Nil #3

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Distribuição gratuita

ago/set 2012

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Ano 2, #03, agosto/setembro 2012 www.nilrevista.com Editoras Clarissa Gianni e Patrícia Colmenero Projeto Gráfico e Diagramação Bianca Novais e Flora Egécia Fotografia Estúdio Cajuína Webdesigner Maurício Chades Jornalista Responsável Dione Moura Colaboram nesta edição Luísa Vieira, Taís Meireles, Paulo Fehlauer, Luísa Malheiros, Henrique Eira, Rafael Bessa, Felipe Cavalcante, Tiago Ferreira, Rodrigo Botero, Janaína Miranda, Rafael Viana, Vitor Schietti, Natália Keshi.

imagem da capa Felipe Cavalcante

ISSN 2179-9202 Distribuição Gratuita

Contato nil@nilrevista.com Colabore colaboracao@nilrevista.com Para anunciar anuncie@nilrevista.com Twitter @nilrevista Facebook Nil Revista Nil ® é marca registrada. Todos os direitos reservados. Agradecimentos Aos amigos e familiares que nos apoiaram, Taiom, Susana Dobal, André Carvalho, Cristina Moura, Rodrigo de Oliveira, , Doca Paz, João e Arthur, Sueli Ribeiro, Efraim Queiroz , Leandro Morgado, Thiago Mendonça, Thiago Lucas, Luiza Folle, Marta Oliveira, Dropbox, Fundo de Apoio à Cultura (FAC) e colaboradores. Apoio


Esta edição também contou com financiamento coletivo, promovido pelo Catarse www.catarse.me


Carta das Editoras Não há outro jeito de apresentar a terceira edição da Nil sem dizer que, não fosse a doação das 112 pessoas que apoiaram o projeto no Catarse, além das diversas outras que divulgaram a iniciativa de financimento coletivo para impressão da Nil #3, ela não estaria sendo folheada. Portanto, mais do que nunca, esta edição é especial, refletindo seu caráter colaborativo e dedicada a todos que acreditam na arte como respiro de vida, a todos que acreditam na Nil. Nesta edição, desfilamos arquitetura, fomos movidos pela paixão dos dançarinos da cidade, nos inspiramos na vida-arte de Gisele Santoro, exploramos o mundo das editoras da capital, descobrimos a arte de andar

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pelas ruas de Brasília, viajamos até Amsterdã para sentir as cores de sua cultura visual e caminhamos na fronteira entre influência e plágio. A Nil conta com o investimento do FAC (Fundo de Apoio à Cultura) e, além da revista impressa, possui um site com a versão digital da revista e notícias atualizadas regularmente. Clarissa Gianni Editora


Colaboradores Felipe Cavalcante, 27 anos, Brasília O que faz Desenha O que fez na Nil Desenhou e diagramou a matéria encontros e desencontros O que pensa assim que acorda penso muito não... mas rola uma fome. Artista Só fui conhecer o trabalho em escultura do Isamo Noguchi esse ano, bem impressionante. Me sinto Nil quando... Vejo projetos bacanas realizando coisas grandes. Henrique Eira, 24 anos, Brasília O que faz terminando desenho industrial na UnB. O que fez na Nil dei a cara da matéria guardado na memória O que pensa assim que acorda PQP! já era preu tá lá! Artista atualmente, Candy Chang Me sinto Nil quando... encontro poesia na gente. Luísa Malheiros, 22 anos, Brasília O que faz estudante de desenho industrial O que fez na Nil tecidos no concreto O que pensa assim que acorda mas já?! Artista Marlene Dumas Me sinto Nil quando.. o acaso me vem com uma surpresa boa. Janaína Miranda, 24 anos , Brasília O que faz fotógrafa O que fez na Nil fotos para a matéria Memória, com Gisele Santoro O que pensa assim que acorda Infinitamente variável... desde "que sonho doido" até a criação de listas Artistas Andrei Tarkovsky, Robert Smithson, David Lynch, Francesca Woodman... Me sinto Nil quando... sinto o vento no rosto

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Taís Meireles, 23 anos, Brasília O que faz redatora em uma agência de publicidade e repórter de moda nas horas vagas. Escreve toda semana no blog da Nil e edita um blog de moda (www. maisglam.com) O que fez na Nil escreveu a matéria tecidos no concreto O que pensa assim que acorda mais cinco minutinhos? Artista Audrey Hepburn Me sinto Nil quando... escrevo. Paulo Fehlauer, 31 anos, São Paulo O que faz fotografia, vídeo, contabilidade, café... O que fez na Nil matéria Eu copio, tu copias, Bob Dylan copia O que pensa assim que acorda café! Artista meio escritor, meio artista: W. G. Sebald Me sinto Nil quando... termino de ler um bom livro. Vitor Schietti, 26 anos, Brasília O que faz fotógrafo, cinegrafista e empresário O que fez na Nil produzi as fotos que ilustram a matéria Cidade de Palavras O que pensa assim que acorda Era tudo apenas sonho? Artista Andreas Gursky Me sinto Nil quando.. completo trabalhos que toquem as pessoas, que as façam pensar, sorrir, mudar. Rafael Viana de Araújo, 28 anos , Brasília O que faz fotógrafo O que fez na Nil procurei acentuar as semelhanças entre moda e arquitetura, para a matéria tecidos no concreto. O que pensa assim que acorda Putz! Tenho certeza que estou muito atrasado... Artista Thom Yorke Me sinto Nil quando... Vejo as pessoas deixando seus respectivos egos de lado e se dando ao máximo por trabalhos em equipe.

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Rodrigo Leite Botero, 30 anos , Uppsala/Suécia Rafael Santos Vato

O que faz tatuagem O que fez na Nil ilustrei O que pensa assim que acorda mais 5 minutos Artista de cu é rola Me sinto Nil quando.. tento ajudar a tirar minhas amigas da cadeia. Luísa Vieira, 26 anos, Brasília O que faz designer O que fez na Nil matéria Beleza Efêmera O que pensa assim que acorda o de sempre: mais cinco minutos... Artista ixi, só um? Gosto muito do Klimt Me sinto Nil quando... inspiro roxo, expiro azul... Tiago Ferreira, 26 anos, Brasília O que faz trabalho no Grande Circular. O que fez na Nil diagramei e fiz letterings da matéria Cidade de Palavras. O que pensa assim que acorda será que eu vou conseguir levantar? Artista Friends With You Me sinto Nil quando... fico ajustando dois toquinhos prum lado, dois pro outro... Pedro Oliveira, 26 anos, Brasília O que faz jornalista O que fez na Nil escrevi o conto Formigas O que pensa assim que acorda Em dormir mais Artista Marçal Aquino Me sinto Nil quando.. Ouço música com fones de ouvido. Natália Keshi, 25 anos, Brasília O que faz diretora de arte e musicista O que fez na Nil direção de arte das fotos da matéria Cidade das Palavras O que pensa assim que acorda que os sonhos bons não se acabem Artista todos que sejam de verdade, e não enlatados. Me sinto Nil quando.. algo inexplicável se explica por si só. 7


Reprodução / Arquivo Público DF


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agradecimento

catarse

cidade de palavr

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eu copio, tu copi

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A impressão da Nil #3 foi possível graças a uma campanha de financiamento coletivo, realizada no site Catarse. Foram 112 apoiadores e superamos os 100% da camapanha com 10% a mais. A Nil agradece a todos que apoiaram, todos que divulgaram a campanha e aos artistas colaboradores Rodrigo Botero, Gabriel Luan e Rodrigo Level, sem os quais nada disso teria sido possível. A todos listados abaixo, bem como os que escolheram permanecer anônimos, nosso muito obrigado. Nil Alessandra Milleo Art Family Tattoo (3) Alexandra Martins (33) Aline Sousa Amanda D. Ana Carolina Matos

Ana Cecília Schettino Ana Luiza Lima Ana Paula Avila (2) Breno Salgado (4) Bruna Bulnes Bruna Neiva

Bruno Mendonça Lelo Taitson (18) Camila Mesones Camila Muradas Carlos Pedro Sant'ana Carol Matias (5) Carol Lisboa Cassiana Umetsu (6) Cassio Kitazato (7) Cesar Gianni Cia Teatral e Espaço Cultural Mapati (32) Cícero Fraga (9) Coletivo Garapa (13) Curoxima Daniela Marinho (10) Demian Machado Walendorff Eduardo Barves (11) Efraim Queiroz Évelin Paim (8) Fernanda Frias Fernando Teles Gabriel Camattari Gabriel Fries

Gaia Diniz Geraldo Neto (14) Giovanna Lettieri Glauber Vieira Ferreira Gustavo Anschau Rick e Gabriela

Mengarda (12) Hannah Ralha (15) Helise Oliveira Henrique Eira (16) Hiram Miller Isabella Brandalise João Victor Militani Jordam José Calazans José Roberto Ribeiro (1) Juliana Holanda Juliana Albuquerque Karla Couto Larissa Souza Lavina Chades (17) Leni Gaspar Leonardo Vitor Hugo da Costa Lílian C. Moreira (19) Livia Holanda Luã Leão Lucas Gehre Luciana Bastos Luda Lima (30) Luísa Malheiros Maria Lopes Maria Paula Dias Mariana Lima Mariana Tesch Keka Bego Marina Fernandes (21) Mário Júnior (a.k.a. mariogogh) (22)

Mauricio Fonteles Mauro Nunes Nadine Diel Nahira Salgado Naiara Caldas Nayara Güércio Paulo de

Tarço da Silva Paulo de Mello Vieira (23) Pedro de Oliveira Pedro MacDowell Pedro Valadares Rafael Lobo Rafaela Camelo (24) Rafaela Lima Artéria (26) Rede Candanga (34) RED Empreendimentos Culturais Renata Teles (25) Renato Moll Rodrigo de Oliveira (31) Rogerio Camara Samanta Gianni Sueli Ribeiro de Souza Quitéria Paulina de Souza Susane Lima Taiom (27) Taís Meireles Talita Ferreira (28) Tauana M. Teo Horta Thais Erre Thales Fernando Tiago Gabriel Valéria Moraes Varanda (29) Vitor Schietti Vivian Campelo (20) Viviane

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foto Vitor Schietti texto Patrícia Colmenero

De todas as formas de arte, é possível afirmar que a literatura é a que menos encontrou o seu lugar ao sol na capital. Escondida atrás de saraus ocasionais e nem sempre muito divulgados, a produção brasiliense resiste.


