ACP Guaratiba Saúde

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Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro Promotorias de Justiça de Tutela Coletiva da Capital Av. Nilo Peçanha, nº 26, 4º e 10º andares, Centro, Rio de Janeiro, RJ CEP: 20020-100 Tels.: 2224-2349 / 2215-5762

EXMO. SR. JUIZ DE DIREITO DA ___ VARA DE FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DA CAPITAL.

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, pelos Promotores de Justiça de Tutela Coletiva infrafirmados, vem, perante esse r. Juízo, com fundamento nos artigos 129, inciso III, da Constituição da República, 34, inciso VI, da Lei Complementar Estadual nº 106/03, e 17 da Lei nº 8.429/92, ajuizar a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA (para declarar a nulidade de pregão presencial e obrigar a execução da assistência médica pelos organizadores de evento de natureza privada) com pedido de tutela antecipada, em face de: MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO, pessoa jurídica de direito público interno, a ser citado na pessoa de seu atual Prefeito, o Exmo. Sr. Eduardo Paes, com sede na Rua Afonso Cavalcanti, n.º 455, Cidade Nova, Rio de Janeiro; II) INSTITUTO JORNADA MUNDIAL DA JUVENTUDE RIO DE JANEIRO, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n. 14192317/0001-81, com sede na Rua Benjamin Constant n. 23, Bairro Glória, CEP 20241-150, Rio de Janeiro – RJ, doravante Instituto JMJ - RIO;

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III) DREAM FACTORY COMUNICACAO E EVENTOS LTDA., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n. 04458217/0001-09, com sede à Avenida das Américas, 4200, bloco 9B, 212, Barra da Tijuca, Rio de Janeiro – RJ; IV) BEM GUANABARA EMERGÊNCIAS MEDICAS, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n. 06219741/0001-44, estabelecida à Rua do Equador n. 456, Santo Cristo, Rio de Janeiro - RJ, CEP 20220-410; V) SAVIOR MEDICAL SERVICE LTDA., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n. 30299895/0001-78, estabelecida `a Rua Barão de Itaipu, 310, Andaraí, Rio de Janeiro - RJ; VI) SISTEMA DE EMERGÊNCIA MÉDICA MÓVEL DO RIO DE JANEIRO LTDA. – VIDA EMERGÊNCIAS MÉDICAS, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n. 01413201/0001-83, estabelecida à Rua São Luiz Gonzaga n. 630, São Cristóvão, Rio de Janeiro – RJ; VII) SRCOM PROMOÇÕES CULTURAIS LTDA., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n. 31887847/0001-63, estabelecida à Rua Goianinha, n. 321, Curicica, Jacarepaguá, Rio de Janeiro – RJ; VIII) SRCOM PRODUÇÕES E MARKETING LTDA., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n. 31246002/0001-99, estabelecida à Rua Goianinha, n. 321, Curicica, Jacarepaguá, Rio de Janeiro – RJ; Pelos fatos e fundamentos jurídicos a seguir aduzidos: Insurge-se o Ministério Público, na presente ação civil pública, contra ato administrativo do Município do Rio de Janeiro flagrantemente ilegal, eivado de diversos vícios, a seguir discriminados, baseado em decisão repentina, não planejada, aparentemente sem justificativa plausível e, sobretudo, com custo indevido para o erário público que assume, como sendo dever seu, a prestação de serviço de atendimento médico da Jornada Mundial da Juventude, que deveria ser executado e custeado pelo ente privado responsável pelo evento.

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Para melhor compreensão dos fatos, será elaborado a seguir um breve histórico dos acontecimentos. 

BREVE

SÍNTESE

DA

DEMANDA

CONSIDERAÇÕES

INICIAIS: A 2ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Saúde da Capital, em maio de 2013, iniciou investigação, através do Inquérito Civil n. 201300479152, para acompanhar o planejamento e execução do projeto de atendimento à saúde da população que participará do evento Jornada Mundial da Juventude 2013. A Jornada Mundial da Juventude, evento de natureza religiosa, de responsabilidade da Igreja Católica, e, portanto, eminentemente privado, consiste na reunião, a cada dois ou três anos, de pessoas católicas originárias do mundo inteiro, sobretudo jovens, numa cidade escolhida para celebrar a grande jornada. A cidade do Rio de Janeiro foi anunciada como a sede para a Jornada Mundial de 2013 no último dia da Jornada Mundial da Juventude em Madrid, ocorrida em agosto de 2011. 1 Portanto, há cerca de aproximados dois anos, já se tem conhecimento oficial de que a Cidade do Rio de Janeiro seria a próxima sede do referido evento, o que importaria em receber enorme contigente de pessoas e demandaria do ente responsável – Igreja Católica – a tomada de medidas de planejamento para a execução de todos os serviços necessários ao adequado recebimento do aludido contigente populacional. Dentro de tal planejamento, por óbvio, inclui-se a assistência em saúde dos participantes do evento, item

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Informação obtida junto ao site: http://pt.wikipedia.org/wiki/Jornada_Mundial_da_Juventude.

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essencial e obrigatório em evento de tal natureza, caracterizado como evento especial ou de massa pela legislação vigente, Assim, o referido inquérito civil foi instaurado com a finalidade de acompanhar o planejamento do atendimento médico necessário para o Evento da Jornada Mundial da Juventude a ser realizado entre os dias 23 a 28 de julho do corrente na cidade do Rio de Janeiro, identificando as responsabilidades de cada um dos entes envolvidos e cobrando a adoção de providências de maneira a assegurar a regular e necessária assistência à saúde de todos os participantes da Jornada Mundial da Juventude. 1.1 DA CONTRATAÇÃO DA EMPRESA DREAM FACTORY PARA O PLANEJAMENTO DO EVENTO: De acordo com a documentação constante dos autos, o segundo réu Instituto JMJ - Rio, pessoa jurídica de direito privado, consistente em associação civil sem fins lucrativos e econômicos, foi fundado em maio de 2011 e teria como uma de suas finalidades efetuar o planejamento, organização, produção, estruturação e execução de ações relacionadas à Jornada Mundial da Juventude nesta cidade. Ocorre que o Instituto JMJ - Rio, apesar de já constituído, frise-se, desde maio de 2011, somente em janeiro de 2012 celebrou contrato de prestação de serviços com a empresa Dream Factory, reconhecendo, na oportunidade, que “para a realização exitosa do evento”, o Instituto necessitaria de “auxílio de empresa especializada no planejamento, comercialização e produção de eventos internacionais de grande porte”, e que a contratada teria a habilitação necessária para a realização dos referidos atos na Jornada Mundial da Juventude 2013. 4


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Importa registrar que a mídia em reportagens reiteradas vem divulgando uma expectativa de público de mais de dois milhões e meio de pessoas na cidade do Rio de Janeiro, durante a realização do evento. O próprio Prefeito Eduardo Paes2, em entrevista coletiva concedida em maio de 2013, ao informar o envio à Câmara de Vereadores de proposta para decretação de feriado na cidade do RJ, durante os dias da Jornada Mundial da Juventude, reconheceu que tal evento seria um dos maiores e mais preocupantes eventos da cidade, pela forma de sua realização, disseminada em diversos pontos da cidade, com deslocamento intenso de elevado contingente populacional. Naquela oportunidade, aliás, o Prefeito Municipal externou como única preocupação a questão da mobilidade urbana, devido ao grande número de veículos que chegarão à cidade e ao enorme quantitativo de pessoas circulando pela cidade em locais diferentes. NADA foi mencionado àquela altura sobre a necessidade da adoção de medidas para assegurar a assistência em saúde a ser prestada nos dias do evento. Desde o início da investigação instaurada pelo Ministério Público, até a presente data, foram realizadas quatro reuniões presididas pela 2ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva da Saúde da Capital (07/05/2013, 22/05/2013, 12/06/2013 e 04/07/2013), em que o Ministério Público buscou reunir os entes privados responsáveis pelo evento e os órgãos públicos responsáveis pelo apoio, controle e fiscalização na área da saúde, contando as reuniões com a 2

Entrevista coletiva concedida pelo Prefeito Eduardo Paes, em maio de 2013, e veiculada no site do GI.GLOBO.COM. Acessível em://g1.globo.com/jornada-mundial-da-juventude/2013/noticia/2013/05/prefeitura-do-rioanuncia-feriado-na-jornada-mundial-da-juventude.html

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presença dos seguintes órgãos/entes: Instituto da Jornada Mundial da Juventude 2013, COL (Comitê Organizador Local), Secretaria Municipal de Saúde (Superintendência de Urgência e Emergência da SMSDC, Subsecretaria Municipal de Atenção Hospitalar, Urgência e Emergência, Vigilância Sanitária Municipal), 1º GSE do Corpo de Bombeiros, empresas Dream Factory, SRCOM, GRUPO BEM, GRUPO VIDA, SAVIOR, RESGATE PLUS e os médicos integrantes do Grupo de Apoio Técnico, GATE – Saúde do MPRJ. Na primeira reunião realizada pelo MP, o segundo réu (Instituto JMJ Rio) esclareceu que teria celebrado contrato com a empresa Dream Factory, com expertise na realização de grandes eventos, para o planejamento de todo o evento na cidade, inclusive o referente à assistência em saúde aos participantes da JMJ 2013.

Nesta oportunidade, a própria Dream Factory apresentou

documento contendo “Proposta do Plano Médico para o evento da Jornada Mundial da Juventude 2013”, prestando ao Ministério Público, como responsável contratado pelo Instituto JMJ Rio, todas as informações que foram exigidas. Para que este Juízo possa ter uma visão mais clara e consolidada do acompanhamento das ações pelo Ministério Público no inquérito civil em referência, esta PJ elaborou planilha do conteúdo das reuniões realizadas, registradas em atas, que passará a fazer parte integrante desta inicial, porém, consubstanciada no Anexo. Até a reunião realizada no dia 12/06/2013, o segundo réu e a empresa Dream Factory compareceram como responsáveis pelo planejamento na área de saúde do evento. Porém, em 24/06/2013, o Ministério Público tomou conhecimento, informalmente, de que a aludida empresa não mais estaria 6


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responsável pelas ações em saúde da Jornada, razão pela qual determinou a notificação do Instituto JMJ para apresentação de esclarecimentos e designou reunião, com todos os entes envolvidos, que se realizou no último dia 04/07/2013. Em 03/07/2013, o Ministério Público recebeu ofício resposta do segundo réu, informando que a Secretaria Municipal de Saúde teria assumido a execução do “planejamento em saúde cujo plano foi apresentado pelo Instituto JMJ – Rio nas reuniões anteriores”, quanto aos atos públicos em Copacabana, Guaratiba e Glória. A seu turno, o MP também foi procurado pelo Secretário Municipal de Saúde acompanhado pelo Procurador-Geral do Município, no final do mesmo dia, para comunicar a decisão do Município de assumir a responsabilidade pela assistência médica nos eventos citados, já tendo inclusive publicado aviso de licitação em 01/07/13 no Diário Oficial. 1.2 – DO COMPROVADO DESVIO DE FINALIDADE: No dia 04/07/2013, em reunião com a presença, entre outros, do Secretário Municipal de Saúde, do Instituto JMJ, das empresas Dream Factory e demais prestadoras de serviços de saúde, foi entregue cópia do procedimento administrativo 09/003.498/2013, que culminou com a publicação do aviso de edital para o pregão presencial n. 0396/2013. Nesta mesma reunião, o Ministério Público recebeu a estarrecedora notícia, através da fala da médica representante da empresa BEM (quarta ré), Sra. Mara Costa, de que houvera uma reunião de urgência, no dia 21/07/2013, na Procuradoria-Geral do Município, cuja ciência para comparecimento foi dada na mesma data, da qual participaram, entre outros, o Secretário Municipal de 7


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Saúde, Sr. Hans Dohmann, a representante do Instituto JMJ - Rio Claudine, bem como os representantes das empresas ora rés, onde ficaram cientes de que o processo de contratação das mesmas sofreria mudanças SOMENTE quanto à forma de contratação e pagamento, pois, doravante, o Município do RJ assumiria a responsabilidade pela execução dos serviços de saúde, porém nada mudaria quanto aos escopos contratados, sendo as empresas orientadas a se inscrever no pregão, apresentando as mesmas propostas já objeto de contratação pelo Instituto JMJ. Para que não pairem dúvidas sobre o afirmado, oportuna aqui a transcrição do trecho ora citado do áudio gravado na data da reunião, senão vejamos: Quando indagada se as empresas foram formalmente cientificadas da mudança ora referida, a Sra. Mara Costa afirma:

“a gente foi convocado para uma reunião no Ministério Público Municipal (sic) com a presença do Secretário Municipal de Saúde e da Claudine, onde eles informaram para a gente que os contratos iriam ser cancelados e que ia ser feita uma licitação com a mesma estrutura que já tava sendo programada e pediu que a gente fizesse a proposta do jeito que a gente já tinha feito na proposta vencedora cada uma com seu setor, né, no dia do pregão presencial, para que tudo continuasse correndo e apenas mudasse essa forma de, ao invés de a gente receber pelo contrato da forma que tava, passasse a receber da Prefeitura. Isso foi comunicado a gente nessa reunião e (...) não há opção, né, a gente já esta envolvido nisso. A minha empresa e com certeza os outros também já tem as coisas em andamento, (...), com equipamentos, pessoas...” Para bom entendedor, meia palavra basta.

