Revista MPAC - 17ª edição

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Sumário 05 Editorial:

Inteligência e cooperação

de Direito 06 Estado Em passado recente, o Ministério Público do

Estado do Acre teve atuação decisiva pela preservação do Estado Democrático de Direito

preciso união 08 ÉA importância da atuação conjunta no enfrentamento ao crime organizado

recuar 10 Sem MP acreano prioriza ações de inteligência contra organizações criminosas

global 14 Desafio Ministério Publico do Estado do Acre tem

olhar atento contra facções criminosas e busca acordos internacionais de combate ao tráfico de drogas

maus caminhos 18 Os MPAC realiza monitoramento constante das

fronteiras e mapeamento de rotas utilizadas pelo crime organizado

serviço do bem 22 ANúcleto de Apoio Técnico completa seis anos e facilita atuação do MPAC

o inimigo 23 Conhecendo MPAC se torna referência em produção de indicadores sobre criminalidade

28 A Violência no Acre direito do Cidadão 30 Um Fórum de Segurança Pública representa

marco na elaboração de estratégias contra criminalidade

Blackout 37 Operação MPAC integra megaoperação contra

organizações criminosas em 15 estados


Kátia Rejane de Araújo Rodrigues Procuradora-Geral de Justiça do Acre Celso Jerônimo de Souza Corregedor-Geral Rodrigo Curti Secretário-Geral Oswaldo D’Albuquerque Lima Neto Procurador-Geral Adjunto para Assuntos Administrativos e Institucionais Sammy Barbosa Lopes Procurador-Geral Adjunto para Assuntos Jurídicos Álvaro Luiz Araújo Pereira Subcorregedor-Geral Leandro Portela Steffen Ouvidor-Geral Colégio de Procuradores: Kátia Rejane de Araújo Rodrigues (Presidente) Giselle Mubarac Detoni Vanda Denir Milani Nogueira Ubirajara Braga de Albuquerque Williams João Silva Edmar Azevedo Monteiro Filho Patrícia de Amorim Rêgo Cosmo Lima de Souza Oswaldo D’Albuquerque Lima Neto Flávio Augusto Siqueira de Oliveira Sammy Barbosa Lopes Carlos Roberto da Silva Maia Álvaro Luiz Araújo Pereira Gilcely Evangelista de Araújo Souza Celso Jerônimo de Souza Rita de Cássia Nogueira Lima João Marques Pires Danilo Lovisaro do Nascimento Produção Diretoria de Comunicação do MPAC

Textos Kelly Souza, Jaidesson Peres e Ulisses Lima

Revisão André Ricardo

Fotos Tiago Teles

Capa e Diagramação Ulisses Lima Jornalista Responsável Kelly Souza MTB 328/AC

_____________________________________ Ministério Público do Estado do Acre www.mpac.mp.br Procuradoria Geral de Justiça Rua Marechal Deodoro, 472, Centro - Rio Branco-Acre - CEP: 69.900-333 - (68) 3212-2000


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Editorial

Inteligência e cooperação

E

m pleno século XXI, sob a égide da denominada “Era do conhecimento” por Piter Drâcker, o homem ainda não superou um dos principais problemas enfrentados no meio social: a criminalidade. Com efeito, a sociedade em rede, caracterizada pela velocidade do fluxo de informações e pelos constantes avanços científicos e tecnológicos, não conseguiu debelar este mal endêmico que acomete todos os segmentos e camadas sociais. Os desafios são inumeráveis no campo do controle e enfrentamento desta crescente onda de criminalidade que assola nossa nação. É de sabença geral que as organizações criminosas vêm desafiando o Estado de Direito, buscando colocar em xeque a credibilidade dos poderes e instituições, criando ‘estados paralelos’ à revelia da ordem jurídica. O Estado Democrático de Direito e os Poderes

organizados e constituídos são mais sólidos e fortes que qualquer ameaça exógena. Não é hora de recuar e retroceder. Pelo contrário. É o tempo de avançar e consolidar políticas públicas e estratégias de enfrentamento contra aqueles que ousam quebrar o pacto social. O art. 144 da Constituição da República proclama que: “A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio”. O Ministério Público do Estado do Acre tem envidado todos os esforços necessários para transpor o direito à segurança pública do plano normativo para o plano factual e dar concreção aos anseios da sociedade, que clama por uma vigorosa atuação contra as incursões criminosas.

Kátia Rejane de Araújo Rodrigues Procuradora-geral de Justiça do MPAC


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Normalidade

Estado de Direito Em passado recente, MPAC teve papel primordial na desarticulação de crime organizado que atuava dentro de instituições públicas

N

os anos 90, a atuação do Ministério Público do Estado do Acre (MPAC) foi primordial para desarticular o crime organizado que mantinha sustentáculos nas instituições públicas. Liderado por um coronel da Polícia Militar, responsável por ordenar a execução de várias pessoas que interferiam nos interesses do esquadrão, o grupo

atuava na cobrança de dívidas, acertos de conta, contrabando de cigarros e tráfico de drogas. “Era um momento muito difícil em que, com esse grupo de extermínio, que era chefiado por um coronel, nós tínhamos atos explícitos de violência que afrontavam o poder estatal constituído. Executavam pessoas, executavam, às vezes, criminosos, mas pessoas

que também não tinham nenhuma ligação com a criminalidade, atos ilícitos praticados. Então, o grupo de extermínio servia para várias funções”, lembra o procurador de Justiça Danilo Lovisaro, que ingressou no MP acreano no auge da atuação do crime organizado. De acordo com ele, que desenvolve um estudo de doutorado sobre a investigação preliminar


7 comparando o sistema jurídico italiano com o sistema jurídico latino-americano, essas organizações criminosas, geralmente, surgem diante da fraqueza ou omissão do poder estatal. Esse quadro leva uma parcela da população, descrente na atuação da polícia e no sistema judicial, a confiar na proteção de grupos de extermínio. Nas comunidades pobres, os moradores chegam a apoiar tais grupos, já que, na ausência do Estado, são essas organizações que mantêm a ordem e afasta os criminosos perigosos. O grupo de extermínio, então, é visto como a única força capaz de garantir o mínimo de ordem e segurança aos moradores atormentados por diversas mazelas sociais. O esquadrão da morte, como

ficou conhecido no Acre, matou, dilacerou corpos, torturou, manteve cemitério clandestinos, ameaçou autoridades. Para enfrentar essa deplorável situação, foi necessário articular uma força-tarefa das instituições, como Ministério da Justiça, os Ministérios Públicos Estadual e Federal e a Secretaria de Segurança Pública. Empenhado na preponderância do Estado Democrático de Direito e demonstrando pulso firme, o MP acreano, por sua vez, tomou uma série de medidas no enfrentamento à problemática. Esse amplo esforço desembocou na criação do Grupo Especial de Combate ao Crime Organizado, hoje Gaeco, no desarquivamento de inquéritos policiais e processos, instrução de inquéritos, envio de

casos já instruídos de competência do Ministério Público Federal, utilização da delação premiada e no alargamento das fronteiras de atuação, através das diligências feitas em outros estados. O resultado disso foi redentor. Apoiado pela sociedade, que clamava por paz e justiça, em especial o Comitê contra a Impunidade e o Centro de Defesa dos Direitos Humanos da Diocese de Rio Branco, o MPAC conseguiu dar uma resposta à altura do desafio enfrentado por um estado ainda novo, que buscava consolidar suas instituições. Com a investigação conjunta e oferecimento de denúncias, várias pessoas foram condenadas, desligadas de cargos públicos e as instituições recuperaram a sua credibilidade.


