E-Book III Congresso SPESM - Volume II

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A Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental ASPESM

DA INVESTIGAÇÃO À PRÁTICA Atas do III Congresso Internacional da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental

Porto, Dezembro 2012


EDIÇÃO E PROPRIEDADE: SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENFERMAGEM DE SAÚDE MENTAL

Título: DA INVESTIGAÇÃO À PRÁTICA Sub-Título: Atas do III Congresso Internacional da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental

COORDENAÇÃO DA EDIÇÃO: Carlos Alberto da Cruz Sequeira Luís Octávio de Sá

COMISSÃO EDITORIAL: Bruno Miguel Costa Santos Francisco Miguel Correia Sampaio

Divulgação: SPESM Suporte: E-book (formato .pdf) ISBN: 978-989-96144-4-4 Nota: todos os artigos publicados são propriedade da SPESM, pelo que não podem ser reproduzidos para fins comerciais, sem a devida autorização da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental A responsabilidade pela idoneidade e conteúdo dos artigos é única e exclusive dos seus autores.

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ÍNDICE 1. JOGO EDUCATIVO PARA DEPENDÊNCIA QUÍMICA

ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO.

Camila de Castro Teixeira; Zelia Nunes Hupsel; Márcia Aparecida Ferreira de Oliveira

2. PERFORMANCE HUMANA E INFLUÊNCIA DOS ANTIDEPRESSIVOS NAS FUNÇÕES PSICOMOTORAS – UM ESTUDO EXPERIMENTAL ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Helena Jardim; Bruna R. Gouveia

3. VULNERABILIDADE AO STRESS EM FAMILIARES DE PESSOAS EM SITUAÇÃO CRÍTICA MARCADOR NÃO DEFINIDO.

ERRO!

Madalena Cunha; Helena Rosário; Fernando Pina

4. ENFERMEIROS DE CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS PERANTE A DOENÇA MENTAL MARCADOR NÃO DEFINIDO.

ERRO!

Nelson Alexandre Simões de Oliveira; Carolina Miguel Graça Henriques

5. AS HABILIDADES SOCIAIS DO DOENTE MENTAL EM CONTEXTO DE INTERNAMENTO MARCADOR NÃO DEFINIDO.

ERRO!

Carolina Miguel Graça Henriques; Helena da Conceição Borges Pereira Catarino; José Carlos Gomes; Nelson Alexandre Simões Oliveira

6. OS ESTILOS PARENTAIS EDUCATIVOS E ANSIEDADE MANIFESTA NA CRIANÇA ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Carolina Miguel Graça Henriques*; Jacinta de Jesus Ferreira Alho

7. VIVÊNCIAS DO HOMEM INFÉRTIL QUE DESEJA TER FILHOS

ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO.

Carolina Miguel Graça Henriques; João José de Sousa Franco; Paula Maia Ferreira Vicente Amado

8. A QUALIDADE DA SUPERVISÃO NO ENSINO CLÍNICO DE ENFERMAGEM DE SAÚDE MENTAL MARCADOR NÃO DEFINIDO.

ERRO!

Carla Sílvia Fernandes; Bruno Miguel Costa Santos; Raquel Maria Torres; Victor Ferreira Lobo

9. CONTRIBUTO DAS INTERVENÇÕES PSICOEDUCATIVAS NA ADESÃO TERAPÊUTICA DA PESSOA COM INSUFICIÊNCIA CARDÍACA: CONCEÇÃO DE UM PROGRAMA PSICOEDUCATIVO ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Pedro Miguel Custódio

10. ALTERAÇÕES PSICOLÓGICAS E COMPORTAMENTAIS NA DEMÊNCIA DEFINIDO.

ERRO! MARCADOR NÃO

Lia Fernandes

11. VINCULAÇÃO, TEMPERAMENTO AFETIVO E SAÚDE MENTAL

ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO.

Raul Alberto Cordeiro

12. ESTRATÉGIAS COMUNICATIVAS UTILIZADAS PELOS ENFERMEIROS DE CUIDADOS INTENSIVOS ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Liliana Oliveira; Neide Feijó

13. ESTIGMA FACE AO DOENTE MENTAL - LOUCO?! MAS POUCO… ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Ana Margarida Moreira Barbosa; Cátia Sofia da Silva Monteiro; Joana Raquel Fernandes Regufe; Marta Moreira e Sá

14. GESTÃO DO REGIME TERAPÊUTICO DA PESSOA PORTADORA DE ESQUIZOFRENIA: UM PROGRAMA DE INTERVENÇÃO TERAPÊUTICA ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Fernanda Maria dos Santos Antunes Neto; Maria de Fátima dos Santos Rosado Marques


15. O USO DO ÁLCOOL PELAS GESTANTES E AS CONSEQUÊNCIAS SOBRE O FETO NÃO DEFINIDO.

ERRO! MARCADOR

Priscyla Fernanda Santana França; Maria do Carmo Querido Avelar

16. A DEPRESSÃO NOS IDOSOS – UM ESTUDO DE CARACTERIZAÇÃO DE IDOSOS RESIDENTES NA COMUNIDADE ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Bruna R. Gouveia; Helena Jardim

17. ADAPTAÇÃO E VALIDAÇÃO PARA PORTUGUÊS DO QUESTIONÁRIO DE COPENHAGEN BURNOUT INVENTORY (CBI) ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Cesaltino Manuel Silveira da Fonte; Maria dos Anjos Coelho Rodrigues Dixe; José Carlos Rodrigues Gomes

18. “PONTES DE SAÚDE MENTAL”: O IMPACTO DE UMA INTERVENÇÃO EM GRUPO NA SAÚDE MENTAL, SENTIDO INTERNO DE COERÊNCIA E ADESÃO AOS TRATAMENTOS DO DOENTE DEPRESSIVO ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Ana Margarida Varandas Santo; José Carlos Gomes

19. CO-DINÂMICA DO TRATAMENTO PSICOTERAPEUTICO DE PAIS E DE FILHOS ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Luís Barroso

20. OS PAIS COMO PARCEIROS NA EDUCAÇÃO PARA A SEXUALIDADE DEFINIDO.

ERRO! MARCADOR NÃO

Maria Isabel Santos; Júlia Magalhães; Neide Feijó

21. ALTERAÇÕES EMOCIONAIS DA GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA: CONHECER PARA PREVENIR MARCADOR NÃO DEFINIDO.

ERRO!

Júlia Magalhães; Maria Isabel Santos; Neide Feijó

22. PERCEÇÃO DOS PAIS SOBRE A ADAPTAÇÃO DOS IRMÃOS DE CRIANÇAS COM DOENÇA ONCOLÓGICA ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Goreti Filipa Santos Marques; Beatriz Rodrigues Araújo

23. QUALIDADE DE VIDA DO DOENTE COM ESQUIZOFRENIA INSTITUCIONALIZADO ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Filipa João Antunes Costa Lima

24. ANSIEDADE: BOAS PRÁTICAS EM ENFERMAGEM

ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO.

Natália da Conceição Martins Rodrigues Fernandes; Rosângela Sebastiana Augusto de Sousa; Maria da Fé Tavares Carapichoso; Filipe Daniel Viegas Fontes; António José Bastos Martins

25. TÉCNICAS DE RELAXAMENTO: BOAS PRÁTICAS NO SERVIÇO DE MEDICINA INTENSIVA MARCADOR NÃO DEFINIDO.

ERRO!

Natália da Conceição Martins Rodrigues Fernandes

26. RASTREIO E DETEÇÃO DE CASOS EM SAÚDE MENTAL

ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO.

