Vida & Educação 22

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Ano 5, nº 22 - R$ 6,90

40 ANOS DA PEDAGOGIA DO OPRIMIDO As Palavras Libertadoras de Paulo Freire

ENTREVISTA

PÓS-MODERNIDADE

REPORTAGEM

Professor Celso Antunes (Especialista em Educação): Indisciplina em sala de aula e o papel dos pais na educação.

Será preciso reinventar a educação infantil para formar a criança pós-moderna?

Projeto Bila: uma proposta de política pública. Biblioteca e lan house VIDA Eà EDUCAÇÃO integrados, acesso internet | 1 pago com leitura!

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O N D E M U I T O S V Ê E M A P E N A S U M A C R I A N Ç A,

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C O M O S I S T E M A D E E N S IN O A P R E N D E B R A S I L , S U A CID A D E G A R A N T E U M F U T U R O

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A Prefeitura da sua cidade, em parceria com a Editora Positivo, pode realizar uma verdadeira revolução nas escolas públicas do seu município. O Sistema de Ensino Aprende Brasil é um programa que oferece benefícios para alunos e professores de todas as escolas de sua comunidade. É um conjunto de recursos pedagógicos com a garantia do maior grupo educacional do País.

S I SJANEIRO T E M A / DFEVEREIRO E E N S I N| O2 A P R E N D E B R A S I L . T R A N S F OR M A NDO O F U T URO D A S CRI A NÇ A S BR A SIL EIR A S . Vida_e_Educação_20-02-2009.indd 2

GARANTIA DE QUALIDADE

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VALORIZAÇÃO DOS PROFESSORES

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Os Livros Didáticos Integrados são desenvolvidos e atualizados pelo Centro de Pesquisas Positivo. Eles contam com o padrão de excelência e a precisão na produção editorial e gráfica que consagraram a Editora Positivo. Uma equipe altamente qualificada estará à disposição dos profissionais de educação do seu município, dando o suporte necessário à prática pedagógica, por meio de cursos de metodologia que contribuirão para a formação continuada.

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N Ó S V E M O S T A M B É M U M G R A N D E F U T U R O.

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Além de uma home page personalizada para o município, no Portal Aprende Brasil, alunos e professores têm acesso individualizado a um conteúdo educacional exclusivo e a avançados recursos e serviços multimídia, como Dicionário Aurélio, atlas, enciclopédia e muito mais.

Entre em contato com a Editora Positivo e descubra como obter, por meio do Sistema de Ensino Aprende Brasil, os melhores resultados educativos no seu município.

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Com o Sistema de Ensino Aprende Brasil, seu município vai garantir o acesso à educação de maior qualidade para todos e assegurar as condições de um futuro promissor para as crianças do seu município, que terão à sua disposição uma infinidade de recursos educativos, visando a uma formação humana completa.

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NESTA EDIÇÃO

23 ENTREVISTA

Entrevista: disciplina x indisciplina na sala de aula Os novos conceitos de indisciplina nortearam a entrevista com o pesquisador Celso Antunes. O entrevistado alertou o que é preciso modificar tanto na escola como na educação familiar para estimular o aprendizado dos estudantes.

28 PEDAGOGIA

As palavras libertadoras de Freire Recordamos, a partir da obra A Pedagogia do Oprimido, que completou 40 anos recentemente, o conceito plural e revolucionário de liberdade de Paulo Freire, refletindo a contemporaneidade do pensamento dele e a esperança proveniente das páginas daquele que foi um de seus livros mais célebres.

37 EDUCAÇÃO BILÍNGUE

Educação Bilíngue: o início de uma nova luta No contexto da educação para pessoas surdas, surge a corrente da educação bilíngue. Nesta edição, abordamos o bilinguismo, defensor do ensino de línguas como primeira língua desde a infância, compreendendo-o como uma luta por igualdade e liberdade de expressão em oposição à cultura dominante.

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REPORTAGEM

Leitura: Projeto Bila Na periferia da capital cearense, encontramos o projeto Biblioteca Integrada à Lan House, o Bila. Finalista do prêmio VIVALEITURA do ano de 2008, é um dos projetos que a Cooperativa Pirambu Digital vem desenvolvendo nos últimos três anos no Pirambu, fazendo a diferença no contexto social.

47 OBSERVATÓRIO

Observatório: sugestões para os novos gestores Abrindo a nova seção Observatório, trazemos uma série de orientações para os novos gestores que tomaram posse no início de 2009. Em seu artigo, retrata o que deve ter continuidade das gestões anteriores e o que deve ser modificado.

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AINDA NESTA EDIÇÃO

Ano 4, nº 22 - R$ 6,90

AS PALAVRAS LIBERTADORAS DE FREIRE 40 anos da Pedagogia do Oprimido

ENTREVISTA

PÓS-MODERNIDADE

OBSERVATÓRIO

Professor Celso Antunes (Especialista em Educação): Indisciplina em sala de aula e o papel dos pais na educação.

A educação infantil e a criança pós-moderna.

Novos gestores, nova política educacional.

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6 Cartas do leitor 8 Notícias da UNDIME 40 Publicações 50 Opinião: Políticas públicas em

educação

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EDITORIAL

Um novo tempo

O início deste novo ano representa para a Vida e Educação uma nova era, a que desejamos compartilhar com nossos leitores. Tempo de mudanças práticas, mas também teóricas – relativas à missão desta revista de despertar no seio da população debates relevantes ao progresso da educação no país. Não por acaso, agregamos em nosso título vida e educação. Neste novo tempo, propomos cada vez mais a união destes termos, a conscientização de que atuar como educador e educando é inerente à natureza humana, pois a vida é construída de aprendizagens. Reflexo desta nova etapa, a Vida e Educação reinventa-se graficamente. O leitor tem em mãos uma publicação mais moderna, que objetiva, através da adoção de novas linguagens, cores e elementos gráficos, facilitar e estimular a leitura, tornando-a mais dinâmica. Além de alterações no formato, a Vida e Educação também inicia 2009 com mudanças de conteúdo, inaugurando a seção observatório. Nela, membros da sociedade civil são chamados a refletir sobre aspectos da educação, sobretudo relacionados à gestão escolar e políticas públicas. Nesta edição, você acompanha o artigo do professor doutor Casemiro de Me-

deiros Campos, que sugere quais iniciativas podem ser adotadas pelos gestores escolares que tomam posse no início desse ano. Novos tempos, no entanto, significam também, infelizmente, tempos de conflito. Em meio aos estampidos ensurdecedores de Gaza, a Vida e Educação esforça-se para fazer ecoar o grito libertador de Paulo Freire, revisitando um de seus mais célebres títulos, que completou recentemente 40 anos: a Pedagogia do Oprimido. Em seus textos, João Figueiredo e Ercília Braga destacam elementos que oportunamente reiteram a importância do clamor por liberdade e autonomia – um eco nos estudos freireanos. Assumir uma nova etapa com responsabilidade é ainda deitar os olhos sobre o momento histórico ao qual pertencemos. Para tanto, damos continuidade à reflexão sobre a pós-modernidade, iniciada na última edição, desta vez, discutindo o processo de formação da criança contemporânea. Solange Jobim e Souza explica como a criança compreende a publicidade e os produtos culturais a ela direcionados e qual lugar devemos ocupar junto às novas gerações frente às mudanças nos processos de informação e pro-

dução de conhecimento na cultura do consumo. Já a pedagoga Eloiza Schumacher discute formas alternativas de como despertar nas crianças valores diversos aos que elas têm acesso cotidianamente. A todos, uma boa leitura e o nosso desejo de que este espírito transformador oriente as perspectivas referentes à educação em nosso país; que gestores, educadores, pesquisadores, pais e estudantes também anseiem e lutem por novas conquistas.

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CARTAS DO LEITOR Av. Oliveira Paiva, 2621 60.822-131 - Fortaleza (CE) Telefone: +55 (85) 4006.4056 Fax: +55 (85) 4006.4057 undimeceara@undime.org.br www.undime.org.br Presidente: Flávio de Araújo Barbosa (São Gonçalo do Amarante) Secretária de Articulação: Monica Maria Silva de Sousa (Solonópole) Secretário de Coordenação Técnica: Josè Marcondes M Landim (Barbalha) Secretária de Comunicação: Maria Vera Vasconcelos (Jijoca de Jericoacoara) Secretária-adjunta de Assuntos Jurídicos: Isabel Maria Magalhães Freitas (Aquiraz) Secretária-executiva: Sandra Leite Assessoria de Comunicação: Gustavo Menescal

A CULPA É DA EDUCAÇÃO

Nesta edição número 21 da revista, gostei muito da matéria ‘A culpa é da Educação’. Fiquei satisfeita com a abordagem, pois são fatos que realmente acontecem no nosso cotidiano. Muito boa. Parabéns! Jarlane Lima Fortaleza, CE

Diretora: Sandra Lima Röhl Diretor de redação: Peter Röhl (in memorian) Jornalista responsável: Marcia Ximenes (Mtb 01733) Estagiária de Jornalismo: Mayara Araújo e Gabriela Meneses Projeto gráfico e edição de arte: Norton Falcão CONSELHO EDITORIAL Ana Maria Iorio Dias (UFC), Betânia Leite Ramalho (UFRN), Casemiro de Medeiros Campos (UFC), Clermont Gauthier (Université Laval, Canadá), Flávio de Araújo Barbosa (Undime-CE), Júlio César Araújo (UFC), Luís Távora Furtado Ribeiro (UFC), Marco Aurélio de Patrício Ribeiro (Iesc), Maria de Jesus Araújo Ribeiro (Mieib), Messias Dieib (UFC e Uern) e Sandra Leite (Undime-CE) COLABORADORES DESTA EDIÇÃO Andreia Serra Azul, Casemiro de Medeiros Campos, Celso Antunes, Chagas Fernandes, Clarissa Tavares, Eloisa Schumacher, Ercília Braga, Gildenis Silva, João Figueiredo, Lauristela Rodrigues, Mauro de Oliveira, Roseli Fischmann, Solange Jobim, Vilmar Silva. ASSINATURA E DISTRIBUIÇÃO Preço de assinatura anual no Brasil: R$ 39,90, para seis edições (bimestrais). Para outros países: R$ 70,00. Edições anteriores: R$ 6,90, mais custo postal. Venda em banca no estado do Ceará, Piauí e Maranhão. Distribuição direta para colaboradores, governadores, prefeitos, diretores de escolas e assinantes. Fotolito, impressão e acabamento Pouchain Ramos

MAIS UMA PETECA A FAVOR DA CRIANÇA

Trazer à tona temas voltados para segurança de nossas crianças é muito importante. Não se pode conceber que a exploração de crianças e jovens continue fazendo parte do nosso cotidiano como se fosse uma coisa normal. Parabéns ao pessoal da revista e à Undime. São de ações assim que o Brasil precisa Rafael Teixeira de Amorim (Universitário, CEFET) Fortaleza-CE

ARTE, RÁDIO E AFETIVIDADE NA FORMAÇÃO DOS PROFESSORES

Paixão, afeto... Como educadora, tenho percebido como sentimentos importantes estão se esvaindo do nosso cotidiano escolar. Nossas crianças precisam de afeto. É importante para uma formação cidadã. Parabéns para o professor Henrique pela abordagem tão rica de sentimentos. Rua Nestor Barbosa, 129 60.455-610 – Fortaleza (CE) Telefone/fax: +55 (85) 3214.6971 Fone: +55 (85) 3081.1607 brasiltropicalfor@terra.com.br Presidente: Sandra Lima Röhl Assessora-adjunta: Ângela David

Ana Maria Cristina Rio de Janeiro- RJ

CAPA

norton/falcão A revista Vida e Educação é uma publicação bimestral da Undime-CE elaborada pela Editora Brasil Tropical Ltda, que mantém todos os direitos reservados. As matérias divulgadas neste veículo não expressam necessariamente a opinião da revista. A publicação se reserva o direito de adequar os artigos. ISSN 1806-0145

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A Prefeitura de Fortaleza garante transporte escolar gratuito para toda a rede municipal, beneficiando mais de 10 mil alunos. A Prefeitura de Fortaleza deu mais um grande passo na excelência do ensino da rede municipal. Em fevereiro, vamos entregar mais 10 ônibus escolares, além dos 63 que já estão em circulação. Assim, em parceria com a Companhia de Transporte Coletivo, vamos cobrir toda a rede de ensino municipal, garantindo o transporte escolar para mais de 10 mil alunos da Educação Infantil, do Ensino Fundamental, da Educação de Jovens e Adultos e do Pró-Médio. Prefeitura de Fortaleza: qualidade no ensino além da escola.

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MAIS UM DIREITO QUE TODO ESTUDANTE TEM EM FORTALEZA: O DE IR E VIR.

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UNDIME EM NOTÍCIAS

Undime lança publicações ção Nacional e o Estatuto da Criança tradas, via e-mail, sobre a movimentapara orientar novos ção dos processos entre as diversas e do Adolescente. gestores municipaiss As publicações servirão de base áreas do órgão. Para se beneficiar

para a realização dos Fóruns Estaduais da Undime e do 12º Fórum Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação, que acontecerá no período de 4 a 7 de maio de 2009, em Curitiba. A Undime realizará oficinas e atividades com base nos documentos. Para participar, os Dirigentes Municipais de Educação devem procurar a Undime do seu Estado. Todos os contaA União Nacional dos Dirigentes tos e outras informações podem ser Municipais de Educação - Undime, obtidas no portal da undime (www. em parceria com o Fundo das Na- undime.org.br). ções Unidas para a Infância - Unicef, lançou duas publicações fundamenFNDE implanta sistemas tais para os novos gestores: o caderno online para melhorar a Orientações ao Dirigente Municipal de infra-estrutura de escolas Educação: fundamentos, políticas e práticas e a Agenda dos Cem PrimeiNos últimos anos, o Ministério da ros Dias. Com o apoio do Ministério Educação, juntamente com outros da Educação, as publicações têm por órgãos, vem buscando formas para objetivo auxiliar os dirigentes no bom melhorar a educação pública e tornáexercício de suas funções, permitindo la transparente. O mais recente desaa continuidade de programas e proje- fio do FNDE é fazer um levantamento tos que o município já vinha realizan- da situação estrutural de todas as esdo, e ainda, orientar como proceder no colas do país. Para isso, está implandesenvolvimento de novas iniciativas. tando o sistema LSEweb, o Sistema Em seus 22 anos de atuação, a de Levantamento da Situação EscoUndime comprovou que um dos prin- lar Web. cipais desafios dos gestores públicos Com o LSEweb, que funcionará é saber como trabalhar diante das em parceria com as secretarias estadificuldades estruturais de cada mu- duais e municipais de educação, serão nicípio, além de estabelecer o sentido apuradas a situação de equipamentos de rede entre suas escolas e seus e mobiliário e as condições de uso dos projetos político-pedagógicos, orça- banheiros, refeitórios, telhados etc. As mentos e prestações de contas. informações serão reunidas em um O Caderno e a Agenda incenti- banco de dados, acessível pela invam os dirigentes a trabalhar para ternet, para balizar políticas públicas garantir o direito à educação, reduzir educacionais e melhorar a gestão as desigualdades e a exclusão, res- escolar. O primeiro teste do sistema gatando a dívida social do Brasil com aconteceu em Aquiraz, no Estado do seus cidadãos. A Undime entende Ceará, ainda durante o mês de feveque compete ao gestor assegurar o reiro. O calendário de capacitação do direito de aprender de todas e cada sistema para o restante do país comeuma das crianças, adolescentes, jo- ça em março. vens e adultos de seu município por Ainda no primeiro semestre de meio do acesso à educação pública 2009, o FNDE também disponibilicom qualidade social, conforme as- zará outro sistema online, o Sistema seguram a Constituição Federal, a de Acompanhamento de Processos, Lei de Diretrizes e Bases da Educa- destinado a avisar a pessoas cadas-

dele, o interessado deve preencher no endereço eletrônico do FNDE (www.fnde.gov.br) um cadastro com nome, e-mail e o número dos processos que queira acompanhar.

