O LÚDICO NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DO ENSINO FUNDAMENTAL EEDUCAÇÃO INFANTIL

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O LÚDICO NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DO ENSINO FUNDAMENTAL E EDUCAÇÃO INFANTIL Maria Cristina Trois Dorneles Rau – IEPPEP Joana Paulin Romanowski- PUCPR Pura Lúcia Oliver Martins - PUCPR Resumo Com o objetivo de analisar as concepções e práticas sobre o lúdico como recurso metodológico entre educadores que atuam na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental, tendo em vista contribuir para os cursos de formação inicial de professores desses níveis de ensino, o presente estudo em andamento, toma como objeto de estudo o lúdico na prática pedagógica do professor de Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental suas concepções e práticas. Desenvolve-se numa abordagem qualitativa de pesquisa, modalidade pesquisa-ensino, com professores em cursos de formação continuada Pós-graduação “lato-sensu” em Psicopedagogia. Apóia-se nos estudos de Tizuko Morshida Kishimoto. Análises preliminares do estudo realizado mostram que criar um espaço de formação nos currículos de formação docente que aborde o lúdico como práxis educativa escolar pode ser uma alternativa através do qual o educador possa conhecer a realidade do seu grupo de crianças, seus interesses e necessidades, comportamento, conflitos e dificuldades, e que, paralelamente constitua um meio de estimular o desenvolvimento cognitivo, social, lingüístico e cultural e propiciar aprendizagens específicas. Palavras-chave: Formação de professores, lúdico, prática pedagógica.


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O LÚDICO NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DO ENSINO FUNDAMENTAL E EDUCAÇÃO INFANTIL Maria Cristina Trois Dorneles Rau – IEPPEP Joana Paulin Romanowski- PUCPR Pura Lúcia Oliver Martins - PUCPR Este trabalho é parte dos estudos realizados para a elaboração da dissertação de mestrado em Educação. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica exploratória sobre as concepções e práticas da utilização do lúdico como recurso pedagógico que possuem os professores em Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Tendo como enfoque principal do objeto de estudo de minha pesquisa, “O lúdico na formação do educador”, procurarei buscar algumas abordagens sobre formação docente que possam ser relacionadas com a formação lúdica e sua utilização como recurso metodológico em sala de aula, na tentativa de levar uma reflexão para a prática dos professores. Entre as questões que mobilizam os educadores encontra-se a formação profissional, a organização de projetos pedagógicos que visem a aprendizagem e a discussão da prática pedagógica. O artigo está organizado em duas partes intimamente relacionadas, quais sejam, a formação de professores onde apresento uma reflexão sobre os encontros e desencontros dessa formação e o lúdico na formação do educador discutindo-o como um elo entre formação pessoal e a ação pedagógica na sala de aula. Na parte final apresento reflexões preliminares sobre a necessidade de se abrir um espaço nos currículos de formação docente que aborde o lúdico como práxis educativa escolar. Formação de Professores: encontros e desencontros Desde tempos passados acumulam-se os problemas na formação, em decorrência da pouca clareza do perfil profissional desejado nos cursos de formação propostos. A falta de clareza do perfil profissional reflete-se nos currículos, que tornam os cursos fragmentados e distantes da prática pedagógica. As contradições surgem nos cursos que não consideram a especificidade da educação em relação a um corpo de conhecimentos capaz de perceber as


