humanizar a informação científica. Tradicionalmente, as pautas de jornalismo científico costumam ser centradas em quatro áreas de conteúdo: medicina, cosmologia (investigação do universo), biologia e as teorias de informação, incluindo a inteligência artificial. Contudo, a Superinteressante coloca em seu site que “traz matérias de ciência, curiosidades e tecnologia”, não se limitando às ciências exatas e à tecnologia, mas abordando temas das ciências humanas, como a história e filosofia, por exemplo. Isso indubitavelmente reflete a valorização das ciências humanas, e evidencia o fato de que a crescente oferta de informação por fontes nem sempre confiáveis amplia a necessidade de abordagens sérias dos assuntos complexos, mas de maneira agradável e acessível aos leigos. Conclui-se, então, que a pauta da Superinteressante é muito eclética, sem um padrão fixo de reportagens, adaptável aos interesses flutuantes dos leitores.

5.1.2. Corpus da análise A Superinteressante foi escolhida pela sua importante participação na difusão e desenvolvimento dos infográficos no Brasil. Para a análise, foram selecionados três infográficos retirados da sua edição especial As 20 Melhores Matérias da História da Super. Como o infográfico foi definido como uma informação jornalística que se diferencia da iconografia tradicional por poder ser a fonte principal de informação na página, o critério determinado na escolha das matérias foi a relação de hierarquia da infografia como matéria jornalística. Seguindo esse critério, percebe-se que os infográficos da Superinteressante costumam pertencer a três grupos principais, dos quais selecionamos os infográficos para participar do corpus da pesquisa:  Infográfico independente de outra matéria: é aquele que não é subordinado a uma matéria principal, costumando tomar o espaço de uma a duas páginas inteiras. Os selecionados foram:

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A história da Terra (publicado em setembro de 2002)

E se... existisse vida em todo o sistema solar? (publicado em junho de 1999)

 Infográfico que complementa a matéria principal: é aquele que é subordinado a uma matéria principal, costumando ocupar o espaço de menos de uma página inteira. O selecionado foi: 

O Mapa da Insensatez (publicado em abril de 2006)

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5.2.

Infogr谩fico: A Hist贸ria da Terra

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5.2.

Infográfico A História da Terra

Tema do Infográfico Este infográfico, intitulado “A história da Terra”, trata da evolução do planeta desde a sua origem até ao surgimento dos seres humanos. Toda essa informação é condensada no espaço de uma página dupla que apresenta diferentes formas de se expor a informação. Contudo, esse infográfico é basicamente uma linha do tempo (horizontal), ou seja, um tipo de gráfico que descreve uma seqüência de eventos sucessivos. Trata-se de uma linha de tempo bastante complexa, com várias camadas de informação e uma configuração de elementos que incorpora a forma da estrutura do planeta Terra. 5-2 - Infográfico da revista Superinteressante (criado pelos Infografistas Luís Iria e Rodrigo Maroja, texto de Denis Burgierman)

Configuração Nesse infográfico temos várias estruturas para direcionar a leitura, dentro da limitação de uma página dupla da revista. Podemos acompanhar uma grande linha do tempo que guia o olhar do leitor de forma narrativa (da esquerda para a direita). Outra estrutura é a numeração de textos, dando direcionamento ao texto narrativo e induzindo a uma seqüência de leitura. Podemos também perceber que há diferentes características das fases evolutivas da Terra que são descritas graficamente ao leitor, possibilitando aspectos diferentes de compreensão do assunto. O leitor tem liberdade para seguir caminhos diferentes na leitura. Para entendermos a complexidade de opções operadas pelo infografista, vamos utilizar o Esquema de Michael Twyman (1979), descrito no capítulo 4, indicando as células que foram ocupadas na matriz. Além disso, devemos lembrar que Engelhardt (2008) afirma que elementos gráficos são ordenados sintaticamente entre si e, dentro do espaço gráfico, existe 111


um tipo de hierarquia entre os elementos localizados em camadas. Ao observarmos o infográfico em questão, percebemos que alguns elementos se sobrepõem em camadas que guiam a narrativa (ver fig. 5-3). Começando pela parte superior da página, temos os textos (em linguagem verbal numérica configurada como linear interrompido) com recursos gráficos que direcionam o olhar do leitor para o canto superior esquerdo, onde se inicia a narrativa pelo título. Ou seja, a primeira camada, que representa uma explosão ao lado do título, inicia a narrativa. Em seguida, as duas fases do globo terrestre, que se sobrepõe, são pontuadas por textos que introduzem e narram as fases iniciais do planeta.

