Exposição "Fortaleza de Peniche: Baluarte de Liberdade"

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1527

Segundo o recenseamento efetuado a mando de D. João III existiam em Peniche (de Cima) 47 vizinhos, e na Ribeira (Peniche-de-Baixo) 144 vizinhos, num total de cerca de oitocentos moradores.

1544

15 de julho – No seguimento de um forte ataque realizado por corsários e piratas franceses, D. Afonso de Ataıd́e, Conde de Atouguia, escreve a D. João III informando da necessidade de proceder à defesa do lugar e porto da Ribeira (Peniche-de-Baixo).

1557

São iniciadas as obras de fortiicação de Peniche, por ordem do rei D. João III, que ordena a D. Luís de Ataíde, 3º Conde de Atouguia, a construção de um baluarte, com sua torre, no sıt́io do Alto da Vela. Em 1558, é concluıd́a a construção do Baluarte Redondo.

1589

26 de maio – Desembarque de exército luso-britânico, constituıd́o por cerca de 20 000 homens, liderado por D. António, Prior do Crato, que, tomando a Fortaleza, marcha até Lisboa, numa tentativa que se revela falhada de restauração da soberania nacional.

1609

12 de novembro – Filipe II eleva Peniche a vila e sede de concelho.

1642

31 de maio – O Conselho de Guerra, instituıd́o pelo recémcoroado D. João IV, referindo-se ao atraso nos trabalhos de fortiicação de Peniche assinala ser esta “praça de tão grande importância e a principal chave do Reyno pela parte do mar”

1645

Conclusão dos trabalhos de construção da Fortaleza de Peniche, por D. Jerónimo de Ataíde Em 1671, será inalizado o pano amuralhado da praça militar, ligando a penıńsula “de mar a mar”, segundo inscrição patente no Baluarte Redondo e que originalmente estaria exposta no Forte das Cabanas.

1698

E criado o Terço de Peniche que, em 1707, passa a ser designado de Regimento de Infantaria de Peniche.

1759

Janeiro – No âmbito do chamado processo dos Távoras, movido pelo Marquês de Pombal, as propriedades dos Ataıd́es (familiares dos Távoras) são coniscadas, e as suas armas, existentes no Baluarte Redondo e na Porta de Armas da cidadela, são picadas.

1793

Abril – O Regimento de Infantaria de Peniche participa valorosamente, entre 1793 e 1795, na chamada Guerra do Rossilhão, entre Espanha e França, recebendo o privilégio de inscrever na sua bandeira a divisa “Ao valor do Regimento de Infantaria de Peniche”

1807

8 de dezembro – Entra na praça militar de Peniche um contingente militar franco-espanhol, sob o comando do general Thomières, que icará instalado na Fortaleza.

1824

Transferência para a Fortaleza de Peniche de uma centena de liberais, de entre os quais se contavam o general Bernardo Correia de Castro e Sepúlveda e o Marquês de Fronteira, provenientes das cadeias do Castelo e do Limoeiro, em Lisboa.

1833

25 de julho – Correndo a notıćia da derrota das tropas miguelistas do General Telles Jordão, a guarnição da Fortaleza abandona a praça militar em direção a Coimbra. Nesse mesmo dia, as tropas liberais, lideradas pelo barão de Sá da Bandeira, ocupam a Fortaleza.

1837

19 de outubro – Explosão num dos paióis da Fortaleza, seguida de incêndio que destruiu o Palácio do Governador da Praça, de traça seiscentista.

1868

Instalação de Depósito de Emigrados Espanhóis constituı́do por militares que haviam participado no fracassado golpe liberal de 2 de janeiro de 1866, liderado pelo General Juan Prim.

1894

2 de junho – Depósito de Emigrados Brasileiros na Fortaleza. Internamento, até 1895, de grupo de 148 refugiados polı́ticos brasileiros, que participaram na Revolta da Armada de 1893 contra o governo republicano de Floriano Peixoto.

1901

Chegam a Peniche 368 refugiados boers, provenientes da Africa do Sul, que icam internados na Fortaleza, e noutros locais da vila, até 18 de julho de 1902.

1908

Visita no âmbito da obra social do jornal republicano “O Século”, com o objetivo de avaliar a possibilidade de instalação de um sanatório para doentes tuberculosos na Fortaleza.

FORTALEZA

DE PENICHE

1917

Durante a 1ª Guerra Mundial, é instalado na Fortaleza um Depósito de Concentrados de nacionalidade alemã e austro-húngara. Estes prisioneiros serão libertados apenas em outubro de 1919, após a assinatura do Tratado de Versailles.

1934

E instalado na Fortaleza o Depósito de Presos de Peniche, destinado a albergar opositores ao regime ditatorial do Estado Novo. Este estabelecimento prisional adapta, de forma sumária, as construções anteriores da fortiicação.

1953

Iniciaram-se obras de arranjo e adaptação da Fortaleza a estabelecimento prisional, um conjunto de blocos prisionais segundo o modelo americano. Nasce a chamada Cadeia do Forte de Peniche

1960

3 de janeiro – Dá-se a mais relevante das diversas fugas registadas da prisão polıt́ica. Evade-se da ala de alta segurança do Bloco C um coletivo de membros do Partido Comunista Português, no qual se destaca Álvaro Cunhal, lıd́er histórico deste partido.

FACTOS E FIGURAS

1974

Libertação dos presos polı́ticos após o triunfo da Revolução dos Cravos. Nos dias 26 e 27 de abril e 1 de maio, a Democracia é saudada por expressivas manifestações populares junto à Fortaleza

Após a Revolução de 25 de abril, a Fortaleza receberá, até fevereiro de 1976, um contingente composto por exagentes da PIDE-DGS.

1977

21 de setembro – Funciona na Fortaleza o Centro de Acolhimento de Refugiados de Peniche, dirigido pela Cruz Vermelha Portuguesa, recebendo mais de meio milhar de refugiados/retornados. Este centro encerra em 31 de dezembro de 1982.

1984

A Câmara Municipal de Peniche instala na Fortaleza várias valências de natureza cultural e lúdica, com destaque para o Museu de Peniche (atual Museu Municipal de Peniche), inaugurado a 18 de maio, Dia Internacional dos Museus.

CIDADELA DA PRAÇA MILITAR DE PENICHE

Com a Restauração da Independência nacional, a 1 de dezembro de 1640, teve inıćio um ambicioso programa de fortiicação das fronteiras do reino, de forma a precaver uma possıv́el reconquista espanhola. A assunção de que uma invasão hostil teria uma componente por via marıt́ima motivou a fortiicação da costa portuguesa, com particular destaque para Lisboa e zonas limıt́rofes. Pela sua proximidade à capital e facilidade de desembarque, a região de Peniche mereceu especial atenção.

Em missiva do Conselho de Guerra, criado por D. João IV, datada de 1642, alude-se ao facto de ser necessário agilizar a fortiicação de Peniche por esta ser uma “(…) praça de tão grande importância e a principal chave do reyno pela parte do mar (…)”.

Nas três décadas seguintes, é ediicado um amplo sistema defensivo composto por várias fortiicações e encabeçado pela Fortaleza de Peniche.

Paralelamente, assiste-se à criação e estacionamento nesta praça militar de um regimento: o Terço de Peniche, criado em 1698. A este sucederá, em 1707, o Regimento de Peniche. Em 1806, fruto da reorganização do Exército, o Regimento de Peniche estará na génese do, ainda existente, Regimento de Infantaria nº 13.

PENICHE MILITARY FORTIFICATION CITADEL

After the restoration of national independence on 1 December 1640, an ambitious fortiication programme of the kingdom's frontiers commenced, in order to guard against a possibility of Spain conquering the country again. The assumption that a hostile invasion would have a maritime component was the reason underlying the fortiication of the coast of Portugal, in particular of Lisbon and the adjacent areas. Because of its proximity to the capital and the ease of disembarkation here, the region of Peniche merited special attention.