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urante a produção da Nil #2, foi pautada uma matéria sobre autores brasilienses publicados pelas grandes editoras. Cinco destas grandes editoras brasileiras foram consultadas e o resultado foi que a matéria nunca foi feita, porque nenhum autor brasiliense havia sido publicado por elas. Mas, Florence Dravet, uma das criadoras da editora de Brasília, Casa das Musas1, acredita que o assunto não é de todo negativo e, se as grandes editoras não querem os brasilienses, os candangos querem: “Em Brasília, como em qualquer outra cidade, há autores e leitores, há talentos (por que não haveria?). Não há grandes editoras, portanto, há espaço para as pequenas. Na minha opinião, isso é bom, porque editoras como a nossa conseguem aos poucos conquistar espaço (um espaço muito mais imaginário do que mercadológico). Mas, como em qualquer outra cidade, aqui dominam as grandes editoras nacionais e internacionais. O que é importante é trabalhar nas margens. Às vezes, isso cansa, mas, outras vezes, isso pode ser sentido e percebido como

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uma grande força: a força de resistência!”, afirma Florence. Do lado da resistência, a revista Nil entrevistou as editoras da cidade, e um escritor que, desde 1977, publica seus livros. A Nil trouxe também uma contribuição lá do lado de cima do continente para encher o cerrado de inspiração .

A editora brasiliense Sala de Convergência2 surgiu do desejo apaixonado do professor, jornalista e poeta Luiz Martins da silva (responsável pela leitura crítica dos trabalhos), que vê a edição como uma missão social e cultural, e também da enorme quantidade de trabalhos bons, tanto de pesquisa quanto literários, que eram inéditos no mercado. A editora é recente, tendo lançado o seu primeiro livro em agosto de 2011 e mais dois livros desde então, todos na área de pesquisa. Porém, Fernando Barros, responsável pelo setor de Visão Estratégica de Mercado da editora, avisa que há uma grande expectativa na área literária. De acordo com Fernando, existe uma razão evidente para tantas obras relevantes não terem conquistado o seu espaço ainda:



líbrio de 300 livros vendidos por seu valor de face, normalmente o total de exemplares que imprimimos em cada edição. A partir da venda do 301º exemplar, o autor passa a ser sócio da Sala em cotas iguais, depois de descontados os custos de reedição. Normalmente as gráficas trabalham exigindo um mínimo de mil exemplares impressos. Esse limite impõe um custo muito alto e isso tem se transformado numa barreira intransponível para muitos autores. Nós conseguimos contornar esse problema”, explica Fernando.

“A razão é fundamentalmente de ordem econômica. Existem poucas editoras com foco na valorização do autor e o motivo é que o livro é um enorme desafio financeiro para as empresas. Nós compreendemos isto. Sabemos das dificuldades, mas aceitamos o desafio de criar alternativas para o problema... Temos um dever com a nossa cidade: o fundamental é conseguir transformar em produto cultural todas as manifestações aqui produzidas”. Para viabilizar financeiramente a produção e tornar possível esse desafio da editoração, a Sala propõe uma sociedade entre editora e autor. “Precisamos – a Sala de Convergência e o autor associado – atingir o ponto de equi-

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Para Fernando, a Sala pretende colaborar para o enriquecimento literário da capital, privilegiando o autor. “Não existem amarrações contratuais que submetam eternamente o trabalho do autor ao jugo da empresa. Na verdade, cuidamos do autor muito além da impressão. Dedicamos parte considerável do nosso tempo ao aconselhamento editorial e montamos toda a estratégia de divulgação”, afirma Fernando pela equipe, que já possui experiência de lançamento de mais de 200 livros. Já a LGE Editora3, editora também de Brasília, para permitir que novos autores tenham a chance de publicar, divide a conta: “A forma encontrada foi a da participação financeira do autor em edições por demanda” e, segundo Antônio Navarro, Diretor Executivo e Editor Chefe, “todos os autores hoje renomados, passaram também por essa fase”. A editora publica obras de literatura infantil, juvenil e para adultos, tendo já editado mais


de 350 títulos. Porém, o leitor do Distrito Federal parece ainda precisar se desenvolver para que o mercado literário possa imprimir tudo o que produz: “Não vou dizer a você que Brasília lê muito, porque esse é o índice estatístico mais vergonhoso do país. Estamos ainda em um processo de transformação, com a implantação de novas bibliotecas, com a ampliação da leitura nas escolas e programas de incentivo à leitura. Teremos um futuro mais promissor, com certeza”, declara Antônio.

conta Antônio Navarro.

Na editora Casa das Musas, como já invoca o nome, o objetivo é trazer um pouco de beleza para o mundo, com os belos discursos que os gregos tanto gostavam: “O meio editorial é cruel como qualquer outro mercado, mas o propósito da nossa editora é fugir um pouco dessa crueldade, trazer um pouco de ar fresco, trabalhar um livro bonito, cuidar da edição. Outras vezes, é baratear uma edição universitária que pode atender aos estudantes... Enfim, temos atuações variadas. Só não somos nem convencionais, nem comerciais”, afirma Florence Dravet. Na Casa, os autores têm que possuir suas próprias fontes de financiamento e os livros só são aceitos após análise do conselho editorial. A editora já publicou alguns romances e contos, mas o seu foco principal, na literatura, é a poesia: “Publicamos bastante poesia, que tem pouco espaço no mercado e nas

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garante Florence Dravet.

editoras comerciais e, no entanto, tem muita gente fazendo poesia de qualidade. Então, tentamos atender a essa realidade. Publicar poetas desconhecidos, que não vão ficar famosos através da Casa das Musas (pelo menos por enquanto), mas que, pelo menos, terão o prazer de ver seus livros publicados e disponíveis para a leitura”, explica Florence. Para Florence, a razão de não existir um mercado literário em Brasília, como existe no Rio e em São Paulo, não é a falta de uma formação cultural de autores e leitores, mas sim a falta de uma infraestrutura adequada. “Aqui em Brasília não há distribuidoras, todas se concentram no Sudeste. As livrarias que dominam o mercado são nacionais e internacionais”, explica ela, que conta que a Casa não tem pretensões de sair das margens do mercado, quer continuar publicando desconhecidos e “fazer a felicidade de poucos”. “É difícil, mas nunca procuramos o caminho da facilidade”, garante a co-criadora da Casa das Musas. Mas o caminho das editoras não é o único que leva ao livro publicado. Nicolas Behr4 é o escritor mais famoso da capital. Conhecido por circular nas asas do avião, sempre com seus livros, para vender ou trocar, o autor aposta no método da auto-publicação desde 1977.

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Seu primeiro livro virou um Best-seller, tendo vendido 8.000 exemplares de mão em mão. Iogurte com Farinha foi feito em mimeógrafo, e já refletia o desejo de um escritor de ser publicado, mesmo sem a ajuda de uma editora: “Eu gosto de fazer livros, tenho uma relação muito orgânica com eles. Escrevo, edito e publico. Antes, nos tempos dos mimeógrafos, nos anos 70, eu mesmo os imprimia. Meu primeiro livrinho mimeografado foi impresso gloriosamente nas dependências do Colégio Setor Leste. E agora aprendi um programa de edição de livros ‘maravilha’. Mas é bom ressaltar que os meus dois melhores livros - Laranja Seleta e Brasilíada - foram editados por profissionais do ramo, com pouca intervenção pessoal minha”, conta o escritor. Nicolas já foi estrela do curta-metragem Braxília, dirigido por Danyella Proença e vencedor de três prêmios no CinePE e mais três no Festival de Brasília, e já teve seu perfil biográfico escrito pelo jornalista Carlos Marcelo, no livro Nicolas Behr – Eu Engoli Brasília, publicado em 2004, na Coleção Brasiliensis. Quanto à impressão que se tem de que há pouquíssimos escritores publicados em Brasília ou mesmo escrevendo na capital, ele discorda: “A produção literária em Brasília é


intensa, mas, realmente, poucos autores chegam ao conhecimento do grande público. Ou porque são publicações pessoais, auto-edições, de pequena circulação, ou porque não são tão representativas assim”, afirma Nicolas, que dá a dica de outras formas de publicação de guerrilha: “Existe o FAC - Fundo de Apoio à Cultura, do GDF, existe a possibilidade de levantar recursos no comércio local ou o autor pode se auto-financiar. Meus livros têm patrocínio de empresas locais como colégios e restaurantes”, garante ele.

histórias em quadrinhos xerocadas em folha branca comum; pequenos livros, datilografados à maquina e de numeração limitada; até livros produzidos em off-set que contam o diário de viagem de alguém. Tudo produzido por artistas e escritores locais e vendido a preços baixos, como 4 ou 8 dólares.

A visão do Faça Você Mesmo (o famoso DIY, em inglês, Do It Yourself) de Nicolas é trabalhada em larga escala em vários pontos da cidade de São Francisco, nos Estados Unidos. A cidade, hippie por excelência, cerca de 40 anos depois dos tempos das flores no cabelo, ainda carrega seu espírito artesanal e comunitário.

Essa ainda é uma realidade a se conquistar em Brasília e no país. De acordo com o diretor da LGE, “existe no Brasil uma cultura de discriminar o novo autor”, e essa deve ser uma barreira a ser superada por todos os brasileiros para que uma leva de escritores consiga chegar.

Isso só é possível porque o material inédito e local não é rejeitado pela população. Pelo contrário, percebe-se na cidade uma verdadeira moda do DIY.