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Integração institucional

É preciso união Atuação conjunta no enfrentamento ao crime organizado é a chave do sucesso

O

fenômeno da violência urbana cada vez mais coloca em alerta as autoridades públicas para uma resposta que esteja à altura dos novos tempos em que vivemos. Visto como um fenômeno complexo, a violência decorre de vários fatores econômicos, sociais e políticos, mas o crime organizado é um de seus principais catalisado-

res, atuando sobretudo no tráfico de drogas, com controle de territórios e farta disponibilidade de mão-de-obra. Lembrando o caso da Itália no enfrentamento à máfia, em que se criou uma atuação coordenada de várias instituições, o procurador de Justiça Danilo Lovisaro defende uma resposta em que se envolvam todos os órgãos do estado

para conter as chamadas facções criminosas, que têm ameaçado a sociedade e o Estado com o tráfico de drogas. “Em um momento de dificuldade, aqui no estado e no âmbito nacional [esquadrão da morte], se verificou que só a atuação conjunta, a atuação que envolve todas as instituições relacionadas ao aparato da segurança pública,


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pode enfrentar qualquer tipo de crime organizado, seja o esquadrão da morte, seja hoje a nossa realidade triste em que vivemos com as facções criminosas”, disse o procurador de Justiça. O Ministério Público acreano tem papel fundamental no enfrentamento ao crime organizado. No entanto, segundo o procurador de Justiça, a realidade atual é diferente da que ocorreu com o grupo de extermínio, embora o

modelo de atuação do MPAC tenha sido exitoso. “O passado é um modelo bem-sucedido, porque se conseguiu debelar a atuação do grupo de extermínio naquele momento. Só que era uma realidade diversa.” Lovisaro chama a atenção para a complexidade dos fatos e o amplo desafio por parte de todas as instituições públicas no cumprimento de suas funções, não só aquelas ligadas à segurança pú-

blica. “Não há a menor possibilidade de se fazer o enfrentamento ao crime organizado sem que haja uma união, coordenação de todas as instituições envolvidas. Não há espaço no enfrentamento ao crime organizado, como ele está hoje operando, para a omissão de nenhum campo do Estado. Não se pode ser omisso, não se deve estar presente só na ponta, no aspecto criminal, quando as coisas aconteceram, que é o repressivo.”


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Enfrentamento

Sem recuar

Tecnologia, inteligência e informação como aliadas na repressão às organizações criminosas

Ônibus incendiado no bairro Belo Jardim II em Rio Branco. Foto: Aline Nascimento/G1

A

situação da segurança pública é uma das principais preocupações da população, que sofre com a ousadia das

facções e seus métodos cada vez mais aprimorados, promovendo assaltos frequentes, execuções horrendas, incêndios criminosos,

ataques a prédios públicos e rebeliões nos presídios. Diante desse quadro, o MP acreano passou a eleger como prioridade a atuação


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enérgica contra o crime organizado, investindo em tecnologia, inteligência e informação, proporcionando capacitação a membros e servidores e estabelecendo parcerias com outros órgãos estatais ligados à segurança pública. Em 2012, ainda na gestão da

então procuradora-geral Patrícia de Amorim Rêgo, foi criado o Núcleo de Apoio Técnico (NAT), que é de fundamental importância nas decisões, ações ou proposições dos promotores e procuradores de Justiça. O órgão presta apoio em questões que envolvam

conhecimento especializado, tecnologia e inteligência. A inciativa faz parte do processo de evolução da atuação do MPAC. Setores do NAT já são referência em nível nacional, como é o caso do Observatório de Análise Criminal, que produz dados, informações e conhecimentos sobre criminalidade, focando especialmente nas organizações criminosas. Para isso, conta com uma equipe de analistas criminais capacitados que atuam em articulação com o Gaeco e demais setores do NAT. “Os desafios passam justamente por esse aspecto de que nós temos que evoluir a cada momento. Não há espaço de acomodação para o servidor nem para o promotor. No Observatório de Análise Criminal, por exemplo, há trabalho meticuloso no que diz respeito à análise de dados relacionados à criminalidade do nosso estado. Diria que é uma fonte extremamente confiável, inclusive para o público externo do MP”, afirma Lovisaro. Atual coordenador do Gaeco, o procurador de Justiça destaca a evolução do órgão de execução do MPAC, que opera em duas frentes: uma relacionada ao combate às facções e a outra contra a corrupção e lavagem de dinheiro. “Acho que o Gaeco, de sua conformação inicial ao que é hoje, evoluiu muito, e me sinto orgulhoso de ter sido parte em todos os momentos e vendo a contribuição tão relevante que os colegas têm trazido”.


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O Gaeco é o responsável, no âmbito do MPAC, pelo combate e repressão às ações desenvolvidas pelo crime organizado, traçando estratégias e políticas de enfrentamento a essas organizações criminosas. O órgão se destaca pelo envolvimento direto de promotores na prática de investigação e o trabalho conjunto com autoridades policiais. Para atacar o braço financeiro dessas organizações, o MPAC implantou, em 2014, em parceria com

o Ministério da Justiça, o Laboratório de Tecnologia contra a Lavagem de Dinheiro (LAB-LD), que utiliza softwares e metodologia de análise e de mineração de dados capaz de fazer cruzamentos de informações em investigações complexas que demandam quebras de sigilo bancário, telefônico, telemático ou fiscal de longos períodos. “A nossa atuação tem como objetivo, principalmente, atacar o braço financeiro. Temos que

seguir o dinheiro dessas organizações. É um caminho sempre difícil e que vai depender de investigações cada vez mais profundas e complexas, bem como, de investimentos nos recursos humanos, em termos de qualificação. Cito o LAB-LD, instrumento pelo qual o MPAC está se legitimando como uma das instituições mais qualificadas para capitanear o enfrentamento ao crime organizado”, assinalou Lovisaro.