A letter to the Council of War created by João IV, dated 1642, mentions the fact that it was necessary to speed up the Peniche fortiication because it was a “(…) fortiied place of such great importance and the main key to the kingdom from the sea (…)”

Over the following three decades an extensive defence system was built consisting of several fortiications and spearheaded by the Peniche Fortress.

In parallel, a regiment was created and stationed at this military site: the Terço de Peniche, created in 1698. It would be succeeded by the Peniche Regiment, in 1707. In 1806, after a reorganisation of the army, the Peniche Regiment would give rise to the 13 Infantry Regiment, which still exists today.

D. JOÃO IV

D. João (Vila Viçosa, 1604 – Lisboa, 1656) foi ilho de D. Teodósio, VII Duque de Bragança, e D. Ana de Velasco y Giron, neto de D. Catarina de Austria, regente do reino, na menoridade de D. Sebastião, e trisneto de D. Manuel I. Com a morte de seu pai, em 1630, assume a liderança da Casa de Bragança, casando em 1633 com D. Luıśa de Gusmão.

Após o golpe palaciano de 1 de dezembro de 1640, realizado por um conjunto de nobres portugueses, que faz cair o governo da regente Duquesa de Mantua, restaurando a indepêndencia nacional, D. João, é aclamado rei de Portugal e dos Algarves, com a designação de D. João IV.

O seu reinado foi marcado pela tentativa de reconhecimento no quadro internacional da independência nacional e dos direitos da Casa de Bragança à coroa portuguesa, pela defesa das fronteiras contra a Espanha e reivindicação das cidades coloniais perdidas para os holandeses, no Brasil e na Asia.

Retrato do rei D. João IV (c. 1642), atribuıd́o a José de Avelar Rebelo. Espólio do Museu Nacional dos Coches. Autor da fotograia: José Pessoa. Imagem cedida pela Direção-Geral do Património Cultural / Arquivo de Documentação Fotográica.

Num contexto marcado pela ameaça constante de uma possıv́el guerra com Espanha, a sua governação deu forte enfoque à reorganização do exército, construção de várias fortalezas de modo a fazer a defesa das fronteiras, terrestres e marı́timas, ao desenvolvimento da indústria de artilharia, tendo para tal instituıd́o, ainda em 1640, o Conselho da Guerra. Este monarca assume um papel decisivo na história de Peniche. E no seu reinado que, entre 1641 e 1671, é ediicado um sólido e extenso sistema defensivo, encabeçado pela Fortaleza de Peniche, o qual indelevelmente marcou e pautou a vivência deste território nos séculos seguintes.

Planta cedida pelo Gabinete de Estudos Arqueológicos de Engenharia Militar.

REGIMENTO DE PENICHE

Substituindo a companhia de ordenanças que servia na praça militar é instituıd́o, em 1698, o Terço de Peniche.

Com a publicação de novas ordenanças por D. João V, em 1707, o Terço de Peniche passa a ser designado de Regimento de Infantaria de Peniche. Em 1740, o Regimento participa numa expedição militar no Estado da India, libertando as provıńcias de Bardez e Salcete.

A 2 de novembro de 1755, o Regimento ruma a Lisboa com a missão de proteger a população da cidade e os seus haveres, no seguimento do terramoto do dia anterior.

O Regimento participa, entre 1793 e 1795, na chamada Guerra do Rossilhão, entre Espanha e França, com um efetivo de 950 homens sob o comando do coronel António Francisco de Abreu. Pela bravura demonstrada, o prıńcipe D. João (futuro D. João VI) atribui a esta companhia o privilégio de inscrever na sua bandeira a divisa “Ao valor do Regimento de Infantaria de Peniche”

Na sequência da reorganização do Exército, levada a cabo em 1806, os regimentos passaram a ser numerados, cabendo ao Regimento de Peniche o nº13.

Durante o perıódo das Invasões Francesas e Guerra Peninsular (1807-14), o Regimento nº 13 participou ativamente nos combates, integrando as forças luso-britânicas, com destaque para as campanhas de 1812 e 1813. Durante as Guerras Liberais (1828-34), o Regimento passa a ser designado de Regimento de Infantaria de Leiria, acompanhando o partido de D. Miguel. Com o triunfo das forças liberais o regimento é extinto.

Em 1837 são criados vários batalhões de Infantaria, renascendo o Infantaria 13. Esta força passa a estar aquartelada na cidade de Chaves, transitando em 1883 para Vila Real, onde ainda hoje o Regimento nº 13 está instalado.

AS INVASÕES FRANCESAS

Na sequência das Invasões Francesas, a Fortaleza de Peniche foi ocupada pelas tropas napoleónicas apenas alguns dias após a tomada de Lisboa, em 1807, tendo icado o general Jean Guillaume Thomières como comandante da guarnição ocupante.

A ocupação da Fortaleza e do Forte de N.ª Sr.ª da Consolação terão decorrido sem incidentes, tendo sido imediatamente entregue a Praça e franqueados os quartéis e munições, por ordem do conde de Sampaio, Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra.

Durante o perıódo de ocupação napoleónica, o General Junot manda executar obras de reparação na fortiicação. Neste perıódo, são vários os relatos de permanentes desacatos, profanações, roubos e violações por parte das tropas napoleónicas.

Em agosto de 1808, as tropas inglesas defrontam os soldados de Napoleão nas batalhas da Roliça e do Vimeiro, resultando da derrota francesa a assinatura da Convenção de Sintra, a dia 30 – ratiicada a 1 de setembro. O artigo 12º desta Convenção estipulava que a Fortaleza de Peniche fosse entregue às tropas britânicas logo que estas ali se apresentassem para substituir a guarnição francesa.

Um dos governadores da Praça Militar que urge destacar deste perıódo pósinvasões, pela projeção que procurou dar ao desenvolvimento da Vila em diversas áreas da economia, cultura e sociedade penichense, foi o general britânico Richard Blunt.

Entre maio e julho de 1814, Peniche associa-se às diversas cerimónias e festividades que regozijaram com a deinitiva derrota do exército francês pelo exército aliado e assinatura da Convenção de Paris.

GUERRAS LIBERAIS

Na transição para o segundo quartel do século XIX, a Fortaleza de Peniche foi testemunha de mais um conlito, desta vez a Guerra Civil que opôs liberais constitucionalistas e absolutistas sobre a sucessão real.

Na sua base esteve a fuga da Corte para o Brasil, aquando das Invasões Francesas do inıćio do século, e a consequente Revolução Liberal, com instauração da primeira Constituição portuguesa, em 1822, que implementou uma monarquia constitucional, pondo im ao Antigo Regime. Com a morte de D. João IV, em 1826, iniciou-se uma disputa entre os seus dois ilhos – D. Miguel (absolutista) e D. Pedro (liberal) – pela sucessão ao trono.

Durante as chamadas Guerras Liberais, que se desenrolaram entre 1832 e 1834, a Fortaleza é ocupada sucessivamente por miguelistas (até 1833) e por liberais (a partir de julho de 1833), servindo de cárcere aos prisioneiros de ambos os lados.

Em 1833, o Forte de S. João Baptista, nas Berlengas, foi tomado por soldados liberais, comandados pelo coronel Joaquim Pereira Marinho que pretendiam, a partir daı,́ ocupar a praça militar de Peniche. Tal veio a acontecer a 25 de julho desse ano, perante o abandono da Fortaleza por parte da guarnição absolutista, em consequência de falsas informações que remetiam para a derrota das tropas miguelistas do General Telles Jordão. Apesar da ocupação da praça militar pelos liberais, as tropas absolutistas continuaram instaladas em Obidos, arremetendo constantemente contra Peniche, havendo também investidas contrárias, por parte da guarnição liberal, cheiada pelo barão de Sá da Bandeira, Bernardo de Sá Nogueira. A Convenção de Evora-Monte, assinada a 26 de maio de 1834, havia de colocar um ponto inal a esta guerra.