É comum encontrar, em livrarias que não pertencem às grandes cadeias, tanto livros comerciais comuns, editorados, quando livros feitos à mão. Na Needles & Pens5, vendem-se

Contatos 1 http://saladeconvergencia.com/site/ 2 http://www.lgeeditora.com.br/ 3 casadasmusas1@hotmail.com 4 http://www.nicolasbehr.com.br/ 5 http://www.needles-pens.com/home.html


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texto Patrícia Colmenero fotografia Janaína Miranda ilustração Henrique Eira

“Em 1960, eu dancei na festa da inauguração da capital, em um evento em cima do Congresso. Foi a primeira vez que fui a Brasília. Cláudio Santoro já estava aqui e tinha sido encarregado de fazer um projeto que desse alguma vida cultural à cidade. Ele era amigo da Eugênia Feodora, bailarina russa, e convidou-a para se apresentar em Brasília com a companhia dela, da qual eu fazia parte. Assim que eu conheci o Cláudio, nós nos apaixonamos, e eu acabei me mudando para Brasília para morar com ele. O Cláudio morava com outros 10 professores da UnB no que hoje é o Centro de Dança do DF. Na hora em que eu entrei naquele prédio, eu pensei: esse prédio é perfeito para dança. Todo de vão livre, o pé direito alto... Foi assim que começou essa história.

encher as vagas; mas, no dia, estourou a revolução de 64, ou seja, todos os aeroportos do país fecharam e ninguém pôde vir de outros lugares. Em Brasília, só havia 2 pessoas, que eram a Norma Lilia e a Lúcia Toller, que não passaram no exame. Então, a escola não aconteceu. Mudou o governo e aí que o projeto foi catapultado mesmo.

Cláudio tinha sido convidado para ser o diretor do serviço extra escolar para as escolas públicas. Ele queria fazer um corpo de baile e a ideia era que os seus bailarinos seriam professores nas escolas, oferecendo opção para os alunos de fazer educação física ou formação em dança. Foi feito um concurso para pre-

Na UnB, era horário integral tanto para professores quanto para alunos. Então, você chegava às dez da noite e tinha gente trabalhando. O departamento tinha muito prestígio. Nós tínhamos todos os instrumentos de música antiga doados pela Alemanha, tínhamos uma biblioteca muito grande, também doada.

Em seguida, com a entrada do reitor Zeferino Vaz, a Universidade de Brasília ofereceu todas as condições que o Cláudio precisava para montar o Departamento de Música. Antes disso, só existiam cursos de extensão. A primeira ideia foi fazer uma Faculdade de Música e Dança, como é muito comum na Europa, com as faculdades de artes cênicas e música, focando as óperas.

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O que eu achava mais fantástico é que o Cláudio nunca quis imprimir a personalidade dele nos alunos. Cada um tinha sua liberdade, desde que dominasse o conhecimento. Então, ele era um regente bem rígido, bem europeu e tinha gente que dançava na regência ou jogava merda na parede e dizia que aquilo era música experimental. Para ele, tudo bem, desde que todos tivessem noção de harmonia, de teoria, e conhecessem as bases da profissão. Por isso, o departamento florescia, porque havia uma inquietação intelectual muito grande. O Cláudio já botou vários alunos para estudar balé comigo. Tinha um aluno que era nosso vizinho e ele fazia movimentos muito bruscos para reger e aí o Cláudio mandou ele estudar balé. Ele estudou um ano de balé comigo. Ele era duro, ele exigia muito. Ele era um cara que chegava antes da equipe de limpeza e saía depois de todo mundo. Ele trabalhava quase que 24 horas por dia, porque estava sempre estudando, sempre compondo. No auditório Dois Candangos, depois do almoço, o Cláudio transmitia uma hora de música. Os estudantes comiam no Bandejão (Restaurante Universitário) e depois iam para o auditório ouvir música. O Cláudio colocava desde música africana primitiva até a música

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mais avant-garde. Essa foi uma época fundamental para a Universidade de Brasília. Havia professores de prêmio Nobel dando aula, especialistas em vários departamentos, gente que ganhava 5 vezes mais nos seus países e que veio aqui pelo sonho. Brasília ia ser completamente diferente hoje se não fosse a crise da Universidade. A crise foi porque os militares demitiram 15 professores da Universidade sem nenhum motivo válido. Não houve processo nem nada. Nisso, os coordenadores da UnB se reuniram e disseram que não aceitavam e queriam demissão. O Cláudio era um deles. Depois, os chefes de departamentos pediram demissão e os professores pediram demissão. O negócio chegou a tal ponto que o departamento começou a ser dirigido por um aluno de primeiro semestre. Cerca de 200 professores pediram demissão e a universidade parou. Nosso apartamento foi invadido pelos militares e nós fomos para o exílio na Alemanha. Passamos cerca de 3 anos lá, a convite de um projeto cultural de Berlim, que convidava escultores, músicos, artistas plásticos para dar uma vida cultural à cidade. Lá, fiquei grávida do meu terceiro filho e foi uma gravidez de risco, e os médicos queriam abortar. Aí eu decidi voltar para o Brasil, o meu filho nasceu de 10 meses, e logo depois estourou o AI5.


Antes da crise, a UnB recebia alunos desde 4 anos de idade. Então você calcula o nível da formação. Isso depois da crise acabou. Naquela época, a gente realizava um concerto por semana todo sábado de manhã no auditório, que ficava entupido. Todos os professores paravam de dar aula às 10 para irem para o auditório. A cidade despencava para assistir a esses concertos. Quando nós voltamos para o Brasil, em 78, não era nem obrigatório você ter estudado música para entrar na Universidade. As pessoas não assistiam mais aos concertos, era tudo muito livre e não se produzia o que se poderia produzir. Aí, o Cláudio reinstituiu tudo isso, mas o estrago que você faz de muitos anos

se leva muito tempo para recuperar, e é mais fácil criar do que consertar. Com a volta para a capital, o Cláudio montou a estrutura interna do Teatro Nacional, que estava em fase final de construção, e eu fui convidada a montar a Escola de Dança. Mas nós tínhamos esquecido, depois de tantos anos fora, que, no Brasil, quando muda governo, muda até o cara que leva o cafezinho. Nós chegamos a inaugurar o Teatro, mas entrou a Eurides Brito e colocou o projeto dentro da gaveta. Nós tínhamos, naquela época, muitos convênios culturais internacionais com a Europa. O sistema de luz do teatro era belga e nós tínhamos um acordo com eles e queríamos trazer grandes técnicos para formar candangos

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em todas as áreas. Infelizmente, isso não aconteceu, e a única coisa que o Cláudio conseguiu preservar foi a orquestra, porque ele tinha conseguido um patrocínio que pagava durante uns meses. Mas com o sucesso dos concertos, o governo acabou assimilando a orquestra e a tornou estatutária. O único lugar que não era de funcionário público era o dele. O maestro era nomeado. O Cláudio poderia ter se defendido, mas ele sempre achou que a renovação artística é importante, e a pessoa que se eterniza em um lugar não evolui. Existiam duas propostas para a orquestra na época. Uma delas era a de contratar 100 músicos americanos a preço de dólar, e isso era muito bom para os americanos e muito bom para quem estava regendo, que não teria trabalho nenhum, pois os músicos tocavam sozinhos. Mas o que iria ficar para a cidade, para os jovens, para o mercado de trabalho? A outra proposta era do Cláudio, de pegar os estudantes e professores da Escola de Música e fazer a orquestra. O atual regente da orquestra tinha 14 anos quando o Cláudio o chamou! E aí foi um trabalho duro, porque eles nunca tinham tocado em uma orquestra, não conheciam muitas obras. Não era o resultado sonoro que o Cláudio estava habituado, regendo as grandes orquestras do mundo, mas era uma oportunidade para essa garotada.”

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Ao ser questionada sobre que sugestão Gisele poderia dar para os jovens de Brasília, ela respondeu rápido com o que foi a motivação de toda sua vida: “A única sugestão que eu dou é fazer o que você ama. A vida é muito dura. E se você ainda é obrigado a fazer o que você não gosta... eu não poderia! Uma aluna uma vez veio me perguntar o que eu achava dela virar bailarina. Eu disse: se você acha que vai ser famosa, esquece. Sempre aparece gente melhor, isso é coisa da vida. Mas se você quer ser bailarina, porque você não aguenta viver sem, porque, mesmo na última fila do corpo de baile, você vai estar contente; seja bailarina, porque você vai fazer bem, vai ter sucesso e vai ser feliz. Aí o pessoal fala: “Ai! Mas a dança é difícil demais!”. Não. Tudo é difícil quando você quer fazer bem. Se você for um bom advogado, vai passar as

noites debruçado em processos, vai abrir mão de família, de lazer, de dinheiro. Essa obsessão com ser funcionário público é algo que eu sou totalmente contra. A minha mãe foi funcionária pública por anos. Ela cansou de me arranjar empregos maravilhosos, mas eu preferia trabalhar no Teatro Municipal ganhando menos de um salário mínimo. A luta dela comigo foi essa, coitada. Mas eu teria ficado louca, porque desde pequena eu vivi sempre para a arte. Eu chegava em casa, trancava as portas da sala e podia dançar 3, 4 horas seguidas, sem nunca ter visto um espetáculo de balé ou ter dançado. Com 4 anos eu já me escondia para ouvir música e chorar. Eu escrevia, eu queria ser escritora, eu ganhava prêmios de literatura. Eu sou muito feliz com a história que eu tenho”.

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foto JAAR GEERLIGS | texto LUISA VIEIRA


PROJETO POSTERS IN AMSTERDAM PRESERVA A MEMÓRIA VISUAL DA CIDADE

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Pôsteres. Centenas deles. Em Amsterdã, Holanda, é praticamente impossível andar pelas ruas sem se distrair com alguma ilustração, uma mensagem inusitada ou um arranjo tipográfico extremamente bem feito. Os pôsteres em Amsterdã são indiscutivelmente parte integrante da cultura visual da cidade. Sua natureza, porém, é transitória; dentro de algumas semanas, peças dignas de museu acabam desaparecendo por completo.