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Desmantelamento

Desafio global Fortalecimento interno, diálogo interinstitucional e aprofundamento de estratégias marcam atuação do MPAC para conter escalada da violência

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criminalidade organizada expande-se mundo afora, engloba novos agentes e inova nos seus métodos de atuação, o que traz imensos desafios

ao Estado. No caso do Acre, a posição geográfica é um dos pontos que merecem atenção, sobretudo em razão das fronteiras com os dois maiores países produtores

de cocaína do mundo: Peru e Bolívia. O estado, assim, passa a ser um território estratégico para a rota do tráfico de drogas e armas. Com isso, muitas organizações


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com atuação no sudeste, que têm suas entranhas nos presídios, buscaram se instalar no estado. A partir de 2012, foram formados os primeiros núcleos de facções oriundas de outros estados. Porém, o movimento não passou despercebido pelo MPAC e as autoridades da segurança, ocasião em que se deu a primeira operação— a Diáspora—, resultando na denúncia e responsabilização de 46 integrantes. Mesmo com todo o esforço, a criminalidade organizada continuou avançando. Em 2013, foi criada a primeira facção local, surgida dentro do Presídio Francisco d’Oliveira Conde, com a finalidade de se contrapor à instalação de organizações nacionais. Com

as investigações em andamento, o MPAC entendeu que precisava aprofundar a estratégia de combate ao crime e, então, ampliou o diálogo com outras instituições públicas, bem como, cumpriu papel de articulador para que essas instituições também dialogassem entre si. Dessa forma, a nova fase de atuação do MP acreano foi norteada por dois eixos: um de fortalecimento interno e o outro de integração com instituições externas. O resultado foi a deflagração de 20 operações com 815 pessoas denunciadas só no último biênio, correspondendo a 20% do contingente carcerário que cumpre pena em regime fechado. No âmbito interno, o NAT foi

estruturado e fortalecido. Já o Laboratório de Tecnologia contra a Lavagem de Dinheiro, que era voltado aos crimes de colarinho branco, passou também a trabalhar na identificação do braço financeiro das facções, permitindo o bloqueio e recuperação da cifra de R$ 15 milhões. Nisso, ainda é importante o trabalho do Observatório de Análise Criminal na produção de conhecimento sobre a criminalidade. No quesito tecnologia, houve investimento em equipamentos e no desenvolvimento de ferramentas próprias que, inclusive, foram difundidas para mais de 12 instituições parceiras. Foram também adquiridas ferramentas para extração de dados de equi-


16 pamentos eletrônicos. O Núcleo de Inteligência do NAT, em um trabalho integrado, hoje, conta com colaboradores, além do próprio quadro, que pertencem a outros organismos estatais. “Isso traz maior eficiência, sobretudo na identificação de suspeitos e pessoas envolvidas nessas organizações. Com essas ferramentas, temos, por exemplo, capacidade interna de realizar extração, tratamento e análise de dados dentro de um estandarte forense, pericial e técnico”, disse o coordenador-adjunto do NAT, promotor de Justiça Bernardo Albano. Na relação com outras instituições, o MPAC empenhou-se

para estar presente nas decisões dos Gabinetes de Gestão Integrada, visando participar do planejamento de estratégias com as forças de segurança pública. Teve papel importante também na articulação da criação de 70 vagas no regime disciplinar diferenciado para os presos influentes e líderes de facções que cumprem pena no Presídio Antônio Amaro Alves. “Isso é importante porque nos possibilita isolar as lideranças das organizações criminosas em nosso próprio estado, evitando que possamos utilizar o sistema penitenciário federal, que tem uma pesada contrapartida, que é justamente o contato desses pre-

sos, encaminhados daqui a outros presídios, com outras lideranças de outros estados, o que acaba fomentando uma integração criminosa absolutamente nefasta”, explica Albano. O trabalho capitaneado pelo Gaeco com o objetivo de desarticular as organizações criminosas, por meio de operações integradas com a inteligência, teve o reconhecimento do Prêmio CNMP, em 2017. “Realizamos, nesse período de dois anos, 20 operações, com várias instituições parceiras, principalmente a Polícia Civil. Ou seja, as organizações criminosas, com atuação mais contundente no estado, vêm sendo combatidas, suas lideranças identificadas,


17 e em números muitos expressivos”, sublinha Albano. Das principais operações levadas a cabo pelo Gaeco, a Operação Fim da Linha foi um marco no combate ao crime, com a denúncia de 165 pessoas, um número expressivo que a tornou a segunda maior operação deflagrada em um estado brasileiro contra uma organização criminosa. Já a

Operação Sintonia, em parceria com a Polícia Civil, denunciou 138 membros de facções e a Operação Êxodo desdobrou-se em três fases. Levando em conta a posição geográfica do Acre, o promotor de Justiça Bernardo Albano defende uma integração maior, no combate à criminalidade, com outros estados e inclusive com os

órgãos de segurança da Bolívia e do Peru. “É preciso estreitar as relações, porque o crime hoje é transnacional. Da mesma forma, é importante a atuação do GNCOC [Grupo Nacional de Combate às Organizações Criminosas] como aglutinador de todos os Gaecos. Hoje o criminoso não é mais regional, e devemos também nos unir.”


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Mapa do crime

Os maus caminhos

Autoridades monitoram continuamente fronteiras e mapeiam rotas utilizadas pelo tráfico de drogas

O

Acre é o 15º estado brasileiro em extensão territorial com uma superfície de 164.221,4 quilômetros quadrados, ocupando 4% da Amazônia brasileira e 1,9% do território nacional. Localizado no extremo sudoeste da Amazônia, faz divisa com os estados do Amazonas e Rondônia e mais dois países. Das 22 cidades acreanas, 17 estão situadas na linha de fronteira com países andinos. O estado possui uma extensa faixa de

fronteira com a Bolívia (618km) e o Peru (1.350). Juntos, esses dois países são responsáveis por mais de 10% de todo o cultivo de coca no mundo, com mais de 90.000 hectares plantados. A Bolívia é considerada o terceiro maior produtor de coca, perdendo apenas para a Colômbia e o Peru, de acordo com o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes (UNODC). Os dados fazem parte de constante monitoramento feito pelo

MPAC, por intermédio do NAT, que foi criado em 2013 para prestar apoio de inteligência e segurança institucional, técnico-científico e operacional aos órgãos de execução, especialmente ao Gaeco. O trabalho é conduzido pelos promotores Marcela Cristina Ozório e Bernardo Albano, coordenadora e coordenador-adjunto do NAT, respectivamente, que vem realizando o monitoramento de forma contínua desde 2016, logo que se verificou o acirramen-


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to da disputa entre facções criminosas por território de drogas, resultando em conflitos dentro e fora dos presídios do Acre. Diante desse cenário, o número de vítimas de homicídios dolosos aumentou em 80%. Naquele ano, pela primeira vez, o estado registrou uma onda de atentados, desencadeada após a morte de um traficante, em Rio Branco e interior, contra ônibus e prédios públicos. Uma rebelião no presídio Francisco d’Oliveira Conde, na capital, deixou quatro mortos e quase vinte feridos. Nesse monitoramento do

MPAC, são produzidas informações relacionadas às características das fronteiras, aos crimes e destinos das drogas que entram no Acre passando por essas regiões, indicadores de violência relacionados ao tráfico, entre outras. Aspectos geográficos e fragilidade No Acre, a vasta malha hidroviária, especialmente nas regiões do Alto Acre, Purus e Juruá, apresenta-se como principal acesso de traficantes de entorpecentes oriundos dos países vizinhos. Alguns dos principais rios que cor-

tam o estado têm suas nascentes na Bolívia ou Peru. Sendo o quarto estado, na Amazônia Legal, de maior preservação da cobertura florestal, ramais localizados em regiões de mata fechada e de difícil acesso também favorecem o fluxo de pessoas clandestinas, drogas e contrabandos. Esses aspectos geográficos aliados a uma cobertura de fiscalização insuficiente dificultam a atuação dos órgãos estaduais de segurança pública no combate ao narcotráfico e demais crimes fronteiriços. Os traficantes en-