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especificidades para a educação básica, as práticas adotadas, o que representa desencontros de concepções e de ações. A educação é um processo historicamente construído, o educador possui um papel nesse processo, que é mediar o educando a buscar sua identidade e atuar de forma crítica e reflexiva na sociedade. A formação do educador depende da concepção que cada profissional possui sobre criança, homem, sociedade, educação, escola, conteúdo e currículo. MIACARET (1991, p. 12), aponta para a ligação existente entre o ensino, a formação acadêmica e a formação pedagógica do educador: "A prática na aula deve ser esclarecida pelos princípios teóricos e melhorada pelos resultados da investigação. A teoria pedagógica só pode erguer-se a partir de uma prática conhecida e refletida". A formação acadêmica ao nível universitário está centrada sobre um grupo de disciplinas, o que dificulta, assegurar ao mesmo tempo aberturas sobre outros domínios científicos e participar na formação e no desenvolvimento da personalidade dos alunos. A formação dos educadores é indissociável dos esforços da educação permanente e continuada, não se deve fechar em si mesma, mas tornar-se uma das peças fundamentais de qualquer sistema educativo. A formação pedagógica dos educadores pode propiciar a prática de diferentes métodos pedagógicos que permitam estabelecer a comunicação educativa e otimizar essa comunicação. A história proporcionou-nos métodos adaptáveis a diferentes situações e coloca a disposição novos processos e novas tecnologias que modificaram as relações pedagógicas entre professores e alunos e também entre alunos e o seu meio. Portanto, a formação pedagógica do educador não se restringe ao estudo limitado de alguns processos práticos. O educador ao conhecer as razões da utilização de diferentes metodologias refletidas junto à formação acadêmica, busca o conhecimento do que faz, porque o faz, domínio dos instrumentos pedagógicos para adaptá-los melhor às exigências das novas situações educativas.


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A validade do método utilizado pelo professor ocorre na medida em que este esteja preparado para compreender e utilizar o instrumento que lhe é apresentado por razões explícitas, em função dos objetos que se fixou. Segundo GIMENO (apud TARDIF, 1990) existem limitações sociais, culturais e ideológicas e os Cursos de Formação de Professores, historicamente seguem a paradigmas. Estes paradigmas estão sempre sendo transformados de acordo com as necessidades sociais. A formação de professores trabalha com aspectos culturais, pois o sujeito ao desejar ser professor assume posições epistemológicas e culturais. Partem de alguns pressupostos determinantes de sua formação e atuação, como os saberes que perpassam pelo saber acadêmico e o saber pedagógico, que por sua vez será significativo no processo ensino aprendizagem. Um destes saberes é o que trata da relação professor aluno, permeado pelos conteúdos acadêmicos, que embora sejam trabalhados de forma sistemática exigirão do professor diferentes tipos de conhecimentos, entre eles a subjetividade existente nas relações sociais. Tal questão refere-se a problemática da formação do educador e resulta em dificuldades no campo da prática pedagógica. Ocorre assim, “a necessidade de currículos consistentes e em permanente ampliação, aperfeiçoamento nos modelos de desenvolvimento profissional e pessoal evolutivo e continuado, indagação reflexiva da conduta docente, interagindo com os limites didáticos“. (ibid.) Segundo SCHULMAN (1986 apud TARDIF, 1990) o conhecimento do conteúdo pedagógico compreende as formas mais úteis de representação das idéias, as analogias mais importantes, as ilustrações, exemplos, explicações, a forma de representar a matéria para torná-la compreensível. Nesse contexto, tem-se na reflexão um objetivo para a Formação de Professores. GARCIA (1990) aponta a utilização de vários termos que definem este tipo de professor. Sua origem remonta a DEWEY (1933), que aborda a necessidade de formar professores que reflitam a sua prática, na perspectiva de que a reflexão será um instrumento de desenvolvimento do pensamento e da ação. SCHÖN (1983), propôs o conceito de reflexão na ação, definindo-o como o processo em que os professores aprendem a partir da análise e interpretação de sua própria atividade. A formação profissional necessita de harmonia entre conhecimentos pedagógicos e conteúdos que levem à apreensão dos conhecimentos do mundo.


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Porém, o que se percebe é a existência de cursos de formação teóricos com ausência da prática reflexiva e de um perfil profissional que não considera como pesquisador da prática pedagógica. Assim, não basta inserir a prática reflexiva para garantir um perfil profissional de professor pesquisador. Outra questão relevante na formação dos professores trata dos saberes docentes. Tanto a formação acadêmica quanto à formação pedagógica exige a iniciação a um subconjunto do saber e o desenvolvimento de uma cultura geral. Questiona-se