MEC libera convênios para investimento em escolas técnicas O ministro da Educação, Fernando Haddad, assinou no início de 2009, em Brasília, 14 convênios para liberação de R$ 342 milhões. O montante vai para 13 estados das regiões Norte e Nordeste, além do estado de Mato Grosso, que devem investir em ensino técnico e profissionalizante. A ação faz parte do programa Brasil Profissionalizado, que repassa recursos federais para os estados investirem em suas escolas técnicas. Foram contemplados os estados do Acre, Amapá, Bahia, Ceará, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Paraíba, Piauí, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Roraima, Sergipe e Tocantins. Com os recursos, serão construídas 29 novas escolas de ensino médio, que ofertarão, de forma integrada, a educação profissional técnica de nível médio. As novas escolas terão capacidade para atender até 1.500 alunos. O projeto das instituições prevê biblioteca informatizada, sala para videoconferências e educação à distância, laboratórios para ensino de ciências e aplicações práticas de educação tecnológica, auditório, parque esportivo, entre outros, em uma área construída de 5.500 m².

Nove Estados recebem recurso complementar do Fundeb. O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) repassou R$ 254.250.000,00 referentes à

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primeira parcela (janeiro) da complementação da União aos estados e respectivos municípios que não arrecadaram o suficiente para garantir o valor mínimo por aluno/ano estabelecido na legislação do Fundo da Educação Básica (Fundeb). Nove estados recebem essa complementação: Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pará, Paraíba, Pernambuco e Piauí. Os recursos do Fundeb destinamse a financiar a educação básica (creche, pré-escola, ensino fundamental, ensino médio e educação de jovens e adultos). Sua vigência é até 2020, atendendo, a partir do terceiro ano de funcionamento, 47 milhões de alunos. Confira os valores transferidos referentes a janeiro no endereço eletrônico www.fnde.gov.br

Fundação patrocina pesquisa sobre a História do Brasil O Prêmio Clarival do Prado Valladares, promovido pela Organização Odebrecht, recebe até o dia 31 de março inscrições para projetos inéditos de pesquisa que tratem de tema ligado à História do Brasil. A Organização Odebrecht será a responsável pelos recursos necessários à realização completa do projeto selecionado, da pesquisa à edição de livro ilustrado. Podem se inscrever pesquisadores de todo o Brasil, com projetos nas áreas de história econômica, evolução sociopolítica e criação artística brasileira. O regulamento do concurso está disponível no site www.odebrecht.com.br.

Prêmio Euclides da Cunha oferece R$ 30 mil reais em prêmio A Academia Brasileira de Letras (ABL) recebe até o dia 31 de julho as inscrições para o Prêmio Euclides da Cunha, uma homenagem ao centenário de nascimento do autor de Os

sertões. O prêmio, no valor de R$ 30 mil reais, será conferido ao melhor livro, inédito ou publicado depois de 10 de janeiro de 1999, sobre a vida ou a obra de Euclides da Cunha. Os trabalhos deverão ser enviados à Secretaria da entidade. O edital completo do Prêmio está disponível no site da ABL (www.academia.org.br).

6ª Confintea será realizada no Brasil O Brasil sediará pela primeira vez a 6ª Conferência Internacional de Educação de Adultos (Confintea). De 19 a 22 de maio, em Belém, no Pará, representantes dos paísesmembros das Nações Unidas e de mais seis países convidados vão discutir as diretrizes para a Educação de Jovens e Adultos (EJA) para os próximos 12 anos – periodicidade de cada Confintea. A 6ª Confintea pretende promover o reconhecimento da educação

e aprendizagem de jovens e adultos como um fator importante para a aprendizagem ao longo da vida. Além disso, a Conferência pretende fazer um exame global da situação da educação e da aprendizagem de jovens e adultos (EJA), já que a última Confitea foi realizada no ano de 1997, em Hamburgo, na Alemanha. A Declaração de Hamburgo, considerada um marco para a EJA por promover avanços na concepção holística de apredizagem, permitiu que agentes governamentais e não-governamentais seguissem um conjunto de recomendações quanto à educação de jovens e adultos. A partir dos debates na conferência internacional, será consolidada a Declaração de Belém, com as diretrizes para o próximo período. A escolha do Brasil como sede da conferência reflete o bom trabalho realizado pelo país na área de Educação de jovens e adultos.

Secretária de Articulação Carlos Eduardo Sanches Secretária de Coordenação Técnica Maria de Nazaré Salles S. Monteiro Secretária de Comunicação Maria Cecília Amendola da Motta Secretário de Finanças Flávio Romero Guimarães Secretário de Assuntos Jurídicos Secretária executiva: Jardeni de Azevedo Francisco Jadel Vivian Ka Fuhr Melcop Presidente região Centro Oeste Secretária administrativa Lúcia Schuster Luciane Guimarães de Oliveira Presidente região Nordeste Assessora Administrativa Maria Luiza Martins Aléssio Celza Chaves, Fátima Soares Presidente região Norte Assistente Administrativo Moacir Fecury Ferreira da Silva José Nilson de Melo Presidente região Sudeste Assessores de Comunicação Social José Aparecido Duran neto David Telles, e Nana Cunha Presidente região Sul DIRETORIA EXECUTIVA Magela Ligner Formiga Presidente Nacional Conselho Fiscal Justina Iva de Araújo Silva Solimara Ligia Moura Vice-Presidente Marcia Regina Eggerd Soares Suely Duque Rodarte Wanessa Zavarese Sechim União dos Dirigentes Municipais de Educação – Undime SCS – Q. 6 – Ed. Carioca – salas 611 / 613 70306-900 Brasília, DF Fone: +55 (61) 3037-7888, Fax: 3039-6030 undimenacional@undime.org.br www.undime.org.br

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EXPERIÊNCIA EDUCACIONAL

Alfabetizando no tempo certo

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O programa “É tempo de alfabetizar” desenvolvido há três anos pela Secretaria de Educação do Cabo de Santo Agostinho (Grande Recife) tem alcançado resultados surpreendentes na aprendizagem das crianças do 1º e do 2º ano do ensino fundamental. Foi idealizado para ensiná-las a ler e escrever com mais proficiência. Tudo feito, a partir de uma aperfeiçoada alfabetização dos pequenos estudantes cabenses, que frequentam as escolas da rede municipal. O programa começou a ser desenvolvido em 2006, planejado e implantado no primeiro mandato do prefeito Lula Cabral (PTB), com o

objetivo de se conseguir um avanço maior na área da educação, por meio de um ensino de melhor qualidade. No primeiro ano, o programa atendeu a 76 turmas de 38 escolas, somando um total de quase 1,8 mil alunos (24 por turma). Em 2006, apenas crianças do 1º ano foram beneficiadas. Já em 2007, foram 3.121 alunos de 141 turmas de 40 unidades de ensino. Em 2008, 139 turmas de 43 escolas participaram do programa que atendeu a 3.147 crianças. A secretária de Educação do Cabo de Santo Agostinho, Gildineide Fialho, recorda que, para oferecer um ensino de melhor qualidade aos meninos e meninas de 6 e 7 anos de

idade, os primeiros 76 professores do programa foram capacitados, de forma especial, em 2006, para conhecerem e desenvolverem novas técnicas de ensino. Posteriormente, os demais 63 docentes também receberam formação específica. “A participação, o interesse e o rendimento de todos foram muito bons”, afirma a educadora, que trabalha para estender o programa a todos os estudantes dos anos iniciais do ensino fundamental.

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Nas Ondas da leitura

Uma das atividades desenvolvidas pelo programa “É Tempo de Alfabetizar”, como forma de reforçar a didática e despertar ainda mais o interesse das crianças, é o projeto “Nas Ondas da Leitura”. Através dele, os professores promovem várias formas de leitura e depois realizam diversas tarefas que exigem a integração dos alunos que passam a recontar, oralmente e por escrito, os contos que ouviram em sala de aula. Esse projeto é realizado através de parceria com a Editora Imeph. “Usamos livros de literatura, para trabalharmos a leiturização”, revela Gildineide. Os estudantes que integram essa ação da Prefeitura do Cabo recebem dois kits. Um, com material escolar convencional e fardamento. O outro, específico do projeto, é recheado com dezenas de livros infantis, CD

com músicas e um livro de leitura e escrita para a prática da escrita dos próprios textos. Em 2008, os kits do “Nas Ondas da Leitura”, por exemplo, foram compostos de 23 títulos de diversos autores nacionais. Para despertar ainda mais a atenção das crianças, a Secretaria de Educação, Editora Imeph e a Conhecimento Editora trazem até elas os próprios autores para contar historinhas, debatê-las em público e ainda para autografar os livros. Esse é um dos maiores diferenciais oferecidos pelo projeto. Após a culminância das atividades desenvolvidas através do projeto, na escola, os trabalhos são apresentados a toda a comunidade escolar, com a participação efetiva dos pais. A secretária municipal de Educação explica que o objetivo é “dar melhor formação, tornar o aluno

leitor e os professores mais preocupados com a leitura e a escrita dos seus alunos. Tudo isso feito de uma forma alegre e prazerosa”. Segundo Gildineide, a intenção da Prefeitura é que o projeto deixe de ser oferecido apenas ao 1º e 2º ano para ser uma política educacional do governo municipal. “Estamos ousando muito, os livros são excelentes, mas, para a aquisição desse material do Projeto, é necessário um investimento significativo, ressalta a secretária. As palavras de Gildineide Fialho no que se refere a investimentos em educação são reforçadas pelo ilustre Professor e Educador Celso Antunes quando afirma: “O futuro não tem preço e, naturalmente, quem investe no gosto pela leitura, está investindo no futuro, está plantando amanhãs.”

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EXPERIÊNCIA EDUCACIONAL

“Os livros oferecem um leque de possibilidades que podem ser explorados em todas as áreas do conhecimento, como: jogos e brincadeiras; na área da ciências, meio ambiente, matemática, geografia, cores costumes e outros.”

Escola Maria José Paiva Professora Edite F. de Melo

com a certeza do dever cumprido e consequentemente consciente da continuidade de tudo que foi relevante em relação ao despertar o desejo, o prazer na leitura e na escrita.”

Escola Eronides Soares (Pontezinha) Supervisora Maurien Gomes

Escola Monteiro Lobato Professora Antonia de França Alves

“Esse projeto é muito importante para o nosso trabalho em sala de aula como também para nossos alunos pois desafia os alunos a ler e reescrever histórias mesmo sem saber ler e escrever convencionalmente.”

“Baseado no Projeto Ondas da leitura, elaboramos o nosso projeto Navegando na leitura, onde todas as professoras, alunos e pais participaram ativamente dos trabalhos desenvolvidos. Chegamos ao final

“Parabenizo a equipe do Instituto IMEPH que chegou para fortalecer o ensino, aprendizagem em nossa cidade, e ao nosso Prefeito Lula Ca-

“Todos os alunos se envolviam na leitura, com entusiasmo total. Cada livro uma novidade, uma curiosidade.”

Escola Eronides Soares Professora Edna Ferreira de Melo

bral que acreditou e investiu nestes alunos, que desde cedo possam despertar o gosto pela leitura e escrita.”

CAIC Prefeito José Alberto de Lima Professora Edinalva Maria Nunes

“O projeto Nas Ondas da Leitura envolve a criança na felicidade de ler e escrever, plantando uma semente que na vida inteira se manterá e se preservará.”

Celso Antunes Na culminância do projeto Nas Ondas da Leitura, na cidade de Cabo de Santo Agostinho - PE

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ENSINO RELIGIOSO

Laicidade do Estado e ensino religioso nas escolas

Roseli Fischmann*

Todo cidadão brasileiro tem o livre arbítrio para escolher sua religião. Como Estado laico, o Brasil garante esse direito, mas, na contra-mão, institui o ensino religioso obrigatório no ensino fundamental. A mesma lei garante ao estudante a matrícula facultativa na disciplina, mas, na prática, o que se vê nas escolas é que o ensino religioso chega aos estudantes de forma transversal, embutido em outras matérias. Inaugurando um debate mais apurado acerca do ensino religioso, que pretendemos realizar ao longo das próximas edições, convidamos a professora Doutora Roseli Fischmann, da Universidade de São Paulo. Em seu artigo, deparamo-nos com uma reflexão sobre como essa obrigatoriedade pode ser prejudicial ao desenvolvimento de crianças e adolescentes, alertando para a abordagem inadequada de determinados assuntos, como o meio ambiente e a saúde reprodutiva.

Tema delicado, complexo e sempre com potencial para gerar polêmicas intermináveis, a questão do ensino religioso nas escolas públicas toca em pontos centrais da temática da cidadania, relacionados à liberdade de crença e de culto, assim como, de forma inextricável, à liberdade de consciência. Como pressuposto de todo o debate, a laicidade do Estado é garantida pelo Artigo 19 da Constituição Federal de 1988, indicando a impossibilidade jurídica de o Estado pronunciar-se em matéria de religião (cf Fischmann, 2008a). Por isso, a relação desse princípio da laicidade do Estado brasileiro com a educação na escola pública tem sido problemática. O ensino religioso foi definido no Artigo 210 – Parágrafo Primeiro da Constituição Federal como obrigatório para a escola e facultativo para o aluno. O que já era complexo, em razão da laicidade do Estado, tornou-se de fato inconstitucional ao ser regulamentado pelo Artigo 33 da Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional (LDB-EN), em particular pela segunda redação que recebeu, em 1997. Tornou-se, na prática, inexequível, a não ser às custas da violação da laicidade do Estado, da liberdade de consciência, de crença e de culto de alunos, famílias e docentes. Esse dispositivo constitucional estabelece que o ensino religioso é parte integrante da formação básica de todo cidadão. Confundindo religião e cidadania, viola direitos, por exemplo, dos ateus e de todos os pais que entendam como seu direito educar seus filhos dentro de valores éticos universais, deixando que seu filho proceda à eventual escolha religiosa no futuro, já decidindo por si. Nesses casos, trata essas famílias como se estivessem mutilando seus filhos, quando se trata de escolha amplamente permitida quando se considera a liberdade de consciência e por não prejudicar a outras pessoas ou seus direitos. Ambígua, a lei propõe um ensino religioso que ‘’respeite a diversidade cultural religiosa do Brasil’’, enquanto

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estabelece que as diversas ‘’denominações religiosas’’ deverão agregar-se a uma única entidade civil, que seria interlocutora dos sistemas de ensino para definir um conteúdo unificado. Seria a forma de evitar o contato direto do Estado laico com conteúdos religiosos fora de sua alçada, mas acaba por ser flagrante ameaça ao direito à livre associação, pois, se uma determinada religião ou denominação pretender ser considerada, não terá escolha a não ser vincular-se a alguma entidade “credenciada” como interlocutora do Estado. Do ponto de vista de formação de professores, torna impossível qualquer gesto por parte do Estado. Uma coisa é a comunidade religiosa, que tem claramente estabelecido seus princípios, valores, crenças, doutrinas, práticas, formar professores de ensino religioso a ser ministrado no âmbito e sob a autoridade dessa mesma comunidade. Outra coisa é uma elaboração híbrida, que não pode ser atribuída ao Estado, por ser laico e não poder se pronunciar sobre religiões, e ficaria, assim, sem responsável; ou, para tê-lo, passaria necessariamente por sobre as liberdades de muitos, que seriam deixados ao largo do processo, por não se associarem a este ente proposto pelo Artigo 33. Contudo, a prática das escolas indica que, ao invés de pedir que os pais e/ou os alunos se manifestem, indicando sua escolha pelo ensino religioso, assinando manifestação de vontade, o que tem ocorrido, na prática, são processos que dificultam para que o aluno se retire em caso de, por sua consciência e/ou por escolha de seus pais, não querer freqüentar o ensino religioso. Ou seja, uma escola que deveria formar para a democracia, torna-se centro de práticas de violação do direito à liberdade de crença. Em livro publicado como re-

sultado de pesquisa recentemente concluída (Fischmann, 2008b), apontamos aspectos relevantes em relação a esse ponto. Vale mencionar, em particular, a forma inconstitucional que diversos estados adotaram de propor que o ensino religioso seja não apenas de tipo ecumênico, trazendo os já mencionados problemas, como também que seja tratado, nas séries iniciais, de forma transversal, tornando virtualmente impossível ao estudante saber quando o ensino religioso entrará em cena, no seu cotidiano, se quiser se retirar. Temas como meio ambiente, saúde e, em particular, direitos reprodutivos e saúde reprodutiva, ligados a temas da sexualidade, podem ser afetados diretamente pelo tipo de abordagem dada nessas propostas inconstitucionais de ensino religioso, negando o conhecimento científico, pela abordagem que é própria para o campo religioso, mas imprópria para o campo pedagógico, sobretudo da escola pública. A correta condução da escola pública, dentro do princípio da laicidade do Estado, não impedirá que crianças e adolescentes tenham vida religiosa; ao contrário, protegerá a escolha das famílias e os ensinamentos das comunidades religiosas, que estarão livres do chamamento do Estado para se associar a alguma entidade civil obrigatória, desrespeitando também a liberdade de associação, nesse caso; ou de fornecer dados de sua religião para um processo homogeneizador e, por isso, dilacerador do próprio direito à liberdade de crença que teoricamente a lei estaria a promover. Superar semelhantes práticas discriminatórias, pela educação é tarefa árdua que não inclui o ensino de supostos “denominadores comuns” às religiões, como reivindicam para suas práticas aqueles que defendem um ensino auto-denomi-

nado “ecumênico”, mas antes o simples e puro respeito à diversidade e pluralidade, abrigadas pelo Estado, em benefício do cidadão e das liberdades fundamentais. ****** Referências FERRAZ, Anna Cândida da Cunha. Registro histórico-documental: Parecer Jurídico apresentado ao Governador do Estado de São Paulo In: FISCHMANN, Roseli (org.). Ensino religioso em escolas públicas : impactos sobre o Estado Laico. São Paulo : FAFE/ FEUSP/ PROSARE/ MacArthur Foundation, Factash, 2008, pp. 27-69. FISCHMANN, Roseli. Estado laico. São Paulo : Memorial da América Latina, 2008. FISCHMANN, Roseli. Do transversal ao inconstitucional: o caso da normatização do ensino religioso nas escolas públicas no Estado de São Paulo após 2001. In FISCHMANN, Roseli (org.). Ensino religioso em escolas públicas : impactos sobre o Estado Laico. São Paulo : FAFE/ FEUSP/ PROSARE/ MacArthur Foundation, Factash, 2008, pp.132-152.

