Ergonomia e Usabilidade - 3ª Edição

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3a edição

Walter Cybis

Adriana Holtz Betiol Richard Faust

Novatec


Copyright © 2007, 2010, 2015 da Novatec Editora Ltda. Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de 19/02/1998. É proibida a reprodução desta obra, mesmo parcial, por qualquer processo, sem prévia autorização, por escrito, do autor e da Editora. Editor: Rubens Prates IG20151006 Assistente editorial: Priscila A. Yoshimatsu Editoração eletrônica: Carolina Kuwabata Revisão gramatical: Marta Almeida de Sá Capa: Igor Lima ISBN: 978-85-7522-459-5 Histórico de impressões: Outubro/2015 Agosto/2013 Agosto/2012 Maio/2011 Abril/2010 Novembro/2009 Setembro/2007

Terceira edição (ISBN: 978-85-7522-459-5) Terceira reimpressão Segunda reimpressão Primeira reimpressão Segunda edição (ISBN: 978-85-7522-232-4) Primeira reimpressão Primeira edição (ISBN: 978-85-7522-138-9)

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capítulo 1

Princípios ergonômicos enriquecendo a experiência do usuário

Este capítulo apresenta um conjunto de qualidades que uma interface deve apresentar de modo que ela possa marcar a experiência de seus usuários. Para tanto, ela deve ser capaz de motivar, estando ao mesmo tempo adaptada a seus usuários e às atividades que eles realizam com o software. O conjunto de qualidades apresentado neste capítulo considera as propostas de ergonomistas, de cientistas da computação, de engenheiros de usabilidade, de designers, e também as exigências de normas e regras de estilo para plataformas. Em particular, foram consideradas as seguintes propostas: • Heurísticas de usabilidade de Nielsen (1993) • Regras de Ouro de Shneiderman (2004) • Princípios de design do Android (“Android Design Principles”) • Princípios de Diálogo da Norma ISO/ABNT 9241:110 (2012) • Critérios ergonômicos de Bastien e Scapin (1997) O conjunto de critérios apresentados neste capítulo está listado na tabela 1.1. Ele resulta da seleção do que as propostas supracitadas apresentam de comum e de diferente. Ele aglutina assim as propostas de diferentes perspectivas, incluindo as dos autores deste livro em uma estrutura fortemente inspirada no conjunto de critérios ergonômicos de Bastien e Scapin (SCAPIN; BASTIEN, 1997).

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Capítulo 1 ■ Princípios ergonômicos enriquecendo a experiência do usuário

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Tabela 1.1 – Conjunto integrador de critérios, princípios, regras e heurísticas para a ergonomia das interfaces e para a experiência do usuário Princípios Poder de marcar a experiência Qualidade da ajuda Condução às ações dos usuários

Qualidade das apresentações

Carga de trabalho

Controle do usuário Adaptabilidade

Gestão de erros

Homogeneidade/coerência Compatibilidade

Subprincípios Poder de encantar Poder de surpreender Poder de simplificar a vida Qualidade da documentação de ajuda Adequação ao aprendizado Apresentação do estado do sistema Convite Feedback imediato Significado dos códigos e das denominações Legibilidade Agrupamento e distinção por localização Agrupamento e distinção por formato Brevidade das entradas individuais Concisão das apresentações individuais Ações mínimas Densidade informacional Ações explícitas Controle do Usuário Flexibilidade Personalização Consideração da experiência do usuário Proteção de erros Tolerância aos erros Qualidade das mensagens de erro Correção de erros Coerência interna a uma aplicação Coerência externa a uma plataforma Compatibilidade com o usuário Compatibilidade com as tarefas do usuário

Estes princípios serão apresentados e exemplificados na sequência deste capítulo.


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1.1 Poder de marcar a experiência Este princípio é uma síntese das propostas da equipe de experiência do usuário da comunidade de desenvolvedores para Android (“Android Design Principles”). As experiências marcantes são resultado da interação com interfaces apresentando três qualidades: o poder de encantar, o poder de surpreender e o poder de simplificar.

1.1.1 Poder de encantar A beleza estética é um atributo que desempenha um importante papel para motivar uma pessoa a usar uma interface. Hassenzahl (2004) esclarece que as pessoas servem-se da bela estética de uma interface, com a qual se identificam, para comunicar aspectos de sua própria identidade. O encantamento estético é uma perspectiva da experiência que permanece estável apesar de eventuais problemas de uso, sendo mais ligado ao ego do que à obtenção de um objetivo. No entanto o poder de encantar não será suficiente para motivar uma pessoa a usar um software que não responda às suas expectativas mínimas de desempenho. Para desenvolver belas interfaces capazes de encantar, os desenvolvedores devem explorar os espaços estéticos de: • imagens e animações; • efeitos sonoros; • fontes, espaçamentos e diagramação; • cores e texturas para elementos das telas e dos planos de fundo; • estilo de ícones para aplicações, ferramentas, status, notificações. O calendário criado pelo UOL para a Copa do Mundo de 2014 (“Calendário da Copa”) tem o potencial de marcar a experiência de seus usuários aficionados de futebol (Figura 1.1). O todo é ousado e inspirador, destacando-se em relação ao formato usual de tabela de jogos, e está estruturado em torno de uma bola flutuando sobre as belas imagens dos estádios da copa. O simples sobrevoo do mouse dá acesso aos resultados dos jogos em todas as etapas. A interação com este calendário proporciona uma experiência


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rica em percepções lúdicas e pragmáticas, exemplificando perfeitamente o modelo de qualidades hedônicas e pragmáticas de Hassenzahl, apresentado na seção 6.1.2 deste livro (HASSENZAHL, 2005).