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Justamente por isso o projeto Posters in Amsterdam é tão valioso. O arquivo iniciado pelo designer e diretor de arte Jarr Geerligs é uma coleção de fotos de pôsteres encontrados pela cidade. Após manter as fotos durante quatro anos em seu arquivo pessoal, Jarr percebeu que elas poderiam ter mais valor ao serem compartilhadas. Em 2006, criou uma página no flickr para seus registros: “Eu realmente gosto quando as coisas são úteis e acessíveis a todos. Desta maneira, as pessoas podem se inspirar e conhecer o que vem sendo feito na área do design aqui na Holanda”.


Ao fotografar as peças que fazem parte do site, Jarr procura cartazes que “de alguma maneira, agradem aos olhos e à mente”. Os critérios para a escolha podem também variar imensamente: “Procuro um design criativo. Ou um efeito ou técnica especial. Alguns são escolhidos pelas fotos interessantes que são usadas, ou pela ideia ou mensagem que eles contêm. E outros são escolhidos pelo seu contexto, pelo estado em que o pôster se encontra ou, justamente, pela falta de um pôster.” Apesar de admitir não fotografar muitos dos pôsteres que encontra pelo caminho, seu arquivo possui mais de 2600 fotos.

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para saber mais: www.postersinamsterdam.com www.planetjarr.com O resultado desta espécie de curadoria é impressionante. Posters in Amsterdam é um catálogo completo das inúmeras linguagens e estilos trabalhados em diversas frentes do design holandês nos últimos anos. Estúdios comerciais dividem espaço com artistas de rua, calígrafos e ilustradores. Esta diversidade forma uma fonte praticamente inesgotável de ideias e referência para designers de vários países. Desde que o site oficial do projeto foi criado, em 2010, ele foi assunto de inúmeros blogs e divulgado em peso via Twitter. Em 2012, Posters in Amsterdam completa 10 anos e talvez seja o momento de lançar o projeto em forma de livro.

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Além de Posters em Amsterdam, Jarr Geerligs possui outros projetos com seu estúdio Not Just another Team, que também produz objetos de arte e música. Ele prefere não se ater a uma única área, porque “existem muitos caminhos, tanto para descobrir e experimentar... Eu acredito que somos todos mais livres enquanto não nos rotulamos. Assim criamos mais possibilidades”, conta.

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Os braços e pernas de Brasília são formados por diversos dançarinos, de todos os estilos e gerações. Nil Revista entrevistou artistas que atuam no cenário para nos contar sobre a sensação de movimentar a cidade. foto ESTÚDIO CAJUÍNA | texto CLARISSA GIANNI

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“Dançar pra mim é rezar com os pés. É sagrado.”

Rodrigo Mena Barreto dança desde 1994 e a paixão pelo que faz está estampada em seu rosto quando conta sua história. Hoje, o bailarino é uma referência na dança, e sua companhia, a Duo Cia de Dança, é reconhecida em todo o Brasil. A capacitação profissional em Brasília está localizada principalmente nas academias, companhias de dança e seminários. “Eu fiz vários cursos, participei sempre do Seminário Internacional de Dança de Brasília. Das 21 edições, eu devo ter participado de 12. O Seminário é uma das principais formas de capacitação que Brasília possui. Traz muita gente boa de fora, dá oportunidades excelentes pros dançarinos. Ir pra fora ainda é muito caro, então o Seminário é uma das melhores oportunidades pra se qualificar, aprender e conseguir bolsas para estudar no exterior”. Rodrigo estudou e trabalhou sempre na área de dança e nunca quis trabalhar fora de Brasília. Já viajou para o exterior para estudar e trabalhar, mas

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sempre acreditou que valia a pena voltar para sua cidade: “Aqui em Brasília é difícil, muito por causa dessa cultura de ter um emprego público. Mas eu estou aqui porque eu gosto, porque eu quero. Um dos meus maiores motivos pra não desistir foi o apoio dos meus pais. Quem foi comprar minha primeira sapatilha comigo foi meu pai, do meu lado, e eu nunca me esqueci disso”. E Brasília está, cada vez mais, mostrando que é, sim, digna de tanta confiança. Prova disso são os novos estilos surgindo nas academias, que encontram público ávido pela novidade. Dois exemplos são o Jazz Broadway e as Técnicas Sensuais. O Jazz Broadway não é um estilo novo, mas chegou a Brasília há pouco tempo, vindo de Nova York com Rodrigo. “O Jazz Broadway é bem antigo, mas ele ficava preso nos musicais, não ia pras academias. Aos poucos isso foi mudando... Ele engloba vários estilos: Balé, Sapateado, Street, Jazz, tudo isso usando, como trilha sonora, as músicas de obras como


Chicago, Mamma Mia, Burlesque e Fela. O estilo ensina a olhar pra frente, câmera 1, câmera 2, pegar e soltar o microfone, dançar com chapéu, guarda-chuva, cadeira”. Já as Técnicas Sensuais, outro estilo ministrado por Rodrigo, focam na consciência corporal, no movimento que se faz ao mexer no cabelo ou cruzar as pernas. “Você ensina as pessoas a dançar de forma mais sensual, usando elementos cênicos, como um lenço, uma luva. Se você tem consciência de que seu corpo pode funcionar de forma diferente da que ele está habituado a funcionar, você quebra aqueles vícios cotidianos e consegue descobrir que você existe de uma forma diferente. A sensualidade não está na forma que seu corpo tem, e sim como você o usa”. Rodrigo afirma-se feliz com o que faz: “Pra ser um bom artista, você tem que dançar com sua alma. Você tem que se desprender dos preconceitos e dos achismos. Você tem que ser nada mais do que livre”.

“É muito difícil simplificar o que eu sinto quando danço, com palavras. É uma sensação indescritível.” 37


Rayssa Ferreira dança desde os 6 anos de idade. Hoje, com 22, ela diz que não se vê fazendo outra coisa na vida a não ser dançar. Apesar de ter começado no Balé, Rayssa se apaixonou mesmo pelo Jazz e pela Dança Contemporânea: “O Jazz dá margem para muitos novos estilos. E foi daí que surgiu o Stiletto”, conta a bailarina, sobre um estilo novo que está, aos poucos, conquistando o público. “O Stiletto é bem feminino, a movimentação te permite usar o corpo de uma forma muito livre. A base é o Jazz, ele mistura a história do Street Jazz com a onda do gay movement, que estava surgindo nas ruas, nas boates e, assim, foi criado um novo estilo”. No Stiletto, os alunos dançam de salto alto e os movimentos são exagerados, mas sensuais. “Quem começou a dançar Stiletto foram os homens e as drag queens, então é tudo bem caricato. E as cantoras pop também ajudaram a dar um boom no estilo, dando um ar muito glamouroso, mais diva”.

“O Pole Dance é mais que uma arte, é um desafio.”

Com tantas novidades, o cenário da dança na cidade parece estar passando por uma mudança: “Acho que está surgindo uma galera com atitude, mais poder aquisitivo talvez, mais contatos. A velha guarda, Lucia Toller, Giselle Santoro, Norma Lillia, Regina Maura, todo esse pessoal batalhou e conseguiu criar muita coisa. E agora é a vez da nova geração continuar, e eu vejo que esse pessoal está tentando dar um up, procurar novas formas de divulgação. É essa renovação que dá essa visibilidade”.

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Quando questionada sobre a importância da dança na sua vida, Rayssa responde depois de dois minutos silenciosos: “Eu acho que é isso. É esse silêncio. É muito difícil simplificar o que eu sinto com palavras. Nada nunca me fez sentir o que eu sinto quando como eu estou no palco, pra dançar. É uma sensação indescritível. Não consigo explicar”. Alessandra Moreira trouxe mais visibilidade para a Pole Dance em Brasília. Formada em Educação Física, Alessandra também é personal trainer. Alessandra viu na Pole Dance uma oportunidade para trabalhar o corpo, de forma não só a ressaltar a sensualidade, mas também o lado fitness e esportivo da dança: “Eu comecei a trabalhar com a Pole pela parte acrobática, pois você tem ganhos em todos os sentidos. Melhora o corpo, desenvolve resistência, aumenta a auto-estima”. Em Brasília, ainda não há capacitação profissional na área de Pole Dance, então Alessandra foi para o Rio de Janeiro se aprimorar: “Eu conhecia de assistir vídeos, de ler na Internet etc. Comecei a pegar umas aulas com uma professora que praticava como hobby, em casa, e depois de aprender e conhecer mais, eu resolvi ir pro Rio buscar uma certificação. Foi aí que eu me apaixonei. Consegui a certificação pela Federação Brasileira de Pole Dance e voltei pra Brasília”.

Hoje em dia, a Pole Dance é mais divulgada, existem campeonatos, como a recente I Pole World Cup, que aconteceu no Rio, em setembro de 2011, visando à profissionalização, à valorização e até o reconhecimento da Pole como um esporte Olímpico. Apesar de todas essas ações, ainda há muita vulgarização da arte: “Ainda tem muito preconceito, ainda é visto como uma dança de cabaré. Até porque o Brasil é um país machista. Se eu falo que eu sou professora de Pole Dance, o pessoal já acha que é coisa de stripper, nem pensa que eu sou uma profissional qualificada, que estudei para aquilo. As pessoas não sabem o que é e confundem muito ainda”. A Pole Dance está se destacando no Brasil e em Brasília, e Alessandra afirma que esse crescimento vem com qualidade e com reconhecimento: “Toda essa divulgação tira o estigma de dança de boate, e traz uma visão mais profissional”. Alessandra aponta a mídia, o fluxo de informações, os sites de compras coletivas e o acesso a tudo isso como principais fatores propulsores do mercado da dança:“Não é que as pessoas estão descobrindo que querem fazer isso agora. A vontade sempre existiu. Elas só não sabiam pra onde ir. Todo mundo procura sempre uma coisa nova pra fazer”.

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“Eu amo a dança, porque com ela eu posso me expressar sem precisar dizer nada.”