1642 (12 de agosto) O Conde de Atouguia, D. Jerónimo de Ataıd́e, procede ao inventário do armamento e efetivos militares existentes na praça militar: 5 peças de artilharia de bronze, 1 berço de canhão 1 meia colubrina, 1 pedreiro, 15 peças de ferro, 500 mosquetes pólvora corda balas de mosquete e arcabuz para além de uma guarnição composta por 500 soldados, que colaborava nas obras de construção da Fortaleza.
Fardas do Regimento de Peniche, 1777 1735 A guarnição da Fortaleza era constituıd́a por um total de 316 militares, servidos por 50 peças de artilharia. 1721 (1 de novembro) O provedor da Comarca de Leiria, Braz Raposo da Fonseca, informa que a praça militar era servida por “hum regimento de Infantaria paga, além de seis companhias de Ordenanças da terra”. 1707 O Regimento de Infantaria de Peniche era composto por 12 companhias, uma delas de granadeiros, num total de 720 efetivos. 1698 O Terço de Peniche foi instituıd́o com uma guarnição de 670 homens, tendo como primeiro comandante o Mestre de Campo Vasco Fernandes César Mendes.
1968 O Terço de Peniche foi instituıd́o com uma guarnição de 670 homens, tendo como primeiro comandante o Mestre de Campo Vasco Fernandes César Mendes. 1755 (2 de novembro) No seguimento do terramoto veriicado no dia 1, Marquês de Pombal, Secretário de Estado do rei D. José, ordena que o Regimento de Infantaria de Peniche marche para Lisboa com a missão de proteger a população e os seus haveres. A memória desta presença é evocada na toponı́mia da cidade de Lisboa através da Rua do Abarracamento de Peniche.

DE CIDADELA A PRESÍDIO

No inıćio do século XIX, teve inıćio o processo que culminou com a adaptação da primitiva estrutura militar da Fortaleza a estabelecimento prisional.

Durante as Invasões Francesas, apenas alguns dias após a tomada de Lisboa pelo exército napoleónico, em 1807, a Fortaleza de Peniche foi ocupada. Em 1808, com a vitória das tropas luso-britânicas nas Batalhas do Vimeiro e Roliça, ordenou-se a entrega da praça militar às forças aliadas.

A Fortaleza foi testemunha das confrontações polıt́icas que culminaram na Guerra Civil que opôs liberais a absolutistas, entre 1832 e 1834. Foi quartel de miguelistas e, depois, de liberais, sendo utilizada como cárcere para os prisioneiros de ambos os lados.

A destruição acidental do Palácio do Governador, em 1837, antecede o im da vocação militar da Fortaleza de Peniche nos inais desse século. Os avanços da tecnologia bélica tornaram obsoleta este tipo de estrutura defensiva.

No primeiro quartel do século XX, antes da instalação da prisão polıt́ica neste espaço durante a ditadura do Estado Novo, são de destacar alguns episódios: o internamento de refugiados boers, a proposta de criação de um sanatório e o cárcere de prisioneiros alemães durante a 1ª Guerra Mundial.

FROM CITADEL TO MILITARY PRISON

The beginning of the 19 century saw the initiation of a process that culminated with the conversion of the fortress's original military structure into a prison.

During the French invasions, just a few days after Napoleon's army took Lisbon, in 1807, the Peniche Fortress was occupied. In 1808, after the victory of the Anglo-Portuguese troops in the battles of Vimeiro and Roliça, the surrender of the military fortiication to the allied forces was ordered.

The fortress witnessed the political confrontations that culminated in the Civil War that pitched liberals against absolutists from 1832 to 1834. It was a barracks for Miguelites and later for liberals, and was used as a gaol for prisoners of both sides.

The accidental destruction of the Governor's Palace in 1837 preceded the end of the military vocation of Peniche Fortress at the end of the century. Advances in military technology made this kind of defensive structure obsolete.

In the irst quarter of the 20 century, before the installation of the political prison in this space during the Estado Novo (“New State”) dictatorship, a few noteworthy episodes took place: the coninement of Boer refugees, the proposal to create a sanatorium and the gaoling of German prisoners during World War I.

A Cidadela de Peniche encabeçava um vasto sistema defensivo que se estendia de Nazaré a Mafra, dirigido por um governador com a patente de General de Brigada. Este tinha a sua residência oicial no chamado Palácio do Governador, situado na Fortaleza.

Tratava-se de um edifıćio de traça apalaçada, no qual se destacava o imponente pórtico interior de dois pisos, e a faustosa porta, que reproduz na ıńtegra, a proposta de Sebastiano Serlio, arquiteto italiano do Renascimento, autor tratado I sette libri dell'architettura

O Palácio do Governador foi destruı́do parcialmente, em 1837, na sequência de uma violenta explosão de um dos paióis da Fortaleza, não tendo sido reconstruıd́o o edifıćio na mesma traça.

Deste resta apenas o portal original, atual entrada do Museu Municipal.

Alguns dos Governadores da Praça de Peniche

Imagem cedida pelo Gabinete de Estudos Arqueológicos de Engenharia Militar.

Fotograia do Africanamuseum (Johannsburg), disponıv́el em Ferreira, O. J. O. (1994) Viva os Boers! Beregeïnterneerdes in Portugal tydens die anglo-boereoorlog, 1899-1902, Pretoria.

1815 – Richard Blunt – António Hipólito da Costa 1819 – Garcia Manuel Durão Palhinha 1821 – António Hipólito da Costa 1823 – João de Vasconcelos e Sá 1827 – António Feliciano Teles de Castro Aparıćio 1832 – Pedro José de Santa Bárbara – António Feliciano Teles de Castro Aparıćio 1833 – Joaquim Pereira Marinho – Bernardo de Sá Nogueira, Barão de Sá da Bandeira 1834 – José de Barros e Abreu, Conde de Casal 1836 – Bernardo de Sá Nogueira, Barão de Sá da Bandeira – José de Barros e Abreu, Conde de Casal 1838 – Francisco José Carretti 1839 – Joaquim Pedro Pinto de Sousa 1842 – Miguel Correia de Mesquita Pimentel

– Jean Guillaume Thomières 1808 – Luıś António de Castel-Branco 1810 – Richard Blunt 1812 – Joaquim António Rodrigues Galhardo

O INTERNATO BOER EM PENICHE

Entre abril de 1901 e julho de 1902, a então Vila de Peniche acolheu cerca de três centenas e meia de refugiados boers, fugidos da 2ª Guerra Anglo-Boer (18991902) que opôs o exército inglês aos colonos das repúblicas do Transval e Orange, no nordeste da atual Africa do Sul, na sua maioria oriundos da Holanda. A violência desta guerra originou uma onda de refugiados civis e militares rumo à então colónia portuguesa de Moçambique. Por força da pressão inglesa, são reencaminhados pelo governo português para Portugal continental, sendo alojados em Caldas da Rainha, Alcobaça, Abrantes e Peniche. A chegada, terão sido recebidos entusiasticamente, sob os clamores “Heil die Boere!” (Vivam os Boers!), o que se deveria aos sentimentos antibritânicos que persistiam na sociedade portuguesa depois do Ultimato de 1890.

Em Peniche, foram internados dois grupos de refugiados: combatentes que se haviam rendido e polıćias sul-africanos.

Não existe consenso sobre o número de afrikaners aquartelados em Peniche, variando, de acordo com os arquivos, de 340 a 368 pessoas, entre oiciais, sargentos e soldados. A maioria dos boers foi alojada na Fortaleza (entre 260 a 280 pessoas).