5-3 – Estrutura em camadas do infográfico guiando a narrativa. A função das letras é apenas evidenciar as diferentes camadas

Seguindo o Esquema de Twyman, nesse infográfico o conteúdo da informação é colocado em uma grande matriz, ou tabela, cujas colunas se curvam como meridianos terrestres. Apresenta cinco divisões horizontais que marcam diferentes camadas, sendo que a primeira (a maior e principal) é a que reúne as informações pictóricas (d). A segunda seqüência (e) corresponde aos títulos de uma tabela tradicional, com as datas (linguagem numérica), seguidas por textos (linguagem verbal numérica em configuração linear interrompida), que ocupam a terceira linha da tabela (f). A seguir, uma linha fina indica as eras geológicas (g), diferenciadas por cores, combinando o verbal (texto) com códigos

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(esquemático). Por fim, a última linha (h) é completada por desenhos de globos terrestres, que são esquemáticos. Embora todo esse conjunto de elementos seja uma linha do tempo, nome tradicional para este tipo de discurso, a sua configuração é de matriz (ou tabela). Nessa tabela, os títulos das colunas foram deslocados para a parte inferior do infográfico, o que mostra a liberdade do infografista com esse tipo de representação. Os modos de representação são os mais variados, indo do texto que Twyman caracteriza como verbal numérico, ao pictórico, passando por configurações esquemáticas como mapas, incluindo um interessante código de cores que é uma variante esquemática incomum. A mistura dos três modos de simbolização, verbal numérico (texto), pictórico (desenhos) e esquemático (mapas e códigos de cor), em um mesmo modo de configuração, uma matriz ou tabela, não está previsto no esquema de Michael Twyman, demonstrando a vitalidade dos infográficos no uso das possibilidades da linguagem gráfica.

Narração A estrutura no infográfico em questão é narrativa e descritiva quando relata os aspectos essenciais do cada fase do planeta. Como podemos ver na seqüência (fig. 5-4), a narrativa começa à esquerda e termina à direita (seguindo a direção da leitura ocidental). Essa narração é pontuada por datas específicas, que subdividem a narrativa em fases. Isso possibilita uma síntese de uma história de caráter científico que, de outra maneira, poderia ser complexa demais.

5-4 – Narrativa do infográfico dividida em começo, meio e fim

Na medida em que essa narrativa é dividida por fases distintas, ela ganha uma estrutura clara de conto com começo, meio e fim:

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 Começo: o primeiro quadro narrando a explosão estelar que deu origem ao planeta.  Meio: a formação geológica e biológica da Terra.  Fim: o surgimento dos seres humanos exemplificado por um humanóide de perfil. Dessa maneira, o caráter de conto traz uma familiaridade subjetiva à narrativa. Do ponto de vista científico, essa narrativa aborda as concepções da física sobre a formação da Terra, e do ponto de vista biológico, a narrativa está centrada na teoria da evolução das espécies de Charles Darwin. De uma maneira mais subjetiva, poderíamos dizer que esse infográfico resgata os aspectos míticos da narrativa bíblica da criação do mundo em 7 dias. No Gênesis, a criação se inicia com o surgimento da luz e a formação da Terra, seguidos da criação dos animais, do jardim do Éden e finalizando com a criação dos seres humanos. Na narrativa do infográfico, no início temos a explosão da estrela, podendo ser lido subjetivamente como a criação da luz, e nas últimas fases há uma aglomeração de vegetação e animais, sugerindo um ”jardim do Éden” (fig. 4.1.2). A função da utilização de uma narrativa mítica de correlação subjetiva é uma aproximação cultural do leitor com a narrativa do infográfico, criando mais interesse e envolvimento do leitor com a narrativa. Pode-se dizer que a utilização de correlação subjetiva encontra limites, não podendo descaracterizar a proposta principal da narrativa que é a transmissão de informação científica.

Informação temporal Uma forma bastante difundida de representar tempo em um infográfico é um tipo de gráfico denominado de “linha do tempo”, que Engelhardt chama de “gráfico do tempo”, e Twyman de “lista pictórica”. Esse tipo de gráfico tem sido usado com freqüência para relacionar historicamente um fato.

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5-5 – Detalhe do Infográfico da revista Superinteressante dando ênfase a três linhas do tempo

Da mesma forma que um globo terrestre está dividido em linhas imaginárias horizontais e verticais, nesse infográfico o autor escolheu a mesma convenção gráfica das colunas verticais. Isso funciona em uma estrutura esquemática de linhas que acompanham o formato da Terra, oferecendo faixas verticais nas quais são colocados os fatos que ocorreram em cada faixa temporal. Trata-se de uma linha do tempo construída pela representação gráfica, verbal e pictórica de uma seqüência de fases históricas do planeta Terra. Essas fases se comportam como uma lista e estão delimitadas por um fio branco que contrasta com a cor azul do planeta no fundo. Além disso, essa mesma linha do tempo contém camadas (mencionadas na fig. 5-3), em que outras linhas do tempo complementam a linha principal. O conteúdo textual e esquemático principal da linha do tempo está situado na base do infográfico. Percebemos as mudanças gerais do planeta em uma seqüência em que as primeiras três fases são dividas em fases de bilhões de anos, e as seguintes a cada 100 milhões de anos. Cada uma dessas fases é acompanhada de representações pictóricas ricas em detalhes.

5-6 – Detalhe

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Em seguida, uma segunda linha do tempo complementar aponta as fases geológicas, em relação às da linha principal, através de um degradê de cores diferenciando cada uma.

5-7 – Detalhe

A última linha do tempo descreve as mudanças físicas do planeta através de uma seqüência de pequenos globos terrestres. O que torna esse infográfico coeso é que todos os elementos descritos se relacionam entre si, o que possibilita que todos os elementos esquemáticos e pictóricos contribuam para a mesma narrativa. Cada um oferece uma seqüência de informação diferente ao longo da narrativa.