40 Wesley Messias


“Dance. Expresse uma história sem pronunciar uma só palavra. Faça um movimento e, ao final, sinta quantas pessoas ouviram sua prece. Se você conseguir tocar os corações das pessoas com um movimento, você está dançando.” Acompanhando a avó, que era vice-presidente da Escola de Samba de Brasília, Wesley teve seu primeiro contato com o mundo da dança ainda criança. Hoje, é dono de um currículo invejável, ganhou diversos prêmios e é parte essencial da história da dança de Brasília. Trabalhando sempre na área, Wesley formou uma bagagem grande de novos estilos e técnicas. Uma de suas contribuições mais notórias para dança da cidade é no Raggajam, uma interpretação da dança afro-jamaicana reconhecida mundialmente, o Ragga (Dancehall). “Eu fui pra São Paulo fazer um workshop com a bailarina Laure Courtellemont, campeã de Hip Hop, e descobri que ela tinha um projeto, chamado Raggajam, que é a visão dela do Ragga. E eu gostei da proposta, entrei pro grupo dela e trouxe pra cá”. Além do Raggajam, Wesley também é conhecido pelo trabalho no Street Dance, Street Jazz, Lyrical Hip Hop,

além de ser preparador corporal de dançarinos, modelos e atores de teatro e televisão. Todas essas influências ajudaram a criar um outro estilo de dança, bem recente aqui em Brasília, a Sexy Dance: “Eu comecei a notar que muitas meninas procuravam as aulas de Street Jazz, mas elas se interessavam pela parte mais sensual, mais diva. Foi assim que eu acabei criando uma aula de Street Jazz voltada pra mulheres. Comecei a trabalhar com atitudes corporais de modelos e a coreografar drag queens também, o que me fez aprender outras coisas. Então, a Sexy Dance tem a estrutura do Street Jazz, mas ensina como colocar seu corpo no centro, como andar de salto alto, como bater cabelo, como ter atitude”. Wesley afirma que é possível viver de dança, e sua própria história pode ser usada como prova. Sempre fazendo o que gosta, ele já viajou para Portugal , Rússia, Espanha, Itália, Polônia, Alemanha e Estados Unidos, conseguiu destaque na mídia com suas coreografias e sempre participa de festivais, campeonatos e workshops. “Eu me divirto fazendo o meu trabalho. Se você faz bem feito, vai atrás, tem humildade, quer sempre se superar, você vai conseguir se dar bem na sua profissão, você vai ter resultado”.

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Flávio Verne é um jovem dançarino que está começando sua carreira no mundo da dança. Dos seus 18 anos, 7 foram preenchidos pela dança. Flávio atualmente pratica Street Jazz, Vogue e Waacking, sendo, esta última, a modalidade ensina aqui em Brasília: “Sempre tive uma dificuldade imensa em achar um estilo dentro das danças urbanas que eu me sentisse à vontade, que eu me sentisse bem. Em 2008, fiz um curso de Waacking, com a Laure Courtellemont, e me apaixonei por essa dança. Fiquei encantado. Desde então não parei de ir atrás, pesquisar, fazer cursos, conhecer pessoas dessa área etc...” O Waacking é mais uma das novidades no mundo da dança brasiliense. É uma dança que vem do Street Dance, mas tem características próprias: “O Waacking se baseia em movimentos rápidos e distintos de braços e mão combinados com movimentos relaxados de quadris e perna, sincronizados com a música. Esse estilo foi desenvolvido pela comunidade gay nas baladas de Los Angeles, dentro dos conceitos do Locking (estilo de dança funk e dança de rua muito virada para o espetáculo, sempre interagindo com a plateia e com movimentos cômicos)”, explica Flávio. O dançarino também está ativo no movimento de fazer crescer a arte aqui em Brasília, e reconhece seu papel no processo: “Acho que temos muita luta pela frente ainda, pra dança ser devidamente reconhecida, mas pra ser bem sincero, acho que somos muito abençoados por termos um teatro bom, um centro de dança e, o mais importante, profissionais e pessoas que lutam por isso”.

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SERVIÇO Jazz Broadway, Técnicas Sensuais, Sexy Dance, Raggajam e Waacking p Instituto de Dança Juliana Castro 508 Sul, Bloco B, Loja 13, Brasília-DF (61) 3244-4142 Balé e Jazz p Norma Lillia – SCLS 108, Bloco E, Loja 01, Brasília-DF (61) 3242-3883 Stiletto p Escola de Dança Alex Gomes SCRN 712/713, Bloco D, Loja 18 Brasília-DF (61) 3272-7072 Pole Dance p Studio Personal Engenho do Corpo CLN 208, Bloco D, Loja 55. Brasília-DF p Academia World Gym – CSB 02 Lotes 01 a 04 , Alameda Shopping, Taguatinga– DF (61) 3351-1601

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EU COPIO TU COPIAS

BOB DYLAN COPIa

texto Paulo Fehlauer ilustração Rafael Bessa

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Bob Dylan, quem diria, foi acusado de plágio. Quando, em setembro último, a Gagosian – galeria que tem em seu acervo nomes como Richard Avedon, Andy Warhol e Robert Rauschenberg – anunciou a abertura, em Nova York, de uma exposição de pinturas do ídolo da música americana, os olhares do mundo da arte e da música cruzaram-se mais uma vez. Não é incomum ver rockstars e popstars arriscando seus traços na pintura – a lista inclui David Bowie, Marilyn Manson, três quartos dos Beatles, entre outros – mas é bastante frequente que esses trabalhos sejam vistos com sobrancelhas arqueadas pela comunidade artística, já que a notoriedade musical dos autores costuma inflar as cotações para além da qualidade estética das obras. Mas Dylan não é marinheiro de primeira viagem – já expôs na Alemanha e na Dinamarca – e há algum tempo experimenta em outras áreas, como a literatura e o cinema. Todo esse currículo poderia absolvê-lo do estigma

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do rockstar-pintor, mas o que chamou a atenção de algumas pessoas quando a exposição na Gagosian foi aberta ao público não foi a qualidade do trabalho em si, mas a curiosa semelhança de algumas de suas obras com fotografias de profissionais também mundialmente conhecidos, como Henri Cartier‑Bresson. Confrontadas as telas com as fotografias, é impossível negar a relação. De acordo com a galeria, a exposição, denominada The Asia Series, traria um diário visual de Dylan em suas viagens ao Japão, China, Vietnã e Coreia. Após ser questionada quanto à originalidade das telas, a Gagosian limitou-se a citar um trecho de uma entrevista com Mr Dylan que consta do catálogo da exposição, no qual ele afirma que seu trabalho se baseia na vida real: “pessoas reais, cenas de rua reais, cenas por detrás das cortinas, modelos vivos, pinturas, fotografias...”


Lida ao pé da letra, a justificativa de Bob Dylan até soa como válida: assim como o Monte Sainte Victoire, no sul da França, que tanto inspirou Cézanne, uma fotografia faz parte do mundo e está sujeita a interpretações e reinterpretações por parte dos artistas. O problema, no caso de Bob Dylan, é que, no lugar de imitar Deus (ou a natureza ou qualquer outra entidade), ele tomou por referência o trabalho criativo de seus pares, e isso, como fomos ensinados, é algo indigno. Na década de 80, a artista norte-americana Sherrie Levine causou certo rebuliço no “mundinho” ao expor, sob a sua assinatura, reproduções idênticas de fotografias históricas de Walker Evans. O ensaio tinha o nome auto-acusativo de After Walker Evans, e, segundo Levine, tinha por objetivo justamente colocar em questão o tema da autoria e da subjetividade: seria possível afirmar alguma originalidade em uma forma de expressão naturalmente reprodutível?

Vinte anos depois, outro artista dos Estados Unidos, Michael Mandiberg, escaneou o mesmo livro de Walker Evans apropriado por Sherrie Levine e colocou os arquivos à disposição para download gratuito em seu website – o projeto foi estrategicamente nomeado After Sherrie Levine (www.aftersherrielevine.com). Os arquivos de Mandiberg vêm acompanhados de um “certificado de originalidade”: uma receita explicando como devem ser impressos e emoldurados para que sejam considerados originais – obviamente, não há limitação de série, uma prática artificialmente incorporada pela fotografia como pressuposto para a atribuição de valor pela escassez. Mandiberg teve menos repercussão do que a exposição de Levine, talvez porque, em tempos hiperconectados e hiperimagéticos (no Facebook, 6 bilhões de imagens são adicionadas a cada mês), questionar a originalidade da fotografia seja um assunto demasiadamente 1980.

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O mundo da arte vive mergulhado em um eterno debate sobre questões de originalidade e subjetividade e sobre os limites entre influência e plágio. O crescimento do mercado de arte e o aumento dos valores das obras de artistas renomados, principalmente na arte contemporânea, aproximam cada vez mais os artistas (e as galerias) dos advogados. Nos Estados Unidos, são comuns as acusações de plágio e violação de copyright. Entre as disputas mais recentes do âmbito fotográfico, está o caso Gordon vs. McGinley. Em fevereiro de 2011, a artista Janine Gordon entrou com uma ação contra o fotógrafo Ryan McGinley, acusando-o de haver copiado suas imagens em “composição, assunto e estética”, em um trabalho publicitário realizado para a marca de jeans Levi’s. Em um extenso documento (http://copyrightem.com/ exhibit-a-to-gordon-opposition), Gordon aponta diversas similaridades entre uma série de fotografias produzidas por ela ao longo de sua carreira e as imagens publicitárias de McGinley. Ao submeter as imagens à análise de um grupo de observadores comuns, o júri decidiu que não havia razões para considerar os trabalhos como similares. Compare os trabalhos e imagine a jurisprudência perversa que seria criada caso a decisão fosse favorável a Janine Gordon.