então,

se

existem

diferentes

tipos

de

conhecimentos

pedagógicos que o professor possa adquirir? O que sabem os professores sobre os conteúdos que ensinam, onde e quando adquiriram, como fazem a transformação desses conteúdos na sua formação? TARDIF (2002), trata dos saberes profissionais dos professores e conhecimentos universitários apontando um paradoxo entre a profissionalização dos professores e a crise atual no profissionalismo. Sobre a profissionalização dos professores, destaca a necessidade de renovar os fundamentos epistemológicos do ofício do professor, através da epistemologia da prática profissional e seu movimento de profissionalização. O autor aborda que a natureza dos conhecimentos conduz ao conhecimento especializado e formalizado que ocorre através do estudo fragmentado em disciplinas científicas e ciências (naturais e aplicadas, sociais e humanas e da educação). Faz-se necessário, então, buscar a autonomia dos conhecimentos técnicos e subjetivos que exijam “do profissional reflexão para que não só conheça o problema, mas também esclareça e organize os objetivos almejados e os meios a serem utilizados para atingi-los”. É o que SCHÖN (apud TARDIF, 2002), “chama de construção do problema em oposição à resolução instrumental do problema que seria baseada na aplicação de teorias e técnicas prévias”. Os

conhecimentos

profissionais

são

evolutivos

e

progressivos.

A

profissionalização do professor ocorre ao se inserir no ensino e na formação de professores a renovação dos fundamentos epistemológicos do ofício de professor e de educador.


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Segundo SANTOS (1997, p. 12): Os cursos de licenciaturas têm recebido inúmeras críticas, especialmente no que se refere à sua ineficiência quanto à formação dos profissionais em educação. É, hoje, questão de consenso que os egressos dos cursos de graduação

não

estão

suficientemente

preparados

para

atender

as

necessidades das escolas, principalmente no que se refere à compreensão da criança como ser histórico-social, capaz de construir seu próprio conhecimento. (ibid.) É preciso buscar um novo paradigma na formação docente, rompendo com modelos antigos de forma a abandonar a segmentação dos conhecimentos que acontece através da fragmentação das disciplinas. Despir a formação docente da hierarquia entre disciplinas científicas e pedagógicas. O conhecimento profissional possui dimensões éticas inerentes à prática profissional por atuar com seres humanos. TARDIF (2002), aponta a crise do profissionalismo ao colocar que a subjetividade do profissional está sendo mais percebida hoje conforme o “modelo de uma racionalidade limitada, improvisada, na qual o professor reflexivo, a improvisação, a indeterminação, a criatividade, a intuição, o senso comum desempenham um grande papel na rotina profissional”. Há um período de transformação entre os saberes profissionais que os professores trazem de seus modelos e o que lhes são colocados atualmente.

“A ausência de referências comuns gerou divisão e confusão entre os profissionais e multiplicou os problemas de comunicação entre os adeptos de diferentes correntes de pensamento, o que dá agora a impressão de que muitas profissões não dispõem de um repertório de saberes estável, codificado, consensual e portador de imputabilidade”. (ibid.).

É preciso que se examine a natureza dos fundamentos, possibilitando um processo crítico e reflexivo sobre a relação do enfoque da prática nos cursos de formação de professores. “A epistemologia da prática profissional é o estudo do conjunto dos saberes utilizados pelos professores em seu espaço profissional cotidiano para desempenhar todas as suas tarefas.”(ibid.)


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Entende-se por saber, o saber fazer e saber ser. É necessário revelar os saberes, compreender como são integrados concretamente nas tarefas dos profissionais e como os incorporam, produzem, utilizam, aplicam e transformam em função dos limites e dos recursos inerentes no processo do trabalho docente em relação à identidade profissional dos professores. “O trabalho não é primeiro um objeto que se olha, mas uma atividade que se faz, e é realizando-a que os saberes são mobilizados e são construídos” . (ibid.) Assim, o autor considera que não se pode confundir os saberes profissionais com os conhecimentos adquiridos na formação universitária, pois a prática universitária é um espaço de aplicação das hipóteses, sem relação com a realidade do trabalho docente. Os saberes dos professores possuem habilidades além das cognitivas, pois possui sua história de vida, emoções, um corpo, poderes, personalidade, culturas e seus pensamentos são arraigados de significados dos diferentes contextos aos quais são inseridos. “Nas profissões de interação humana como o magistério, a personalidade do trabalhador é absorvida no processo de trabalho e constitui, até certo ponto, a principal mediação da interação”. (TARDIF e LESSARD apud TARDIF, 2002). As atividades docentes exigem conhecimentos além dos que a tecnologia possa satisfazer, por serem nesse contexto insuficientes em situações de controle humano. Nesse sentido, entende-se a função dos educadores como fundamental dentro do processo ensino-aprendizagem dos alunos, e que deve ser o de tomar como ponto de partida a concepção de ensino que a sociedade tem produzido historicamente, levando os alunos à apreensão deste conhecimento ao se situarem na contemporaneidade e dialogar com o passado, instrumentalizando-os para que estes tenham condições para reelaborar o saber e intervir criticamente na sociedade. TARDIF (2002), aborda que os profissionais da educação se utilizam o tempo todo de recursos e capacidades pessoais para atuar no seu ambiente de trabalho. Os saberes dos professores devem agir de forma contextualizada provocando a compreensão do trabalho coletivo. Segundo NÓVOA (1992), houve uma grande revolução na formação dos professores nos últimos anos, porém ainda não é suficiente. O autor aborda que há uma grande dificuldade em colocar em prática, concepções e modelos inovadores.