20 tram no estado, abastecem o mercado local e, daqui, seguem para as demais regiões do país, o que faz do Acre um dos principais estados de trânsito para escoamento de droga. Além do tráfico, aparecem entre os crimes mais comuns, nos municípios acreanos situados em regiões de fronteira com a Bolívia e o Peru, o furto de animais, contrabando de armas e munições, refúgio de criminosos, crimes ambientais, imigração clandestina, exploração sexual infanto-juvenil e homicídios. Os caminhos da droga Segundo o MPAC, a droga chega ao estado por rios, ramais, estradas ou até mesmo em voos co-

merciais, que partem de cidades peruanas sem qualquer fiscalização, pelas regiões do Juruá, Alto Acre e Purus. Foram mapeadas mais de dez das principais rotas, a maioria delas em localidades que ficam na fronteira com o Peru, que, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), é o maior produtor mundial da coca, matéria-prima da cocaína. No Juruá, o trajeto até chegar a Cruzeiro do Sul, de onde sai a droga para Rio Branco, pela BR364, é feito por via fluvial e terrestre em mata fechada e pode demorar dias. A cobertura vegetal reduz o fator surpresa e amplia as possibilidades de fugas dos traficantes ou de eles se desfazerem

da droga jogando no rio. Em 2017, em três dias, foram apreendidos quase 260 quilos de droga, entre maconha e cocaína, na região do Juruá. As apreensões foram realizadas pelas Polícias Militar, Civil e Federal em operações distintas. No Purus, a droga vem principalmente pelo município de Santa Rosa, distante cerca de dez minutos de barco de uma vila peruana apontada como principal refúgio de traficantes e como ponto de entrega de droga aos brasileiros. Os traficantes também utilizam caminhos partindo das cabeceiras do rio Iaco, saindo de Assis Brasil, utilizando até mesmo animais no transporte quando no inverno amazônico,

Foto: Sérgio Vale/Secom/Gov do Acre


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em direção à Sena Madureira ou à Estrada Transacreana, por onde chegam até a capital. Nas regionais Alto e Baixo Acre, a rota dos criminosos foi traçada baseada em informações colhidas in loco a respeito de vias de entrada e saída de produtos ilícitos na Bolívia e, não diferente do que ocorre nas demais, passam pela floresta até chegarem à rodovia BR-317. Drogas e expansão da violência Os números do levantamento feito pelo MPAC reforçam que o tráfico, consumo de drogas e a criminalidade estão cada vez mais próximos. Verifica-se uma relação direta entre o aumento do número de homicídios e roubos e o uso e venda de entorpecentes. E

quanto mais avançam as facções dentro e fora dos presídios, mais crescem os índices de violência nas ruas. Em 2010, a taxa de homicídios no Acre era de 24.9 por 100 mil habitantes, passando para 43,5 seis anos depois. De 2015 para 2016, o número de assassinatos cresceu 83%. Em 2017, 42 pessoas foram assassinadas, em média, por mês no estado. Em 2016, o uso de arma de fogo para o cometimento do crime de homicídio consumado estava presente em 65% dos casos. Já em 2017 e 2018, os casos com o uso de tal instrumento superaram os 70%. Até 21 de maio deste ano, haviam sido registrados 163 assassinatos e mais da metade (57%) possuía autoria desconhecida.

“Importa salientar que o principal motivo para o expressivo aumento foi atribuído às disputas entre as organizações criminosas pelo controle do tráfico de drogas nas diversas localidades do estado”, explica o promotor Bernardo Albano. Em Rio Branco, dados do Centro Integrado de Operações em Segurança Pública (Ciosp) mostram que os registros de roubos cresceram 92% de 2011 a 2016. “O roubo é a principal prática criminosa desenvolvida pelos integrantes das organizações criminosas para garantir a aquisição de drogas e armas nos países vizinhos. O patrimônio de preferência são os veículos, em especial motocicletas, camionetes e caminhões, condicionados às exigências dos receptadores bolivianos”, acrescenta o promotor.


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Multidisciplinaridade

A serviço do bem Núcleo de Apoio Técnico completa seis anos e facilita atuação ministerial

O

Núcleo de Apoio Técnico (NAT) é coordenado pela promotora de Justiça Marcela Ozório e conta com uma equipe de cerca de 40 profissionais habilitados em diversas áreas de conhecimento que prestam apoio aos órgãos de execução e, em especial, Gaeco. O órgão é ainda responsável pelo gerenciamento e funcionamento do Sistema de Investigação de Movimentação Bancá-

ria (Simba) e do Laboratório de Tecnologia contra Lavagem de Dinheiro (LAB-LD), duas importantes iniciativas com foco na área financeira para combater a lavagem de dinheiro, corrupção e sonegação fiscal. Internamente, o NAT está organizado em seis principais coordenações: Operações, LAB-LD, Inteligência e Segurança Institucional, Tecnologia da Informação e Laboratório Forense Computa-

cional, Observatório de Análise Criminal e, por último, o Setor Técnico-Científico, que atua de forma integrada e interdisciplinar nos casos sob análise. Esse setor é responsável pela elaboração de estudos e pesquisas técnico-científicas que subsidiam os procedimentos judiciais e extrajudiciais do MPAC. Para isso, conta com uma equipe multidisciplinar que atua nas áreas ambiental, conflitos agrários, ha-


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bitação e urbanismo, patrimônio público, cidadania, direitos humanos e infância e juventude. O coordenador Artur Leite lembra que a maior parte dos problemas que chegam ao setor não acontece isoladamente. Ele dá o exemplo das frequentes denúncias de negligência contra idosos, ocasião em que os profissionais da psicologia e assistência social entram em cena fazendo visita domiciliar, acionando os órgãos públicos, buscando familiares e até acompanhando a audiência com os responsáveis. Com essa ação, são descobertos outros problemas, a exemplo da exploração

financeira. “O trabalho interdisciplinar faz toda a diferença e dá munição para fundamentar a ação do promotor”, justifica. Inaugurado em 2014, o Laboratório de Tecnologia contra a Lavagem de Dinheiro atua em investigações criminais que envolvam quebras de sigilo bancário, telefônico e fiscal. A iniciativa é resultado de um acordo técnico firmado com o Ministério da Justiça e visa à identificação, ao rastreamento e à recuperação de recursos, com o bloqueio de bens e contas bancárias, oriundos das atividades ilícitas de grande complexidade.

O coordenador do LAB-LD, Adriano Sales Santos, sublinha que o MPAC é o único no estado que dispõe desse tipo de estrutura para analisar grande volume de dados, o que, inclusive, legitima-o a fornecer informações a outras instituições. “O laboratório não é isolado. Ele compõe uma rede nacional de laboratórios de tecnologia contra a lavagem de dinheiro. Entendemos, assim, que, para desmantelar uma organização criminosa é preciso retirar o recurso financeiro, o que automaticamente desfalca a organização”.


24 Estruturação e capacidade técnica Primeiro coordenador do NAT, o procurador de Justiça Danilo Lovisaro disse que, nesses seis anos, o NAT foi importante para o avanço das atividades do MPAC. “Hoje, cada vez mais existe uma especialização dos servidores que ali trabalham, mas que, por um lado, sempre conta com essa característica da multidisciplinaridade. É um setor de excelência e que, atualmente, passados esses seis anos, seria praticamente inconcebível o MPAC continuar funcionando de uma forma eficiente sem a existência desse setor”, declarou.