*ROSELI FISCHMANN é livre docente pela Universidade de São Paulo, com doutorado e mestrado na área Filosofia e História da Educação. Foi professora visitante da Universidade Harvard (Estados Unidos). Integrou o Grupo de Trabalho sobre Educação em Direitos Humanos da UNESCO (Paris). Redigiu o documento Pluralidade Cultural, integrando a equipe dos PCNs do MEC, e foi coordenadora geral do Manual Direitos Humanos no Cotidiano, colaboração Secretaria Nacional dos Direitos Humanos/UNESCO/USP.

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PÓS-MODERNO

A criança pós -moderna e o papel da Educação Infantil Em sua última edição, a revista Vida e Educação apresentou uma reflexão sobre o papel da educação e do professor na sociedade pós-moderna. Nesta edição, o foco da discussão será o processo de formação da criança contemporânea. A psicóloga Solange Jobim e Souza e a pedagoga Eloiza Schumacher Corrêa discutem essa questão em seus artigos “Criança, consumo e cidadania: uma equação possível?” e “Escola infantil hoje: espaço para reinventar padrões de relação!”, respectivamente.

As transformações nos processos educativos deram-se concomitantemente às mudanças na sociedade. Pais e educadores encontram diferentes dificuldades no processo de formação das crianças, devido aos apelos do mundo pós-moderno. O bombardeio de informações, o consumismo, o ritmo de vida acelerado em contrapartida ao sedentarismo são exemplos de fatores que influenciam no comportamento dos pequenos. Diante deste contexto, faz-se imprescindível a remodelagem dos modos de ensino? O Senador Cristovam Buarque, em entrevista recente à emissora de Tv Record News, afirmou que as escolas precisam acompanhar as transformações da sociedade e, consequentemente, das crianças. Tal ponto de vista, no entanto, leva-nos quase simultaneamente a refletir sobre os limites dessa adaptação. É realmente dever

da escola adequar-se à práxis pósmoderna ou será ela a instituição que tem por missão “nadar contra a corrente”? Dando continuidade ao conjunto de artigos referentes à pós-modernidade, em que, inicialmente, a observamos de modo panorâmico e destacamos a necessidade de educadores para esta geração, voltamo-nos agora, em especial, à observância do universo infantil. A psicóloga Solange Jobim e Souza inaugura o debate repensando a importância do diálogo entre pais e filhos, do estímulo aos valores domésticos e da formação familiar no combate aos apelos publicitários e ao desejo de consumo. Em contrapartida, a pedagoga Eloiza Schumacher Corrêa questiona a aparência, a postura e as estratégias que a escola deve assumir no processo de educação dos pequenos. Para Schumacher, uma esco-

la formadora de crianças cidadãs hoje é aquela que se reinventa sem desvalorizar as tradições; é aquela que, apesar das necessidades de adequação às novas tecnologias, combate certos hábitos da criança contemporânea com o resgate de habilidades esquecidas. É o espaço em que a criança deve experimentar realidades, fazer escolhas, resolver problemas, enfim, entrar em contato com situações de aprendizagem que a desenvolvam para além das facilidades compradas pelos pais. É desafio de educadores e gestores escolares lidar com esta gangorra que pende entre o advento do novo e a preservação de valores, cabe à escola e aos pais o bom censo de eleger o melhor não só para a instrução escolar de seus filhos, mas para a formação deles enquanto membros potencialmente transformadores da sociedade.

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Criança, consumo e cidadania: uma equação possível? *Solange Jobim e Souza

No mundo atual, a formação da criança, desde a mais tenra idade, acontece em estreita relação com a cultura do consumo. As crianças, desde os primeiros momentos da vida em sociedade, estão submersas em uma materialidade constituída por objetos que agregam valores aos modos de ser e estar no mundo. Deste modo, já nascem usando a fralda X, bebendo o leite Y e brincando com a boneca Z. Na interação com os adultos e com outras crianças, os códigos da cultura

do consumo se fazem presentes. Ao entrarem em contato com as mercadorias, diretamente ou por meio da publicidade, as crianças aprendem as regras de convívio social. Com muita frequência, temos observado como os encontros entre crianças e adultos estão empobrecidos por serem, cada vez mais, demarcados por experiências de acesso aos bens de consumo. Ir ao “shopping” se transformou em comportamento de lazer e entretenimento das massas, pois ainda que não se compre nada, estar entre as mercadorias é manter acesa a chama do desejo para não se deixar de consumir em um futuro muito próximo. Possuir determinados objetos significa agregar prestígio e reconhecimento entre pessoas. Consumir, portanto, ao invés de se constituir em uma atitude irrefletida ou alienada pode e deve ser um ato político. Em outras palavras, o consumo deve ser motivo para nos fazer refletir sobre o modo como temos participado na construção das relações de poder que circulam no capitalismo avançado, sustentadas com muita competência e “expertise” pelos meios de comunicação. Na medida em que percebemos a

complexidade das relações de produção e consumo no capitalismo tardio, a questão maior é nos indagarmos sobre o modo como agimos, conscientemente ou não, neste contexto. O problema não é nos posicionarmos contra o consumo em si dos bens culturais, embora isto também possa ser uma atitude louvável. O que não podemos deixar de fazer é tomar consciência sobre o modo como cada um de nós vem desenvolvendo valores e atitudes na vida, a partir da abundante e ininterrupta oferta de objetos transformados em ícones fictícios da felicidade suprema. Ter objetos significa ser admirado(a), respeitado(a) e invejado(a) pelos outros. Se os objetos já conquistaram o poder de interferir nas relações que estabelecemos com as pessoas e passaram a ocupar um lugar de destaque na definição de nossos afetos e sentimentos interpessoais, é hora de reverter este processo, estranhando tais atitudes e se indagando sobre o que nos faz pensar que tal comportamento é natural. O desafio é fazer desta constatação um modo de reinventarmos nossas relações com a cultura do consumo, valorizando atitudes que fortalecem o respeito pela vida, levando em conta

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as escolhas cotidianas sobre os objetos que consumimos. Numa entrevista concedida a Contardo Calligaris1 , Oliviero Toscani, fotógrafo e publicitário, polêmico por suas propostas vanguardistas, lembra-nos que o gasto com a publicidade é maior em nossa cultura do que o gasto com a educação pública e que, portanto, a publicidade veiculada pela mídia é hoje mais formadora de nossa subjetividade do que o ensino escolar. Não podemos deixar de nos indignar quando nos damos conta de que o consenso da razão contemporânea é constituído pelas imagens dos sonhos publicitários. Entretanto, é prudente que nossa análise vá além do reconhecimento da ameaça que os novos meios de comunicação, especialmente a publicidade direcionada ao público infantil, exerce sobre nós. Isto significa dizer que, mesmo reconhecendo as estratégias abusivas do mercado aliado à publicidade para fazer girar a roda da fortuna, acreditamos na mudança, na reforma da passividade do espectador em relação aos meios de comunicação. A formação da criança cidadã para uma leitura crítica das mensagens publicitárias pode ser uma das metas educacionais mais importantes na conjuntura atual. Pensar criticamente o mundo em que habitamos requer, contudo, saber formular as perguntas necessárias para provocar mudanças de atitudes. Será que temos analisado o modo como nos relacionamos com a mídia? Temos observado a qualidade do que nos chega pela janela da TV? Sabemos como a criança compreende a publicidade e os produtos culturais a ela direcionados? Será que, alguma vez, nos sentamos simplesmente junto à criança pra indagar sobre sua experiência como espectadora? Que lugar é este que deve-

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mos ocupar junto às novas gerações frente às mudanças nos processos de informação e produção de conhecimento na cultura do consumo? Que tempo dedicamos às conversas com as crianças? Escutamos o que elas dizem? Sabemos o sentido que as crianças dão para as palavras que elas escutam de nós? Ao buscar as repostas para estas questões, percebemos que o tempo compartilhado entre adultos e crianças é cada vez mais escasso. Trabalha-se cada dia mais para o aumento do poder aquisitivo e, consequentemente, do consumo. Pais chegam tarde em casa, e as crianças estão atarefadas e solitárias. A família se reúne cada vez menos para conversas cotidianas. Este afastamento da criança do mundo do adulto, ou, melhor dizendo, a falência do diálogo entre as gerações favorece a expansão do contato da criança com o mundo virtual e empobrece aquelas experiências de vida pautadas nas trocas interpessoais. Os adultos deixam de contar suas histórias às crianças, porque não sabem mais conversar sobre outra coisa, mas sim como os objetos conferem uma “dignidade” às avessas, porque nos desviam dos sentimentos essenciais e verdadeiros. Enfim, os objetos têm ocupado em demasia o espaço das conversas e ficamos sem saber como recuperar no diálogo com os mais jovens as conversas sobre os temas que nos conferem legitimidade através das gerações – transformar memórias em histórias. Quando não contamos mais nossas histórias, estamos contribuindo para a extinção daqueles que sabem escutar. Sem as histórias, desaparece com elas a comunidade dos ouvintes. Sem narradores e sem ouvintes, o individualismo recrudesce. Pensar criticamente sobre o que estamos oferecendo às crianças e

avaliar nossa participação, como coautores, na construção do mundo em que vivemos, é o desafio a ser enfrentado no campo educacional hoje. As indagações são sempre bem vindas, pois estimulam o pensar na contra corrente daquilo que se tornou hábito na vida cotidiana. Nossa intenção aqui, longe de responder completamente aos muitos desafios postos pela nossa época, é trazer à tona questões polêmicas, orientar o pensamento crítico sobre o impacto da publicidade e da mídia em geral, superando as explicações fáceis, produto de concepções maniqueístas, que paralisam a ação de adultos e crianças em novas direções. Será que o uso dos meios de comunicação de uma forma crítica pode se constituir em uma ferramenta importante e indispensável para a superação do enquadramento alienado de crianças e adultos na sociedade de consumo? O que pode a educação? Vale pensar, vale tentar. Ser cidadão na sociedade de consumo é principalmente se indagar sobre o lugar que estamos deixando de ocupar quando abdicamos de pensar coletivamente e fazer valer, com gestos, palavras e atos, a cumplicidade com a vida.

*Solange Jobim e Souza Psicóloga. Professora Associada do Programa de Pós-graduação em Psicologia Clínica da PUCRio. Professora Adjunta da Faculdade de Educação da (UERJ). Pesquisadora do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo e Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ). Coordenadora do Grupo Interdisciplinar de Pesquisa da Subjetividade – GIPS - no Departamento de Psicologia da PUC-Rio. ___________ 1 Esta entrevista está no livro “Crônicas do individualismo cotidiano”, Contardo Calligaris, São Paulo, Ática, 1996.

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PÓS-MODERNO CARTOLA

Escola infantil hoje: espaço para reinventar padrões de relação Eloiza Schumacher Corrêa*

Refletir sobre um currículo para a educação infantil nos dias de hoje é certamente uma tarefa desafiadora, sobretudo quando constatamos que as crianças que nos chegam nesses tempos pós-modernos estão inseridas em contextos complexos e reapresentam as contradições de uma sociedade em crise. Como lidar, por exemplo, com crianças bombardeadas com overdoses de novidades, donas de ilimitadas informações; com aquelas que tudo ganham, evidenciando uma competitividade emergente em todos os aspectos (ter mais, usar mais – marcas e assessórios – para ser mais, para parecer mais, para vencer o outro...); com os pequenos impacientes que exigem satisfação imediata e garantida; com quem vive fechado em casa, diante da televisão e do computador sem a mínima chance de se movimentar e brincar na rua; com pequenos estressados e ansiosos, frutos das rotinas extenuantes; com os superprotegidos que não têm o mínimo repertório para resolver conflitos; com aqueles a quem já foi ensinado que as relações podem ser mercadorias; com os que idolatram os bad-boys; ou ainda com tudo isso junto ao mesmo tempo... Enfim, estas e outras tantas situações (estranhas há 30 ou 40 anos) são comuns na escola hoje. Por isso, é preciso aprender a tomar atitudes pedagógicas frente a elas. E é exatamente aí que se centra nosso propósito: discutir sobre a cria-