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“A preocupação com a pessoa do professor é central na reflexão educacional e pedagógica. A formação depende de cada um, e mais importante do que formar é formar-se; que todo o conhecimento é auto-conhecimento e que toda a formação é auto-formação”. (ibid.) A partir da abordagem teórica sobre a formação dos professores apresento um enfoque pessoal como eixo para a formação docente, abordando o lúdico como um elo necessário ao contexto dessa formação. A abordagem atual sobre os jogos infantis proporciona à educadores e pesquisadores da educação o incentivo de sua prática pedagógica como recurso para a aprendizagem e o desenvolvimento infantil. “O jogo é um instrumento pedagógico muito significativo. No contexto cultural e biológico é uma atividade livre, alegre que engloba uma significação. É de grande valor social, oferecendo inúmeras possibilidades educacionais, pois favorece o desenvolvimento corporal, estimula a vida psíquica e a inteligência, contribui para a adaptação ao grupo, preparando a criança para viver em sociedade, participando e questionando os pressupostos das relações sociais tais como estão postos”. (KISHIMOTO, 2000).

A autora aborda também que o lúdico é um instrumento de desenvolvimento da linguagem e do imaginário, vinculado nos tempos atuais, como um meio de expressão de qualidades espontâneas ou naturais da criança, como recriação, momento adequado para observar a criança, que expressa através dele sua natureza psicológica e inclinações. Tal concepção mantém o jogo à margem da atividade educativa, mas sublinha sua espontaneidade.

O Lúdico na Formação do Educador: Um elo entre formação pessoal e a ação pedagógica na sala de aula. “Se desejamos formar seres criativos, críticos e aptos para tomar decisões, um dos requisitos é o enriquecimento do cotidiano infantil com a inserção de contos, lendas, brinquedos e brincadeiras.“ (KISHIMOTO, 2003). Para NEGRINI (apud SANTOS, 1997, p. 13) a formação do educador deveria contemplar três pilares que fariam a sustentação da formação profissional: a formação acadêmica, a formação pedagógica e a formação pessoal, que tem como sugestão que seja feita através da formação lúdica.


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SANTOS (1997), aponta que a formação lúdica valoriza a criatividade, o cultivo da sensibilidade e a busca da afetividade. Quanto mais o adulto vivenciar sua ludicidade, maior será a probabilidade de trabalhar com a criança de forma prazerosa. O adulto que vivencia atividades lúdicas convive, revive e resgata com prazer à alegria do brincar, potencializando a transposição dessa experiência para o campo da educação através do jogo. Segundo SANTOS (1997, p. 11) educar é ir além da transmissão de informações ou de colocar à disposição do educando apenas um caminho, limitando a escolha ao seu próprio conhecimento. É ajudar a pessoa a tomar consciência de si mesma, dos outros e da sociedade, oferecendo ferramentas para que o outro possa escolher entre muitos caminhos, aquele que for compatível com seus valores, sua visão de mundo e com as circunstâncias adversas que cada um irá encontrar. O educador ao conhecer as razões da utilização de diferentes metodologias refletidas junto à formação acadêmica, busca o conhecimento do que faz, porque o faz, domínio dos instrumentos pedagógicos para adaptá-los melhor às exigências das novas situações educativas. A validade do método utilizado pelo professor ocorre na medida em que este esteja preparado para compreender e utilizar o instrumento que lhe é apresentado por razões explícitas, em função dos objetos que se fixou. Em “O Perigo da Invenção de Jogos” ANTUNES (2003), descreve a história de um professor que em descanso em sua chácara no final de semana vivencia uma crise de gota e é estimulado a procurar o curandeiro local, que utiliza ervas para o tratamento. Uma vez refletindo criticamente, deduz que deve crer no conhecimento produzido pela ciência através da medicina a qual possui uma base científica sistematizada. O autor aponta que o professor que inventa jogos está para a educação, como o benzedor está para a medicina. Ao abordar o lúdico na formação do educador SANTOS (1997, p.12), aponta que "a ludicidade é uma necessidade do ser humano em qualquer idade e não pode ser vista apenas como diversão". Ao desenvolver conteúdos que abordam o lúdico como uma proposta metodológica junto a educadores, sempre ocorrem reflexões acerca das possibilidades de intervenção e de ensino. Tais reflexões evocam sentimentos,