Os refugiados estavam autorizados a andar livremente pela penıńsula e, em algumas ocasiões especiais, podiam deslocar-se ao exterior. Os tempos livres eram ocupados com caminhadas, eventos desportivos, associações de debate e troca de correspondência. Alguns boers trabalharam como sapateiros, alfaiates, marceneiros, fotógrafos, professores de música, bem como na reparação de redes de pesca, construção civil e agricultura.

Esta estada termina no verão de 1902 com o Juramento de Fidelidade à Coroa Britânica, a 5 de julho, em Peniche, na presença do representante da Embaixada Britânica. A 18 desse mesmo mês, 301 internos são embarcados rumo a Lisboa. Dezanove internos tiveram que permanecer em Peniche, uma vez que lhes foi impedido o regresso à Africa do Sul por corresponderem a mercenários estrangeiros que lutavam ao lado dos Afrikaners.

Coro dos Prisioneiros do Campo de Peniche durante a 1ª Guerra Mundial. Imagem do Arquivo Histórico-Militar / Revista Sábado nº 510.

Fortaleza de Peniche, possivelmente no Armistıćio.

PRISIONEIROS ALEMÃES DURANTE A 1ª GUERRA MUNDIAL

A 23 de fevereiro de 1916, pressionado pelo governo britânico, Portugal abandona a neutralidade na 1ª Guerra Mundial, apresando 72 navios alemães e austrıácos que se encontravam em Lisboa e noutros portos coloniais. A 9 de março, a Alemanha declara guerra a Portugal.

Para além dos tripulantes e passageiros das embarcações, também os súbditos alemães e austrıácos em idade militar, residentes em Portugal e nas colónias, seriam coninados em campos de concentração criados para o efeito. Aqueles que tinham posses izeram-se acompanhar da respetiva famıĺia.

São criados Depósitos de Concentrados ou de Internados em Angra do Heroı́smo (Açores) e em Lourenço Marques (Maputo) e Macequece, em Moçambique. Em 1917, os presos de Moçambique são transferidos para o Quartel de Infantaria nº 5, em Caldas da Rainha, e para a Fortaleza de Peniche. O Depósito de Concentrados de Peniche recebeu 180 prisioneiros, que se dividiam por três classes, decididas pelos próprios, havendo variações na qualidade do alojamento. A maioria dos presos eram tripulantes de navios mas a Fortaleza também recebeu 15 famıĺias – 9 mulheres e 16 crianças.

Os prisioneiros gozariam de alguma liberdade de circulação dentro da Vila, não podendo transpor os limites da Praça Militar, recolhendo à fortiicação no inal do dia.

Na Fortaleza de Peniche criou-se um coro, dirigido por Willy Hager (que se tornou lıd́er dos prisioneiros, responsável pela distribuição da correspondência e das pequenas mesadas cedidas por organizações de assistência internacionais); nasceram crianças (Gestrud Hechler às 03h30 de 14 de abril de 1919) e morreram prisioneiros (Arno Reinhold, de 31 anos, a 17 de agosto de 1918, sepultado no cemitério local). As tentativas de fuga também ocorreram. A detenção prolongou-se por quase um ano após a guerra ter terminado, por se ter estado a aguardar as resoluções do Tratado de Versailles. Os concentrados de Peniche são libertados em outubro de 1919.

1968 O Terço de Peniche foi instituıd́o com uma guarnição de 670 homens, tendo como primeiro comandante o Mestre de Campo Vasco Fernandes César Mendes. 1878 A Fortaleza encontrava-se guarnecida com 76 peças de artilharia, dispunha de quatro armazéns de material bélico e acomodações para 300 militares.
1641 – D. Jerónimo de Ataıd́e 1642 – Gaspar Luıś de Meireles 1650 – Gaspar Luıś de Meireles – Conde da Ericeira 1651 – Domingos Franco Cochado 1654 – João de Oliveira Delgado 1655 – Luıś Lopes de Cepeda 1656 – João de Oliveira Delgado 1657 – Manuel Freire de Andrade 1664 – Gaspar Luıś de Meireles 1667 – Simão Matheus 1669 – Manuel Freire de Andrade 1671 – Simão Matheus 1677 – João da Costa de Britos 1680 – D. Luıś da Silva de Ataıd́e 1684 – Manuel Dias Nogueira 1689 – D. Jerónimo de Ataıd́e 1693 – João da Costa Brito 1697 – Bernardim Freire de Andrade – D. Jerónimo de Ataıd́e 1699 – Vasco Fernandes César Mendes 1713 – Cristóvão Correia Freire 1721 – Manuel Freire de Andrade 1735 – Bento da Silva Veiga 1758 – Silvestre de Jesus Ribeiro 1766 – Lourenço de Melo da Silva e Sá 1776 – Verıśsimo ferreira de matos souto 1782 – Jorge de Sousa Manuel de Mendonça 1786 – Francisco Brunette 1788 – Jorge de Sousa Manuel de Meneses 1794 – António Francisco de Abreu 1795 – Duarte Luıś Palha de Almeida 1796 – João da Silva Bento – Anastácio José Pereira Ramos 1798 – João da Silva Bento 1799 – Anastácio José Pereira Ramos 1807 – Luıś António de Castel-Branco
DESTRUIÇÃO DO PALÁCIO DO GOVERNADOR 1843 – Carlos José Cardoso Moniz Castelo Branco 1851 – José Pedro Celestino Soares 1853 – Adrião Acácio da Silveira Pinto – Luıś António de Mesquita Cabral de Almeida 1854 – Adrião Acácio da Silveira Pinto 1855 – José Maria Balby – Cristóvão José Franco Bravo 1856 – Barão da Batalha 1857 – José Quintino Dias 1862 – Barão de Monte Brasil 1865 – João Grifiths 1871 – Francisco Maria Melquıádes de Cruz Sobral 1872 – Joaquim Ferreira Sarmento 1875 – Augusto César Nunes 1876 – António Ferreira da Rocha Gandra – Sebastião da Mata Moniz da Maia 1880 – António José Botelho da Cunha 1886 – Manuel Joaquim Marques 1890 – Bernardino Celestino da Costa Pimentel 1893 – António Severino Alves Galvão 1894 – José Tomás de Cárceres 1899 – José Alfredo da Cunha Barros

ESTADO NOVO

Após o golpe militar de 28 de maio de 1926 foi implantado, em Portugal, um regime ditatorial, de tipo fascista.

Com a aprovação da Constituição de 1933, documento que legitima o regime polıt́ico do Estado Novo, a liberdade de expressão e os direitos de reunião e de associação passam a ser regulamentados por diplomas legislativos próprios, fortemente restritivos das liberdades individuais.

Este regime totalitário foi liderado por António de Oliveira Salazar, entre 1932 e 1968, altura em que lhe sucedeu Marcelo Caetano. Este estadista iniciou funções como Ministro das Finanças após o golpe militar. Foi Presidente do Ministério, assumindo, após a aprovação da Constituição de 1933, o cargo de Presidente do Conselho de Ministros.

Caracterıśticas do Estado Novo:

Ÿ Supressão das liberdades de expressão, de reunião, manifestação e associação;

Ÿ Proibição de partidos polıt́icos (com exceção do partido governamental, a União Nacional), da liberdade sindical e do direito à greve;

Ÿ Censura e repressão pela polıćia polıt́ica (PVDE, PIDE, DGS);

Ÿ Perseguição, prisão e tortura de opositores à ditadura;

Ÿ 13 anos de guerras coloniais, com mais de 8 000 mortos e 30 000 feridos entre os portugueses e milhares de vıt́imas entre os povos das ex-colónias;

Ÿ Uma sociedade vigiada, com forte condicionamento da vida cultural;

Ÿ Exploração dos trabalhadores e atraso económico e social;

Ÿ Milhão e meio de portugueses que se viram forçados a emigrar, entre 1961 e 1973.

