Ação Civil Pública com Antecipação de Tutela

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1 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE RONDÔNIA PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE BURITIS EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA COMARCA DE BURITIS – RO. CAMPO: 2006001060001356

O MINISTÉRIO PÚBLICO DE RONDÔNIA, com base no art. 129, III, e art. 37, caput, da Constituição Federal, propõe a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA c/ pedido de antecipação de tutela

Em face do MUNICÍPIO DE CAMPO NOVO DE RONDÔNIA/RO, pessoa jurídica de direito público interno, representado pelo Excelentíssimo Sr. Prefeito Municipal (Sr. Nilson Coelho Marçal art. 12, II, do CPC), que pode ser localizado na sede da Prefeitura de Campo Novo de Rondônia/RO, pelos motivos de fato e de direito que a seguir passa a expender: Foi instaurado procedimento investigatório preliminar no âmbito do Ministério Público de Rondônia através da Portaria 008/2006 (fl. Rua Theobroma, 1457 – Setor 02 – Buritis/RO - Cep: 78.967-800 Fone: (69) 3238-2979- www.mp.ro.gov.br / e-mail: buritis@mp.ro.gov.br


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16) visando apurar eventual irregularidade no concurso público 001/2005, da Prefeitura Municipal de Campo Novo de Rondônia/RO. A realização do concurso foi terceirizada à empresa ACK, ASSESSORIA, PLANEJAMENTO E CONSULTORIA LTDA, com sede na rua Zulmira Canavarros, nº 26, Centro, Cuiabá/MT, fone (65) 3025-5630 e 3025-5631. A candidata JARDENE RAMOS ANDRADE (fl. 03) apresentou denúncia por escrito ao Ministério Público (fls. 03/05) dizendo que se sentiu prejudicada ao concorrer a uma vaga para o cargo de fisioterapeuta do município de Campo Novo de Rondônia/RO, no concurso 001/2005 daquele município. A candidata alega que das 50 (cinqüenta) questões objetivas constantes da prova para o referido cargo, vinte delas foram copiadas de um concurso para fisioterapeuta realizado no ano de 2000, no município de Niterói/RJ. JARDENE coloca em dúvida a lisura do certame, tendo em vista que as vinte questões repetidas estavam à disposição de todos no site pciconcursos.com.br muito tempo antes da realização da prova em Campo Novo de Rondônia/RO. Com base nessas informações, o Ministério Público requisitou o caderno de provas do concurso para podermos comparar as questões formuladas na prova de NITERÓI em 2000 e as questões do concurso de Campo Novo de Rondônia/RO em 2005. E de fato constatamos a coincidência de VINTE questões, das cinqüenta aplicadas na prova. Rua Theobroma, 1457 – Setor 02 – Buritis/RO - Cep: 78.967-800 Fone: (69) 3238-2979- www.mp.ro.gov.br / e-mail: buritis@mp.ro.gov.br


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Às fls. 105/112 consta a prova para o cargo de fisioterapeuta do concurso 001/2005 de Campo Novo de Rondônia/RO. Podemos observar que as vinte primeiras questões da prova abordam conhecimentos específicos da área de fisioterapia e o restante, de língua portuguesa e conhecimentos gerais. Ocorre que TODAS as questões de conhecimentos específicos da prova para o cargo de fisioterapeuta foram literalmente copiadas da prova realizada em NITERÓI no ano de 2000. Às fls. 445/451, consta a prova de fisioterapeuta realizada no município de NITERÓI no ano de 2000, com grifo nas questões que foram copiadas. A empresa ACK – ASSESSORIA e PLANEJAMENTO sequer se deu o trabalho de alterar pelo menos a ordem das alternativas das questões, sendo que até mesmo as letras do gabarito são as mesmas do concurso realizado em NITERÓI, conforme se verifica nos documentos de fls. 0321 e 4442. A

situação

não

é

novidade

concursos públicos.

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Gabarito do concurso de Campo Novo de Rondônia/RO.

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Gabarito do concurso de Niterói/RJ. Rua Theobroma, 1457 – Setor 02 – Buritis/RO - Cep: 78.967-800 Fone: (69) 3238-2979- www.mp.ro.gov.br / e-mail: buritis@mp.ro.gov.br

em


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Conforme documentos em anexo, a ASSOCIAÇÃO JUÍZES PARA A DEMOCRACIA apresentou representação ao CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA pugnando pela anulação do concurso para juiz substituto no Estado do Tocantins/TO, tendo como um dos fundamentos, a repetição de várias questões em concursos anteriores, senão vejamos: “A repetição de questões afronta o princípio da isonomia, uma vez que favorece candidatos que eventualmente

