Seguranca, trafico e milicias no Rio do Janeiro

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Segurança, tráfico e milícias no Rio de Janeiro

das milícias com maior tradição e um modelo para várias outras da região. Mas, provavelmente, esse modelo só é sustentável e de alta rentabilidade em comunidades de intensa atividade comercial ou de rápido crescimento territorial e demográfico, que é justamente o caso do Rio das Pedras. “o policial vê isso, o bandido arrumando isso tudo, porque ele fica...o que acontece, eu vou combater o tráfico, vou tirar o tráfico, vou ficar e vou cobrar a mesma coisa e vou arrumar dinheiro.Então foi por isso que foi crescendo, cresceu, porque Rio das Pedras eles arrumam um dinheirão. Então aquilo todos os policiais ficam sabendo, a maioria é por quê? Porque sabe que a milícia cresceu no Rio das Pedras. Dali que foi espalhando pelas outras comunidades. Porque lá eles arrumam sessenta, setenta mil por semana. Tu já pensou? Um dinheiro...” (Entrevistado n. 1, liderança de organização de comunidades) Além do pagamento de taxas digamos ‘regularizadas’ para as transações imobiliárias, a falta de controle formal permite também que em alguns casos sejam cometidas arbitrariedades ainda mais escandalosas na regulação do espaço urbano, como a apropriação direta de imóveis por parte dos milicianos. “í, ela falou: ah, minha filha, vou lhe falar uma coisa. Você não sabe o que eles fizeram comigo. Eu só tinha meu marido, meu marido morreu. Só está eu. Não tenho mais filhos aqui. Parece que tinha dois filhos, parece que um tinha sido morto, que também era traficante, e o outro estava preso. E a casa dela, era uma casa grande. Sabe o que eles fizeram? Fecharam a casa da idosa, está acontecendo isso também e não tem saído no jornal, não esta em nenhum lugar, eles foram, se apropriam da casa. Isso me deixou... primeira vez que ouvi isso, alguém me contou, mas eu não estava lembrada; aconteceu assim, você fez coisa errada, você menina errada vai embora. Agora, está outro fenômeno. Se você mora sozinha e tem casarão, para que você precisa disso? Vou te deixar num cômodo e o resto é meu.” (Entrevistado n. 11, Ana Gonzaga, Campo Grande) A cobrança de taxas aos moradores pode ser interpretada como uma tentativa de manter os lucros quando a atividade comercial na comunidade é pequena, ou a própria comunidade é de tamanho reduzido.

O prego final no caixão do mito da milícia como uma cruzada de libertação do narcotráfico acontece quando comprovamos que, em alguns casos, a própria milícia controla o tráfico de drogas de forma mais ou menos indireta, como uma forma de aumentar sua renda. Se na maioria dos casos, os entrevistados afirmaram que a venda de drogas na comunidade está estritamente proibida, sob pena de morte, há no entanto alguns casos em que ela é tolerada ou até controlada pela milícia local. Neste sentido, os testemunhos das entrevistas coincidem com o revelado pelos registros do Disque-Denúncia. “Ah, sobre o tráfico de drogas tem, você não pode ser praticante lá, você não pode vender, você não pode fumar, você não pode cheirar, não pode fazer nada disso. E eu acho isso bom.” (Entrevistado n.16, Favela do Barbante, Campo Grande) “Mas teve um assassinato de um rapaz que era motorista do tráfico e continuou lá. Ele achava que não ia acontecer nada com ele porque ele não andava com os caras, ele dirigia só. E os caras mataram o garoto, mataram o menino. Mas as mortes depois que aconteceram foi na guerra deles lá. Morreram pessoas do lado deles, pessoas do lado do tráfico. Mas não assim moradores, eles matarem moradores porque o pessoal desrespeitou porque o pessoal segue à risca, não adianta. Se tiver alguma coisa, se falar “Não, não pode isso.”, o pessoal segue aquilo. Quem não quer seguir sai. Mas quem fica segue e sabe que não é brincadeira, como com o traficante.”(Entrevistado n. 34, Kelson, Penha) Entrevistador: "E o que aconteceu com esses soldados que estavam na quadrilha do tráfico de drogas?" "Se alinharam ao ...[...] Houve só uma substituição de comandos" Entrevistador: "E a venda de drogas foi mantida?" "A venda de drogas foi mantida claro. Não pode acabar porque é um comércio, e como comércio é rentável, então é uma disputa de espaço né.”(Entrevistado n. 23, Morro do Agudo, Comendador Soares) “Quando a gente foi morar lá não tinha nada. Mas aí PM entrou; a maioria deles são tudo ex-policiais. Muitos deles são ex-PM. Aí, eles entraram, falaram que iam botar segurança. A gente falou que não queria. Eles falaram que iam botar assim


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