Durante cerca de quatro décadas, de 1934 a 1974, a Fortaleza de Peniche foi utilizada como prisão polıt́ica pelo regime do Estado Novo, por aqui passando cerca de 2 500 portugueses cujo único crime foi o de lutarem pela Liberdade.

THE “NEW STATE”

After the military coup of 28 May 1926, a fascist, dictatorial regime was implanted in Portugal.

After the approval of the 1933 Constitution, a document that legitimised the political regime of the New State, freedom of speech and the right of assembly and association were regulated by speciic legislation which severely restricted individual freedoms. This totalitarian regime was directed by António de Oliveira Salazar, between 1932 and 1968, when he was succeeded by Marcelo Caetano. This politician had started out as Finance Minister after the military coup. He was President of the Ministry, and after the approval of the 1933 Constitution, he occupied the post of President of the Council of Ministers.

Characteristics of the New State: Ÿ Suppression of the freedoms of expression, assembly, demonstration and association;

Ÿ Prohibition of political parties (with the exception of the governmental party, the National Union), of trade union freedom and the right to strike; Censorship and repression by the political police (PVDE, PIDE, DGS);

Ÿ Persecution, imprisonment and torture of the regime's opponents; 13 years of colonial wars, with over 8,000 dead and 30,000 wounded, including the Portuguese and the thousands of victims from the peoples of the former colonies;

Ÿ A surveillance society, with a severely conditioned cultural life;

Ÿ Exploitation of workers and economic and social backwardness;

Ÿ One and a half million Portuguese who were forced to emigrate from 1961 to 1973.

For nearly four decades, from 1934 to 1974, the Peniche Fortress was used as a political prison by the Estado Novo regime, and almost 2,500 Portuguese, whose only crime was to ight for freedom, were held here.

Vista aérea da Fortaleza de Peniche. Década de 1930.

DEPÓSITO DE PRESOS DE PENICHE

Em 1934 foi instalado oicialmente, na Fortaleza de Peniche, o Depósito de Presos de Peniche.

No entanto, logo após o golpe militar de 1926, terão sido detidos na Fortaleza de Peniche vários resistentes.

Este estabelecimento prisional recebeu, nas décadas seguintes, centenas de opositores ao regime de Oliveira Salazar, de diversos estratos socioproissionais e orientações polıt́icas. Tratavam-se de pessoas acusadas pelo aparelho ditatorial de serem responsáveis por atos contra o Estado, de estarem associadas a movimentos polıt́icos de carácter ilegal, como o Partido Comunista Português ou o movimento anarcossindicalista, ou de terem, simplesmente, proferido airmações contra o regime.

O Depósito de Presos de Peniche adaptou, de forma sumária, para alojamento e isolamento de presos, as construções dos séculos XVII e XVIII, como os antigos aquartelamentos de soldados e oiciais, as cavalariças, as latrinas ou as cozinhas da fortiicação. Sendo precárias, estas estruturas não reuniam as elementares condições de conforto, higiene e segurança.

PENICHE PRISONER QUARTERS

1934 saw the installation in the Peniche Fortress of the Depósito de Presos de Peniche, or Peniche Prisoner Quarters.

However, several members of the resistance were detained in the Peniche Fortress immediately after the military coup in 1926.

This prison received hundreds of opponents to the regime of Oliveira Salazar, from different social classes and professions and with different political views.

They were accused by the dictatorial system of committing deeds against the state, of being members of illegal political movements like the Portuguese Communist Party or the anarcho-syndicalist movement, or simply of having uttered statements against the regime.

The Depósito de Presos de Peniche underwent a summary conversion of the 17 and 18 century constructions, like the old soldiers' and oficers' barracks, the latrines or the fortress kitchens, for the accommodation and isolation of prisoners. Precarious as they were, these structures did not meet even elementary standards of comfort, hygiene and safety.

O QUOTIDIANO NA FORTALEZA

No perıódo de vigência do Depósito de Presos de Peniche (1934-1956), os presos estavam coninados ao espaço da Fortaleza, em particular à extremidade sul da fortiicação (zona entre as Baterias da Furna e o Baluarte do Alto da Vela), sendo vigiados de perto por um corpo da Guarda Nacional Republicana que aı ́se encontrava instalado. Não existia então um aparelho prisional repressivo claramente instituıd́o, podendo os presos circular pela Fortaleza. Cabia a estes a gestão do seu quotidiano. As lides domésticas, como a limpeza das casernas, a lavagem de roupa ou a confeção das refeições, eram da responsabilidade dos presos.

As horas vagas eram ocupadas de forma muito diversa, através da leitura e debate de obras literárias e polıt́icas de relevo, do lecionar pelos presos mais letrados de aulas de português, matemática e lıńguas estrangeiras, da produção manuscrita de jornais clandestinos, da recriação de jogos tradicionais, da criação de alguns animais (patos e galinhas) para ins alimentares e, até, da preparação de planos de evasão, alguns dos quais bem-sucedidos.

O quotidiano era igualmente preenchido pela visita de familiares e amigos, e é neste quadro que se assiste à introdução e utilização no espaço de uma máquina fotográica. As fotograias conhecidas retratam, para além das visitas em si, o quotidiano dos presos polıt́icos, as relações de camaradagem e os momentos de lazer.

Pese embora a existência de alguma liberdade de ação por parte dos reclusos, o Depósito de Presos de Peniche era efetivamente um estabelecimento prisional. Aos presos que de algum modo desrespeitavam as regras e indicações impostas pelos guardas estava reservada a reclusão em celas de isolamento.

JORNAIS DA PRISÃO

Há um grupo importante de jornais manuscritos clandestinamente por presos polıt́icos, no perıódo que vai de 1934 a 1945, em praticamente todas as cadeias fascistas. Ao todo são 18 tıt́ulos e cerca de 200 números que terão sido produzidos nas cadeias de Peniche, Caxias, Monsanto, Aljube, Angra do Heroıśmo, Tarrafal (Cabo Verde) e Penitenciária de Lisboa.

Estes jornais tinham como função ajudar à formação ideológica, à organização e luta dos presos, à elevação da moral e da sua combatividade, informando-os de aspetos vários da vida interna e externa, quebrando o seu isolamento.

A elaboração destes jornais, para além da necessidade de iludir a vigilância dos carcereiros, exigia muita imaginação, organização e coragem dos presos para produção, defesa e circulação no interior das cadeias destes documentos.

Pela sua natureza, pelo facto de se terem publicado durante um tão longo perıódo em condições de feroz repressão e, até mesmo, pela qualidade gráica, estes jornais são considerados únicos no movimento revolucionário internacional e parte integrante da imprensa clandestina que travou combate contra a ditadura fascista.

Para além dos jornais produzidos na prisão, é ampla a quantidade de jornais e folhetins clandestinos que circulavam em Portugal durante a Ditadura do Estado Novo, inclusivamente dentro das cadeias, de entre os quais se destaca o Jornal “Avante”, órgão central do Partido Comunista Português. Num paıś onde tinham sido abolidas as liberdades fundamentais e vigorava um regime de feroz censura sobre os meios de comunicação social, esta imprensa alternativa cumpriu um papel fundamental de oposição e resistência ao regime. As suas páginas foram importantes espaços de crıt́ica, análise, informação e denúncia de crimes e atos repressivos cometidos pela ditadura.

AS FUGAS DA PRISÃO POLÍTICA DE PENICHE

As mais de vinte fugas realizadas a partir do interior das cadeias fascistas, abrangendo algumas dezenas de presos, exigiram imaginação, planeamento, organização, audácia e coragem.

Do conjunto de mais de uma dezena de fugas ou tentativas de fuga registadas da prisão polıt́ica de Peniche, destacam-se, pela sua espetacularidade, duas evasões: a de António Dias Lourenço, a 17 de dezembro de 1954, a partir do Baluarte Redondo, e a fuga coletiva de 3 de janeiro de 1960, da ala de alta segurança do Bloco C.