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posicionamentos que partem de suas relações mais intrínsecas no que diz respeito à relação educador e educando, adulto e criança. BOMTEMPO (1996, p. 64), no livro Jogo, Brinquedo e Brincadeira de KISHIMOTO, citando VYGOTSKY (1984, p.176), afirma que o brincar tem sua origem na situação imaginária criada pela criança, em que desejos irrealizáveis podem ser realizados, com a função de reduzir a tensão e ao mesmo tempo, constituir uma maneira de acomodação a conflitos e frustrações da vida real. Brincar leva a criança a tornar-se mais flexível e buscar alternativas de ação. Enquanto brinca, a criança concentra sua atenção na atividade em si e não em seus resultados e efeitos. Permitir brincar às crianças é uma tarefa essencial do educador. VYGOTSKY (1984, p. 64), defende que necessidades, incentivos e motivos da criança devem ser levados em conta pelos teóricos do jogo. Para ele, o jogo "é essencialmente desejo satisfeito", originado dos "desejos insatisfeitos" da criança que se tornam afetos generalizados. Ele define como característica do jogo, o fato de que nele, uma situação imaginária é criada pela criança. O brincar da criança é a imaginação em ação. O jogo é o nível mais alto do desenvolvimento no pré-escolar e é através dele que a criança move-se cedo, além do comportamento habitual na sua idade. A Zona de Desenvolvimento Proximal é um conceito para explicar o que uma criança é capaz de fazer com o auxílio de pessoas mais experientes. (ibid., p.112) Com esse método pode-se avaliar o processo de desenvolvimento até o presente momento e os processos de maturação já produzidos, assim como os processos que estão em amadurecimento e se desenvolvimento. O jogo é fundamental para o desenvolvimento cognitivo, pois ao representar situações imaginárias, a criança tem a possibilidade de desenvolver o pensamento abstrato. Isso acontece porque novos relacionamentos são criados no jogo entre significados e objetos e ações. É importante ver na atividade lúdica da criança o tipo de atividade criadora necessária para a expressão da personalidade e a evolução da imagem do corpo. Através da prática pedagógica do jogo o professor pode conhecer as expressões da personalidade do educando, porque nele a criança se liberta de situações difíceis, as coisas e ações não são o que aparentam ser. SANTOS (1997), aponta que apesar de inúmeras pesquisas e reflexões teóricas a respeito do processo educacional e a formação de educadores, ainda não