5-8 – Detalhe

Informação espacial A informação espacial é mais evidente na descrição da formação de cadeias de montanhas e oceanos, na linha do tempo das fases geológicas. Para relacionar vários fatores simultaneamente, o infografista teve a idéia engenhosa de usar as linhas das coordenadas meridionais para separar as fases históricas do planeta. No entanto, usar um elemento esquemático para representar outro diferente poderia, eventualmente, confundir os leitores. Curiosamente, isso não ocorre nesse caso. Para entendermos isso, podemos usar os conceitos de unidade semântica e pragmática propostos por Goldsmith (1980: 206-208). As imagens clássicas do globo (ver fig. 5-9) são muito coesas culturalmente, de forma que praticamente qualquer leitor, ao ver um globo, com linhas formando uma matriz em sua superfície, reconhece que se trata de um globo terrestre (unidade semântica e pragmática).

5-9 – Ambas imagens do globo terrestre, um com suas linhas de coordenadas meridionais (à esquerda) e o outro (à direita) um símbolo genérico de globo, são representações clássicas do mesmo (commons.wikimedia.org)

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No entanto, embora as próprias linhas das coordenadas geográficas sejam elementos reconhecíveis, podemos argumentar que é possível se reconhecer um globo terrestre sem se dar conta do significado das mesmas. Ou seja, é possível que as linhas das coordenadas geográficas possuam menos unidade pragmática, ou familiaridade como o público leitor em geral, do que a forma convencional do globo terrestre como um todo. Em outras palavras, ambos os globos da fig. 5-9 são imagens tão difundidas que o reconhecimento das linhas meridionais é menos imediato do que a forma paradigmática do próprio globo terrestre. Por isso podemos concluir que, nesse infográfico, trocar ou anular o sentido original da estrutura esquemática do planeta não provocou confusão para o leitor. Outro fator espacial importante nesse infográfico é a profundidade espacial, ou seja, o conceito que para Goldsmith (1980: 208) é de localização sintática e que para Engelhardt (2008: 30) é o do espaço gráfico, que já foi mencionado no início dessa análise no item Configuração.

Descrição e estilo Quanto aos aspectos descritivos, o desenho realista de fenômenos geológicos, dos animais e das plantas tem a função de descrever cada um deles e localizar onde, na narrativa, se colocam os elementos descritos que vão surgindo e desaparecendo. O conteúdo semântico do infográfico influiu na escolha de estilo de representação do infográfico em análise. Podemos perceber que se procurou um estilo de reprodução fotográfica do planeta Terra, sugerindo dessa forma uma idéia de particularidade pictórica (Twyman, 1985), ou seja, foi necessário que houvesse um tipo de unidade semântica (Goldsmith, 1980) na representação, de forma que os animais e o planeta fossem representados com um nível de detalhamento cuja função foi sugerir: 1. A identificação das espécies de animais ou tipo de mudança geológica em questão. 2. A dramaticidade de um acontecimento que não foi registrado fotograficamente. Isso ocorre pelo detalhamento fotográfico e a sugestão de movimento (ação) na representação, o que faz parecer que estamos observando um acontecimento factual. Podemos perceber isso na fig. 5-4, especialmente na imagem dos répteis se movimentando para fora da água. Isso é apenas um tipo de representação sugestiva secundária, pois a real função dessa representação de movimento, como já foi mencionado, é a de mostrar narrativamente as fases de transição evolutiva (de seres aquáticos para criaturas terrestres, por exemplo). Podemos perceber que essa especificidade mencionada é realizada pelas técnicas de ilustração

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de que esse infográfico faz uso, ou seja, de recursos digitais que misturam fotografias de animais e texturas naturais (como de plantas e pedras) com pinturas digitais. Contudo, o estilo de ilustração quase fotográfica da vida pré-histórica tem uma tradição anterior à ilustração digital.

5-10 – Essa ilustração é uma pintura a guache de Milton Alves (Superinteressante, março de1991)

A ilustração da matéria A Última Caçada da revista Superinteressante (fig. 5-10) foi feita em guache por Milton Alves 10 anos antes do infográfico em análise, quando programas de manipulação fotográfica, como o Photoshop, ainda não tinham se tornando ferramentas comuns nas redações das revistas brasileiras. Percebemos claras semelhanças estilísticas entre a ilustração digital de Luís Iria e o trabalho de Milton Alves. Em ambos os casos, percebemos uma riqueza de luz e sombra, e uma aparente precisão anatômica que revelam a preocupação com a verossimilhança das imagens. Podemos perceber que, em ambos os trabalhos, o apuro pictórico tem uma função essencialmente dramática, já mencionada, de tornar “reais” criaturas e cenas nunca vistas por humanos.

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5-11 – Detalhe

Na figura 5-11, um detalhe do infográfico em análise, podemos ver que, embora a representação seja aparentemente fotográfica, os dinossauros e animais pré-históricos não seguem uma clara relação de escala. Goldsmith (1980) descreveria esse fenômeno como uma questão de locação semântica, situação em que cada um dos elementos é facilmente reconhecível pelo observador, e que determinadas figuras estão em seqüência em um mesmo plano, sendo que a proporção de escala entre eles passa a ser relativizada. Um animal pequeno, que recebe uma ênfase em escala, como o roedor abaixo da borboleta, pode parecer consideravelmente maior que o rinoceronte à sua frente. Isso demonstra que a relação entre os elementos não pretende ter qualquer precisão semântica relativa à escala, e os elementos apenas exemplificam, de forma genérica, a evolução dos animais nas diferentes fases da Terra.

