No Entanto #57

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noentanto 57 Jornal Experimental do 4º período de Jornalismo - Ufes, Vitória - ES Dezembro de 2011

modelos na

maturidade pág. 8


Opinião

Na coxia do jornalismo

“N

ossas ideias iniciais sobre o Corpo de Bombeiros mudaram de sentido ao nos depararmos com a gigante estrutura que abriga a corporação. São muitos batalhões, companhias, ideias, projetos e funções, o que dificultou, a princípio, o direcionamento da nossa matéria. Encantadas com o trabalho desenvolvido pela instituição, confessamos que foi muito difícil escrever de forma totalmente independente. Mas depois de muitas visitas, recepções atenciosas e outras nem tanto assim, concretizamos nosso trabalho, felizes com a sensação de dever cumprido fechando o ciclo de nossas publicações no No Entanto.

Daiane Delpupo Jéssica Romanha

Reportagem Astrid Malacarne Esther Radaelli Daiane Delpupo Eduardo Dias Fábio Andrade Henrique Montovanelli Inglydy Rodrigues Izabelly Possatto Jéssica Romanha Leonardo Ribeiro Leone Oliveira Maíra Mendonça Rhayan Lemes Thaiana Gomes Viviane Machado

Em dezembro de 2011 a página do Facebook de Mark Zuckerberg, criador dessa rede social, foi invadida por hackers, que copiaram e divulgaram 13 fotos de Mark em momentos íntimos. O empresário aparece em casa, cozinhando, acompanhado de sua namorada, de seu cachorro, de seus amigos. Agilidade de informações, interatividade, estabelecimento de novas relações entre os indivíduos e o mundo. Essas são algumas características que tornam as redes sociais um fenômeno do século XXI. O fato de estarmos conectados vai além do desejo de participar das redes. É uma necessidade que se impõe para muitos como forma de se manterem atualizados, de participarem e interagirem dentro dos próprios grupos em que se inserem. o postarmos fotos, participarmos de grupos ou simplesmente “curtirmos” algo que gostamos, permitimos que todos tenham acesso à nossa privacidade. No entanto, casos como os de Mark nos fazem pensar até que ponto as redes sociais são capazes de interferir em nossas vidas. Qual o nosso real controle sobre esse processo, já que nem o próprio criador do facebook foi capaz de escapar da astúcia dos hackers? É preciso estar atento à linha tênue que há entre a liberdade de expressão proporcionada pela internet e a invasão da vida alheia.

Maíra Mendonça

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perfil de Lourival Pimenta foi um desafio. Parti para apuração com um telefone, sem nome e a tarefa de procurar um vendedor de pão de queijo de Vitória. Após várias ligações descobri que, na verdade, eram diversos comerciantes na capital, mas havia um apenas que incluía a Ufes em suas vendas diárias, era Lourival. Feito essa descoberta bastava apenas encontrá-lo, e isso levou duas manhãs de buscas pelas áreas do CCJE e o resto da semana de entrevistas, convivência, fotos e, é claro, muito pão de queijo. Foi uma matéria que exigiu muita conversa, pois o entrevistado era tímido e o tempo e as entrevistas é que o levaram a contar um pouco mais de sua trajetória.

A matéria de capa desta quarta e última edição fala sobre ser modelo na terceira idade. Para ilustrar o tema, contamos mais uma vez com o belo trabalho do estudante de Artes Visuais Bruno Bissoli. Outro destaque é a matéria de Amanda Meschi, aluna do 1º período do curso. Seu texto foi escolhido entre todos os alunos da turma, a partir de uma entrevista coletiva com o cineasta Vitor Graize. Abrimos espaço para que os recém-chegados experimentem a sensação de ver sua primeira matéria publicada. Afinal, também tivemos essa oportunidade quando éramos calouros. Um semestre se passou e aquela ansiedade do início se transformou na sensação de dever cumprido. Da reunião de pauta à revisão final, fomos repórteres, editores, diagramadores e alguns até ilustradores. Em pouco mais de quatro meses vivemos a rotina de uma redação e nossa primeira experiência com impresso. Agradecemos a todos que nos ajudaram, a prestatividade das fontes, o carinho e as críticas dos leitores. Descobrimos, na prática, que jornalismo dá trabalho, mas é gratificante poder levar informação bem apurada adiante. É desnecessário falar que sempre podemos melhorar, mas agora temos certeza: estamos no caminho certo.

no entanto...

despedida

no entanto...

Edição

Diagramação

Gráfica

Any Cometti Esther Radaelli Fábio Andrade Jéssica Romanha Izabelly Possatto Leonardo Ribeiro Rafael Freitas Thaiana Gomes

Esther Radaelli Daiane Delpupo Inglydy Rodrigues Isabella Mariano Izabelly Possatto Jéssica Romanha Maíra Mendonça Rafael Freitas Rhayan Lemes Thaiana Gomes Viviane Machado

Gráfica Universitária

Ilustração de capa Bruno Bissolli

Tiragem 1000 exemplares

Professora Orientadora Daniela Caniçali

Projeto Gráfico Esther Radaelli Isabella Mariano

Izabelly Possatto

expediente O No Entanto é um jornal laboratório produzido pelos alunos do 4º período do curso de Comunicação Social - Jornalismo, da Universidade Federal do Espírito Santo. Av: Fernando Ferrari , 514, Goiabeiras /Vitória-ES CEP: 29075-910

Sugestões? jornalnoentanto@gmail.com Curtiu? facebook.com/noentanto Dezembro de 2011


o negócio é mineiro Muitos são os que circulam pela Ufes e têm boas histórias para contar. Um deles é Lourival Pimenta, vendedor ambulante que oferece mais do que pão de queijo

por Izabelly Possatto Foto: Izabelly Possatto

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sair do seu prédio e ir até a cantina. ourival Pacheco Pimenta, 48 anos, é presença O pão de queijo de Lourival custa R$1,50 e há constante na Ufes. Mais especificamente no três sabores: tradicional, goiabada ou calabresa - o Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas mais procurado. Os clientes, assim como Lourival, são (CCJE). Vendedor de pão de queijo, Lourival tem uma descontraídos e brincalhões. Alguns insistem em pedir rotina que começa cedinho: todas as manhãs ele e sua aquele desconto ou até querem levar pão de queijo de esposa Elza fabricam o que ele irá vender durante o dia. graça. Em terras mineiras, o vendedor era pintor. Por falta Aline, Ariane, Nathália e Ronaldo, estudantes da unide serviço, ele e Elza resolveram aceitar o convite do versidade, são clientes de Lourival desde 2008. Durante sobrinho e buscar novas possibilidades de trabalho no a entrevista, não abriram mão de piadas e brincadeiras Espírito Santo. Ao chegar em solo capixaba, surgiu a com o vendedor, confirmando a popularidade dele com chance de comercializar o pão de queijo. Lourival sentiu os clientes. Eles dizem que o comerciante é simpático e que havia uma demanda do produto em nosso estado. que seu pão de queijo é mais barato que o da cantina, Segundo ele, aqui “o pão de queijo não pode faltar”. que custa R$1,80. Eles garantem que São oito anos exercendo a protambém é mais saboroso. fissão. Inicialmente, Lourival vendia Mas não é sempre que Louripão de queijo em diversos pontos de val tem as vendas movimentadas. Vitória. Ele tentava abranger a maior A chuva muitas vezes atrapalha o área possível e por isso circulava sem negócio, e mesmo rodando de prérota determinada. Isso o deixava sem dio em prédio ele não consegue clientela certa. vender tanto quanto em dias de sol. Um dia o vendedor aproximou-se dos portões da universidade e notou Lourival Pimenta, 48 anos “Atrapalha as vendas mas dá para levar os negócios”. É nesse momento a quantidade de pessoas que circulaque ele conta com a fidelidade dos vam. Previu o potencial de vendas do clientes. Quem compra com frequência ajuda a evitar campus e estava certo. São sete anos comercializando o prejuízo. pão de queijo na Ufes, sempre nos mesmos centros, o Lourival pensa em melhorar de vida e diz querer fique o ajudou a conquistar consumidores fiéis e a ser car rico um dia. Ele fala da vontade de construir uma notado por quem passa. Seus clientes são na maioria casa para a família e montar seu próprio negócio - gosestudantes e servidores. Ele chega por volta de 8h30, taria de ter uma cantina na Ufes. Mas no momento já passa pela Prograd e inicia suas vendas no prédio do se sente feliz por ter conseguido comprar um carro de curso de Serviço Social, onde já há algumas pessoas à presente para a mulher - já que ele mesmo não sabe espera. Uma delas é Rayara Fernandes, que compra o dirigir. produto todos os dias pela praticidade de não precisar

“o pão de queijo não pode faltar”

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Qual será o fim do

filme ?