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existem disciplinas que contemplem especificamente a subjetividade nos cursos de formação superior na área da educação. O desenvolvimento de conteúdos que abordem o lúdico como uma proposta metodológica junto a estes educadores e sua relação acerca das possibilidades de intervenção e de ensino, poderia vir a ser uma proposta inovadora no processo de transformação entre os saberes profissionais que os professores trazem de seus modelos e os que lhes são colocados atualmente. KISHIMOTO (2000) em seu artigo intitulado “Escolarização e Brincadeira na Educação Infantil”, faz uma crítica à tentativa de adoção do brincar livre nas instituições, enfocando que não ocorre verdadeiramente porque tais instituições não possuem objetos culturais para implementação de espaços adequados, não ocorre o valor cultural que deve ser dado aos brinquedos, a existência de saberes escolares que excluem elementos da cultura do país e a pouca interação criança-criança e criança e adulto através da brincadeira. “Grandes espaços internos e externos, como salões, salas e corredores sempre vazios, são utilizados para as ditas brincadeiras livres, que pela ausência de objetos ou cantos estimuladores, favorecem correrias, empurrões. Alguns exemplares de brinquedos, geralmente doados, por sua quantidade natureza, impedem a elaboração de qualquer temática de brincadeira, regra que prevalece nas instituições”. (ibid.) A concepção de brincar como forma de desenvolver a autonomia das crianças requer um uso livre de brinquedos e materiais que permita a expressão dos projetos criados pelas crianças. A autora enfatiza também, sobre o lugar dos brinquedos no imaginário dos professores,

como

objetos

culturais

carregados

de

valores

considerados

inadequados e que este tipo de atitudes demonstra pré-concepções relacionadas à classe social, ao gênero e à etnia e tenta justificar o brincar nas instituições de Educação Infantil. O jogo para ser utilizado como recurso pedagógico deve ser contextualizado significativamente para o aluno, através da utilização de materiais concretos e sua historicidade. “A produção de objetos não reflete a riqueza do mundo cultural e natural, o imaginário infantil não reflete a riqueza folclórica”. (ibid., p.4). Finalmente, aponta como aspecto ausente das discussões dos educadores a interação criança-criança e criança-adulto por meio da brincadeira. As vivências


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lúdicas, bem como as experiências corporais se utilizam da ação, do pensamento e da linguagem, tendo no jogo sua base fundamental. Parte final A formação lúdica evoca a possibilidade ao futuro educador de conhecer-se, explorar e descobrir suas possibilidades e limitações, desbloquear resistências e ter uma visão clara sobre a importância do jogo e do brinquedo para a vida da criança e por toda a sua vida. Nesse contexto, pensar a formação lúdica como proposta de uma ação docente arraigada de significado para a criança, leva a refletir sobre a atual perspectiva sobre a formação docente, a incentivar a prática do jogo como forma de proporcionar a aprendizagem e o desenvolvimento infantil. Assim, criar um espaço de formação nos currículos de formação docente que aborde o lúdico como práxis educativa escolar pode ser uma alternativa através do qual o educador possa conhecer a realidade seu grupo de crianças, seus interesses e necessidades, comportamento, conflitos e dificuldades, e que, paralelamente constitua um meio de estimular o desenvolvimento cognitivo, social, lingüístico e cultural e propiciar aprendizagens específicas. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 é um marco histórico que possibilita a visão de uma educação igualitária. Para que isto aconteça é necessário abolir o isolamento profissional valorizando os saberes profissionais, buscar um processo de formação inicial que se integre à continuada e melhorar a qualidade da educação no caminho de superação dos desencontros na formação profissional docente. Concluo este estudo com um questionamento: Afinal, o que é necessário para formar o educador? A questão não se esgota aqui, pois apesar das reflexões teóricas a respeito da formação do educador, há muito há ser repensado. Sugiro, assim, que uma das formas de repensar os cursos de formação é introduzir na base de sua estrutura curricular a formação lúdica.


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Referências Bibliográficas ANTUNES, Celso. O jogo e a educação infantil. Petrópolis, RJ: Vozes, 2003. GARCIA, Carlos Marcelo. Os professores e sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992. KISHIMOTO, T. M. Jogo, Brinquedo, brincadeira e a educação. São Paulo: Cortez, 2000. MIACARET, Gaston. A formação de professores. Coimbra: Semeclina, 1991. NÓVOA, Antonio. Os professores e sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992. PIAGET, J. A Formação Do Símbolo Na Criança. Rio De Janeiro: Zahar, 1976. SERBINO, Raquel Volpato. Formação dos professores. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1998. SANTOS. S. Marli P. O Lúdico na Formação do Educador. Petrópolis-RJ: Vozes, 1997. SCHÖN, Donald. Os professores e sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992. TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis, RJ: vozes, 2002. TRIVINOS, Augusto Nibaldo Silva. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 1987. VYGOTSKY, L.S. A Formação Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984.


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