Danilo Lovisaro menciona ações emblemáticas do órgão que tiveram repercussão e contribuíram para o reconhecimento do MPAC. No caso da ‘Telexfree’, condenada pela prática de pirâmide financeira, o trabalho de investigação do Laboratório de Tecnologia contra a Lavagem de Dinheiro foi decisivo para o sequestro de valores em contas correntes. “O NAT tem se mostrado um órgão essencial ao bom andamento das atividades do Ministério Público. Os profissionais têm qualificação e recebem capacitação”. A atual coordenadora, promotora de Justiça Marcela Ozó-

rio, afirmou que a estrutura e a capacidade técnica do NAT influenciam diretamente para que membros e servidores do MPAC possam desempenhar suas funções com qualidade. “O NAT realiza serviços de vistorias, elaboração de relatórios, estudos, perícias, auditorias e assessoramento técnico. Para isso, conta com uma estrutura especializada para prestar todo o suporte necessário de que os membros precisam para demandar judicialmente ou extrajudicialmente, bem como, ações que tenham por objetivo a mudança da realidade social”, garantiu.

“O NAT tem se mostrado um órgão essencial ao bom andamento das atividades do Ministério Público. Os profissionais têm qualificação e recebem capacitação.” - Marcela Ozório Promotora de Justiça



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Informação

Conhecendo o inimigo Observatório de Análise criminal torna-se referência em produção e fornecimento de indicadores sobre segurança pública

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igado ao NAT, o Observatório de Análise Criminal é onde os indicadores, que estão relacionados a práticas criminosas das facções, passam por análise e geram dados que orientam o trabalho do MPAC e auxiliam a atuação dos órgãos de segurança.

Foram produzidos dois Anuários de Informações e Indicadores Prioritários de Violência e Criminalidade e quase 900 relatórios técnicos. Esses e outros dados foram determinantes para a realização de operações integradas, que resultaram na denúncia de 815 integrantes de facções cri-

minosas e na recuperação de cerca de R$ 15 milhões. “Historicamente, o Ministério Público do Estado do Acre tem uma atuação muito forte contra o crime organizado. A fragilidade das nossas fronteiras e a presença de facções criminosas no estado tornam essa luta muito


27 árdua, mas temos feito esse enfrentamento com firmeza, com um trabalho de inteligência, junto com as demais instituições”, assegura a procuradora-geral de Justiça, Kátia Rejane de Araújo Rodrigues. Os dados foram entregues para os órgãos que compõem o sistema de segurança pública e autoridades, entre elas o presidente da República, Michel Temer, que recebeu um dos levantamentos em agosto do ano passado. Anuário nacional O MPAC teve participação na edição especial do 12º Anuário do

Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). O coordenador do Observatório de Análises Criminais, Aldo Colombo Júnior, foi o autor do artigo intitulado ‘A violência no Acre’. De acordo com Aldo Colombo Júnior, o MPAC passou a ser uma referência na produção e fornecimento de indicadores sobre segurança pública. “Pela característica do Ministério Público, a gente requisita dados dos vários órgãos públicos, trata-os, transforma em conhecimento e os difunde para o uso na tomada de decisão dos gestores do sistema integrado de segurança pública, e membros

‘‘Temos feito esse enfrentamento com firmeza, com um trabalho de inteligência, junto com as demais instituições” - Kátia Rejane de Araújo Rodrigues Procuradora-geral de Justiça do Estado do Acre

do Ministério Público que atuam nessa área.” A publicação é uma importante ferramenta para a promoção da transparência e da prestação de contas na área da segurança pública, influenciando a melhoria da qualidade dos dados por parte dos gestores públicos. Além disso, contribui para a produção de conhecimento, para o incentivo à avaliação de políticas públicas, para a introdução de novos temas na agenda de discussão do campo e para ações de incidência política realizadas por diversas organizações da sociedade civil.


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Artigo

A Violência no Acre Aldo Colombo Júnior Bacharel em Direito, Especialista em Criminologia, Política Criminal e Segurança Pública, Especialista em Segurança Pública e Direitos Humanos. 3º SGT da Polícia Militar do Acre, Atualmente coordenador do Observatório de Análise Criminal do Núcleo de Apoio Técnico do Ministério Público do Acre.

A

violência e a criminalidade estão em pauta na sociedade brasileira e vêm ganhando centralidade nas diversas áreas do conhecimento voltadas para o estudo sobre o comportamento humano e as conexões causais que constituem o problema. A compreensão do fenômeno

delitivo está condicionada a uma avaliação com perspectiva mais sociológica e com caráter analítico/explicativo sobre os fatores constituintes do crime e da dinâmica do seu desenvolvimento, assim como sobre as políticas públicas voltadas para a regulação social e restabelecimento da ordem.

No momento, o que se percebe é um processo de naturalização do fenômeno da violência, que vem se enraizando na sociedade devido à desorientação normativa e valorativa. No que tange especificamente ao Estado do Acre, a violência adquiriu outros contornos conside-


29 rando o que vem ocorrendo nos últimos quatro anos. Há até pouco tempo, as ações de segurança pública concentravam-se na prevenção e repressão de delitos que apresentavam incidência com níveis toleráveis do ponto de vista analítico-criminal e social. Ocorre que, nos últimos anos houve uma explosão nos registros de crimes violentos, com variações expressivas e sem precedentes. Tal fenômeno fez emergir manifestações dos vários segmentos sociais e políticos com o objetivo de identificar os fatores causais e, a partir dos parâmetros encontrados nas publicações oficiais de nível nacional, poder dimensionar o problema e, consequentemente, desenvolver planos operativos estratégicos. No tocante a este assunto, torna-se necessário trazer ao conhecimento alguns indicadores correlatos que, em regra, são utilizados para aferir os níveis de violência de um território. A este respeito, destaca-se, no Estado do Acre, a evolução contínua da taxa de vítimas de homicídios dolosos por grupo de 100 mil habitantes. Verifica-se que as taxas registradas em 2014 e 2015, de 24,7 e 27,5, respectivamente, ainda que abaixo da taxa nacional, não afetaram positivamente o sentimento de segurança da sociedade acreana. Já em 2016, a taxa de homicídios dolosos apresentou um aumento de 58% em relação ao ano anterior, resultando em uma taxa de 43,3. Como se já não bastasse, em 2017, o

crescimento de assassinatos não cessou e o Estado registrou a maior taxa de homicídios de sua história, sendo contabilizadas 502 vítimas, o que representou uma taxa de 60,5 e posicionou o Acre dentre os Estados com as piores taxas do Brasil. Mesmo que hipoteticamente, qual seria a explicação para tal fenômeno? A partir de 2015 o Acre começou a registrar ações violentas orquestradas por Organizações Criminosas (ORCRIMs) instaladas no Estado. Em um primeiro momento, as ações criminosas se desenvolviam a partir de ataques contra o patrimônio público e privado, praticados como retaliação às ações preventivas e repressivas desenvolvidas pelo Sistema de Segurança Pública do Estado. Poucas eram as mortes decorrentes de conflitos inter, entre e contra Orcrims. Entretanto, a partir de 2016, o interesse das Orcrims no domínio das rotas do tráfico de drogas, assim como do mercado de consumo de drogas no Estado, fez explodir uma guerra entre as facções, fato este que refletiu, consideravelmente, no inflacionamento dos números de assassinatos, roubos e, consequentemente, da população carcerária. Para que se tenha uma ideia, o número de roubos no estado aumentou 85% nos últimos cinco anos (2013/2017)¹. Entre 2014 e 2016, conforme dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, a taxa de aprisionamento cresceu 20,7%, chegando a 1056 por 100 mil ha-