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5-12 – Seqüência clássica da evolução humana (commons.wikimedia.org)

A função da imagem da figura 5-11 é diferente da função da imagem da seqüência, bastante difundida, de evolução da raça humana (ver fig. 5-12), em que a variação de escala entre cada figura é fundamental para mostrar as diferenças de características entre as fases evolutivas. A função da ilustração da figura 5-11 é representar de forma genérica a variedade de vida ao longo de diferentes fases geológicas, culminando com o surgimento do ser humano. Já que o foco nesse infográfico é mostrar a evolução do planeta Terra, através de uma linha do tempo, sem precisar descrever detalhadamente a fauna e flora terrestre, as relações entre os elementos representados sugerem mais abundância, evolução e variedade, do que precisão biológica. O desafio do infografista, neste caso, é o de alcançar a síntese narrativa sem a perda dos aspectos descritivos que representam cada uma das fases em que a seqüência temporal foi dividida. O infografista, resolvendo esta questão, acrescentou uma dimensão mítica, a da narrativa bíblica, que acentuou aspectos subjetivos de admiração pela história do planeta, aumentando a possibilidade de cativar a atenção do leitor.

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5.3.

Infogrรกfico: E se... existisse vida em todo o sistema solar?

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5.3.

Infográfico: E se... existisse vida em todo o sistema solar?

Tema do Infográfico Este infográfico, intitulado “E se... existisse vida em todo o sistema solar?”, faz parte de uma seção da revista Superinteressante que responde perguntas dos leitores, chamada “Super Respostas” (o logotipo que identifica a seção está localizado no canto superior esquerdo juntamente ao título do infográfico). Na abertura da matéria, a equipe jornalística da revista é referida em terceira pessoa, como “A Super”, e o texto dá a entender que cientistas de diversas áreas (química, anatomia, fisiologia e astronomia) foram questionados: “Qual a forma que os eventuais ETs deveriam ter para sobreviver em cada um dos planetas do sistema solar?”. O infográfico oferece basicamente a descrição gráfica verbal e pictórico-esquemática desses seres, e o meio ambiente de seus respectivos planetas, utilizando uma linguagem verbal em um estilo jovem, fazendo uso de termos coloquiais para descrever fenômenos científicos. Há semelhanças entre esse infográfico e o anterior (“A história da Terra”), primeiramente porque ambos lidam com teoria de evolução biológica, proposta inicialmente por Darwin. O infográfico anterior tratava de fatos históricos da evolução do planeta, enquanto que nesse infográfico é oferecida uma especulação sobre como seria o resultado de uma evolução biológica alternativa em diversos planetas do sistema solar. 5-13 – Infográfico da revista Superinteressante (criado pelo infografista Luís Iria, texto de Tereza Venturoli)

Configuração e Narração Trata-se, mais vez, de uma matriz (tabela), assim como no infográfico “A história da Terra”, mas estruturalmente diferente. A parte superior, assim como no infográfico anteriormente analisado, é ocupada pelo título da seção, pelo título do infográfico e por textos secundários

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com atributos para chamar atenção para a informação contida na matéria. A matriz tem oito colunas encabeçadas por títulos, seguidos de textos (verbal), com linhas de desenhos (pictórico), seguidas por planetas (esquemático-pictórico). Esta linha final tem o fio separador evidente, contornando as formas esféricas dos planetas. As representações pictóricas por vezes extrapolam as fronteiras delimitadas das colunas, que por sua vez são marcadas por tonalidades dominantes das representações pictóricas. Na fig. 5-14, evidenciamos a estrutura da matriz, mostrando que as colunas são compostas por três linhas de células, onde cada uma possui uma função. Verificamos, contudo, que a primeira e a terceira linhas têm funções análogas, mas se utilizam de linguagens diferentes: uma é escrita (verbal-gráfica), enquanto que a outra é esquemático-pictórica. A primeira linha possui textos escritos cujos títulos (que definem os planetas em questão) têm a função de categorizar as colunas. A terceira linha tem uma função análoga, pois categorizam as colunas através de representações esquemático-pictóricas dos planetas.

5-14 – Estrutura da configuração em matriz do infográfico

Uma variante da linha do tempo matricial faz uso das três variedades da linguagem verbal, simultaneamente, de forma não prevista no esquema de Twyman. Do ponto de vista de como a estrutura desse infográfico guia a leitura, percebemos inicialmente que o conjunto trata-se uma matriz. No entanto, devido ao caráter narrativo do conjunto e descritivo de cada célula, as expectativas de leitura são diferentes. O leitor pode ser atraído para uma das células pelo conteúdo imagístico. É possível que, a partir deste ponto, leia o texto de uma única coluna, e assim por diante. No esquema de Michael Twyman, esse método de configuração não linear é independente das linhas de texto, oferecendo