Preso polıt́ico, militante do Partido Comunista Português, António Dias Lourenço (1915-2010) evade-se, numa noite fria de dezembro de 1954, do Segredo, cela de isolamento instalada no Baluarte Redondo da Fortaleza de Peniche.

Sozinho, preparou a fuga: estudou os movimentos dos guardas e procedeu de modo a ser castigado, o que equivalia a ser fechado no Segredo. Aı,́ com a ajuda de uma meia faca que conseguira obter, começa a tarefa de remoção de um pedaço de madeira da porta. Após longos dias de trabalho, consegue sair da cela e munido de uma corda feita de cobertor desiado e pouca roupa, lança-se ao mar. Alcançada terra irme e depois de mais de uma hora de correria pela então Vila de Peniche, Dias Lourenço salta para uma camioneta de transporte de peixe e concretiza a sua evasão.

A 3 de janeiro de 1960, teve lugar uma fuga coletiva na qual participaram dez presos, destacados dirigentes e militantes do Partido Comunista Português: Álvaro Cunhal, Carlos Costa, Francisco Martins Rodrigues, Francisco Miguel Duarte, Guilherme da Costa Carvalho, Jaime Serra, Joaquim Gomes dos Santos, José Carlos, Pedro Soares e Rogério de Carvalho

Esta fuga contou com a colaboração de José Alves, cabo da GNR do corpo de segurança externo às instalações prisionais. Fator igualmente decisivo para o êxito da fuga foi o silêncio colaborante dos populares que se deram conta da sua realização.

No dia 3 de janeiro de 1960, já tudo preparado no plano interno e avistado o sinal – aberto o portabagagens de um carro estacionado no largo fronteiro da Fortaleza, o Campo da República – dá-se inıćio à concretização da fuga. Terminado o jantar, o guarda prisional apita para os presos se levantarem da mesa e regressarem às suas celas. E imobilizado com uma toalha, anestesiado com clorofórmio e encerrado numa das celas. Rapidamente são rasgados lençóis e feita uma corda para a descida da muralha. Eis o percurso percorrido:

1. Saıd́a do 3º Piso do Bloco C. O Guarda da GNR esconde os presos, um a um, debaixo do seu capote para não serem vistos, e leva-os até ao piso seguinte;

2. Os presos percorrem o piso até à guarita situada a norte da muralha, onde se escondem e é amarrada a corda;

3. Descida da muralha até ao fosso exterior;

4. Travessia do fosso e escalada do muro que separa a Fortaleza do largo;

5. Travessia do Campo da República até aos carros estacionados conduziram os presos evadidos a lugar seguro.

Esta fuga abalou as fundações do próprio regime ditatorial e do seu aparelho repressivo, airmando este acontecimento como um marco maior na história da resistência antifascista ao Estado Novo em Portugal.

ESCAPES FROM THE PENICHE POLITICAL PRISON

The more than twenty escapes that were made from the inside of the fascist gaol, by several dozen prisoners, called for imagination, planning, organisation, boldness and courage. Of the ten recorded escapes from the Peniche political prison, two in particular stand out for their spectacular nature: that of António Dias Lourenço, on 17 December 1954, from the Round Stronghold, and the collective escape of 3 January 1960, from the C Block high-security wing.

Fortaleza de Peniche, 1947 Aula lecionada por e para presos polıt́icos. Década de 1930. Edmundo Pedro no Depósito de Presos de Peniche, no dia em que completou 16 anos (08/11/1934). Interior de caserna no Depósito dos Presos de Peniche. Fortaleza de Peniche, 1935. Autor: Cansado Gonçalves
Fortaleza de Peniche, 1935. Autor: Cansado Gonçalves Gravura de Margarida Tengarrinha com base em desenho de Alvaro Cunhal.

CADEIA DO FORTE DE PENICHE

Em 1953, segundo projeto do arquiteto Rodrigues Lima, iniciaram-se obras de arranjo e adaptação da Fortaleza a estabelecimento prisional. Foi demolida uma parte signiicativa dos antigos edifıćios da fortiicação e construıd́o, sucessivamente, até 1961, um conjunto de blocos prisionais, segundo o modelo americano das prisões de alta segurança.

E criada a Cadeia do Forte de Peniche, pautada pelo reforço do aparelho repressivo prisional, realidade que se mantém até ao 25 de abril de 1974. Para além dos três blocos prisionais destinados aos presos – A, B e C – é construıd́o um soisticado Parlatório, em 1971, e instituıd́os dois Pátios de Recreio interiores.

Com a requaliicação da prisão aumentou a ação repressiva. Cada bloco e cada piso eram isolados, de forma a impedir o contacto entre presos. Destes novos pavilhões destaca-se o Bloco C. Albergava, no 1º piso, presos em celas coletivas; no 2º piso, estava a enfermaria (espaço onde se encontra a presente exposição) e, no 3º piso, havia a Ala de Alta Segurança onde estavam encarcerados os presos considerados mais perigosos e que interessava isolar da restante população prisional. Foi daqui que se deu a célebre fuga coletiva de 1960.

PENICHE FORTRESS GAOL

In 1953 work commenced on the refurbishment and adaptation of the fortress for use as a prison, in accordance with the project of the architect Rodrigues Lima. A signiicant part of the old fortiication buildings was demolished, and afterwards, a series of prison blocks were built following the American model for high-security prisons, concluding in 1961. The Cadeia do Forte de Peniche was created, characterised by the reinforcement of the repressive system of the prison, a reality that remained in place until the Revolution of 25 April 1974.

In addition to the three prison blocks designed for the prisoners – A, B and C – the Parlatório, or prisoners' receiving room, was built in 1971, and two exercise yards were put in place. After the restructuring of the prison, the repression increased. The prisoners could not speak to one another. Each block and each loor was isolated, so as to prevent contact between prisoners. The most notorious is C Block, which now houses the Municipal Museum. On the 1st loor, the prisoners were kept in collective cells and the 2ⁿ loor was where the inirmary was (the room where this exhibition is on display), and the 3 loor was the High-Security Wing, used to incarcerate the prisoners deemed the most important, those who were supposed to be kept isolated from the rest of the prison population.

O QUOTIDIANO NA FORTALEZA

A vida prisional na Fortaleza de Peniche foi, ao longo dos anos, marcada de forma persistente pela repressão, arbitrariedade e humilhações. Com as novas instalações – à maneira americana – o convıv́io e a circulação dos presos foram profundamente afetados com o isolamento a que foram sujeitos. A remodelação deu lugar a uma cadeia de tipo penitenciário, com um número elevado de celas individuais, com blocos isolados uns dos outros e os pisos entre si, o que permitia uma vigilância mais apertada por parte dos guardas. O Bloco A, junto à furna e à linha amuralhada virada a sul, tinha dois pisos com celas coletivas. O Bloco B era composto por três pisos com quatro celas individuais cada. O Bloco C era constituıd́o por três salas coletivas no rés-dochão e celas individuais no 3º piso. As regras estabelecidas para o regime prisional eram ixadas pelo regulamento interno da Cadeia. A vida prisional era regulada por mais de 40 apitos estridentes, durante o dia. Ainda que, ao longo dos anos, tenha havido alturas de maior e menor repressão, nomeadamente graças às lutas dos presos, suas famı́lias e organizações nacionais e internacionais, a vida dos resistentes enclausurados na Cadeia do Forte de Peniche era alvo de bastantes limitações. Os castigos eram recorrentes, a alimentação de fraca qualidade e pouco variada, a assistência médica era mıńima. Havia restrições ao estudo e à leitura. A censura à correspondência dos presos com as suas famıĺias podia levar à rasura total do que tinha sido escrito. As visitas eram realizadas no Parlatório, com completo isolamento fıśico entre presos e suas famıĺias, incluindo crianças, e sob apertada vigilância dos guardas prisionais. As conversas deviam ser audıv́eis e compreensıv́eis na linguagem e as visitas podiam ser interrompidas a qualquer momento por decisão discricionária dos carcereiros.