Figura 1.1 – Tabela da Copa de Mundo de 2014 do portal UOL http://copadomundo. uol.com.br/tabela-da-copa/.

1.1.2 Poder de surpreender Como seu nome diz, este princípio preconiza a busca pela superação das expectativas dos usuários em relação a uma aplicação e a sua interface, e isso tanto no plano estético como no funcional. O poder de surpreender vai motivar o uso da interface, seja porque ela é bela e evoca boas recordações ou porque oferece produtividade pessoal. Do ponto de vista funcional, as interfaces capazes de surpreender colocam funções importantes ao alcance dos usuários, capacitando-os a aproveitar ao máximo sua experiência. A interface enriquecida das transmissões Web (streaming) da Radio Canadá para os jogos da Copa do Mundo de 2014 tinha realmente o poder de marcar a experiência dos amantes de futebol (Figura 1.2). Além da excelente qualidade das imagens e da oferta de dados e informações sobre a partida em modo multitela, ela colocava vídeos dos acontecimentos marcantes da


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partida à disposição do usuário em uma linha de tempo anotada. Ele tinha assim o poder de visualizá-los quantas vezes e quando quisesse, mesmo enquanto assistia à partida.

Figura 1.2 – Tela enriquecida da transmissão Web da Copa do Mundo de 2014 da Radio Canadá.

1.1.3 Poder de simplificar a vida Este princípio é extremamente motivador para o usuário que percebe em uma interface a possibilidade de viver experiências eficazes e produtivas sem que haja necessidade de aprendizado intensivo ou leitura de vasta documentação. Neste caso, é a percepção da utilidade e da usabilidade de uma aplicação de software, e menos sua estética, que marca a experiência do usuário. Uma interface com o poder de simplificar a vida do usuário… • apresenta funções simplificando atividades realizadas pelos usuários, ao mesmo tempo que aumenta o seu desempenho. Ela faz as coisas complicadas em seu lugar (Figura 1.3b) e reduz a carga de trabalho em atividades trabalhosas (Figuras 1.3a e 1.3b);


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• apresenta recursos de personalização inteligentes capazes de aprender sobre o usuário, de modo que, oportunamente, venham a facilitar a sua vida (Figuras 1.3b e 1.3c).

(a)

(b)

(c)

Figura 1.3 – Telas da aplicação Cifra Club simplificando bastante a vida do usuário amante do violão. Sob o comando do usuário, esta aplicação apresenta os acordes de que o usuário necessita em um painel popup (a), faz a complicada mudança de tom da partitura em um clique (b) e realiza a confortável rolagem automática da música que o usuário está tocando (c).

1.2 Condução às ações do usuário A condução caracteriza a interface que recepciona bem os usuários que buscam realizar ações específicas com o sistema. Este critério, originalmente proposto por Bastien e Scapin (1997), aplica-se quando o objetivo é favorecer a utilização do sistema por usuários novatos, principalmente. Neste livro, este critério é analisado a partir de três dimensões: a visualização do estado do sistema, o convite e o feedback imediato.


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1.2.1 Visualização do estado do sistema A primeira providência para conduzir o usuário em suas ações é bem informá-lo sobre o estado do sistema. A informação do estado do sistema é um princípio proposto por Nielsen (1993) e distingue-se da noção de feedback na medida em que não se refere a uma ação do usuário. Este princípio aplica-se especialmente em sistemas autônomos e em tempo real, nos quais a interface deve apresentar o estado do sistema, bem como as notificações sobre as ações de outros agentes do sistema, de modo que o usuário possa articular suas ações (Figura 1.4).

(a)

(b)

(c)

(d)

Figura 1.4 – Indicação do estado do sistema : (a) no site Grooveshark.com – música sendo executada em uma playlist e estado da execução no tempo; (b) a chamada no Skype; (c) o recebimento de uma mensagem no sistema Thunderbird; (d) o momento do último salvamento automático do software do IRPF 2015.


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Exemplos deste princípio incluem: • a indicação de qual música de uma playlist está sendo tocada pelo sistema (Figura 1.4a); • a indicação de chamada telefônica sendo estabelecida (Figura 1.4b); • a indicação da chegada de uma mensagem de e-mail (Figura 1.4c); • a indicação de um salvamento automático efetuado (Figura 1.4d).

1.2.2 Orientação e convite Além de informar sobre o estado do sistema, a interface deve convidar o usuário a realizar suas ações, empregando recursos que lhe permitam localizar-se, identificar as opções de comando disponíveis, conhecer sobre seu modo de operação, incluindo as formas de obter ajuda. Uma interface acolhedora e convidativa apresentará… • títulos claros para as telas, janelas e caixas de diálogo; • instruções sobre os modos de operação (Figura 1.5); • informação sobre os formatos das entradas esperadas (Figura 1.5);

(a)

(b)

Figura 1.5 – Instruções sobre o modo de operação: (a) no Google Maps; (b) aplicativo Primeiros Socorros do Dr. Drauzio.