Foto: Henrique Montovanelli

por Eduardo Dias Henrique Montovanelli

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Videolocadoras que ainda sobrevivem perdem clientes para as lojas on-line e precisam se reinventar

irataria e download ilegal de filmes é crime. Em ambos é baixa a qualidade de vídeo e áudio. Comprar DVDs piratas pode financiar o tráfico de drogas. Esse discurso influencia muitos a continuar locando filmes. Mas com os recentes serviços online, as videolocadoras começam a sentir o peso dessa concorrente que oferece mais títulos e preços mais acessíveis. As promoções chamam atenção. Mensalidades inferiores a R$20, filmes em alta qualidade para download ou para assistir ilimitadamente online e entrega de DVDs em domicílio. A mensalidade é menor que o valor de três locações nas principais videolocadoras da Grande Vitória - que cobram em média R$7 por um “lançamento”. O pacote mais vendido da NetMovies custa R$14,99 mensais e disponibiliza cinco mil filmes e séries online, além de quatro DVDs entregues em casa, entre seus 35 mil títulos. Sua principal concorrente, a americana Netflix, chegou ao Brasil em setembro oferecendo o serviço online. Nos EUA, onde também faz entrega em domicílio, a Netflix contribuiu para o fechamento de muitas locadoras. Para enfrentar a pesada concorrência da pirataria e

do download ilegal, as videolocadoras vêm buscando alternativas para sobreviver. A Companhia do Vídeo, que possui cerca de quatro mil títulos e está localizada há 15 anos na Praia da Costa, inaugurou em janeiro lanchonete, sorveteria e açaíteria dentro da loja. Transformou-se em um point na região. Não recuperou as locações, mas manteve a clientela e tornou o negócio viável. “Trabalhar só com locação de filme já é inviável. Ninguém hoje abre só locadora. As que já existiam estão se reinventando”, afirma Guilherme Neto, 49, dono da locadora. A família de Albano Lopes, 50, continua frequentando a Companhia do Vídeo, mas agora para tomar sorvete e açaí. Recentemente ele adquiriu uma TV com acesso à internet com serviço da NetMovies gratuito até o fim do ano, por isso parou de locar filmes. “Comprei a televisão com internet e estou gostando bastante. A imagem é excelente. Posso ver o filme que quiser e quantas vezes quiser”. Analisando a comodidade e os custos, ele pretende assinar um plano da NetMovies assim que acabar o período experimental. As locadoras tradicionais, entretanto, possuem a vantagem de obterem mais cedo os “lançamentos”,


categoria mais procurada. Há o prazo mínimo de dois anos para um filme ser liberado digitalmente para download. Ou seja, pelas locadoras online hoje, só é possível acessar aos filmes lançados até 2009. Mas isso não vale para a entrega em domicílio, que corresponde a cerca de 80% dos serviços utilizados pelos clientes da NetMovies, por exemplo. No Espírito Santo essa opção está disponível até o momento para Vitória, Serra, Cariacica e Vila Velha. Além da NetMovies e da Netflix, há ainda Saraiva Digital, Terra TV Video Store, Muu (Globosat) e as “on demand” das TVs por assinaturas Net (Net Now) e Sky (Sky On Demand). Todas possuem serviços específicos para filmes, séries e shows. Guilherme acredita que elas não serão “a” concorrente, mas sim mais uma, juntamente com a pirataria, os downloads e outras formas de entretenimento. “Penso que as videolocadoras vão acabar ou reduzir bastante, como as lojas que vendem vinis, que hoje são poucas e para um público bem específico”. Sobre a falência do ramo, ele reclama: “as produtoras estão vendo o negócio acabar e não fazem nada, não abaixam o preço dos filmes. Só a Warner (Bros) que há muito tempo abaixou pela metade”. Em média, um DVD destinado à locação custa R$100 e o Blu-ray, R$90. Para ele começar a lucrar com o investimento, são necessárias em torno de 15 locações por unidade. Há títulos que chegam a custar R$160. E os DVDs? O formato DVD pode ter um futuro similar ao vinil ou CD, que antes da era dos downloads vendia muito mais. Erly Vieira Jr., 34, professor do curso de Comunicação Social da Ufes, entende que o DVD pode ter uma sobrevida ainda menor que o CD, por não possuir uma estética mais trabalhada, como os encartes, fator que ainda influencia nas vendas dos CDs. Mas isso não vale para os Box e DVDs de filmes lançados em edições para colecionadores estratégia cada vez mais aproveitada pela indústria. Com relação aos serviços online, Erly prevê que “quando tiverem capacidade para operar em larga

Os filmes podem ser assistidos no computador, tablet, smartphone com Android, TV com internet e TV sem internet com consoles PlayStation 3, Wii e Xbox 360. Mas é necessário uma boa conexão, com velocidade preferencialmente superior a 1 Mbps.

escala (maior acesso à banda larga), mais pessoas poderão baixar filmes e com mais facilidade”. Quando, há nove anos, a Serra Vídeo Locadora abriu as portas no Centro da Serra enfrentava a concorrência de cerca de oito locadoras. Hoje é a única na região. Wanderley Gavassoni, 48, dono do empreendimento que possui 600 clientes “ativos” - são cerca de dois mil cadastrados - e quatro mil filmes, diz ter começado a sentir grandes perdas há aproximadamente três anos. “Eu tinha uma receita média de R$ 18 mil por mês. Hoje é de R$ 6 mil”, lamenta. Para mantê-la aberta, ele tomou medidas diferentes das de outras locadoras. Depois que o filme sai do cinema, espera cerca de cinco meses para efetuar a compra para que o valor fique mais em conta. Os lançamentos chegam mais tarde à sua locadora, mas ele consegue alugá-los por apenas R$ 3,50. Além disso, ele liga para os clientes para divulgar sorteios de TVs, bicicletas e filmes. Segundo ele, 50% do lucro vem dessas estratégias de marketing. “Se não fosse isso já teria quebrado”. Apesar das dificuldades do mercado, Wanderley não planeja mudar de ramo e seu aluguel já está pago até 2015. Se depender de clientes como Miguel Borges, 20, e Ricardo Bastos, 35, empreendedores como Wanderley e Guilherme podem continuar no ramo. Miguel loca cerca de três filmes por semana na Serra Vídeo Locadora e entende que ainda é baixa a qualidade de filmes por download ou piratas. “A locadora oferece vantagens pela variedade e pelo combate à pirataria”. Já Ricardo, que nem conhecia as videolocadoras online, diz não ter a menor paciência para procurar filmes na internet. Além disso, gosta do vínculo que criou com as funcionárias da loja para indicações. “Para mim é muito mais cômodo. Com quem eu vou conversar na internet para saber se o filme é bom? Na locadora confio na Ingrid e na Rita, que são minhas amigas”, explica porque continua locando cerca de seis filmes por semana na Companhia do Vídeo.

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Antiga, mas ainda querida Mesmo com os avanços tecnológicos, ainda há quem recorra à nostálgica máquina de escrever

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don íra Men Foto: Ma

Foto: Bru nella

Simões

por Maíra Mendonça Viviane Machado

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século XXI é a era da tecnologia. Celulares, computadores, câmeras digitais videogames e tantos outros aparelhos tecnológicos tomam conta de nosso cotidiano e fazem com que estejamos sempre à procura de algo novo. E o “novo” se torna cada vez mais convencional, enquanto o “antigo” por vezes é visto como inusitado. É nesse contexto que ainda perdura um antigo instrumento mecânico para escrever. Criada no início do século XIX (1808), a máquina de escrever ou máquina datilográfica sobrevive. O jornalista Leonel Ximenes, 46 anos, é editor de Opinião do jornal A Gazeta e recebe em média duas cartas escritas à máquina por mês. São leitores que ainda não se adaptaram aos novos meios de comunicação. Leonel acha válido que se manifestem por meio de cartas datilografadas: “é um esforço que fazem para ter sua opinião publicada”. O médico pneumologista e professor da Ufes Alípio César Nascimento, 66 anos, não abre mão da máquina de escrever. Em seu consultório, ele a utiliza para preparar as receitas dos pacientes. Ainda antes de iniciar os estudos de Medicina, doutor Alípio fez um curso de datilografia. Desde então, não abandonou a máquina. “Não gosto de ficar olhando para o computador enquanto converso com meus pacientes, por isso prefiro fazer receitas rápidas na máquina de escrever”.

