no mínimo era isso - 10 bandas, 10 ensaios - coletânea

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no mĂ­nimo era isso 2


OUTROS CRÍTICOS

no mínimo era isso 10 bandas, 10 ensaios

Recife/PE 2013 3


Edição e Organização: Carlos Gomes Revisão: Carlos Gomes e Fernanda Maia Projeto Gráfico e Diagramação: Fernanda Maia Realização: Outros Críticos

GOMES, Carlos (org.). No mínimo era isso: 10 bandas, 10 ensaios. Recife: Outros Críticos, 2013. 1. Música Popular. 2. Crítica. I. Título. 2013

A coletânea musical no mínimo era isso está disponível para download gratuito no site outroscriticos.com Esta publicação só foi possível graças ao apoio dos músicos e autores participantes do projeto. Agradecimentos especiais a Caio Lima e Hugo Medeiros, da banda Rua, Coletivo Ostra Monstra e à equipe do Teatro Arraial (Recife-PE). Outros Críticos contato@outroscriticos.com Tipos: Aleo Italic, LightItalic e Bold, 09/10/11/14/18/48/60; Cambria Regular e Bold, 10/11/18.

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SUMÁRIO Apresentação 6 glauco césar II 9

Glauco e o duplo de si Bruno Vitorino

mojav duo 16

Fruir o fluxo

Conrado Falbo

rua 22

do absurdo ao limbo

Carlos Gomes

hugo linns 29

Sobre a construção de sertões pessoais Renato Contente

paes 32

Infinito

Rodrigo Édipo

isaar 38

A eterna manhã de uma voz Débora Nascimento

caçapa 45

Caçapa e seus ragas de viola

Patricia Palumbo

caramurú 48

Entre as cores da mandala, um trovador  Leonardo Vila Nova

team.radio 54

White Tokio e Recife Victor de Almeida

walter areia 58

Isso não é um ensaio aberto, é improviso Diego Albuquerque

Os autores 63

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Apresentação Estamos em Pernambuco, há música, crítica e todos os tipos de desencontros. Os espaços de escuta estão escassos. Como sempre, cenas culturais deglutindo e implodindo gerações. Umas após as outras. Os meios impressos não criam mais tensões, mas circulam sobrevivendo entre os escombros. Há um sorriso terno na boca do artista. O Estado controla, ou melhor, procura controlar, catalogar, filtrar e editar a criação. A arte resiste a isso tudo, é força feita de um estado bruto e sem medida. Como corpos estranhos no corpo da sociedade, as canções insistem em serem vozes. Os artistas refazem o tempo e criam o ruído intermitente de que todos nós necessitamos. Traços obscuros dessas vozes estão dispostos nas palavras e sons desta breve publicação. no mínimo era isso é espaço para encontros. Os ensaios sobre as dez bandas aqui presentes não farão sentido sem a leitura e escuta posterior do público. Os textos servem como ignição para outras interpretações, posicionamentos, embates e crítica. O título que dá nome à coletânea musical e de ensaios veio da faixa instrumental que abre o primeiro disco da banda Rua, do absurdo, lançado em 2011. Para comemorar os dois anos do 6


lançamento, fui convidado a escrever sobre o disco porque o músico Caio Lima (voz e composições da Rua) achava insatisfatória a recepção crítica que o álbum tinha recebido nesses últimos dois anos. A experiência de escrever o ensaio sobre a banda, aliada à recepção dos músicos sobre o texto, me fez perceber (ainda mais) o quanto a cena cultural em que estamos inseridos, cada qual à sua maneira, é carente de reflexões sobre as obras produzidas. No entanto, há uma simples pergunta que insistentemente me perturba: o público – o desconhecido e misterioso público – tem interesse em leituras críticas sobre os discos? Obviamente, podemos estender esse questionamento aos livros, filmes, exposições, peças de teatro etc. Há um esgotamento da crítica cultural por falta de demanda, de público leitor? Certamente, há diversas maneiras de responder a essas perguntas. Tenho escolhido manter os projetos de crítica cultural dos Outros Críticos em movimento e a dialogar com outras vozes. Espero que esse prisma acompanhe a leitura e escuta que vocês farão desta coletânea. Esse espaço é nosso, ocupá-lo é o mínimo que podemos fazer. É o que desejamos. Boa escuta. Carlos Gomes.

Recife, 11 de setembro de 2013.

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no mĂ­nimo era isso 10 bandas, 10 ensaios

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glauco cĂŠsar II


Glauco e o duplo de si

Bruno Vitorino

A princípio, uma pauta em branco é um obstáculo quase intransponível. O silêncio altivo que emana de seus pentagramas intocados parece lançar ao compositor o desafio da transgressão do vazio. Pôr a primeira nota no papel exige de quem escreve um impulso capaz de quebrar a pausa inicial e estruturar, assim, suas urgências internas. Justamente devido a esse caráter personalíssimo da música, o compositor, ao olhar para dentro, vai buscar a centelha que desencadeia o processo da criação em duas esferas que habitam o seu âmago: a emoção e a razão. Nas condições ideais, ele sabe transitar por estes campos e os sobrepor de modo complementar para erigir a partir deles uma realidade formal baseada na técnica, contudo voltada para um ideal subjetivo e essencialmente expressivo. Mas, existe o risco dele se perder nessa varredura e alcançar os extremos tanto de um lado quanto do outro. Se o autor descambar para o máximo racionalismo, ele fatalmente acabará por reduzir o ato de compor a um método científico de organizar sons e espaços baseado em regras tão 10


constritivas e rígidas no qual as próprias escolhas do compositor soam artificias, resultando em uma música intrincadamente fria que enfatiza o mecanicismo da execução. Em contrapartida, se, ao escrever, o autor negligencia a forma e mergulha livremente na pura imaginação intuitiva, periga cair na incoerência da justaposição de emoções brutas e ideias não desenvolvidas, transformando sua obra numa névoa incompreensível e ilógica. Inteiramente consciente dos caminhos tortuosos que é a composição, essa “extenuante travessia de uma passagem imaginária” , o pianista Glauco César II consegue se estabelecer nesses dois universos e criar em cada um deles um artista único. De um lado, o Glauco erudito com treinamento clássico e formação acadêmica; do outro, o Glauco psicodélico que desdenha dessa bagagem e foca no aspecto sensorial da canção. Um duplo de si. Com “O Trem”, seu projeto mais conhecido do público recifense, Glauco se liberta do olhar opressor da disciplina acumulada ao longo de anos de estudo para se permitir ser justamente o inverso: o espírito livre. Esteticamente, Glauco e o Trem é o fruto da epifania daquele estudante de música que, depois de ouvir, reouvir e investigar “O Cravo Bem Temperado” de Bach, escuta Raul Seixas pela primeira vez e percebe que as muralhas estilísticas que o cercavam eram imaginárias e mais tênues do que ele supunha. Música é, sobretudo, movimento, e o aspecto estático das categorizações não passa de uma presunção do intelecto. Abraçar o 11