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1.2.3 Feedback imediato Uma vez que o usuário tenha comandado uma ação, a interface deve mantê-lo informado sobre o novo estado do sistema. O conteúdo e a rapidez do feedback são fatores importantes para o estabelecimento da satisfação e confiança do usuário, assim como para o entendimento do diálogo e do funcionamento do sistema. O feedback imediato é uma qualidade a serviço de todos, mas principalmente dos usuários mais novatos, que pouco conhecem as reações dos sistemas. A ausência de feedback, ou sua demora, pode ser desconcertante para este tipo de usuário, que pode suspeitar de uma falha no sistema e tomar atitudes prejudiciais para os processos em andamento. Uma interface que fornece feedback de qualidade… • relata ao usuário o recebimento de todas as entradas por ele efetuadas; • indica ao usuário que um tratamento demorado está sendo realizado, bem como a sua conclusão e o seu resultado (Figura 1.6). As respostas do computador devem ser fornecidas de forma rápida, em um tempo apropriado e adequado a cada tipo de transação. Uma resposta rápida deve ser fornecida com informação sobre o resultado da transação solicitada.

(a)

(b)

Figura 1.6 – Feedback sobre: (a) a criação de um texto rápido na interface de SMS para Android e (b) a criação de um álbum e o registro de um artigo no álbum criado na aplicação Pinterest.


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1.3 A qualidade das apresentações O entendimento de uma tela depende fundamentalmente do significado, da legibilidade e da distribuição relativa das informações e dos objetos nela apresentados. Este critério está dividido em três subcritérios elementares: apresentações significativas, legibilidade, agrupamento/distinção por localização e agrupamento/distinção por formato.

1.3.1 Apresentações significativas Este princípio diz respeito aos códigos e denominações apresentados ou solicitados pela interface. Ele preconiza especificamente uma adequação entre o conteúdo e a expressão destas apresentações. Quando em um contexto de uso a expressão é significativa para o usuário, este poderá reconhecer ou interpretar seu significado facilmente, terá menos dúvidas e cometerá menos erros. Esta qualidade caracteriza as interfaces claras e aplica-se especialmente quando os usuários são novatos ou intermitentes. Em uma interface significativa… • os nomes de funções e objetos de interação são familiares para os usuários (Figura 1.7); • os códigos são representativos do conteúdo que veiculam e são distintos (por ex.: M – Masculino / F – Feminino, em vez de 1 – Homens / 2 – Mulheres); • as abreviações são de imediata interpretação.

(a)

(b)

Figura 1.7 – (a) Formulário de entrada no Horde, que apresenta o rótulo “Nome do usuário” em vez de “Login”. (b) O mesmo software emprega os nomes “Lista Branca” e “Lista Negra”, que são bastante representativos das funções que filtram as mensagens desejáveis e indesejáveis.


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1.3.2 Legibilidade A legibilidade diz respeito às características que possam dificultar ou facilitar a leitura das informações textuais. Ela é uma qualidade a serviço de todos os tipos de usuários, mas particularmente das pessoas idosas e com problemas de visão. As principais legibilidades são: • o tamanho da fonte • o contraste letra/fundo • o espaçamento entre linhas • o comprimento das linhas

Figura 1.8 – Tela do site digital acesso.com apresentando texto legível com contraste positivo e em colunas de linhas curtas.

Em uma interface legível… • o texto longo que deve ser lido rapidamente aparece em letras maiúsculas e minúsculas misturadas naturalmente (maiúsculas no início de frases e nomes próprios) em vez de somente com maiúsculas; • este mesmo tipo de texto é apresentado em linhas com comprimento adequado (não muito longo) e com um contraste efetivo com o fundo (Figura 1.8);


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• o texto que deve ser lido por idosos ou pessoas com problemas de visão (sensibilidade ao contraste) aparece em letras claras sobre um fundo escuro (Figura 1.9). Para essas pessoas o fundo brilhante pode ofuscar completamente as letras escuras.

Figura 1.9 – Tela do site Acesso Digital com contraste negativo, adequada às pessoas com problemas de sensibilidade ao contraste. Este tipo de contraste, entretanto, torna a tela mais sensível a problemas de reflexão de pontos luminosos externos.

1.3.3 Agrupamento e distinção por localização Esta é a qualidade que caracteriza a interface que permite ao usuário perceber rapidamente sua organização a partir da localização das informações nas telas. Esse critério, originalmente proposto por Bastien e Scapin (1997), diz respeito também ao posicionamento relativo dos itens dentro de um grupo. Uma interface espacialmente organizada deve… • distribuir logicamente as opções de comando em grupos em função dos objetos e das ações que a eles se aplicam (Figura 1.10). Ela deve também distribuir logicamente as opções dentro dos grupos em função de sua frequência de utilização, de ordem cronológica ou da importância da tarefa;


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• apresentar os campos de um formulário em sequência lógica (em função da ordem da tarefa, de sua importância ou frequência de uso); • apresentar listas de dados ou informações coesas (somente informações de um mesmo tipo dentro de determinada lista) e ordenadas logicamente; • separar e aproximar itens e grupos nas telas conforme as relações lógicas que se estabelecem entre eles.

Figura 1.10 – Barra de ferramentas, organizando as opções de ferramentas do MS Word.