Mas o médico já tem dificuldades para comprar as fitas com tinta, necessárias para que a máquina funcione - ele ainda encontra na loja Gecore, em Vitória. O conserto fica a cargo de um conhecido, que conserta sua máquina há anos. “Já estou me preparando para quando tiver que abandoná-la”, brinca. O jornalista e diretor regional do Serviço Social do Comércio (Sesc), Gutman Uchôa de Mendonça, 80 anos, conta que foi sua irmã Daoulah quem o ensinou a mexer na máquina de escrever. Aos 11 anos, Gutman já sabia escrever em uma velha Continental de seu pai, na época dono do jornal “O Norte”, em São Mateus. Gutman escreve para o jornal A Gazeta desde março de 1952 e afirma não conseguir fazer sua coluna - de 50 linhas, cada uma com 72 cacacteres - no computador. “Vou morrer sem ser cínico: tenho grandes dificuldades de escrever na mesma velocidade num computador. Pode ser que largando os afazeres de executivo eu venha a ser mais ágil”, brinca. Gutman afirma que ainda não conheceu alguém que tenha, no computador, raciocínio tão lógico, fácil e ágil quanto ele tem em uma máquina de escrever. “As pessoas não se espantam quando sabem que escrevo numa velha Remington. Uma extraordinária maioria ostenta um computador no escritório para ser moderno. Escrever é uma arte e isso pode ser feito até com um cotoco de lápis e papel de embrulho”. Ao contrário do doutor Alípio, Gutman não acredita na extinção das máquinas de escrever. “Milhares ainda estão em uso; ainda não desapareceram as fitas e os consertos. Quem conserta minhas máquinas é o Adelmo Zambom, um fiel companheiro de trabalho. Quem manda comprar fitas é minha adorável secretaria Glaucia Krüger, que também passa minhas colunas, e-mails e correspondências através das malditas máquinas eletrônicas”, ironiza. Há também quem recorra à máquina de escrever como marca de estilo. É o caso da artesã, maquiadora e tatuadora Brunella Simões, 26 anos. Ela criou a papelaria Tête-à-Tête para vender cadernos personalizados pela internet. Fez a logomarca da loja utilizando uma máquina de escrever. E a entrega dos produtos é acompanhada por cartas de agradecimentos aos seus clientes. Cartas escritas à máquina.


Pouca luz e nenhuma cor

por Astrid Malacarne Eduardo Dias

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ense em um Natal sem as cores que iluminam casas e ruas. Imagine não conseguir enxergar o número do ônibus ou as pequenas letras de um livro ou tela de computador. Assim vive Lucas Reuter, 23 anos. O estudante de Engenharia de Produção da Faesa descobriu o problema de visão na infância. “Meus pais repararam que na praia eu ficava sempre muito tímido, quietinho. Procuraram um oftalmologista e descobriram que meu comportamento era efeito da fotofobia. Sem óculos escuros em sol forte não enxergo quase nada”. Além da fotofobia, Lucas possui um tipo de daltonismo que o impossibilita de enxergar qualquer cor. Ele tem ainda uma severa perda da visão: cerca de 90%. “Sabe quando acendem a luz do quarto e você fecha os olhos porque não esperava por isso? Sofro disso todos os dias com a luz do sol”, explica. Com os óculos escuros feitos para esse tipo de sensibilidade, Lucas consegue enxergar dentro do seu padrão. “A sensibilidade à luz é o meu maior problema. Se não fosse isso, nem me importaria em enxergar pouco e em preto e branco”. Mesmo sem saber qual o seu real problema, devido à falta de clareza dos laudos médicos, Lucas procura levar uma vida normal. “Trabalho, estudo, pratico esportes e tenho muitos amigos. O maior problema é não poder tirar carteira de motorista, mas faço as outras coisas como qualquer jovem da minha idade”. Lucas tem um irmão gêmeo, Pedro Henrique Reuter, que estuda Direito na Ufes e tem os mesmos problemas. Lucas, Pedro e outras 60 mil pessoas no estado são deficientes de baixa visão: não possuem a vista normal, mas não chegam a ser cegos. O que ocorre é uma alteração significativa da capacidade funcional da visão, decorrente de fatores isolados.

A rotina de quem enxerga muito pouco ou quase nada Os meios mais comuns de se adquirir a deficiência são doenças como a toxoplasmose, em crianças; e o glaucoma, em adultos. Também pode ser uma deficiência congênita - a pessoa já nasce com o problema. Reabilitação No Hospital Universitário da Ufes, campus de Maruípe, há o Serviço de Reabilitação da Visão, que consiste em uma equipe de oftalmologistas, terapeutas ocupacionais, psicanalistas e fisioterapeutas que buscam soluções para esses problemas. Criado em 1995 pela oftalmologista Elisa Cremasco, o Serviço tenta aproveitar ao máximo a visão remanescente do paciente com auxílio de instrumentos ópticos e eletrônicos. Os auxílios ópticos contemplam o uso de lupas, telescópios ou óculos com até 20 graus. Entre os eletrônicos estão lupas eletrônicas e um mouse com câmera, que amplia o texto ou a imagem em uma tela de TV ou computador. Os pacientes encontram meios para realização de atividades diárias, como a leitura e a costura. “Os casos variam de paciente para paciente, conforme o problema e a faixa etária”, explica a oftalmologista Suzana Vereza, que compõe a equipe. “O objetivo é sempre a autonomia do paciente, para que ele não seja dependente de ninguém”. Para prevenir e detectar problemas de visão, Suzana recomenda o Teste do Pezinho. “O exame é muito importante para detectar desde cedo as doenças, pois o tratamento será mais eficaz”. Instituições como a do Hospital Universitário estão espalhadas pelo país desde a criação do Instituto Benjamin Constant, no Rio de Janeiro, e da Associação Brasileira de Assistência ao Deficiente Visual, em São Paulo.

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Sonhos Nunca é tarde para tentar novos caminhos: idosos e idosas se tornam modelos na melhor idade e se sentem realizados com essa escolha

Fotos:Arquivo Pessoal

se descreve como uma pessoa extrovertida, o que é facilmente notado. Mas reclama da falta de apoio da família em suas escolhas. “Eles dizem ‘só pode ser doida’ e eu digo que sou doida mesmo”. Ser artista está em sua veia, garante. De forma descontraída diz que se lhe pedissem para escolher entre uma viagem internacional e poder ver a Xuxa, com certeza escolheria a segunda opção. A senhora, que hoje tem 79 anos, diz já ter ido em caravanas para ver o Faustão e a Xuxa, mas hoje quase não encontra mais esse tipo de passeio. Graça Shereider, diretora da Shereider Produções, onde Lenne Dias fez seu curso completo de modelo, garante que a procura por modelos na terceira idade é frequente. Ela explica que muitas vezes os senhores e senhoras são abordados por olheiros, outras vezes eles mesmos procuram a agência. Ela acredita que a procura ocorre por uma vontade de ocupar o tempo ou uma oportunidade de ganho, mas “o valor que

Esther Nogueira

Foto: Arq uivo pes soal

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os oito anos, Arlene Borges Dias pensou em fugir com o circo. Mas sabendo da reação que sua mãe teria, desistiu. E assim, seu sonho de ser artista foi adiado. “Quando a gente pensa muito no que fazer, não faz”. Mais tarde veio o casamento e dona Arlene se viu ainda mais distante de seu desejo. Mas em 1996, já aos 64 anos, a senhora nascida no dia 14 de maio de 1932 decidiu fazer um curso de modelo. “Um curso completo”, destaca, de vídeo, passarela, etiqueta. Sindicalizada como atriz, já participou de curtas e longas-metragens, além de propagandas de grandes marcas, como Dadalto, Unimed e Eletrocity. Já foi Miss Vila Velha e Miss Espírito Santo. E toda essa carreira só se iniciou no que dizem ser a melhor idade. “Me sinto covarde, sou frustrada por ter deixado meu sonho por tanto tempo. Gostaria de ser uma grande atriz”, lamenta. Com o nome artístico de Lenne Dias, a senhora


não envelhecem por Esther Radaelli Thaiana Gomes

ganham varia muito de campanha para campanha”. A Shereider Produções está há 15 anos no mercado e em seu catálogo existem cinco idosos com fotos atualizadas para recomendar. O senhor Hilton Álvaro Angeli, 74 anos, mais conhecido como “Rei da Terceira Idade”, faz parte do catálogo de modelos da Shereider. Ele veio de Santa Teresa para a Grande Vitória com 32 anos, e conta que não tinha muito estudo, pois cursou até a 4ª série do ensino fundamental. Foi representante comercial, trabalhou como gerente de uma loja de embalagens e como cobrador de dívidas. Este último emprego lhe rendeu um trauma: quase foi atingido por dois tiros ao cobrar R$50 de um policial. Hilton afirma que nunca tinha se interessado por “atividades de idosos” e que achava os bailes da terceira idade coisa de gente que não tinha o que fazer. “Tudo uma cambada de sem vergonha”, fala descontraidamente. Mas um dia, no ano

Lenne Dias lli ntovane rique Mo n e H : s Foto

de 2003, levado por sua falecida esposa, conheceu um baile na Serra. Chegando lá, começou a dançar e gostou. Depois daquele dia, nunca mais parou. No mesmo ano aconteceria a eleição de Rei e Rainha da Terceira Idade da Serra. Indicado pela maioria como um bom candidato, seu Hilton não relutou. “Eu sabia que ia ganhar aquele concurso. Os outros concorrentes não sabiam se portar, estavam bem caídos”, brinca o senhor. Hilton estava sem dinheiro e recorreu ao patrocínio de R$200 de uma loja de autopeças para arcar com o aluguel de um terno para o desfile. “Quando fui devolver o terno, a dona da loja me surpreendeu dizendo que eu não precisava pagar. Ela disse que havia sonhado comigo e que, no sonho, alguém dizia a ela que me incentivasse. Por isso não quis cobrar o aluguel e ainda me deu um curso completo de modelo”. O Rei da Terceira Idade disse que no começo os filhos caçoavam dele e diziam que ele não teria coragem.