Elza Maria Silva Lemos; Ana Maria Romano; José Manuel Monteiro Dias; Maria Conceição Alves Rainho

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27. O ACOLHIMENTO DOS USUÁRIOS DE SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS NA ATENÇÃO BÁSICA: PERCEPÇÃO DOS ENFERMEIROS ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Letícia Bosso Moreira; Sonia Regina Zerbetto

28. ATITUDES DOS ENFERMEIROS NA PSIQUIATRIA FACE À IMPORTÂNCIA DA FAMÍLIA NOS CUIDADOS DE ENFERMAGEM ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Júlia Martinho; Manuela Martins; José Carlos Carvalho; Ilda Fernandes

29. CONVIVER COM UMA PESSOA COM ESQUIZOFRENIA: REPERCUSSÕES NOS FILHOS E CÔNJUGE ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. José Carlos Carvalho; Paula Pinto Freitas; António Leuschner

30. VERDADES ÚNICAS DE PERCURSOS PARTILHADOS: CONJUGALIDADE E PROBLEMAS LIGADOS AO ÁLCOOL ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Joana Amaral; Zélia Teixeira

31. REIKI E QUALIDADE DE VIDA

ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO.

Marcela Jussara Miwa; Maria Cristina Silva Costa; Nelson Filice de Barros

32. CYBERBULLYING - UMA AMEAÇA SEM ROSTO

ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO.

Bárbara Sofia da Silva Cardoso Fernandes; Lígia Raquel Mendes Pereira Sala; Marina Fernandes Pereira; José Carlos Carvalho

33. PERCEÇÃO DO CONCEITO DE BULLYING NO TRABALHO PELOS ENFERMEIROS NÃO DEFINIDO.

ERRO! MARCADOR

Antónia Teixeira; Teresa Rodrigues Ferreira; Elizabete Borges

34. O EFEITO DE UM PROGRAMA DE EXERCÍCIOS NA MELHORIA DA MOBILIDADE EM DOENTES DE ALZHEIMER ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Fernandes, A.; Carvalho, R

35. ENFRENTANDO UMA EXPERIÊNCIA DIFÍCIL MESMO COM APOIO: A ADOLESCENTE MENOR VIVENCIANDO A MATERNAGEM

426

Paula Rosenberg de Andrade; Regina Issuzu Hirooka de Borba; Conceição Vieira da Silva Ohara; Circéa Amalia Ribeiro

36. O FAMILIAR COMO CUIDADOR DA PESSOA COM DEPRESSÃO

436

Maria de Fátima dos Santos Rosado Marques; Manuel José Lopes

37. A ADESÃO AO PACIENTE ALCOOLISTA AO TRATAMENTO: NO CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL ÁLCOOL E DROGAS LOCALIZADO NO INTERIOR DE SÃO PAULO 444 Cely de Oliveira; Márcia Aparecida Ferreira de Oliveira; Tatiane Fernandes Alves

38. O PAPEL DO ENFERMEIRO NOS CUIDADOS A PACIENTES PORTADORES DE ESQUIZOFRENIA

456

Cely de Oliveira; Márcia Aparecida Ferreira de Oliveira; Tatiane Fernandes Alves

39. PERCEPÇÃO DOS GRADUANDOS DE ENFERMAGEM SOBRE ASSISTÊNCIA AO ADOLESCENTE PORTADOR DO TRANSTORNO BIPOLAR DO HUMOR

467

Cely de Oliveira; Márcia Aparecida Ferreira de Oliveira; Anselmo Amaro dos Santos

40. ABUSO E NEGLIGÊNCIA A PESSOAS IDOSAS: FATORES ASSOCIADOS À INTERVENÇÃO DOS ENFERMEIROS Helena Maria Júdice; Carlos Alberto Sequeira; José Ferreira-Alves

476


41. ESTUDO DE CASO – DEPRESSÃO MAJOR

487

Nelson Alexandre Simões de Oliveira; Catarina Cardoso Tomás

42. MOVIMENTO E RELAXAMENTO: UMA ESTRATÉGIA NO CONTEXTO DA INTERVENÇÃO DE ENFERMAGEM

504

Olga Maria Martins de Sousa Valentim; Maria do Céu Monteiro

43. QUALIDADE DE VIDA EM PESSOAS COM ALCOOLISMO

515

Olga Maria Martins de Sousa Valentim; Célia Samarina Vilaça de Brito Santos; José Pais-Ribeiro

44. CULTURA, STRESS E DOENÇA MENTAL

532

Carlos Manuel Ferreira Monteiro; Liliana Castanheira Rebelo

45. FAMÍLIAS QUE INTEGRAM PESSOAS DEPENDENTES NO AUTOCUIDADO: PERCEÇÃO DA AUTOEFICÁCIA DOS MEMBROS DA FAMÍLIA PRESTADORES DE CUIDADOS

542

Susana Carla Ribeiro de Sousa Regadas; Cândida Assunção Santos Pinto; Abel Avelino de Paiva e Silva

46. IMPACTO DA PSICOEDUCAÇÃO NA ANSIEDADE E PERSPETIVAS FACE Á MORTE EM MÉDICOS E ENFERMEIROS DE CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS 558 Cláudia Cristina de Sousa Mourão

47. A LINGUAGEM CLÍNICA CONVOCADA PELOS ENFERMEIROS: DO PROCESSO DE DIAGNÓSTICO ÀS INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM NUMA UIPIA 574 Ana Margarida Esteves Pereira; Vanessa Sofia Daniel Lages

48. AVALIAÇÃO DO AUTOCONCEITO NUM GRUPO DE ADOLESCENTES PORTUGUESES

584

Catarina Cardoso Tomás; João Paulo Branco Gaspar Dias Balau; Maria dos Anjos Coelho Rodrigues Dixe; José Carlos Rodrigues Gomes

49. LITERACIA EM SAÚDE MENTAL DOS ADOLESCENTES E JOVENS – UMA REVISÃO SISTEMÁTICA DA LITERATURA 597 Tânia Morgado; Lúcia Sousa; Susana Conceição; Luís Loureiro

50. QUALIDADE DE VIDA E BEM-ESTAR DOS IDOSOS

612

Sandra Moreira; Teresa Rodrigues Ferreira; Elizabete Borges

51. QUALIDADE DE VIDA E ESPIRITUALIDADE DE PESSOAS IDOSAS QUE VIVEM SÓS

626

Sandra Moreira; Teresa Rodrigues Ferreira; Elizabete Borges

52. QUALIDADE DE VIDA E SATISFAÇÃO COM A VIDA DOS IDOSOS NA COMUNIDADE

640

Sandra Moreira; Teresa Rodrigues Ferreira; Elizabete Borges

53. ANÁLISE DO PROJETO TERAPÊUTICO INSTITUCIONAL: NÚCLEO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS DE SANTO ANDRÉ 653 Maria Odete Pereira; Isabela Alves Silveira Souza; Márcia Aparecida Ferreira de Oliveira

54. PROMOÇÃO DA SAÚDE MENTAL NOS ADOLESCENTES: RESULTADOS DE UMA ESTRATÉGIA DE INTERVENÇÃO 662 Luísa Campos

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55. FATORES QUE DIFICULTAM A APLICABILIDADE DA POLÍTICA NACIONAL DO MINISTÉRIO DA SAÚDE DO BRASIL PARA A ATENÇÃO INTEGRAL AOS USUÁRIOS DE ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS 669 Maria Odete Pereira; Márcia Aparecida Ferreira de Oliveira; Paula Hayasi Pinho; Heloísa Garcia Claro; Divane de Vargas; Sônia Barros

56. INTENÇÃO DE PROCURA DE AJUDA E AS BARREIRAS PERCEBIDAS NO CONSUMO DE ÁLCOOL

680

Luís Manuel de Jesus Loureiro; Aida Maria de Oliveira Cruz Mendes; José Carlos Pereira dos Santos; Nuno Rafael Neves de Oliveira

57. O ABUSO DE ÁLCOOL E A PROCURA DE AJUDA EM ADOLESCENTES E JOVENS PORTUGUESES

688

Luís Manuel de Jesus Loureiro; Teresa Maria Barroso; Catarina Sofia Sousa; Ana Teresa Martins Pedreiro

58. IMPLEMENTAÇÃO DO SISTEMA DE GESTÃO DA QUALIDADE DO INSTITUTO SÃO JOÃO DE DEUS NA CASA DE SAÚDE DO TELHAL – CLÍNICA DE ALCOOLOGIA NOVO RUMO 698 Jorge Cravidão