outro lado – o intuitivo – era, portanto, irresistível, inevitável. Por isso, nesse trabalho, Glauco busca uma música de arquitetura simples, impregnada pela atmosfera psicodélica, para alicerçar sua poesia rica em jogos de palavras, aliterações e significâncias, e deixar ecoar seu grito mais primevo. Compreender essa emancipação de si mesmo promovida por Glauco, permite ao ouvinte descortinar a real dimensão de suas canções e entender que o aparente lugar-comum de sua estética lisérgico-retrô-setentista é, na verdade, a exposição de sua faceta mais íntima e menos controlada (o que de certa maneira justifica e redime, inclusive, seu canto desafinado). Puro impulso emotivo. Em “Tu”, por exemplo, o pianista canta as inseparáveis dicotomias que emanam de uma paixão numa valsa inebriante. Já em “Medo-me”, Glauco enfrenta seus demônios internos e o horror de se perceber um indivíduo frágil de “mãos estranhas, braços finos, com tremor nas pernas e olhar desconfiado” a enfrentar um mundo hostil que pode trucidá-lo num instante. O turvo movimento cromático descendente do acorde de D7 para o Db que inicia a composição e se repete ao longo de seu desenvolvimento suspende a ideia de certeza tonal. Tal artifício reforça a sensação de pavor que ecoa da letra e só é aliviada quando a música encontra um momentâneo repouso no mesmo Db após um giro harmônico. É como se depois de muito lutar com seu medo, Glauco conseguisse finalmente aplacá-lo. 12


No lado diametralmente oposto, está o erudito Glauco César II, um compositor inquieto, metódico e complexo que conhece profundamente o legado musical da Europa Ocidental, a opulência da cultura popular de sua terra, as abissais rupturas estéticas do modernismo e a liberdade improvisativa trazida pelo jazz. Todavia, ao se utilizar desses matizes, ele assume riscos e busca sua própria identidade artística sem se render à tirania das convenções e ao marasmo das zonas de conforto. As tradições e as normas são para ele referências que devem ser assimiladas, mas, antes de ser o fim em si da composição, funcionam como o princípio da busca pelo novo. Em última instância, cabe ao artista a responsabilidade moral de ser fiel à sua própria visão e forjar dentro dessa integridade criativa seu estilo, e Glauco o é até as últimas consequências. Combinando destreza técnica, uma capacidade imaginária que parece não ter fim e a habilidade de sentir cada filigrana de seus escritos em interpretações arrebatadoras, Glauco resplandece. Muito além da leviandade do exibicionismo virtuosístico ou das láureas catedráticas, sua produção instrumental aborda questões fundamentais sobre o sentido da arte hoje e sua relação com o indivíduo – no caso, tanto aquele que escuta quanto o que produz. Aqui, ele não quer apenas a transitória experiência sensível da realidade. Busca a verdade sublime da transcendência; tocar o éter; conectar, ainda que momentaneamente, o Homem ao 13


infinito. “Grito Negro” com toda sua polirritmia estrondosa, seu encadeamento harmônico mais livre, suas mudanças de direção inesperadas (exposição/variação/reexposição) é uma excelente ilustração do talento de Glauco em transmudar a realidade objetiva dos sons na realidade astral das essências. Tal profundidade é algo raro num mundo regido pela banalidade e pela aparência. Para a coletânea no mínimo era isso, Glauco apresenta sua composição “O Amor”, uma interseção desses dois Eus num diálogo entre o instintivo e o cerebral. Por um lado, a métrica uniforme que dá coesão aos versos declamados como um mantra, através de uma melodia estacionária que gravita em torno de uma singela harmonia de quatro acordes (Cm, Gm, DbMaj7, AbMaj7). Do outro, o intérprete que transpõe ao piano o indizível para comunicar sentimentos que emanam das vicissitudes irracionais do amor. Um olhar mais ao longe, no entanto, revela uma tenaz construção imagética que reside sob a aparente simplicidade da composição. Glauco relaciona cada acorde às estruturas internas do coração (átrio direito, átrio esquerdo, ventrículo direito e ventrículo esquerdo), sendo a melodia o sangue que lhes perpassa e a dinâmica expressiva, a força e o sentido com que o músculo se inquieta em seu ardor amoroso. O órgão símbolo do amor é pintado com sons, palavras e silêncios. Se a busca da identidade artística é um processo árduo, Glauco teve a ousadia de se 14


construir não uma, mas duas vezes, sem temer o impossível da empreitada. E é justamente essa audácia que o separa como artista inovador do vácuo conformista tão em voga. O que se teria perdido se ele não tivesse tentado? Ao abrir em si dois caminhos que correm em paralelo e eventualmente se tocam, Glauco realiza suas aspirações mais elementares por meio da experiência ora sensitiva, ora metafísica. Não se pode e nem se deve ignorar tal comprometimento com a arte. Que venham mais de seus Eus.

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mojav duo


Fruir o fluxo

Conrado Falbo

Como músico, minha compreensão do verbo “improvisar” sempre esteve ligada ao domínio de uma técnica densa e sofisticada, requisito essencial para navegar territórios como o jazz. Ainda estudante de música, procurei a improvisação quando quis ir além da tarefa de seguir partituras e aperfeiçoar interpretações para tentar conquistar alguma liberdade em relação ao uso do meu instrumento. Mas minha carreira de improvisador teve um fim antes de começar, quando me dei conta de que repetir exaustivamente escalas e estudar progressões harmônicas era algo que eu não estava disposto a fazer, por falta de afinidade ou excesso de preguiça. Acabei indo buscar a música fora do sistema dos conservatórios e da universidade, e reencontrei o improviso no mundo da dança. O Contato Improvisação, como o próprio nome já deixa perceber, utiliza o contato como ponto de partida para a improvisação com o próprio corpo. É difícil ir além de uma definição vaga, pois este modo de pensar o movimento assume várias formas e mistura-se com várias técnicas nos diversos lugares do mundo onde é 17


cultivado. Este pensamento me abriu uma nova perspectiva para a experiência de improvisar: ao mesmo tempo em que a liberdade é imensa (não há necessidade de treinamento prévio nem do domínio de um vocabulário técnico específico), o nível de concentração, de escuta e de mobilização de recursos interiores precisa ser igualmente profundo para que o processo valha a pena. Meu encontro com o Contato Improvisação foi também um encontro com o Mojav Duo, que passou a tocar nas jams1 organizadas pelo Coletivo Lugar Comum, grupo de artistas do qual faço parte. Convidamos Fred Lyra (colega dos tempos da faculdade de música, que abandonei) e Hugo Medeiros, principalmente por causa da reflexão e do cuidado com que encaram o trabalho: nenhum de nós queria apenas um fundo musical. Por isso, posso dizer que improvisamos juntos em várias situações, pois músicos e movedores interagem o tempo todo, como não poderia deixar de ser em um evento que leva o nome de jam, na melhor tradição dos encontros entre músicos de jazz. Escutando as gravações enviadas por Hugo para que eu escrevesse este texto, reconheço na sonoridade os movimentos das jams. Toda improvisação parece liberar um tipo de impulso de continuidade, que termina desencadeando uma série de estratégias para que seja possível seguir em frente. Acontece que Assim como acontece no jazz, os eventos em que pessoas interessadas em Contato Improvisação se encontram para improvisar são chamados de jams.