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Depois de tal declaração nefasta, o Ministério Público restou convencido de que a repentina decisão do Município réu, tomada a menos de um mês do evento, teve como finalidade clara o favorecimento de interesses particulares tanto do Instituto JMJ (segundo réu) como das empresas já contratadas pelo mesmo. E nem se diga que a real motivação do ato decisório tenha sido o interesse Público consubstanciado na prestação de serviços adequados de saúde à população, pois tal argumento revela-se falacioso. A uma porque, caso o Município tivesse a intenção verdadeira de buscar o melhor atendimento em saúde para a população no referido evento, o que já seria questionável, pela natureza do evento – privado e religioso -, já teria de ter fundamentado a assunção da contratação e gerência dos serviços de saúde há muito tempo, pois o evento já está previsto nesta Cidade há quase dois anos e, além disso, o planejamento das ações para a Jornada vem se desenvolvendo já há algum tempo, com a realização de diversas reuniões que contaram, inclusive, com a presença da Secretaria Municipal de Saúde. A duas porque nada há que indique a incapacidade ou a impossibilidade das empresas em executarem o serviço na forma já prevista e contratada pelos organizadores do evento. Pelo contrário, as reuniões que vinham sendo realizadas no Ministério Público demonstram que eventuais inadequações foram a tempo corrigidas, sendo até mesmo temerário, a esta altura, romper o curso dos acontecimentos. Aliás, oportuno registrar que a Secretaria Municipal de Saúde sempre atuou como ente público articulador, prestando orientações para que o segundo réu e 9


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as empresas por ele contratadas pudessem elaborar e executar o projeto de atendimento médico nos ditames da legislação vigente; assim como prestar o apoio ao evento, no serviço de urgência e emergência, exceto móvel, servindo como retaguarda assistencial para o atendimento promovido pelos entes privados na data do evento. Tal assertiva consta, inclusive, do Plano de Contingência Assistencial e de Emergência Jornada Mundial da Juventude 2013, elaborado pela SMSDC, que instrui a presente. Nele consta expresso que: “Ao Comitê Organizador Local (COL) da Jornada Mundial da Juventude e seu Coordenador Médico cabem a responsabilidade e viabilização prática do atendimento pré-hospitalar (APH) fixo e móvel nos locais de eventos, assim como as adequações e/ou mudanças que forem pertinentes à dimensão e perfil do evento, após avaliação pelo Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio de Janeiro/1º GSE.” E mais adiante: “A Secretaria Municipal de Saúde estará com toda a sua rede de saúde servindo como retaguarda assistencial para o atendimento pré-hospitalar fixo e móvel a serem instalados e contemplados nos locais de evento pela empresa promotora da Jornada, conforme discutido e pactuado em todas as reuniões com outros órgãos públicos e o organizador do evento.” Em nenhum momento, no curso destes dois anos, o Município do RJ manifestou a intenção ou, sequer, fundamentou a assunção da contratação e gerência dos serviços de saúde em substituição aos organizadores do evento religioso. Por outro lado, conforme declarações prestadas pelos Srs. Agnelo Quintela Junior e Daniel Eugenio Clerici, estes da empresa VIDA, e pela Sra. Mara Costa, da empresa BEM, todos são uníssonos em afirmar que a realização de 10


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planejamento sério e adequado de empresas de saúde para prestar o serviço na dimensão do exigido pela Jornada Mundial da Juventude, demandam preparo com tempo mínimo razoável, não sendo possível que outras empresas, de forma consciente e séria, possam se estruturar para participar da licitação e prestar o serviço exigido. Em outras palavras, significa dizer que, em prazo tão reduzido, somente as empresas que já estão envolvidas no processo é que teriam condições concretas de executar o serviço pretendido. Corolário do próprio princípio constitucional da licitação pública é o caráter competitivo dos certames levados a efeito pelo Poder Público, de modo a garantir a isonomia entre os participantes e a supremacia do interesse público, tal como expressamente previsto no art. 3º, caput, da Lei 8.666/ 93: Art. 3º. A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhe são correlatos. Realmente, se não há competição verdadeira entre os participantes do certame, impossível mesmo falar-se em processo licitatório, eis que não haverá como selecionar, entre as propostas apresentadas, aquela que seria mais vantajosa para a Administração Pública. No caso dos autos, em que os participantes do processo licitatório já previamente informados de como deveriam participar da licitação, ou seja, apresentando a mesma proposta, contemplando o lote para o qual já 11


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tinham sido contratados, pretende o Município réu dar contornos de legalidade à pseudo licitação, que tem por objetivo legitimar a escolha das mesmas empresas já contratadas pelo Instituto réu. Nesse sentido, realizar processo licitatório ou simplesmente contratar diretamente aquele que melhor aprouver ao administrador público não faz a menor diferença, pois a licitação não estará cumprindo seu papel constitucional, senão maquiando a ilicitude praticada pelos envolvidos. A toda evidência o fim buscado pelos Réus em nada se confunde com a seleção da proposta mais benéfica para a Administração, tal como exigido expressamente nos arts. 37, inciso XXI, da Constituição da República, e 3º, da Lei 8.666/ 93. Muito pelo contrário, a forma como o pregão presencial foi deflagrado com a orientação das empresas rés sobre como devem apresentar suas propostas e a ausência de interesse em que as empresas compitam entre si, viola frontalmente o princípio da licitação. Ocorre que os atos lesivos ao patrimônio público e praticados com desvio de finalidade são considerados nulos de pleno direito pelo art. 2º, da Lei 4.717/ 65, que assim dispõe: Art. 2º. São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de: e) desvio de finalidade. Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade observarse-ão as seguintes normas: e) o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência. 12


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Destarte, demonstrado o desvio de finalidade na espécie, nulos de pleno direito os atos até então praticados pela Administração Pública Municipal no processo n. 09/003498/13. Tais atos, assim praticados, também violam, a um só tempo, os princípios constitucionais da impessoalidade e da moralidade administrativa, constantes do art. 37, caput da CF/88, pois, no primeiro caso, ensejam tratamento diferenciado a administrados na mesma situação jurídica e, no segundo, porque relegam os preceitos éticos norteadores da Administração Pública. 1.3 DA INDEVIDA ASSUNÇÃO PELO MUNICÍPIO DA EXECUÇÃO DOS SERVIÇOS DE SAÚDE EM EVENTOS DA JORNADA MUNDIAL DA JUVENTUDE 2013, ATRAVÉS DA REALIZAÇÃO DE PREGÃO PRESENCIAL PARA CONTRATAÇÃO DE EMPRESAS: Conclui-se que, apesar de já se ter conhecimento, há cerca de quase dois anos de um evento de grande porte na Cidade do Rio de Janeiro, de forma repentina, açodada e, ao ver deste órgão ministerial, ilegal, o Município do Rio de Janeiro, através da Secretaria Municipal de Saúde, resolve, no final do mês de maio, a menos de um mês do início da Jornada, assumir para si a execução do serviço de atendimento médico pré-hospitalar fixo e móvel nos eventos a serem realizados em Copacabana, Guaratiba e Glória, que deveriam estar a cargo dos organizadores do evento, conforme legislação abaixo relacionada. Sobre o assunto, encontram-se vigentes os seguintes atos normativos locais: Resolução SESDEC n. 80/2007 e a Resolução CREMERJ n. 187/2003, que, reproduzindo conceitos, normas e diretrizes da Política Nacional de Urgência e 13


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Emergência prevista na Portaria MS n. 2048/2002 e da Resolução CREMERJ n. 100/96, definem e trazem a regulamentação dos requisitos mínimos necessários para a autorização de projeto de atendimento médico pelo Corpo de Bombeiros e liberação de Certidão de Anotação de Responsabilidade Técnica (CART) pelo CREMERJ, documentos estes imprescindíveis para a realização de eventos especiais com estimativa de público superior a hum mil pessoas. De acordo com a Resolução CREMERJ n. 187/2003 e Resolução SESDEC n. 80/2007, portanto, evento especial é: a aglomeração préprogramada de público superior a 1.000 (mil) pessoas reunido para atividades de qualquer natureza, tais como artísticas, religiosas, esportivas, festividades de fim de ano, carnaval, espetáculos musicais, convenções, exposições, etc., com risco potencial de ocorrência de agravos à saúde pelo quantitativo de pessoas e/ou pelas características do evento e do local. A Resolução SMSDC n. 1710, de 18/02/2011, que instituiu o Comitê Permanente de Emergências e Eventos de Massa no Âmbito da Secretaria Municipal de Saúde também traz conceito semelhante para o que denomina de evento de massa, ao defini-lo como “atividades coletivas que por motivo esportivo, religioso, lúdico ou laboral, entre outras motivações, movimentam e/ou atraiam um elevado contingente de pessoas vindas de todas as partes do pais e/ou do mundo”. Para tais eventos, destarte, a legislação exige autorizações a serem emitidas pelo Corpo de Bombeiros e CREMERJ, os quais analisam, respectivamente, a FARE com projeto de atendimento médico, e o pedido de emissão de CART (Certidão de Anotação de Responsabilidade Técnica), órgãos 14


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estes que verificam se os requisitos técnicos mínimos previstos pelas resoluções em comento estão sendo observados, quanto à disponibilização de recursos mínimos (postos médicos, ambulâncias, transporte aéreo, etc., contemplando os respectivos equipamentos, insumos, medicamentos, recursos humanos). Estabelece, ainda, a Resolução CREMERJ n. 187/2003, como prazo mínimo para o pedido de cadastramento, registro ou anotação de Responsabilidade Técnica, acompanhada do projeto de atendimento médico do evento especial, o período de 30 dias antes da data de realização do evento. Prevê também a referida resolução que, no caso de eventos com público superior a 40.000 pessoas ou avaliado como de alto risco, deverá ser realizada reunião entre o Corpo de Bombeiros e os responsáveis pelo evento para definir as estratégias necessárias para garantir a segurança do público e participantes (art. 14 da Resolução SESDEC n. 80/2007). Desta forma, pelas exigências normativas acima previstas, depreende-se, de forma cristalina, que a estrutura de assistência médica para a Jornada Mundial da Juventude 2013, em razão do porte e importância do evento, já teria de estar aprovada pelos órgãos competentes ou, minimamente, em processo avançado de análise, observando o prazo mínimo de 30 dias para apresentação prévia do pedido de emissão da CART e da autorização da FARE e projeto de atendimento médico. Ademais, pela legislação antes mencionada, a estrutura deve ser custeada pelos organizadores do evento.