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ção de situações de aprendizagem para que nossos alunos, com suas “síndromes contemporâneas”, experimentem outras formas de ser e agir na convivência. Phillippe Perrenoud (1999), ao argumentar em favor de uma possível autonomia da escola frente ao contexto social, sugere que a escola deve tentar ser um “oásis”, mantendo seu estatuto “protegido” e continuando a funcionar mesmo em “circunstâncias movimentadas”. Isso significa que é necessário resguardar as finalidades da educação, assegurar a formação e o desenvolvimento do ser humano, não importando contexto em que a escola encontra-se inserida. Ou seja, diante de qualquer crise, o sentido de educar merece ser preservado, garantindo-se as necessidades de aprendizado (seja de ordem social, cognitiva ou afetiva). Partindo desta idéia, acreditamos que é possível aproveitar nosso tempo com as crianças na escola para a construção de mais relações saudáveis, mesmo que fora dela isso não esteja acontecendo. Contudo, para que isso aconteça, é preciso reinventar padrões de relacionamento . Na escola, significa fazer com que os envolvidos possam vivenciar situações que normalmente não vivenciam fora dela, tendo em vista, a desnaturalização de modelos de comportamentos. Em outras palavras, significa mostrar concretamente outras possibilidades de relação, desestabilizando modelos com os quais as crianças estão acostumadas. Pensando dessa forma, torna-se produtivo apostar no desenvolvimento de pedagogias que oportunizem a experimentação de relações diferenciadas entre as pessoas. E, nesse sentido, a escola pode vir a ser uma fonte inesgotável de pos-

sibilidades de romper com alguns “padrões” de relação tão frequentes nos dias de hoje, desde que sejam preparados ambientes físicos e emocionais para tanto. A escola infantil, concebida deste modo, como um lugar onde todos aprendem a se relacionar melhor, requer profissionais que incorporem o aprender a conviver como parte estruturante do currículo. E, nesse caso, é necessário ficarmos atentos a pelo menos cinco questões: Esse movimento vai além da realização de atividades com as crianças. Supõe permitir a vivência real dos desafios e sentimentos que permeiam os processos de concretização das atividades, o que inclui enfrentamento de problemas, tomada de decisões, preparação de ambientes e materiais, busca de recursos, partilha de conquistas.... Contar com a criança como parceira na construção de algo é um movimento que possibilita diferentes aprendizados: analisar o que está sendo proposto, visualizar as condições do contexto, descobrir possíveis problemas, selecionar o que é relevante, assumir riscos, fazer escolhas, buscar ajuda, criar estratégias, construir suas próprias soluções, assumir responsabilidades. As crianças que recebem tudo pronto e imediato, que são sempre protegidas dos conflitos, que contam sempre com adultos para resolver os problemas, não estão acostumadas a exercitar a paciência e a tolerância, não aguentam frustrações e pouco sabem sobre os processos envolvidos para a concretização de algo. Portanto, terão, em situações que envolvem este tipo de responsabilização, a oportunidade de experimentar outras formas de ser e agir. Apoiar e dar ferramentas para que a crianças imaginem as coisas

de um outro jeito, incluindo na escola elementos como admiração, descoberta, interpretação, surpresa, encantamento, são estratégias substancialmente ricas para reinvenção de relações. Nesse sentido, um caminho eficaz seria preencher o cotidiano com literatura, poesia, artes visuais, dramáticas ou musicais. Correr no pátio da escola atrás de algo que sirva para ser o mastro do barco, encontrar a textura que faltava para completar uma mistura, colocar o palito de picolé para sustentar uma mesinha, terminar de pintar o foguete, fazer descobertas inusitadas com a mistura de materiais... são experiências praticamente não vividas por quem passa boa parte do dia na frente da televisão ou do computador, por quem tem acesso somente ao que é comprável, por quem não consegue esperar, por quem recebe tudo de “bandeja” e ainda não vivenciou o sentido de ir atrás do que deseja. É preciso então que a escola promova o diferente: estimule a exploração; ofereça às crianças propostas que tenham problemas dentro delas; apresente desafios que nunca tenham uma única resposta definida, mas um mundo de possibilidades; provoque surpresas, dúvidas, entusiasmo, novas maneiras de ver e, principalmente, se transforme num espaço inspirador para a expressão de seus sentimentos e conhecimentos por meio do uso linguagens diversificadas. Estruturar trabalhos que promovam uma aproximação sensível e verdadeira com a natureza: plantar; preparar visitas a áreas naturais; organizar caminhadas; andar descalço na mata; oportunizar contatos com a terra, em que se possa ouvir os sons, sentir os cheiros, explorar texturas; propor contemplações, em

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que se fique fascinado com a beleza e a complexidade dos ambientes; entre outros exemplos, poderão ser experiências particularmente ricas no sentido de desenvolverem novas maneiras de sentir a natureza, para que aprendam a respeita-la, a ser gratos a ela, experimentando modos de conviver com o meio que talvez ainda não conheçam. Numa sociedade em que cada vez menos as crianças podem transitar livremente e perderam a autonomia de ir e vir, em que cada vez mais ocupam seu tempo com atividades sedentárias, em que as oportunidades para brincar na rua praticamente estão em extinção, romper com um padrão significa criar oportunidades para que façam o contrário: movimentem-se com liberdade, consciência e autonomia. Não se trata aqui de simplesmente aumentar o tempo dedicado às atividades esportivas. O foco é muito mais amplo, supõe a estruturação de atividades voltadas para a construção da autonomia de movimento (ir, vir, localizar-se, tomar decisões

espaciais...), para a consciência corporal (uso do corpo para conhecimento e prazer), para o reconhecimento das possibilidades de expressão corporal, para a ampliação e diversificação das possibilidades de movimento... Portanto, embora as atividades esportivas sejam essenciais é, sobretudo, por meio das problematizações intencionalmente introduzidas na rotina da sala que essa amplitude se concretiza. Compreendemos que, numa sociedade em que é comum a experimentação de sentimentos negativos entre os seres humanos, é tanto possível quanto necessário pensar a escola como um local onde se pode exercitar emoções positivas. Isto significa, como diz Galvão (2001), trabalhar em prol do “saneamento” da “atmosfera emocional”. Para tanto, há que se propor e fazer emergir modelos de educação que se preocupem em nutrir também áreas relacionadas com a emoção e a espiritualidade. Há que se reeditar rituais, construir e viabilizar contextos para brincar, para sentir, para com-

partilhar, para se vincular, para se tocar, para apreciar, para inventar sem a pressa do imediatismo, para agir intuitivamente, para se emocionar, para estar carinhosamente com o outro... ******** Referências GALVÃO, IZABEL. Expressividade e emoção: Ampliando o olhar sobre as interações sociais. Rev. Paul. Educ. Fís. Supl.4, 2001. PERRENOUD, PHILIPPE. Construir as competências desde a escola. Porto Alegre: Artmed, 1999. PERROUD, PHILIPPE. Escola e Cidadania. Porto Alegre: Artmed, 2005. SANTOS, BOAVENTURA SOUZA. Para uma pedagogia do conflito. In: SILVA, L.H.; AZEVEDO, J.C.; SANTOS, E.S. Novos mapas culturais, nocas perspectivas educacionais. Porto Alegre: Editora Sulina, 1996. *Eloiza Schumacher Corrêa é pedagoga e assistente social. Consultora de educação em redes de ensino públicas e privadas na Educação Infantil e Ensino Fundamental. Palestrante em eventos de Educação. Assessora da Escola Autonomia de Florianópolis (SC). eloiza.c@superig.com.br

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ENTREVISTA

Repensando a disciplina em sala de aula e o papel dos pais

Pensar em disciplina na sala de aula remete-nos, em geral, a uma porção de estudantes rigidamente sentados, livros abertos, e silêncio absoluto enquanto se ouve (somente e atentamente) a voz do professor. Mais de 30 anos de pesquisa e reflexão acerca desse e de outros temas relativos à educação levaram o professor Celso Antunes a questionar com maestria esta cena. Segundo ele, o debate, o diálogo é imprescindível no processo de aprendizagem, e não só a conversa professor-aluno, mas entre os próprios estudantes. “A disciplina não pode, jamais, chegar ao aluno como uma ordem, um castigo, um imperativo que partindo do mais forte, dirige-se ao oprimido em nome de seu conforto pessoal”, alerta Celso Antunes. Diante do imperativo de transformação das escolas, é preciso repensar as condutas em sala. A necessidade

de silêncio, muitas vezes, é oriunda de uma postura unilateral do professor, que requer alunos passivos. Uma outra questão relativa à indisciplina é a criação familiar. O aluno indisciplinado é reflexo da conduta dos pais? Celso Antunes comenta sobre a importância do ensino para a vida, a convivência em sociedade, dentro e fora da escola. Para ele, escola e família auxiliam os seres humanos no processo de aprendizagem, não podendo uma transferir à outra sua parcela de responsabilidade sobre cada indivíduo. Autor de mais de 40 livros relativos à aprendizagem, Antunes atualmente dedica-se a palestras e conferências, em que discute os conceitos de indisciplina, além de neuropedagogia, cognição, métodos de aprendizagem, formação docente, entre outros.

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Vida e Educação - Um dos temas mais recorrentes e interessantes de suas palestras é “disciplina e indisciplina na sala de aula”. Segundo sua concepção, professor, o que há de inapropriado no uso desses termos para caracterizar o comportamento dos alunos? Celso Antunes - Não conheço um conceito para “Indisciplina” que possa expressar toda dimensão de seu significado. Em geral, se afirma que indisciplina se caracteriza pelo fato do aluno conversar em sala de aula e nesse ponto cresce minha indignação e surpresa. Conversar é a mais expressiva e mais significativa conquista da humanidade e privar a pessoa da conversa é privá-la do pensamento e da criatividade e de uma aprendizagem significativa. Há conversas e conversas e muitas delas são ferramentas do pensamento, instrumentos de reflexão.

Muitas vezes, em uma classe em que os alunos conversam, ocorre a pesquisa, a descoberta, a argumentação e a construção autêntica do saber. Creio que melhor seria afirmar que indisciplina existe quando os propósitos e missões da aula não se concretizam pela apatia ou pelo tumulto dos alunos, cuja atenção se desvia para outros significados. Tal como um ato cirúrgico, deve carregar uma intenção de cura, uma aula precisa estar centrada na idéia de aprendizagem significativa e, portanto, transformação e esta exige a conversa interior e a discussão com o outro. Aceito que uma conversa paralela ao que o professor explica, distante dos desafios que ousa e propõem possa ser uma atitude a ser coibida, mas jamais crer que alunos em silêncio totais sejam criaturas no exercício da verdadeira aprendizagem. Vida e Educação - Como profes-

sores e diretores reagem a essa desmistificação da indisciplina proposta em seus estudos? Celso Antunes - Quando não se fixam apenas na palavra e compreendem o sentido dessa desmistificação, concordam, ainda que muitos admitam que não conhecem os verdadeiros caminhos para uma conversa construtiva, reflexiva e desafiadora em sala de aula. Percebem, então, que o aluno torna-se indisciplinado por não ter sido feito interessado; torna-se apático porque a aula o fez espectador e não um protagonista. Infelizmente para muitos professores existe apenas um formato para a aula e esse formato a aproxima de um discurso. Mas é impossível ignorar que existem muitas maneiras de se ministrar uma aula e que todo professor precisa conhecer algumas e assim dispor de ferramentas ade-

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quadas para as aprendizagens que desejar promover. Existem mais de duas centenas de países no mundo e em todos existem escolas. Em todas as escolas existem aulas. Será que o formato da mesma, associando-a a um discurso, é prática universal? Será que não se poderia aprender outras maneiras de se ministrar aulas e com estas promover o protagonismo do aluno, sua conversa interior, seus novos pensamentos e a verdadeira construção de significados? Vida e Educação - Como a agitação, a curiosidade e outras dessas

“A água da chuva que escorre pela encosta de um morro se transforma em fator de apreensão se não é disciplinada.”

atitudes típicas do comportamento infantil podem se tornar instrumentos pedagógicos? Celso Antunes - A água da chuva que escorre pela encosta de um morro se transforma em fator de apreensão se não é disciplinada. Pode ocasionar destruição e ameaça à vida. A fala do aluno, tal como a água que escorre, necessita ser provocada, estimulada com criatividade e orientada para a busca dos objetivos de uma aprendizagem verdadeiramente significativa. Quarenta alunos discutindo solução para um desafio numérico podem estar fazendo ruído, mas em sua curiosidade e busca de aprendizagem existe mais ação que no silêncio sepulcral de quem ouve porque é induzido a crer no pecado da fala. Sou contra aula sem protagonismo, passividade do aluno sem sua conversa com outros e sem sua conversa interior. Vida e Educação - Que indivíduos e instituições podem ser considerados, de fato, responsáveis pela formação de uma criança? Celso Antunes - A família é sempre a primeira e essencial instituição, a escola vem logo após. São elas que regem os fatos que se ouve, os programas que se assiste. Quando uma família, tal como uma empresa, apresenta de forma clara a definição de sua “missão” e o elenco dos valores nos quais crê e acredita e quando materializa a prática desses valores a criança se forma e não há porque temer forças exógenas. O ser humano nasce preparado para aprender a pensar e se fazer, e escola e família são instituições essenciais nessa busca. Vida e Educação - Em entrevista a um jornal goiano, em 2007, o senhor afirmou que o papel da escola de transmissora de informações está ultrapassado, visto que hoje crianças e jovens se informam a partir da TV e da Internet. Nesse sentido, qual seria então a função social da escola atualmente?

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ENTREVISTA

Celso Antunes - Existe uma distinção entre “informação” e “conhecimento”, entre “memorização” e “significação”. A verdadeira aprendizagem une a informação com o conhecimento, o fato com sua análise e sabedoria. Não mais se exige que professores informem, mas são essenciais e imprescindíveis no papel de transformar essa informação em conhecimento. Deve usar a informação e ajudar o aluno a refletir sobre sua relação com a vida, o entorno, deve valer-se da informação para provocar pensamentos, despertar curiosidades. Cabe ao professor ensinar ao aluno como pesquisar, como argumentar, como assumir uma visão sistêmica do mundo, como aprofundar sua capacidade de análise, crítica e aplicação e, sobretudo, se auto-avaliar e buscar sempre fazer de sua maneira de enxergar uma diferenciada forma de ver. Toda escola e qualquer lugar somente pode assim ser chamada

quando cumpre três papeis essenciais: (a) ser um verdadeiro centro epistemológico e dessa forma ensinar o aluno a aprender, pensar, usar sua memória, saber pesquisar, poder argumentar, enfim saber utilizar a plenitude de suas competências. (b) ser um centro promovedor da socialização do aluno e dessa forma “ensinar” a construir amizades, fundamentarse na solidariedade, compreender o outro e, finalmente, (c) um centro instigador de inteligências e de competências, levando o aluno a aprender a aplicar tudo quanto descobre. Vida e Educação - Considerando que hoje os papéis da escola e do professor precisam ser repensados, a educação recebida em casa, na família, também deve mudar? Celso Antunes - A educação familiar não sobrevive e não é rejeitada pelos filhos se não se modifica. É possível se adestrar crianças, mas estas logo se distanciam de um autoritarismo amestrador e buscam o diálogo e a vontade de construir o

mundo de suas relações. O apelo da criança à família é sempre muito forte e essencialmente motivador. Pena que nem todos os pais compreendam e possam saber ler esses apelos e assim se transformarem sempre, se façam verdadeiros amigos e se instituam como provedor da segurança. Vida e Educação - Em sua opinião, o modo como os pais educam os filhos se reflete na disciplina em sala de aula? Celso Antunes - Em parte. Não creio que a escola deva ser refém de uma educação familiar que questione seus objetivos de formação. A educação familiar ajuda bastante a disciplina escolar, mas esta tem suas metas e necessita buscá-las preferencialmente auxiliada pela família, mas buscá-la sempre ainda que a família as vezes não coopere.

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PEDAGOGIA

Em tempos de guerra, ecoa a voz de Freire: 40 anos de Pedagogia do Oprimido Israelenses e palestinos encontram-se novamente em guerra. Iniciado em 27 de dezembro de 2008, o novo confronto já fez mais de 900 mortos, dentre eles, quase 300 crianças. Nesses tempos de guerra, em que opressor e oprimido se confundem, recorremos ao pensamento do sábio que, também na adversidade, ressignificou a concepção de educação libertadora. Exilado no Chile, entre os anos de 1967 e 1968, Paulo Freire escreveu um dos livros mais importantes de sua obra, A Pedagogia do Oprimido. Nele, desfaz a linha tênue que separa educação e liberdade e preconiza a impossibilidade de se aprender sozinho ou pela intercessão de um só indivíduo. Aprendizagem é comunhão. Diante da lógica desumana de

opressão e marginalização, em que “a pedagogia dominante é a pedagogia das classes dominantes”, como nos diz o próprio Freire, o ato de educar deve – por missão – pautarse na tríade ação-reflexão-ação, superando o caráter mercadológico de aquisição de saber para tornar-se meio de conscientização, sabedoria que leva à tomada de atitude. No exílio, Freire repensou a dialogicidade, compreendendo-a como a capacidade dos seres humanos de compartilhar vivências a partir do diálogo e, através dele, combater a intolerância (racial, cultural, religiosa, política). Nesses tempos de guerra, em que a obra escrita há 40 anos apresenta-se tristemente atual, convidamos você, leitor, a revisitar a Peda-

gogia do Oprimido nas palavras de João Figueiredo e Ercília Braga. Em seus textos, os autores destacam elementos que oportunamente reiteram a importância do clamor por liberdade e autonomia – um eco nos estudos Freireanos. Figueiredo discorre acerca da Teoria Dialógica da Ação, um impulso contrário à dominação, à manipulação e à invasão cultural. Já Ercília Braga retoma o conceito de ética de responsabilidade, o estímulo aos interesses coletivos em detrimento do egocentrismo. Tais artigos objetivam, de certo modo, questionar o que temos feito para tornarmos o mundo um lugar de homens libertos, partilhadores de saberes e costumes, cultivadores de formação e respeito mútuo, como desejou Paulo Freire.