Fotos:Henrique Mantovanelli


Pois foram as críticas que o motivaram mais. Em 2004 ele começou o curso. “Eu era o único modelo idoso no meio dos jovens. Isso não foi bom pois eu ouvia críticas. Cheguei a falar com a Graça (diretora da agência) que queria sair”. Mas seu Hilton persistiu, teve formatura e uma festa cheia de emoções. “Quando o locutor anunciou meu nome na passarela, eu entrei empolgado, correndo, igual artista. Todos me aplaudiram, e eu comecei a jogar beijos para todos. Depois a Graça me disse, rindo: 'você não fez nada do que aprendeu com a gente!'.” Após o curso, Hilton foi garoto-propaganda de lojas, fez comerciais e, inclusive, conheceu o Projac (Central Globo de Produções) no Rio de Janeiro, sendo figurante em algumas minisséries e contracenando com famosos como a atriz Ana Paula Arósio. Ano passado, ele foi Mister Serra. Ele diz não ser vaidoso, mas que já foi um homem convencido. Hoje não mais. Por experiência, o senhor de sorriso fácil e humor inquestionável diz que tudo pode acontecer muito rápido, mas também se findar da mesma forma. Há um ano sem trabalhos na área, lamenta que não há uma valorização dos modelos idosos capixabas e que as agências já recorrem a outros estados. Diferentemente de dona Arlene e do seu Hilton, a mineira Esther Andrade Nogueira, 75 anos, modelo, manequim e atriz, não é agenciada. A Miss Cariacica de 1999 venceu o concurso municipal e foi o 2º lugar no concurso estadual. A iniciativa partiu da própria Esther.

"Achava que o meu perfil agradava as pessoas, sem contar que eu gosto dessas coisas, de modelar, desfilar". Logo após ficar em 2º lugar no estadual, dona Esther foi chamada para desfilar para duas boutiques da Grande Vitória em 2000. Ela fez o curso de modelo e manequim oferecido para as candidatas à Miss Cariacica. A partir de 2002 ela começou a fazer as primeiras propagandas: Unimed, Café Número 1 (com a cantora Wanessa), Eletrocity e outras. Em 2010 participou de um curta, "O sorriso do Violeiro", de Therla Duarte, no qual atuou como avó dos personagens principais, um casal de irmãos. Dona Esther não é muito vaidosa, se preocupa mais com a saúde. "Não pinto os cabelos e nem penso em fazer plástica. Minha neta briga comigo por causa das unhas que não faço e minha irmã fala para eu pintar os cabelos. Mas todos elogiam meu sorriso, que é espontâneo. Acho que é a parte que mais admiro em mim. Procuro sempre estar de bem com a vida”. Atualmente, além de exercer a profissão de modelo, ser mãe, avó e dona de casa, ela também é Conselheira Estadual do Direto do Idoso, e por isso a sua agenda é sempre movimentada - viaja muito em função dessa atividade. Para a neta de dona Esther, Daniellen Nogueira, 22 anos, a nova “profissão” da avó não foi uma surpresa. “Ela não é tímida, eu torcia por ela nas competições de Misses. Quando a imagem dela aparece em outdoors e na TV as pessoas ligam, comentam, é divertido”.

Hilton Álvaro omes aiana G Fotos: Th


Mais amor aos livros

Foto: Jéssica Romanha

O mau c enche uidado com a sala os livr d biblio o teca d e reparos d s o esta a maio do r por Jéssica Romanha Leonardo Ribeiro

O processo de restauração também se torna mais lento porque exige trabalho artesanal. Furadeira, guilhotina, agulhas e linhas são instrumentos de trabalho de Vera e Aurea. Elas realizam o trabalho mais complicado - como a costura da lombada de livros delicados e a encadernação - e ocupam uma sala ampla com três mesas, cadeiras, prateleiras, cartolinas. Os estagiários ficam na antessala e fazem o primeiro contato com o livro danificado. Eles cuidam das publicações com danos leves, como higienização externa, remoção de adesivos e etiquetas. “A remoção de fita adesiva é feita com bisturi aquecido e pressionado sobre o plástico”, explica Débora Guimarães, estudante de Artes Visuais e estagiária do setor. Débora diz que já viu livros estragados de inúmeras formas. “Muitos não são apenas grifados, mas usados como cadernos pessoais. Há livros da área de Ciências Exatas que chegam aqui com contas gigantescas”, relata. Mesmo as anotações a lápis prejudicam o livro e, provavelmente, deixarão marcas para sempre. Débora explica que apagar com borracha pode danificar ainda mais a página rabiscada: “por isso optamos por não apagar”. Em casos de danos mais graves - como manchas de café - dona Vera e dona Aurea não podem fazer nada. Recursos avançados poderiam ajudar na retirada dessas marcas, mas a biblioteca não os possui. O melhor a fazer é e sempre será conservá-los.

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ítimas do descaso de usuários, livros com páginas rasgadas, riscadas, entre outras danificações estão armazenados na sala de reparos e restauração da Biblioteca Central da Ufes. São 2.266 obras à espera de cuidados. A diretora da Divisão de Formação e Tratamento do Acervo, Arlete Franco, relata que “há casos de alunos que utilizam os livros até como guarda-chuva”. Arlete destaca que além de fitas adesivas coladas, capas rasgadas e páginas rabiscadas, a retirada de lombada e as páginas soltas são os principais danos causados nos livros. O descaso com o patrimônio público entristece Aurea Aparecida Gomes, simpática senhora do setor de reparos e restauração, que afirma com convicção: “é muito melhor conservar do que restaurar”. Vera Lúcia Trancoso, funcionária do setor há 18 anos, também se entristece com o mau uso dos livros. Mas ainda assim, ela conta - em ar de confissão - que está sempre disposta a ajudar quem precisa. “Se algum estudante precisa de um livro que está na fila para ser restaurado, eu faço o que posso para deixá-lo pronto o mais rápido possível.” O setor de restauração pode levar meses para devolver um livro à prateleira. A demanda é grande e, às vezes, os materiais necessários acabam no meio do processo. A Biblioteca Central também é responsável pelos reparos de livros das seis bibliotecas setoriais, mas conta com apenas duas funcionárias e quatro estagiários.

Retire o livro da estante pela parte superior da lombada; Não

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reparos; Não dobre pontas de páginas nem as folheie com auxílio de sa li

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grifos ou anotações; Evite comer e beber perto dos livros; Evite us a


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Para garantir a segurança nas escolas, governo e prefeituras da Serra e de Vitória recorrem a serviços de patrulhamento e vigilância das instituições por Esther Radaelli Maíra Mendonça

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ambiente escolar deve, por princípio, fornecer um espaço seguro e tranquilo para a aprendizagem. Por isso existem, cada vez mais, planos de segurança específicos para escolas, que variam conforme estas sejam particulares ou públicas, estaduais ou municipais. Há hoje 189 públicas na Serra e 118 em Vitória. Na Serra, a patrulha escolar é feita pela empresa terceirizada VIGSERV, contratada pela prefeitura para garantir a segurança nos colégios municipais. Carlos Tadeu Casteluber, 48 anos, é gerente operacional da empresa e explica que o trabalho diário dos patrulheiros consiste em ir até as instituições e verificar como estão, conversar com professores e fazer vistorias, se necessário. Caso haja problema de maior gravidade, seja interno ou externo, eles acionam a polícia, já que não trabalham armados. Quando convidados, os profissionais dão palestras sobre segurança nas escolas. Em cada patrulha sempre há um homem e uma mulher, com treinamento para lidar com crianças e adolescentes. “O serviço dos patrulheiros é de conscientização, como forma de prevenir a violência”, explica Carlos Tadeu. Micheline Vechi, 40 anos, é diretora há cinco anos da escola municipal Dom Helder, em Jacaraípe, na Serra. Ela afirma que “além de alunos e funcionários se sentirem mais protegidos com a presença das patrulhas - até pelo fato de os patrulheiros não andarem armados - os arredores da escola também ficou mais tranquilo. A simples presença deles afasta maus elementos e evita que estranhos pulem o muro da escola”. Segundo Micheline, os patrulheiros aparecem várias vezes ao dia. A Serra possui 116 escolas municipais e o patrulhamento só atende à instituições de Ensino Fundamental, que correspondem a 64 escolas. Mas o