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opções de leitura dirigida, o que corresponde a um tipo de leitura comumente explorado nas revistas, num hibridismo entre a matriz e a configuração não linear dirigida. Contudo, essa configuração em que se pode iniciar a leitura em qualquer uma das colunas da matriz reflete o conteúdo informacional do infográfico. A não linearidade de leitura entre colunas se deve ao fato do conteúdo informacional de cada coluna ser independente. Como acabamos de mencionar, a narrativa deste infográfico não se baseia em um movimento horizontal seqüencial, pois a informação em cada coluna é distinta da outra. No entanto, verticalmente, as colunas possuem informações coesas entre si. Mesmo assim, a informação oferecida nesse infográfico é muito mais descritiva do que narrativa, ao contrário do infográfico “A história da Terra”, em que não há uma sugestão de narratividade com início e fim. A intenção dos autores desse infográfico parece ser apenas de responder descritivamente uma especulação de cunho científico, utilizando diversos recursos gráficos. Informação Temporal e Espacial As representações pictóricas das criaturas vivas dos diversos planetas extrapolam as suas células invadindo um pouco as colunas laterais. A intenção disso não parece ser unificar as imagens pictóricas de cada coluna, mas sugerir movimento e pluralidade de criaturas vivas (ver fig. 5-15), o que Ashwin (1982) classifica como cinética dinâmica. Podemos afirmar, ainda, que as representações dos planetas devem ser classificadas, ao contrário, como uma cinética estática, pois a função dos planetas é o categorizar, não o de situar dramaticamente alguma informação visual.

5-15 – Detalhe

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Esse recurso, de se ultrapassar os limites de um quadro, fazendo uma figura parecer se movimentar ou, como na fig. 5-16, de criar uma relação mais dinâmica entre os quadros, é comum nas histórias em quadrinhos. 5-16 – Detalhe de

uma página da história em quadrinhos de Moebius e Jodorowsky (Après L’Incal, Vol.1) (MOEBIUS, 2000:7)

Embora a representação de movimento possa sugerir uma relação temporal, nesse caso, podemos afirmar que o movimento entre células tende a sugerir uma mudança na relação espacial. Aliás, a informação espacial está bem presente nesse infográfico, pois o infografista, ao incluir os planetas se sobrepondo às cenas pictóricas (ver fig. 5-15), consegue mostrar uma diversidade de aspectos espaciais em áreas gráficas reduzidas. A locação semântica (Goldsmith, 1980) é determinada diretamente pela representação discreta de cada planeta, enquanto que a sensação espacial de profundidade e ambientação do local e das criaturas é realizada nas representações pictóricas, sintaticamente mais ricas.

Descrição e Estilo Verifica-se que esse infográfico se utiliza basicamente de recursos que sugerem relações espaciais e descrição. Tanto no texto escrito, quanto nas imagens pictóricas, percebemos uma valorização da descrição desse cenário hipotético. Embora as representações pictóricas tenham funções variadas, tanto os planetas quanto as cenas com seres vivos, elas possuem uma consistência homogênea, usando o termo sugerido por Ashwin (1979). A consistência no tratamento gráfico dá uma unidade às diferentes representações. Essa unidade sintática contribui para o conceito de locação semântica, citado acima, sugerindo que os planetas e os ambientes são interligados semanticamente.

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Complementando isso, vemos que o estilo pictórico desse infográfico é predominantemente naturalista, por tentar uma correlação visual com fenômenos físicos da natureza (ASHWIN, 1979). Contudo, como os fenômenos representados no infográfico em análise são apenas especulações científicas, poderíamos considerar esse naturalismo como relacionado a fenômenos de ficção-científica. Se compararmos esse infográfico com o anterior (“A história da Terra”), percebemos que, embora o anterior seja mais complexo estruturalmente e mais rico em informação, há semelhanças em estilo de representação. Isso não é de se estranhar, já quem ambos foram elaborados pelo mesmo infografista, Luiz Iria 3. Em ambos, os casos o naturalismo especulativo caminha para uma forma de foto-realismo, oferecendo certa dramaticidade visual que sugere que aqueles ambientes e seres fictícios poderiam existir, mesmo que apenas teoricamente.

3

Luiz Iria é um dos infografistas mais premiados no Brasil e seu estilo pictórico marcou a revista Superinteressante. Trabalhos realizados por um mesmo ilustrador ou infografista podem apresentar certa consistência no tratamento, que pode se caracterizar como um estilo pessoal. Ao contrário do mundo das artes plásticas, no contexto do design gráfico, as vantagens de um estilo próprio são relativas. O estilo próprio de um profissional do design pode conformar a identidade visual de uma publicação, levando a mesma ser rotulada pelo seu estilo, assim como um ator pode ser rotulado por um tipo específico de atuação. A adoção de um estilo próprio pode ser interessante para coesão visual de uma publicação, mas pode se tornar cansativo para o público leitor se, a longo prazo, o estilo adotado não se adequar aos conteúdos informacionais oferecidos. Nigel Holmes (fig.2-5), por exemplo, possui certa “assinatura gráfica” bem distinta. Não vem ao caso questionar se essa consistência estilística é algo desejável para o próprio profissional. Verifica-se, no mundo da infografia, certa tendência a privilegiar o estilo naturalista, ou pictórico-esquemático, mas, a princípio, o que dita o estilo de representação é o conteúdo informacional. Na medida em que a temática da infografia vai se diversificando, os estilos de representação também precisam fazer o mesmo. Um exemplo dessa diversificação estilística pode ser encontrado na revista Mundo Estranho, que incorporou um tom menos “adulto” às matérias, oferecendo, muitas vezes, uma linguagem mais cartunesca e lúdica do que se costuma ver na infografia contemporânea (ver fig.2-4).