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Teoria Dialógica da Ação e a atualidade do pensamento de Paulo Freire João Figueiredo*

Começo de um princípio: “Pedagogia do Oprimido” inaugura um campo de ação-reflexão-ação, a Educação Popular, tal como hoje conhecemos. Nela, surge uma proposta de emersão dos esfarrapados desse mundo, que potencializa a reflexão acerca de ações transformadoras-libertadoras da opressão social instalada no mundo do capital e do mercado. Chegamos ao fim dos tempos do capital hoje? Não creio. Como afirma Paulo Freire, na Pedagogia do Oprimido, somente os oprimidos possibilitam a superação dos processos opressores e ninguém mais. Desse modo, percebe-se a relevância de sua Teoria Dialógica da Ação. Esta obra traz como tema central o ser humano, em suas complexas dimensões, na consolidação de sua

liberdade e autonomia. E isto é profundamente avançado em tempos de uma forte defesa a um discurso único nas ciências e, consequentemente, no campo da educação, da informação e da comunicação. O casamento possível entre sujeito-objeto, que derivava em conhecimento científico, ocorria por meio de um único método. A colonialidade do saber assim se instalou. Uma epistemologia eurocêntrica e cartesiana, a ciência moderna, fundamentou todo o avanço civilizatório que descambou na sociedade da informação. É uma teoria que carrega uma postura eminentemente colonializante. Colonializar implica em impor idéias, propagar ideologias. Pode ainda ser entendida como estratégia de invasão cultural. Implica em exercer domínio sobre outras formas de co-

nhecimentos, lógicas. Globalmente, começa, em 1492, com a “descoberta da Europa”, instaurada com a invasão das Américas. No eurocentrismo colonializante, surge uma civilização fragmentada, cognitivista, excludente, monocultural, desumana. Segundo Paulo Freire, os seres humanos são seres de ação-reflexãoação. E por isso mesmo todo quefazer implica em uma teoria que ilumina a ação e por ela é iluminada. Senão será verbalismo ou ativismo. Portanto, da mesma maneira como há uma teoria que anima os processos opressores, faz-se necessária uma que potencialize, caracterize e seja inerente à práxis libertadora: uma Teoria Dialógica da Ação. Esta sim se integra no contexto de um quefazer libertador, descolonializante. A Teoria Dialógica da Ação eclodiu

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no momento mesmo em que a sociedade se problematizava por meio de um forte movimento estudantil (barricadas de abril em Paris), feminista, hippie... Havia no ar uma crítica à sociedade de consumo, a toda ordem instituída, lutas pela democracia, criticas à guerra do Vietnã etc. Naquele momento, se consolidou a proposta freireana. Esta obra se iniciou com “Educação e Atualidade Brasileira”, tese de concurso para a cadeira de História e Filosofia da Educação da UFP (não seria interessante colocar o significado da sigla?), defendida em 1959, quando dialoga sobre um Projeto Popular para o Brasil. Adensa-se com “Educação como prática da Liberdade”, publicado em 1967, no qual aprofunda sua reflexãoação. Colima na Pedagogia do Oprimido, produzida durante seu exílio no Chile, entre 1967 e 1968. Em 1967, conclui os três primeiros capítulos e os guarda. Em 1968, revisa e escreve o quarto capítulo – a Teoria Dialógica da Ação. A Pedagogia do Oprimido foi publicada em 1969, num manuscrito em língua portuguesa. Saiu como livro em 1970, nos Estados Unidos - Nova York. No Brasil, sua publicação neste formato se dá em 1974. Esta obra propõe que a palavra prenhe de significado potencialize ao humano tornar-se autor de sua própria história. Trata de um processo educativo, uma ação cultural para a libertação. E nessa relação epistemológica, entre os humanos e seu entorno, a realidade opressora pode ser desvelada e transformada. Conceitualmente, ajuda na compreensão do mundo, dos limites explícitos na situação-limite, transponível por meio de ações superadoras, os atos-limite; potência ontológica humana de ser-mais. Nessa pegada, avança-se em direção ao inédito – viável, o sonho possível que se materializa por meio do nosso quefazer, que é a práxis, traduzida de maneira simples e profunda por ação-reflexão-ação.

Em sua leitura, a dialógica é compartilhar palavra, não oca, mas plena de sentido, de vida, de experiência derivada da práxis social. Isso viabiliza transformar a opressão numa realidade desejável. Dialoga-se acerca de atividades criadoras, contextualizadas. Assim ocorre a gênese da Teoria Dialógica da Ação. Lembro que Habermas publicou sua obra mais importante apenas

em 1981, “Teoria da Ação Comunicativa”. Esta fez dele um dos maiores filósofos da atualidade!?! Bem antes, Paulo Freire publicara sua proposta. E nela já falava em intersubjetividade, em intercomunicação. Ao tratar da Teoria Dialógica da Ação, destaco que a Teoria da Ação Antidialógica se funda em quatro vertentes: a Conquista, o Dividir para Dominar, a Manipulação e a Invasão

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PEDAGOGIA

Cultural. Na busca da superação destes artifícios, Paulo Freire propõe quatro pilares dialógicos: a Co-laboração; a União; a Organização e a Síntese Cultural. Sucintamente, pode-se dizer que a Conquista se identifica com uma postura necrófila, opressora, reificadora, lendo os humanos como coisas a serem exploradas e dominadas, oprimidas. O Dividir para Dominar

implica em fragmentação e parcialização. A Manipulação se associa a mídias e discursos organizados em torno de “mitos” e pactos sociais elitistas. A Invasão Cultural, por sua vez, aliena e destitui através de ideologias e valores validados pela elite. Na Teoria Dialógica da Ação, A Co-laboração, a relação com o outro, é o que nos constitui. Parceiramente, potencializa o reconhecimento da

realidade, uma emersão acima dos procedimentos fragmentadores. Desvela criticamente o mundo e o quadro opressor. É biófila, pois se filia à vida e aos processos vitais. Traz união ao reconhecer que é no encontro que podemos avançar. O Unir para Libertação implica em comunhão entre os seres; entre cultura e natureza, entre as dimensões humanas; entre objetividade e subjetividade, entre teoria e prática. Une o que vem se apresentando falsamente como separado. O cuidado é essencial nessa ação integradora. A Organização, na qual se busca unidade, liderança orgânica revolucionária que contribui com deliberações democráticas e participativas; testemunho afetivo: radicalização quanto à busca das raízes de nosso ser mais inteiro, coerência com o que desejamos; ousadia, valentia de amar; crença nas massas; prática da liberdade não autoritária, nem licenciosa. A Síntese Cultural, que visa a transformação, tenciona permanência-mudança; pretende superar as induções alheias; é emancipatória; favorece a criação parceira das pautas de ação; resolve a contradição entre o saber da liderança e dos grupos populares. Paulo Freire finaliza esta obra, que continua a ser revista e aprofundada noutros livros, com a profunda e amorosa lição da confiança no povo, na fé nos humanos e na criação de um mundo em que fosse menos difícil amar. ******** Referências Bibliográficas: FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro, RJ: Paz e Terra, 1974/13 ed., 1983. ______. Educação como prática de liberdade. Rio de Janeiro, RJ: Paz e Terra, 1967/ 24 ed. 2000. ______. Educação e atualidade brasileira. São Paulo, SP: Cortez: Instituto Paulo Freire, 2001.

*João Figueiredo Professor doutor do Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira, integrante do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Ambiental Dialógica, Educação Intercultural, Educação e Cultura Popular (Gead)

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PEDAGOGIA

Ética da Responsabilidade: es Ercília Braga*

A imprensa cearense divulgou, no dia 29 de dezembro de 2008, o balanço anual dos homicídios na Região Metropolitana de Fortaleza: 1.000 casos. Nós, educadores e educadoras populares, que temos um compromisso com a vida vivida em plenitude, precisamos refletir sobre o tipo de educação adequada para vivermos nessa complexidade contemporânea, com a globalização da economia, das comunicações e da cultura; com o alargamento da violência em suas diversificadas formas e níveis e com o acirramento da exclusão, dos conflitos nacionais e internacionais, nos quais emergem fundamentalismos, intolerâncias e racismos. Não precisamos importar teorias para compreender os espaços educativos e saber como potencializá-los para o enfrentamento dos inúmeros processos desumanizantes. Temos a proposta freireana a nos acenar com uma “ética universal do ser humano”(FREIRE,2000). Ética contrária à lógica do mercado, da exploração capitalista e de qualquer forma de opressão dos seres vivos. Em 2008, a Pedagogia do Oprimido, obra fundamental do edifício político-pedagógico erigido por Paulo Freire, completou 40 anos. Num mundo onde tudo vira mercadoria descartável, inclusive os livros, é de se perguntar por que esse livro continua influenciando tantos educadores mundo afora. Quais receitas Freire oferece? Quais trilhas seguras apresenta? As idéias do livro dedicado aos “esfarrapados da terra” têm um valor perene exatamente porque, além de

não apresentar nenhuma receita ou trilha segura, discute as questões fundamentais do ser humano, da sua formação e do seu agir. O educador pernambucano, que se tornou andarilho do mundo, parte de uma antropologia positiva, afirmando a vocação ontológica que o ser humano tem de “ser mais”. Essa é a grande base de sua pedagogia. Base alimentada por uma profunda esperança. Voltemos aos números da violência anteriormente citados. O que nós educadores temos com isso? Isso não é caso para a polícia? Na ótica freireana, a leitura da palavra não pode estar dissociada da leitura do mundo. Crianças, jovens ou adultos que decodificam a palavra violência devem pronunciar sua experiência em torno desse fenômeno: como sou afetado por isso? Em que medida colaboro para essa violência? Qual a base estrutural que a origina e alimenta? Como posso agir para colaborar com a edificação de um mundo melhor? Paulo Freire nos ensinou, e demonstrou quando foi secretário de educação da cidade de São Paulo, que o aprendizado da leitura da palavra não é incompatível com a leitura do mundo. Educadores e educandos, mediatizados pelo mundo, ou seja, sendo uma presença atuante no mundo, educam-se mutuamente. Daí por que ninguém é sujeito da autonomia do outro. É importante retomar nesse ponto de nossas reflexões as elaborações freireanas sobre conscientização, so-

bretudo a partir da primorosa obra Pedagogia da Esperança, onde a Pedagogia do Oprimido é retomada. Nesse livro falado, vemos que o processo de conscientização ultrapassa a simples tomada de conhecimento da realidade opressiva para fortalecer-se pela ação-reflexão-ação, constituindo-se em práxis transformadora. Sintonizado com essa perspectiva, Ernani Maria Fiori, no prefácio da Pedagogia do Oprimido (1978), afirma: Os caminhos da liberação são os do oprimido que se libera: ele não é coisa que se resgata, é sujeito que se deve autoconfigurar responsavelmente [...] o oprimido, reflexivamente, descobrese e conquista-se como sujeito de sua própria destinação histórica [p.9-10]. Somente com essa compreensão, superamos a perspectiva pedante de que conscientizamos alguém. A dialogicidade é o fundamento da educação libertadora e, consequentemente, dos processos de conscientização. Pelo diálogo, educadores e educandos, em comunhão, ganham significação enquanto seres humanos plenos. É, portanto, uma exigência existencial. É ato de criação. Para que o diálogo ocorra, exige-se humildade, amor e fé nas pessoas, sentimentos humanos cada vez mais escassos e desprivilegiados nessa sociedade materialista. Nas palavras de Freire, “o diálogo é o encontro dos homens mediatizados pelo mundo, para pronunciá-lo, não se esgotando, portanto, na relação eu-tu”. [1978, p.79]. Mas quantos educadores, cansados ou seduzidos

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esperanças renovadas pela lógica dominante, deixaram de acreditar no diálogo... Na verdade, perderam a esperança, pois esta é condição para o diálogo. O ano de 2009 inicia. Estamos num momento propício para avaliações e redirecionamentos. Momento para renovar esperanças: nas formas de organização social; nos rumos da política educacional, no redirecionamento das práticas escolares; nas nossas atitudes cotidianas, pois as mudanças devem começar em nós mesmos. Trata-se de renovar esperanças em duas dimensões, fundamentalmente: no nosso crescimento interior (individualidade) e no compromisso com o outro (coletividade). Ambas têm, como pano de fundo, uma ética da responsabilidade consubstanciada em valores claros: solidariedade, cultura de paz, abertura ao servir, identificação com a dor do outro, cooperação e justiça. A dignidade humana, o respeito a todas as formas de vida e os valores espirituais, são bens inestimáveis. Para Escamez e Gil (2003), o cultivo da ética da responsabilidade é o caminho para conciliar os interesses comuns com os interesses individuais, superando, assim, o individualismo que caracteriza nossa época. A dimensão utópica que permeia a obra de Freire é fruto da sua concepção de que homens e mulheres são seres inacabados, inconclusos e, portanto, em permanente estado de aperfeiçoamento. Influenciado pelo filósofo marxista alemão Ernst Bloch (1885-1977), autor da obra O Princípio Esperança, Paulo Freire não

tem uma visão ingênua sobre esperança, como mera atitude passiva de espera. O espírito utópico não está dissociado da realidade presente. As situações concretas que nos afligem devem ser problematizadas e enfrentadas. Tanto para Bloch, quanto para Freire, a utopia é horizonte que orienta uma crítica radical do presente. Em outras palavras, não podemos vislumbrar um futuro diferente deixando de considerar os problemas presentes. Somos seres em situação, e não há educação sem consideração dos seres humanos tal qual vivem, pensam e sentem. A esperança nutre-se em muitas fontes: na ânsia de justiça; na expressão dos afetos; na abundância dos que sabem partilhar, mesmo quanto têm pouco; na indignação ante às explorações; na revolta popular frente à corrupção em todos os níveis; nos sonhos dos jovens ativos e criativos; na leveza dos que sabem lidar com as diferenças; nos desejos dos idosos que ainda se sentem jovens; na fé dos que aprenderam a agradecer. Porém, a esperança só se consolida como princípio orientador da ação educativa pelo engajamento. Nas palavras de Paulo Freire, esperança é uma “necessidade ontológica” e um “imperativo excepcional e histórico”. Não é, porém, a esperança um cruzar de braços e esperar. Movo-me na esperança enquanto luto e, se luto, com esperança espero (1978, p.97). Esperança é dínamo. É combustível para a ação transformadora. Paulo Freire recuperou o sentido

positivo da utopia, recolocando o ser humano no centro das reflexões educativas, denunciando as condições concretas de opressão e anunciando o “inédito viável”, construído historicamente por sujeitos que aprendem a pronunciar sua palavra e a agir no mundo. Destacamos aqui um dos muitos legados deixados por Freire: a importante tarefa que cabe aos educadores de cuidar para que a esperança, constitutiva do humano, não se desvie ou se perca. A obra freireana não nos deixa esquecer que a desumanização é uma possibilidade na história, mas não é uma condenação inevitável. ******** REFERÊNCIAS ESCAMEZ, J e GIL, R. O Protagonismo na educação. Porto Alegre: Artmed, 2003. FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978. ____ Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982. ____ Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2000. *Ercília Maria Braga de Olinda Doutora em Educação pela UFC. Pertencente ao eixo temático Educação Ambiental, Juventude, arte e Espiritualidade da linha de pesquisa Movimentos Sociais, Educação Popular e Escola do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFC.

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ALTAS HABILIDADES

Falando sobre estudantes com altas habilidades Andréia Serra Azul da Fonseca*

O estudante classificado pelo senso comum de “gênio” ou “superdotado” tem sido foco de reflexão no meio educacional. Diferentemente do que se imagina, essa criança não necessariamente se sobressai intelectualmente às demais. Pelo contrário, há casos em que a criança pode ter um desempenho excepcional em determinada disciplina escolar e apresentar dificuldades de aprendizado em outras. Para evitar equívocos, a palavra “superdotado” vem sendo substituída pela expressão “com altas habilidades”, identificando-a, assim, como um tipo de deficiência que merece devida atenção. O artigo a seguir, da pedagoga Andréia Serra Azul da Fonseca, discorre sobre as altas habilidades, apresentando suas características e alertando sobre a importância do envolvimento dos educadores no processo cognitivo de estudantes com esse tipo de deficiência.