contrato assinado com a prefeitura é para apenas 56 instituições. São cinco patrulhas para essas escolas. Carlos Tadeu destaca que “esse trabalho existe há quatro anos e desde então os índices de violência interna nas escolas é quase zero”. Já em Vitória, de acordo com a gerente administrativa da Secretaria Municipal de Educação (Semi), Marta Silva de Azevedo, 47 anos, não há sistema de patrulhamento. A segurança fica a cargo de um porteiro no período diurno e um segurança no período noturno - que pode ser tanto um contratado por empresas terceirizadas, quanto um guarda patrimonial da prefeitura. Mas esse número pode aumentar, conforme a localização da escola - se estão em áreas mais perigosas - e seu tamanho - algumas possuem sistema de videomonitoramento. O Governo do Estado trabalha de maneira diferente. De acordo com capitão Warner Di Francesco, coordenador da Patrulha Escolar da Secretaria Estadual de Educação (Sedu), policiais fazem uma visita semanal a cada unidade de ensino. “Este ano, de um total de 1.400 atendimentos, 94% das visitas foram preventivas. O resgate do laço entre a família e a escola tem sido positivo nas escolas atendidas na Grande Vitória”. Segundo informações do governo, a patrulha escolar é coordenada pela Sedu e pelo Comando Geral da Polícia Militar. Os policiais selecionados tem perfil voltado para o ambiente educacional, com formação superior na área pedagógica ou de assistência social. Todos possuem curso de gerenciamento de conflito, passam por uma capacitação promovida pelo Ministério Público Estadual sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e conhecem o regimento escolar. Gilda Cardoso de Araújo, 44 anos, é professora de pós-graduação em Educação da Ufes e fez no ano

Professores Servidão

Dedicação


Patrulha A-B-C

Amor Violência

2000 um estudo sobre “Violência e Depredação do Patrimônio Escolar”. Ela explica que todos os funcionários que trabalham na escola possuem um papel pedagógico. Portanto, estabelecer uma relação afetiva com os alunos é fundamental para o combate à violência. “De uns anos pra cá, a maioria dos sistemas de ensino passaram a terceirizar o serviço de segurança. Há alta rotatividade desses profissionais. Por mais bem treinados que sejam, não há um vínculo entre eles e a escola”. Para Gilda, a única forma de combater a violência é inserir a escola no âmbito comunitário, transformando-a em um centro de referência, capaz de atender aos alunos, pais e a toda a comunidade em tempo integral. “É claro que não podemos negar a existência de problemas como o tráfico de drogas e a prostituição que há nos arredores das instituições. O importante é pensar em alternativas para lidar com isso”, enfatiza a professora. Selma Maria Estevam, 52 anos, é pedagoga da escola estadual Antônio Engrácio da Silva, localizada em Feu Rosa, na Serra. Uma vez por semana, a patrulha escolar e os policias militares passam pelo colégio. “Eles batem papo com os alunos e são bem preparados para isso”. A diretora da escola, Ledimar Correa Ramos, 51 anos, destaca, entretanto, que a patrulha não passa pela manhã, horário em que alunos maiores estudam e existe mais chance de ter problemas. A escola também possui vigilante em todos os turnos. É um serviço terceirizado pela Sedu. Um desses

Escola Paz

vigilantes, Antônio Marcone, 42 anos, comenta que falta uma maior preparação humana desse trabalhador. “Há muitos vigilantes que são ignorantes, tratam as pessoas mal”. Marcone acredita que a primeira arma a ser usada deve ser sempre o diálogo. Feu Rosa é um bairro com muita criminalidade, por isso as educadoras reclamam da falta de policiamento no entorno da escola. “Parcialmente os seguranças dão conta. Mas o melhor seria que passassem todos os dias aqui e que houvesse maior policiamento nos horários de entrada e saída de alunos”, afirma Selma. As educadoras relataram um episódio ocorrido há poucos meses: dois rapazes foram assassinados na rua de trás da escola e logo os alunos foram ver o que estava acontecendo. “Para eles é normal, eles convivem com isso, a violência no bairro é comum. Mas dentro da escola eles se sentem seguros”. Selma tem 25 anos de formação, e acredita no ensino como forma de educar para a vida ensinando valores, “Eu falo para os alunos: não quero abrir o jornal e ver vocês lá como traficantes, quero ver que fizeram coisas boas. Se cada professor conseguir plantar uma sementinha, isso vai florescer”.

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escolas seguras

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Estradas mais caras A concessão da BR 101 deve acontecer no segundo semestre de 2012. Sete novas praças de pedágio serão construídas de norte a sul na rodovia

por Rhayan Lemes

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rrumar a bagagem, chamar a família e preparar o carro não serão as únicas preocupações para quem for cruzar a BR 101 nos próximos anos. Além dos custos normais de uma viagem, o motorista deverá gastar com novas taxas de pedágio. Sete novas praças estarão operando ao longo dos 475 km da via no Espírito Santo, gerando um custo de cerca de R$ 30 para quem atravessá-la. Os novos pedágios estarão nas proximidades de Pedro Canário, São Mateus/Jaguaré, Linhares/Aracruz, Serra, Vila Velha/Guarapari, Rio Novo do Sul/Cachoeiro do Itapemirim e Mimoso do Sul. O leilão para escolher a concessionária, coordenado pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), está marcado para 18 de janeiro. O contrato de concessão, que tem duração de 25 anos, deve ser assinado no início de julho. A Confederação Nacional do Transporte (CNT) divulgou no dia 26 de outubro a 15ª Pesquisa CNT de Rodovias - estudo que avalia a situação da malha rodoviária federal e principais rodovias estaduais. A extensão da BR 101 no estado foi classificada como “boa”, sendo a pavimentação considerada “ótima” e a sinalização e geometria “regular”. Tais resultados colocam em xeque a necessidade dessa concessão que vai gerar sete praças de pedágios na BR 101. O superintendente do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) do Espírito Santo, Halpher Luiggi, diz que a concessão “não é só serviço de estrada, é também um serviço social”. As obrigações da concessionária ganhadora constam num extenso documento, o Programa de Exploração da Rodovia.

“Haverá um sistema de atendimento ao usuário 24 horas por dia. Em casos de acidente, a concessionária terá 15 minutos para prestar socorro. Para atendimento mecânico, o serviço deve chegar em 20 minutos”, conta Luiggi, que acredita que as medidas devem diminuir o número de acidentes e evitar vítimas fatais. Segundo ele, o projeto prevê doze sistemas de atendimento ao usuário, sendo que cada um contará com o aparato de uma ambulância, um guincho, um veículo de inspeção, um caminhão brigadista e um veículo gaiola (para recolher animais). Quanto à avaliação positiva da BR 101 na pesquisa, Luiggi aponta os serviços de recapeamento realizados pelo DNIT em 2010 como fundamentais para o resultado. A via, no entanto, recebeu a mesma avaliação nos anos de 2009 e 2010. De acordo com o edital de concessão, as taxas de pedágio devem ser fixadas com uma tarifa-teto de R$ 0,06237 por km, o que resulta num valor total de R$ 29,69. O superintendente do DNIT-ES acredita que muitas propostas serão apresentadas no leilão, ampliando a concorrência e, consequentemente, reduzindo o valor dos pedágios. Luiggi espera uma redução de até 30% no valor-teto estipulado. Para o universitário Ramon Rômulo de Souza, 21, a cobrança é abusiva. “Os pedágios se tornam uma fonte de lucro, pois extrapolam os objetivos principais de construção e manutenção (das rodovias)”. Luiggi explica que no consórcio da BR 101 a iniciativa privada terá ganhos que ao longo dos 25 anos devem gerar lucro máximo de 8% sobre os investimentos.