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Ocorre que, surpreendentemente, a Secretaria Municipal de Saúde decidiu em 24/05/2013, ou seja, a menos de 30 dias do início da Jornada, alterar todo o processo que já estava sendo conduzido pelo órgão responsável pelo evento, ora segundo réu, e assumir a condução do serviço de saúde (atendimento pré-hospitalar fixo e móvel) na maior parte dos locais onde haverá grande concentração de público – Copacabana, Guaratiba, Percursos de peregrinação e Glória. Para tanto, após reconhecer o fato de não ter estrutura própria suficiente para tal, publicou, em 01 de julho de 2013, edital de pregão presencial para contratar empresas prestadoras do serviço de saúde exigido, sendo que a abertura da licitação ocorrerá no próximo dia 12/07/2013. Caso haja recurso do resultado do pregão, há que ser respeitado o prazo de três dias úteis para a apresentação de razões recursais e, ainda, há de se aguardar o prazo de adjudicação e homologação da licitação, fazendo com que, em um cenário mais ou menos realista, a definição das empresas vencedoras da licitação somente ocorra a partir do dia 17 de julho. Assim, por óbvio, por maior boa vontade que possam ter os órgãos públicos envolvidos na fiscalização (Corpo de Bombeiros, CREMERJ e Vigilâncias Sanitárias) não haverá tempo hábil para que as empresas vencedoras do certame obtenham regularmente a emissão da CART e liberação da FARE e projeto de atendimento médico junto, respectivamente, ao CREMERJ e Corpo de Bombeiros, já que o prazo mínimo de antecedência é de 30 dias. Por outro lado, em razão da complexidade do evento e do quantitativo de pessoas superior a 40 mil, determina o art. 14 da Resolução SESDEC n. 80/2007, que as empresas prestadoras de saúde deverão se reunir com o Corpo de Bombeiros para obter as diretrizes e orientações para execução do projeto 16


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de atendimento médico, o que, certamente, restará inviabilizado se houver o aguardo da licitação para a escolha das empresas prestadoras dos serviços de saúde. Destarte, nesta breve e simplificada análise dos fatos, é possível se concluir que a licitação, realizada pelo Município do RJ, em tempo recorde, diga-se de passagem, não atenderá, de forma alguma, aos ditames da legislação atualmente vigente sobre o thema . E mais, em vez de contribuir positivamente para o atendimento à saúde do público participante da Jornada Mundial da Juventude, acarreta, às vésperas do evento, clima de insegurança e desconfiança nos serviços que, antes organizados e programados para serem prestados de forma privada, passam a ser substituídos por empresas vencedoras de pregão organizado às pressas e com critérios técnicos questionáveis. E nem se argumente que sendo as empresas contratadas as vencedoras resolverá a questão, pois ao admitir-se isto como argumento válido, estar-se-á chancelando patente ilegalidade, dando um cheque em branco ao gestor para atuar ao arrepio da lei. 1.4 DA IMPOSSIBILIDADE DE SUBVENÇÃO A QUALQUER EVENTO RELIGIOSO: Salta aos olhos, em primeiro plano, a inviabilidade no emprego de qualquer espécie de verba pública na “Jornada Mundial da Juventude”, não só diante do seu evidente caráter privado, assim como do inequívoco timbre religioso que marca o evento.

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Embora

seja

de

se

reconhecer,

apoiado

em

dados

do

IBGE(http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2000/popul acao/religiao_Censo2000.pdf), que a maioria da população professe religiões de raiz cristã (católicos e protestantes, aí incluídos os evangélicos), o Brasil optou por ser um Estado laico, em que não há qualquer vinculação entre o Poder Público e uma determinada igreja ou religião, sendo a todos assegurada a liberdade de consciência e crença religiosa, nos termos do artigo 5o, inciso VI, da Constituição Federal a seguir transcrito: Artigo 5o. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito a vida, a liberdade, a igualdade, a segurança e a propriedade, nos termos seguintes: (…) VI - e inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;

A liberdade de religião, entendendo-se como tal o direito de manifestar as próprias crenças, seja de forma individual ou coletiva, pública ou privada, também encontra guarida no artigo XVIII da Declaração Universal dos Direitos Humanos e nos artigos 2º, 3º e 4º da Declaração Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Intolerância e Discriminação Fundadas na Religião ou nas Convicções, a seguir transcritos: Declaração Universal dos Direitos Humanos Artigo XVIII. Todo ser humano tem direito a liberdade de pensamento, consciência e religião; este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância, em publico ou em particular. 18


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Declaração sobre a eliminação de todas as formas de intolerância e discriminação fundadas na religião ou nas convicções Artigo 2º §1. Ninguém será objeto de discriminação por motivos de religião ou convicções por parte de nenhum Estado, instituição, grupo de pessoas ou particulares. §2. Aos efeitos da presente declaração, entende-se por "intolerância e discriminação baseadas na religião ou nas convicções" toda a distinção, exclusão, restrição ou preferência fundada na religião ou nas convicções e cujo fim ou efeito seja a abolição ou o fim do reconhecimento, o gozo e o exercício em igualdade dos direitos humanos e das liberdades fundamentais. Artigo 3º A discriminação entre os seres humanos por motivos de religião ou de convicções constitui uma ofensa a dignidade humana e uma negação dos princípios da Carta das Nações Unidas, e deve ser condenada como uma violação dos direitos humanos e das liberdades fundamentais proclamados na Declaração Universal de Direitos Humanos e enunciados detalhadamente nos Pactos internacionais de direitos humanos, e como um obstáculo para as relações amistosas e pacificas entre as nações. Artigo 4º §1. Todos os Estados adotarão medidas eficazes para prevenir e eliminar toda discriminação por motivos de religião ou convicções, no reconhecimento, do exercício e do gozo dos direitos humanos e das liberdades fundamentais em todas as esferas da vida civil, econômica, política, social e cultural. §2. Todos os Estados farão todos os esforços necessários para promulgar ou derrogar leis, segundo seja o caso, a fim de proibir toda discriminação deste tipo e por tomar as medidas adequadas para combater a intolerância por motivos ou convicções na matéria.

Por outro lado, também deve ser destacado o Pacto de São Jose da Costa Rica (Convenção Americana de Direitos Humanos), que estabelece: Artigo 12 – Liberdade de consciência e de religião 19


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1. Toda pessoa tem direito a liberdade de consciência e de religião. Esse direito implica a liberdade de conservar sua religião ou suas crenças, ou de mudar de religião ou de crenças, bem como a liberdade de professar e divulgar sua religião ou suas crenças, individual ou coletivamente, tanto em publico como em privado. 2. Ninguém pode ser submetido a medidas restritivas que possam limitar sua liberdade e conservar sua religião ou suas crenças, ou de mudar de religião ou de crenças. 3. A liberdade de manifestar a própria religião e as próprias crenças está sujeita apenas as limitações previstas em lei e que se façam necessárias para proteger a segurança, a ordem, a saúde ou a moral publica ou os direitos e as liberdades das demais pessoas.

Através dos diplomas citados, percebe-se que o direito a livre manifestação de pensamento, no qual se inclui a liberdade de credo, expressão do direito fundamental da pessoa humana, encontra respaldo tanto no ordenamento jurídico interno, como ainda nos principais diplomas normativos internacionais. Nesse aspecto, vale trazer à citação a doutrina de Alexandre de Moraes3, a respeito do desrespeito a fé e as ideias de índole espiritual: A conquista constitucional da liberdade religiosa é verdadeira consagração de maturidade de um povo, pois como salientado por Temístocles Cavalcanti, e ela verdadeiro desdobramento da liberdade de pensamento e manifestação”. A abrangência do preceito constitucional e ampla, pois sendo a religião o complexo de princípios que dirigem os pensamentos, ações e adoração do homem para com Deus, acaba por compreender a crença, o dogma, a moral, a liturgia e o culto. O constrangimento a pessoa humana, de forma a constrangê-

3

MORAES, Alexandre de. Direitos Humanos Fundamentais. Sao Paulo: Atlas, 2004, p. 75.

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lo a renunciar sua fé, representa o desrespeito à diversidade democrática de ideias, filosóficas e a própria diversidade espiritual.

Por outro lado, é de se lembrar que a liberdade de crença envolve, igualmente, um conteúdo negativo, ou seja, o dever de abstenção do Estado, ou seja, de interferir, através da proibição de culto ou, o que é mais relevante para o caso em análise, através de fomento e/ou subvencionamento de eventos religiosos pertinentes a uma crença em detrimento da outra, sob pena de ofensa ao principio do Estado laico, que assim é definido por Celso Ribeiro Bastos: A liberdade de organização religiosa tem uma dimensão muito importante no seu relacionamento com o Estado. Três modelos são possíveis: fusão, união e separação. O Brasil enquadra-se inequivocadamente neste último desde o advento da República, com a edição do Decreto 119-A, de 17 de janeiro de 1890, que instaurou a separação entre a Igreja e o Estado. O Estado brasileiro tornou-se desde então laico. (...) Isto significa que ele se mantém indiferente às diversas igrejas que podem livremente constituir-se (...). (BASTOS. Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 17ª ed. p. 178, São Paulo: Editora Saraiva, 1996)

Com efeito, não há a menor sombra de dúvida de que a Constituição Federal determina que o Estado se mantenha neutro em relação às diferentes concepções religiosas presentes na sociedade, sendo-lhe vedado tomar partido em questões de fé, estabelecer preferências, privilegiar uns ou ignorar outros, bem como buscar o favorecimento ou o embaraço de qualquer crença.

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A definição de um Estado laico, leigo, neutro se obtém através da própria análise semântica do termo, assim definido por De Plácido e Silva: "LAICO. Do latim laicus , é o mesmo que leigo, equivalendo ao sentido de secular, em oposição do de bispo, ou religioso." (SILVA. De Plácido. Vocabulário Jurídico. 12ª ed. v. III, p. 45. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1997.)

E a voz definitiva a respeito do tema é a de Daniel Antonio de Moraes Sarmento4, quando leciona que: (…) a laicidade impõe que o Estado se mantenha neutro em relação as diferentes concepções religiosas presentes na sociedade, sendo-lhe vedado tomar partido em questões de fe, bem como buscar o favorecimento ou o embaraço de qualquer crença. O principio do Estado laico pode ser diretamente relacionado a dois direitos fundamentais que gozam de máxima importância na escala de valores constitucionais: liberdade de religião e igualdade. Em relação ao primeiro, a laicidade caracteriza-se como uma verdadeira garantia institucional da liberdade religiosa individual. Isto porque, a promiscuidade entre os poderes públicos e qualquer credo religioso, por ela interditada, ao sinalizar o endosso estatal de doutrinas de fe, pode representar uma coerção, ainda que de caráter psicológico, sobre os que não professam aquela religião. (...)

4

SARMENTO, Daniel. O Crucifixo nos Tribunais e a Laicidade do Estado. Revista Eletrônica PRPE. Disponível em: http://www.prpe.mpf.gov.br/internet/content/download/1631/14570/file/RE_%20Daniel Sarmento2.pdf>.

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Por outro lado, a existência de uma relação direta entre o mandamento de laicidade do Estado e o principio da igualdade e também inequívoca. Em uma sociedade pluralista como a brasileira, em que convivem pessoas das mais variadas crenças e afiliações religiosas, bem como indivíduos que não professam nenhum credo, a laicidade converte-se em instrumento indispensável para possibilitar o tratamento de todos com o mesmo respeito e consideração. Neste contexto de pluralismo religioso, o endosso pelo Estado de qualquer posicionamento religioso implica, necessariamente, em injustificado tratamento desfavorecido em relação aqueles que não abraçam o credo privilegiado, que são levados a considerar-se como “cidadãos de segunda classe”. Tais pessoas, como membros da comunidade política, são forcadas a se submeterem ao poder heterônomo do Estado, e este, sempre que e exercido com base em valores e dogmas religiosos, representa uma inaceitável violência contra os que não professam.(...)”