tenham participado do outro certame ou que tenham acesso às perguntas do concurso anterior, nos dias de hoje plenamente facilitado por consultas à Internet. A repetição de questões vulnera a regra do sigilo da prova a todos os candidatos, que é indispensável para assegurar a impessoalidade no certame e a igualdade de oportunidade aos participantes. Ademais, faz parte da atribuição da própria banca Examinadora, a “elaboração, aplicação, correção das provas”, nos termos do item 3, do referido Edital, não se podendo conceber como elaboração a montagem da prova com base em outras já realizadas anteriormente. Por todo o exposto, para a preservação da legalidade, da moralidade administrativa e do princípio da isonomia, que deve nortear a realização dos concursos públicos, notadamente o de Rua Theobroma, 1457 – Setor 02 – Buritis/RO - Cep: 78.967-800 Fone: (69) 3238-2979- www.mp.ro.gov.br / e-mail: buritis@mp.ro.gov.br


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ingresso à carreira da Magistratura, é que nos dirigimos a este órgão colegiado, dando conhecimento das aventadas irregularidades, para que sejam sanadas, com a regularização do edital e reinício do certame, com a reabertura do prazo para novas inscrições. São Paulo, 20 de Julho de 2005 Marcelo Semer Presidente do Conselho Executivo da Associação Juízes para a Democracia”. Ora, a empresa ACK foi contratada e paga para realizar as provas do concurso e simplesmente copia inteiramente as questões de um concurso realizado há mais de cinco anos, que inclusive está à disposição de qualquer pessoa num site especializado em concursos. A realização de um concurso dessa forma em nada beneficia o CANDIDATO QUE ESTUDA, mas sim aqueles que tiveram a SORTE de participar do concurso anterior ou que tiveram por acaso a curiosidade de ver a dita prova na internet momentos antes do concurso a ser realizado. Sem falar na altíssima probabilidade de vazamento da informação de que as questões de determinado concurso irão se repetir, beneficiando restrito número de privilegiados que têm acesso a tais informações.

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Desta forma Excelência, a lisura do certame é altamente questionável, não permitindo o ordenamento jurídico que o provimento de cargos no serviço público se convalide diante de tantas irregularidades e suspeitas. Além de ferir o princípio da isonomia, a repetição de questões da forma que foi feita fere também os princípios da impessoalidade e moralidade administrativa, esculpidos no art. 37 da Constituição Federal:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) ............................ II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

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HELY LOPES DE MEIRELLES, baseando-se nas lições de MAURICE HAURIOU, o principal sistematizador da teoria da moralidade administrativa, nos ensina que:

"A moralidade administrativa constitui hoje em dia, pressuposto da validade de todo ato da Administração Pública (Const. Rep., art. 37, caput). Não se trata – diz Hauriou, o sistematizador de tal conceito – da moral comum, mas sim de uma moral jurídica, entendida como "o conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administração". Desenvolvendo a sua doutrina, explica o mesmo autor que o agente administrativo, como ser humano dotado da capacidade de atuar, deve, necessariamente, distinguir o Bem do Mal, o honesto do desonesto. E, ao atuar, não poderá desprezar o elemento ético de sua conduta. Assim, não terá que decidir somente entre o legal e o ilegal, o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno, mas também entre o honesto e o desonesto. Por considerações de direito e de moral, o ato administrativo não terá que obedecer somente à lei jurídica, mas também à lei ética da própria instituição, porque nem tudo que é legal é honesto, conforme já proclamavam os romanos – non omne quod licet honestum est. A moral comum, remata Hauriou, é imposta ao homem para sua conduta externa; a moral administrativa é imposta ao agente público para a sua conduta interna, segundo as exigências da instituição a que serve, e a finalidade de sua ação: o bem comum. .............................. O certo é que a moralidade do ato administrativo, juntamente com a sua legalidade e finalidade, constituem Rua Theobroma, 1457 – Setor 02 – Buritis/RO - Cep: 78.967-800 Fone: (69) 3238-2979- www.mp.ro.gov.br / e-mail: buritis@mp.ro.gov.br


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pressupostos de validade, sem os quais toda atividade pública será ilegítima."3 Quem garante que numa prova de 50 questões, sendo que 40% delas foram literalmente copiadas de outro concurso cuja prova estava explícita na internet, não houve beneficiamento de determinados candidatos que pudessem ter acesso a esta informação?

E mesmo que ninguém tivesse tido acesso a informação de que as questões iriam ser copiadas, não é justo nem moralmente correto que uma empresa que foi paga para realizar um concurso (e isso pressupõe a edição das questões), simplesmente copie as questões de outro concurso para evitar trabalho e beneficiar, induvidosamente, aquele candidato que teve a sorte de ler anteriormente a prova já aplicada por meio da internet.