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O alemão Joachim Schmid é mais um artista que coloca em questão a ideia de originalidade da fotografia e a separação (cada vez menos nítida) entre o que é banal e o que é arte. Desde 1982, ele coleciona fotografias alheias. Iniciou coletando-as nas ruas, mas, com a explosão da distribuição de imagens pela internet, passou a buscar no Flickr os objetos do seu trabalho. Há alguns anos, ele passou a reunir imagens “roubadas” em uma série de livros auto-publicados, nos quais organiza as imagens por temas: de “Comida de avião” a “Isto é arte?”, este último trazendo fotos feitas por amadores que buscam imitar o olhar de grandes fotógrafos. Ao ser questionado sobre os direitos autorais das imagens de que se apropria, Schmid defende que, apesar de reconhecer que seu trabalho opera em uma área cinzenta, a autoria só pode ser reconhecida (e protegida) quando o resultado se encontra dentro de uma mínima faixa de originalidade e a partir de uma intenção — o que, segundo ele, não inclui a fotografia amadora — e lhe permite utilizar as imagens como bem entender. Em um post publicado no blog Conscientious Photographer, o crítico de fotografia Jörg M. Colberg coloca a questão da originalidade novamente em debate: “Quem é dono das torres de resfriamento?” (http://jmcolberg.com/ weblog/extended/archives/who_owns_


Bernd e Hilla Becher

cooling_towers), referindo-se ao clássico trabalho de Bernd & Hilla Becher, dupla de fotógrafos alemães que, entre as décadas de 1950 e 1970, produziu diversas séries que retratam estruturas industriais – entre elas, torres de resfriamento de usinas de energia (http:// www.artnet.com/artwork/425927249/ cooling-towers.html). Sobre o tema, Colberg diz: “Ninguém é dono das torres de resfriamento enquanto assunto fotográfico. Fotografar torres de resfriamento (seja direta ou indiretamente) é uma ideia que qualquer um pode usar. Não há copyright para ideias. O que importa é a execução, o que quer que você faça com aquela ideia”.

Voltando a Bob Dylan, a questão, portanto, é pensar “por que copiar?”. Dylan afirma utilizar as fotografias enquanto “parte da realidade”, tanto quanto uma árvore ou um edifício, o que reproduz, de certa forma, a mesma ingenuidade do fotógrafo amador que imita Bresson. A cópia, nesse caso, reduz-se a um método – bastante utilizado em cursos de desenho e pintura, por exemplo – e o fato de o trabalho haver sido inserido com louvores no circuito da arte acaba por dizer mais sobre o mercado do que sobre o próprio Dylan (que, convenhamos, pertence mais à esfera da música do que das artes visuais). Por outro lado, concordemos ou não com suas posturas, artistas como Sherrie Levine, Michael Mandiberg e Joachim Schmid assumem a cópia como objeto de trabalho e de reflexão. Quanto mais difusas ficam as fronteiras, mais difíceis se tornam os julgamentos. Recentemente, foi criada no Facebook uma página com um título bastante sugestivo: “A culpa é do Duchamp”. Se é que temos que atribuir a culpa a alguém, que seja a ele, portanto. E, em caso de sermos tomados pela ideia de que há alguma novidade em tudo isso, basta lembrar que, daqui a apenas seis anos, seu urinol se tornará centenário.

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Outros trabalhos que lidam com cópia e apropriação: No início de 2011, o fotógrafo Michael Wolf recebeu menção honrosa do tradicional prêmio de fotojornalismo World Press Photo pelo ensaio A Series of Unfortunate Events, construído a partir de imagens do Google Street View. Em sua defesa às críticas que recebeu, Wolf atribui a sua originalidade ao fato de ter fotografado a tela do computador: www.photomichaelwolf.com/ street_view_unfortunate_events/ A fotógrafa americana Penelope Umbrico, que esteve no 7˚ Paraty Em Foco, apropria-se de imagens encontradas em redes sociais e sites de vendas. Um de seus trabalhos mais conhecidos é o Suns (From Sunsets) from Flickr: www.penelopeumbrico.net/Suns/Suns_Index.html A fotógrafa Corinne Vionnet cria sobreposições a partir de centenas de imagens de pontos turísticos encontradas na internet, a fim de mostrar como as escolhas dos turistas já estão marcadas por um imaginário coletivo: www.corinnevionnet.com/site/1-photo-opportunities.html.

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Corinne Vionnet


O Concurso Nil de Fotografia contou com inscrições de cerca de mil fotografias de 17 estados brasileiros. 3 Fotógrafos receberam o prêmio em dinheiro, no valor de 3 mil reais, e outros 7 fotógrafos receberam menção honrosa. As 10 fotografias estão publicadas nesta edição da Nil. O tema do concurso é “A Sutileza”. Susana Dobal, fotógrafa e professora da Universidade de Brasília, e André Luis de Carvalho, fotógrafo e atual professor da Universidade Federal de Ouro Preto/MG, foram os jurados convidados do concurso e, representando a Nil, participou a fotógrafa e diretora de arte Flora Egécia. A Nil agradece a todos os inscritos.

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Jurados convidados Susana Dobal

André Carvalho

Susana Dobal é fotógrafa e professora na Universidade de Brasília. Fez mestrado em fotografia (International Center of Photography & NYU), doutorado em História da Arte (CUNY/Graduate Center). Participou de mais de trinta exposições em Brasília, Rio de Janeiro, São Paulo, Nova York, Madri, Buenos Aires e Nice. Foi uma das fundadoras do grupo Ladrões de Alma. Publica artigos sobre fotografia, cinema, arte e o livro Peter Greenaway and the Baroque: writing puzzles with images (2010).

André Luis Carvalho possui graduação em Comunicação Social, com habilitações em Publicidade e Propaganda e em Jornalismo, e mestrado em Comunicação, pela Universidade de Brasília. Foi professor da Universidade Católica de Brasília, coordenou o Núcleo de Fotografia Captura (UCB) e esteve à frente da Direção do Curso de Comunicação Social (UCB). Atualmente é professor efetivo da Universidade Federal de Ouro Preto/ MG. A ênfase de sua atuação acadêmica e profissional é em Fotografia.

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VENCEDORES

Mรกrcio Lima

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Janete Anderman | www.janeteanderman.com

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Ana Carolina Matias | www.carolmatias.com

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MENÇÃO HONROSA

Bruno Bravo www.flickr.com/brunobravo

Mayra Lins mayralins.virb.com

Helder Faria www.flickr.com/9804034@N04 56


Petrônio Neto

Léosalvato

Joyce Nabiça

Andrés R. Marín www.clubedaserpentejc.wordpress.com


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Não é o ângulo reto que me atrai nem a linha reta, dura, inflexível, criada pelo homem. O que me atrai é a curva livre e sensual, a curva que encontro nas montanhas do meu país, no curso sinuoso dos seus rios, nas ondas do mar, no corpo da mulher preferida. De curvas é feito todo o universo, texto Taís Meireles

o universo curvo de Einstein

foto Rafael Viana Oscar Niemeyer

As curvas de prédios como o Congresso Nacional e a Catedral de Brasília consagraram Oscar Niemeyer como um dos maiores arquitetos do mundo. Sua principal fonte de inspiração? Os traços do corpo feminino. Assim como estilistas que esculpem tecidos para valorizar as mulheres, Niemeyer traduz as formas delas para o concreto. Dessa forma, a moda e a arquitetura podem ter uma relação ainda mais convergente. Afinal, ambas são baseadas na forma, na estrutura e no embelezamento de necessidades básicas do ser humano: roupas e abrigos. “Roupas e casas se tornam uma extensão de quem as habita”, sintetiza Jum Nakao, um dos estilistas brasileiros mais influenciados pela arquitetura moderna. É dele um desfile memorável, em 2004, na São Paulo Fashion Week, quando modelos vestidas em estruturas gigantescas de papel foram à passarela e rasgaram as próprias roupas ao final. A apresentação foi considerada como o desfile da década pelos críticos de moda no Brasil e como um dos mais importantes do século pelo Museu de Moda de Paris.

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Assim como Jum Nakao, a designer brasiliense Stefania Rosa segue os caminhos traçados pela arquitetura para criar peças de moda, nas quais as estruturas e as formas têm ainda mais valor que o produto final. “Vejo a modelagem da roupa como uma verdadeira arquitetura. O manuseio do tecido no manequim de modelagem possibilita a criação visando à tridimensionalidade e proporcionando formas inovadoras. É pura geometria”, comenta. Formada em moda e especializada em História e Teorias da Arte, Stefania explica que edifícios arquitetônicos sempre serviram de inspiração para o design, em suas mais diversas áreas, incluindo a moda. “Formas arquitetônicas se transformam em silhuetas, colunas fazem surgir shapes lânguidos”, afirma. Para ela, essa relação concentra-se principalmente no estudo da forma na concepção das roupas.

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No entanto, as inspirações arquitetônicas no universo fashion também podem surgir de forma literal, como na coleção inspirada na arquitetura de Brasília desfilada em 2010, no Fashion Rio, pela marca brasiliense Apoena. A estilista responsável pelo desfile, Kátia Ferreira, conta que a inspiração, parafraseando Niemeyer, veio como um sopro. “Usamos conceitos sinônimos dos dois universos: formas, curvas, linhas retas, estruturas ora rebuscadas, ora clean”, resume. Para Kátia, a relação entre a moda e a arquitetura tem mais a ver com a inspiração do que com a interdisciplinaridade. “Além disso, acho que as qualidades de um bom designer de moda e de um bom arquiteto são basicamente as mesmas”, opina. Outras marcas que recentemente se inspiraram na arquitetura para produzir suas peças foram a Maria Bonita e a Ronaldo Fraga, ambas com coleções baseadas no trabalho de Athos Bulcão, arquiteto e azulejista responsável por murais como os da Igrejinha da 307/308 Sul e do Instituto de Artes da Universidade de Brasília. Nas duas coleções, desfiladas na São Paulo Fashion Week em janeiro de 2011, a geometria de Bulcão serviu como mote para as estampas das roupas e acessórios das marcas.

1 Márcio Madeira

Nakao explica que concebe suas coleções pensando sempre além do simples ato de vestir. “Projetar uma casa é muito próximo de vestir uma pessoa, pois o que vestimos na realidade é a relação do usuário com o entorno. O que eu modelo e esculpo não é o papel, o tecido, o espaço, mas sim a percepção humana”, reflete o estilista.