Corolário de tudo o que ora se expõe é a vedação de subvencionamento de qualquer evento religioso, como dispõe, expressamente artigo 19, inciso I, da Constituição Federal: Artigo 19. E vedado a União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvenciona-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;

A fim de alcançar o cerne da normativa constitucional, assim se posicionou Pontes de Miranda: 23


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estabelecer cultos religiosos está em sentido amplo: criar religiões ou seitas, ou fazer igrejas ou quaisquer postos de prática religiosa, ou propaganda. Subvencionar está no sentido de concorrer, com dinheiro ou outros bens de entidade estatal, para que se exerça a atividade religiosa. Embaraçar o exercício significa vedar, ou dificultar, limitar ou restringir a prática, psíquica ou material dos atos religiosos". (MIRANDA apud SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 17ª ed. p. 253 e 254 São Paulo: Editora Malheiros, 2000)

 DA FLAGRANTE NULIDADE DO PROCESSO ADMINISTRATIVO PARA REALIZAÇÃO DE PREGÃO PRESENCIAL PELO MUNICÍPIO DO RJ: Contudo, apesar das ilegalidades narradas acima e sobejamente demonstradas nos autos, foram cometidas novas e mais graves ilegalidades em série pelo primeiro réu, as quais passarão a ser identificadas a seguir, a macular o procedimento administrativo referente à licitação em curso (Pregão Presencial n. 0396/2013) e a consequente seleção de empresas para executar os contratos de prestação de serviços para implantação de unidades de atendimento préhospitalar fixo e móvel nos eventos da JMJ, descritos no Projeto Básico apresentado. Questionar-se-á, a partir de agora, a higidez do processo administrativo n. 09/003.498/2013 que culminou com a publicação de aviso de licitação na modalidade Pregão Presencial do tipo menor preço por lote para a prestação de serviços de saúde que “contemplem todas as necessidades para a implantação de unidades 24


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de atendimento pré-hospitalar fixo (PHF) e móvel nos eventos da JMJ – Atos Centrais e Atos Especiais (Angelus), devidamente descritos e especificados no Projeto Básico (Anexo I)”, com um custo total para o Município do Rio de Janeiro no montante de R$ 7.840.636,54 (sete milhões, oitocentos e quarenta mil e seiscentos e trinta e seis reais e cinqüenta e quatro centavos).

Assim, em razão do que se viu linhas acima, tudo aponta para o fato de que a Administração Pública, sobretudo em razão do prazo acentuadamente raquítico para o início do evento, tem por objetivo chancelar as contratações anteriormente realizadas pelo Instituto (as quais inclusive se encontram na iminência do distrato), celebrando ela própria, Administração Pública, os contratos e, consequentemente arcando, indevidamente, com os custos do evento, em desfavor dos já combalidos cofres públicos. Acontece, porém, que a assinatura dos contratos com aquelas sociedades previamente eleitas pelo Instituto não poderia ocorrer de imediato, sem a submissão a prévio procedimento licitatório que, a rigor, teria como resultado coroar a proposta mais vantajosa à Administração Pública. Não há margem para contratação direta pelo Poder Público (com fulcro no art. 24, IV da Lei 8666/93) sob o argumento da emergência na obtenção da prestação do serviço. Aqui, por razões mais do que óbvias, se está diante da odiosa figura da “emergência fabricada”, por meio da qual a Administração, desidiosa, deixa de tomar as providências a tempo e modo, necessárias a realização do certame. 25


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Dessa maneira, o Município, na qualidade de pretenso contratante, teve de, forçosamente, valer-se das vias procedimentais ordinárias, prévias a toda e qualquer contratação: o procedimento licitatório. E assim disparou a realização de pregão. Digno de nota, porém, é que a análise pormenorizada do procedimento administrativo licitatório levado a cabo pela Administração Pública Municipal só faz corroborar os contundentes elementos indiciários, até aqui existentes, todos no sentido de que a execução do contrato será efetivamente empreendida por aqueles que, semanas antes, já haviam firmado contratos com a Instituição promotora da JMJ, que, diga-se de passagem, deixou de custear os serviços imprescindíveis para a realização do evento sem qualquer justificativa. A conclusão, vale o registro, vai ao encontro das declarações já prestadas por Mara Costa, representante de uma das virtuais contratadas pelo Instituto (para prestar o serviço que o Município, às pressas, agora licita) em reunião ocorrida no último 4 de julho, nas dependências do Ministério Público. Aos olhos mais atentos, a conclusão que emerge da leitura do procedimento licitatório é a de que os autos foram instrumentalizados exclusivamente com o propósito de documentar a realização de escolhas e deliberações já previamente acordadas entre servidores municipais e o Instituto promotor do evento. Com efeito, devido aos candentes vícios que o impregnam (adiante vistos), não seria exagero afirmar que o expediente, autuado como de n°

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09/003498/135, sequer pode efetivamente ser chamado de “procedimento”. Ora, afinal de contas, este vocábulo, ao menos etimologicamente, pressupõe conjunto sequencial de ações, cronológicas, de maneira que os atos praticados em momento anterior sirvam de parâmetro para aqueles que o seguirão, e assim por diante, até que seja atingido seu resultado que, em se tratando de licitação, há de ser, sempre e sempre, a obtenção da melhor proposta. Como já se permitiu antever, nada disso se faz presente na hipótese em apreço. Aqui, não parece ter-se em mente a obtenção, impessoal e isenta, da melhor oferta, mas convalidar aquelas já apresentadas pelas “ex-contratadas” do Instituto e “virtuais vencedoras” do certame. A assertiva acima se deve, em grande parte, a constatação da realização tumultuada das etapas procedimentais. Ao contrário do que se espera deva ocorrer em regular atuação estatal, identifica-se verdadeira inversão de suas etapas, dado a confirmar que os atos praticados posteriormente não têm relação de causa e efeito àqueles que o antecedem, quando logicamente deveria ser assim. O primeiro fato a sustentar esta assertiva é verificado logo no início do pregão presencial nº 396/2013 (rito cujos contornos gerais couberam à Lei federal n° 10520/2002, regulamentada, no âmbito do Município do Rio de Janeiro, através do Decreto 30538/2009, cf. o art.37, XXI Constituição da República). 5

A análise se baseia na cópia dos autos, entregue, por ocasião da reunião, pelo Procurador-Geral do Município,

contendo ao todo 129 (cento e vinte e nove) páginas.

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O ato embrionário para a realização de toda e qualquer licitação (de qualquer modalidade) é a avaliação dos custos pela autoridade competente. A estimativa de valores para qualquer compra ou serviço que a Administração Pública pretenda realizar constitui passo inicial. Se não bastasse tratar-se de conduta umbilicalmente ligada ao princípio da economicidade, é medida que se impõe ante o que dispõem a Lei Geral de Licitações e Contratos (art. 7, § 2º, inciso II, da Lei n. 8666/93), a Lei do Pregão (Art. 3º, inciso III da Lei 10520/02) e o próprio decreto municipal, editado pelo atual Prefeito: (Art. 6º, inciso I, alínea b do Decreto Municipal n. 30538/2009) E como avaliar os custos de um produto e serviço? Quem responde é o próprio Executivo Municipal (curiosamente a entidade promotora do pregão), no art.6° do Decreto acima descrito: considerando os preços de

mercado e os praticados pela Administração Pública Municipal em certames anteriores . É a tão famosa (quanto negligenciada) cotação (ou consulta) de preços. Pois bem. Ora, a todos que se ocuparem de analisar o (primeiro) projeto básico 6 do objeto licitado (lauda por lauda, linha por linha) jamais tomarão conhecimento de como o Subsecretário Municipal de Saúde chegou aos valores ali apontados como da ordem de R$ 7.775.788,45 (SETE MILHÕES SETECENTOS E SETENTA E CINCO MIL, SETECENTOS E OITENTA E OITO REAIS E QUARENTA E CINCO CENTAVOS). Afinal, não havia nada nos Dois foram os apresentados. Um datado do dia 24 de junho e, outro, sem data, encartado nos mesmos autos duas laudas depois.

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autos a servir de parâmetro, simplesmente porque a Administração não promoveu a cotação de preços prévia. Durante todas as quinze páginas de projeto básico, a única referência a valores e custos dizia respeito apenas aos gastos globais que envolveriam cada um dos lotes, mas nada de referência a custo unitário, a indicar como se havia chegado àquele montante. É simplesmente inconcebível que se apresente o orçamento de algo sem que se parta de seu antecedente lógico, os custos unitários. Mesmo assim (contrariando previsão legal), o projeto básico foi autorizado no mesmo dia em que apresentado (dia 24 de junho), restando publicado no Diário Oficial no dia imediatamente seguinte (dia 25 de junho), a confirmar que a prática dos atos posteriores independe da conclusão de seus antecedentes lógicos. À publicação seguiu-se novo projeto básico (o segundo, que alterava parte dos valores apontados no primeiro e acrescia um novo lote, o quarto, denominado evento Angelus). Este, igualmente, apresentava custos também globais, lote por lote, mas, assim como seu antecessor, não havia pista de como fora obtido. Como poderia o Subsecretário Municipal de Saúde, Sr. JOÃO LUÍS FERREIRA COSTA, ter assinalado, em ambos os projetos básicos previamente confeccionados, suas estimativas sem mesmo dispor de qualquer cotação de preços prévia?

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Parte das respostas às indagações acima se consegue obter algumas páginas mais a frente do “procedimento”, onde se acham os orçamentos (custos globais) colhidos pela própria Instituição promotora do evento junto a algumas prestadoras de serviço. A documentação ali contida (cf. fls.70/72) revela que os valores utilizados para o apontamento do custo global são exatamente idênticos àqueles indicados pelas prestadoras de serviços, contratadas pela entidade promotora da Jornada. Foram reproduzidos, inclusive, os centavos. A confirmar que quando da edição de ambos os projetos básicos não havia sido cumprida a tarefa prévia de estimativa dos custos unitários (exigência legal, frise-se), tem-se os e-mails entabulados por servidores municipais em data posterior ao advento dos citados projetos. Nos diálogos, Polyana Rodrigues Alves solicita informações acerca de ata de registro de preços em vigor, certamente como o intuito de atender às disposições legais. O interlocutor, em resposta, é enfático em asseverar que no âmbito daquela Secretaria, não consta ata de registro de preços vigente

nem certame em desenvolvimento que contemple o objeto nas condições e características insculpidas no projeto básico em tela . Trata-se de evidência irrefutável de que a Administração Pública Municipal primeiro confeccionou o projeto básico apontando o valor global e depois se apressou em obter documentação apta a calçá-lo (i.é, os valores unitários), o que pode ser confirmado pelo dia e horário do envio das mensagens. Já passava das 18:07 hs do dia 26 de junho quando o servidor

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encaminhou a resposta atestando inexistência de preços a respaldar a informação. Por aí já se vê que a estimativa procedida pela Administração Pública não foi, em verdade, pautada em análise pormenorizada dos valores dos serviços e produtos que objetiva contratar, de modo que, após a realização de seguidas operações aritméticas, se chegasse a um valor global. O que se deu foi fenômeno inverso: os únicos valores unitários encartados mais à frente no “procedimento” são decomposição dos valores globais apontados pelas sociedades empresárias contratadas pela promotora do evento. Pôs-se, literalmente, a carroça na frente dos bois . Ademais,

os

valores

globais/orçamentos

apresentados

pela

Administração Pública são cópia fidedigna daqueles apresentados pelas virtuais contratadas do Instituto a este, em momento anterior. Ou melhor: são reproduções numéricas dos valores que, em verdade, o Instituto indica terem sido (supostamente) apresentados por suas contratadas, já que não há nada nos autos do “procedimento” que permita aferir tenham sido aqueles os apresentados pelas aludidas sociedades. A Administração Pública simplesmente não pode agarrar-se em documento produzido por terceiros, sem que a idoneidade do que ali consta passe por seu crivo, quanto mais em se tratando de licitação envolvendo objeto de tamanha complexidade e montantes desta grandeza. Contudo, assumiu-os como verdade absoluta e se baseou exclusivamente nestes papeluchos, fabricados unilateralmente, não datados e apócrifos (cf. fls.71