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todas estas estratégias podem ser subvertidas, e são (ao menos por improvisadores atentos), sempre que a oportunidade se mostra sedutora e a vontade responde com movimento. Som é movimento, e talvez a natureza da improvisação seja não ter natureza alguma além desse impulso de manutenção do fluxo. Até questões simples, e aparentemente lineares, como orientação e sentido ganham outras dimensões no improviso: andar para frente, por exemplo, não significa necessariamente seguir reto ou manter-se no mesmo plano. Aliás, a própria noção de “frente” é sempre uma questão referencial, e os referentes mudam o tempo todo. A música de Fred e Hugo mostra que eles sabem muito bem como traduzir em som estas questões. Afinal, estar “De costas pro céu”, “De costas pra si” ou “De costas pra terra” não quer dizer perder um ponto de vista, mas ganhar novas possibilidades de enxergar. Da mesma forma, “Vozes do além” podem soar familiares porque vêm do lado de dentro. Para mim, a palavra “fluxo” sugere um movimento líquido e rápido, mas o fluxo sonoro do Mojav Duo me lembra que este movimento pode adquirir feições bem diferentes. Percebo uma característica percussiva que prevalece mesmo nos momentos mais “sustenidos”, como em “Um que resta” ou “Gradus”. E escrevo isto pensando principalmente na guitarra, já que a bateria algumas vezes aparece justamente distendendo os sons, em contraponto a este fraseado construído pelas cordas na base do stacca19


to. Pode ser que isso seja algo propositalmente perseguido pelos músicos, ou pode ser que eu esteja ouvindo além da conta. De um jeito ou de outro, a escuta deixa claro que o trabalho rítmico é uma preocupação central para a dupla, o que equivale dizer que o tempo é algo que tem uma importância consciente para Fred e Hugo. Nossa concepção do tempo ainda é predominantemente linear, mas o fluxo de uma música como a do Mojav Duo muitas vezes conduz ao ciclo. É uma falsa repetição, um som que não soa sobre si mesmo, mas desenha novas possibilidades cada vez que pensamos ouvir uma frase já conhecida. Talvez o improviso, mais que qualquer outra atividade premeditada, explicite que a repetição é algo impossível quando se espera alcançar um mesmo resultado. Cada vez que escuto as gravações, vejo que minha posição de ouvinte também muda, assim como meus pontos de referência na escuta. Não é suficiente dizer que cada gravação é uma versão entre infinitas possibilidades que dependem do momento da performance: também a escuta é um tipo de performance que não depende apenas da vontade e da ação dos músicos. A música é uma arte de performance. Essa afirmação parece óbvia, mas frequentemente não se reflete nem na formação nem na conduta de um número assustadoramente grande de artistas atuantes em vários gêneros. Escutar o Mojav Duo me deixa contente em perceber que existem músicos que enxergam além do exibicionismo técnico e estão preocupados com 20


a abertura para a comunicação, uma abertura que não pode ignorar a mudança, mas precisa abraçá-la e incorporá-la ao próprio fazer. Sem isso, não é possível fruir o fluxo.

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rua


do absurdo ao limbo

Carlos Gomes

A banda Rua está permanentemente em estado migratório. A proposição estética sob o título do absurdo (2011) revelou, àquela altura, que a música pernambucana teria pela frente que empurrar uma pedra pesadíssima, aglutinada – como se fosse possível – por criação e crítica. As canções-pedras logo ganharam as suas primeiras gravações: trip hop, samba, experimentalismo, minimalismo. Cada nova audição será uma reinvenção desses e de outros rótulos. Rua está para a música como o artista está para a morte. A presença inevitável dessa sombra torna a criação uma conquista vital. É preciso criar para conservar-se em movimento, com vida. Essa relação permanecerá como um ato contínuo, uma confissão autoral sobre o ser/estar do artista. Cada compasso, palavra ou melodia será uma prova viva da surpresa que a música inventiva deverá causar no ouvinte. Perceber uma narrativa poético-musical nas treze canções que compuseram o álbum atemporal da Rua, de certa maneira, será uma chave de interpretação possível e, quem sabe, também surpreendente. 23


do absurdo amplia as possibilidades de criação sobre o vazio. Será a página em branco um poema?, Um galpão imenso e vazio, uma instalação artística?, O silêncio, a canção absoluta que nunca nos acostumaremos a escutar? São sobre essas indagações que a música da Rua se aproxima. Há uma espécie de choque de opostos presente em praticamente todo o álbum; de um lado o branco, as bases instrumentais e sua amplitude, seus espaços imensos e em construção; do outro, o preto, a palavra cantada (irmã da poesia) que tem nas vozes (no canto) o entrecruzamento dessas duas cores. É a voz que atravessa e conduz as tonalidades do absurdo. A abertura instrumental de “no mínimo era isso” desacostuma o ouvido do excesso. O mínimo é mola propulsora que, aos poucos, se expande na imensidão do tempo e depois, com a mesma velocidade, retorna ao seu ponto de origem. Os sons da marimba de vidro são cíclicos e cortados pelo arco que prepara e lança o nosso herói na narrativa, que toma corpo com a combinação experimentada entre o baixo, o cavaquinho, a guitarra e a bateria. Fôlego para a palavra e suas vozes. todalegria funda um buraco invisível todalegria salta o pedaço impalpável todalegria engorda o inefável todalegria é surda (...) e ensurderce um 24


A canção é uma abertura aos extremos. As afirmações gritadas no canto são poéticas que pesam sobre os ombros do nosso herói. A possibilidade da alegria (a arte é alegre?), a possibilidade da criação (criar é estar alegre?) vê-se diante do contraste entre o som e o silêncio. Esse é o nosso herói, personagem permanentemente em conflito, entre o branco e o preto, o som e o silêncio, a vida e a morte. O êxtase em som acompanha a voz e a base sonora crescente. Até que “escorrego” devolve o herói à aparente calmaria da jornada. embrutecendo aos poucos embrutecendo aos trancos embrutecendo aos vãos escorrendo

Esse contraste faz parte da estética do disco. A música impele constantemente o ouvinte a acompanhar as suas nuances. A imprevisibilidade nos arranjos, na sugestão das letras, suas imagens, como visões oníricas, são quase sempre enigmas a serem decifrados. Em sequência, “afeiçoado” e “rainha da bateria”, impessoais canções de desamor. A primeira mantém um pulso recorrente, a segunda samba com a tradição do samba, faz do gênero um jogo metalinguístico entre a criação e a crítica. É possível sermos a tradição e criticá-la ao mesmo tempo? A música mais “popular” do disco é a que encena uma crítica mais profunda à música con25


temporânea. Se ela caminha entre a reconhecível tradição, “um dia estranho” e “intervalo”, as faixas seguintes, transformam o cavaquinho e a guitarra, respectivamente, em bichos estranhos no ninho. Os músicos Nelson Brederode (cavaquinho) e Fred Lyra (guitarra) são os autores que assumem tais riscos. Yuri Pimentel (baixo) e Hugo Medeiros (bateria) são colaboradores nessa algazarra. A primeira sequência melódica faz corpo para a pele poética que a voz de Caio Lima declama. A segunda soa como improviso em conjunto, seu título nos impõe uma pausa ao herói do absurdo. Refletir o caminho até aqui e estar atento para percorrer outra parte da estrada. “só”. onde o dia finda onde um céu tem teto onde nuvens são algodão d’onde a chuva pinga azul onde o tempo nina onde o vento canta onde um sol amarelo ri quando a noite engole um chão colorindo um bloco do infinito lá em solidão à usura dos olhos vazios A solidão da canção dialoga com a possibilidade de amor em “às bolas de gude”, em que a marimba de vidro de Hugo de Medeiros volta com outra intensidade, diferentemente da música de abertura, aqui se faz num lirismo que joga a favor da melodia e do canto, 26