1.3.4 Agrupamento distinção por formato Este princípio preconiza que o usuário deve poder perceber rapidamente as similaridades ou diferenças entre as informações a partir da forma gráfica de componentes da interface. Uma interface graficamente organizada irá… • estabelecer uma distinção visual entre áreas com funções diferentes em uma tela (comandos, ferramentas, dados, informações etc.); • distinguir graficamente os elementos de uma tela que têm diferentes funções, como os títulos e as opções dos menus (Figura 1.11a) ou os rótulos e os dados em um formulário de entrada (Figura 1.11b). Uma atenção especial deve ser dispensada ao emprego das cores para diferenciar a informação, na medida em que este recurso pode não ser efetivo em diversas situações, como quando os usuários forem daltônicos, nos casos em que a interface e as informações possam ser acessadas ou impressas em telas e impressoras monocromáticas (preto e branco). Nestes casos, os projetistas devem procurar outro tipo de codificação adicional, como legenda, marcadores, estilo de caracteres, contraste figura-fundo etc.


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(a)

(b)

Figura 1.11 – (a) Página Web do correntista do Banco do Brasil diferenciando títulos dos grupos e opções sensíveis por formato. (b) Formulário do aplicativo IRPF 2015 diferenciando rótulos, dados e orientações.

1.4 Ajuda e aprendizado Este critério preconiza que uma interface apoie o usuário em seu aprendizado do sistema e na busca de ajuda para poder realizar uma atividade. Ele representa uma extensão do princípio de condução e de qualidade das apresentações e é formado por dois subcritérios: adequação ao aprendizado e qualidade da ajuda.

1.4.1 Adequação ao aprendizado A parte 110 da norma ISO 9241 propõe que a interface ergonômica deve apresentar características que facilitem o seu aprendizado. Assim, uma interface adequada ao aprendizado faz uso de…


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• modelos conceituais para a interface que sejam compatíveis com os modelos mentais de seus usuários; • metáforas para estruturar a interface, que terá o aspecto e o comportamento de um objeto conhecido, como um calendário, uma agenda ou ainda uma calculadora (Figura 1.12). Assim, o usuário que saiba como usar estes objetos poderá aplicar as estratégias e os modos de operação conhecidos à nova interface; • telas de diálogos consistentes entre si e compatíveis com a estrutura da atividade que o usuário realiza com o sistema; • uma função de desfazer ações equivocadas, dando segurança para o usuário explorar a interface. Estes dois últimos pontos se referem igualmente aos critérios de consistência, compatibilidade e de correção de erros, apresentados mais adiante neste capítulo.

(a)

(b)

Figura 1.12 – (a) Metáforas de um rolete utilizado na tela da aplicação Tecnonutri para tornar a entrada da altura do usuário totalmente intuitiva; (b) metáfora da calculadora no Windows 7 contribuindo para o aprendizado imediato da aplicação.


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1.4.2 Qualidade da ajuda Este princípio, que é preconizado de maneira explícita por Nielsen (1993), está a serviço de um usuário engajado na utilização de um software que, devido à falta de experiência ou de conhecimentos, busca obter ajuda para completar sua atividade. O software adaptado do ponto de vista da qualidade da ajuda apresenta… • diversos estilos de ajuda: ajuda contextual, conceitual, passo a passo; • ícones de ajuda contextual bem à vista do usuário (Figura 1.13a); • função de ajuda procedural (Figura 1.13b), com facilidades de navegação e de busca no conteúdo; • função de ajuda por tutorial passo a passo orientado à tarefa, com um número limitado de etapas.

(a)

(b)

Figura 1.13 – (a) Ícone levando a ajuda contextual da aplicação Pinterest; (b) tela de ajuda contextual da aplicação Pinterest.


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1.5 A carga de trabalho O critério carga de trabalho preconiza a redução da carga cognitiva e perceptiva do usuário, bem como o aumento da eficiência do diálogo. Este critério, proposto por Bastien e Scapin (1997) e também por Shneirderman (2004), aplica-se em um contexto de trabalho intenso e repetitivo realizado por usuários experimentados em ambientes profissionais. Nestes contextos, o software deve poupar o usuário de leituras e memorizações desnecessárias, de deslocamentos inúteis, além da repetição de entradas. Quanto maior for a carga de trabalho cognitivo para o usuário, maior será a probabilidade de ele vir a cometer erros. A carga de trabalho subdivide-se em dois critérios: brevidade (que inclui concisão e ações mínimas) e densidade informacional.

1.5.1 Brevidade O software ergonômico deve respeitar a capacidade de trabalho perceptivo, cognitivo e físico do usuário, tanto para entradas e saídas individuais quanto para conjuntos de entradas (i.e., conjuntos de ações necessárias para alcançar uma meta). O critério brevidade divide-se em duas qualidades elementares: concisão e ações mínimas. 1.5.1.1 Concisão

A concisão se refere à minimização da carga perceptiva, cognitiva e motora associada à realização de saídas e entradas individuais pelos usuários. Uma interface concisa… • apresenta títulos (de telas, janelas e caixas de diálogo), rótulos (de campos, de botões, de comandos) e denominações curtas; • fornece valores default1 adequados para a entrada de valores individuais (Figura 1.14a); • fornece facilidades de seleção (listas, check boxes, botões de rádio) para a entrada de valores individuais (Figura 1.14a); 1 Valor default é um valor ou uma opção de entrada que o sistema oferece automaticamente ao usuário. Caso este seja adequado, o usuário não terá trabalho algum para realizar a entrada.


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• fornece apoio às entradas de dados repetitivos (Figura 1.14b); • fornece o preenchimento automático de vírgulas, pontos decimais e zeros à direita da vírgula nos campos de dados.