Os alunos com altas habilidades/ superdotados encontram-se distribuídos em toda população: estimativas de uma proporção de 3% a 5% de alunos com altas habilidades/ superdotação e para talentos até 20%. Logo, as aptidões superiores não se restringem a gênero ou a condições sócio-econômicas privilegiadas. Acrescente-se a essas considerações a idéia errônea (e por que não dizer preconceituosa) da sociedade sobre a incompatibilidade entre inteligência ou talento e pobreza. É notória a constatação de que, quando uma criança ou adolescente de classe privilegiada é identificado como talentoso ou superdotado, o fato seja visto como dentro do esperado. Entretanto, quando essas mesmas características são observadas em uma criança ou adolescente de

classe menos favorecida, o fato causa espanto geral (ESTEVES, 2006; FONSECA, 2006; GUNTHER, 2000; VIANA, 2005). A primeira referência oficial sobre educação para alunos com altas habilidades no Brasil é relativamente recente, surgiu na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de 1971 (lei 5.692/71). Embora a Educação Especial seja abordada de modo bastante limitado, consta uma breve recomendação com vistas ao atendimento diferenciado de portadores de altas habilidades, em meio aos demais portadores de necessidades educacionais especiais (BRASIL, 1971). Conforme o artigo 9º da LDB de nº 5.692 de 1971: Os alunos que apresentem deficiências físicas ou mentais, os que se

encontrem em atraso considerável quanto à idade regular de matrícula e os superdotados deverão receber tratamento especial, de acordo com as normas fixadas pelos competentes Conselhos de Educação (BRASIL, 1971: 3). A proposta de atendimento educacional especializado enunciada pelo MEC para os alunos com altas habilidades/superdotação apresenta fundamentos nos princípios filosóficos que embasam a educação inclusiva. Tem como objetivo precípuo formar professores e profissionais da educação para a identificação dos alunos com altas habilidades/superdotação, oportunizando a construção do processo de aprendizagem e ampliando o atendimento, com vistas ao pleno desenvolvimento das suas potencialidades, além de

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proporcionar informações em razão de suas necessidades educacionais especiais, bem como, para todos os membros da comunidade escolar da rede regular de ensino (BRASIL, 2006; FONSECA, 2006). Atualmente, identificar e estimular a criança com altas habilidades/superdotação constitui-se um desafio para educadores, psicólogos e a própria família. Muitas propostas acerca das concepções sobre altas habilidades têm sido estudadas desde o início do século XX e mais fortemente nos últimos 30 anos. Com a elaboração e divulgação de testes de inteligência, especialmente na 1ª metade do século passado, uma concepção bastante enraizada no pensamento popular até os dias de hoje é a de que o indivíduo com altas habilidades/superdotação seria aquele que se sai bem nos testes de inteligência ou que apresenta um desempenho intelectual superior. Entretanto, nas últimas décadas, diversos estudos têm contestado a noção de que o fenômeno das altas habilidades/superdotação estaria relacionado exclusivamente a um QI alto (ALENCAR & FLEITH, 2006). No que diz respeito à identificação desses alunos, a Teoria dos Três

Anéis, proposta por Joseph Renzulli, concebe altas habilidades/superdotação como resultado da interação de três fatores: habilidade acima da média, motivação (envolvimento com a tarefa) e criatividade. Especificamente com relação a criatividades, Renzulli aponta que são: (a) características do pensamento como fluência, flexibilidade e originalidade de pensamento, (b) fatores associados a tra-

ços de personalidade como abertura a novas experiências, curiosidade, sensibilidade e coragem de correr riscos e (c) características da produção dos indivíduos superdotados como inovação, riqueza de detalhes e abundância. As definições em alusão a inteligências são numerosas, não obstante, o modelo de Inteligências Múltiplas de Gardner se constitui uma das mais completas por defender uma concepção pluralista da mente, compreendendo variadas aptidões em contraponto a uma única habilidade. Gardner ilustra a inteligência como a capacidade de resolver pro-

As inteligências múltiplas de Howard Gardner Inteligência

Características

Habilidade de expressão; facilidade para se comunicar; aprecia a leitura; possui Lingüística ou amplo vocabulário; competência para debates; transmite informações complexas verbal com facilidade; absorve informações verbais rapidamente. Lógicomatemática

Facilidade para detalhes e análises; sistemáticas no pensamento e no comportamento; prefere abordar os problemas por etapas (passo a passo); discernimento de padrões e relações entre objetos e números.

Espacial

Sua percepção do mundo é multidimensional; facilidade para distinguir objetos no espaço; bom senso de orientação; prefere a linguagem visual à verbal.

Musical

Bom senso de ritmo; identificação com sons e instrumentos musicais; a música evoca emoções e imagens; boa memória musical.

Corporalcinestésica

Boa mobilidade física; prefere aprender “fazendo”; prefere trabalhos manuais; facilidade para atividades como dança e esportes corporais.

Interpessoal

Facilidade para comunicação; aprecia a companhia de outras pessoas; prefere esportes em equipe.

Intrapessoal

Reflexiva e introspectiva; capaz de pensamentos independentes; autodesenvolvimento e auto-realização.

Naturalística

Confortável com os elementos da natureza; bom entendimento de funções biológicas; e interesse em questões como a origem do universo, evolução da vida e preservação da saúde.

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blemas ou de elaborar produtos que sejam valorizados em um ou mais ambientes. Seus estudos foram sistematizados em sete formas de inteligências: lingüística ou verbal, lógico-matemática, espacial, musical, corporal-cinestésica, interpessoal e intrapessoal. Recentemente, foi incluída a inteligência naturalística (GARDNER, 1995, 2000). Deste modo, é imprescindível que a escola que atenda esses alunos procure conhecê-los em sua amplitude. Todo planejamento educacional tem maior validade e, conseqüentemente, leva aos melhores resultados na proporção direta em que é adequado às necessidades individuais, concretas, mediatas e imediatas de cada criança em particular. Sabemos que o trabalho individualizado é muito difícil de viabilizar na escola, principalmente com alguns tipos de alunos especiais. Neste caso, a segunda melhor opção é trabalhar com pequenos grupos de alunos, com algumas características em comum, buscando planejar a educação voltada para as necessidades e interesses desses grupos. O estudo cuidadoso e pormenorizado de cada criança que compõe o grupo de qualquer forma será sempre a referência básica para se estabelecerem planos educacionais, GUENTHER, 2003, 2006. Cabe ao professor trabalhar junto com seus alunos na busca constante de desenvolver competências, habilidades e talentos. Nessa forma, os benefícios serão observados em todas as áreas, e todos aos alunos serão beneficiados, sejam eles com altas habilidades ou não, pois o enriquecimento em sala de aula irá favorecer o crescimento educativo de toda a turma. Bem como o respeito às necessidades dos alunos, o conhecimento de métodos e estratégias a serem implementados pelo professor tornam-se o diferencial no atendimento ao aluno com altas habilidades. O objetivo é viabilizar o sucesso do aluno com altas habilidades com

os outros colegas e com seus profes- tificar altas habilidades, Tese de Dousores, tornando-os companheiros de toramento. UFC. Ano de Obtenção: descobertas e aprendizagens signifi- 2005. cativas. ******** Referências Bibliografias: ALENCAR, E.M.L.S. & FLEITH, D. S. Superdotação: determinantes, educação e ajustamento. São Paulo: EPU, 2001 GARDNER, H. Inteligências múltiplas: a teoria na prática. Porto Alegre: Artmed, 1995. ________ Inteligência. Um Conceito Reformulado. Rio de Janeiro: Objetiva, 2000. GUENTHER, Z. C. Identificação de talentos: Recurso a técnicas de observação directa. Sobredotação, Braga, vol. 1, nºs 1 e 2, p. 7 – 36, 2000. GUENTHER, Z. C. O aluno bemdotado na escola regular: celebrando a diversidade, incluindo as diferenças In Escritos Sobre Educação Ibirité. v. 2, n. 1, p. 43-54, jun., 2003 RENZULLI, J. S. & FLEITH, D. S. O modelo de enriquecimento escolar. Sobredotação, Braga, vol.3, nº 2, p. 7 – 41, 2002. VIANA, T. V. Avaliação educacional diagnóstica: Uma proposta para iden-

*Andréia Serra Azul da Fonseca Possui graduação em Pedagogia e é especialista em Educação Especial pela UFC. Possui mestrado em Educação na especialidade de Tecnologia Educativa pela Universidade do Minho-Portugal; Atualmente Doutoranda em Educação na UFC. andreiasaf@yahoo.com.br / andreiasaf@hotmail. com

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Educação Bilingue: o início de uma nova luta Vilmar Silva*

Muito além do acesso ao conhecimento, a educação bilingue propicia a inclusão da comunidade surda na sociedade brasileira. Os defensores do bilinguismo propõem que a língua de sinais seja ensinada ao surdo, desde a infância, como primeira língua. Já a língua oficial do país de origem, utilizada pela maioria das pessoas que convivem com o surdo, deve ser ensinada como segunda língua. Assim, o bilinguismo privilegia a língua gestual, transformando-a em um instrumento de expressão e luta, em oposição à cultura dominante que trata o surdo como mero ouvinte. Nessa perspectiva, o professor Vilmar Silva discute em seu artigo a proposta de educação bilingue, considerada, pelo autor, como ponto de partida para a mobilização social e política de comunidades surdas.

O bilinguismo parte do princípio de que o surdo deve dominar, enquanto língua materna, a língua de sinais, que é a sua língua nativa, e como segunda língua a língua oficial de seu país. Nesse sentido, é de fundamental importância o convívio dos mais velhos, que dominem a língua de sinais. Além disso, se os pais forem ouvintes, há a necessidade de que eles aprendam a língua de sinais, preferencialmente no convívio com as comunidades surdas, para garantir um ambiente linguístico e cultural adequado à criança surda, tanto no contexto familiar como no social. Para Goldfeld (1997, p. 108), o ambiente linguístico deve ser o mais adequado possível à criança surda, para facilitar a aquisição da língua de sinais e evitar o atraso da linguagem e todas as suas consequências, em nível de percepção, generalização, formação de conceitos, atenção e

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EDUCAÇÃO BILÍNGUE

memória. E acrescenta que provavelmente “a língua de sinais será a língua mais utilizada na construção da fala interior e exercerá a função planejadora da linguagem, já que esta língua é mais fácil e natural para o surdo”. Entretanto, não podemos esquecer que, se por um lado, o oralismo e a comunicação total têm tido como principal objetivo a adequação dos surdos à realidade dos ouvintes, por outro lado, os projetos de educação bilíngue construídos com as comunidades surdas brasileiras não almejam essa adequação, porque o surdo, politicamente organizado, assume a surdez como uma diferença histórica e cultural. Portanto, a noção de que o surdo deve, a todo custo, tentar aprender a língua oficial de seu país em sua modalidade oral para poder se aproximar do padrão de normalidade colocada pelos ouvintes é rejeitada por estes projetos de educação bilíngue. Além disso, a luta histórica dos movimentos surdos é em prol do reconhecimento da língua de sinais no processo pedagógico. Isto é, os surdos, após o domínio secular do oralismo, passam a intervir na construção de projetos educacionais que tem como foco principal o reconhecimento de sua experiência visual. Porém, não significa dizer que a premissa de normalidade do surdo tenha desaparecido com a educação bilíngue. Muito pelo contrário, existem propostas de educação bilíngue que conservam a visão oralista em relação ao surdo. Essas propostas geralmente procuram deslegitimar as línguas de sinais, usando-as enquanto instrumento para a aquisição da língua oral. A compreensão que se tem é que as propostas bilíngues que tentam colocar em foco a língua majoritária sem refletir com as comunidades surdas elementos constitutivos de sua educação - tais como: qual o currículo a ser adotado na educação de surdos? qual deve ser a modalidade da

segunda língua, oral ou escrita? em que momento deve ocorrer a aquisição da segunda língua? - tendem a “ouvintizar” o processo de luta das comunidades surdas. Segundo Skliar (1997), as comunidades surdas que estão refletindo sobre essa temática divergem de projetos unilaterais e defendem um bilingüismo que reconheça o direito da aquisição e do uso das línguas de sinais, não para serem oralizados, mas para poderem participar com sua própria língua dos debates que circundam a sociedade atual, no mesmo nível de igualdade e de condições, porém reconhecendo sua singularidade e especificidade. O posicionamento político dos movimentos surdos tem demonstrado que não existe um projeto de educação bilíngue pronto e preparado para ser usado em qualquer parte do mundo. Neste sentido, Skliar (1997, p. 9) cita o pensamento de Paulo Freire, que é enfático em afirmar que nenhuma prática pedagógica pode ser transplantada: Uma mesma compreensão da prática educativa e uma mesma metodologia de trabalho não operam necessariamente de forma idêntica em contextos diferentes. A intervenção é histórica, é cultural, é política. É por isso que insisto tanto em que as experiências não podem ser transplantadas, se não reinventadas. Por essa linha de pensamento, não existe uma proposta de educação bilíngue que possa ser transplantada universalmente, o que existe são processos históricos e culturais que produzem diferentes projetos de educação bilíngue. Um outro ponto a ser analisado na educação de surdos, segundo a Federação Mundial dos Surdos (WFD), está relacionado com o alto percentual de surdos fora do ambiente escolar, ou seja, aproximadamente 80%, situação que se agrava ainda mais nos países do Terceiro Mundo. Este dado, para Skliar (1998), deve no mí-

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nimo fazer com que os educadores de surdos (surdos e ouvintes) reflitam para quem estão sendo pensadas as propostas de educação bilíngüe, e nos força a afirmar que a educação bilíngue, com seu projeto político-pedagógico, não deve se restringir apenas à escolarização de surdos. Ela precisa transcender o espaço escolar mediante políticas públicas que propiciem o desenvolvimento linguístico dos surdos em diversos ambientes, que articulem os movimentos surdos regional e nacionalmente, que coloquem os surdos, no mínimo, no contexto da classe trabalhadora, tanto no campo de educação profissional como de mercado de trabalho, etc. Porém, uma parcela representativa de profissionais que trabalham com surdos acredita que: a desigualdade não dependeria de uma privação cultural dos surdos, mas de uma limitação de oportunidades sociais e educacionais. Assim, se exagera o papel da escola, supondo que as restrições econômicas e socioculturais existentes podem ser modificadas e reformadas dentro da instituição escolar, com o objetivo de alcançar uma relativa igualdade (Skliar, S/D, p.11). Essa proposta humanista de educação bilíngue tenta resolver ingenuamente um problema social e histórico apenas no campo educacional, esquecendo-se de que não basta aos surdos terem acesso ao conhecimento, mas precisam também transformar esses conhecimentos em instrumentos de luta que combatam as relações sociais de dominação. A compreensão que se tem é que a educação bilíngue não pode ser vista apenas como um ponto de chegada, mas sim como um ponto de partida, cuja perspectiva política reflita as condições socioeconômicas, linguísticas e culturais dos próprios surdos. É um projeto que precisa ser construído com as comunidades surdas, para que os projetos políticopedagógicos de educação bilíngue

não se restrinjam apenas à implantação de escolas, mas que possam aprofundar e criar de forma massiva as condições “de acesso a la lengua de senas y a la segunda lengua, a la identidad personal y social, a la información significativa, al mundo del trabajo y a cultura de los sordos” (Skliar, 1997, p.7). Bibliografia GOLDFELD, Marcia. A criança surda: linguagem e cognição numa perspectiva sócio-interacionista. São Paulo: Plexus, 1997. SKLIAR, Carlos. A escola para surdos e as suas metas: repensando o currículo numa perspectiva bilingüe e multicultural. Porto Alegre: UFRGS, S/D. (Texto). ___________. Un análisis preliminar de las variables que intervienen en el proyecto de educación bilingüe para los sordos. Porto Alegre: UFRGS, 1997. (Texto). *Vilmar Silva Professor de Matemática do Centro Federal de Educação Tecnológica de Santa Catarina (CEFET/SC). Mestre em Educação na Linha “Educação e Movimentos Sociais” pela UFSC e doutorando em Educação na Linha “Educação e Processos Inclusivos” também pela UFSC. Atualmente coordenador da construção, na Grande Florianópolis, da Unidade Bilíngüe – Libras/Português – do sistema CEFET/SC. Maiores informações: www.sj.cefetsc.edu.br/~nepes ou vilmar@sj.cefetsc.edu.br.