em frases melódicas longas e em versos como: “ela, o dia torto de um inverno inteiro ao vento morno”. No final, vozes femininas sobrepostas são um rastro de esperança e gozo: “feliz toda manhã”, sentenciam elas. As músicas seguintes, “ais” e “pala”, permeiam o mesmo cenário poético das anteriores, mas enquanto a primeira desvanece em som através das linhas de baixo, repetindo fórmulas já apresentadas em outras canções, a seguinte é mais propositiva e jorra sua verve particular para lugares mais inesperados (e inóspitos). “pala” são grunhidos da voz, cavaquinho, baixo e bateria, num dos melhores arranjos do álbum. A música “pronome” dá voz ao herói, seu canto desola as possibilidades de ventura. Um fim de estrada sem final. sair de si é um engano só é desumano e mais é fatal (...)

As vozes e a programação da música unem o natural e o artificial para tentarem constatar o indizível do derradeiro. Chegar ao fim da jornada sem tantas respostas. “página 6”, no entanto, escancara mais uma vez as contradições do artista, do herói, de sua jornada absurda. Sísifo carrega a pedra até o alto da montanha. Refaz o caminho infinitas vezes. Esse é o sentido de sua existência. “e haja vida pra gastar”, repete a voz dissimulada. 27


Irmos do absurdo ao limbo (próximo disco da banda) será como propor um entrelugar estético para novas jornadas e experiências. As faixas pré-mixadas de limbo que chegaram até mim são recompensas para os ouvintes que souberam escutar o álbum anterior, em que escutar será sempre diferente de ouvir. Ouvir é um ato passivo, natural. Escutar exige luta interna; exige também uma jornada, uma retomada da liberdade criativa avessa aos rótulos e pré-disposições. Tomem contato com os pouco mais de 9 minutos da música “limbo” e, com esforço, perceberão que o silêncio e o tempo são condições essenciais para compreendermos o que chamamos de arte. Rua carrega com energia essa pedra indizível e pesada que todos sonhamos ter nas mãos.

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hugo linns


Sobre a construção de sertões pessoais

Renato Contente

Ao ouvir Vermelhas nuvens (2012), segundo álbum do pernambucano Hugo Linns, os diferentes sertões que podem nos habitar se excitam de maneira curiosa. De início, eles já surgem vigorosos e trazem à tona as pequenas referências de Sertão que guardamos, não raro, em cantos meio perdidos da memória: uma viagem de infância, um documentário visto na tevê, um dia de festa num mercado público. Algo no disco também insinua que os sertões suscitados pela viola dinâmica de Linns têm mais a ver com um significado vasto da palavra (algo como o utilizado por Guimarães Rosa, para quem o Sertão é dentro da gente) do que o de uma geografia física propriamente dita. O instrumento é apresentado pelo artista através de nuances renovadas e provocativas. Disseca o Brasil de dentro pra fora, do interior para o litoral, e também um pouco da gente, num movimento semelhante. Linns é um dos nomes da cena contemporânea que se propõem a modernizar a viola dinâmica (ou nordestina, como também é conhecida) através da música instrumental. Sem 30


palavras ou canto, o pernambucano rompe a tradição do instrumento de servir essencialmente como acompanhamento dos versos de cantadores para experimentar suas potencialidades distintas. Em comparação ao início de seu projeto solo como violeiro – registrado no álbum Fita branca (2009) –, o pernambucano traz em Vermelhas nuvens uma sonoridade mais elaborada, consistente. Como o próprio artista apontou, parte disso se deveu à textura musical que imprimiu à obra com o auxílio de pedais e slides (tubo oco de metal que se acopla ao instrumento). Com formação no Conservatório Pernambucano de Música e na UFPE, Hugo tem como violeiro-referência o serratalhadense Adelmo Arcoverde, com quem tocou por três anos e aprendeu a criar sertões. Os doze temas que constituem seu segundo álbum espelham essa trajetória moldada por emboladas, baiões, cocos e maracatus, mas inovam ao apresentar com sutileza elementos dissonantes do universo roqueiro, com influências de The Doors a Radiohead. O disco sinaliza, assim, o surgimento de um novo e surpreendente sertão no mapa da música feita em Pernambuco. De asfalto, terra batida ou em outro aspecto geográfico (físico ou emocional), algo é certo: o tanto que existe de Sertão em cada um de nós fica melhor delineado depois de ouvir Hugo Linns. 31


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paes


Infinito

Rodrigo Édipo “Em pé, com fé, onde o homem iria? Até onde o homem iria?” Caso o telefone não tivesse tocado naquele momento, o resto da minha vida seria diferente. Aos 67 anos eu já estava cansado de tentar fazer a minha vida acontecer. As pessoas passam a vida tentando fazê-la acontecer, e no meu caso, isso me acompanha desde que me recuperei de um meningismo aos 15 anos. Quem estava na linha era Rafael, amigo que conheci no longínquo 2017 em uma das viagens que fiz com a banda Paes para João Pessoa – época em que minha poesia andava nervosa, desacreditada e as palavras jorravam tão inquietas quanto a mais precoce das ejaculações. – Alô, Paulo? Tô ligando pra lhe fazer um convite... precisamos de você. Rafael – hoje, um velho de 70 anos, desorientado da vida e achincalhado pelo cigarro – queria que eu aparecesse em sua casa de praia para nadar, fumar um baseado e tomar água de coco. Mesmo cansado para qualquer tipo de deslocamento além do quarteirão da minha 33


cama, resolvi ir. Estávamos em um nublado agosto. Devido à profissão que exercera por toda a vida, Rafael sempre andou rodeado de jovens. A tarde tinha sido legal, mas extremamente sem sentido. Lembro da presença de Aninha e de outras garotas. Todas no auge do biquíni. De longe, sentado no chão, o peso da idade e dos divórcios me distanciava de qualquer uma delas. Com 67, ainda faltava dois anos para que eu – Paulo Paes, músico e poeta caduco das esquinas do Recife – pudesse fazer alguma referência sexual e esdrúxula à minha idade. Charles Bukowski teria muita pena de mim. Enquanto anoitecia, apareceu outra jovem, o nome era Larissa. Por volta dos 17 anos. Era perfeita. Disseram-me que estava apaixonada por um tal de Mathias, que também estava no local. Notei que ela não tirava os olhos dele, mas o cara não lhe dava a mínima. Deixei pra lá, porém, quando já me despedia de toda aquela juventude que já varava a madrugada, Larissa me perguntou se eu poderia levá-la para casa, justificando estar chateada com Mathias. Senti que essa desnecessária confissão era um truque das mulheres para despertar o interesse dos homens. – Ele é muito sortudo. – abri a guarda. Durante o trajeto, a nossa conversa não passou de um papo-água. Ela disse que era atriz e estava procurando trabalho. Deixei-a no lugar pedido, certo de que se tratava apenas de uma 34


pirralha. E voltei pra casa.