(a)

(b)

Figura 1.14 – Telas da aplicação Nutrabem: (a) minimizando a carga de trabalho para a entrada da data de nascimento dos usuários. Uma data default em 1980 irá facilitar a entrada para a maioria das pessoas adultas, o público-alvo da aplicação; (b) opção “Copiar para outro dia” na interface da aplicação TecnoNutri facilitando a entrada de valores repetitivos.

1.5.1.2 Ações mínimas

Este princípio preconiza a minimização e a simplificação do conjunto de ações necessárias para o usuário alcançar uma meta ou realizar uma atividade. Ao limitar, tanto quanto possível, o número de telas pelas quais o usuário deve passar, ele estará diminuindo a carga de trabalho e a probabilidade de ocorrência de erros. Uma interface ágil e rápida… • oferece atalhos de favoritos, de modo que o usuário não tenha de percorrer em sequência todos os painéis de menu ou as páginas de um documento para alcançar uma página ou um painel específico;


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• proporciona funções de produtividade, permitindo que o usuário repita entradas realizadas (atalho Ctrl+Y nas aplicações do MS Office); • proporciona a manipulação direta de objetos gráficos (clicar e arrastar), poupando o trabalho do usuário de editar muitas linhas de comando (Figuras 1.15 e 1.16).

(a)

(b)

Figura 1.15 – (a) Realização de ações complicadas por meio de manipulações simples no gerenciador de arquivos do Windows 7; (b) inserção de uma tabela por meio de um mínimo de cliques no MS Word.


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Figura 1.16 – Tela do correntista do Banco do Brasil, permitindo a obtenção de extratos de conta de forma simples, com apenas um clique na barra de tempo.

1.5.2 Densidade informacional O critério densidade informacional preconiza a redução da carga de trabalho perceptiva e cognitiva do usuário em relação ao conjunto total de itens de informação apresentados em uma tela. Este critério, proposto por diversos autores, está prioritariamente a serviço de usuários iniciantes em uma aplicação, que terão dificuldades para encontrar o que precisam em uma tela carregada de informação. De fato, os erros são mais frequentes e o desempenho dos usuários é reduzido quando a densidade da informação é muito alta.

(a)

(b)

Figura 1.17 – (a) Caixa de diálogo “Localizar e Substituir” do Word apresentando um mínimo de opções e permitindo o acesso às opções mais avançadas por meio da opção “Mais >>”; (b) versão para celular do site “minhavida.com” organizando o conteúdo em uma interface “acordeom”, que minimiza a quantidade de informação apresentada.


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Uma interface minimalista… • apresenta somente os itens que estão relacionados à tarefa; o restante pode ser acessado oportunamente (Figura 1.17a); • organiza as apresentações em painéis escondidos como os de um acordeom (Figura 1.17b).

1.6 Controle explícito Este critério, proposto por todos os pesquisadores citados no início deste capítulo, aplica-se em particular às tarefas longas sequenciais e nas quais os processamentos sejam demorados. São situações delicadas, em que a falta de controle do usuário sobre as ações do sistema pode levar a perdas de tempo e de dados. O controle explícito é subdividido em dois critérios elementares: ações explícitas do usuário e controle do usuário.

1.6.1 Ações explícitas do usuário Este critério aplica-se antes da realização de ações longas, sequenciais e de tratamento demorado, ou ainda que tenham repercussão importante para o usuário. Em tais situações, o programa deve executar somente aquilo que o usuário quiser e quando ele comandar. Esse critério refere-se assim à ligação explícita que deve existir entre uma ação do usuário e um processamento importante do sistema. Este princípio é menos aplicável a situações corriqueiras, embora os usuários entendam melhor o funcionamento de uma aplicação e cometam menos erros quando o processamento pelo computador resulta de suas ações explícitas. A interface acionada explicitamente… • separa as ações de seleção de uma opção e de ativação dessa opção quando se referir a um tratamento demorado e de grande repercussão sobre o sistema (Figura 1.18); • não implementa comandos de dupla repercussão (por exemplo, salvar + fechar) envolvendo tratamentos demorados e de responsabilidade;


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• sempre solicita uma ação do usuário de validação global em um formulário para entrada de diversos dados ou parâmetros.

(a)

(b)

Figura 1.18 – (a) Diálogo do Skype dando ao usuário o controle explícito sobre a ativação de uma chamada que não ocorre automaticamente quando da seleção de um contato; (b) diálogo do Android separando a seleção da ativação de uma opção.

1.6.2 Controle do usuário O critério controle do usuário aplica-se durante a realização de ações longas, sequenciais e de tratamento demorado. Nessas situações os usuários devem estar no controle dos acontecimentos, podendo, por exemplo, comandar uma interrupção, o cancelamento, o reinício, a retomada ou a finalização dos tratamentos. As ações do usuário devem ser antecipadas, e as opções apropriadas devem ser oferecidas. O controle sobre as interações favorece a aprendizagem e assim diminui a probabilidade de erros. Em consequência, o sistema torna-se previsível e adaptado a usuários novatos e intermitentes.


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Em uma interface controlada pelo usuário… • o usuário encontra as opções para comandar o avanço, o recuo, a interrupção, a retomada ou a finalização de um diálogo sequencial (Figuras 1.4a e 1.19); • o usuário encontra as opções para comandar a interrupção, a retomada ou a finalização de tratamentos demorados; • o cursor não se desloca de um campo a outro em um formulário como efeito do comando explícito de tabulação ([Tab]).