59. CONFUSÃO AGUDA E DELIRIUM: IMPORTÂNCIA DA UTILIZAÇÃO DE INSTRUMENTOS PSICOMÉTRICOS DE DIAGNÓSTICO E/OU RASTREIO

707

Francisco Miguel Correia Sampaio; Carlos Alberto da Cruz Sequeira

60. FAMÍLIA: GESTÃO DE CONFLITOS EM CONTEXTO PSIQUIÁTRICO

718

61. PREVALÊNCIA DO BULLYING NUMA EB2,3 DA REGIÃO NORTE DE PORTUGAL

730

Manuela Martins, Júlia Martinho, José Carlos Carvalho, Ilda Fernandes

Elizabete Borges; Pedro Melo

62. CARPE – CENTRO DE ACOMPANHAMENTO E REABILITAÇÃO PSICOEDUCATIVA

735

Ana Maria Seco Alves de Sousa; Luís Filipe Esteves Barbosa de Oliveira; Célia Maria Fernandes Cerqueira

63.PREVENÇÃO DE COMPORTAMENTOS SUICIDÁRIOS: UM CONTRIBUTO DOS ENFERMEIROS José Carlos Santos

742


INTRODUÇÃO

Caros (as) colegas, Em primeiro lugar envio uma palavra de apreço e agradecimento pelo elevado número de trabalhos enviados para esta publicação. A todos os autores, um bem-haja, pelo esforço e contributo na disseminação do conhecimento. A edição deste E-book surge no âmbito da realização do III CONGRESSO INTERNACIONAL, que se realizou nos dias 10, 11 e 12 de Outubro de 2012, no Auditório da Universidade Católica, Porto, Campus da FOZ, Portugal. Este evento foi dedicado à Investigação em Saúde Mental e à sua Relação com a Prática Clínica, porque consideramos que se trata de uma área da maior importância na promoção de saúde, prevenção da doença e no tratamento/reinserção da pessoa com problemática mental. Desde já agradecemos à Universidade Católica pela amabilidade demonstrada no acolhimento desta iniciativa da SPESM, A Janssen, à BIAL e à LIDEL Edições Técnicas Ldª, pelo apoio a este evento. Este evento, iniciou-se no dia 10 de Outubro de 2012, com as comemorações do dia Mundial da Saúde Mental, com destaque para o debate sobre “como promover uma melhor saúde mental das pessoas” e terminou no dia 12 com uma conferência sobre “a promoção da saúde mental na comunidade”. Por isso, a enfase foi colocada na investigação e, na investigação que ofereça respostas seguras para a prática clínica. As pessoas com doença mental fruto de alterações cognitivas, afetivas, relacionais e comportamentais,…, devem ter o direito, de ser alvo de intervenções sustentadas pela investigação, ou seja, que tenham possibilidades efetivas de contribuir para a melhoria do seu estado de saúde.

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O programa científico incluiu conferências sobre a Investigação e a prática clinica em saúde mental; ética e a saúde mental/doença mental; pratica baseada na evidência e o seu contributo para a qualidade das práticas, dados epidemiológicos sobre a morbilidade psiquiátrica em portugal e no brasil, a saúde mental dos adolescentes, a depressão e o suicídio em Portugal, as questões relacionadas com o álcool – instrumentos de avaliação, estratégias de redução da ansiedade e depressão nos familiares cuidadores, a reabilitação psicossocial e a assistência à pessoa com doença mental, estratégias de empoderamento das equipas, a construção social do enfermo mental, estratégias para promover comunidades mentalmente saudáveis e como construir uma boa saúde mental. Em paralelo funcionaram várias mesas temáticas com sessões mais práticas sobre: violência e saúde mental, impacte da doença mental, envelhecimento, demência e familiares cuidadores, vulnerabilidade e resiliência em adolescentes e jovens adultos. A nossa mensagem neste ano de 2012 é de esperança; esperança para todos os profissionais de saúde, esperança para todas as pessoas vulneráveis, esperança para todos por um futuro melhor, porque sem esperança, a vida torna-se muito mais difícil. Os artigos selecionados foram muito diversificados. A responsabilidade do seu conteúdo é única e exclusiva dos seus autores. Optamos por aceitar o maior número de artigos enviados, por considerarmos a sua importância para a divulgação do conhecimento, em detrimento de um rigor exaustivo em termos de formatação de acordo com as regras de publicação. Na expetativa de ver o nosso esforço recompensado, esperamos que disfrutem deste EBook, como prova para memória futura de alguns dos trabalhos discutidos neste congresso. Porto, 18 de Dezembro de 2012 O Presidente da Direcção da SPESM Carlos Sequeira



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35. ENFRENTANDO UMA EXPERIÊNCIA DIFÍCIL MESMO COM APOIO: A ADOLESCENTE MENOR VIVENCIANDO A MATERNAGEM Paula Rosenberg de Andrade*; Regina Issuzu Hirooka de Borba**; Conceição Vieira da Silva Ohara***; Circéa Amalia Ribeiro**** *Enfermeira. Doutora em Ciências pela Escola Paulista de Enfermagem da Universidade Federal de São Paulo. Enfermeira responsável pelo Ambulatório Médico do Centro Assistencial Cruz de Malta - São Paulo - Brasil. Membro do Grupo de Estudos de Puericultura (GRUEP) da UNIFESP. paularandrade@uol.com.br **Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Professor Adjunto da Escola Paulista de Enfermagem da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Líder do Grupo de Estudos do Brinquedo (GEBrinq) da UNIFESP. rihborba@unifesp.br ***Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Professora Associada da Escola Paulista de Enfermagem da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Líder do Grupo de Estudos de Puericultura (GRUEP) da UNIFESP. c.silva27@unifesp.br ****Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Professora Associada da Escola Paulista de Enfermagem da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Líder do Grupo de Estudos do Brinquedo (GEBrinq) da UNIFESP. caribeiro@unifesp.br

RESUMO Introdução: A maternidade na adolescência entre 10 e 14 anos de idade vem aumentando no Brasil gerando preocupações quanto à exposição dessas jovens e seus bebês aos riscos de agravo à saúde, vulnerabilidade social, exploração sexual e psicológicos. Objetivos: Compreender o significado do cuidar do filho para a mãe adolescente menor, desvelar as demandas necessárias pra que possa cuidar do filho e elaborar um modelo teórico representativo dessa experiência. Metodologia: Foram utilizados como referencial teórico o Interacionismo Simbólico e como referencial metodológico a Teoria Fundamentada nos DadosGrounded Theory. Fizeram parte do estudo nove mãe que vivenciaram a maternidade/maternagem

na

adolescência

menor.

Resultados:

A

análise

comparativa dos dados levou a identificação de dois fenômenos interativos: Convivendo com uma experiência solitária e difícil ao cuidar do filho e Tendo ajuda da rede de apoio para cuidar do filho. A articulação desses dois fenômenos 426

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levou à identificação da categoria central Enfrentando uma experiência difícil mesmo com apoio e à construção do Modelo Teórico representativo dessa experiência. Conclusões: As dificuldades vivenciadas para cuidar do filho para a adolescente menor, mesmo com a ajuda da rede de apoio são somente amenizadas, e ela não apresenta condições psicológicas para exercer e superar as dificuldades dessa vivência.

Palavras-chave: Relações Mãe-filho, Adolescente, Puericultura.