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PUBLICAÇÕES UNDIME

CONTINENTE AFRICANO

MULHERES DE CORAGEM

A Revista Educação Municipal é uma iniciativa da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação – Undime. O projeto teve inicio em 1988 e, desde então, a Revista é um espaço para divulgação de trabalhos e artigos científicos de especialistas em educação. Fotos, entrevistas, agenda de eventos e prazos para adesões em programas e projetos do Governo, são as principais inovações da Revista, que conta ainda com espaços publicitários que serão vitrines de experiências de sucesso em todo Brasil.

Uma história que começou no continente africano, chegou ao Brasil e vem superando dores e preconceitos para dizer que a liberdade pode ser conquistada com criatividade e alegria, mas não existe sem frutos e sem pão, sem choça para morar, sem cachoeira para se banhar, sem amor, sem respeito, sem justiça social.

A bravura e a coragem de mulheres como Maria Thomázia e Elvira Pinho são ressaltadas numa linguagem simples e mostram que sempre houve, em nossa história, heróis e heroínas que se dedicaram à luta pelo respeito e pela dignidade, especialmente a pessoas menos favorecidas.

Todas as cores do Negro Arlene Holanda Editora Conhecimento 36 paginas

Vovó Anastácia e as mulheres guerreiras abolucionistas Francinete Azevedo Editora Imeph 20 paginas

Revista Educação Municipal Edição Undime 52 páginas

LEIS DA EDUCAÇÃO Leis da Educação é uma coletânea que reúne as principais Leis Estaduais e Federais voltadas ao setor. Leis da Educação é voltado a educadores e estudantes que, muitas vezes, desconhecem os direitos já conquistados, com respaldo em lei. Representa um estímulo a quem se inicia no magistério e aposta em uma

educação de qualidade e numa sociedade mais justa. A publicação, de fácil manuseio, promete, assim, combater o distanciamento das leis sobre educação, promovendo o acesso ao código que dá suporte a esse direito universal. Leis da Educação Artur Bruno www.arturbruno.com.br 490 páginas

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REPORTAGEM

Projeto Bila: Viva a leitura no Pirambu! Gabriela Meneses e Mayara de Araújo

Promover a inclusão digital aliada ao incentivo à leitura é a proposta da Biblioteca Integrada à Lan House (Bila). O projeto é uma iniciativa da Cooperativa de Tecnologia da Informação do Ceará - Pirambu Digital, empresa que desenvolve ações em Tecnologia da Informação e Comunicação no Pirambu, bairro que apresenta acentuados índices de vulnerabilidade social em Fortaleza, no Ceará. Em novembro de 2008, o projeto Bila alcançou projeção nacional, por meio da participação no Prêmio Vivaleitura, principal premiação que homenageia iniciativas de incentivo à leitura em todo o Brasil. No início, eram apenas ideias de um professor que queria transformar a sociedade através da Tecnologia da Informação. Aos poucos, elas amadureceram e ganharam o apoio de pessoas que desejavam ter sua realidade modificada. Foi assim que Mauro Oliveira, professor do CEFET, juntamente com jovens do Pirambu, bairro da capital cearense, começaram a desenvolver uma lan house, em que os moradores da comunidade pudessem acessar a Internet sem nenhum custo. “Surgiu, então, a idéia das pessoas pagarem com a leitura”, conta Mauro. Desse modo, instituiuse a seguinte regra: na Bila – Biblio-

teca Integrada à Lan House, paga-se uma hora de navegação na web com uma hora de leitura. De acordo com Mauro Oliveira, o projeto estimula o contato de crianças e adolescentes com os livros e com a tecnologia. A sala da Bila abriga estantes com livros, oito computadores conectados à Internet e uma mesa grande para acomodação das crianças leitoras. As estantes guardam aproximadamente 250 obras, que vão desde enciclopédias, dicionários até livros paradidáticos, doadas por particulares, escolas, Ongs, entre outros. Para possibilitar um contato harmônico dos usuários da biblioteca com os livros e com a web, foram criadas algumas regras de funcionamento. Segundo Lauristela Rodrigues, uma das monitoras da biblioteca, primeiro as crianças leem, depois elas utilizam o computador. “As crianças têm de ler, no mínimo, meia hora para ter acesso aos computadores”, conta Lauristela. Para dinamizar esta estratégia, além da leitura, os usuários produzem textos sobre a história que leram. Segundo a monitora, esses textos são corrigidos e arquivados para concorrerem a premiações de pequenos concursos, realizados dentro da própria Bila. “A premiação funciona como um incentivo à produção de textos”, explica Lauristela.

PARA CRIANÇAS E ADULTOS Maria das graças é uma das cerca de 20 crianças que freqüentam diariamente o Bila, e encontram no projeto um lugar de descobertas e aprendizados. Acompanhada de sua mãe ou sua prima, vai todas as manhãs. A quem pensa que a menina é um das leitoras assíduas da biblioteca, uma surpresa: Maria ainda não sabe ler. Ela tem apenas seis anos e, com a ajuda da monitora, desvenda, nos livros do Bila, suas primeiras palavras. A falta da leitura não chega a ser um obstáculo na hora de usar o computador, Lauristela Rodrigues liga a máquina, acessa os jogos online preferidos de Maria e a deixa à vontade. Com habilidade, a pequena aprende as cores, tingindo as roupas dos personagens da turma da Mônica. É com esta mesma esperteza que Maria das Graças pretende conquistar, de leitura em leitura, palavra a palavra, o sonho – decidido – de ser médica, ou melhor, pediatria. A prima de Maria, Francilane Rodrigues, tem 10 anos e é a autêntica frequentadora do projeto. Acompanha o Bila desde o início, quando sua prima, aluna do cursinho prévestibular ministrado na cooperativa, levou-a para passar algumas horas. Do acervo, Francilane já perdeu a

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REPORTAGEM

conta de quantos livros leu, dentre eles, clássicos cearenses como Iracema, de José de Alencar. Um dos aspectos interessantes do acompanhamento das monitoras durante o uso dos computadores é a educação para o universo digital. Quanto mais cedo as crianças forem orientadas ao uso consciente da internet, mais preparadas estarão para identificar sites e usuários que representam perigo. Francilane é um exemplo. Apesar de utilizar a rede para acessar blogs, fotologs e orkuts dos amigos, ela não possui Orkut. ”Só pode quem for maior de 18 anos, não é? Eu até tinha um, mas a monitora disse que não podia e eu também contei pra minha mãe e ela não deixou”, explica a garota. O alcance do projeto se expande, principalmente, por crianças como Francilane, que gostam do espaço, freqüentam e acabam levando amigos e parentes. No dia em que visitamos a cooperativa para a produção da reportagem, Francilane havia levado outras duas crianças, que visitavam o projeto pela primeira vez. Apesar de grande parte do público ser composto de crianças, os serviços da biblioteca não se restringem apenas aos pequenos. “O foco é nas crianças, mas a gente vê bas-

tante adulto vindo pra cá”, diz a monitora Lauristela Rodrigues. Ela conta que os adultos vão à biblioteca usar o computador para acessar sites de relacionamentos, fazer pesquisas e informar-se sobre concursos públicos. Segundo a monitora, eles também passam pela mesma regra das crianças: uma hora de leitura corresponde a uma hora de navegação na web. PRÊMIO VIVALEITURA: O RECONHECIMENTO DE UMA BOA INICIATIVA Em 2008, a Bila concorreu ao Prêmio Vivaleitura, principal premiação que homenageia iniciativas de incentivo à leitura em todo o Brasil. O projeto ficou entre os cinco finalistas na categoria “Bibliotecas Públicas, Privadas e Comunitárias”. De acordo com Mauro Oliveira, idealizador da Bila, o prêmio proporcionou à biblioteca um reconhecimento nacional. Para ele, toda essa divulgação auxilia no fortalecimento do desejo de implantar a Bila como uma política pública. “Uma ideia dessa era óbvio que o governo estadual e municipal deveriam apoiar (...) isso poderia ser política pública”, afirma. Segundo Mauro Oliveira, a biblioteca é uma iniciativa “barata, original e inteligente” que, para ser implemen-

tada, precisa apenas de um monitor incentivando as pessoas a usarem a internet de maneira benéfica e direcionando as leituras, que “pagam” o acesso aos computadores. A previsão, segundo Mauro , é de que o projeto seja implantado também em outras comunidades de Fortaleza que apresentam acentuados índices de vulnerabilidade social, como a praia do Titanzinho e o Conjunto Palmeiras. Serviço Biblioteca Integrada à Lan House (Bila) Rua Nossa Senhora das Graças, 1097, Pirambu - Fortaleza – Ceará Horário de funcionamento: 8h às 12h / 13h às17h. O serviço é aberto ao público.

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O EMBALADOR, O PROFESSOR E UM SONHO Gildenis Silva cursa administração na Faculdade Integrada do Ceará (Fic) e é diretor da Cooperativa Pirambu Digital, que comercializa serviços de tecnologia e beneficia cerca de 37 técnicos da comunidade. Há seis anos, contudo, jamais imaginara tal futuro. Em entrevista, perguntamos se presenciara muitas histórias de vida modificadas pela cooperativa. Gildenes nos responde com um convite: “Vou contar a minha”. O rapaz de apenas 24 anos, morador do Pirambu, era embalador de supermercado. Já havia prestado vestibular três vezes para Química e, em todas as tentativas, não obteve êxito. A chance de fazer um curso superior surgiu com uma parceria firmada entre o grupo LG Eletronics e o Centro Federal de Educação Tecnológica do Ceará (Cefet -CE), que custeou dois anos e meio de formação de 120 jovens do Pirambu aprovados no vestibular do Cefet. “Cursei

[Desenvolvimento de Softwares] mais pela facilidade, mas, quando entrei, percebi que, se tivesse feito Química, teria me frustrado”, admite Gildenis. Ele e outros 82 jovens do Pirambu já estavam quase no fim do curso quando o professor Mauro Oliveira apresentou a proposta de desenvolvimento da cooperativa. “Essa sala aqui estava cheia, tinha gente sentada no chão, eu lembro como se fosse hoje”, relembra Gildenis Silva. O espírito empreendedor despertado naquele dia fez-lhe abandonar dois empregos fixos para se dedicar ao projeto, que hoje é uma referência nacional em Tecnologia da Informação e foi selecionado para representar o Brasil em intercâmbio na Índia e na África do Sul. As conquistas mercadológicas, no entanto, não satisfizeram os sócios do empreendimento. “Queríamos que o projeto tivesse um pé no comercial e outro no social”, aponta Gildenis. Atualmente, a cooperativa beneficia indiretamente centenas de moradores por meio

de projetos que aliam baixo custo e promoção de oportunidades a crianças, jovens e adultos. Nas áreas voltadas à educação, ela oferta aquilo que tornou possível aos membros da cooperativa o futuro que hoje vislumbram: cursos preparatórios para o ingresso no Nível Superior. Disponibilizam ainda cursos de língua estrangeira, reforço escolar, além do projeto Bila, finalista do prêmio Vivaleitura 2008. Hoje, além de presidir a Cooperativa, Gildenis Silva auxilia o pai na microempresa de instalações hidráulicas da família. É dessa forma que pessoas como Gildenis , que um dia foram apenas jovens trabalhadores informais, retribuem a esperança que lhes foi ofertada. Para embalador, aprendizes e mestre, contudo, a história não termina aqui: iniciativas como a Cooperativa Pirambu Digital e seus projetos devem e podem se tornar políticas públicas. É comisto que sonham e para isto que trabalham.

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EDUCAÇÃO INDÍGENA

Conferências Regionais de Educação Indígena Clarrisa Tavares - jornalista*

Avaliar e melhorar a situação da educação indígena é uma luta constante do movimento indígena brasileiro. Segundo dados da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), existem atualmente no Brasil cerca de 460 mil índios, distribuídos em 225 sociedades. Com inúmeros obstáculos para educar suas crianças, estes povos enfrentam da ausência de material didático e merenda escolar a dificuldades de deslocamento e de adaptação dos estudantes ao ensino formal. O ano de 2009 será histórico para essa luta com a realização de 18 Conferências Regionais de Educação Indígena, culminando na Conferência Nacional. Em matéria originalmente publicada pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), a jornalista Clarissa Tavares, mostra o que foi discutido na primeira conferência regional, no Amazonas, e as próximas discussões.

FOTO: CLARRISA TAVARES

Madalena Custódio ressalta a importância da conferência.

Cerca de 350 professores, gestores escolares, lideranças indígenas e representantes governamentais e da sociedade civil se reuniram, de 15 a 18 de dezembro, em São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, para discutir a educação indígena na região. Esta foi a primeira etapa da Conferência Regional de Educação Escolar Indígena, fase preparatória para a Conferência Nacional de Educação Escolar Indígena, prevista para acontecer em setembro de 2009. O encontro em São Gabriel da Cachoeira foi o primeiro passo para a materialização da Conferência Nacional, que é uma reivindicação histórica do movimento indígena no Brasil. “É muito importante para as comunidades do rio Negro a realização dessa conferência aqui em São Gabriel. A gente vai poder avaliar a educação nos municípios e apontar caminhos que vão nortear as experiências no rio Negro”, destacou, durante o primeiro dia de encontro, a Baniwa Madalena Custódio, coordenadora do departamento de educação da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN). Esta primeira etapa reuniu cerca de 200 delegados e 100

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FOTO: CLARRISA TAVARES

Conferência Regional de Educação Indígena chama atenção de participante.

participantes, representando os 25 povos dos municípios de São Gabriel da Cachoeira, Barcelos e Santa Isabel, todos no rio Negro. Lá foram eleitos 38 delegados que participarão da Conferência Nacional. Durante as discussões, professores e gestores indígenas acaloraram os debates com posicionamentos e questionamentos aos representantes governamentais presentes. Como conciliar a educação formal com a educação diferenciada? O que deve ser avaliado no processo de aprendizagem? Como avaliar os alunos indígenas? Em que momento o aluno indígena deve aprender o português? Como ter uma educação de qualidade com a escassez de materiais didáticos e de recursos? Muitas das perguntas ficaram sem respostas, mas sinalizaram que o encontro está no caminho certo. “Nós, os próprios indígenas, estamos começando a construir o tipo de educação que que-

remos e o MEC [Ministério da Educação] está entendendo que tem que nos ouvir”, avaliou Madalena. DESAFIOS E PERSPECTIVAS Os desafios para a construção da educação escolar indígena de qualidade são muitos e diversos. Para o professor Roberto Carlos Fernandes Sanches, 21 anos, da comunidade indígena Dâw (pronuncia-se dôu), a maior dificuldade é a ausência de material didático na língua materna. Responsável por uma turma de 12 alunos de 5 e 6 anos da Escola Municipal Waruá, ele afirma que todas as crianças falam o dâw e para conseguir alfabetizá-las foi necessário que ele mesmo criasse cartilhas, apostilas e outros materiais na língua. “Um grande problema é que a gente não tem computador e nem uma pequena gráfica para reproduzir os materiais”, conta.