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e 73 dos autos de nº 09/003498/13) como pauta única para balizamento de preços. É evidente que o comportamento negligente da Administração Pública quanto à constituição do orçamento e da prévia consulta não se alinha com as determinações legais, tendo ainda o condão de revelar que os atos procedimentais são calcados exclusivamente em documentação fornecida pelo Instituto promotor da JMJ que, por sua vez, representam os interesses das prestadoras contratadas por este. O entendimento do Tribunal de Contas da União acerca do tema confirma o acerto das considerações acima e, ao mesmo tempo, confirmam a ilegalidade apontada:

“Consulte , nas contratações em que seja aplicável a hipótese de dispensa de licitação, o maior número de possível de

propostas de potenciais interessados, de modo a aperfeiçoar parâmetros de comparação quanto à escolha do fornecedor, do objeto a ser executado e à razoabilidade dos preços cotados .” (Acórdão 21/2006 Segunda Câmara) “9.3.1.13. realização de ampla pesquisa de preços no

mercado, a fim de estimar o custo do objeto a ser adquirido, definir os recursos orçamentários suficientes para a cobertura das despesas contratuais e servir de balizamento para a análise das propostas dos licitantes, em harmonia com os arts.7, §2°, inciso III e art. 43, incisos IV e V, todos da Lei 8666/93.” 32


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(Acórdão n°1182/2004, Plenário, Relator Min. Walton Alencar Rodrigues, DOU de 26.08.2004).

A estampada nulidade do pregão por desrespeito à norma cogente é conclusão também obtida dos ensinamentos de JESSÉ TORRES PEREIRA JÚNIOR 7:

“as licitações somente podem ser realizadas após a Administração estimar, com o maior nível de precisão possível, o quantitativo do objeto e o seu valor de mercado, cuja pesquisa deverá constar no processo. A ampla pesquisa de preços é requisito de validade do procedimento licitatório.”

As conclusões expostas não divergem daquelas obtidas por ninguém menos que o Procurador-Geral do Município. Quando instado a confeccionar o parecer jurídico, vaticinou, sem rodeios, que “parece ser necessário que a

Secretaria junte a este processo suas estimativas para os eventos de Guaratiba, pois consta do processo apenas as cotações que teriam sido feitas pela organização do evento, devendo se comparar e adotar o menor preço” (fls.124 dos autos licitatórios) . Acontece, porém, que a sua manifestação não foi acolhida pela Administração que, a despeito da exigência formulada, seguiu em frente...

7

Políticas Públicas nas Licitações e Contratações Administrativas. Editora Fórum, p.401.

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A bem da verdade, apenas em relação a dois dos lotes, de um total de quatro, é que há valores apresentados (unilateralmente) pelo Instituto, e gerou a reprovação do Procurador-Geral. Em relação aos outros dois (referentes aos eventos Angelus e Copacabana), não há qualquer documentação apresentada pelo Instituto promotor do evento. Quanto a estes, há apenas um esboço de planilha, também apócrifa, não datada, apontando em valores, à toda evidência, fabricados. Aqui, sem dúvida, reside o segundo indício irrefutável de manipulação do “procedimento” licitatório. Com efeito, se os valores apontados pela Administração Pública tivessem sido obtidos após prévia consulta de preços minimamente coerente, é certo que jamais se teria como resultado a obtenção de custos, em sua quase totalidade, constituídos de números redondos, simplesmente porque os custos unitários quase nunca o são. É de se conferir a “planilha”, responsável pelos custos do lote “Copacabana” (cf. fls.74 do proc.09/003498/13): dos catorze valores ali reproduzidos, nada menos do que doze deles tem seus últimos cinco dígitos iguais a zero!!!! Limpeza? R$ 300.000,00 redondos. Transporte pessoal? R$ 42.000,00 redondos. Medicamentos? R$ 210.000,00. Material Hospitalar? 270.000,00. E por aí vai... Mais inusitada que a composição dos valores em si é a suposta fonte de tais números. Segundo o que consta a fls.81 do “procedimento” licitatório, para a composição destes custos, “a Secretaria Municipal de Saúde adotou os valores praticados para o esquema de atendimento de saúde das atividades públicas do

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Reveillon 2012/2013”, constando ainda do documento que “foram também levados em consideração atas de registro de preço vigentes”. A veracidade do documento (assinado por JOÃO LUIZ FERREIRA COSTA, Subsecretário Municipal de Saúde), como já se poderia supor, é seriamente posta em xeque quando se leva em consideração as mensagens eletrônicas mencionadas linhas acima, as quais desmentem seu teor, na medida em que se afirma (cf. fls.69 do proc.) não constar ata de registro de preços que contemplem os serviços especificados nos projetos. Inquestionável que, acaso efetivamente os valores tivessem sido buscados da fonte indicada, o servidor via-se compelido a apresentá-los. Tratase de obrigação legal, não tendo qualquer valia a vã assertiva de que os valores teriam sido obtidos de tal ou qual meio, sem que os autos sejam realmente instruídos com a documentação idônea e comprobatória. In casu, deveriam ser certamente encartados os tais gastos com o réveillon e mesmo as atas de registros de preços utilizadas, porquanto a pesquisa de preços, conforme costumeira lição doutrinária, deve estar

formalizada no processo administrativo para garantir a transparência de sua realização 8. Nem que se fizesse alusão, na pior das hipóteses, aos números das atas de registro de preços invocadas. Ambas as providências, em especial a última delas, é prova valiosa e indispensável da higidez das declarações, considerando sobretudo o que dispõe o art. 5º do Decreto Municipal

88FLÁVIO

AMARAL GARCIA. Licitações e Contratos Administrativos. Casos e Polêmicas. Editora Lumen Juris, p.29.

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23957/2004, dispondo que a ata de Registro de Preços [é confeccionada] com a ordem de classificação das empresas obtida no certame. Em rigorosamente nada disso tendo sido juntado aos autos, seja pela irrealidade refletida nos números redondos, seja porque o teor da justificativa é desmentido por outro documento contido nos autos ou, ainda, em razão das afirmações não terem sido acompanhadas dos documentos indispensáveis a validá-las, a conclusão a que se chega é que as apócrifas planilhas não correspondem à realidade e, portanto, são ideologicamente falsas. Lamentavelmente, não é só por ocasião das estimativas de custos e na confecção dos orçamentos que o Município descumpre as leis postas. A sensação de que a Administração Pública conduz o procedimento licitatório como se este fosse um pesado fardo do qual pretende, o mais rápido possível, ver-se liberto, é ainda confirmada pela análise de diversos atos, supostamente produzidos em tempo verdadeiramente recorde. Estes, assim como aqueles, constituem ilegalidades capazes, por si só, de resultar na invalidade do procedimento licitatório. Tendo ocorrida a publicação da aprovação do (primeiro) projeto básico no dia 25 de junho (fls.34), em D.O municipal, é completamente inexplicável e desafia a inteligência humana a insinuação (através das datas apostas nos documentos) de que a Administração Pública, até o dia imediatamente seguinte, tenha conseguido i) confeccionar outro projeto básico (fls.35 a 66), ii) justificado a contratação acorde este novo projeto básico ( fls.67/68), iii) promovido pesquisa e juntada de custos e orçamentos (fls.69-73), iv) “justificado” os custos ( fls.81), v) justificado a 36


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hipótese de pregão presencial ( fls.82), tendo ainda nesse raquítico espaço de tempo, vi) apresentado edital em 34 páginas (!!!!), cf.fls.83-117; vii) submetido a contratação ao Prefeito e sua anuência (fls.122); viii) encaminhamento dos autos à Procuradoria-Geral do Município (fls.123); ix) obter sua apreciação pelo Jurídico; x) novo encaminhamento, a pedido deste, à Comissão de Programação de Controle de Despesa ( fls.126) e xi) aprovação pela Comissão. A (supersônica) velocidade empregada na instrução do procedimento é, por si só, comprobatória de que os atos praticados eram mais resultado de acordo de vontades adrede estipulado do que fruto de reflexão e análise parcimoniosa dos autos, sobretudo em se tratando de imbricado projeto básico como o destes autos. A pressa é inimiga da perfeição – reza o ditado -, e da maneira atropelada que os atos foram sendo conduzidos, era mesmo inimaginável que o processo não contivesse vícios. Por certo, a complexidade ínsita a cada um dos atos administrativos supostamente praticados, em meio a tramitações por diversos órgãos, em míseros dois dias, não condiz com o tempo necessário para desempenhar as tarefas desincumbidas por cada personagem. Não há outro raciocínio a seguir senão constatar que as datas apostas em substancial parte dos documentos não condizem com a realidade dos fatos. A cronologia foi alterada, disso não se duvida. E é questão de justiça restabelecê-la, através de (outros) documentos contidos (acidentalmente) nos autos.

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A reconstituição de como os fatos se passaram tem por elemento fundamental não só aqueles e-mails trocados no dia 26 de junho (quarta-feira) no final do dia (o horário contido nas mensagens é mesmo revelador, cf.fls. 69), mas sobretudo a data indicada por ocasião da confecção do edital, contida a fls.89 dos autos. O pregoeiro apôs a data de 28 de junho de 2013 (sexta-feira) como de sua confecção. Sendo de se considerar completamente improvável que os computadores de ambos os servidores estivessem com o horário desajustado e, por fim, que o senhor Pregoeiro tivesse avançado no tempo na hora de indicar a data 9, esta a ordem dos fatos: 1º (fls.34) - dia 25 de junho (autorização do primeiro projeto básico); 2º (fls.69) – dia 26 (e-mails trocados com a data do envio das mensagens fornecidas pelo provedor) e 3º ( fls.89) – dia 28 (confecção do edital). Bem, se todos os atos praticados posteriormente ao dia 28 de junho (fls.89) foram datados como perpetrados nos dias 25 e 26 de junho, só há duas explicações possíveis: ou os documentos foram praticados fora da ordem seqüencial estabelecida em lei ou antedatados. Não há outra via a seguir. E ambos os caminhos levam à mais absoluta nulidade do procedimento, seja pela ruptura do devido processo legal, seja pela prática de atos simulados 10. 9

Tão improvável quanto ao desajuste no relógio dos computadores é apor em documento data futura. É corriqueiro

firmar documento com data pretérita, mas o contrário é de rara ocorrência. 10

O vocábulo simulado foi empregado (e assim há de ser interpretado) em seu conceito jurídico-positivo, na forma do

que dispõe o Código Civil (art.167), com a seguinte redação: “É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma. § 1o Haverá simulação nos negócios jurídicos quando: I -

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E por que a Administração Pública protagonizaria tão tenebrosos expedientes? Ora, se os atos (supostamente) praticados posteriormente aos três eventos ocorridos nos dias 25, 26 e 28 de junho tivessem aguardado a ordem prevista em lei (na primeira hipótese acima) ou os documentos confeccionados contivessem a real data em que foram cunhados (na pior das hipóteses, do dia 28 de junho, sexta-feira, em diante), a Administração Pública encontraria sérios óbices à própria realização do certame, por ausência de tempo hábil. Também não era para menos: não custa lembrar que só a autuação do procedimento licitatório deu-se no dia 24 de junho, a menos de um mês do início do evento, programado no calendário sabe-se lá há quanto tempo.... Ademais, é de se ter em mente que a Lei 10520/2002, em seu art.4º, V, prevê um espaçamento mínimo de oito dias úteis entre a publicação dos avisos do edital e a realização do certame e também exige que os tais avisos só aconteçam após cumpridas todas aquelas etapas que enumera. Dito isto, não fosse a utilização de um dos dois expedientes11, jamais a Administração Pública poderia publicar aviso de edital, como efetivamente fez

aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem;II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira; III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados”. 11