35.1. INTRODUÇÃO Para a Organização Mundial de Saúde, a adolescência é classificada em precoce ou menor, dos 10 aos 14 anos e tardia ou maior, dos 15 aos 19 anos de idade. É o período de transição entre infância e idade adulta, transição esta marcada pelo desenvolvimento biológico do início da puberdade à maturidade sexual reprodutiva, pelo desenvolvimento psicológico dos padrões cognitivos e emocionais da infância para a idade adulta (WHO,2011). No Brasil a fecundidade de mães adolescentes entre 10 e 14 anos vem aumentando, sendo que dos 573.712 nascimentos de bebês de mães entre 10 e 19 anos, 27.796 foram de adolescentes entre 10 e 14 anos, registrando assim, um aumento de 2,05% de nascidos vivos, entre 1998 a 2009, na respectiva faixa etária. A situação da gravidez nesta faixa etária precoce é preocupante e constitui-se, como um fator denunciador de um abuso que a adolescente pode estar sofrendo há anos, levando a repercussões psicológicas negativas na constituição de sua sexualidade e ao desenvolvimento de gravidez, parto e puerpério (CAVASIN et al, 2004). A literatura descreve que bebês de mães adolescentes menores são mais vulneráveis quanto à ocorrência de prematuridade, baixo peso ao nascer, apgar mais baixo, doenças do trato respiratório, trauma obstétrico, transtorno de E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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desenvolvimento, baixo quociente intelectual, cegueira, surdez, morte perinatal ou mesmo durante a infância (LEWANDOWSKI; PICCINI; LOPES, 2008, BELARMINO; MOURA; OLIVEIRA; FREITAS, 2009). Especificamente no que se refere à maternagem, ou seja, à prestação dos cuidados ao bebê pela mãe adolescente menor, estudo realizado na década de 80, revelou a falta de competência dessas jovens para cuidarem sozinhas de seus filhos, que seus filhos estão sujeitos a agravos em relação aos aspectos psicológicos e de desenvolvimento e são mais vulneráveis a maus tratos (CROCKENBERG, 1987). Diante desse panorama e com o aumento de mães adolescentes nessa faixa etária, que começaram a procurar a Consulta de Enfermagem do Centro Assistencial Cruz de Malta (CACM) para seus filhos, fez com que eu fosse em busca da compreensão desta realidade e reforçou minha responsabilidade como enfermeira, perante estas mães, seus bebês e suas famílias e, assim, decidi em aprofundar meus conhecimentos sobre este complexo mundo do cuidado que essas mães estabelecem com seus filhos. Como descrito, os estudos evidenciam a maternidade/maternagem na adolescência menor sob a visão de um delineamento biomédico, revelando uma vivência predominantemente negativa, que a meu ver, não oferece subsídios para uma prática assistencial humanizada e abrangente que contemple os significados da vivência do cuidar do filho e as demandas de apoio que necessita para realizar esse cuidado. Acredito que, para tanto, é preciso desvelar o significado da vivência do cuidar do filho para esta jovem, quais as demandas que necessita para fazê-lo e oferecer condições de prosseguir sua trajetória e construção de uma nova identidade: adolescente e mãe.

35.1.1. OBJETIVOS Compreender o significado de cuidar do filho para a mãe adolescente menor; Desvelar as demandas necessárias, para que possa cuidar do filho e Construir um modelo teórico representativo dessa vivência. 428

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35.2. METODOLOGIA Trata-se de uma pesquisa de natureza qualitativa que tem como preocupação essencial o significado que o indivíduo atribui às coisas e às suas vidas, tendo no ambiente natural a fonte dos dados (MINAYO 2008). A pesquisa foi aprovada pelo Comissão de Ética em Pesquisa sob o Parecer 2025/07 da Universidade Federal de São Paulo/ Brasil e antes de sua realização, foram adotados todos os procedimentos éticos que incluíram a carta informativa, a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, a autorização da Instituição onde se deu a coleta dos dados. Foram utilizados como referencial teórico o Interacionismo Simbólico e a Teoria Fundamentada nos Dados Grounded Theory, como referencial metodológico. O estudo foi realizado no ambulatório do CACM, instituição filantrópica mantida pela Soberana Ordem dos Cavaleiros de Malta de São Paulo e Brasil Meridional, localizada na cidade de São Paulo. As participantes do estudo foram nove mães que vivenciavam ou haviam vivenciado a maternidade na adolescência menor e que constituíram-se de três grupos amostrais: o primeiro grupo amostral composto de três mães que sofreram maus tratos na infância, relacionamento conflituoso com a família, caracterizado por problemas na relação e dinâmica familiar; o segundo grupo constituído de quatro mães adolescentes que vivenciaram o apoio da família na infância, durante a gravidez e ao nascimento de seus filhos e o terceiro grupo amostral composto de duas mães, uma que teve apoio da família e da rede de apoio e a outra não e que significaram suas experiências passadas relacionadas a maternagem de forma similar àquelas vivenciadas já na fase adulta. Os dados foram coletados de setembro de 2008 a setembro de 2011 e as estratégias utilizadas foram a observação participante e a entrevista semi-estruturada com as mães, iniciada com a pergunta norteadora “Conte-me como está sendo (ou como foi) para você a experiência de cuidar de seu filho?” A análise dos dados deu-se

simultaneamente à coleta seguindo as etapas de codificação,

categorização,

codificação

teórica

e

a

construção

do

modelo

teórico

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representativa do fenômeno estudado (STRAUSS; CORBIN 2008). Na codificação aberta, os dados obtidos nas entrevistas são examinados linha por linha e recortados em unidades de análise, denominadas códigos, isto é, uma palavra ou sentença que exprima o significado dessa para o pesquisador. Após a codificação de cada entrevista, foi realizada a categorização, momento em que os códigos são agrupados em categorias, mediante suas similaridades conceituais. A codificação teórica consiste em um intenso movimento de ir e vir, isto é, de indução e dedução no qual os dados são comparados e as categorias densificadas, possibilitando a identificação da categoria central que representa o elo entre todas as categorias. A categoria Central deve ser ampla o suficiente para exprimir a essência do fenômeno estudado e permitir a proposição do modelo teórico que descreve a experiência em questão.

35.3. RESULTADOS A análise dos dados das observações e entrevistas com as mães adolescentes permitiu a compreensão do significado que elas atribuem à vivência de cuidar do filho. A experiência revelada não se caracterizou, como um processo de estágios e sequência lógica, mas envolveu dois fenômenos interativos que foram: Convivendo com uma experiência difícil ao cuidar do filho e Tendo ajuda da rede de apoio para cuidar do filho. As categorias que o compõem são: Vivenciando os cuidados iniciais ao filho de maneira solitária e difícil, Continuando a vivenciar dificuldades para cuidar do filho em casa, Surpreendendo-se ao deparar-se com uma experiência diferente e única, Sentindo-se exigida e sobrecarregada, Sofrendo ao deparar-se com a dor e o sofrimento do filho e Percebendo-se perder o domínio sobre seu papel de mãe. Estas categorias revelaram as dificuldades, sofrimentos, medos e o sentimento de solidão, com que a mãe adolescente menor depara-se ao cuidar de seu filho podendo vir a comprometer sua adaptação à maternagem e a construção de sua identidade. É uma experiência difícil, que se inicia ainda na maternidade, ao 430