SOLIDARIEDADE COM OS PRESOS POLÍTICOS

A solidariedade para com os presos polıt́icos foi constante e uma importante componente da resistência à ditadura do Estado Novo.

Diversas estruturas e comissões de solidariedade – no plano nacional e internacional – deram a conhecer a severidade do regime, ajudando na mobilização, denúncia e melhoria das condições prisionais, exigindo melhor alimentação, mais convıv́io entre os presos e possibilidade de visitas em comum.

A luta pela melhoria das duras condições prisionais teve alguns momentos marcantes:

- Greves de fome de 1950 e 1952 – esta última apoiada por manifestação popular; - Lutas de 1960 e 1962, em apoio da campanha nacional e internacional pela amnistia aos presos polıt́icos; - Lutas de 1963 e 1964, com levantamento de rancho e gritos de todos os presos; - Luta de 1970, por melhor alimentação e assistência médica.

Estas lutas só foram possıv́eis porque os presos, apesar do seu isolamento e permanente vigilância, ergueram uma organização que assegurava a comunicação entre o coletivo prisional disperso pelos diferentes blocos e pisos e entre o interior e o exterior da cadeia.

A solidariedade entre presos polıt́icos permitiu minorar as arbitrariedades a que eram sujeitos, através de um sistema de interajuda, com levantamentos conjuntos e partilha de mantimentos cedidos pelas famı́lias – cuja redistribuição, chamada “comuna”, mesmo quando proibida continuou a existir.

A população de Peniche mostrou-se solidária com os presos: facilitando as visitas dos familiares com donativos e cedência de instalações para dormidas, através de apoio moral e do silêncio cúmplice, nas fugas que testemunhou.

As colónias de férias para ilhos de presos polıt́icos, promovidas pela Comissão Nacional de Socorro aos Presos Polı́ticos, tiveram também um importante papel na resistência antifascista. Destas, destaca-se a que existiu na Casa do Anjo, no Baleal (freguesia de Ferrel, Peniche), a partir de 1973, pela sua proximidade à Fortaleza.

A PIDE EM PENICHE

A PIDE (Polıćia Internacional de Defesa do Estado) exercia um poder absoluto sobre as suas cadeias privativas – Aljube, Caxias, Porto, Coimbra – e sobre as cadeias formalmente dependentes da Direção Geral dos Serviços Prisionais, Ministério da Justiça, como era o caso da que estava instalada na Fortaleza de Peniche.

A vigilância dos pavilhões penitenciários era garantida pela Guarda Prisional e o perı́metro da Fortaleza de Peniche pela Guarda Nacional Republicana. No entanto, a portaria do estabelecimento prisional era assegurada diretamente por elementos da PIDE/DGS que, desta forma, controlavam a totalidade dos acessos à Cadeia.

A PIDE exercia uma vigilância omnipresente e omnipotente sobre a Cadeia, quer pela intervenção direta, quer pelos seus agentes internos, quer, ainda, por informadores recrutados no corpo dos guardas prisionais, que asseguravam a esta polıćia um duplo controlo sobre toda a vida prisional.

Com a abertura, em abril de 1965, da delegação da PIDE em Peniche, acentuou-se a vigilância sobre a Fortaleza, os familiares dos presos e a população de Peniche. A PIDE vigiava e controlada tudo o que se passava à volta da Fortaleza, incluindo as festas da então vila. Registava os nomes dos familiares e de outras pessoas que visitavam os presos e as matrı́culas dos carros em que se deslocavam. Controlava, igualmente, os locais onde os familiares comiam, dormiam e as pessoas com quem conversavam, chegando a realizar buscas a essas casas e a submeter os seus proprietários a interrogatórios. Instituições e cidadãos de Peniche considerados desafetos ao regime, suspeitos de partilharem ideias “subversivas”, eram sujeitos a buscar, devassas policiais e mesmo presos. Os pescadores eram alvo de particular atenção por parte da PIDE que avaliava o seu “estado de espıŕito”.

Correspondência censurada

26 DE ABRIL DE 1974

Na madrugada de 25 de abril de 1974 eclode uma revolução liderada pelo Movimento das Forças Armadas (MFA) que faz derrubar o regime do Estado Novo. Neste processo são tomados e ocupados, pelas forças militares, diversos locais e equipamentos considerados estratégicos, um pouco por todo o paıś. Deste rol consta a ocupação dos estabelecimentos prisionais de natureza polıt́ica afetos ao regime: Cadeia do Aljube, Cadeia do Forte de Caxias e Cadeia do Forte de Peniche.

Pelas 10h30 do dia 25 de abril chega a Peniche o Agrupamento Norte, comandado pelo Capitão Diamantino Gertrudes Silva, que congrega o RAP 3 – Regimento de Artilharia Pesada 3, o CICA 2 – Centro de Instrução de Condução Auto 2, ambos da Figueira da Foz, o Regimento de Infantaria 10, de Aveiro, e o Regimento de Infantaria 14, de Viseu, com o objetivo de ocupar a Cadeia do Forte de Peniche.

Correspondendo esta data à última quinta-feira do mês, realizava-se no chamado Campo da Torre (Campo da República – largo junto à Fortaleza), a tradicional feira mensal, tendo a mesma sido abruptamente interrompida e desmantelada pela chegada do contingente militar.

Após a recusa do diretor da cadeia, António Leal de Oliveira, em aceder à rendição e entrega do estabelecimento prisional, a companhia CICA 2 e duas seções de obuses do RAP 3, comandadas pelo Capitão Rocha Santos, montam cerco à fortiicação. São montados e apontados obuses de forma a, caso seja necessário, fazer fogo sobre a Fortaleza de Peniche. O grosso da coluna militar seguirá para Lisboa, icando às ordens do Posto de Comando na Pontinha.

A população de Peniche assiste às movimentações militares com um misto de estranheza e curiosidade, tomando conhecimento do golpe militar, ao longo do dia, através da rádio e da televisão.

Concluıd́o o golpe militar com sucesso, será no dia 26 de abril que a população de Peniche, os familiares e amigos dos presos polıt́icos se vão concentrar no exterior na Fortaleza, aguardando a saıd́a destes, numa vigıĺia que durará todo o dia. Já de noite, chegam a Peniche o Capitão-tenente Carlos Machado Santos e o Major José Moreira de Azevedo, acompanhados dos advogados Acácio de Gouveia, Artur Cunha Leal e Nuno Rodrigues dos Santos, enviados pelo MFA para negociar a saıd́a dos presos polıt́icos. Será apenas na madrugada de dia 27 de abril que os trinta e seis presos presentes à época nesta cadeia serão libertados, para júbilo da multidão que longamente os aguardou no exterior dos muros da Fortaleza de Peniche.

26 APRIL 1974

In the early hours of the morning of 25 April 1974, a revolution broke out led by the Armed Forces Movement which brought down the fascist regime. On the morning of that day, a military group arrived in Peniche, commanded by Captain Diamantino Gertrudes Silva, with the aim of occupying the Peniche Fortress Gaol. After the prison warden refused to surrender the prison, the contingent laid siege to the fortress.

After the successful conclusion of the military coup, on 26 April the population of Peniche and relatives and friends of the political prisoners gathered outside the Fortress, waiting for the prisoners to come out, in a vigil that lasted the entire day. It was not until the early hours of 27 April that the thirty-six prisoners then present in the gaol were released, to the jubilation of the crowds who had waited for them for so long.