Para os fins que objetiva a presente demanda, é irrelevante qual dos expedientes foi encetado, o que há de ser

apurado em sede de inquérito civil instaurado para a prática de atos de improbidade administrativa. Por enquanto, o

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(fls. 417 do IC), já no dia 1º de julho de 2013 (segunda-feira), tampouco marcála para o dia 12 de julho (respeitados aqui os oito dias úteis). A propósito, considerando o curto hiato entre a confecção da minuta do edital (fls.89, dia 28 de junho, sexta-feira) e a publicação, já na manhã de segunda-feira (dia 1º de julho) do aviso convocatório, é mesmo sintomático que a Administração se valeu de um dos artifícios, porquanto humana, material e logicamente impossível que tivesse cumprido, em questão de horas, todos os demais atos administrativos que medeiam ambas as etapas. Tanto atropelo acabou gerando, inclusive a própria publicação12 de aviso de aprovação do (segundo e último) projeto básico – pasmem! – em data posterior (3 de julho, cf.fls. 152 a 169 do Anexo I ao IC) a própria publicação do aviso de convocação da licitação. A esta altura, já não podem restar dúvidas de que o procedimento nº 09/003498/13 (publicado na imprensa oficial como PP 396/2013) padece de vícios graves o suficiente a ensejar a decretação da nulidade, notadamente em que aqui nos interessa é que um ou outro foi utilizado, e ambos importam em nulidade do procedimento administrativo. 12

A ressalva contida no aviso de que a publicação se tratava, em verdade, de republicação por incorreção é

uma falácia, para dizer o mínimo. Republicação por incorreção ocorre quando há erro material. Aqui houve simplesmente a apresentação de novo projeto básico, no lugar daquele apresentado entre a fls. 3-33 do procedimento licitatório, desta vez contemplando o evento Angelus, inexistente no primeiro. Mudou-se o objeto e daí a necessidade de nova aprovação e publicação. O termo republicação só teve o intento (frustrado) de esconder mais um episódio emblemático de inversão de ritos, dentre outros tantos. O mais curioso é que a aprovação do projeto básico constitui o primeiro ato da fase interna da licitação e a publicação de aviso o primeiro da fase externa. O episódio é mesmo emblemático da balbúrdia procedimental realizada durante o pregão presencial.

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razão do atentado cometido em desfavor do devido processo legal administrativo. O due process of law do procedimento administrativo não é menos caro ao Direito do que aquele enunciado em diplomas processuais. Ao contrário, é sujeito a idênticas deferências e cuidados, como registra MARÇAL JUSTEN FILHO 13: “O devido processo legal é uma conquista do pensamento jurídico ocidental e retrata a concepção de que a arbitrariedade

nas decisões é restringida através da observância de uma

série

ordenada

de

formalidades.

Essas

formalidades visam a comprovar a presença e o conteúdo dos fatores formadores de convicção do julgador. Além disso, essas formalidades permitem a todos interessados oportunidade de manifestação (...) O devido processo legal estabelece freios e contrapesos ao poder do julgador. Antes de examinar se a decisão é justa e

compatível com o direito, cabe definir se ela foi produzida em observância a todas as formalidades. Observância de todas as formalidades significa: a)

Obediência à ordenação e à sucessão de fases

determinadas na Lei e no ato convocatório; b)

13

Observância do princípio da publicidade;

Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Editora Dialética, 13ª edição, p.101.

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c)

Audiência prévia e plena manifestação de todos os

interessados.”

Afora as ilegalidades até aqui já identificadas, há outra sorte de vícios que parecem não apenas atentar também quanto à higidez do procedimento, mas em especial quanto aos princípios setoriais da publicidade (aliás, o trecho acima transcrito aproveita também a este tópico), impessoalidade, isonomia (rectius: igualdade entre os licitantes) e da competitividade. Quanto à apontada violação à publicidade, não há como não reagir perplexo a inexistência de qualquer determinação de que os avisos de edital tivessem publicação também em jornal de grande circulação, mas apenas de que a

divulgação

da

licitação

dar-se-á[ia]

nos

sites

HTTP://ECOMPRASRIO.RIO.RJ.GOV.BR, por tratar-se de portal oficial da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro e no HTTP://www.comprasnet.gov.br, portal de compras do governo federal. (fls.118 dos autos de nº 09/003498/13). Afinal de contas, ainda vige o Decreto Municipal nº 30538/2009, editado pelo Prefeito em exercício (ao menos, em consulta à legislação no portal da Prefeitura, na internet, não há notícia de sua revogação), categórico em estabelecer a seguinte determinação quanto à publicidade: “Art. 7º A fase externa do Pregão observará as seguintes regras: I - a convocação dos interessados será efetuada por meio de publicação de aviso em função dos seguintes limites: a) através de aviso publicado no Diário Oficial do Município do Rio de Janeiro – D.O.RIO e em meio eletrônico, na internet, para 42


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aquisições de bens ou serviços comuns de valores estimados até R$ 160.000,00 (cento e sessenta mil reais); b) através de aviso publicado no D.O.RIO, em meio eletrônico, na internet e no jornal de grande circulação local para aquisições de bens ou serviços comuns de valores estimados até R$ 650.000,00 (seiscentos e cinquenta mil reais);

c) através de aviso publicado no D.O.RIO, em meio eletrônico, na internet e no jornal de grande circulação regional ou nacional para aquisições de bens ou serviços comuns de valores estimados acima de R$ 650.000,00 (seiscentos e cinqüenta mil reais).”

Em tendo sido estimado o objeto do pregão presencial nº 396/2013 em montante aproximado de R$ 8.000.000,00 (oito milhões de reais), o despacho determinando divulgação mais restrita do que determina o Decreto e, bem assim, a inexistência de notícia de publicação nos meios de divulgação devidos representa, sem sombra de dúvida, mais uma rotunda nulidade do procedimento licitatório. Não é difícil imaginar a quem favorece a restrição da publicidade. Quanto menos divulgada a realização da licitação, menos se prestigia a competitividade, menores são as chances de obter propostas mais vantajosas. Maior, apenas, são as chances dos prestadores, adrede avisados, de sagrarem-se vencedores. Por aí se vê, mais uma vez, que a seriedade (e a gravidade) das declarações de Mara Costa, proferidas durante reunião realizada no Ministério Público, onde revelou a intenção do Município (veiculada em reunião, diga-se) 43


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de que as sociedades empresárias previamente acordadas com o Instituto promotor do evento participassem da licitação. Dentro deste contexto, é inegável que manter a licitação “em segredo” para grande parte dos interessados é indispensável para conseguir seu intento. A rigor, mesmo que não houvesse sido revelada a, digamos, predisposição da Administração Pública de contratar com as sociedades empresárias mencionadas, parece ao Ministério Público existir fato claramente impeditivo de que estas participassem do certame. Em que pese isto não tenha sido alardeado pelo Município (tampouco nos autos do “procedimento” licitatório), o projeto básico apresentado nos autos é, em substancial parte, reprodução do projeto apresentado pelas aludidas sociedades empresárias quando das negociações encetadas com o Instituto promotor da JMJ, conclusão a que se chega após a conferência dos termos do referido projeto de atendimento médico e o de fls.35/66 do procedimento. Ora, em sendo assim, ainda que o Juízo houvesse por bem (ignorando os elementos contidos no inquérito civil) negar o pedido de decretação da nulidade do procedimento licitatório, é certo que deveria ao menos obstar a participação das sociedades cujos projetos serviram de base, bastando, para tanto, efetuar a subsunção dos fatos à norma que deriva do art.9º da Lei 8666/93, contendo a seguinte redação:

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“Art. 9o Não poderá participar, direta ou indiretamente, da licitação ou da execução de obra ou serviço e do fornecimento de bens a eles necessários: I - o autor do projeto, básico ou executivo, pessoa física ou jurídica; II - empresa, isoladamente ou em consórcio, responsável pela elaboração do projeto básico ou executivo ou da qual o autor do projeto seja dirigente, gerente, acionista ou detentor de mais de 5% (cinco por cento) do capital com direito a voto ou controlador, responsável técnico ou subcontratado; III - servidor ou dirigente de órgão ou entidade contratante ou responsável pela licitação. § 1o É permitida a participação do autor do projeto ou da empresa a que se refere o inciso II deste artigo, na licitação de obra ou serviço, ou na execução, como consultor ou técnico, nas funções de fiscalização, supervisão ou gerenciamento, exclusivamente a serviço da Administração interessada. § 2o O disposto neste artigo não impede a licitação ou contratação de obra ou serviço que inclua a elaboração de projeto executivo como encargo do contratado ou pelo preço previamente fixado pela Administração. § 3o Considera-se participação indireta, para fins do disposto neste artigo, a existência de qualquer vínculo de natureza técnica, comercial, econômica, financeira ou trabalhista entre o autor do 45


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projeto, pessoa física ou jurídica, e o licitante ou responsável pelos serviços, fornecimentos e obras, incluindo-se os fornecimentos de bens e serviços a estes necessários. § 4o O disposto no parágrafo anterior aplica-se aos membros da comissão de licitação. “

A ideia do legislador foi bem retratada por MARÇAL JUSTEN FILHO 14: “As vedações do art. 9º retratam derivação dos princípios da moralidade pública e isonomia. A lei configura uma espécie de impedimento, em acepção similar à do Direito Processual, à participação de determinadas pessoas na licitação. Considera um

risco a existência de relações pessoais entre os sujeitos que definem o destino da licitação e o particular que licitará. Esse relacionamento pode, em tese, produzir distorções incompatíveis com a isonomia. A simples potencialidade de dano é suficiente para que a lei se acautele. Em vez de remeter a uma investigação posterior, destinada a comprovar a anormalidade da conduta do agente, a lei

determina

seu

afastamento

a

priori.

O

impedimento consiste no afastamento preventivo daquele que, por vínculos pessoais com a situação 14

Obra já citada, página 163.

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concreta,

poderia

obter

benefício

especial

e

incompatível com o princípio da isonomia.”