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precisar cuidar do filho, sem a ajuda dos profissionais de saúde e da família. Com seu retorno para casa, continua interagindo com as dificuldades emergidas durante a internação, que não foram sanadas, além de outras que vão surgindo. Assim, sua rotina é modificada repentinamente, o que determina cansaço para prosseguir nos cuidados de si e do filho. A adolescente também se surpreende ao compreender que a experiência do cuidar é diferente e única, e que ter tido a vivência de cuidar anteriormente de outras crianças menores, não lhe garante que não tenha dificuldades e medos ao cuidar do filho. Nesta perspectiva, ela ainda sofre ao deparar-se com a dor e o sofrimento do filho, quando percebe que ele não está bem ou, até mesmo, quando precisa levá-lo sozinha ao Posto de Saúde para ser vacinado ou quando está doente. Além do mais, ela ainda deparar-se com uma situação inusitada, a de ir perdendo o domínio sobre seu papel de mãe. Abaixo serão apresentados alguns trchos extraídos das falas das mães adolescentes que serão identificadas com as iniciais MA (Mãe Adolescente) seguida pelo número da entrevista (MA1, MA2): “Eu tive que aprender a cuidar do meu filho sozinha lá na maternidade. Minha mãe só podia entrar na hora da visita, e a enfermeira veio lá, deu um banho rapidinho no meu filho e não me ensinou nada! (MA5)”; “Eu tive dificuldade em dar o banho sozinha na maternidade. (MA8)”; “Eu tive medo de segurar meu filho pela primeira vez na hora de mamar e ele cair. (MA1)”; “Eu fui cuidando do meu jeito. Tinha coisa que dava certo e outras que não. (MA9); “Nem parece que eu ajudei a cuidar da minha irmãzinha, eu cuidava dela sem problemas! Quando vi aquele bebezinho pequenininho (o filho), não imaginava que ia ser tão diferente, que eu ia ter dificuldade no começo para dar o banho e limpar o umbigo, coisas que eu já ajudava a fazer. (MA4)”; “Daqui a pouco eu preciso ir prá casa pra fazer comida e dar uma arrumada e ainda cuidar do meu filho.(MA7)”; “ Mudou tudo: agora eu tenho que acordar mais cedo, antes eu dormia até mais tarde. Preciso acordar mesmo quando eu tô cansada, pra fazer o leitinho dele e me arrumar pra ir para escola. Mudou a minha rotina. (MA6)”; “Te juro, eu chorei de dó, eu fiquei triste e meia deprimida, fiquei morrendo de dó. Eu sei que a vacina é importante, mais a picada é muito horrível! (MA5)”; “ Eu tava amamentado e voltei pra escola, aí ela foi lá e decidiu que leite E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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ia dar, e assumiu todos os cuidados. (MA2)”; “Ela (minha mãe) ia tomando as decisões em tudo, era complicado! Ela ia tomando as decisões, e eu não podendo fazer e falar, nadinha! (MA9)”. O segundo fenômeno foi composto pelas categorias Percebendo-se apoiada para cuidar, Tendo suporte financeiro e apoio para retornar às atividades, Desenvolvendo confiança para cuidar, Ampliando o conceito de cuidar e Transformando-se com a maternagem, retrata as interações que a mãe adolescente estabelece com sua rede de apoio, para conseguir desempenhar seu papel de mãe e, assim, conseguir atender às demandas que o cuidar do filho exige. Quando a experiência do cuidar do filho é iniciada na maternidade com a ajuda da família e dos profissionais de saúde, ao chegar em casa com o bebê e perceber que continua a contar com o apoio direto dos mesmos, faz com que essa mãe se sinta amparada, não somente no sentido de amenizar suas dificuldades e medos pelo cuidar, mas também pela ajuda nas demandas decorrentes da sobrecarga e das novas atribuições estabelecidas por sua nova identidade de mãe. Esta interação de ajuda com a rede de apoio e família vai além das ações básicas do cuidar, como dar banho, trocar as fraldas e levar para receber vacina, ela

percebe que pode ainda contar com a ajuda

financeira para seu sustento e de seu filho, e que ainda lhe garantem o retorno precoce à escola. Nessa relação de ajuda, a mãe adolescente menor passa a desenvolver gradativamente confiança para cuidar do filho, o que lhe confere a sensação de ser competente para exercê-lo da melhor maneira possível e acaba por determinar a valorização de sua autoestima. Assim, nesse processo de ter e receber ajuda para cuidar, a adolescente passa a interagir consigo mesma e a ressignificar as questões relacionadas ao cuidar, e assim passa a ampliar sua visão do conceito sobre o cuidar. Todo esse processo de ajuda faz com que ocorram transformações, uma vez que vão florescendo sentimentos positivos em relação a seu filho que passam a determinar com que não se sinta sendo mais criança: “A minha mãe ficava a noite comigo, ela me ensinou como cuidar do meu filho. Ela ensinou a trocar a limpar e trocar a fralda e ela me ajudou a segurar ele direitinho na hora de dar de mamar. (MA5 )”; Nossa! Eu tive ajuda de todo mundo: sogra, sogro, tio, companheiro, até do meu irmão de 10 anos. Eu 432

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não posso reclamar, todo mundo sempre me ajudou a cuidar da nenê. (MA3); “Tive dó de levar o meu filho pra tomar vacina. Na primeira vez, a minha mãe veio comigo (dar vacina no meu filho); na segunda vez, a minha tia e o meu marido. Foram eles que seguraram (MA6)”, “No começo, foi difícil para dar de mamar, depois de receber orientação na consulta e com você (P.), tudo ficou mais fácil. (MA2);” Eu tive todo o apoio da minha mãe, sogra, companheiro pra voltar a estudar, assim que as aulas começassem. Todos eles prometeram ficar e ajudar a cuidar do bebê, enquanto eu estivesse estudando. (MA4)”; “Fui adquirindo confiança pra cuidar no dia a dia. A minha família foi importante, para que isso acontecesse. (MA8)”; ”Eu me lembro o dia, quando ele começou a andar sozinho, sem segurar. Eu nem acreditava que isso estava acontecendo! (MA9)”; “A gente joga muito bola. É a minha brincadeira favorita, e a dele também, é muito divertido! Eu e ele adoramos brincar de bola! (MA7)”; Eu mudei e deixei de ser criança para amadurecer.(MA2)”; “A minha filha, eu amo muito ela, é a minha razão de viver! (MA3)”.

35.4. REFLETINDO O MODELO TEÓRICO O significado da experiência da adolescente menor para cuidar do filho teve como base a perspectiva do Interacionismo Simbólico, levando a refletir sobre a importância das interações como sendo um processo dinâmico no mundo social e passível de constantes modificações. Assim sendo, a

adolescente menor

interage consigo mesma, sua família e rede de apoio e vai em busca daquilo que identifica ser necessário para sentir-se amparada, no sentido de conseguir desempenhar o papel de mãe e, atender às demandas que o cuidar do filho exige. Estudo com mães adolescentes de 15 a 19 anos de idade, revelou as estratégias de enfrentamentos e de superações que vivenciam ao exercer a maternidade/maternagem

(ANDRADE,

2006).

Já,

o

modelo

teórico

ENFRENTANDO UMA EXPERIENCIA DIFÍCIL MESMO COM APOIO (ANDRADE, 2012) mostrou ser uma experiência diferente quando comparada a descrita E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

433


acima. Para a mãe adolescente menor, mesmo ao receber a ajuda da família e rede de apoio, o cuidar do filho apresenta-se como uma experiência difícil e desafiadora, revelando imaturidade psicológica e emocional para enfrentar e superar as dificuldades que tal vivência lhes impõem.

35.5. CONSIDERAÇÕES FINAIS A experiência revelada traz aspectos que devem ser repensados pelos profissionais de saúde, no sentido de contribuir com a compreensão do que vem a ser mãe na adolescência menor e as demandas de apoio que necessita não somente para cuidar do filho, mas também de si. O profissional de saúde, em especial o enfermeiro que atua com adolescentes deve repensar suas atitudes diante destas mães tão jovens, demonstrando atenção, orientando e ensinandoas como cuidar do filho, assim como de si. É importante assegurar que

a

adolescente estabeleça uma relação estreita com alguém de sua rede de apoio para ajudá-la a cuidar do filho. No que condiz as esferas públicas e governamentais, faz-se importante repensar a necessidade da implantação de programas específicos com enfoque no recorte etário, entre os 10 e 14 anos, focados no suporte para o desenvolvimento da resiliência, isto é, na construção e valorização das suas habilidades e competências, que com certeza favorecerá e garantirá oportunidades de experiências positivas para a construção de um futuro melhor, com vistas a prevenção da reincidência de uma gravidez precoce, retorno e adesão à escola e o fortalecimento do vínculo na relação mãe-filho.

REFERÊNCIAS Andrade, PR; Ribeiro CA; Ohara CVS. Mãe adolescente cuidando do filho: um modelo teórico (2006). Rev Bras Enferm, 59 (1): 30-5. Andrade, PR. Enfrentando uma Experiência Difícil mesmo com Apoio: a adolescente menor vivenciando a maternagem. 2012. 180 p. (Doutorado em Ciências)- Universidade Federal de São Paulo, 2012. 434

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


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brasileiras.

