Fumômetro

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A EXPERIMENTAÇÃO COMO UMA FORMA DE SENSIBILIZAÇÃO SOBRE A QUESTÃO DA TOXICIDADE DO CIGARRO Kamila Maria Rudek Bolsista PIBIDCiências (UFFS) Roque Ismael da Costa Güillich Coordenador do Projeto PIBIDCiências (UFFS) Judite Scherer Wenzel Docente (UFFS) Marisa Both Supervisionadora do Projeto PIBIDCiências (UFFS) Cenira Bremm Professora da Escola Resumo: A realização de atividades de experimentação ainda é um grande desafio para educadores da Educação Básica. Com isso o Programa Institucional de Bolsa de Iniciação a Docência (PIBIDCiências) surge como uma estratégia de permanência e garantia de formação qualificada de professores, tendo como temática central a Experimentação no Ensino de Ciências, como forma de revitalizar e qualificar esse ensino e a alfabetização científica desde a Escola Básica. Dentro dessa proposta viu-se importante no decorrer das aulas de química dos 3ª anos do Ensino Médio de uma escola estadual, realizar uma discussão sobre o tabagismo e suas consequências para o organismo humano, além da relação com as questões sociais e as Leis vigentes. Diante disso, apresentamos o Fumômetro, uma simulação que envolve o uso de materiais alternativos que tem como objetivo discutir a composição química do cigarro, bem como, as doenças causadas pelo mesmo. Em concernência da práxis supracitada, observouse também, as interligações com outras áreas da Ciência e o impacto da experimentação no desenvolvimento de conceitos de Química. A presença dos bolsistas do PIBIDCiências tem facilitado o desenvolvimento da experimentação no ensino de Ciências/Química, aliado a revitalização dos laboratórios de Ciências nas escolas propiciando vivências, pesquisas e reconstruções com vistas a melhoria do Ensino de Ciências. Palavras-chave: Experimentação, Conhecimento, Conhecimento Químico.

Situando o contexto A sala de aula é o espaço que se caracteriza como de negociações e de produção de novos sentidos e de significados necessários para o entendimento do conhecimento científico/químico/escolar. Isso acontece em uma rede interativa complexa, de troca de saberes, em que se tornam presentes a história de vida, as experiências e vivências conjuntas de professores e alunos, bem como, o próprio conhecimento formal/escolar, o qual precisa ser significado junto aos estudantes.


Nesse sentido, acreditamos na necessidade de diferentes práticas pedagógicas, para possibilitar aos estudantes construir novos conhecimentos. Como afirma Pansera-de-Araújo; Auth e Maldaner (2007, p.243), “[...] o estudante é capaz de elaborações cientificas escolares a partir de experimentações

e

questionamentos

aprendidos

num

ambiente

de

sistematizações [...]”. Assim percebemos do quão é importante trabalhar com práticas pedagógicas, pois é o momento em que os alunos redescobrem todo o conhecimento já elaborado. Para isso, é importante que o estudante se envolva no decorrer das atividades experimentais, discutindo com os colegas, com o professor o que foi observado e o que está sendo entendido por ele. Também, importante é a mediação do professor no decorrer do processo, da prática, pois o estudante precisa ser orientado, precisa aprender a ver o experimento através dos olhos da ciência. Segundo Galiazzi (2007, pg.334), “ensinar ciências é levar o educando a interagir com o mundo. É transformar um individuo ouvinte ou observador das ideias e das ações dos outros em um cidadão capaz de participar deste mundo de maneira ativa e responsável, a partir de sua compreensão autônoma e efetiva.” As práticas experimentais trazem uma formação importante, mas a sua realização requer estudos, tempo e ainda competência técnica. Nesse intuito de arranjo da melhoria de práticas, o curso de Graduação em Ciências: Biologia, Física e Química – Licenciatura da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) – Campus Cerro Largo- RS propôs PIBIDCiências como uma estratégia de permanência e garantia de formação qualificada de professores, tendo como temática central a Experimentação no Ensino de Ciências, como forma de revitalizar e qualificar esse ensino e a alfabetização científica desde a Escola Básica (UFFS, 2010). O programa tem como objetivo á experimentação na sala de aula, através da qual o discente tem um contato direto com a sala de aula e passa a auxiliar o docente em suas atividades, procurando propor novas práticas experimentais. No decorrer dos trabalhos valorizamos a participação do professor da escola, do licenciando e do professor formador, no sentido de ampliar as trocas de saberes. A organização para isso é a participação mensal de cursos de


formação do Grupo de Estudos e Pesquisa em Ensino de Ciências e Matemática (GEPECIEM). O grupo se coloca como um fórum de educação permanente para reflexões sobre a área. O trabalho é desenvolvido através de ações conjuntas e colaborativas de ensino, pesquisa e extensão sendo desenvolvido com base na perspectiva da investigação-ação. Também é utilizado o diário de bordo onde cada participante descreve suas vivências na escola, no dia a dia bem como, seus sonhos, angústias, ansiedades e reflexões da prática. No sentido de ampliar os espaços de reflexão sobre a prática de ensino e de aprendizagem.