Ainda que a Lei se contente com a simples potencialidade de dano (na forma do excerto acima transcrito), algumas obscuridades, omissões e irregularidades contidas no objeto da licitação, retratado no projeto básico, parece elevar, ainda mais, o risco ao princípio da competitividade e à igualdade entre os licitantes. 2.1 – DAS FALHAS NO PROJETO BÁSICO ELABORADO: Segundo a Informação Técnica nº 364/2013, elaborada pelo Grupo de Apoio Técnico Especializado do Ministério Público, constante do inquérito civil, o projeto básico apresentado pela Administração Pública contém diversas omissões e contrariedades, as quais, se não forem sanadas, tem o condão de acarretar maior desequilíbrio entre os licitantes, ainda mais se se considerar que o projeto é fruto da reprodução, em larga medida, daqueles apresentados pelo 2º e demais réus. Sabe-se que o Decreto nº 30.538/2009, que regulamenta a modalidade de licitação Pregão, para aquisição de materiais e serviços comuns da Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro, estabelece que na fase preparatória do Pregão cumpre ao órgão requisitante além de justificar a necessidade de contratação definir o objeto do certame, a dotação orçamentária e promover o termo de referência. Assim, o projeto básico deve contar com a descrição detalhada e todas as especificações técnicas do objeto de forma precisa, clara e concisa, 47


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vedadas aquelas que excessiva, irrelevante e desnecessariamente limitem ou frustrem o caráter competitivo do certame (art. 6º, Decreto 30.538/2009). Neste contexto, cumpre transcrever o assinalado pelo GATE – Saúde na referida informação técnica, relativas às principais omissões graves a ensejar a nulidade do certame, por deficiências do Projeto Básico. Transcreve-se, nesse trecho, as constatações do Corpo Técnico do Ministério Público: No item relativo à descrição do objeto licitado destaca-se de imediato que o planejamento do atendimento em licitação foi elaborado pela Instituição Privada COL JMJ responsável pelo projeto anterior analisado e aprovado pelo CBMERJ/1º GSE. O projeto básico atual deve ser obrigatoriamente analisado e aprovado pelo CBMERJ/1º GSE. A aprovação do projeto anterior não isenta o Município de obter uma nova análise e aprovação pelo CBMERJ/1º GSE, conforme art. 14 da Resolução SESDEC 80/2007. O item 3.1 do Projeto Básico restringe a contratada a possuir no mínimo 01 (um) leito de suporte avançado em cada posto de PHF, considerando a área física já aprovada pelos órgãos autorizadores do evento. Ocorre que ao descrever em cada lote, a capacidade física instalada, o quantitativo de leitos de suporte avançado é de 02 (dois) leitos. Dessa forma, o Projeto não atende a clareza prevista no Decreto nº 30.538/2009, que rege o pregão na Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro. (...)

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No item 3.2 do Projeto Básico não consta qualquer previsão de técnico administrativo para registro das ocorrências no PHF e emissão de relatórios (art. 43, da Resolução SESDEC 80/2007), em manifesta contradição com o previsão de Recursos Humanos na alínea n do Lote 4. A descrição dos Recursos Humanos nos demais Lotes 1, 2 e 3 é omissa quanto ao técnico administrativo. O Projeto Básico (item 3.3) ao prever os Recursos Assistenciais dispõe que a aquisição de material permanente com os recursos da contratação reverterá para o Município ao final do contrato, sem a especificação de quais tipos de materiais e motivos de aquisição. A contradição é manifesta, uma vez que a licitação é para serviços de saúde e não para compra de material e insumos. Destaque-se, ainda grave omissão na descrição do LOTE 1 (Copacabana), alínea a, por não haver a especificação do número de leitos nos 6 (seis) Postos PHF para atendimento ao público. A descrição de 67 (sessenta e sete) leitos é distribuída genericamente entre os 6 (seis) Postos PHF. O mesmo ocorre na alínea c do LOTE 1 quanto à distribuição dos Recursos Humanos, não sendo conhecida o quantitativo de médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem entre os Postos e Transporte PréHospitalar. A confusão aumenta pela previsão de independência entre as equipes que tripulam as ambulâncias e aquelas lotadas nos Postos, haja vista a ausência de especificação sobre sua distribuição entre os referidos equipamentos fixos e móveis.

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Não há comprovação pelo Instituto JMJ de questões fundamentais excluídas expressamente do Projeto Básico pelo Município, como a responsabilidade pela limpeza, segurança patrimonial de bens que estão sob a guarda do Município, uma vez que pagos com recursos públicos, higienização para prevenção de infecções e ausência de banheiros para as atividades dignas dos profissionais de saúde contratados. Essas definições são fundamentais para o cumprimento das normas definidas pela Vigilância Sanitária, conforme Informação Técnica. Além disso, foi expressamente excluído do Projeto Básico e não comprovado pelo Instituto como será feita a Limpeza e Gerenciamento dos Resíduos de Serviços de Saúde, se eximindo de função fundamental na área de saúde, que deve ser objeto de avaliação pela Vigilância Sanitária. No LOTE 2 (Vias de Peregrinação) e LOTE 3 (CAMPUS FIDEI, GUARATIBA), o Projeto Básico os mapas apresentados não apresentam as indicações dos locais específicos de localização dos PHF nas Vias e Campus, aonde os peregrinos poderão ser atendidos, conforme art. 11 da Resolução SESDEC 80/2007. Ainda é omisso o Projeto quando no preâmbulo de cada Lote são descritas genericamente as normas vigentes nas estruturas dos postos de atendimento de urgência, com manifesta omissão acerca das referidas normas técnicas vigentes. As mesmas omissões e contradições são reproduzidas nos demais lotes, conforme descrito da Informação Técnica reportada, o que lépida análise permite concluir pela completa desorganização do Projeto Básico, sem revisão, 50


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fato claramente constatado pela ausência da alínea f e g, saltando para a alínea h no LOTE 2. Preocupa ao Ministério Público, ainda, a obscuridade quanto a retaguarda assistencial e regulação, uma vez que se constata completa indefinição do número de leitos de retaguarda nas Unidades Hospitalares e as referências e contrarreferências para aqueles pacientes atendidos durante o evento, bem como a omissão quanto às normas de informação aos familiares relativas a definição das remoções dos pacientes, conforme expressa previsão do art. 39 da Resolução SESDEC 80/2007. Há muito que o TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (e a doutrina, reconheça-se) atrela a necessidade de descrição clara do objeto licitado à isonomia entre os licitantes e a lisura do procedimento. Confira-se, a propósito, a Súmula 177 da Corte de Contas Federal:

“A definição precisa e suficiente do objeto licitado constitui regra indispensável da competição, até mesmo como pressuposto do postulado da igualdade entre os licitantes, do qual é subsidiário o princípio da publicidade, que envolve o conhecimento pelos concorrentes potenciais, das condições básicas da licitação. Na hipótese particular da licitação para compra, a quantidade demandada é essencial à definição do objeto do pregão.”

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Mais uma vez, socorremo-nos dos ensinamentos de MARÇAL JUSTEN FILHO, preciso em descrever a importância da correta descrição do objeto da licitação:

“A descrição do objeto da licitação contida no edital não pode deixar margem a qualquer dúvida nem admite complementação a posteriori. Entre a opção de

uma

minuciosa,

descrição não

sucinta

pode

haver

e

uma dúvida

descrição para

a

Administração Pública: tem de escolher a descrição completa e minuciosa. Certamente, a descrição deve ser clara. No caso, sucinto não é sinônimo de obscuro. Se a descrição do objeto da licitação não for completa e perfeita, haverá nulidade, nos termos adiante apontados”.

Ao tempo em que se encerra o presente tópico, não resta dúvida de que o procedimento administrativo nº 09/003498/13 está não só infestado de vícios que exigem a decretação de sua nulidade, mas incrustado de elementos que, além de revelarem a sua verdadeira origem (prolongamento de tratativas travadas inicialmente entre os particulares e o Instituto promotor da JMJ), também desnudam seu provável e direcionado destino.  DO DIREITO

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O art. 37, caput e inciso XXI, da Constituição Federal de 1988 impõem: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...) XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.” O art. 3º da Lei 8.666/93 impõe que as licitações sejam processadas e julgadas “em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos” (grifo nosso). Por outro lado, a nulidade dos atos administrativos praticados com desvio de finalidade vem prevista no seguinte dispositivo legal: “Art. 2º. São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de: e) desvio de finalidade. Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade observarse-ão as seguintes normas: e) o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência.”

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Apesar de não ser objeto da presente, mas já estar sendo objeto de investigação pelo Ministério Público, é bom lembrar que o art. 10, VIII, da Lei 8.429/92, dispõe que consubstancia a improbidade administrativa “frustrar a licitude de processo licitatório”. Portanto, a conduta do Município-réu, ao elaborar em tempo recorde processo licitatório totalmente eivado de vícios, com o objetivo claro de favorecer as empresas que já tinham sido contratadas pelo segundo réu, em flagrante prejuízo aos cofres públicos, constitui atentado aos dispositivos legais e constitucionais acima mencionados, bem como aos já citados no item 2.1, especificamente quanto à Lei 8.666, Lei 10.520 e Decreto Municipal n. 30538/2009, impondo a declaração de nulidade de tais atos e reclamando, para tanto, a intervenção imediata do Poder Judiciário. A seu turno, reitere-se a necessidade de atendimento aos seguintes atos normativos locais: Resolução SESDEC n. 80/2007 e a Resolução CREMERJ n. 187/2003, que, reproduzindo conceitos, normas e diretrizes da Política Nacional de Urgência e Emergência prevista na Portaria MS n. 2048/2002 e da Resolução CREMERJ n. 100/96, definem e trazem a regulamentação dos requisitos mínimos necessários para a autorização de projeto de atendimento médico pelo Corpo de Bombeiros e liberação de Certidão de Anotação de Responsabilidade Técnica (CART) pelo CREMERJ, documentos estes imprescindíveis para a realização de eventos especiais com estimativa de público superior a hum mil pessoas.

4 DA NECESSIDADE DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA:

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O processualista Luiz Guilherme Marinoni15 preleciona: “...A tutela antecipatória pode ser concedida no curso do processo de conhecimento, constituindo verdadeira arma contra os males que podem ser acarretados pelo tempo do processo, sendo viável não apenas para evitar um dano irreparável ou de difícil reparação (art. 273, 1, CPC), mas também para que o tempo do

processo seja distribuído entre as partes litigantes na proporção da evidência do direito do autor e da

fragilidade da defesa do réu (art. 273, 11 e § 6.° CPC).

Em última análise, é correto dizer que a técnica antecipatória visa apenas a distribuir o ônus do tempo do processo. É preciso que os operadores do direito compreendam a importância do novo instituto e o usem de forma adequada. Não há motivos para timidez no seu uso, pois o remédio surgiu para eliminar um mal que já está instalado, uma vez que o tempo do processo sempre prejudicou o autor que tem razão. É necessário que o juiz compreenda que não pode haver efetividade sem riscos. A tutela antecipatória permite perceber que não é só a ação (o agir, a antecipação) que pode causar prejuízo, mas também a omissão.” Na lição do processualista acima, se constata que o tempo do processo deve ser repartido entre as partes litigantes, pois prestar a tutela jurisdicional é dizer o direito em tempo hábil à sua justa efetivação, o que ante o excesso de pleitos às portas do Judiciário, vem sendo, no mais das vezes, impossibilitado em nossos Juízos. Tal necessidade, há muito demonstrada pela doutrina, restou erigida à categoria de garantia fundamental pela Emenda Constitucional n.º 45/2004, que inseriu o inciso LXXVIII no art. 5º da CF, explicitando o dever estatal de prestar a jurisdição de maneira efetiva e em tempo hábil.

15

Manual do Processo de Conhecimento. A tutela jurisdicional através do processo de conhecimento, 2ª edição revista, atualizada e ampliada, Editora RT, p. 229.