bitantes maiores de 18 anos, e 1,7 presos por vaga. Em 2017, a população carcerária seguiu crescendo, de modo que a taxa de ocupação prisional no chegou a 209%, ou seja, uma razão de 2,1 presos por vaga.² Percebe-se ainda, um envolvimento cada vez maior de jovens nas práticas criminosas em comento, sejam eles vítimas ou autores. Diante deste preocupante cenário, cabe a todas as esferas do poder público, envolvidas direta e indiretamente com o desenvolvimento e execução das políticas públicas de segurança pública, reavaliarem os modelos operativos e readequá--los no sentido de reestabelecer os níveis razoáveis da criminalidade. Para tanto, torna-se condicionante para o sucesso das futuras ações avançar na produção de conhecimento situacional a respeito dos fatores causais que constituem a problemática em discurso. Temas como Crime Organizado, Fronteira e Sistema Prisional, em especial no que tange ao modelo de execução penal, devem ser priorizados no Plano Estadual de Segurança Pública. Por fim, nota-se que uma importante etapa de um modelo de política pública de Segurança Pública resolutivo já está incorporada no briefing dessa jornada, a saber, a INTEGRAÇÃO. ________________________ ¹ Centro Integrado de Operações de Segurança Pública (CIOSP/SESP/AC). ² Instituto de Administração Penitenciária do Acre (IAPEN/AC).


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Segurança pública

Um direito do Cidadão Fórum realizado pelo MPAC representa marco na elaboração de estratégias em prevenção e controle da criminalidade

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elaboração de estratégias e medidas para prevenir e conter a criminalidade no estado deu a tônica no Teatro da Faculdade da Amazônia Ocidental (Faao), nos dias 19 e 20 de novembro. O “Fórum de Segurança Pública: um direito do cidadão”

encerrou-se com balanço positivo e reuniu centenas de pessoas, entre especialistas, intelectuais, estudantes, operadores do Direito e da segurança. Realizado pelo Ministério Público do Estado do Acre, o encontro é considerado um marco

para as políticas públicas de segurança, em que instituições do sistema de segurança pública e da Justiça unem-se para construir uma resposta à sociedade no sentido de resguardar a vida, a integridade física e a tranquilidade dos cidadãos.


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“Além de constituir um dever do Estado, a segurança pública revela-se um direito fundamental de cada cidadão brasileiro.” - Kátia Rejane de Araújo Rodrigues Procuradora-geral de Justiça do Estado do Acre

Durante as discussões, ficou nítida a preocupação dos representantes de instituições públicas, pensadores e autoridades com a preservação do Estado Democrático do Direito diante das ameaças de organizações criminosas que têm como principal fonte de lucro o comércio ilegal de drogas, bem como, a troca de informações para minar a atuação desses grupos, que têm promovido atentados e travado uma guerra pelo domínio do tráfico. A procuradora-geral de Justiça, Kátia Rejane de Araújo Rodrigues, sublinhou que a segurança é um direito fundamental de qualquer pessoa, conferido pela Constituição, e o Estado tem de empreender todo o esforço para tornar isso realidade. “Além de constituir um dever do Estado, a segurança pública revela-se um direito fundamental de cada cidadão brasileiro, incumbindo aos poderes da República, forças policiais e órgãos

integrantes do Sistema de Justiça e segurança pública, aqui incluído o Ministério Público, envidar todos os esforços para transpor este direito basilar do plano normativo para o plano factual”, afirmou a procuradora-geral, que elegeu como uma de suas prioridades à frente do MP acreano o enfrentamento à criminalidade. Na programação, os principais eixos de discussão versaram sobre a problemática de homicídios, tráfico de drogas, sistema penitenciário e organizações criminosas, divididos sob a forma de mesas temáticas, com a participação de especialistas de cada área. No primeiro dia, o evento ofereceu duas mesas temáticas — a primeira sobre o sistema penitenciário e a outra sobre o tráfico de drogas. Mediada pelo procurador de Justiça João Marques Pires, a discussão trouxe à luz questões a respeito da superlotação de presídios, valorização e capacitação dos servidores do sistema prisio-

nal, infraestrutura, utilização de tecnologia e, principalmente, a importância dos procedimentos operacionais. O coordenador-geral de Informação e Inteligência Penitenciária do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), Sandro Abel Barradas, e o diretor do Instituto de Administração Penitenciária do Estado do Acre (Iapen), Aberson Carvalho de Sousa, desenvolveram suas considerações no sentido de melhorar o sistema carcerário do Acre que, tendo a maior população carcerária do Brasil e o predomínio de pessoas presas por tráfico de drogas, é alvo das organizações criminosas que tentam expandir seu domínio. Em outra ponta, a promotora de Justiça Joana D’Arc Dias Martins mediou a mesa temática acerca do tráfico de drogas. Ela foi ladeada pelo delegado da Polícia Civil Pedro Resende e o coronel da Polícia Militar Emílio Virgílio Lima de Oliveira.


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Organizações criminosas e homicídios No segundo dia, o evento trouxe o procurador-geral de Justiça de Alagoas, Alfredo Gaspar de Mendonça Neto, que é também coordenador do Grupo Nacional de Combate às Organizações Criminosas (GNCOC) do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais do Ministério Público (CNPG). Ex-secretário de Estado de Segurança, o procurador-geral citou a semelhança de seu estado, quanto aos aspectos da violência urba-

na, com o Acre. Segundo ele, com a interiorização das facções criminosas, Alagoas alcançou uma das maiores taxas de homicídios do país, ocasião em que foi convidado para ocupar o cargo de secretário de Estado de Segurança Pública, implantando um gabinete de gestão integrada com a participação de todos os comandos das forças policiais. Mediada pelo delegado da Polícia Civil Alcino Souza Júnior, a mesa temática sobre organiza-

“A legislação é arcaica e o povo na rua quer que as instituições funcionem.” - Alfredo Gaspar de Mendonça Neto Procurador-geral de Justiça do Estado do Alagoas e coordenador do Grupo Nacional de Combate às Organizações Criminosas (GNCOC)

“Fóruns como este, além de trazerem temas importantes para uma reflexão, favorecem a integração e conhecimento de outros órgãos sobre técnicas que possam ser compartilhadas.” - Sandro Abel Barrada

Coordenador-geral de Informação e Inteligência Penitenciária do Departamento Penitenciário Nacional (Depen)


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“O combate à criminalidade engloba políticas de inclusão social, alterações legislativas, controle das vias de acesso das fronteiras e o isolamento das lideranças do crime.” - Bernardo Albano Promotor de Justiça

“Existem dois tipos de impunidades: aquela em que não há punição daquele que deveria ser punido e a punição branda, que é aquela que é muito tímida.” - Ildon Maximiano Promotor de Justiça