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5.4.

Infogrรกfico: O Mapa da Insensatez

127


5.4.

Infográfico: O Mapa da Insensatez

Tema do Infográfico O infográfico intitulado “O Mapa da Insensatez” faz parte da reportagem de capa “Doutores da Agonia”, de oito páginas, que relata as experiências desumanas dos cientistas nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. Considerando o tipo de conteúdo em questão, a matéria assume um tom mórbido, tanto no texto quanto na aparência visual, utilizando fotos perturbadoras das vítimas e textura de sangue que proporciona uma unidade visual entre as páginas.

5-17 – Terceira e quinta páginas da reportagem “Doutores da Agonia”

O infográfico, que está na quinta e sexta páginas, utiliza um mapa topográfico simplificado da Alemanha, Polônia, República Tcheca, Áustria e Eslováquia, para localizar os campos de concentração onde as experiências eram realizadas, descrevendo-as textualmente. As legendas dos seis campos de concentração apontados informam:

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1.

A numeração que indica a que campo de concentração a legenda se refere no mapa;

2.

O nome do campo de concentração;

3.

O período de tempo em que o campo de concentração esteve ativo, com meses e anos;

4.

Os números de mortos;

5.

Parágrafos com descrições das experiências realizadas nos locais.

5-18 – Detalhe de uma legenda do infográfico

5-19 – Infográfico da revista Superinteressante (criado pelos Infografistas Luís Iria e Rodrigo Maroja, texto de Denis Burgierman)

Configuração Mapas são exemplos de linguagem esquemática, combinada com palavras que são organizadas em linhas interrompidas. Além disso, vários elementos e cores simbólicas somam-se à imagem, codificando as informações. Os mapas não costumam sugerir um trajeto de leitura, sendo vistos como não-linear abertos, ou seja, abertos a uma leitura não direcionada. No entanto, o uso de símbolos (estrelas e suásticas), de números e de atributos visuais como cor e tamanho, cria uma diferenciação entre elementos que dirige o olhar. O conjunto do infográfico sugere que as três colunas de fundo escuro estejam integradas ao todo, contendo as duas primeiras uma lista de seis itens, e a última um texto entre aspas, em caixa alta, que representa um depoimento relacionado ao texto principal, ao qual o infográfico está claramente submetido. As texturas escuras sugerindo sangue, juntamente com as citações textuais em caixa alta, entre parênteses, estão presentes não só no infográfico mas ao longo de toda reportagem, dando uma unidade visual entre o infográfico e a matéria.

Informação Espacial e Temporal

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Em se tratando de um mapa, são as relações espaciais que guiam a leitura. No próprio mapa, vários elementos e cores simbólicas codificam as informações. Eles são:

Suásticas Simbolizando os campos nazistas

Estrelas Pontuando o nome das cidades onde os campos de concentração estiveram localizados

Cor vermelha escura A função da cor vermelha é simbólica, servindo como fator de diferenciação entre elementos. A textura sugerindo sangue simboliza a brutalidade nazista e o sofrimento das vítimas. O vermelho também serve para marcar os limites esquemáticos geográficos dos países e para que haja uma unidade hierárquica entre as cidades, os limites geográficos, as estrelas, os números das legendas e os nomes das cidades, pois todos foram representados com o mesmo vermelho. Além disso, para diferenciar os elementos do mapa e suas legendas, o fundo de textura vermelha escura foi usado para contrastar com o fundo branco do mapa. Ou seja, através desse recurso, os elementos gráficos do mapa em vermelho escuro (sobre o fundo branco) passam a se diferenciam das legendas em branco (sobre o fundo vermelho escuro)

Cor preta Utilizada na tipografia dos nomes dos países e nos símbolos de suástica. Sua função é hierárquica, ao se diferenciar dos elementos geográficos e de outros símbolos em vermelho. Além disso, os elementos em preto se destacam da massa daqueles em cor vermelha, levando o leitor a identificar mais rapidamente os campos de concentração e os nomes dos países. A razão disso parece ser o fato dos autores (do infográfico) acharem que essas são informações essenciais que os leitores deveriam ter contato mais imediatamente

A relação temporal do infográfico se limita à informação textual sobre o tempo de duração dos campos de concentração, situada discretamente abaixo dos títulos das legendas.