(a)

(b)

Figura 1.19 – (a) e (b) Diálogo passo a passo na aplicação “Primeiros Socorros” dando a possibilidade ao usuário de avançar e recuar sequencialmente nas etapas das instruções.

1.7 A adaptabilidade A adaptabilidade é proposta por diversos pesquisadores, como a qualidade do software adaptar-se ou estar adaptada a usuários de diferentes perfis e níveis de competência. Ela é particularmente esperada em sistemas em que o público-alvo é vasto e variado. Três subcritérios participam da adaptabilidade: a flexibilidade, a consideração da experiência do usuário e a personalização.

1.7.1 Flexibilidade A flexibilidade preconiza que as interfaces devem disponibilizar diferentes maneiras para a realização de uma mesma tarefa, independentemente do nível de competência dos usuários. Este princípio aplica-se quando o usuário


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desenvolve estratégias variadas para a realização de uma tarefa ou se encontra em condições particulares de contexto, como, por exemplo, quando ele necessita de mais precisão na tarefa ou quando ele está com pressa. Uma interface flexível fornece aos usuários… • diferentes maneiras de realizar a entrada de dados (por digitação, por seleção, por manipulação direta); • diferentes caminhos para chegar a uma funcionalidade frequentemente utilizada (ícone na barra de ferramenta, opção em um painel de menu, atalho de teclado); • diferentes opções de formato de arquivos e de unidades para os dados (Figura 1.20).

(a)

(b)

Figura 1.20 – Telas de configuração de cores no MS Office, nas quais o usuário pode (a) selecionar uma cor padronizada ou (b) definir uma cor personalizada clicando sobre um ponto na área de cores ou digitando seu valor em diferentes sistemas (RGB ou HSL).

1.7.2 Consideração da experiência do usuário Este critério aplica-se quando o software pode ser usado tanto por novatos como por experientes e preconiza que sua interface deve propor diferentes meios para que ambos tenham facilidade de usar suas funções, sem a


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necessidade de personalizá-la. É importante salientar que um usuário experiente pode retroceder a uma condição de iniciante (menos especialista) depois de longos períodos sem utilizar o sistema. Uma interface que considere a experiência do usuário… • fornece aos especialistas atalhos que permitem acesso rápido às funções do sistema; • fornece aos usuários intermitentes diálogos passo a passo; • fornece aos usuários totalmente inexperientes diálogos sob a iniciativa do computador (Figura 1.21).

Figura 1.21 – Telas da urna eletrônica brasileira cuja sequência de diálogo (a > b > c > d > e) é controlada explicitamente pelo sistema. O usuário passa de uma cédula eletrônica a outra à medida que confirma suas intenções de voto.

1.7.3 Personalização A personalização refere-se aos meios colocados à disposição de usuários para que estes personalizem a interface de modo a levar em conta as exigências da tarefa, suas estratégias ou seus hábitos de trabalho. Uma interface personalizável oferece ao usuário as possibilidades de… • personalizar as telas, inserindo ou retirando ícones, dados ou comandos, ou ainda definindo seus favoritos (Figura 1.22);


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• definir sequências de ações automáticas (macros); • alterar os valores default oferecidos pelo sistema.

(a)

(b)

Figura 1.22 – (a) Tela do aplicativo IRPF 2015 com recursos de favoritos permitindo ao usuário economizar na navegação em busca de uma ficha. (b) Tela de personalização da aplicação CifraClub, na qual o usuário pode configurar diferentes parâmetros influenciando sua experiência.

1.8 Gestão de erros A gestão de erros diz respeito a todos os mecanismos que permitem evitar ou reduzir a ocorrência de erros e que favoreçam sua correção. Este critério caracteriza a interface segura. Ele aplica-se em particular quando os erros dos usuários têm repercussões importantes como a perda de dados, de dinheiro, ou colocam em risco a integridade física de pessoas. De maneira geral, pode-se dizer que as interrupções provocadas pelos erros têm consequências negativas sobre a atividade do usuário, prolongando as transações e atrapalhando o planejamento. Quanto menos erros acontecerem, menos interrupções ocorrerão e melhor será o desempenho do usuário.


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Quatro subcritérios participam da gestão dos erros: a proteção contra os erros, a tolerância aos erros, a qualidade das mensagens de erro e a correção dos erros.

1.8.1 Proteção contra os erros A proteção contra os erros diz respeito aos mecanismos empregados para detectar e prevenir os erros de entradas de dados ou de comandos e impedir que ações de consequências desastrosas e/ou irrecuperáveis ocorram. Uma interface que protege a interação contra os erros… • indica ao usuário a existência de erros em entradas ainda não efetuadas (Figura 1.23); • avisa o usuário sobre o risco de perda de dados ainda não gravados ao final de uma sessão de trabalho; • não oferece um comando destrutivo como opção default.

Figura 1.23 – Campos para os dados da conta-corrente no site do Banco do Brasil, protegendo o usuário de erros de entrada. O fundo dos campos não será “amarelado” enquanto o dado inserido não corresponder a um valor válido.

1.8.2 Tolerância a erros Este critério diz respeito à capacidade de os sistemas realizarem sua função de maneira satisfatória, apesar dos erros mais evidentes dos usuários.


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Uma interface que é tolerante aos erros dos usuários… • fornece resultados de buscas de informação, desconsiderando os erros evidentes na expressão de busca (Figura 1.24).