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O art. 273 do CPC enumera os requisitos legalmente exigidos à antecipação dos efeitos da tutela, instituto processual que materializa tal garantia. São basicamente três: prova inequívoca da verossimilhança das alegações; fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, e possibilidade de reversibilidade. Conforme se passará a demonstrar, in casu, estão presentes tais requisitos. A

prova

inequívoca

da

verossimilhança

está

sobejamente

demonstrada nos autos, através da prova documental que instrui a presente, bem como do teor da gravação da reunião ocorrida em 04/07/2013 (Mídia em DVD), constante do Inquérito Civil que instrui a presente, os quais, de forma cristalina e contundente, demonstram que a licitação iniciada pelo Municípioréu atenta contra os princípios administrativos da legalidade, impessoalidade, competitividade, igualdade e moralidade, já que ficou evidenciado que: i) durante o processo de planejamento do evento privado e religioso, os responsáveis pela JMJ 2013 estavam assumindo todas as obrigações legais para a prestação de assistência à saúde dos participantes do evento, não havendo justificativa crível para que o Município do Rio de Janeiro, repentinamente, assuma obrigações que originariamente não eram suas, modificando os rumos da organização do serviço de saúde há muito já programado para a Jornada Mundial da Juventude – JMJ Rio 2013; ii) houve reunião prévia da Secretaria Municipal de Saúde e organizadores do eventos, em que as empresas rés tiveram a notícia antecipada de que seria aberta licitação e de que deveriam apresentar proposta nos mesmos moldes da que já era objeto de contrato com o segundo réu, já que processo de contratação sofreria mudanças apenas e tão somente quanto à forma de contratação e pagamento, havendo a expectativa 56


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destas ultimas de sagrarem-se vencedoras do certame, em razão da exiguidade de tempo e da impossibilidade de outras empresas se prepararem em tempo recorde para participar do processo; iii) os contratos já celebrados pelo Instituto JMJ, ora segundo réu, continuam em vigor, não tendo havido rescisão até a presente data, havendo plena condição daquele em continuar como responsável pela execução dos serviços de saúde; iv) tratar-se de evento de natureza privada e religiosa, razão pela qual é absurdo o custeio de tal evento com verbas públicas, em flagrante prejuízo ao erário público municipal, detentor de notória limitação para a concretização de políticas públicas na área da saúde, especialmente; v) os flagrantes vícios de legalidade já apontados no processo de licitação ora em curso, exaustivamente demonstrados acima. Já o periculum in mora reside no fato de que, a se manter o processo licitatório da forma como está, haverá manifesto prejuízo para o erário público municipal, já que arcará com custos que, originariamente, não deveriam ser por ele assumidos, podendo trazer prejuízos, inclusive, à implementação de políticas públicas, programas, ações e serviços de natureza permanente, que efetivamente concretizem o direito fundamental social à saúde previsto constitucionalmente. Por outro lado, eventual demora no deferimento da tutela de urgência tornará ineficaz a tutela jurisdicional ora pretendida e acabará por legitimar processo de licitação viciado desde a sua origem. Registre-se, ainda, que a não realização do pregão presencial não significa a não prestação do serviço de saúde e a conseqüente vulnerabilidade da população participante do evento, eis que os pedidos abaixo discriminados tem por finalidade obrigar ao Instituto JMJ (segundo réu) a execução, sob sua responsabilidade, das ações em saúde 57


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já programadas e pactuadas com os órgãos públicos, nos termos da legislação vigente, seja através da manutenção dos contratos já firmados ou não. Em resumo, busca-se nesta Ação Civil Pública provimento jurisdicional que garanta, de forma adequada, a prestação do serviço à saúde da população carioca e do público participante da 13ª edição do encontro Jornada Mundial da Juventude – JMJ Rio 2013. Por prestação do serviço de forma adequada, compreende-se não só a organização do serviço de saúde dentro dos critérios técnicos constantes da Resolução CREMERJ n. 187/2003 e Resolução SESDEC n. 80, de 18 de julho de 2007, mas também a sua oferta dentro das regras e princípios que regem a Administração Pública, notadamente, os princípios da legalidade, da moralidade e da eficiência, não sendo crível admitir e permitir que a menos de 15 dias da realização do evento: 1-

o Município do Rio de Janeiro, repentinamente, modifique os rumos da organização do serviço de saúde há muito já programado para a Jornada Mundial da Juventude – JMJ Rio 2013, optando por assumir obrigações que, em última instância, pertencem ao Instituto JMJ (responsável pela organização do evento); isto, frise-se, sem qualquer justificativa razoável ou até mesmo requerimento formal por parte dos interessados,

2-

que ao assumir obrigações não originárias do Poder Público, agentes públicos, manobrando os acontecimentos, promovam reunião com representantes das empresas Vida, Savior e BEM, juntamente com a organização do evento, anunciando a possibilidade de suspensão temporária ou até mesmo a rescisão de contratos de natureza privada já firmados entre as referidas empresas e o Instituto JMJ e orientando-os a participar do pregão presencial que se avizinha e a apresentar, na ocasião, propostas de conteúdo idêntico aos dos citados contratos; 58


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3-

que este pregão presencial, organizado em tempo recorde pela municipalidade, tenha sido realizado sem as devidas publicidade e transparência, apresentando, ainda, contornos técnicos que, aparentemente, somente permitiram às empresas que previamente conheciam os projetos, vencê-lo em cada um de seus correspondentes escopos, em franca violação aos princípios da legalidade, da moralidade, da publicidade, impessoalidade, isonomia e da competitividade;

4-

que a partir desta manobra política, a municipalidade retire dos cofres públicos, em prol de evento de natureza privada, o montante de R$ 7.840.636,54, que, por óbvio, seria melhor utilizado se em benefício da população carioca em geral, que, lembre-se nos últimos tempos vem ocupando as ruas clamando por mais saúde e educação para todos;

Assim, de modo a preservar a lisura da coisa pública, e, ao mesmo tempo, garantir ao público participante da JMJ – Jornada Mundial da Juventude a necessária e adequada atenção a sua saúde, é imprescindível que haja decisão judicial, inclusive, em caráter de urgência, que permita romper esta sucessão de acontecimentos e, ao mesmo tempo, restabelecer a ordem anterior. E por entender como inconteste a verossimillhança dos fatos alegados nesta exordial, consubstanciadas nas provas produzidas no bojo do Inquérito Civil que ora instrui a presente, bem como evidente o receio de dano irreparável ou de difícil reparação, caso realizado o pregão presencial n. 0396/2013, postula o Ministério Público a este d. juízo, na forma do art. 273 do Código de Processo Civil, em sede de antecipação dos efeitos da tutela de mérito relativa ao direito difuso invocado, inaudita altera pars , que determine liminarmente:

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1- a suspensão imediata dos efeitos do Edital de Pregão Presencial n. 0396/2013, vedando-se por consequência a prática de quaisquer atos previstos no referido instrumento editalício, devendo o Município do RJ, ora primeiro réu, ser impedido de qualquer forma, de transferir recursos públicos, direta ou indiretamente, ou mesmo por meio de contratação emergencial para serviços de saúde que deveriam ser custeados pela organização do evento, conforme legislação já referida nos itens 1. 3 e 3 desta, para o evento Jornada Mundial da Juventude 2013; 2- Caso o pedido acima não seja acolhido, alternativamente, sejam as empresas rés impedidas de participar do aludido certame, na medida em que, tendo acesso a informações privilegiadas ao tempo da sua elaboração, impediram sobre o certame pairassem os postulados da isonomia e da concorrência livre e em igualdade de condições entre outros possíveis participantes da licitação; 3- seja determinado o imediato bloqueio da verba orçamentária de R$ 7.840.636,54 (sete milhões oitocentos e quarenta mil seiscentos e trinta e seis reais e cinquenta e quatro centavos), antes destinada a efetivação do Edital de Pregão Presencial n. 396/2013, para fins de destinação futura a programas de saúde constantes dos instrumentos de gestão da saúde – Plano Municipal de Saúde 2014/2017 e Programação Anual de Saúde – PAS 2014/2017; 4- seja determinada ao Instituto JMJ - Rio, imediatamente, a obrigação de fazer consistente na manutenção de toda a programação de atenção à saúde preexistente ao tempo do lançamento do Edital de Pregão acima mencionado, seja mantendo-se as contratações já existentes ou celebrando novos contratos, também de natureza privada, que garantam, no mínimo, os serviços já programados pela organização do evento, nos exatos termos do que preconizam a Resolução CREMERJ n. 187/2003 e Resolução SESDEC n. 80, de 18 de julho de 2007, sob pena de cancelamento total ou parcial dos eventos que integram a Programação da JMJ Rio 2013; 5- em virtude da premência do tempo, em deferidos os pedidos acima, seja determinada a expedição de ofício aos requeridos, por fax, 60


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com a devida comunicação e ordem para que tomem as providências cabíveis no sentido de fazer cumprir a decisão judicial, apresentando em juízo, no prazo máximo de 48h a contar da ciência da decisão, a comprovação do seu imediato cumprimento, sob pena de multa diária no valor de R$ 50.000,00 para cada réu, a ser revertida para o Fundo Municipal de Saúde para fins de aplicação em serviços de saúde; 6- sejam expedidos ofícios aos órgãos de Vigilância Sanitária Municipal e Estadual, ao CREMERJ e ao 1º GSE do Corpo de Bombeiros, comunicando a existência da presente ação judicial e o deferimento da liminar (enviando cópia da mesma), solicitando: i) que informem a este d. Juízo, no prazo máximo de cinco dias antes do início da Jornada Mundial da Juventude, se há condições técnicas na área da saúde para a realização da Jornada Mundial da Juventude; ii) para que promovam aos atos de fiscalização e controle respectivo, verificando, inclusive, o cumprimento integral pelos réus da tutela de urgência deferida; 5 - DOS PEDIDOS: Requer ainda o Ministério Público: 1.1.

O recebimento da presente e a citação dos réus, para que contestem a ação no prazo legal, sob pena de suportar os efeitos da revelia;

1.2.

Sejam os autos do Inquérito Civil nº 201300479152, no original, recebidos como parte integrante da exordial;

1.3.

Seja, ao final, julgado procedente o pedido para tornar definitivos os comandos e obrigações descritas no requerimento de tutela de urgência formulado acima, sob pena de multa diária de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) pelo descumprimento de cada item, incidente após a publicação da sentença condenatória, condenando-se, ainda, os demais réus e eventuais beneficiários deste ato ao ressarcimento dos prejuízos decorrentes dos atos ilícitos apontados na presente ação; 61


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1.4.

Seja, o Município do Rio de Janeiro, ao final, também condenado à obrigação de fazer consistente no remanejamento da verba orçamentária no montante de R$ 7.840.636,54 (sete milhões oitocentos e quarenta mil seiscentos e trinta e seis reais e cinquenta e quatro centavos), antes destinada à efetivação do Edital de Pregão Presencial n. 396/2013, para os programas de saúde constantes dos instrumentos de gestão do SUS – Sistema Único de Saúde, a saber, Plano Municipal de Saúde 2014/2017 e Programação Anual de Saúde – PAS 2014/2017, devendo a escolha do programa ser feita pelo gestor, mediante consulta prévia ao Conselho Municipal de Saúde;

1.5.

A condenação dos réus no ônus da sucumbência, fixados em 20% (vinte por cento) do valor da causa, os quais deverão ser revertidos para o Fundo Especial do MP/ Centro de Estudos Jurídicos do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, nos termos da Lei Estadual n. 2.819/97, regulamentada pela Resolução GPGJ n. 801/98;

1.6.

seja a verba sucumbencial destinada ao Fundo Especial do Ministério Público, regulamentado pela Lei Estadual n.º 2819/97 e pela Resolução GPGJ n.º 801/98.

Protesta por todas as provas admitidas em direito, especialmente, as provas documental, testemunhal, além de pericial e outras que se mostrarem necessárias no curso do processo. Para fins de admissibilidade formal de eventuais recursos futuros, requer desde logo a apreciação direta e específica das questões suscitadas na presente inicial quando da decisão final do processo. Esclarecem a 2ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva da Saúde da Capital e a 2ª Promotoria de Tutela Coletiva da Cidadania da Capital, que receberão intimações na Av. Nilo Peçanha, 26, 10º andar e 4º andar (respectivamente) Centro, Rio de Janeiro. Tratando-se de valor inestimável, em face à natureza do bem juridicamente tutelado, atribui-se à ação o valor de R$ 8.000.000,00 (oito milhões de reais) para fins processuais. 62


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Rio de Janeiro, 08 de julho de 2013.

MADALENA JUNQUEIRA AYRES Promotora de Justiça

ALEXANDRA PAIVA D’ AVILA MELO Promotora de Justiça

CARLA CARRUBBA Promotora de Justiça

PATRICIA S. TAVARES Promotora de Justiça

DENISE DA SILVA VIDAL Promotora de Justiça

BRUNO SANTOS GUIMARÃES Promotora de Justiça

SILVIO FERREIRA DE CARVALHO NETO Promotor de Justiça

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