cobrança seria indevida. Mas duplicar e depois cobrar, A gestora de eventos Izabella Salazar, 33, recorda eu acho justo”. o início do funcionamento da praça de pedágio entre De acordo com Luiggi, o projeto de concessão prevê Vila Velha e Guarapari, quando ela morava em Setiba. a duplicação da BR 101, mas isso deve acontecer ao “Logo que começou a funcionar, por seis meses eu longo dos 25 anos de concessão. No quarto ano, a ainda ia e voltava à Vitória para trabalhar. Mas percebi duplicação deverá estar pronta no trecho que vai da ES que o dinheiro que gastava com pedágio e gasolina não 261 ao acesso à Grande Vitória pela Serra. No quinto compensavam, por isso me mudei para a capital”. ano, deve estar concluída na ES 124 (Guaraná), ES 146 B Izabella mora hoje em Vila Velha e paga o pedágio (Alfredo Chaves) e ES 489 (Atílio Vivacqua). No décimo da Terceira Ponte todos os dias. Ela agora reconhece ano haverá duplicação no trecho da ES 421 (Conceição a necessidade de cobrança da taxa: todas as vezes da Barra), Linhares, BR 698 (Mucuri) e Divisa BA/ES. que precisou ser atendida pela concessionária achou No 23º ano será a vez da ES 489 (Atílio Vivacqua) até o serviço satisfatório. “Minha família sempre foi bem a Divisa ES/RJ. Mas se o volume de tráfego aumentar, atendida. Todas as vezes que vi um animal na pista e prazos mais curtos podem ser estabelecidos. liguei, o atendimento foi imediato. O pedágio é caro, Luiggi aponta vantagens mas funciona”. como a construção de O corretor de imóveis José A 15ª Pesquisa de passarelas, viadutos, redução do Fernando da Silva, 48, viaja Rodovias da Confederação índice de acidentes, melhoria frequentemente pela BR 101 Nacional do Transporte na velocidade operacional da sentido sul. Ele acredita que via e geração de milhares de os pedágios podem garantir classificou a BR 101 como empregos. Ele explica que, melhorias para quem trafega. “boa”, tendo “ótima” mesmo enquanto a rodovia “A concessionária tem o pavimentação e sinalização estiver concedida, o DNIT compromisso de dar mais e geometria “regular”. é a autoridade de trânsito segurança, limpar, colocar placas, responsável por gerenciar o prestar socorro”. José diz que se sistema rodoviário. Caso não sejam cumpridas as os serviços de segurança e manutenção forem feitos, a condições determinadas nos editais, a ANTT tem até concessão pode valer a pena. 210 dias para sanear os vícios e erros da concessionária. Os serviços de manutenção em placas e pavimentação Após isso, o DNIT passa a assumir o trecho e fica a cargo da BR 101 são apontados como déficits pela 15ª do Governo Federal realizar nova concessão ou não. Pesquisa de Rodovias da CNT. “O DNIT passou muitos anos com uma infraestrutura de pessoal precária, além Os pedágios impedem o direito de ir vir? de depender de recursos que vem de Brasília. No final Nas redes sociais, um trabalho acadêmico que de 2010, tínhamos somente cinco engenheiros. Hoje, aponta os pedágios como detentores da liberdade de ir estamos com dez, o que já resulta na qualidade recente e vir é replicado por aqueles que dizem querer “justiça” dos trabalhos desenvolvidos”, pontua Luiggi. e o fim do pagamento da taxa. O conteúdo, publicado Paulo Scheppa de Souza, 40, administrador de no dia 05/12/2007 no site da Assembleia Legislativa do empresas que transita pela BR 101 Norte quase todos Rio Grande do Sul, coloca o Jornal Agora como fonte os finais de semana, avalia que a rodovia se encontra em oficial do texto. Trata-se de um trabalho de conclusão boas condições. “O problema é que o fluxo aumentou do curso de Direito, realizado por Márcia dos Santos muito nos últimos anos. A pressa acaba gerando Silva, na Universidade Católica de Pelotas (UCPel). acidentes. A estrada está em boas condições, mas já No trabalho intitulado de “A Inconstitucionalidade passou da hora de ser duplicada”, pondera. Sobre o dos Pedágios”, Márcia usa a Constituição Federal de pagamento de pedágio, Paulo não vê problema. “Só 1988 para embasar sua tese. Segundo ela, o artigo 5, não pode implantar pedágio antes de duplicar. Aí a

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16 que diz que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”, o inciso XV do mesmo artigo, que diz que “é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens” e a própria Constituição Federal assegura o direito de ir e vir, que é cláusula pétrea (que não pode ser alterada). Ela afirma que parte do imposto de Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) incluso no valor da gasolina já é destinado à manutenção em estradas. Portanto, seria desnecessário o pagamento de pedágio. Márcia garante que não paga pedágio e passa direto pelas cancelas - que segundo ela são feitas de plástico e não danificam o veículo. Para o mestre em Direitos e Garantias Fundamentais e professor de Direito Constitucional da Faculdade de Direito de Vitória (FDV), Cláudio Colnago, “é natural que a questão do pedágio gere dúvidas e controvérsias”. Segundo ele, apesar da Constituição garantir a todos o direito de locomoção, os direitos fundamentais não são absolutos e, por isso, são passíveis de restrições. Colnago diz que é necessário realizar uma interpretação sistemática da Constituição. Enquanto o artigo 5º inciso XV garante a locomoção, o pedágio é tratado pelo artigo 150 inciso V, que diz que é vedado à União, Estados e Municípios “estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público”. O inciso proíbe que o poder público crie ou cobre tributos com a finalidade de limitar o livre tráfego de pessoas ou bens, admitindo, porém, a possibilidade de cobrança de pedágio sempre que se caracterize a conservação da via pública como finalidade. Ele cita ainda o artigo 175, que estabelece ao Poder Público prestar os serviços públicos, direta ou indiretamente através de particulares, mediante permissão ou concessão, sempre através de licitação. Colnago ressalta que o pedágio somente pode existir se houver uma via alternativa gratuita para o mesmo destino. Um parecer da Procuradoria Geral da República aponta que o pedágio não pode impedir o direito de tráfego. Dessa forma, a falta de via de acesso alternativo e gratuito, em boas condições de uso, impede a cobrança de pedágio. Luiggi diz que, apesar de se ter que trafegar um pouco mais, existem rotas alternativas rodoviárias de norte a sul da BR 101. A respeito da concessão da rodovia, Colnago acredita que ela deva ocorrer desde que sejam estabelecidas e fiscalizadas metas de conservação e ampliação. Para ele, “a simples transferência para a iniciativa privada não se justifica”.

Praça 1 2 3

Município Pedro Canário São Mateus / Jaguaré Linhares / Aracruz

Localização km 2,0 km 86,7 km 168,1

Tarifa-teto R$ 3,86 R$ 5,18 R$ 4,85

4

Serra

km 242,2

R$ 4,69

5

Vila Velha / Guarapari

km 318,4

R$ 4,82

6

Rio Novo do Sul / Cachoeiro de Itapemirim

km 396,7

R$ 4,07

7

Mimoso do Sul

km 449,0

R$ 2,22

Fotos: Divul gação

BR 101


Prontos para agir por Daiane Delpupo Jéssica Romanha

Salvar vidas e zelar pela segurança da sociedade é motivo de orgulho para os oficiais do Corpo de Bombeiros

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ção e de todos os ideais desenvolvidos s bombeiros são admirados por ela, Jorge Merlim, 21, está na turma por sua missão de zelar e salde preparação de bombeiro. Ele se senvar vidas. Atualmente, quatro te motivado pela imagem de profissiobatalhões e nove companhias, espalhanal competente e respeitado. “Quero das por todo o Espírito Santo, transmiconstruir uma carreira dentro do CB e tem uma imagem empática para 86% fazer parte dessa história”. Jorge divide da população, segundo pesquisa realia sala de aula com Fábio Fabre, 25, que zada este ano pelo IBOBE (Instituto Braprestou concurso atraído pela estabilisileiro de Opinião Pública e Estatística). dade financeira. Nas horas vagas, Fábio “Compromisso com a sociedade, traé brigadista (bombeiro voluntário). Ele balho sério e dedicação são as bases afirma que o processo inicial não é fácil, para comprovação desse dado de aceitapois o desgaste físico e mental é intenso, ção popular”, segundo o capitão Victorimas não se arrepende de ter entrado. O no Luz Pinto, 50. “Além disso, o CB está tenente coronel Marcelo D’sep, na corsempre promovendo atividades na tenporação há 24 anos, também sente ortativa de apresentar e aproximar as pesgulho dos serviços soas do nosso traque prestam. “Não balho”, acrescenta. Esse olhar vigia o acaso e a sabia o que era Além dos serviços mais conhecidos, o maldade: é o olhar previdente e ser bombeiro, mas Corpo de Bombeiros arguto, abnegado e perspicaz, queria ser militar. Militar do Espírito incansável e generooso, que Hoje não troco o Santo (CBMES) de- vela pela segurança, pela que faço por nada”. Com a experiênsenvolve atividades propriedade, pela fortuna, cia de quem já vie projetos sociais, pela vida de todos nós. Olavo Bilac veu dias exaustivos, como o “Bombeiros o capitão Victorino, do Futuro”, que atenpresidente da Associação dos Bombeide crianças e adolescentes em situação ros Militares do Espírito Santo (ABMES), de risco social, como Vinicius Gomes, 12. é bombeiro há 30 anos e admite não “É engraçado como a gente muda, ganha ser fácil passar por todas as etapas de mais disciplina, além de ficar mais atenascensão na corporação. “Quando esto às questões de riscos no dia a dia”. E tamos passando por testes, tocar o sino é por isso que a soldado e responsável é o sinal de desistência. Eu assumi um pelo projeto Karolina Antunes, que está compromisso comigo mesmo: sempre há dois anos e meio na corporação, dedeixava para acionar o sino no dia semonstra satisfação com seu trabalho. guinte, quando a exaustão já tinha pas“Sempre sonhei em ser bombeiro, e o sado e eu estava disposto a continuar”. que faço é de coração. Quando as crianMesmo aposentado há quase dois anos, ças iniciam o curso, geralmente demonsVictorino continua trabalhando na ABtram indisciplina. Percebo a importância MES voluntariamente, e garante que do projeto quando, ao final do curso, elas a paixão pela instituição é o que expliadquirem respeito umas pelas outras”. ca sua vontade de não abandoná-la. Com o desejo de fazer parte da institui-