Figura 1.24 – O motor de pesquisa da Google mostrando os resultados da busca de informação desconsiderando um erro de digitação evidente, mas oferecendo ao usuário a opção de realizar a busca pelo termo originalmente digitado pelo usuário.

1.8.3 Qualidade das mensagens de erro Este princípio preconiza que as mensagens de erro apresentadas pelo sistema devem ser pertinentes, legíveis e exatas em relação à informação dada ao usuário sobre a natureza do erro cometido (sintaxe, formato etc.), e sobre as ações a serem executadas para corrigi-lo. A qualidade das mensagens favorece o aprendizado do sistema. Uma boa mensagem de erro… • indica ao usuário a razão ou a natureza do erro cometido, o que ele fez de errado, o que deveria ter feito e o que deve fazer para sair da situação de erro (Figura 1.25); • é orientada para a tarefa, emprega termos específicos e é breve; • tem um tom neutro, não reprovador ou humorístico.


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Figura 1.25 – Mensagem de erro do aplicativo de correio eletrônico Thunderbird, indicando as causas do erro e as ações possíveis para recuperar a normalidade do sistema.

1.8.4 Correção dos erros O critério correção dos erros diz respeito aos meios colocados à disposição do usuário com o objetivo de permitir a correção de seus erros. Os erros são bem menos perturbadores quando são fáceis de corrigir. Há facilidade na correção de erros quando a interface… • fornece funções “desfazer” e “refazer”; • fornece a possibilidade de o usuário refazer apenas a parte errada de uma entrada (indica o dado errado em um formulário, mantendo todos os outros intactos); • fornece ligação direta entre o relatório de erro e o local onde ele se produz (Figura 1.26).


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Figura 1.26 – Tela do verificador de pendências do IRPF indicando a natureza dos erros cometidos, as ações possíveis para sua correção e oferecendo um link que dá acesso ao campo onde o erro foi verificado.

1.9 Homogeneidade/coerência Este princípio preconiza que as interfaces devem ser consistentes, procurando respeitar padrões e estilos definidos tanto no nível do produto como no nível da plataforma. Ele aplica-se em particular quando os usuários são novatos ou intermediários. Diante de uma tela desconhecida, eles tentarão empregar estratégias desenvolvidas na interação com outras telas de um mesmo software ou uma mesma plataforma. Ele se divide em dois subcritérios: a coerência interna e a coerência externa.

1.9.1 Coerência interna O critério coerência interna refere-se à forma na qual as escolhas no projeto da interface (códigos, denominações, formatos, procedimentos etc.) são


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conservadas idênticas em contextos idênticos. Os procedimentos, rótulos, comandos etc. são mais facilmente reconhecidos, localizados e utilizados quando seu formato, sua localização ou sintaxe são estáveis de uma tela para outra, de uma seção para outra. Nessas condições, o sistema é mais previsível e a aprendizagem é mais generalizável; os erros são minimizados. Em uma interface internamente homogênea… • os códigos e as denominações são definidos pelos mesmos critérios em contextos idênticos; • a distribuição, a apresentação e a denominação dos objetos nas telas são padronizadas (Figura 1.27); • a sintaxe dos procedimentos é padronizada (utiliza os mesmos meios para obter os mesmos resultados).

Figura 1.27 – Telas “Opções” e “Confirmações de leitura” do aplicativo de correio eletrônico Thunderbird respeitando as mesmas regras para o arranjo (alinhamento, grupamento, posicionamento, estilo…) de seus componentes (seletores e botões de comando).


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1.9.2 Coerência externa O critério coerência externa preconiza que interfaces rodando em uma mesma plataforma (Windows, MacOS, Android ou iOS, por exemplo) devem apresentar aparências e comportamentos semelhantes, o que contribui para a sua intuitividade. Em uma interface externamente homogênea… • os formatos, os arranjos, os procedimentos seguem os padrões mais populares entre as aplicações para a mesma plataforma (Figura 1.28).

Figura 1.28 – Telas de diferentes aplicações para celulares inteligentes (smartphones) da plataforma Android compartilhando as mesmas regras para o arranjo (posicionamentos, alinhamentos, estilos…) de seus componentes.

1.10 Compatibilidade Este critério preconiza a existência de compatibilidade, ou de um acordo natural entre as características das interfaces, dos usuários e das tarefas que eles realizam com o sistema. Deste modo, o aprendizado será mais rápido e a eficiência do usuário será maior. O critério compatibilidade divide-se em dois subcritérios: a compatibilidade com o usuário e a compatibilidade com a tarefa.


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1.10.1 Compatibilidade com o usuário Este princípio preconiza que as características do sistema sejam compatíveis com os conhecimentos e as competências dos usuários assim como suas habilidades e capacidades físicas, cognitivas (memória, percepção) e culturais. Em uma interface compatível com o usuário… • as informações textuais são apresentadas em caracteres maiores caso a população-alvo seja composta em sua maioria por idosos (compatibilidade com suas dificuldades perceptivas) (Figura 1.29a); • (em interfaces direcionadas a usuários idosos) as áreas sensíveis das opções de comando são maiores e mais espaçadas entre si (compatibilidade com suas dificuldades de controle motor); • as informações coloridas serão duplamente codificadas caso a população-alvo tenha uma alta porcentagem de homens (compatibilidade com a maior incidência de daltonismo nesta população) ou quando houver a possibilidade de elas serem apresentadas em suporte monocromático (telas ou impressoras em preto e branco) (Figura 1.29b);

(a)

(b)

Figura 1.29 – (a) Estilo de apresentação da aplicação Big Launcher compatível com as limitações de usuários idosos. (b) Código de cores redundantes compatível com usuários daltônicos na interface de configurações do Android.