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Sexualidade,

São

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36. O FAMILIAR COMO CUIDADOR DA PESSOA COM DEPRESSÃO Maria de Fátima dos Santos Rosado Marques*; Manuel José Lopes**

*Professora adjunta, Universidade de Évora/Escola Superior de Enfermagem S. João de Deus, mfmarques2@sapo.pt **Professor coordenador, Universidade de Évora/Escola Superior de Enfermagem S. João de Deus, mjl@uevora.pt

RESUMO A partir de um desenho de investigação de natureza qualitativa e indutiva com recurso

à

Grounded

Theory,

realizaram-se

entrevistas

narrativas

semiestruturadas a 8 famílias de doentes com depressão, o que correspondeu a 20 participantes. Pretendeu-se caraterizar a depressão na perspetiva do familiar e do doente e descrever as estratégias utilizadas pelo familiar para cuidar da pessoa com depressão. A codificação axial permitiu 2 categorias relacionadas com a narrativa da doença e as estratégias de cuidados. Constatou-se que a depressão é perspetivada de forma diferente pelo familiar e pelo doente e que as estratégias do familiar para cuidar, se revelaram desadequadas para a situação de saúde do doente.

Palavras-chave: cuidador familiar; depressão; enfermagem

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36.1. INTRODUÇÃO A depressão é provavelmente a mais antiga e uma das mais frequentemente diagnosticadas doenças do foro mental. Os seus sintomas têm sido descritos há quase tanto tempo quanto as evidências de documentação escrita (Townsend, 2002), existindo casos relatados há cerca de 3000 anos (Serra, 1990). Classificada como transtorno do estado de humor (ICD 10), a depressão é encarada como um grande problema de saúde pública, pela forma como pode deteriorar a qualidade de vida dos doentes e pelas implicações familiares e sociais que acarreta, razão pela qual é o centro de atenção de profissionais e investigadores que atuam no campo da saúde mental. Considerada a principal causa de incapacitação em todo o mundo, assume uma forte expressão de incidência e prevalência, situando-se em quarto lugar entre todas as doenças, e sendo ainda esperada uma tendência ascendente desta patologia nos próximos 20 anos (OMS;2001). Segundo a European Alliance Against Depression (EAAD, 2012), estima-se que 18,4 milhões de europeus sofrem de depressão, enquanto um estudo de saúde mental realizado em Portugal (2010), revelou que 7,9% da população tinha perturbações depressivas, resultado superior à média dos países europeus. Fenómeno de caráter universal, a depressão pode afetar indivíduos de ambos os sexos, de qualquer idade, de qualquer classe social, nível de instrução, nível cultural, religião e ideologia (Silva, 2012), não se limitando a atingir só a pessoa doente mas também a sua família, provocando sérios problemas na dinâmica pessoal, familiar e social. Tendo em conta as atuais políticas de saúde e o Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016, o internamento é considerado um recurso de última linha e como tal, é no contexto familiar e social que a pessoa vive a sua depressão, devendo os familiares, através de uma atitude pró-ativa, adotar um papel de relevo e ser vistos como parceiros importantes na prestação de cuidados. Esse E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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papel não é passivo e tem consequências importantes, nomeadamente nos estilos de vida e nas relações interpessoais (Ballester Ferrando et. al., 2006). É esperado que os familiares se assumam como cuidadores informais de uma pessoa cuja situação clinica muitas vezes desconhecem e para a qual não estão preparados, por não saber o que fazer. É-lhes pedido que cuidem. Mas como o fazem? Como as experiências dos sujeitos só são conhecidas se forem reveladas pelos

próprios,

sentimos

a

necessidade

de

investigar

de

forma

a

compreendermos o modo de cuidar. O querer compreender algo, surge em consequência de uma inquietação para a qual não temos resposta concreta e satisfatória. Assim, formulámos uma questão norteadora, que segundo Quivy e Campenhoudt (1992) não é mais do que uma tentativa de expressar com a maior fidelidade possível o que procuramos saber e/ou compreender:

Como é que o familiar cuida da pessoa com depressão? De modo a clarificar o caminho de pesquisa, definimos ainda os seguintes objetivos:- caraterizar a depressão na perspetiva do familiar e do doente; descrever as estratégias utilizadas pelo familiar para cuidar do doente com depressão.

36.2. METODOLOGIA O desenho de investigação é de natureza qualitativa, onde o investigador tem como preocupação a compreensão absoluta e ampla do fenómeno em causa, através da descrição e interpretação do mesmo (Fortin,1999). A investigação qualitativa refere-se a processos que não se sujeitam a uma medição experimental em termos de quantidade, intensidade ou frequência, mas baseia-se na suposição de que a realidade é socialmente construída nas relações entre o 438

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investigador e o objeto de investigação, bem como nos constrangimentos situacionais que condicionam o processo (Quartilho, 2001). De acordo com o desenho de investigação anteriormente referido, utilizámos a Grounded Theory como método estruturante da pesquisa, sendo este de natureza primeiramente indutiva na medida em que procura gerar teoria a partir dos dados recolhidos em campo, não privilegiando a análise dos mesmos em função de teorias préexistentes (Fortin,1999) O trabalho de campo decorreu durante os meses de fevereiro e julho de 2009, em 2 polos das consultas externas do departamento de psiquiatria e saúde mental do Hospital do Espírito Santo E.P.E. de Évora, situados em duas cidades distintas do distrito de Évora. Os participantes selecionados para o estudo obedeceram aos seguintes critérios: ser adulto e/ou idoso com diagnóstico clinico de reação depressiva breve ou prolongada (ICD-9)1; viver com familiares; ter capacidade cognitiva que permitisse a recolha de informação; participação voluntária do doente e família. Utilizámos a amostragem não probabilística intencional, selecionando todos os indivíduos a que tivemos acesso durante os meses atrás referidos, de acordo com os critérios de seleção definidos. Assim, aquando da ida à consulta, e após verificarmos o diagnóstico médico (critério de seleção), foram abordados 13 doentes e convidados a participar no estudo. Foi-lhe revelada a finalidade e objetivos do mesmo, tendo 8 acedido a participar, representando cada um uma família, o que perfez um total de 20 participantes. A recolha de informação foi feita através de entrevistas narrativas semiestruturadas, as quais foram gravadas em formato áudio com recurso ao gravador e transcritas integralmente por nós. Todas as entrevistas ocorreram nas casas das pessoas. Foram respeitados todos os procedimentos éticos que a pesquisa exigia e os participantes preencheram o consentimento escrito.

Instrumento de classificação em uso no departamento de psiquiatria e saúde mental do Hospital do Espirito Santo E.P.E. de Évora, quando realizámos a colheita de dados.

1

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439


36.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS Após a codificação aberta, de acordo com os procedimentos da Grounded Theory e com recurso ao programa informático NVivo 8, chegamos à codificação axial a qual permitiu identificar duas categorias: 1ª - Narrativa da doença onde se situam os eixos referentes ao início, causas, manifestações e caraterização da depressão. O início da doença é claramente identificado pelo familiar e pelo doente, sendo coincidente o momento ou período da vida referido por ambos. Quanto às causas, são referidas unicamente pelo doente e relacionam-se com momentos de crise familiar, luto por perda de familiares muito próximos, situações de doença física ou fatores de natureza genética. Para o familiar, a depressão manifesta-se por comportamentos agressivos, isolamento, desinvestimento e passividade. É ainda caraterizada como uma “coisa má” porque destrói a relação familiar e manipuladora porque é uma maneira do doente conseguir o que quer. Para o doente a depressão manifesta-se por sinais somáticos variados, perda de vontade, tristeza, medo e isolamento. É caraterizada como uma doença da cabeça, não se vê, é inconstante e muda completamente a pessoa.