Narração e Estilo No infográfico em si, a narração está claramente presente nas descrições textuais das experiências nos campos de concentração e na citação à direita do infográfico, em que uma testemunha relata as atrocidades. 130


Podemos perceber que há um contraste na mistura da textura orgânica (sangue) com a precisão esquemática do mapa. Analisando a matéria como um todo, o leitor pode ter a sensação de estar em contato com arquivos e mapas antigos, sujos com sangue das vítimas. É claro que isso é uma sugestão simbólica, não pretendendo ser literal. Esse recurso de contextualização simbólica cria uma ambiente de leitura para o leitor mais amplo do que as dimensões de uma superfície plana das folhas da revista. Como já foi mencionado (cap. 4.3.3), Tufte (1990:12-35) defende que uma das possibilidades da linguagem gráfica é superar a bidimensionalidade da superfície do papel. Curiosamente, a estrutura formal da matéria (e do infográfico) como um todo é bem ordenada, mas essa textura de fundo oferece o que, utilizando um termo de Ashwin (1982), seria uma arrumação ou posicionamento casual. Ou seja, a textura de sangue transforma a ordenação tipográfica da matéria, em algo que sugere desordem e violência. Os elementos apresentados na figura 5-20, que complementam o texto principal, estão presentes ao longo da matéria, e têm um papel importante na narrativa da mesma. Esses elementos contextualizam visualmente o tema da reportagem, com fotos das atrocidades, além de títulos e trechos de depoimentos emocionalmente apelativos. Embora nesse caso o infográfico seja subordinado à matéria principal, toda a informação e o contexto visual oferecido no resto da matéria servem como pano de fundo narrativo para o próprio infográfico.

5-20– Detalhes de elementos que contextualizam visualmente o tema da reportagem

Essa abordagem gráfica de se utilizar elementos gráficos com aparência orgânica, vernacular ou fragmentada em design jornalístico, que são uma característica típica da chamada “desconstrução” ou do pós-modernismo em design gráfico (LUPTON, 1999:3-23), é um tipo de recurso que tem se desenvolvido bastante em jornalismo desde a introdução da tecnologia digital. Especialmente na década de 90, designers, como David Carson, revolucionaram o uso de tipografia, mas abandonam também convenções sobre as limitações do espaço gráfico e experimentam com elementos gráficos menos usuais. Podemos perceber isso na capa da revista Raygun (fig. 5-21), projetada por Carson, em que ele incorpora texturas e elementos vernaculares (como a escrita à mão) ao espaço gráfico. Essa tendência também se mostra 131


presente em trabalhos de ilustradores experimentais como Hanock Piven, que incorpora objetos do cotidiano em suas caricaturas (ver fig. 5-2).

5-21 – Capa da revista Raygun por David Carson (blogspot.com)

5-22 – Caricatura de Bruce Springsteen e Barbara Streisand, ilustrações internas para revista intertainment Weekly (1995) por Hanock Piven (blogspot.com)

Do ponto de vista da tipografia, no infográfico e na matéria em análise não há evidência de uma influência de experimentalismo ou desconstrução formal. O que podemos constatar é que o estilo tipográfico escolhido é um fator de diferenciação de informação da matéria. A tipografia do texto da matéria (linear interrompido, em três colunas) é serifada e está presente em todas as matérias da revista por fazer parte do projeto gráfico da mesma. Já para as iconografias, citações e títulos, o

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designer utilizou tipografias sem serifa, um pouco mais chamativas e austeras, que se adéquam à densidade conceitual do tema e contrastam com o texto principal da matéria. Esse contraste gráfico diferencia o texto principal de outros objetos gráficos, entre eles, do infográfico em questão. Como se pode constatar, esse um mapa é um infográfico, rico em descrições, não se tratando unicamente de uma iconografia da matéria principal. Mesmo assim, ao se analisar o infográfico é necessário considerar a matéria como um todo, pois embora o texto da reportagem e o infográfico possam ser lidos independentemente, não deixam de ser informações complementares.

133


6.

Conclus達o

134


6.

Conclusão

No presente trabalho, foi possível abordar apenas alguns aspectos dentro do amplo universo de possibilidades do estudo dos infográficos. Sem a pretensão de esgotar o tema, nosso objetivo foi mapear fatores para análise dos infográficos, visando alcançar uma melhor compreensão dessa peça editorial tão importante nos dias de hoje. Constatou-se que a crescente difusão do uso da infografia jornalística é um fenômeno que reflete as mudanças que estão acontecendo na área do jornalismo, tanto de ordem conceitual, quanto tecnológica. Os jornais contemporâneos oferecem aos seus leitores, mais do que notícias diárias, interpretações e explicações de fatos e fenômenos do mundo moderno. Para desempenhar plenamente esse papel, as mídias escritas de hoje dispõem do recurso da infografia, ferramenta que vem se revelando capaz de oferecer informações sob a forma de linguagem gráfica pictórica, esquemática e verbal, possibilitando reunir vários modos de simbolização da linguagem, simultaneamente. Inicialmente, buscou-se alcançar uma definição conceitual para infografia jornalística a partir de diferenciações traçadas com base no conhecimento já construído sobre iconografia. Assim, chegamos à idéia de que infografia jornalística é um tipo de matéria jornalística em que o texto e a iconografia são interdependentes, e em que a estratégia de leitura pode se desenvolver de forma não-linear. Uma importante característica identificada no infográfico é que o mesmo possui a possibilidade de se apresentar como a fonte principal de informação. A pesquisa indicou que, até a década de 70, fazia-se uma separação entre iconografia e texto tradicional, revelando uma tradição em que o texto era nitidamente privilegiado como fonte preferencial de informação, enquanto que a iconografia era tida como uma fonte secundária, acessória do texto escrito. A partir da década de 70, com o surgimento dos primeiros infográficos jornalísticos, mudou-se essa concepção. O infográfico, ao apresentar uma simbiose entre iconografia e texto, passa a ser protagonista da informação, implicando em uma maior valorização dos elementos pictóricos e esquemáticos. Na análise do aspecto da configuração dos infográficos, foram relevantes o Esquema de Twyman e os estudos de Rob Waller sobre a estrutura não-linear dos diagramas. Twyman ressalta a importância de se ver a linguagem como um instrumento de transmissão de conhecimento. Para análise em design gráfico, ele desenvolveu seu esquema sob forma de matriz. Ao utilizarmos os instrumentos metodológicos de Twyman na infografia, percebemos que os limites entre certas células do esquema se mostram pouco nítidos, havendo características que se misturam. Isso 135