“Bati na porta do desconhecido Misteriosamente”

Depois de um tempo o meu telefone tocou. Era Larissa: – E aí, o que tá fazendo? – perguntou ela. Disse que tinha jantado e estava na cama lendo. Larissa quis saber o nome do livro e como era meu quarto. Ela era capaz de imaginar o nível de solidão daquela noite. Isso me atraiu e – aos 67 anos e ainda tentando fazer a vida acontecer – me entreguei. – Até quando você vai viver o sonho de Sal Paradise? – provocou. O sangue implodiu nas minhas veias e – quando dei por mim – já estava lhe fazendo juras de amor, vendo poesia onde não tem. Embora fosse bonita, não encontrei o ardor e o entusiasmo que uma garota de 17 anos inspira. Só me interessava pelo amor romântico. (…) A cerimônia foi simples e rápida. Estávamos casados. – Você já beijou a noiva, Paulo? – perguntou o Padre – Ah, sim… – disse, sorrindo. Depois de trinta minutos, minhas emoções começaram a ficar confusas. Senti que tinha sido fisgado para aquele altar por um conjunto de circunstâncias absurdas que a vida buro35


crática nos aprisiona. Todas elas perfeitamente evitáveis. Contudo, não poderia esquecer, sempre desejei uma esposa para viver o amor eterno. Larissa era jovem e bonita, com 18 anos incompletos e – embora eu tivesse 50 anos a mais – talvez o casamento vingasse. Talvez a vida – finalmente – começasse a acontecer. “A natureza do ser Não é quanto ter E sim, quanto a ter sentido” Embora não estivesse apaixonado, agora eu era um homem casado e queria que meu casamento desse certo. Eu tinha algo para ocupar a mente. Mas o casório pra Larissa era apenas uma conquista esportiva, assim como uma vitória no mais disputado concurso de novos talentos. O negócio dela era outro. Dois meses bastaram. – Você não me ajuda… não sei para quê eu lhe tenho – falou Larissa de forma ríspida. A carreira de atriz de Larissa não saía do canto, e ela passou a me culpar pelo próprio insucesso. E, depois de tanto não entender e de me iludir com o amor verdadeiro que ela supostamente nutria por mim, percebi que eu não lhe servira nem de trampolim. Talvez as engrenagens estivessem enferrujadas demais para ajudar no salto. Isso me trouxe más lembranças, arquétipos que me assombram desde que minha conturbada relação edipiana aniquilou-me sem pena. Foi triste per36


ceber que dessa vez a minha vida só aconteceu por apenas dois meses. 60 dias, para ficar um pouco mais dramático. Sou fascinado pelas relações interpessoais, elas são a minha maior fonte de inspiração para continuar fazendo o que eu sei. A verdade é que não é só na ascensão que evoluímos, é na queda que aprendemos as maiores lições. E assim a vida vai se preparando. *

Nas horas descobertas pelos sonhos. O infinito… Fragmento extraído da autobiografia “Paulo Paes: Infinito”, no prelo.

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isaar


A eterna manhã de uma voz

Débora Nascimento

Em meados dos anos 1990, houve o final de uma manhã. Era mais um dia que despertava nos estudantes aquela sensação boa de “estamos neste lugar porque gostamos; e não porque fomos obrigados a estudar”. O Centro de Artes e Comunicação da UFPE promovia um de seus eventos culturais, festejando alguma data em especial. Não lembro qual. Provavelmente deveria ser a comemoração do Dia da Música, em que vários artistas e aspirantes se apresentavam dentro de uma programação previamente montada, mas que também abria espaço para os corajosos que se dispusessem a arriscar alguma performance improvisada. Ao meu lado, assistindo às apresentações, estava Zizo, poeta, desenhista e editor de fanzines, cuja obra e personalidade inspiraria, duas décadas depois, a criação do personagem homônimo do filme A Febre do Rato. Como atento observador das pessoas, Zizão ficou maravilhado ao ver uma estudante do curso de Radialismo surgindo, em meio à plateia, para cantar no hall do prédio. Então, virou-se pra mim, com seu contumaz sorriso, e apontando discreta39


mente para a jovem, disse: “Essa daí vai longe”. Na boca de um espectador qualquer, a frase soaria como um comentário clichê, mas, em se tratando de Zizo, com sua alma de mestre, a observação deveria ser levada a sério e este se tornou um dos muitos momentos que guardei na minha memória de ouvinte de música. Não demorou muito tempo e lá está a previsão zizoniana se concretizando. Isaar começava, em 1997, a fazer seus primeiros shows com o Comadre Florzinha, grupo formado por, entre outras, Karina Buhr e Alessandra Leão. O conjunto tinha como principais características a percussão, as batidas e as letras atadas à cultura popular brasileira. O canto das comadres possuía como referência vozes sem burilamento acadêmico. A interpretação atendia às origens e sotaques regionais das moças, sem estar presa a técnicas e a maneirismos. Essa foi a escola de Isaar França, que, antes, já se portava como uma brincante dos maracatus e das festas populares de Pernambuco. As garotas, que estavam naquela maravilhosa fase dos vinte anos, chegaram a dividir uma casa no Poço da Panela, onde estreitaram a amizade e a afinidade sonora – algo que atendia tanto à demanda financeira quanto ao casamento artístico. Cheguei, inclusive, a entrevistá-las, em 1997, para uma matéria, no Jornal do Commercio, sobre jovens que dividiam o mesmo teto fora da casa dos pais. No início de suas carreiras, outras bandas tiveram essa experiência coletiva, como, por exemplo, os Rolling Stones. 40


A convivência intensa acaba se tornando um importante instrumento para a formação musical, estética e comportamental de um grupo musical, até mesmo para a extraordinária descoberta de que, sim, se pode compor! Em paralelo à temporada vitoriosa com a Comadre Florzinha, na qual permaneceu até 2004, nossa heroína foi convidada, em 2001, para integrar um outro projeto exitoso da música pernambucana, a Orquestra Santa Massa, que reunia uma variedade de músicos competentes, como DJ Dolores, Mister Jam, Fábio Trummer e Maciel Salu. Nele, Isaar pôde prosseguir no amadurecimento como intérprete, compositora e performer. O trabalho da superbanda recebeu elogios e aplausos por onde passou. Posteriormente, a cantora emprestou sua voz e capacidade criadora a uma nova iniciativa, DJ Dolores & Aparelhagem, em 2004. Dois anos depois, Isaar mergulhou na concepção e no lançamento de seu primeiro CD solo, Azul Claro. Chegava a vez de levar seu nome à frente de um álbum. Nele, a artista expôs o apuro do bom gosto e da sensibilidade, maturado ao longo dos últimos anos. A imagem da capa sugeria uma atmosfera intimista, um Kind of Blue, mas a alegria inata em Isaar não lhe deixa pegar o rótulo, e ela logo surge na capa do disco Copo de espuma estampando seu cativante sorriso, expressão que ilumina o palco, antes mesmo de começar a cantar. E, assim, “A sorrir…”, Isaar já está há quase 20 anos na profissão de artista, com o pé no 41