“O Estado tem um modelo social e econômico injusto e precisa trabalhar políticas afirmativas e políticas estruturantes.” - Jaqueline Sousa de Araújo Pesquisadora e servidora do NAT/MPAC


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“Nós que estamos envolvidos diretamente, precisamos trazer esclarecimentos desse porte à comunidade como um todo.” - João Marques Pires Procurador de Justiça

“Grande parte dos assassinatos acontece em razão dos conflitos entre facções. Por isso se exige da autoridade policial um preparo maior.’’ - Alcino Souza Júnior Delegado da Polícia Civil

ções criminosas, da qual participou o procurador-geral de Alagoas, teve ainda a participação do coordenador adjunto do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), Bernardo Albano, que apresentou um histórico das facções que atuam no Acre, a organização e o modus operandi de cada uma. O promotor de Justiça chamou a atenção para um conjunto

de medidas englobando políticas de inclusão social, alterações legislativas, prática integrada de combate à violência, controle de fronteiras e o isolamento das lideranças do crime que estão presas. A última mesa temática, referente a homicídios, foi mediada pelo advogado Júnior Feitoza e reuniu a pesquisadora Jaqueline Souza de Araújo, que estuda a geografia do crime no Acre, o pro-

motor Ildon Maximiano e o presidente da Federação Interestadual dos Trabalhadores Policiais Civil da Região Norte (Fepolnorte), Itamir Lima. Apresentando sua pesquisa de mestrado, Jaqueline Souza apontou a relação entre desigualdades sociais e a violência, sugerindo a elaboração de políticas afirmativas e estruturantes. Já o representante dos policiais civis, desta-


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cou a desproporcionalidade entre efetivo e a escalada da violência, bem como, as baixas taxas de resolutividade do crime. O promotor de Justiça Ildon Maximiano, que é atualmente membro do Gaeco e atuou no Tribunal de Júri, defendeu maior investimento nas polícias e o emprego de meios avançados de investigação, além de penas mais duras em relação aos crimes cometidos contra a vida, modificando a atual legislação para inibir o comportamento criminal. De acordo com o secretário-geral do MPAC, promotor de Justiça Rodrigo Curti, enquan-

to forma de contribuição do MP acreano no enfrentamento à criminalidade e à violência, as reflexões das mesas temáticas e as sugestões dos cidadãos, que foram enviadas via plataforma digital, serão reunidas em uma publicação, a qual será entregue ao novo chefe do Poder Executivo estadual. Informar para prevenir Durante a programação, a procuradora-geral de Justiça, Kátia Rejane, lançou o projeto ‘Informar para prevenir’, que tem objetivo de munir a população de informações sobre os mecanismos

de proteção e rastreamento de dispositivos móveis através do Imei, um código único de identificação de todo aparelho celular. Coordenado pela 8ª Promotoria Criminal, através da titular Aretuza de Almeida Cruz, o projeto vai realizar uma ampla campanha informativa em todo o estado, para que as pessoas tenham as informações necessárias para rastrear, bloquear e até mesmo recuperar o telefone roubado. Só em Rio Branco, ano passado, foram registradas cinco mil ocorrências de roubo de aparelhos de celular, perfazendo uma média de 20 por dia.


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Combate ao crime

Operação Blackout MPAC integra megaoperação contra organizações criminosas em 15 estados

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o dia 04 de dezembro de 2018, o Ministério Público do Estado do Acre (MPAC), por intermédio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), deflagrou a Operação ‘Blackout’ com o objetivo de desarticular uma célula do Primeiro Comando da Capital (PCC), responsável pela cooptação e cadas-

tro de novos integrantes da facção. A ação fez parte de uma megaoperação coordenada pelo Grupo Nacional de Combate às Organizações Criminosas (GNCOC), envolvendo Gaecos de dez MPs contra integrantes de organizações criminosas em 15 estados da federação. Foi a primeira ação nacional integrada deste ano que teve como objetivo o cumprimento de

266 mandados de prisão e 203 de busca e apreensão. Os alvos foram integrantes de seis facções com atuação no Acre, Alagoas, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Pernambuco, Paraíba, Paraná, Rio de Janeiro, Roraima, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo e Tocantins. “O Ministério Público brasi-


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“O Ministério Público brasileiro, por meio do GNCOC e dos Gaecos, vem adotando medidas eficientes no desmantelamento e prisão dos principais líderes das facções criminosas presentes em território nacional.” - Alfredo Gaspar de Mendonça Neto Procurador-Geral de Justiça do Estado do Alagoas e coordenador do Grupo Nacional de Combate às Organizações Criminosas (GNCOC)

leiro, por meio do GNCOC e dos Gaecos, vem adotando medidas eficientes no desmantelamento e prisão dos principais líderes das facções criminosas presentes em território nacional. É uma luta baseada na inteligência e com foco na desestruturação desses organismos criminosos violentos”, declarou Alfredo Gaspar de Mendonça Neto, procurador-geral de Justiça de Alagoas e coordenador do GNCOC. O GNCOC congrega o Ministério Público brasileiro e foi criado em fevereiro de 2002, por iniciativa do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG), para combater o crime organizado.

Operação Blackout Segundo o Gaeco, a investigação, que durou cerca de três meses, conseguiu identificar ações de interiorização da facção criminosa PCC com a migração de lideranças para a região de Tarauacá – Envira, buscando a consolidação de rotas para o tráfico de drogas. A partir de Tarauacá, a célula identificada era responsável por realizar os cadastros de novos e antigos membros da facção, bem como, por distribuir, entre os quadros, as informações relativas a mudança de codinomes e de responsabilidades. Ao todo, foram cumpridos nove mandados de prisão em Tarauacá, quatro em Sena Madureira e um em Boa Vista (RR), além de dois

mandados de busca e apreensão. A operação também ocorreu em Rio Branco. “Essa ação nacional mostrou mais uma vez que o combate ao crime organizado é uma preocupação do Ministério Público brasileiro, que vem desenvolvendo um trabalho de repressão por meio dos Gaecos nos estados”, afirmou o promotor Bernardo Albano, coordenador-adjunto do Gaeco do MPAC. No Acre, a operação contou com o apoio do Gaeco do Ministério Público do Estado de Roraima e da Polícia Civil. Entre janeiro e novembro de 2018, o Ministério Público acreano ofereceu 288 denúncias contra integrantes de facções criminosas.