provavelmente se deve à forte presença da linguagem pictórica no infográfico, já que no objeto da análise de Twyman os aspectos textuais eram predominantes. A análise dos infográficos revelou a necessidade de se ampliar a matriz do esquema de Twyman, onde os modos de simbolização (verbal-numérico, pictórico e esquemático) estivessem em conjunto. No entanto, acreditamos que seja cedo para avaliar de forma conclusiva as possíveis limitações do esquema de Twyman quando aplicado à infografia. Concluímos, para esta dissertação, que o estudo do esquema de Twyman foi relevante para oferecer uma visão geral da configuração dos objetos gráficos, o que fornece ferramentas para que o analista possa “dialogar” com a informação apresentada no infográfico. Já o teórico Rob Waller lançou luz sobre um elemento que é comum à maioria dos infográficos, os diagramas. No presente trabalho, verificou-se que a quase totalidade dos infográficos apresenta estrutura de diagrama, oferecendo leituras a partir de pontos múltiplos de atenção. Podemos concluir, portanto, que a infografia amplia o conceito de diagrama e oferece a possibilidade de se comportar como a fonte principal de informação, nesse ponto se diferenciando da iconografia tradicional, que é submissa ao texto. Quanto aos tipos de informação visual identificáveis nos infográficos, as variáveis que dizem respeito ao tempo e ao espaço se revelaram importantes na análise do material, contribuindo para contextualizar fatos e tornar a informação mais dinâmica. Verificamos que as funções de narração e descrição são fatores sempre presentes na infografia, sendo que há alternância no predomínio de uma função ou de outra, de forma que em alguns casos a função narrativa se mostrará mais evidente, enquanto que em outros a função descritiva será preponderante. Nos exemplos estudados, verificamos que seqüência de imagens é um recurso comumente utilizado para reforçar a narratividade, ao passo que, em casos de maior dependência do infográfico ao texto, a descrição visual apóia a narração escrita, tendo, portanto, um papel narrativo secundário. Nem sempre a descrição verbal dá conta da descrição dos elementos, por isso, a infografia é um recurso muito requisitado por jornalistas, nesses casos. O estilo foi um dos aspectos mais interessantes desse estudo. Observou-se que as escolhas estilísticas da apresentação do infográfico passam a integrar o conteúdo informacional, influindo na compreensão da mensagem pelo leitor. Isso significa o reconhecimento de que a adoção de determinado estilo deve levar em consideração a mensagem que se quer transmitir, e o contexto do público-alvo. Através do contato com o trabalho de Goldsmith (1980), muitas das dificuldades referentes ao estudo da linguagem gráfica começam a ser dissolvidas. Muitas vezes, as questões de sintaxe e semântica parecem ser o alvo das abordagens de linguagem gráfica, como podemos constatar em Bertin e Engelhardt, por exemplo. No estudo proposto por Goldsmith, e seguramente por Twyman, a constante 136


mais determinante na análise da linguagem gráfica foi o contexto do usuário, ou seja, a pragmática. O estudo das abordagens desses teóricos evidenciou a necessidade de incluir a compreensão do contexto do usuário entre os fatores essenciais no estudo da infografia, e do design gráfico em geral. Pode-se ressaltar que questões envolvendo a importância do contexto no conhecimento não se limitam aos estudos de linguagem gráfica. O filósofo de linguagem Danilo Marcondes (2000) alerta sobre a importância de se considerar o significado relativo a contextos determinados, fazendo a ressalva de que a relativização pragmática não é um relativismo semântico, cognitivo ou ético (MARCONDES, 2000:41), mas um esforço para se opor a uma visão tradicional do conhecimento. Essas reflexões sobre o papel da pragmática na linguagem gráfica foram sugeridas pontualmente em alguns momentos desse estudo, sem qualquer pretensão de maior precisão. É de se reconhecer, no entanto, que a relevância da questão restou evidenciada no decurso da pesquisa, requerendo maior aprofundamento em estudos posteriores. O objetivo do presente estudo foi mapear recursos para a melhor compreensão da infografia como uma forma complexa de linguagem gráfica. Durante esse processo, pôde-se perceber que, embora a teoria do design ainda seja uma área nova de conhecimento, já começam a surgir relevantes contribuições teóricas que revelam o olhar singular dos designers sobre linguagem gráfica. Em razão disso, optamos, na presente pesquisa, por dar enfoque à produção dos teóricos de design. Esperamos que esse trabalho possa, de alguma forma, demonstrar que a infografia, com sua maior possibilidade de integração com a linguagem escrita e variação de informação, tem uma função importante para o desenvolvimento da linguagem gráfica como forma de conhecimento.

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