chão e na estrada, sabendo que cantar é “buscar o caminho que vai dar no sol”. Desta maneira, vem mantendo a tradição andarilha dos cantores populares, como Luiz Gonzaga, nos anos 1940/50, quando o rádio passava a ser massificado no Brasil como principal veículo para a divulgação de músicas. Hoje, muita coisa nesse mercado musical mudou e melhorou, principalmente em termos de tecnologia de gravação e de promoção, mas isso não impediu Isaar de levantar uma antiga bandeira, através de um cartaz em papel cartolina (“Rádio é concessão pública! Música de qualidade!”) no protesto na Avenida Conde da Boa Vista, realizado no histórico mês de junho de 2013, com as manifestações nas ruas das capitais do país. Vi, em meio aos manifestantes, a artista defender o seu território, que é repleto de bons músicos, mas muitos ainda desconhecidos do grande público. A ficha técnica de seus discos é uma das provas desse manancial ignorado. Com duas décadas de carreira, a cantora, que ainda é uma das poucas mulheres a viver essencialmente de música no estado, e a sua geração, que se uniu na força da mútua colaboração, vem escrevendo o seu capítulo na história da música pernambucana. Essa geração de Isaar é um contraponto ao marasmo que Recife viveu décadas antes, até mesmo porque a cidade e seus artistas foram vítimas da falta de políticas estruturantes para a cultura. Essa geração é produtiva, alia liber42


dade estética a profissionalismo, alimenta com garra a vontade de vencer, sem perder a ternura e a poesia. Uma amostra do cumprimento desses preceitos é que a compositora, em paralelo aos seus discos solos, ainda se lança em desafios, como a participação nos trabalhos de outros músicos e a composição de trilhas sonoras, como a do espetáculo de dança Leve. Isaar, com seu belo rosto de menina sapeca e destemida, possui um elemento crucial para a sobrevivência da alma do artista, manter viva a criança dentro de si. Ella Fitzgerald, a maior de todas (ou seria Elis Regina mesmo, como disse Bjork?), tinha um inacreditável timbre juvenil, mas sabia transformar-se em várias personagens, seguindo cada emoção das canções. Assim como Elis, cantava sorrindo, sem esconder a felicidade de fazer o que gostava. Assim como Ella, sabe Deus o quanto Isaar (e várias cantoras, mundo afora) lutou para conseguir ter e manter uma carreira artística, para permanecer no moto-contínuo do processo de criar, produzir, elaborar, testar, provar, agregar e exibir seu produto imaterial final. A ela, e a todas elas, o nosso respeito. De seu novo disco, ouvi duas faixas que mostram o quanto vem ficando cada vez melhor. As referências e influências se mostram mais sutis, as canções estão mais arrojadas. Das 12 músicas, cinco são de sua autoria, há duas parcerias com Lito Viana e Lucas Vasconcelos, e gravação de composições de Cássio Sette, Ânge43


lo Souza (Graxa), Beto Villares e... Zizo! O mesmo que, em sua antevisão, afirmou que Isaar ia longe. Sim, ela está no imensurável caminho do “longe” e parece não querer saber qual é a distância. Desde que esteja feliz no trajeto.

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caรงapa


Caçapa e seus ragas de viola Patricia Palumbo

O universo da viola é absolutamente sedutor. E imenso. Desde a variedade da feitura do próprio instrumento, passando pelo mundo infinito de afinações. Até a terminologia é saborosa: viola de arame, viola de cocho, afinação rio acima, rio abaixo... Vai longe. Caçapa consegue acrescentar ainda mais história a tudo isso. No álbum Elefantes na Rua Nova (2011), ele usa uma linda viola dinâmica de 10 cordas – uma peça criada em São Paulo e importada pelos cantadores e repentistas que caíram de amor pelo som anasalado e metálico e que terminou por virar uma marca regional. A música tem dessas coisas. A guitarra africana vai parar no nordeste do Brasil com a mesma facilidade que os navegadores encontram para atravessar o oceano se valendo de ventos e correntes favoráveis. E depois vira tudo uma mistura só. A viola de cordas de aço é a viola do poeta nordestino. A de Caçapa tem suas próprias marcas, seus acentos pessoais. Reinventando a tradição ele muda as afinações, troca as cordas, usa pedais e amplificadores. A partir da afinação “natural”, típica da cantoria, ele criou a rebaixada, a oitavada, a tro46


cada. Se já é lindo e inebriante ouvir uma viola, imagine esse som todo repensado sem sair das bases mais tradicionais – que convenhamos, já são maravilhas da nossa música popular. Adoro a definição de gêneros que intitulam as faixas, tem rojão de todo tipo. São como no álbum Coisas (1965), de Moacir Santos. O rojão é o toque da viola que originalmente acompanha o improviso poético, a cantoria. E junto vem o ritmo. O baiano que é mais lascivo, mais dançante, e os cocos e sambas. Delicioso. Cheio de informação e poesia. Caçapa diz que prefere que seus temas não tenham imagens, mas é impossível não imaginar novelas de cordel, sagas de amor e morte ouvindo suas ragas de causar vertigem. Ragas que vem da Índia e de Portugal, da zona da mata e do cais do Recife. Seu trabalho é primoroso, calculado e emotivo porque movido por uma paixão de músico-arquiteto. O aprofundamento na tradição vem do gosto, mas o cuidado, a invenção, a originalidade vem do artista único que ele é.

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caramurĂş


Entre as cores da mandala, um trovador

Leonardo Vila Nova

Ao olhar a profusão de cores que emana de uma mandala, muitos que a admiram, na verdade, não sabem exatamente o que ela significa. Em sânscrito, o nome quer dizer “aquilo que circunda um centro”. Trocando em miúdos, remete à relação entre um ser vivente e o cosmo que se compõe em torno dele. Ao se ouvir a música de Caramurú, tem-se a nítida sensação de se estar frente a uma mandala, e toda a energia pulsante e inspiradora que ela pode despertar se assemelha à relação sensível que o pernambucano tem com sua arte, igualmente policromática e dinâmica. Caramurú lida comumente – e despretensiosamente – com o que o universo dispõe ao seu redor e, de maneira muito particular, transforma em música (ou em desenhos) o que estiver ao alcance da sua busca pelo simples prazer da experimentação. Atualmente, Caramurú é percussionista da banda Tagore – com quem se prepara para lançar, em breve, o primeiro CD – e também já fez parte da banda Caapora. Mas a outra persona do artista, ainda pouco conhecida, é, nada mais, nada menos do que ele próprio, que conversa 49


frequentemente com seus devaneios, e faz deles o prato principal do seu jantar psicodélico. Ao ouvir o EP Ave Maria (2011) e as canções no Soundcloud do artista (soundcloud.com/ocaramuru), me veio à mente um trovador. A despeito do caráter medieval que isso possa vir significar, não ouso aqui classificar o termo como algo que soe atemporal ou anacrônico, mas me atrevo a, com liberdade lúdica e poética, me remeter unicamente à figura de um cantante que circula, sozinho, com seu violão, por ambientes diversos. No entanto, ao longo da trajetória traçada por Caramurú, da primeira à última canção, ele vai cerzindo, por entre simulacros de músicas indianas, ibéricas, sambas, cumbias e outras mumunhas mais, uma multiplicidade de personagens que vão se alternando e se recombinando, em sua simplicidade e poesia – musical e literal. Nunca será possível ver/ouvir apenas um Caramurú. Todo esforço para isso poderá ser em vão. Essa capacidade de ser tantos, habitando apenas um, aponta uma habilidade inata de incorporar referências diversas que se encontram à sua volta, dando-lhes roupagem e características muito peculiares. Seja na forma de fazer música, de escrever ou de criar os arranjos para vestir suas canções. Guardadas as diferenças estilísticas e estruturais, lembro-me muito do disco Smokey Rolls Down Thunder Canyon (2007), de Devendra Banhart, que é igualmente transitório a cada faixa, sempre remetendo a lugares ou épocas diferentes. O trovador, mais 50


