Revista NOIZE #34 - Junho de 2010

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FESTIVAIS INDEPENDENTES //045

FESTIVAIS INDEPENDENTES EM DEBATE O que é preciso para se fazer um festival? Bandas, lugar, estrutura, equipe técnica, público—e dinheiro, muito dinheiro. Por causa deste último, durante muito tempo festivais de música estiveram restritos a grandes capitais, principalmente no eixo Rio de Janeiro-São Paulo. Graças à ótima safra recente da música brasileira, a muito trabalho e organização, eventos de grande porte, com estrutura decente e público numeroso tomaram forma em recantos outrora inexistentes para a música independente. Não sem levantar uma discussão das brabas, tão complexa quanto necessária.

O cerne da questão é, também, o que desencadeou a recente discussão: pagar ou não pagar as bandas que tocam nos festivais? A questão eclodiu a partir de uma entrevista ao site O Inimigo, em que Pablo Capilé, vice-presidente da ABRAFIN (Associação Brasileira dos Festivais Independentes) afirma defender, dentro da instituição, o não-pagamento de cachê para artistas que toquem em festivais produzidos pelos afiliados da mesma. A afirmação é embasada pelo paradigma do Artista Igual Pedreiro+1 e pela crença de que um festival é como uma mostra, uma “feira de bandas”. Deveria basear-se nesse aspecto a aceitação do ponto de vista pela massa que, n’O Inimigo e em outros sites que ecoaram a polêmica+2, postou comentários discordando de Capilé. Para muitos, o fato de as bandas serem o primeiro elemento a aparecer na enumeração que iniciou este texto indica a prevalência dela sobre os demais na hora de se alocar dinheiro—ainda mais porque alguns festivais são realizados com verba pública. Um ponto de vista recorrente nos comments acusa a lógica de acabar com o valor artístico, numa espécie de analogia entre o contingente de bandas dispostas a tocar em festivais e o exército de reserva da primeira revolução industrial: os festivais triunfarão enquanto houver gente disposta a tocar por pouco. Para pensar de forma desbitolada, todos os

lados da discussão podem se beneficiar ao considerar que: (1) festivais não são a única modalidade de show para qualquer banda independente, pequena ou grande, (2) mas constituem, principalmente para as pequenas, um importante “empurrão”; (3) artistas grandes são necessários para qualquer festival que se preze (para além do “show de calouros”), ainda que a grandeza, passe por uma lente subjetiva; (4) todo mundo precisa sair ganhando de alguma forma. O que problematiza, dramatiza e engessa a discussão é a oposição apaixonada que se estabelece entre alguns músicos e produtores. Jornalistas dividem-se no entorno, mas o circo pega fogo pelas fagulhas que trocam quem afirma querer fomentar e quem afirma ser a parcela realmente digna de fomento de todo o processo musical. Mais ainda: há desde alguns meses uma outra discussão que diz respeito ao funcionamento interno das instituições envolvidas, a ideologia de seus membros e outras questões que não nos interessam. Nosso objetivo com este texto—e, principalmente, com o singelo infográfico que o sucede—foi apresentar para o público menos informado (e/ou interessado) alguns pontos da discussão presente em grandes sites e blogs de música brasileiros. Junto disso, nosso desejo de que, não sem muito debate, isso tudo se resolva numa boa, com muita música.

[+1] Artista Igual Pedreiro é o nome do primeiro disco da Macaco Bong e um conjunto de ideias endossadas por Capilé, Fabrício Nobre e diversas outras pessoas, ligadas ou não ao Circuito Fora do Eixo, segundo as quais vivemos um momento em que o artista deve se envolver em diversas outras etapas do processo de produção musical, e não apenas na elaboração de sua arte. [+2] No site screamyell.com.br, dois posts têm sido palco de grande repercussão pública em torno do assunto: o entrevistão com Romulo Fróes e a carta aberta de João Parahyba.


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