Como tudo aconteceu: sobre a Metodologia

A prática foi desenvolvida com três turmas do terceiro ano, da Escola Estadual de Educação Básica Eugênio Frantz de Cerro Largo-RS, ambas do turno da manhã no âmbito da disciplina de Química. O primeiro contato com as turmas foram em observações em aula, nas quais a bolsista acompanhava as atividades dos estudantes. No decorrer das trocas com a professora da turma elaboramos e construímos a nossa aula prática. A qual se torna importante, pois são um recurso/método de ensino, que permite o aluno outras possibilidades de aprendizagem. Na construção do Fumômetro utilizamos materiais alternativos como: frasco de vidro com tampa e com água (representa órgão humano), seringa, para puxar o ar (trago do fumante) mangueira, fita e cigarro comum. (FIGUEIRÊDO et all., 2010). Fizemos dois orifícios na tampa do frasco por onde passamos os dois canudinhos ou as duas mangueiras; colocar água no recipiente até a altura de aproximadamente 3 cm; em uma das mangueiras introduzirem o cigarro e a extremidade dessa mangueira deve estar submersa na água; no outro canudo ou mangueira, conectar a bomba de ar ou a seringa, a extremidade dessa mangueira não deve tocar na superfície da água; acender o cigarro e puxar o ar que está no interior do frasco com a bomba de ar; desconectar a bomba para expulsar o ar que foi retirado do interior do frasco e repetir a operação quantas vezes forem necessárias.


Fonte: RUDEK, 2011. Figura 1: Fumômetro

Iniciamos a aula conversando sobre o tabaco, as substâncias responsáveis pela dependência química, apresentamos a fórmula da nicotina, a sua atuação no organismo. No decorrer da discussão percebemos que os estudantes partem do senso comum de que fumar faz mal, mas não sabem de fato as interações químicas responsáveis, daí a importância do debate mediado. A aula prosseguiu da seguinte maneira, perguntamos aos alunos o que eles sabiam sobre o assunto, se conheciam algumas das substâncias presentes no tabaco e qual delas que causa a dependência? A substância que causa dependência é a nicotina, um Alcalóide Natural de forma química C10H14N2, cada cigarro contém de 8 a 20mg de nicotina cerca de 1 mg é absorvido pelo corpo do fumante. Isso pode acontecer através do pulmão, da pele, de uma mucosa (nariz e gengiva) ou dos vasos capilares até chegar ao cérebro. Dali o alcalóide é distribuído para o corpo todo. Responsável pela dependência física, a nicotina age no sangue por cerca de uma hora, quando surgem os sintomas que alertam o fumante para acender outro cigarro. O efeito que causa no organismo? Ás doenças relacionadas hoje com o fumo? Em


termo geral todos tinham um conhecimento prévio, mas não o bastante para discutir e refletir sobre o mesmo.

Fonte: KAMILA, 2011. Figura 2: Alunos prestando atenção.

Passamos a simulação do Fumômetro explicando suas etapas e a função de cada objeto/material utilizado. Enfatizamos que o processo de fumar, inicia por uma reação de combustão quando acendemos o cigarro com o fósforo, chamamos a atenção para a necessidade do gás oxigênio para tal processo químico, e equacionamos tal reação química. Também explicamos que é uma reação incompleta, sendo a fumaça resultante da combustão incompleta do tabaco. Lembramos que a sua combustão completa só se dá na brasa em torno de 850oC. Na discussão teórica também ressaltamos que o cigarro é composto por várias substâncias, desde acetona, formol, butano, cádmio cianeto, naftalina, nicotina e tolueno.

Apresentamos as fórmulas estruturais e moleculares.

Também, abordamos as principais doenças e outros males causados pelo uso do tabaco bem como a questão social que envolve a Lei Federal nº 9.294/96 que proíbe fumar em lugares fechados.