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Direitos Humanos

Tod@s Junt@s

Ministério Público busca romper com perverso ciclo de violência de gênero

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hefiado por uma mulher, o Ministério Público do Estado do Acre tem priorizado a atenção à mulher para garantir a proteção e efetivação de seus direitos. As mulheres, hoje, são maioria do eleitorado no Acre e formam parcela significativa da população que enfrenta violências doméstica, sexual e psicológica,

persistentes em uma sociedade que ainda não consegue extirpar totalmente históricas desigualdades de gênero. As delegacias e as varas judiciais estão abarrotadas de notícias e denúncias dando conta de estupros, assédios e mortes de mulheres todos os dias. Diante desse cenário, o Ministério Público forma

uma frente de trabalho que engloba a área criminal e a área cível, que combina intervenção judicial com intervenção extrajudicial. Apesar de leis como Lei Maria da Penha e Lei do Feminicídio, bem como, uma série de dispositivos que asseguram direitos e proteção, as práticas cotidianas estão permeadas de uma mentalidade,


consciente ou inconsciente, que ainda acredita em uma suposta superioridade de gênero, o que justifica todo tipo de violência, demandando para isso um combate que se dá por processos educativos, de conscientização e efetivação de direitos. “São inegáveis as conquistas no campo dos direitos humanos e o aumento da representatividade das mulheres no espaço público, mas o grande número de violência e estupros indica que precisamos fazer muito mais, e o MP acreano vem trabalhando para enfrentar essa realidade”, afirmou a procuradora-geral de Justiça, Kátia Rejane. A triste realidade O Acre figura entre os estados com os maiores índices de violência contra a mulher, estando acima da taxa, e é até o ano de 2015 era o primeiro em crimes de estupro. Conforme o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, em 2017, a taxa de crimes de homicídios de pessoas do sexo feminino no Acre foi a segunda maior do Brasil, correspondendo a 8,3 por 100 mil mulheres, ficando relativamente abaixo do Rio Grande do Norte, cuja taxa foi de 8,4 homicídios para cada 100 mil mulheres. Das 37 vítimas de homicídios, 13 mulheres foram vítimas de feminicídios, representando 38% do total, percentual bem acima do nacional, que foi de 24,8% em relação ao total de homicídios de mulheres, assassinadas por outras motivações. Com relação à lesão corporal

“O grande número de violência e estupros indica que precisamos fazer muito mais, e o MP acreano vem trabalhando para enfrentar essa realidade.” - Kátia Rejane de Araújo Rodrigues

Procuradora-geral de Justiça do Estado do Acre

dolosa, ou seja, violência doméstica, o Acre registrou, em 2017, uma taxa de 159,9 ocorrências para cada 100 mil mulheres, ficando abaixo da nacional, que foi de 183,9, porém ficando entre aqueles com o maior número de registros proporcionais, quando comparado com os demais estados brasileiros. Quanto aos crimes de estupro, até 2015, o estado apresentava a maior incidência, com taxa de 65,2 para cada 100 mil pessoas, enquanto que a nacional era de 22,2. Em 2016, caiu para 33,9 e, em 2017, houve redução de 25% em relação à quantidade de ocorrências registradas no ano anterior, ficando em 25,3 registros de estupro por 100 mil habitantes.

Ocorre que as estatísticas referentes aos casos de estupros são aquelas efetivamente incluídas no sistema de segurança pública. Levantamentos feitos com base nos crimes sexuais mostram que os índices de notificação de mulheres violentadas não ultrapassam 10%, ou seja, 90% dos casos deixam de ser notificados às autoridades competentes. Para ser ter uma ideia, a Polícia Civil registrou, no ano de 2015, 524 crimes contra a dignidade sexual de populações vulneráveis, enquanto que as estatísticas do Sistema Nacional de Atendimento Médico (Sinam) registravam 697 casos, perfazendo uma diferença de 173 casos. Quando a equipe técnica do MPAC avaliou os casos das vítimas nominalmente, foi constatado que se tratava de indivíduos totalmente diferentes. Por outro lado, o Brasil é o país que possui a maior taxa de homicídios praticados contra a população LGBT, e esses crimes são praticados de forma cruel contra mulheres travestis e transexuais. Dados do Grupo Gay da Bahia (GGB) indicam que o ano de 2017 foi o ano recorde de mortes motivadas por homofobia no país, com 445 homicídios, um aumento de 30% em relação a 2016. O número representa uma vítima a cada 19 horas. No Acre, entre 2007 e 2017, foram registradas 18 ocorrências de homicídios contra homossexuais e transexuais. Desse total, seis ocorrências foram comunicadas no ano de 2016.


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Porta de acesso aos direitos Em 2017, o Ministério Público acreano recebeu mais de quatro mil inquéritos policiais de violência contra mulher. Por dia, a 13ª Promotoria de Justiça Especializada no Combate à Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher, participa, em média, de 20 audiências na Vara Especializada de Combate à Violência Doméstica, em Rio Branco. Criado em 2015, o Centro de Atendimento à Vítima (CAV) é a porta de acesso do MPAC à mulher vítima de violência de gênero,

garantindo a ela uma identidade, voz e protagonismo no processo penal e fora dele, atuando na reparação do dano, seja material, social, moral e psicológico, articulando a rede de proteção e, ao mesmo tempo, fiscalizando os serviços e subsidiando iniciativas de membros do MPAC. Nesse ano, dos 62 casos que chegaram ao CAV, 80% deles são relacionados a violações de direito contra mulheres, inclusive transexuais, tais como violência sexual, familiar e doméstica. Cada caso gera uma gama de atendimentos, a exemplo de contatos telefônicos,

visitas domiciliares, visitas institucionais, encaminhamentos, estudos de caso e pesquisa de processo judicial. Em geral, há uma média de 44 atendimentos por caso. Em pouco tempo de funcionamento, o CAV já deu importantes passos que resultaram em propostas de escala nacional e estadual, tornando-se referência no combate à violência de gênero, no âmbito do Ministério Público, tanto que foi premiado com o Selo de Práticas Inovadoras do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). O CAV, sendo um órgão especializado na violência de gê-


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nero, compreende que esse tipo de violência não é só praticado contra pessoas do sexo feminino, mas também contra aquelas que se declaram mulheres. A partir da atuação do órgão, a Secretaria de Polícia Civil incluiu mulheres transexuais e travestis vítimas de violência doméstica e familiar no público atendido pela Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam). Além disso, houve sugestões de alterações legislativas para que mulheres transexuais e transgêneros possam ser protegidas pela Lei Maria da Penha, e o estabelecimento de notificação compulsória, na rede pública ou privada de saúde, de casos de violência que envolvam pessoas com identidade de gênero feminino como vítimas. O CAV realizou inspeções e estudos sobre crimes sexuais e vio-

lência doméstica em unidades de saúde de Rio Branco, de Brasiléia e de Xapuri, a partir das Fichas de Notificação Compulsória de Doenças e Agravos do Sistema Único de Saúde (SUS), visando subsidiar intervenções judiciais e extrajudiciais e reduzir os crimes sexuais. Com esse trabalho, foi possível estabelecer o fluxo de atendimento de violência sexual e, em parceria com a Secretaria de Estado de Saúde, promover a regulação dos prontuários. “Estudos mostram que as mulheres que sofrem violência doméstica e familiar são revitimadas na própria rede de proteção do Estado e a maioria das que denunciam é reincidente nesse tipo de violência”, destaca a coordenadora do CAV, procuradora de Justiça Patrícia Rêgo, que foi reconhecida pela revista Marie Claire como mulher inspiradora no enfrenta-

mento contra a violência de gênero, através do Prêmio Viva. Com isso, o MPAC deu início ao Mutirão de Inquéritos Policiais na Deam. A ação na delegacia possibilitou dar maior celeridade na tramitação dos inquéritos e reunir dados que demonstrassem o panorama geral da violência doméstica, além de verificar a estrutura física e condições materiais de funcionamento da delegacia. Através de recomendação, o MPAC pediu também o desmembramento físico entre a Deam e a Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (Depca) para que passassem a atuar em edifícios próprios. A intenção é que os funcionários da primeira recebessem exclusivamente casos de violência contra a mulher, otimizando o atendimento.




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