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• a ordem de leitura dos componentes das telas se faz de cima para baixo e da esquerda para a direita para interfaces direcionadas ao mercado ocidental (compatibilidade com a cultura dos usuários).

1.10.2 Compatibilidade com a tarefa Este princípio preconiza a existência de um acordo entre a estrutura das tarefas e as características da interface em termos de organização das entradas, das saídas e do diálogo de determinada aplicação. Em uma interface compatível com a tarefa do usuário… • as telas são compatíveis com os documentos em papel, o que torna a transferência de informações do contexto da tarefa para o do sistema mais rápida e eficaz; • as convenções dos usuários em termos de denominações, unidades de medida, categorias de informações são respeitadas (Figura 1.30). Assim as traduções, as transposições, as interpretações ou referências à documentação são minimizadas.

(a)

(b)

Figura 1.30 – (a) Unidades de medidas à disposição do usuário interessado em controlar seu consumo de calorias por meio da aplicação TecnoNutri; (b) Interface compatível com a sequência natural das refeições semanais do usuário em regime, na aplicação Nutrabem, o que facilita o entendimento da interface e a eficiência do usuário.


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1.11 Conclusões sobre o compromisso entre critérios Com base no que foi exposto neste capítulo, é possível estabelecer algumas relações entre aspectos do contexto de operação dos sistemas e os critérios ergonômicos a priorizar em uma atividade de projeto e/ou avaliação de usabilidade. A seguir são listadas algumas das relações mais evidentes. • Quando o público-alvo é composto de novatos e intermitentes, especialmente nos casos de sistemas que são usados apenas uma vez (por exemplo, instaladores) ou de vez em quando (por exemplo, o software do imposto de renda), deve-se priorizar os critérios condução, consistência e significado dos códigos e denominações. • Quando os usuários são experientes em suas tarefas, mas novatos no uso do sistema, o critério compatibilidade deve ser priorizado. • Quando um público geral, incluindo novatos e intermitentes, estiver realizando tarefas críticas, sujeitas a erros com repercussões importantes (por exemplo, o software do imposto de renda), todos os critérios da gestão de erros deverão ser aplicados necessariamente. • Quando um público geral, incluindo novatos e intermitentes, estiver realizando tarefas de busca de informação, a densidade informacional deverá ser um critério prioritário. • A legibilidade é um critério importante quando a tarefa é de leitura e o público-alvo é composto de pessoas idosas ou com problemas de visão (como o site de um hospital ou de um laboratório de análises clínicas). • Quando usuários novatos e experientes compuserem o público-alvo de um software apoiando as atividades de um setor com alta rotatividade de pessoal (por exemplo, o telemarketing), o critério consideração da experiência do usuário deverá ser necessariamente aplicável. • Quando profissionais usam sistemas aplicativos para realizar suas tarefas em situação de trabalho intenso e por vezes repetitivo, todos os critérios de brevidade aplicam-se necessariamente. • Quando as funções de um sistema puderem ser utilizadas para diferentes tarefas, em diferentes situações, por usuários de diferentes culturas profissionais, o critério de flexibilidade deverá ser considerado prioritariamente.


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• Quando as tarefas envolverem uma longa sequência de passos ou forem de tratamento demorado pelo sistema, o critério de controle explícito deverá ser definido como prioritário. Este exercício de análise do contexto de uso e de identificação dos critérios prioritários deve ser realizado caso a caso, para cada software em desenvolvimento. Seus resultados orientarão as ações de projetistas e avaliadores, principalmente. No próximo capítulo serão apresentadas as recomendações ergonômicas, esclarecendo e detalhando a implementação dos princípios aqui apresentados.

1.12 Referências bibliográficas ABNT NBR 9241-110. Ergonomia da interação humano-sistema – Parte 110: Princípios de diálogo, 2012. Android Design Principles. Disponível em: <http://developer.android.com/design/ get-started/principles.html>. Acesso em: 18 mar. 2015. Calendário da Copa. Disponível em: <http://copadomundo.uol.com.br/tabela-da-copa/>. Acesso em: 19 mar. 2015. HASSENZAHL, M. The Interplay of Beauty, Goodness, and Usability in Interactive Products. Hum.-Comput. Interact., v. 19, n. 4, p. 319–349, 2004. HASSENZAHL, M. The Thing and I: Understanding the Relationship Between User and Product. In: BLYTHE, M. et al. (Eds.) Funology. Human-Computer Interaction Series. [s.l.] Springer Netherlands, 2005. v. 3p. 31–42. NIELSEN, J. Usability Engineering. San Francisco, CA, USA: Morgan Kaufmann Publishers Inc., 1993. SCAPIN, D. L.; BASTIEN, J. M. C. Ergonomic criteria for evaluating the ergonomic quality of interactive systems. Behaviour & Information Technology, v. 16, n. 4-5, p. 220–231, jan. 1997. SHNEIDERMAN, B.; PLAISANT, C. Designing the User Interface: Strategies for Effective Human-Computer Interaction (4th Edition). [s.l.] Pearson Addison Wesley, 2004.


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