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Assim como a Maria Bonita, a Osklen, do estilista Oskar Metsavaht, desfilou, no inverno de 2010, uma coleção baseada no conceito da moda tridimensional, com roupas quase engessadas, que lembravam as rígidas estruturas de um prédio. Nesse caso, a inspiração veio da arquitetura de uma forma geral. Já a estilista Glória Coelho usou a arquitetura como fonte de referência por dois anos seguidos. No verão de 2010, criou peças baseadas nas for-

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mas do norte-americano Frank Gehry. As roupas apresentadas na São Paulo Fashion Week remetiam claramente às linhas sinuosas do arquiteto, além do uso de cores sóbrias inspiradas nas placas de titânio, frequentemente trabalhadas por Gehry. Na edição de verão de 2011 do mesmo evento, Gloria Coelho resolveu mostrar uma coleção inteiramente inspirada na obra do arquiteto brasileiro Ruy Ohtake. Desta vez, as roupas representavam as intensas curvas e o conceito de cheio e vazio do arquiteto, no qual varandas de prédios se transformam em ondas marítimas. Como não podia deixar de ser, Oscar Niemeyer também serviu de inspiração para a moda. No inverno de 2010, Pedro Lourenço, filho dos estilistas Glória Coelho e Reinaldo Lourenço, lançou sua primeira coleção na semana de moda de Paris. As peças, idealizadas a partir da estética de Niemeyer, focavam-se, principalmente, em um de seus marcos na arquitetura: os brises, estruturas para a entrada de luz nos edifícios.

2 Bira Soares / Agência Fotosite

Em 2010, a Maria Bonita já havia se inspirado no trabalho da arquiteta ítalo-brasileira Lina Bo Bardi, responsável pela criação de diversos prédios icônicos no Brasil, dentre eles o Museu de Arte de São Paulo (Masp). A inspiração, daquela vez, havia sido traduzida em tecidos que simulavam o concreto vazado da arquiteta, em pontos de lã semelhantes ao asfalto e em toques de cores que remetiam ao Masp. Apesar da rigidez da arquitetura, a marca soube manter uma de suas principais características: o conforto.


E como qualquer relação é uma via de mão dupla, arquitetos também podem se inspirar na moda. Mais que isso, alguns até chegam a produzir moda. É o caso dos estilistas Mark Greiner, do Ceará, e Lucas Barros, de Alagoas. Ambos têm formação em arquitetura, chegaram a trabalhar na área – Mark Greiner ainda concilia as duas profissões – mas hoje focam seus esforços na moda, utilizando os conhecimentos arquitetônicos para isso. Para Lucas Barros, observar fachadas antigas e portões não é só olhar arquitetura. “O estilo na arquitetura sempre influenciou os adereços e formatos na moda, assim como o uso e o desuso de materiais. Sendo a moda um produto do comportamento social e a arquitetura uma dominante no espaço onde essas relações surgem, a moda acaba sendo o reflexo direto dos conceitos de espaço que a arquitetura traz para a cidade”, filosofa o estilista.

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3 Sandra Bordin

Outro ponto de convergência entre as duas profissões surge quando arquitetos famosos são convidados para colaborações em marcas de roupas e acessórios. Um dos maiores exemplos disso é o trabalho da iraquiana Zaha Radid para a Melissa. O sapato desenhado por Radid, lançado em 2008, tem formas sinuosas e múltiplos recortes, assim como os principais conjuntos arquitetônicos criados por ela. Um terceiro exemplo da integração entre as duas áreas é um projeto lançado em Amsterdã pela dupla Iris van Herpen e Daniel Widrig. Ela é estilista e ele, arquiteto. Juntos, criaram duas coleções de moda baseadas no conceito de vestidos com estampas digitais. Cristalização e Escapismo foram os nomes dados aos desfiles de Amsterdã, em 2010, e de Paris, em 2011, respectivamente. Nas duas coleções prevaleceu a ideia de criar peças mais leves e flexíveis baseadas em formas tridimensionais da arquitetura.

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De qualquer forma, essa ligação entre moda e arquitetura não é tão recente quanto parece. Em seu livro História da Moda (Editora Anhembi Morumbi, 2007), o professor João Braga comenta que, no início do século 20, durante a Belle Époque, a arquitetura e a moda seguiam pelo mesmo caminho. Ambas eram influenciadas pelas formas naturais e pelas linhas curvilíneas. Nos anos 20, as linhas sinuosas da Art Nouveau foram substituídas pela geometria da Art Déco. Nessa época, o estilista francês Paul Poiret criava peças seguindo as linhas arquitetônicas do movimento, com vestidos retos e estampas geométricas. Em seguida, foi Coco Chanel quem trabalhou inspirada pela arquitetura, focando-se

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nos trabalhos do arquiteto Le Corbusier e nas formas da escola alemã Bauhaus. É inclusive da estilista a seguinte frase: “Moda é como a arquitetura, pura questão de proporções”. Já nos anos 60, o também francês André Courrèges criava peças futuristas em materiais sintéticos como o plástico, e tinha como principal fonte de inspiração os móveis do designer italiano Joe Colombo. Mas, sem dúvida, o principal arquiteto da moda foi Cristóbal Balenciaga. Especialista em criar estruturas perfeitas, marcadas pela força das linhas e pelo jogo de proporções, o estilista espanhol havia se formado em arquitetura e, por isso, era capaz de criar, como ninguém, verdadeiras esculturas com tecidos. Essa inovadora volumetria para as roupas não só se


tornou marca registrada da Balenciaga, como influenciou todas as grandes marcas da época. No livro Moda do Século (Editora Cosac & Naify, 2009), François Baudot afirma que Balenciaga conseguia alcançar em suas criações a harmonia perfeita entre silhueta, proporções e postura e, por isso, a arte do estilista aproxima-se tanto da arquitetura.

Lucas Barros

Em visita ao Brasil no ano passado, o arquiteto italiano Francesco Lucchese afirmou que a moda sempre criou suas estruturas, às vezes sutilmente esculpidas em tecido, mas tecnológicas e inovadoras como as formas dos edifícios. “Quando um estilista desenvolve uma coleção, ele escolhe evidenciar aspectos do corpo, criando volumes e texturas. O arquiteto também pode apresentar objetos dessa maneira”, explicou. Além da forma e da função, a moda e a arquitetura se complementam pela bagagem cultural que carregam. Afinal, ambas são espelhos que refletem a história da arte e as tendências socioculturais de um determinado período do tempo.

Iniciado em 2011, o único curso no mundo que aborda a relação entre a moda e a arquitetura é o F(AA)shion, ministrado pela Architectural Association School francesa, no Museu de Artes Decorativas de Paris. Seu coordenador, o designer Jorge Alaya, convida para as aulas estilistas renomados internacionalmente e que têm como principal linha de trabalho a concepção de estruturas arquitetônicas. São artistas como Gareth Pugh, Issey Miyake, a dupla Viktor & Rolf, Jil Sander e o brasileiro Francisco Costa, atual diretor de criação da marca Calvin Klein.

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texto

fotos

design & ilustração

RAFAELA CAMELO e MARINA SEVERINO

PEDRO FRANÇA

FELIPE CAVALCANTE

O curta A arte de andar pelas ruas, da diretora Rafaela Camelo de Brasília já participou de mais de 18 festivais nacionais e internacionais e ganhou 5 prêmios, incluindo o Troféu Câmara Legislativa, no 44º Festival de Brasília do Cinema Brasília do ano passado.


Encontros & desencontros

Eu sei que vou te amar, de Tom Jobim. Primavera e inverno, de Astor Piazzola. Folia de Reis, de Jorge Antunes. Todos os dias, das 18h às 19h, um grupo de pessoas reúne-se para escutar música. As notas de piano ressoam com a classe e estilo que lhe são tão próprios, variando entre o clássico, ritmos brasileiros, até chegar a Mamãe passou açúcar em mim, de Carlos Imperial. Sobre um pequeno palco de madeira, o pianista transforma o shopping Conjunto Nacional de Brasília em uma sala de concertos. Há 28 anos, entre uma agência do BRB, uma brinquedoteca e um banheiro, idosos, senhoras com sacolas de compra e gente gastando tempo respondem ao boa noite da anfitriã Lúcia Garófalo. A apresentação tem plateia fiel também pelo rádio. Um piano ao cair da noite é um dos programas da Brasília Super Rádio FM. Voltada para um público bastante segmentado, com foco nas classes A e B, é esse o momento em que se abre espaço para um espectador diferente. O espetáculo foi o ponto de par-

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tida para o roteiro do curta-metragem A arte de andar pelas ruas de Brasília, que estreou no 44º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, dirigido por Rafaela Camelo. O filme, vencedor do Troféu Candango Câmara Legislativa como segundo melhor curta entre as produções brasilienses, foi baseado numa vivência de infância. Ao olhar de uma criança, aquele cenário fazia do shopping vizinho à rodoviária um lugar mais sedutor, cheio de luxo e classe. Parecia coisa de novela. Esse mesmo lugar foi revisitado anos depois, durante a faculdade. A lembrança do palco de madeira voltou à cabeça, quando uma professora do curso de Audiovisual da Universidade de Brasília propôs um trabalho sobre as emissoras de rádio da cidade. Mas a memória de um espetáculo pomposo não condizia com a realidade simples encontrada no lugar. Da diferença entre o olhar passado e o atual surgiu a primeira cena do filme.