uma vez, de passagem. Outra referência que pode ser percebida, está explícita e consciente, é a música “Com ou sem tu”, versão de “Whitin You Withot You”, a incursão dos Beatles (via George Harrison) pela música indiana. Na sua correspondente pernambucana, é possível perceber textura e ares nordestinos. Até a improvável versão, em cumbia, de “Take Five”, de Paul Desmond, endossa, por si só, a vocação de Caramurú para captar, assimilar e promover diálogos entre elementos inusitados e improváveis. Em sua música – ou simplesmente numa conversa informal e corriqueira – Caramurú dá mostras de uma mente irrequieta, apesar da mansidão de algumas de suas músicas. No entanto, irrequieta no sentido da recusa em manter-se linear, passiva ou acomodada, em berço esplêndido, apenas ao que lhe é concedido ou solicitado. Na verdade, sente-se um desejo constante de sua mente em permitir-se trafegar por possibilidades diversas, em nome apenas da fruição artística, curiosa e sem medos ou medidas. Assim se permite, nesses termos, lançar-se até onde a sensibilidade pode encontrar meios para se expressar. “Eu não vejo a hora de cair no fundo do poço”, diz Caramurú na canção “Hall de entrada”. Certamente, por vezes, ele parece querer caminhar no (ou além do) limiar da loucura, correndo todos os riscos que isso pode lhe ocasionar, seja inocentemente ou propositadamente, com algumas leves doses de liberdade e ousadia. A sua música é resultado de um mergulho profundo ao que há de mais lunático 51


dentro de si mesmo. Esse sabor entorpecente de insanidade, que mais evoca liberdade e ousadia, é também marcante na tão (por muitos) inalcançável simplicidade com que uma música pode se manifestar. A busca pelo primor e virtuosidade, que é o objetivo de tantos instrumentistas, não faz parte dos planos que mais interessam a Caramurú. Ele lida com a total despretensão por “arrodeios protocolares” ou pseudobarrocos, até mesmo no modus operandi que segue para registrar suas músicas. Como um artesão, ele lida com ferramentas nem um pouco sofisticadas, a exemplo do Audacity – um software gratuito, de gravação e edição de áudio, geralmente utilizado por iniciantes – para dar forma àqueles tais devaneios particulares com os quais ele mantém diálogo intenso e densamente criativo. Com cortes e recortes de feitura totalmente intuitiva, ele abre mão de procedimentos clássicos, para criar os seus próprios métodos de criação e gravação. O violão – que é o seu “módulo compositor oficial” – não está sozinho nesse processo. Suas canções são materializadas também através de caxixis, congas, triângulos, samplers e efeitos – dos mais rústicos, facilmente encontrados no Audacity. O experimentalismo e a ausência de expectativas quantos aos resultados norteiam o seu processo criativo. O lirismo abstrato através do qual ele exercita sua poesia também é outro aspecto que pode dizer muito a respeito de alguém que, inconscientemente, diz algo sobre si, sem maiores 52


explicações lógicas ou compreensíveis do ponto de vista meramente racional. Uma demonstração clara de que a sensibilidade pode ter também no universo das palavras um campo farto para se manifestar de forma espontânea. As metáforas, por vezes indecifráveis, são também alucinações psicodélicas que carregam compreensões íntimas e particulares a respeito desse cosmos que o cerca. A música de Caramurú diz muito a respeito de si. De forma simples, natural e espontânea, ele vai “parodiando a vida e a morte”, jogando para si mesmo uma responsabilidade muito mais libertária do que qualquer outra: a de fazer uma música comprometida apenas com o seu desejo de reconhecer a si mesmo e a seus vários personagens trovadorescos e psicodélicos em cada verso que escreve e cada som que faz emanar da sua mente, alma e coração. Percorrer as brechas possíveis e abocanhar o que lhe dá imenso prazer.

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team.radio


White Tokio e Recife

Victor de Almeida

Em 2010, eu acompanhei a turnê Nordeste da banda Labirinto (SP). Após shows aqui em Maceió e em Aracaju, fomos até Recife onde a banda se apresentaria numa prévia do festival Coquetel Molotov. Nesse dia, lembro do Elson Barbosa, grande amigo e criador do netlabel Sinewave, falar sobre uma banda que estava lançando um EP pelo selo dele e que se apresentaria na sequência. A banda era a Team.Radio e o EP era o White Tokio. Foi engraçado porque quase todos na Labirinto já tinha ouvido falar neles. A Team.Radio já tinha feito turnê em São Paulo e tocado na casa Dissenso, espaço mantido por alguns integrantes da banda paulista. E eu era, acredito, o único que não tinha ouvido falar da banda, mesmo morando vizinho a Recife. No show, lembro de ter visto uma banda muito jovem que fazia um som que remetia a The Radio Dept e My Bloddy Valentine, em certos momentos, mas que tinha um pé em Recife. Seja no sotaque pernambucano cantando inglês ou no diálogo com a cena indie ou pós-mangue da cidade. Independente do nome dado, era 55


uma banda que dialogava mais com a “herança” do Mellotrons do que com o regional. E isso, de certa maneira, me agradava. Uma das coisas que sempre admirei no cenário musical de Recife é a diversidade. Claro que longe das propagandas “multiculturais” do governo de Pernambuco. A diversidade musical da cidade que me interessava não tocava no carnaval, não estava no ciclo junino e nem nos shows de fim de ano. Bandas como a Team.Radio, e até o próprio Mellotrons, não encontram espaço nem nas casas de show da cidade. Em 2011, eu veria outro show deles, sendo que, dessa vez, em Maceió. A Team.Radio participou do festival Maionese, organizado pelo coletivo Popfuzz, que mais tarde iriam lançar, junto com o Sinewave e o RockInPress, o segundo EP da banda, Summertime. Esse segundo disco me acompanhou durante uma boa parte do ano em minhas viagens semanais a Recife. E, curiosamente, um EP intitulado Summertime me faria companhia durante os dias de estrada, embaixo de chuva, na BR-101, no trecho Maceió-Recife. É um pouco de paradoxo, mas era uma música que refletia de certo modo a cidade que eu estava conhecendo. A Recife multicultural, tradicional, cosmopolita, indie, mangue e pós -mangue. Após o lançamento de Summertime, eu cheguei a produzir uma vinda deles para um show na prévia do festival LAB, em 2011. Nesse show já deu para reparar um certo amadurecimento da banda em relação aos outros shows 56


que eu tinha visto. As influências já estavam mais diluídas e notava-se aqui e ali um flerte com uma música brasileira, não-pernambucana, diga-se de passagem, mas ainda assim nacional do Clube da Esquina. Ao mesmo tempo, percebia-se que algumas músicas se mostravam mais urgentes, mas com um refinamento que o tempo traz. Era pop e era sujo, num bom sentido. Por fim, eu estive em outro show deles em Maceió, no ano passado. Assim como no show do LAB, comecei a ouvir pequenas amostras do disco que eles estão preparando. Foi a partir daí que comecei a esperar, numa mistura de curiosidade e ansiedade, o primeiro álbum completo da Team.Radio. E talvez você, que esteja lendo esse pequeno ensaio pessoal, possa ter uma surpresa semelhante a que eu tive em 2010 quando parar e ouvir a música inédita deles na coletânea que acompanha essa publicação. Quem sabe você passe a acompanhar uma banda que, assim como todas as outras presentes nessa compilação, surgiu em Recife num período de muito paradoxo. E, talvez por isso, mais empolgante.