O acesso à comunidade Waruá, onde Roberto mora e trabalha, a três quilômetros de São Gabriel da Cachoeira, é feito somente de barco. Lá vivem 109 pessoas. Mesmo com dificuldades de deslocamento, Roberto cursa o magistério indígena no Pólo Hupda (uma parceria das secretarias municipal e estadual de educação para a formação de professores) e também o segundo segmento da educação de jovens e adultos. A dificuldade de deslocamento e acesso às comunidades é uma constante, já que grande parte delas encontra-se isolada pelo rio Negro. Segundo o professor Karapanã e membro da Comissão Nacional de Educação Escolar Indígena, Donato Miguel Vargas, é difícil trabalhar com a escassez de material e merenda escolar, que muitas vezes não chegam às escolas mais isoladas devido à distância e a falta de combustível. Porém, Donato reconhece que o bom professor é aquele que consegue improvisar enquanto os recursos não chegam. “Às vezes demora mais de três meses pra chegar material, então tem que trabalhar com material alternativo. Por exemplo, se não tem pincel, a gente faz tinta com óleo e urucum e escreve no papel madeira. Se não tem papel, escreve na areia...”. Apesar, do improviso, Donato sabe que apenas boa vontade não é suficiente para garantir o aprendizado. “Temos que fiscalizar a execução dos recursos”, pontua. Mais um desafio que se coloca para os indígenas é a adaptação dos alunos ao sistema escolar formal, pois, muitas vezes, eles precisam deslocar-se para outras localidades onde são oferecidas as séries mais avançadas e acabam despovoando suas comunidades de origem. Conta o professor Higino Pimentel Tenório, do povo Tuiuka, que mora na comunidade de São Pedro do Alto rio Tiquié, a 300 quilômetros da sede do município, que uma solução encontrada pela comunidade para tal dificuldade

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EDUCAÇÃO INDÍGENA

FOTO: CLARRISA TAVARES

Índios de várias etnias participam da conferência Regional do Amazonas.

foi a criação de um esquema próprio, em que os alunos passam 20 dias na escola e outros 15 dias na comunidade. “Optamos por esse sistema para não repetirmos o erro do internato e mantermos as afinidades desses alunos com suas comunidades e o vínculo familiar”, argumentou. LÍNGUAS INDÍGENAS São Gabriel da Cachoeira foi o primeiro município no Brasil a reconhecer três línguas indígenas como co-oficiais: tukuno, baniwa e ñhengatu, que são as línguas com maiores populações de falantes. Porém, no município que tem hoje cerca de 40 mil habitantes, sendo aproximadamente 90 % indígenas, muitas outras línguas são faladas no cotidiano das comunidades.

Fundada em 1668, São Gabriel da Cachoeira fica a 860 quilômetros de Manaus. Banhada pelo rio Negro, a cidade limita-se ao norte com a Colômbia e a Venezuela, numa região conhecida como a “cabeça do cachorro”, pela semelhança cartográfica. Boa parte do território fica no Parque Nacional do Pico da Neblina, considerada área de segurança nacional. PRÓXIMAS ETAPAS Ao todo, serão realizadas 18 conferências nas regiões, cuja divisão obedece ao critério dos territórios etnoeducacionais – agrupamento das terras indígenas, respeitando a territorialidade dos povos e suas redes de relações interétnicas. Os encontros regionais acontecem até agosto de 2009 e, em setembro, a Conferência

Nacional com cerca de 600 delegados. “Queremos garantir a participação de, pelo menos, um representante de cada povo indígena na etapa nacional”, afirmou Gersen Baniwa, coordenador da educação escolar indígena da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do Ministério da Educação. A próxima conferência regional ocorre de 10 a 13 de março, em Salvador, com os povos da Bahia, Alagoas e Sergipe. Em março, acontece ainda outra conferência: de 24 a 27 com os povos do Ceará, Paraíba e Pernambuco. *Matéria originalmente publicada pelo Conselho Indigenista Missionário - Cimi

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OBSERVATÓRIO

A definição de uma política de educação e a gestão escolar Casemiro de Medeiros Campos*

Como parte das modificações adotadas na revista Vida e Educação, inauguramos a seção Observatório. Nela, membros da sociedade civil deitam um olhar mais apurado sobre questões educacionais. O início de um novo ano é sempre um momento importante para a educação: além de significar o começo de matrículas escolares, 2009 coincide com a posse de novos gestores municipais na área. Preocupada com a conduta e as prioridades destes, sejam eles secretários de educação ou mesmo diretores de escolas e coordenadores pedagógicos, a VeE convidou para abrir este novo espaço de diálogo o professor doutor Casemiro de Medeiros Campos. Em seu artigo, ele enumera, comenta e sugere quais demandas devem ser supridas e quais iniciativas podem ser adotadas pelos gestores escolares neste início de uma nova etapa.

A definição de uma Política de Educação Municipal é uma tarefa exigente. Para o secretário municipal que conhece as dificuldades na educação do município, pode até parecer fácil, mas é um desafio para aquele que chega e tem pouca experiência na gestão da coisa pública. Para início das suas atividades, é necessário o estudo e o conhecimento da legislação básica na educação, especialmente a Lei nº 9394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional; da Lei do FUNDEB, dominando os meandros da sua aplicação; e do Plano Nacional de Educação. Assim, o secretário municipal de educação deve se atualizar constantemente com as orientações do cumprimento da legislação, principalmente a lei que determina os parâmetros para licitação e a responsabilidade de ordenação de despesa, como a Lei de Responsabilidade Fiscal. Que fique claro: o secretário de educação é ordenador de despesa da sua pasta, da sua secretaria. Será responsabilizado tanto pelo uso como pelo mau

uso dos recursos públicos, seja este último por erro ou por malversação. Mas é interessante destacar que a preocupação dos prefeitos, como gestores maiores dos municípios, requer respostas rápidas para os seus eleitores. Isso tem provocado uma pressão no secretariado por elaboração de um plano de gestão que gere impacto nos 100 primeiros dias do “novo” governo. Desse modo, a preocupação primeira do secretário municipal de educação será tomar ciência da sua realidade, tentando dominar os problemas que lhe chegam, que são muitos, e respondê-los com rapidez e êxito. Isso vai requerer um discernimento no conteúdo destes problemas e habilidade do gestor, além de cautela e zelo. Mas, passado este período de mapeamento da gestão municipal, as primeiras ações vão se concentrar na lotação dos gestores e professores. Quanto à escolha dos gestores, recomendo que a prioridade no acerto da opção entre um ou outro gestor é a correta nomeação dos coordena-

dores pedagógicos. Por que os coordenadores pedagógicos? A experiência tem colocado que, diante das novas referências no cuidado com a dimensão pedagógica na escola, o coordenador é a figura central para a organização da escola como espaço do trabalho escolar, ligado mais diretamente no apoio, no acompanhamento e no cuidado com o trabalho docente e a aprendizagem dos alunos. O trabalho do coordenador na escola é fundamental para animar, inovar e articular o projeto pedagógico da unidade escolar. A figura do diretor é relevante, mas a direção no dia-a-dia terá preocupações de caráter mais genérico com a administração da escola, as tarefas burocráticas, a manutenção da infra-estrutura e o suporte humano e material da escola, essas atividades são responsabilidades que fogem do conteúdo pedagógico. Por isso, sem desmerecer a atividade de direção, o grupo gestor deve ser visto como uma unidade na diversidade. Todas as figuras que o compõe

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são importantes, mas o coordenador pedagógico tem obrigações que são estruturais no conteúdo da escola como um todo: a parte pedagógica, didática, metodológica no processo de ensino e aprendizagem. É o coordenador pedagógico que garante o ritmo da composição da governança do trabalho escolar. Outra sugestão que acredito ser necessária é a definição no plano de governo na secretaria municipal da educação acerca de um programa de formação continuada para os professores. Esse programa deve ser elaborado verificando o conteúdo da avaliação dos professores e possibilitando a inclusão do corpo docente nas atividades formativas ao longo do período letivo e nos recessos escolares. O recesso é para os alunos, mas os professores podem e devem nos termos da lei ser convocados para o investimento na formação continuada. Esse programa deve oportunizar a atualização e a formação dos professores por meio de cursos de curta duração, seminários, encontros e congressos. Os temas atualmente

mais requisitados para a formação de professores são: a alfabetização e a leitura; as questões referentes à educação inclusiva e o trabalho com a criança pequena na educação infantil e na creche. A escola, através dos gestores, pode também definir um plano de formação continuada tendo em vista as necessidades dos seus professores. Com o uso das novas tecnologias e a educação à distância, os grupos de estudos são cada vez mais frequentes nas escolas, o que permite uma flexibilidade imensa nos horários e atividades formativas. O programa de formação docente pode ser inaugurado com a promoção da abertura do ano letivo com a realização da Semana Pedagógica. A Semana Pedagógica, dentre as suas finalidades formativas, tem a função de motivar os professores para o trabalho pedagógico que se inicia com o ano letivo. A programação, os temas, os conferencistas, o material e até o local devem ser muito bem cuidados para os participantes perceberem o tom da organização e seriedade da “nova” gestão.

Mas o trabalho do secretário municipal de educação é tarefa hercúlea. Os princípios da gestão escolar indicam que é necessário focar ações. Isso implica a definição de prioridades, sobretudo, considerando a escassez de recursos. É recomendável que o secretário municipal de educação, com a sua equipe pedagógica, estudem, analisem e reflitam sobre os indicadores de educação no município, como o Sistema de Avaliação da Educação – SAEB e o Índice de Desenvolvimento da Educação – IDEB, e definam metas e ações para cada ano da gestão com a finalidade de erradicar o fracasso escolar. É prioridade para a atuação do gestor, no seu primeiro ano de mandato, uma atuação imediata com plano de ação para redução do fracasso escolar: reprovação, repetência, evasão e abandono escolar a partir dos indicadores acima referidos. A qualidade na educação pode ser resumida em fazer o aluno aprender. Portanto é dever dos professores promover a aprendizagem dos alunos. Neste sentido, os profes-

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OBSERVATÓRIO

sores devem ser despertados para a consciência crítica do seu saberfazer docente. Auto-analisar as suas atividades e planejar as suas aulas a partir dos resultados das avaliações dos alunos é pressuposto para a melhoria da qualidade do ensino. Logo, é de grande utilidade o cruzamento de informações como os resultados das avaliações do município em educação para daí se ter a definição dos caminhos a serem abertos pelo planejamento estratégico. O planejamento estratégico permite um trabalho de gestão por projetos, o que se media didaticamente com o pedagógico na escola com a pedagogia de projetos. O novo gestor deve aproveitar a oportunidade da sua chegada e promover choque na gestão. Abandonar as velhas práticas clientelistas, corporativistas, burocráticas e cartoriais. Uma gestão responsável tem que superar estas práticas, modernizar o aparelho público, dotando-o de transparência, com recursos humanos qualificados, desburocratizando os processos e facilitando os enca-

minhamentos. Lembro ainda que, neste início de ano letivo, o início da gestão coincide com o período de matrículas. As matrículas devem ser incentivadas. Assim, uma campanha para o aumento das matrículas, considerando os princípios do FUNDEB, implicará a ampliação das receitas na educação do município. As orientações anteriormente referidas têm por objeto apenas orientar os gestores para uma gestão responsável e de qualidade, que tenha como finalidade a melhoria da qualidade da educação escolar, da escolaridade e dos níveis de aprendizagem das crianças e dos jovens. Muito ainda há que ser feito em educação e nas escolas para que a qualidade destas chegue a indicadores do mais alto nível e possibilite levar o nosso povo, num país marcado pelo abissal e profundamente injusto desnível social, à cidadania. A conquista da melhoria na qualidade da educação terá uma repercussão imediata na democratização da vida social e na politicidade, o que trará um malestar às elites. As elites não têm sa-

ídas, os avanços das reivindicações sociais se transformaram em ganhos sem retorno para a democracia no Brasil. Assim, com uma educação melhor, ganham todos.

*Prof. Casemiro de Medeiros Campos Faz doutoramento no Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Ceará – UFC, é mestre em educação/UFC, professor, pesquisador na área de formação de professores, gestor e consultor em educação. Publicou pela Editora Vozes Saberes Docentes e Autonomia dos Professores, 2007 e pela Editora da UFC Educação: Utopia e Emancipação, 2008. home page: www.casemiroonline.com.br E-mail: casemiroonline@casemiroonline.com.br

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OPINIÃO

Políticas públicas para uma Educação articulada Francisco das Chagas Fernandes

O Brasil é um país de natureza federativa por cooperação, com trajetória socioeconômica marcada, ao longo de décadas, por fortes desigualdades sociais e regionais e por acordos, firmados no campo político para o desenvolvimento da educação, que sempre estiveram na contra-mão do equilíbrio gerencial de um processo de planejamento educacional sistêmico e da valorização dos profissionais da educação. A despeito dos avanços nos Marcos Legais com a Constituição Federal de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e o Plano Nacional de Educação – PNE, que definem as bases de um Sistema Nacional de Educação, articulando os sistemas de ensino federal, estaduais, do Distrito Federal e municipais com autonomia, responsabilidades próprias e competências comuns, o país ainda não consolidou as condições para a implementação de uma política pública articulada e eficaz na efetivação do direito à qualidade social da educação para todos (as). Recentemente, após um amplo

debate desenvolvido na Conferência Nacional de Educação Básica – CONEB, a discussão sobre sistemas educacionais passou a considerar novos aspectos além daqueles minimamente aprofundados no contexto do financiamento, da gestão democrática e da qualidade social da educação. Dentre esses aspectos, a avaliação do atual Plano Nacional de Educação e a instalação da discussão do próximo plano decenal, por meio de seu diagnóstico, diretrizes e estratégias de ação, em um ambiente de construção do Sistema Nacional Articulado de Educação. Esse tema, título da Conferência Nacional de Educação – CONAE, tornou-se, portanto, um imperativo do momento histórico atual da educação brasileira e uma decorrência das deliberações da CONEB. O debate nacional sobre Educação, envolvendo a sociedade civil, sob a coordenação de uma comissão nacional instituída pelo MEC, deve se pautar por alguns princípios norteadores com o propósito de consolidar a visão de que a Educação precisa ser concebida de forma sistêmica, sem hierarquias ou fragmentações entre os níveis de ensino. Para tanto, é necessária a mobilização dos segmentos sociais para um amplo debate educacional em uma perspectiva inclusiva e de desenvolvimento social; a definição de diretrizes e estratégias

para o Plano Nacional de Educação; a criação de uma pauta social geradora de referências para um projeto de educação e de parâmetros para a ação programática do Estado no setor e a eleição da Educação como eixo central de um projeto de nação. A consecução desses princípios, certamente, dependerá de uma ampla parceria para o estabelecimento de compromissos mútuos, num processo que culminará com uma Conferência Nacional da Educação, necessidade expressada pela grande maioria das entidades representativas que participaram da Conferência Nacional de Educação Básica. A dinâmica da CONAE prevê Conferências municipais e/ou intermunicipais, estaduais e nacional. As primeiras acontecerão no primeiro semestre deste ano. Há uma conjuntura bastante favorável que facilitará o debate acerca do Sistema Nacional Articulado de Educação: o início da administração de novos gestores e a possibilidade de discutir, em âmbito local, políticas de educação. Estes dois fatores somados trarão importantes subsídios para o debate nacional, que certamente irão agregar consistência e forma à articulação do sistema nacional de educação. Francisco das Chagas Fernandes* Secretário Executivo Adjunto do MEC e professor da rede estadual do Rio Grande do Norte.

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Formando novos olhares para um novo mundo A Editora IMEPH no compromisso de desenvolver nas crianças e nos jovens o prazer de ler e escrever criou o Projeto Nas Ondas da Leitura, com a participação de autores locais, nacionais e de renome internacional, ampliando a Formação Continuada de Professores nas diversas modalidades de ensino, contribuindo assim para uma sociedade participativa, reflexiva e cidadã.

hila Os alunos do Cabo recebendo a moc do projeto Nas Ondas da Leitura

s de Camocim. Apresentação de trabalhos dos aluno Autor autografando para os alunos

do Eusébio

“O projeto Nas Ondas da Leitura envolve a criança na felicidade de ler e escrever, plantando uma semente que na vida inteira se manterá e se preservará.” Celso Antunes ativa Sensibilização da comunidade educ ra leitu a tivo incen de osta para a prop

Literatura Infanto-Juvenil

Na culminância do projeto Nas Ondas da Leitura, na cidade de Cabo de Santo Agostinho - PE

Leitura e Escrita

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