2ª- Estratégias de cuidados onde se situam os eixos referentes à fuga, indiferença, conflito, chantagem e não envolvência. Como forma de cuidar, o familiar afasta-se, está menos tempo em casa para evitar conflitos; aumenta o consumo de bebidas alcoólicas como escapatória; ignora os comportamentos do doente, fingindo que não vê o que se passa, para não entrar em desacordo com ele; para estimular o doente a sair da sua passividade exige que ele faça atividades e por isso raramente participa nas tarefas domésticas, o que gera 440

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muitas vezes conflitos. Por vezes responsabiliza o doente pela instabilidade familiar,

procurando

desta

forma

ajudá-lo

a

ter

consciência

do

seu

comportamento e a promover a mudança de atitudes. Com frequência o familiar recusa o convívio e interação social se o doente não o acompanhar, como forma de o pressionar a relacionar-se com os outros e assim diminuir o seu isolamento. Não entra nas consultas médicas para que o doente fique mais à vontade, mas acompanha-o até ao local da consulta.

36.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Sendo a depressão uma das mais frequentemente diagnosticadas doenças do foro mental, ela continua a ser de difícil compreensão para quem não a vive. A presença em casa de um familiar com depressão, pressupõe que todos os elementos da família tenham que refazer os seus planos de vida e redefinir muitas vezes quase que integralmente os seus objetivos. De acordo com Oliveira (2005), as rotinas domésticas, a vida social e de relação entre os membros da família, o desempenho profissional, a disponibilidade financeira e os papéis familiares alteram-se. A forma como a depressão é vista no seio da família, depende do olhar de cada um dos elementos. Se para o doente ela é uma doença que muda a pessoa, para o familiar a depressão é algo de que o doente se serve para obter os seus fins. A passividade própria do doente que vive uma situação de depressão, incomoda o familiar e como tal, as estratégias que ele utiliza para cuidar, são provocadoras com a finalidade de obter reações e diminuir a letargia do doente. De todo o modo, os familiares sofrem uma mudança para dar resposta às necessidades do doente e o papel de cuidador constrói-se cada dia na interação entre as pessoas que coabitam. O cuidado, sendo um ato intencional, adquire neste contexto, características particulares de conteúdo desadequado à situação E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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de saúde. Tudo o que o familiar faz tem como intenção ajudar o doente a melhorar e vencer a sua depressão, através de um modo diferente de cuidar, mas as estratégias utilizadas conduzem o doente a um maior isolamento. Algumas vezes o familiar tem um sentimento de culpa não como consequência de ter feito algo de mal, mas por ter tido um comportamento mais duro com o doente e não saber se isso é correto. Por sua vez, o doente sente-se incompreendido, mal aceite e mal-amado. Assim, é importante a intervenção de enfermagem para que os cuidadores tenham orientações e apoio na forma de cuidar acautelando consequências negativas para o doente.

36.5. CONCLUSÕES Os familiares vivem o processo de cuidar com muita instabilidade, porque estão a viver um processo de mudança, de transição e não sabem se estão a cuidar bem. Por sua vez, a transição é um conceito central e está dentro do domínio de conhecimento em enfermagem (Meleis, 2007). Se os enfermeiros souberem como os elementos da família enfrentam a depressão do seu familiar e as estratégias que usam para cuidar, podem planificar intervenções adequadas para que a transição se faça com estabilidade. É preciso conhecer a família cuidadora, qual o seu potencial para cuidar, como o faz e as suas necessidades para que os enfermeiros possam ajudar os seus membros (Oliveira et al, 2005), definir estratégias e levar a cabo intervenções que ajudem a cuidar de quem cuida (Ballester Ferrando, et al, 2006)

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Ballester, Ferrando D (2006).Cambios en los cuidadores informales en cuanto a estilos de vida, relaciones y alteraciones de salud mental. Revista Presencia vol 2, nº4 Fortin, Marie-Fabienne (1999). El proceso de investigación: de la concepción a la realización. México:McGraw-Hill Interamericana Meleis, A. I. (2007). Theoretical nursing: development and progress. 4th ed. Philadelphia: L.W.& Wilkins. Oliveira, A. M. N.; lunardi, L.; Silva, M.R.S. (2005).Repensando o modo de cuidar do ser portador de doença mental e sua família a partir de Heidegger. Cogitare enfermagem. vol 10 nº1 (pp.9-15). Organização Mundial da Saúde (2002). Relatório Mundial da Saúde 2001. Saúde Mental: Nova Compreensão, Nova Esperança. Lisboa: Climepsi Editores. Pera, Pilar Isla (2000).El cuidador familiar. Una revisión sobre la necesidad del cuidado doméstico y sus repercusiones en la familia. Cultura de los Cuidados –Universidad de Alicante, año 4, nº7 y 8, 1º y 2º semestres, (pp.187-194) Pereira, Isabel Carvalho Beato Ferraz; Silva, Abel Avelino de Paiva (2012). Ser cuidador familiar: a perceção do exercício do papel. Pensar Enfermagem Vol. 16 Nº1 1º semestre, (pp.54-42) Portugal, Ministério da Saúde, Alto Comissariado da Saúde, Coordenação Nacional para a Saúde Mental (2008).Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016 — Resumo Executivo. Lisboa Disponível

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37. A ADESÃO AO PACIENTE ALCOOLISTA AO TRATAMENTO: NO CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL ÁLCOOL E DROGAS LOCALIZADO NO INTERIOR DE SÃO PAULO Cely de Oliveira*; Márcia Aparecida Ferreira de Oliveira**; Tatiane Fernandes Alves***

*Enfermeira Universidade Paulista - celyolive@yahoo.com.br **Enfermeira EEUSP - marciaap@usp.br ***Enfermeira Universidade Paulista – tatianefaa@bol.com.br

RESUMO Investigar os fatores que influenciam na adesão e não adesão de indivíduos assistidos no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS ad.) localizado no interior de São Paulo. Estudo descritivo exploratório com abordagem quantitativa realizado com pacientes em tratamento no Centro de Atenção Psicossocial com idade entre 18 e 60 anos. Foi realizada coleta de dados em outubro de 2011 por meio de um roteiro de pesquisa contendo questões estruturadas com dados socioeconômicos e referentes ao tratamento. 72,2% dos participantes da pesquisa mencionaram receber incentivo familiar, 65% mostram-se muito motivado a dar continuidade ao tratamento. O incentivo familiar foi apontado como um fator fundamental para a adesão ao tratamento, segundo os participantes da pesquisa a assistência dos profissionais e abordagens utilizadas também tem grande influencia. A adesão ao tratamento esta relacionada a vários fatores e a não adesão dos sujeitos entrevistados deve-se a recaídas após um período de abstinência, ocasionando a perda do autocontrole, internações ou interrupção do tratamento. Tendo em vista que fatores como o ambiente também favorece o consumo excessivo de álcool, supomos que o suporte social mais 444

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atuante possa contribuir para a adesão ao tratamento e apoio aos familiares dos usuários.

Palavras-chave: alcoolista; tratamento; atenção psicossocial.