Por fim, realizamos algumas perguntas para mediar à discussão e também a prática realizada: a) qual sua opinião em relação ás práticas aplicadas pelos professores; b) o que você entendeu sobre á simulação do Fumômetro; c) vocês acham importante abordar questões sociais ás quais se relacionam ao nossa dia-a-dia? Ao analisarmos/ouvirmos as respostas dos estudantes, percebemos a importância da abordagem de tal assunto no sentido de ressaltar suas implicações à saúde e prevenção. Vale ressaltar que o olhar mais químico, permite ao estudante associar os conteúdos químicos, que na maioria das vezes, são trabalhados apenas com o uso do livro didático, dificultando para o estudante identificar os mesmos com o processo de fumar, por exemplo. A elaboração de uma aula prática é muito importante sendo esta aula bem planejada, de forma que o aluno possa refletir e dialogar, assim podendo ter uma ação-reflexão. A mesma opinião foi demonstrada pelos alunos sobre a prática realizada.

Olhando para a prática e tentando refletir No decorrer da aula notamos grande participação dos alunos, pois o assunto estava relacionado a um comportamento vivenciado no dia a dia dos alunos, em diversas formas como campanhas contra o fumo, homologação das leis e demais. Continuando essa ponderação Schnetzler e Aragão (2000, p. 136) apontam que “segundo nosso pensamento, de nada adiantaria realizar atividades práticas em aula se esta não propiciar o momento da discussão teórica-prática que transcende o conhecimento de nível fenomenológico e os saberes cotidianos dos alunos”, daí a importância da mediação do professor. No caso, o estudante por si só não identifica o cigarro como uma mistura de substâncias, nem o processo de acender o cigarro com uma reação de combustão. Analisando as questões realizadas na aula viu-se a grande preocupação que os alunos têm sobre o “perigo” do cigarro, mas num saber cotidiano, de senso comum, sem especificar os conteúdos químicos. Citaram que atualmente o jovem tem o acesso mais fácil para as drogas, seja pela ausência dos pais, causada pela rotina exaustiva não sobrando tempo para


acompanharem seus filhos, deixando assim a porta aberta para as drogas invadirem suas casas, seja pela falta de informações e aprendizagens sobre o tema nesta etapa da vida. Então, como futura professora, falei a eles que os pais devem estar mais presentes no dia a dia do filho acompanhando seus hábitos e buscando maneiras saudáveis de vida. Também é de extrema importância que os professores auxiliem na educação de forma mais profunda, mostrando obstáculos referente as questões que a sociedade enfrenta para vencer o desafio de manter o jovem longe das drogas. Os alunos foram dando declarações: “... quando um jovem se sente próximo da família, tem menos chance de se envolver com o álcool, cigarro e outras drogas” (ALUNO 1, 2011); “...os pais não conhecem bem os problemas que o cigarro causa, mas falam que é uma droga e drogas todas são ruim.”(ALUNO 2, 2011). Parece que decorre falta de orientação no sentido de como a família deve tratar a questão, tão complicada e difícil de abordar. É importante que os pais procurem recursos para orientarem seus filhos sobre os maus da sociedade moderna. Os alunos novamente falaram que os pais tem vergonha de abordar certos assuntos como sexo, prevenções contra doenças sexualmente transmissíveis, drogas em geral e etc. Nesse momento percebi que uma palestra para os pais onde eles possam tirar suas dúvidas sobre os temas sociais é de extrema importância, fazendo assim que eles tenham mais segurança na hora de abordar com os filhos, o que posso sugerir a escola como ação de integração escola-família. Os estudantes conseguiram pela mediação, perceber que várias substâncias presentes no cigarro estão também em produtos domésticos: removedor de esmaltes, produtos de limpeza, sprays e demais. “Isso é um perigo, um problema” afirmavam, da importância de saber suas propriedades para fazer um uso consciente dessas substâncias. Também comentaram sobre as doenças que o cigarro causa através de experiências ocorridas na família, mortes, problemas de pele e demais doenças relacionadas ao consumo excessivo do tabaco. Através da análise constatamos que os alunos gostaram da aula e assim participaram interativamente da reflexão sobre o tema proposto. Nas falas os alunos manifestaram-se dizendo que nas demais aulas não se abria momento


para o diálogo em que eles pudessem compartilhar suas vivências, seus problemas. Pois, em geral, o conteúdo é ministrado de forma rápida passando pelos conceitos e exercícios e prosseguindo para o próximo capítulo do livro, o que reflete, em geral, uma aula tradicional. A