No curta, Um piano ao cair da noite é o espaço onde acontece o desenlace de um amor não correspondido. Logo depois de uma briga, uma das protagonistas escuta a música sendo executada ao vivo, enquanto a outra, sozinha, acompanha a mesma melodia pelo rádio, numa parada de ônibus. As duas são garotas com cerca de 13 anos, estudantes do ensino fundamental em escolas públicas do Plano Piloto, Brasília. A ideia do encontro/desencontro também pautou os outros temas do filme. Todos os dias elas se encontram em um dos vagões do metrô. Dali saem para passar o tempo nas ruas da cidade. A superquadra, a W3 e os blocos da Asa Sul são os cenários escolhidos para viverem as experiências da adolescência. All star, cartinhas escritas com canetas coloridas e iPods carregados com música pop acompanham o primeiro cigarro, o primeiro porre e o primeiro beijo. Os não-lugares, conceito definido pelo antropólogo francês Marc Augé como

um ambiente de passagem, são cenários nos quais as protagonistas buscam definir sua identidade. Andar por Brasília, então, é um desafio. As garotas inventam uma cidade só delas. De segunda a sexta, num vagão de metrô lotado de anônimos, acontece o encontro. Nos pilotis, que servem só de entrada e saída dos moradores, elas dividem segredos. Entre as prateleiras do mercado, a descoberta da paixão por meio de um gesto ingênuo. Como disse Vinícius de Moraes, “A vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida”. Nesse trânsito, a amizade entre Leila e Ana gera uma dúvida. Hormônios à flor da pele transformam um toque em coração acelerado. Mas como ter a certeza do que é o amor, se nunca se amou? A carta lançada pela janela do metrô simboliza, ao mesmo tempo, a tentativa de jogar fora uma memória e o aprendizado de algo doloroso. Porque entre todas aquelas descobertas, a maior ainda é, a possibilidade de amar.

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a arte de andar

O título do curta-metragem é inspirado em um conto escrito pelo mineiro Rubem Fonseca, autor também descoberto durante a adolescência, nas estantes da biblioteca da escola. A relação entre A arte de andar pelas ruas do Rio de Janeiro e a produção brasiliense está na deambulação dos personagens pela cidade, conceito que distingue um artifício usado em filmes de diferentes épocas, temas e abordagens. Com prenúncios na década de 20, passagem importante pelas vanguardas das décadas de 60 e 70 e ecos nos filmes contemporâneos, o cinema de deambulação tem como propriedade personagens que andam longamente. É esse um importante elemento do cinema, capaz de integrar os personagens ao espaço ou, num movimento contrário, evidenciar a sua solidão. Segundo Jean-Claude Bernardet, esse elemento tornou-se um traço estilístico do cinema dos anos 50-70. Personagens que andam a esmo pela cidade também era comum no Cinema Novo e Cinema Marginal. Parafraseando Jean-Claude Bernardet, andar nem sempre é fácil. Há de se pensar no porquê do homem caminhar tanto, pois a estrada é longa e por vezes não se chega a nenhum lugar.

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PORTFÓLIO

 Ramon Batista, 18, brasília (DF)  ramondesenha@gmail.com  urbanhead.tumblr.com Profissão Estudante

Atuação Ainda não tive nenhuma experiência profissional, mas as coisas estão encaminhando para tal.

Interesses Interesse no mundo, tudo pode ser arte, basta olharmos direito. Eu crio porque... tenho necessidade disto, a arte me consome, me faz crescer, pensar, criticar e viver.



 Camila Morita, 32, São josé dos campos (sp) camilamorita@yahoo.com.br www.flickr.com/camilamorita

Atuação Arquiteta e Cenógrafa, exploro outros tipos de expressão nas artes plásticas. Esta parte da criação está toda interligada, então acredito que a pintura seja mais um canal de escape dos pensamentos.

Interesses Processos criativos Profissão Arquiteta

Eu crio porque... ainda não sei te responder.



 Juliana Borgê, 25, Brasília (DF)

Atuação Comunicação visual, produções , arte urbana e mediação.

borge.ju@gmail.com www.flickr.com/juborge

Interesses Artes...

Profissão Artista plástica, ilustradora e designer gráfica

Eu crio porque... Faz parte de mim, uma necessidade de produzir e resignificar .



 Maycon Soldan, 27, São paulo (SP)

Interesses Pela arte irritada.

 mayconsoldan@ymail.com  11 8666.8764  21 7976.8660

Eu crio porque... quero desconstruir a alienação dos clicks descontrolados. Acredito que o processo de criação passa pela pesquisa, construção de uma linguagem e apropriação das coisas que já existem ou não.

Profissão Fotógrafo e Gestor de Projetos Sociais Atuação Trabalho com projetos sociais na área de promoção do desenvolvimento social e educacional.



 Breno abreu, 26 , brasília (DF)  abreubreno@yahoo.com.br  61 9941.3925

elaborando roupas muito mais feitas para pensar do que para vestir.

Interesses Design, moda, cinema, teatro, ballet, música e artes visuais.

Profissão Biólogo e Designer Atuação Desde a graduação, trabalho para uma marca de moda praia de Brasília, chamada SummerShop, fazendo de tudo, desde a concepção das peças e estamparia até o material gráfico e de divulgação da marca. Gosto de fazer em paralelo um trabalho autoral,

Eu crio porque... faz parte de quem sou. Não conseguiria viver sem criar, seja lá o que for. Crio também porque acredito que podemos fazer a diferença, melhorando o mundo ao nosso redor de alguma maneira.

João P. Teles


Jo達o P. Teles


 Wenderson Fernandes, 32, contagem (MG)  wendersonfotografo@gmail.com  www.flickr.com/wendersonfernandes/ Profissão Fotógrafo Atuação Fotodocumentarista, tenho ao longo dos últimos anos me dedicado à produção de trabalhos autorais.

Interesses Cinema, literatura, excursões baratas pra lugares desconhecidos, coisas pequenas que os outros perdem, música brasileira, poesia escrita ou vivida... Eu crio porque... Tento transformar em imagens as impressões que o cotidiano deixa em mim.



 Guga Baygon, 34 , recife / brasília (DF) gugabaygon@gmail.com (61) 8148.5238 / 3039.1871 Profissão Tatuador/grafiteiro Atuação Há 16 anos entre ruas, galerias, museus, workshops, cenografias e eventos.

Eu crio porque... sempre estou inconformado com o comum, busco sempre não me acomodar e nem me prender a regras, arte livre e libertária! Arte para todos os olhos e almas sem restrição!



 Daniel gallo, 35, campinas (sp) mail@danielgallo.com www.danielgallo.com

nas áreas de publicidade, alimentos e retratos.

Interesses Fotografia, cinema, culinária, arte, viagem.

Profissão Fotógrafo Atuação Publicitário por formação, comecei a trabalhar com fotografia em 1996, desde então atuo

Eu crio porque... me permite escolher como vejo o mundo.



 Fernando Chamarelli, 29, são paulo (sp)

Atuação designer gráfico formado pela UNESP, ilustrador e artista plástico autodidata.

 chamarelli23@gmail.com  www.flickr.com/lfchamarelli

Interesses Pintura, ilustração,design, tatuagem, graffiti...

Profissão Artista plástico

Eu crio porque... preciso liberar personagens e universos que habitam minha mente.



texto PEDRO OLIVEIRA ilustração RODRIGO BOTERO 92


Sentia formigas. Eram muitas, espremiam-se na saída do buraco sujo do meu umbigo e caminhavam agitadas, milhares de pequenas patas em minha pele. Desciam pelo osso da minha bacia e seguiam em fila ordenada pelo colchão. Eu permanecia absurdamente imóvel e observava-as descer pelo pé da cama. Abri os olhos. Há algum tempo eu não tinha um sonho tranquilo. Amanheceu antes de sempre e os pássaros irritantes não cantaram. Abri os olhos naturalmente, consegui assimilar o sol como gostaria. Levantei a camisa. Não saía nada da minha barriga. Não consegui ver da janela nenhuma nuvem. Desci pra comprar cigarro, lembrei do que eu sempre lembrava quando fazia aquele caminho. ** Ela havia me dito que uma mulher que trabalhava com ela morava ali perto. ‘A Marina é sua vizinha’.

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Era um dia estranho de tão bonito e eu tive certeza que a Marina não só era minha vizinha, como fumava dos mesmos cigarros que eu e tinha um par de olhos azuis muito claros, quase brancos, lembrando aqueles cachorros cinzentos. Sorria para quase tudo e parecia ter mais dentes que um cavalo. Eu não gostava disso. ‘Prazer, Renato’. Marina trocou o cigarro de mão e me estendeu a esquerda, gelada. ** Eu gostava de tentar imaginar algum significado ou alguma ‘estética do delírio’ que as formigas que saíam do meu umbigo todas as noites teriam. A verdade é que eu não conseguia enxergar nada além do meu umbigo nem em sonho. Eu era egoísta assim. Se eu conseguisse, aliás, pensaria em Marina, nos seus cigarros de fumaça densa e filtro amarelo e em suas mãos geladas de pessoa morta.

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Conseguira. Eu me deitava e, no transe, enxergava no teto do quarto dois olhos azuis enormes. Olhavam-me de forma doce e convidativa e eu detestava ter aquelas horas desperto interrompidas pelo sono cotidiano obrigatório. ** Ela andava com um cara magro dos olhos fundos. Disse que era artista, acho que fotógrafo. Ele falava muito e talvez até dissesse alguma coisa de útil, mas eu achava que a Marina queria me fazer ciúmes. Foi a única explicação que eu encontrei. Saíamos os quatro e eu bebia muito mais do que o normal. ** Eu normalmente a deixava em casa por último. Parei o carro em frente à porta, ela veio me dar um beijo.


Mordi-lhe de leve na bochecha, que como as mãos era gelada. ‘Eu não quero que você vá embora’, foi o que eu consegui dizer, arrastando meu nariz perto do olho e a boca até o ouvido de Marina. Virou-se para mim com os olhos baixos, decepcionada. Fez-me sentir desprezível, exatamente como queria. ‘Você não pode falar tudo que tem vontade’. ‘Eu também não queria ir embora’. E saiu. Fiquei ali parado outros dez minutos. Voltei para casa e me deitei, na pretensão de recuperar o sonho desperto das noites passadas. Nada. Demorei muito, mas dormi. Acordei assustado, as formigas agora corriam ensandecidas, descontínuas e sem sentido. Estavam também em maior número, maiores e mais agressivas. Aquelas garras enormes à frente dos olhos abriam e fechavam ruidosamente, como nos filmes. E todas elas saíam do meio da testa de Marina.

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