Fotos: Daiane Delupupo e Jéssica Romanha


palavra de escoteiro

Foto: Thaiana Gomes

Disciplina e cuidado com o próximo são os principais valores dos grupos de escoteiros

por Fábio Andrade Leone Oliveira

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oi graças a um parente que mora em São Paulo que Breno Pereira conheceu o escotismo. Seu tio, bombeiro na corporação paulista, soube do movimento por lá e o indicou para a mãe de Breno quando o garoto tinha sete anos. Hoje, aos 17, o jovem participa da tropa Sênior do Grupo de Escoteiros do Mar Ilha de Vitória. Segundo Breno, “o escoteirismo forma o caráter da pessoa, institui valores, respeito, dignidade, união”. E foi exatamente com esses objetivos que o escotismo foi fundado em 1907 pelo Lord Baden Powel, no Reino Unido. Egresso do exército britânico, Powel pediu demissão do cargo de tenente-general para se dedicar ao escotismo e preparar jovens para a cidadania ao invés de prepará-los para a guerra. Os escoteiros são educados de forma a agir com altruísmo e independência. Essa lógica norteia as atividades desde os lobinhos - crianças dos sete aos dez anos - até os pioneiros - maiores de 18 anos. Um modo de vida Além das normas pedagógicas voltadas para o desenvolvimento de crianças e jovens, o escotismo é também um modo de vida. O altruísmo e preocupação com o próximo são algumas das bases mais sólidas da atividade. A Lei Escoteira consiste nos princípios que os integrantes do grupo devem seguir. Não é baseada em proibições, mas em ações afirmativas. Uma das recomendações, por exemplo, é que o escoteiro seja “leal à Pátria, à Igreja, às autoridades do governo, aos seus pais, seus chefes, seus patrões e aos que trabalham como seus subordinados”. Os valores do escotismo são passados às crianças a partir dos sete anos, idade mínima para entrar em um grupo.

Nessa fase, os escoteiros são chamados de lobinhos, numa alusão à “Mogli - o menino lobo”, que cresceu por seus próprios meios na selva. Os escoteirosmirins exercem atividades como acampamento e brincadeiras coletivas, visando o convívio com outras crianças e com a natureza, e a própria independência. A partir dos 11 anos, deixa-se a fase dos lobinhos para ingressar no ramo escoteiro - onde permanecem até os 15 anos. Atingindo essa idade, os jovens entram no ramo sênior - até os 18 anos. Os escoteiros praticam atividades voltadas para a aventura, esportes radicais - como rapel -, além de trabalhos sociais voluntários - como visita à asilos e mutirões. A última fase é o ramo dos pioneiros - dos 18 aos 21 anos. O escoteiro passa a adquirir funções dentro do grupo, como auxiliar as atividades com os lobinhos, e segue crescendo na hierarquia escotista. “Esse ramo é diferente dos anteriores. As ações são mais voltadas para a sociedade e para formar o jovem para ser chefe. Essa é minha intenção”, explica Eliza Delazari, 19 anos. Além do trabalho com crianças e jovens, e dos serviços prestados à sociedade, os escoteiros também dão suporte às pessoas em situações de emergência. Nei Tossati, 37 anos, chefe da Tropa Sênior, morava em Santa Catarina quando o estado sofreu a enchente em 2008. Lá, os escoteiros ajudaram a organizar o caos. “Colocamos uma base em Ilhota (um dos municípios mais atingidos pela enchente) com cinco radioamadores e ficamos 15 dias fazendo o papel de pôr a comunicação no ar. Começamos com 11 estações de rádio espalhadas por locais de difícil acesso e uma repetidora no alto do morro que se comunicava com o Brasil inteiro.“


Mania de colecionar

por Inglydy Rodrigues

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Muitas pessoas fazem coleções de selos, carrinhos, bonés. Mas há quem colecione fotos de ônibus

uem nunca fez ou pensou em fazer coleções, ou ao menos conhece alguém que faça? Muita gente coleciona. Alguns, coisas mais comuns, como moedas e selos. Outros, algo mais inusitado, como fotos de ônibus. Com uma coleção de mais de 15 mil fotos, Ricardo Soares Peruch, 33 anos, explica que “algumas paixões vem de berço e gostar de ônibus é uma delas”. Depois de muitas viagens para o interior do estado com a sua avó, ele comprovou seu amor pelo meio de transporte e desde criança reúne as fotos. Ao completar 18 anos, Ricardo foi para muitos lugares do Brasil: São Paulo, Rio de Janeiro, Governador Valadares, cidades do nordeste. O jovem faz questão de dizer: “viajei muito só para tirar fotos”. Mas além da diversão, já teve problemas. Na rodoviária de Jabaquara, em São Paulo, por exemplo, ele foi proibido de tirar fotos por funcionários, pois pensaram que as fotos fariam alguma denuncia. Já Luan da Silva Peixoto, 21 anos, começou a fotografar há pouco tempo. “Só possuo câmera há três meses, mas sempre gostei muito de ônibus”. Luan conta que sua mãe o apóia, mas o pai acha estranho. Ele também relata que certa vez, no início do mês de outubro, foi autuado por um policial por estar fotografando na rodoviária, mas tudo foi explicado e acabou bem. O encontro Um grupo de 13 amigos se encontrou no dia 12 de outubro, na Rodoviária de Vitória, para fazer o que mais gosta: tirar fotos de ônibus. Eles se denominam busólogos e marcaram o encontro por MSN. Alexandre Magno, 41 anos, mora no Rio de Janeiro e decidiu participar para conhecer pessoas novas e, claro, fotografar ônibus: algo que lhe “proporciona felicidade”. Conheceu a terminologia “busólogo” através de um amigo, quando descobriu que não era o único fã de ônibus. Entre todos os presentes, Jones Fernando, 29 anos, era o único que já tinha viajado para outros países para fazer as fotos. Ele esteve na Argentina e no Paraguai. Dentre os estados

brasileiros, só lhe falta conhecer Rondônia e Acre. Sua maior viagem de ônibus durou quatro dias e meio: de Porto Alegre a Belém. Além de se divertir e conhecer lugares diferentes, os busólogos auxiliam quem está em dúvida quando a qual empresa escolher para viajar. Jones já foi muitas vezes questionado e usado como referência por amigos que não sabiam distinguir entre os serviços que os ônibus prestam. Josué Assis, 24 anos, agente de vendas da Rodoviária de Vitória há quatro anos, diz que quase todos os dias é possível ver alguém tirando fotos e não acha que seja um problema. Josué é colecionador de miniaturas de carros. Mania compartilhada Além de fotos e amor pelos ônibus, Alexandre Xavier de Araújo, 20 anos, cria seus próprios modelos e pinturas do automóvel. Morador de Anchieta, Alexandre possui o recorde de andar em 16 ônibus em apenas um dia. Ele ainda relata: “meu hobby é andar de ônibus, isso me faz relaxar e esfriar a cabeça”. Seu trabalho está exposto em sua página no Orkut. Além das redes sociais tradicionais, os busólogos expõem as fotos e compartilham experiências no site onibusbrasil.com. Seus membros postam fotos com informações sobre o veículo - nome, número do carro, empresa proprietária - além de quando e onde foi tirada. Com quase três anos de existência, o site possui cerca de oito mil empresas cadastradas e mais de 450 mil fotos publicadas.

Busologia? A origem do termo está relacionada ao engenheiro e designer de ônibus Hélio de Oliveira. Ele fundou, em 1979, o Clube de Design de ônibus (CDO). Por ser um observador nato do veículo, seus amigos passaram a chamá-lo de busólogo. A partir daí, surgiu o termo Busologia. (informações do blog obusologo.blogspot.com)

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por Amanda Meschi

horas incertas


do livro “Reino dos Medas”, de Reinaldo Santos Neves. A obra foi encontrada por Graize há alguns anos em um sebo em Jardim da Penha, Vitória. Ele se identificou profundamente com a história. A temática flerta com relacionamentos interpessoais e introspectivos, uma vez que explora os sentimentos de angústia e solidão, típicos de uma juventude ambientada em Vitória - “um lugar para onde as pessoas vêm para terem certeza de que irão embora”, como ironiza um dos personagens do filme. Para o jovem diretor, a atmosfera de despedidas é impregnante e acaba por influenciar a maneira como o capixaba enxerga a vida e tece suas relações sociais. A narrativa contada pelo filme nos apresenta Lauro, um artista plástico que parece ter uma vida perfeita. É apaixonado por sua mulher, ama seus amigos e vive de sua arte. Nada parece estar em desacordo, até que o protagonista é abatido por uma crise existencial e, embebido pela angústia, encontra o suicídio como solução derradeira. O clima de melancolia permeia o filme, o que é reforçado pela tonalidade em preto e branco e o jazz como trilha sonora. Sobre o cenário cultural capixaba, Graize afirma ter acompanhado as produções dos últimos dez anos e constata que nos encontramos em um momento de efervescência de ideias, mas ainda é necessário encontrar um meio de sustento pela arte. Ele reconhece que o público em geral requisita entretenimento, o que cria uma barreira para as produções que fogem de um circuito mais comercial. Inquieto, Vitor admite estar percorrendo campos que jamais imaginara, como o da publicidade, e se mostra confuso quando questionado sobre seus projetos futuros, mas pretende continuar com os longas. Entre as incertezas do tempo, ficamos com a clareza do agora: é visível que estamos falando de uma promessa do cinema brasileiro.