simulação

aplicada

mostrou-se

importante,

pois,

os

alunos

compreenderam os conceitos trabalhados durante a aula prática e puderam relacionar com seus conhecimentos vivenciados. Levaram aos seus lares às consequências da toxicidade do cigarro e como ele é perigoso à saúde. Assim, percebemos que os conceitos trabalhados na maior parte das aulas de Química não fazem referência ou não se aproximam da realidade do aluno, levando, por vezes, a pouca ou nenhuma significação dos conceitos envolvidos. Segundo Schnetzler e Aragão (2000, p. 145) “valorização da experimentação como uma estratégia dinâmica e interativa que privilegia a negociação de significados de saberes a partir da exploração de contextos (reias ou criados)”. Nesse sentido, parece que o tema da aula envolvendo o tabagismo foi um estopim para a discussão, a interação verbal, o que propiciou um campo fértil a significação conceitual, pois o tema tinha ligação com o cotidiano dos estudantes. Por conta disso, uma abordagem prática dos conteúdos os torna mais contextuais, facilitando sua significação. Buscamos também uma aula interativa onde eles pudessem trazer suas vivências para dentro da sala de aula, assim valorizando mais uma vez a dinâmica coletiva. Acreditamos que as atividades práticas são de fundamental importância para a formação dos licenciandos em Ciências, dos alunos de Educação Básica e professores e por isso devem ser realizadas de maneira organizada, uma vez que as atividades práticas tentarão estabelecer um elo entre a formação teórico-científica e a realidade, ou seja, o cotidiano (KUPSKE et all., 2011, p.2).

Fazer com que uma aula torne-se eficaz é considerar o que Demo (2000, p.17) enfatiza: “experiência do aluno será sempre valorizada, inclusive a relação natural hermenêutica de conhecer a partir do conhecido. O que se aprende na escola deve aparecer na vida”. Ademais, essa aula prática atingiu seu objetivo, como possibilitar interação entre os alunos, trazer conhecimentos adquiridos pela vivência dos alunos para a sala de aula a fim de facilitar a aprendizagem de conceitos científicos que possam explicar a realidade em que estão inseridos.


Considerações Finais

O ensino de Química tende a se tornar mais eficaz, quando outras atividades são propostas em sala de aula, a exemplo de algumas práticas, ou a simples problematização e contextualização de conteúdos, tão necessárias à significação conceitual. Esse relato teve a intenção de discutir o quanto às práticas é importante para o crescimento dos alunos, em seus vários aspectos fundamentais para que o conhecimento escolar possa ser produzido permitindo reflexão, de forma que haja aprendizagem. Além da composição do cigarro, a combustão, devemos também ressaltar a possibilidade de no decorrer do experimento abordar outros conceitos, ligações químicas, mistura de substâncias, funções orgânicas. Como bolsista ao facilitar a produção do experimento sobre a “Construção do Fumomêtro” percebi que a aula se tornou mais atrativa e também a aprendizagem dos conceitos trabalhados parece ter sido mais eficaz do que simplesmente se fossem abordados apenas os conteúdos com auxílio exclusivo do livro didático. Outro fator importante para minha formação e para o ensino de conceitos químicos foi à percepção do potencial que tem trabalhar a relação dos conceitos trabalhados com o que o aluno vivência.

Referências

DEMO, Pedro. Educar pela Pesquisa. 1941 -4. ed. Campinas, SP: Autores Associados, 200. – (Coleção educação contemporânea). FIGUEIRÊDO, Alessandra M. T. A.; SOUZA, Niely S. de; MARQUES, Sany D. G.; BRANDÃO, Ellen M.; LIMA, Thayana M. L. FUMÔMETRO: Uma Experiência Química no Combate ao Tabagismo em Turmas Inclusivas da EJA. XV Encontro Nacional de Ensino de Química (XV ENEQ) – Brasília, DF, Brasil – 21 a 24 de julho de 2010. GALIAZZI; Maria do C. et all. Contribuição Curricular em Rede na Educação em ciências: uma porta de pesquisa na sala de aula. Ed. Uníjui, pg. 334, ÍJUI 2007 KUPSKE, Karine; HERMEL, Erica do Espírito Santo; GÜLLICH, Roque Ismael da Costa; THOMAS, Solange J. O Vulcão que Impressionou as Professoras de Ciências. In: Anais do EREBIO-SUL. UEL: Londrina – PR, 2010. PANSERA-DE-ARAÚJO, Maria Cristina; AUTH, Milton A.; MALDANER, Otavio A. Autoria Compartilhada na Elaboração de um Currículo Inovador em


Ciências no Ensino Médio. Contexto e Educação; Ijuí -RS: Ed. Unijuí, jan./jun. 2007. pg.243. SCHNETZLER, Roseli Pacheco; ARAGÃO, Rosália M. R de. Ensino de Ciências: fundamentos e abordagens. Campinas, R. Ed. Vieira Gráfica e Editora Ltda., 2000, pg. 136. Unimep/Capes. SCHNETZLER, Roseli Pacheco; ARAGÃO, Rosália M. R de. Ensino de Ciências: fundamentos e abordagens. Campinas, R. Ed. Vieira Gráfica e Editora Ltda., 2000, pg. 145. Unimep/Capes. UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL. Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência-PIBIDCiências. UFFS: Cerro Largo-RS, 2010.


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