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walter areia


Isso não é um ensaio aberto, é improviso

Diego Albuquerque

Quando fui convidado para escrever este ensaio sobre Walter Areia, ou simplesmente Areia, a primeira questão que me veio à mente foi: o que seria um ensaio? Na minha concepção, seria algo que você faz previamente e, de preferência, na surdina, até chegar num resultado final satisfatório. Segundo o dicionário, é uma experimentação prévia destinada a verificar se algo serve ou não para determinado fim. Percebi o quão bem o termo ensaio se encaixa com o padrão musical que Areia desenvolve em seu trabalho solo autoral. O músico estudou no conservatório de música do Recife, onde conheceu a teoria musical e teve contato com diversos discos que viriam a ser referência para o resto de sua vida. Aprendeu a tocar baixo e adaptou o instrumento ao seu método de tocar, a ponto de ser considerado um dos melhores baixistas da música nacional na atualidade. Esse status apenas aumentou quando ele resolveu se dedicar à paixão pelo contrabaixo acústico, instrumento pouco difundido e utilizado no Brasil. Walter Areia, um músico mais experiente, 59


já tocou diversos estilos e com vários artistas, entre eles, Alceu Valença e Naná Vasconcelos. Integrou bandas que se apresentaram em navio, viajando em cruzeiros mar adentro. Tudo na época de sua juventude, quando se considerava apenas um mero operário da música. Além de ser popularmente conhecido pelo seu ótimo trabalho como baixista na banda Mundo Livre S/A, um dos grandes ícones da geração mangue pernambucana. Em 2001, se arriscou pela primeira vez em carreira solo, sob a alcunha de Areia Projeto, lançando de maneira independente o disco A Décima Lua, que foi gravado com a ajuda e participações de Elias Paulino (cavaquinho), Maíra Macêdo (bandola) e Flávio Mamoha (violão). Um álbum que, segundo o próprio, nem ele mesmo possui uma cópia, mas que serviu de rascunho para o que estava por vir, e por quais caminhos ele deveria trilhar em suas composições. Dez anos depois, em meio à inquietação do homem-músico, ele cria o projeto Areia & Grupo de Música Aberta, no qual o compositor resolveu realizar ensaios para o público. E esse talvez seja o maior mérito do projeto de Música Aberta. Quem já teve a oportunidade de acompanhar uma apresentação do grupo, deve ter tido a sensação de presenciar um ensaio aberto de uma banda no palco ou algo parecido com isso. Na realidade, as canções do Areia & Grupo de Música Aberta partem de um tema inicial e se transformam em meio aos improvisos. Ou 60


seja, você não está assistindo um ensaio aberto, apenas a pura arte da improvisação! Na música, a improvisação consiste na habilidade de, ao mesmo tempo, produzir e interpretar, independente dos parâmetros harmônicos ou rítmicos, melodias, ritmos ou vocalizações. Sendo assim, o grupo faz com que as músicas-temas durem o quanto os integrantes acharem necessário, sem medo de errar. Na realidade, errar faz parte do processo. O intuito máximo é atingir a satisfação musical, seja para quem está tocando, como para quem está ouvindo. O primeiro registro lançado pelo projeto, Para Perdedores (2011), começa bem já no título. Um disco dedicado às pessoas consideradas perdedoras em uma sociedade na qual a necessidade de ganhar é absurda. Canções para quem têm necessidade de praticar o desapego, ajudar o próximo e não derrubá-lo! Alheio a todo o contexto filosófico possível de extrair do título do trabalho e de suas canções, musicalmente, Areia se baseou na improvisação cíclica da música oriental e do mote dos cantadores nordestinos do Brasil. Porém, me arrisco a dizer que as influências vão muito além, ao longo dos quatro temas que compõem o disco. “Do Início ao Fim de Tudo”, faixa que abre os trabalhos, é um misto de jazz popular e o choroso fado português. Em “Maracatu de Baque Etéreo”, a musicalidade africana e suas batidas se fazem presentes até no título da canção, aliado a um jazz de primeira linha e mais clássico. “Ciranda de Três” nos leva 61


ao interior, ou aos tempos passados, como se nos convidassem a voltarmos a sermos crianças para irmos brincar (ou dançar) na rua. Fechando, “A Joia do Universo”, uma música do mundo, com nuances que interligam diversos estilos, mantendo a calmaria que o mundo necessita nos dias de hoje. Todas as composições foram gravadas em seu primeiro take, durante uma noite no estúdio Muzak. Foi também o primeiro encontro ocorrido pelos integrantes do quarteto. Tal desprendimento deixa claro o quão aberto ao diálogo e à troca se encontra o compositor, característica adquirida, talvez, fruto do hare krishna, religião que Areia segue há mais de dez anos. O bom resultado apresentado no disco deixa clara a percepção aguçada deste grupo de intérpretes, em todos os arranjos de cada uma das canções. Para tal excelência no resultado, parceiros escolhidos a dedo, pessoas que se identificam, não só pelo respeito à música, mas também em personalidades e ideias. Fazem parte, e se unem ao contrabaixista e mentor do projeto na gravação do disco e nas apresentações da banda, Ivan do Espírito Santo (Saxofone), Julio Cesar (Acordeon) e Cassio Cunha (bateria). Para Perdedores é um trabalho que precisa ser degustado com atenção, de mente limpa e coração aberto, tal qual a música que Areia pratica. 62


os autores Bruno Vitorino

Compositor, baixista do Nebulosa Quinteto e colunista do blog Variações para 4.

Conrado Falbo

Músico, performer, professor, pesquisador e integrante do Coletivo Lugar Comum.

Carlos Gomes

Escritor, editor e curador dos projetos do site Outros Críticos.

Renato Contente Repórter da Folha PE.

Rodrigo Édipo

Editor de conteúdo da MI (Música Independente em Pernambuco) e do site Futebol de Bolso.

Débora Nascimento

Repórter da Revista Continente.

Patricia Palumbo

Jornalista e apresentadora do programa de rádio Vozes do Brasil.

Leonardo Vila Nova

Músico, poeta, percussionista da banda Dunas do Barato e jornalista da Fundarpe.

Victor de Almeida

Produtor do Festival LAB, músico da banda Projeto Sonho e doutorando em Comunicação na UFPE.

Diego Albuquerque

Editor dos sites Hominis Canidae, MI (Música Independente em Pernambuco) e Altnewspaper.

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