Foto: Thaiana Gomes

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uem vê Vitor Graize no auge de sua juventude e por trás de um estilo despojado, mal percebe que está diante de uma mente aguçada e equipada com um riquíssimo arsenal cultural. Aos 28 anos, o cineasta e também jornalista, formado pela Ufes, promove seu primeiro longa-metragem; fala de seu passado; descreve seu presente; e arrisca-se em comentar seus planos futuros, deixando claro sua dificuldade em definir algo tão incerto quanto o tempo que ainda não veio. Graize relembra com nostalgia sua vida universitária. O menino de Manhuaçu, no interior de Minas Gerais, conta que em suas primeiras semanas na Ufes ia ao Cine Metrópolis quase todos os dias após o almoço. Cinéfilo de carteirinha, participou da primeira geração do Grupo de Estudos Audiovisuais (GRAV). Segundo ele, isso foi fundamental para aprender a se relacionar com os filmes e direcionar a sua paixão pelo cinema. Vitor trabalhou como repórter do Caderno Dois, do jornal A Gazeta, por cerca de três anos - de 2007 a 2010. Já nessa época desenvolveu uma carreira paralela voltada ao cinema. Depois de “Olho de Gato Perdido”, lançado em 2009, a produção cinematográfica passou a tomar mais espaço em sua vida e alterou seu modo de pensar a própria profissão. A partir daí, Vitor declara sua desconfiança com o jornalismo, classificando-o de insuficiente na tentativa de narrar o que está acontecendo no mundo e de ser mecanicista, distanciando-se assim de sua essência. E aponta a produção audiovisual como uma forma mais dinâmica de se contar algo. Desde que foram selecionados pelo Edital de LongaMetragem da Secretaria de Cultura do Estado do Espírito Santo, Vitor e Rodrigo de Oliveira, seu parceiro de direção, passaram dois anos mergulhados por completo na produção de “As Horas Vulgares”, que estreou em outubro de 2011. O roteiro consiste em uma adaptação

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Um lugar para as artes, trocas e moradia

Foto: Astrid Malacarne

A Casa nº16, em Vila Velha, é um espaço onde produções artísticas são expostas, amigos se reúnem e a cultura é sempre bem-vinda

por Astrid Malacarne

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número da casa na parede já anuncia a arte que está por vir. O portal é desenhado pelo artista plástico Alex Vieira. Na sala, há um palco para realização de peças, shows, exposições. A Casa nº16 é um coletivo que abarca várias linguagens artísticas. A convivência em grupo vem criando uma forma de confiança entre as pessoas que entram nela. Localizada na Praia da Costa, a Casa é formada por Alexsandra Bertoli, Carla van den Bergen, Fernando Marques, Dante Negreiros, Luara Monteiro, Raphael Araújo e Grupo Z de Teatro. O coletivo explora as potencialidades de cada integrante, com atividades relacionadas a teatro, ioga, fotografia, exposições, oficinas e instalações. Aulas de ioga são ministradas por Alexsandra e Dante. Entre setembro e outubro, o Grupo Z de Teatro apresentou a peça Insone, integrando várias linguagens, como dança, teatro e música. A Casa cede o espaço para exposições de outros artistas que não fazem parte do coletivo. Em setembro, por exemplo, foi realizada uma oficina de efeitos especiais para cinema com Rodrigo Aragão. Outra forma de atuação são as parcerias com outros coletivos, como a que fez com o coletivo Expurgação para a exposição Expo Javala. Houve ainda a exposição de fotografias de Thalys de Oliveira Alves, a mostra de curtas independentes do Cineclube Central e um show da banda Volapuque. Há também espaço para a Hospedagem Solidária: artistas de outros locais do estado ou do país passam uma noite ou uma temporada na Casa, enquanto expõem seus trabalhos no estado. A banda Sabonetes, o rapper Emicida e o artista Vitor Monteiro já se hospedaram lá. História As amigas Alexsandra Bertolli e Luara Monteiro faziam parte de um grupo chamado Casa de Boneca, que realizava intervenções em casas abandonadas. O objetivo era mostrar que há espaços vazios no estado, em contraste com a falta de locais para produção de arte. O projeto não foi adiante. Mas Carla van den Bergen teve a ideia de oferecer a casa abandonada dos pais para as duas morarem por até um ano. Com as visitas de amigos, elas perceberam que a casa seria um espaço ideal para exposições e outras atividades artísticas. “Como temos muitos amigos artistas”, alegra-se Luara, “abrimos o espaço para eles”. Os custos são pagos com recursos das duas e do Grupo Z de Teatro, além da cobrança de entrada e venda de bebidas em eventos. O coletivo Casa nº 16 planeja concorrer em editais do governo para poder bancar os custos de um novo espaço em 2012 e dar continuidade às atividades que vêm fazendo.


A Despedida Um semestre de descobertas, muito trabalho e conquistas

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2010/1

primeiro contato com a rotina de um jornal impresso marca a vida do estudante de jornalismo. É quando a teoria vira manchete, matéria e imagem. Agora, com a quarta edição, temos uma certeza: valeu a pena. Todo o esforço foi recompensado em forma de aprendizado e do reconhecimento de nossos amigos, professores e, principalmente, nossos leitores. A vocês, agradecemos as críticas, sugestões e elogios. “Para quem está habituado ao ‘hard news’, dia após dia, o No Entanto veio como uma grata e saborosa leitura. O olhar do estudante de Jornalismo vem com um quê de descoberta e de ansiedade que abre novos horizontes para as notícias. Me surpreendi com algumas matérias, me emocionei com outras (a das penas alternativas e a dos queimados foram primorosas!); exemplos de que bom jornalismo pode – e deve – nascer antes mesmo da chegada do diploma”. Eduardo Fachetti “Trago meus cumprimentos à Any Cometti pela matéria ponderada, analítica e diversificada sobre crenças secularistas no Brasil. A qualidade do No Entanto salta aos olhos, parabéns aos envolvidos”. Eli Vieira Éramos ao mesmo tempo repórteres e produtores das nossas pautas. Tínhamos que nos virar para marcar entrevistas e pegar todos os dados possíveis com as fontes. Acertar nessa fase é fundamental para o sucesso de qualquer matéria. Fábio Andrade

“Achei muito gostoso ler as reportagens e fiquei particularmente comovida com ‘Mais que um trabalho’, pois tive contato direto com o CTQ quando uma prima sofreu uma queimadura. Parabéns por partilharem uma informação com uma mensagem tão bonita!” Flavia Kunschi

“Quando vi o jornal pensei que ele havia melhorado apenas esteticamente. Mas quando li as matérias vi que ele melhorou em tudo! Parabéns aos alunos que fizeram a matéria sobre a prostituição nos jornais. Achei muito boa! A matéria sobre doação de sangue vetada aos homossexuais também ficou muito interessante!” Luana Dalla Bernadina

Para além do cansaço, saber que você conseguiu trazer uma informação relevante com qualidade é muito gratificante. Agora entendemos melhor o trabalho que dá ser jornalista e a responsabilidade que temos em mãos. Esther Radaelli

A experiência foi muito desafiadora. Eu não imaginava conseguir fazer tudo que fiz e participar intensamente de cada parte do processo: de pensar em uma pauta a ir até a gráfica buscar os exemplares impressos. Viviane Machado

Muitas coisas foram proveitosas nesse semestre. Uma delas foi a certeza de que para se escrever uma boa matéria é preciso tempo, esforço e muita paciência.

Isabella Mariano Tive a oportunidade de trabalhar em diversas pautas com contextos diferentes. Foram muitos erros, mas aprendi bastante e carregarei essa experiência para além do curso. Izabelly Possato

Quando se está de fora, não imaginamos o trabalho que é produzir um jornal. Em cada etapa, uma dificuldade. Daiane Delpupo

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Quando a gente pensa muito no que fazer, não faz


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