No mínimo houve grave descumprimento do edital do concurso em tela, vez que a empresa ACK assumiu o compromisso de executar o concurso no lugar do município. (fl. 456).

Mas poderá ainda surgir o argumento de que a prova estava à disposição de todos na internet, o que colocaria, em tese, todos 3

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 15 ed., São Paulo:Revista dos Tribunais, 1990, p. 79-80. Rua Theobroma, 1457 – Setor 02 – Buritis/RO - Cep: 78.967-800 Fone: (69) 3238-2979- www.mp.ro.gov.br / e-mail: buritis@mp.ro.gov.br


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os candidatos no mesmo nível de igualdade. Ainda assim o argumento pecaria pela falsa premissa de que todos possuem acesso à rede mundial de computadores (internet). E o candidato que não tiver acesso a internet, seja por questões financeiras ou alguma deficiência visual, terá tido ele iguais condições de concorrência? Evidente que não.

É sabido também por este órgão ministerial que é comum a repetição em concursos e vestibulares de questões já aplicadas outrora em diverso certame. Mas o aceitável e o que comumente ocorre é a repetição de uma ou outra questão, e não de 40% de uma prova. No caso em tela foram TODAS as questões da prova de conhecimentos específicos! Desta forma, entende o Ministério Público que a administração pública municipal de Campo Novo de Rondônia/RO não agiu de forma escorreita e com observância ao princípio da moralidade administrativa e igualdade nos concurso públicos.

DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA

O Ministério Público entende que é possível a antecipação dos efeitos da tutela pretendida visto que:

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1. É patente a verossimilhança das alegações (as provas são pré-constituídas), posto que basta uma simples análise e comparação das duas provas mencionadas (a de NITERÓI e a de CAMPO NOVO/RO) para verificarmos a imoralidade e, consequentemente, a invalidade do concurso;

2. A induvidosa dificuldade de reparação do dano existente caso a nulidade do concurso seja declarada só ao final da ação, que certamente demorará muito devido ao grande número de processos desta comarca. Os servidores que tenham sido aprovados para o cargo de fisioterapeuta continuarão a exercer a função de forma irregular por tempo indeterminado, até o término do processo; a continuidade da situação gerará custos indevidos ao município, que estará remunerando servidores que foram aprovados num concurso irregular, bem como atrasará sobremaneira a realização de outro concurso, única forma de regularizar-se a situação.

Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e: (Redação dada pela Lei nº 8.952, de 1994) I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil Rua Theobroma, 1457 – Setor 02 – Buritis/RO - Cep: 78.967-800 Fone: (69) 3238-2979- www.mp.ro.gov.br / e-mail: buritis@mp.ro.gov.br


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reparação; ou (Incluído pela Lei nº 8.952, de 1994) ... DO PEDIDO Isto posto, o Ministério Público requer: 1.A antecipação dos efeitos da tutela de mérito que ao final será concedida, nos termos do art. 273, I, do Código de Processo Civil, declarando-se a nulidade parcial do concurso público 001/2005, do município de Campo Novo de Rondônia/RO, em relação aos cargos de fisioterapeuta; 2.a citação do município de Campo Novo de Rondônia/RO para contestar a ação no prazo legal; 3.seja o município de Campo Novo de Rondônia/RO intimado a apresentar a lista dos candidatos aprovados para o cargo de fisioterapeuta no concurso 001/2005, bem como o endereço dos mesmos (art. 355 do C.P.C); após a vinda de tais informações, que sejam os candidatos aprovados intimados da presente ação, para nela exercerem seu direito de contraditório e ampla defesa, caso queiram, vez que poderão ser atingidos pela eventual decisão judicial que anular o concurso; 4. Seja a empresa realizadora do concurso (ACK Consultoria), intimada da presente ação para que dela tome ciência e requeira o que entender de direito; 5.a

procedência, no mérito, da presente ação, declarando-se a nulidade parcial do concurso público 001/2005, do município de Campo Novo de Rondônia/RO, em relação aos cargos de fisioterapeuta; seja declarada também a nulidade dos atos jurídicos daí decorrentes, como a Rua Theobroma, 1457 – Setor 02 – Buritis/RO - Cep: 78.967-800 Fone: (69) 3238-2979- www.mp.ro.gov.br / e-mail: buritis@mp.ro.gov.br


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nomeação e posse dos candidatos aprovados para o cargo de fisioterapeuta. de prova documental.

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6.A produção de todos os meios direito admitidos, mormente

Dá-se à presente causa o valor de R$ 1.000,00 (mil reais).

Buritis/RO, 14 de março de 2007.

JEFFERSON MARQUES COSTA Promotor de Justiça

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