A FORTALEZA DE PENICHE NO PÓS-REVOLUÇÃO

No perıódo conturbado que se seguiu imediatamente à Revolução, a Fortaleza serviu ainda de prisão a iguras ligadas ao regime fascista, nomeadamente elementos da extinta PIDE/DGS.

O im da história prisional da Fortaleza foi simbolicamente assinalado a 26 de fevereiro de 1976, com o hastear da bandeira branca, após a saıd́a para o estabelecimento prisional de Alcoentre de antigos ministros do governo de Marcelo Caetano e ex-agentes da PIDE, aqui presos por ordem do Movimento das Forças Armadas.

Em 1974, iniciou-se também o processo de descolonização dos territórios ultramarinos, em consequência do qual milhares de refugiados e retornados chegaram a Portugal. Enquadrados pelo IARN – Instituto de Apoio ao Retorno de Nacionais, e perante a inexistência de alojamento mais apropriado, a Fortaleza de Peniche acolheu algumas destas famıĺias, que ocuparam os vários edifıćios do antigo complexo prisional.

Entre 1977 e 1982, funcionou na Fortaleza o Centro de Acolhimento de Refugiados de Peniche, dirigido pela Cruz Vermelha Portuguesa, que terá albergado nos edifı́cios prisionais cerca de cem famıĺias, num total de mais de meio milhar de refugiados/retornados.

PENICHE FORTRESS IN THE POST-REVOLUTIONARY AGE

In the turbulent period immediately after the Revolution, Peniche Fortress was still used as a prison for igures linked to the fascist regime, namely members of the now-defunct PIDE-DGS. The year 1974 also saw the beginning of the decolonisation process of the overseas' territories, as a consequence of which thousands of refugees and returnees arrived in Portugal. Aided by the IARN – Support Institute for the Return of Portuguese Nationals – and due to the lack of more suitable accommodation, Peniche Fortress housed some of these families, who occupied the different buildings of the former prison complex. Thus, from 1977 to 1982, the Peniche Refugee Reception Centre (Centro de Acolhimento de Refugiados de Peniche) was operational, run by the Portuguese Red Cross, housing almost one hundred families in the prison buildings, of a total of more than half a thousand refugees / returnees.

CENTRO DE ACOLHIMENTO PARA REFUGIADOS

Entre setembro de 1977 e dezembro de 1982, a Fortaleza de Peniche recebeu o Centro de Acolhimento para Refugiados (CAR), onde foram instaladas provisoriamente centenas de pessoas oriundas das ex-colónias portuguesas. Estas populações procuraram refúgio em Portugal, a antiga metrópole, depois das crises vividas em Moçambique, Angola, Guiné Bissau e Cabo Verde.

O CAR de Peniche foi o segundo centro desta natureza instalado em Portugal, tendo sido aberto sob a égide da Cruz Vermelha, com parceria da ONU / Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, do Instituto de Apoio aos Retornados Nacionais e da Manutenção Militar. Acolheu, nesses cinco anos, um número de pessoas que continua incerto: as contagens variam entre 417, 357, 600 e 700 indivıd́uos.

Assim, em 1977, a Fortaleza vê reabrir os seus portões para acolher meio milhar de pessoas de idades, sexos, nacionalidades, cores, culturas e proveniências diferentes. Estes refugiados icaram alojados nas celas da antiga prisão polıt́ica, sem grandes condições de salubridade ou privacidade. A cada famıĺia foi atribuıd́a uma cela; os solteiros icaram em camaratas comuns, com as camas separadas por cobertores estendidos através da sala.

A Cruz Vermelha, enquanto entidade organizadora, deiniu regras de funcionamento do CAR.

Foram diversas as estratégias de integração social e económica dos indivıd́uos que viveram na Fortaleza de Peniche nesse perıódo. Desde o inıćio que as crianças e jovens frequentaram os estabelecimentos de ensino local. A inserção no meio laboral da vila foi tendo lugar, nomeadamente através do apoio à descarga de peixe e, mais tarde, pela criação do próprio negócio.

De destacar também as festas na Fortaleza, que eram bastante reconhecidas na altura, tanto pelos utentes do CAR como pela população penichense, sendo lugares de diversão, convivialidade e sociabilidade.

Apenas uma pequena percentagem – c. 35 famıĺias – icou em Peniche após o encerramento do CAR, sendo alojada em habitação social deinida para o efeito.

Normas Reguladoras para o Centro de Acolhimento de Peniche. Ordem de Serviço nº 9/78, de 10 de março, da Cruz Vermelho Portuguesa.

DE 1984 AO PRESENTE

A Câmara Municipal de Peniche, em 1984, chama a si a gestão da Fortaleza. Pretendia-se evitar a reocupação do imóvel por parte de entidades externas ao concelho, em particular pelo Ministério da Justiça, divulgar a memória da prisão polıt́ica enquanto sıḿbolo de resistência contra a ditadura fascista e introduzir um conjunto de valências de natureza cultural capazes de promover a visitação e apropriação do monumento.

Dando seguimento a uma longa aspiração da população de Peniche, o Museu Municipal (então “Museu de Peniche”) é inaugurado a 18 de maio de 1984, Dia Internacional dos Museus. Tratava-se de um espaço museológico que pretendia expor coleções representativas da história, etnograia e economia locais, ocupando os antigos blocos afetos ao aquartelamento da GNR, na zona do baluarte da Ribeira. Este espaço museológico iria transitar, na década seguinte, para o Bloco C da antiga cadeia polıt́ica, realidade ainda vigente.

Paralelamente, logo em 1984, são musealizadas algumas estruturas da cadeia, como o 3º piso do Bloco C e o Parlatório, numa perspetiva de evocação da memória da luta antifascista, associada a este monumento.

Nos anos 90 do séc. XX, funcionaram ainda na Fortaleza vários espaços de natureza cultural, associativa, formativa, lúdica e económica, tais como Oicina de Cerâmica, Escola de Renda de Bilros de Peniche, Jardim Escola/ATL, Comissão de Proteção de Menores, Centro de Formação de Informática, Cafetaria, sendo ainda sede de diversas entidades associativas.

A Fortaleza de Peniche é, hoje, um polo de fruição e dinamização cultural que tem a funcionar, no seu interior, o Museu Municipal de Peniche, o Estúdio Municipal de Dança e o Atelier Local de Artes – ALA. Nela entrelaçam-se história, memória e criação artıśtica, fazendo a evocação deste espaço enquanto local de Liberdade.

FROM 1984 TO THE PRESENT DAY

With the aim of preventing the reoccupation of the Fortress by entities other than the municipality, and in particular by the Ministry of Justice, and at the same time for the purpose of introducing a series of cultural values capable of fostering visits to and the appropriation of the monument by the population, Peniche Municipal Council assumed management of the building.

The Municipal Museum of Peniche was inaugurated on 18 May 1984, International Museum Day. The museological space was designed to exhibit representative collections of the local history, ethnography and economy, occupying the former quarters of the GNR (National Republican Guard), in the Ribeira bastion area. In parallel, some of the prison structures were turned into museum rooms, such as the 3loor of C Block and the Parlatório, or prisoners' receiving room, as a way of evoking the memory of the anti-fascist struggle associated to this monument. By the 1990s, several cultural, associational, educational, recreational and economic spaces were operating inside the Fortress.

Today, Peniche Fortress is a focus for the promotion and enjoyment of culture inside which the Peniche Municipal Museum, the Municipal Dance Studio and the Local Atelier of the Arts – ALA – all function. In it, History, Memory and Artistic Creation are entwined.

Espetáculo de encerramento do ano letivo do Estúdio Municipal de Dança, 18 de junho de 2016. Foto de João Rosado. Fotograias da inauguração do Museu de Peniche, 18 de maio de 1984. Escola de Renda de Bilros de Peniche - Piso 2 do Bloco C, 1990.
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