37.1. INTRODUÇÃO Segundo o Centro Brasileiro sobre Informações sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID) o número de pessoas que fazem uso abusivo de álcool tem crescido atingindo hoje cerca de 10% da população adulta brasileira (CEBRID, 2003). O uso abusivo tem se iniciado cada vez mais cedo entre a população, sendo a idade media de inicio do consumo de 15,1 anos, de aumento do consumo 23,9 anos, e de perda de controle 30,5 anos (Alvarez, 2007). O alcoolismo tem sido responsável por 51.787 internações hospitalares em 367 hospitais, totalizando 39.186 internações (Carlini ,2006). Diante dos dados preocupantes identificando que o álcool tem se infiltrado precocemente na sociedade, mostrou-se necessária políticas que visam assistir e recuperar esses indivíduos adequando essas ao problema de saúde pública. Para assistir a população que faz uso abusivo de álcool na III Conferencia Nacional de Saúde Mental, em dezembro de 2001 O Ministério da Saúde assume de modo integral e articulado o desafio de prevenir, tratar, reabilitar os usuários de álcool e outras drogas (Brasil,2003). Muitos pacientes alcoolistas são atendidos no CAPS ad que são modalidades estruturadas na assistência terapêutica podendo assistir e acompanhar o paciente respeitando a sua singularidade no âmbito de recuperá-lo e reinseri-los na sociedade. Apesar das atividades adotadas pelo programa serem significativas, existe fatores que podem contribuir para que o paciente E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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responda ou não a forma terapêutica. Segundo estudo realizado referente aos fatores associados em (2004), num programa de tratamento a alcoolista identificou-se que os pacientes com estabilidade e responsabilidade em suas relações sociais tanto familiares quanto de trabalho respondem melhor ao tratamento (Ribeiro, 2008). O alcoolismo está associado a fatores sociais, culturais e familiares, sendo estes que desempenham papel fundamental durante todos os estágios, no desencadeamento, no desenvolvimento ou na recuperação do usuário (Jorge, 2007). Segundo Castro e Passos (2005), quando reconhecemos o estado emocional do paciente, temos a possibilidade de pautar estratégias como intervenções terapêuticas individuais . A forma como o profissional enxerga o paciente no seu tratamento é refletida também nos fatores relativos ao paciente na adesão, variando entre a tentativa de compreensão de seus valores e crenças em relação à saúde, à doença e ao tratamento, até a identificação da não-adesão como comportamento desviante e irracional (Leite,2003). Evidenciando o número de abandono, torna-se necessárias intervenções que possam inferir na não adesão do paciente alcoolista ao tratamento, enfatizando a integração de abordagens que aumentem a motivação dos pacientes para o tratamento e o pareamento do paciente ao tratamento, a prevenção de recaída e o controle da auto-eficácia (Resende,2005). Considerando que os egressos ao tratamento pelo alcoolismo vêm aumentando, tornou-se oportuno o presente estudo, que se justifica para melhor compreensão a cerca da temática, na expectativa de identificar fatores associados à adesão e a não adesão dos indivíduos assistidos no CAPS ad.

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37.2. METODOLOGIA Estudo de campo do tipo descritivo-exploratório de natureza quantitativa sobre a adesão ao tratamento do paciente atendido no CAPS ad.

37.2.1. PARTICIPANTES A população desta pesquisa foi composta por 40 pacientes que iniciaram tratamento no CAPS ad, com idade entre 18 a 60 anos, de ambos os sexos, sendo estes encaminhados pelos serviços de urgência e emergência após internação por complicações, unidades básicas de saúde ou procura por livre demanda ao Centro de Atenção Psicossocial a usuários de álcool e outras drogas.

37.2.2. INSTRUMENTOS Questionário estruturado contendo questões do tipo fechada. A pesquisa foi composta por duas partes: Parte I composta por dados pessoais: idade, sexo, estado civil, grau de escolaridade, trabalho e religião. Parte II dados relacionados aos motivos que influenciam os indivíduos a desistirem do tratamento, abordando antecedentes referentes ao uso de álcool, tais como: inicio do uso, freqüência, internações anteriores, problemas relacionados ao uso de álcool, motivação do usuário quanto ao tratamento, incentivo familiar, contribuição dos grupos e profissionais do CAPS ad para sua adesão ao tratamento.

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37.2.3. PROCEDIMENTOS Por se tratar de uma pesquisa com seres humanos, esta foi submetida a análise e apreciação do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Paulista (UNIP) que é reconhecida pelo Conselho Nacional de Pesquisa em Seres Humanos (CONEP), sendo apresentado por meio de seu envio e de carta de encaminhamento ao Comitê juntamente com a folha padronizada para tal. Para o desenvolvimento do estudo, serão seguidas as diretrizes a as normas regulamentadoras de pesquisas que envolvem seres humanos, aprovados pelo Conselho Nacional de Saúde-Resolução 196/96.

37.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS As informações obtidas foram armazenadas no software aplicativo Microsoft Word e analisadas de maneira descritiva, calculando-se as freqüências absolutas e relativas para variáveis quantitativas.

37.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS O perfil dos pacientes, segundo idade e sexo 65,0% eram do sexo masculino e 10,0% eram do sexo feminino e ambos tinham faixa etária entre 41 e 60 anos, sendo média de 41,4. Segundo estudo realizado no Piauí sobre o perfil sociodemográfico e adesão ao tratamento de dependentes de álcool o número de homens vinculado ao tratamento chega a ser de 88,9%.

16

Dados também

encontrados em uma análise com 316 registros de pacientes de um Centro de Atenção Psicossocial, onde este número fora de 86,4%. Estes índices tornam-se relevantes uma vez, que o alcoolismo é tradicionalmente compreendido pela sociedade como um problema da figura masculina, o que remete as próprias mulheres ao preconceito e discriminação.(17,18). Cezar (2006) diz que número de mulheres é relativamente inferior ao de homens, pois estas tende a preservar a 448

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auto-imagem, relacionado à visão social referente ao papel da mulher e posturas consideradas femininas e que a maioria delas costumam buscar tratamento ginecológico ou psiquiátrico alegando depressão, sem, contudo revelar seu problema de alcoolismo.

19

Observou-se que o local pesquisado mantém grupos

mistos, o que pode estar relacionado com o baixo percentual de mulheres ao tratamento Nóbrega (2005) em um estudo que objetivou reconhecer os aspectos de vida das mulheres inseridas num programa de álcool e drogas, aponta sobre a importância de um ambiente favorável, com menos barreiras estruturais e sociais, que possibilitem não apenas a entrada, como também a adesão da mulher usuária de álcool ao tratamento. 20 Foram encontrados indivíduos com idade média de 41,4, mostrando que, apesar do consumo de álcool ter sido feito cada vez mais cedo os jovens são os que menos aderem ao tratamento, dados também encontrados em estudos realizados por Peixoto et al (2010) e Rigoni et al (2009) que respectivamente encontraram idade média de 35,2 e 41 anos. (17 21) A maioria dos pacientes em tratamento estão casados somando 55,0% e 45,0% estão solteiros. Foi encontrado em maior numero sujeitos que estão casados ou mantém união estável, esses dados corroboram com os achados de Fornazier 2006 e Resende 2005.

(22,14)

Os números mostram que o fato de o

individuo manter uma união estável ou estarem casados torna-se um fator de proteção para a adesão ao tratamento, tendo em vista que o alcoolismo está diretamente

associado

a

fatores

sociais,

culturais

e

familiares,

sendo

considerados estes de extrema importância em todos os estágios, no desencadeamento, no desenvolvimento ou na recuperação do usuário. 11 Da totalidade dos indivíduos entrevistados 60,0% possui escolaridade de nível fundamental e 25,0% possui ensino médio. Foi observada que a população pesquisada possui baixa escolaridade. Em um estudo foi observada baixa escolaridade em adolescentes que faziam uso de substancias psicoativas, estes obtiveram um menor desempenho escolar e mais reprovações, fato que o E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

449


consumo do álcool pode refletir na vida adulta.

23

Cunha 2004 analisou déficits

cognitivos em dependentes de álcool, os problemas mais comuns encontrados foram:

problemas

de

memória,

aprendizagem,

abstração,

resolução

de

problemas, síntese viso-espacial, velocidade psicomotora, velocidade do processamento de informações e eficiência cognitiva.

24

Segundo dados referentes aos pacientes que estão em tratamento e possuem emprego mostra que, 52,5% estão empregados e 47,5% estão desempregados. O emprego mostrou-se significativo uma vez que, o número de pacientes empregado é maior dos que estão desempregados, o que pode estar relacionado à adesão desses pacientes ao tratamento na expectativa de manterem seus empregos. Em achados de Ribeiro 2009, considerou que, os pacientes autônomos os referidos como “biscates ou bicos”, tendem a ter dificuldades para manter-se vinculados as rotinas de tratamento por longo prazo. 6

A amostra do número de pacientes que possuem religião revela que, 67,5% possuem algum tipo de religião, e outros 32,5% afirmam não ter religião. A religião pode colaborar com a reflexão do paciente frente ao tratamento, pois algumas religiões em especial as protestantes podem exercer influência e proteção no consumo de drogas, pois estas contam com rede de apoio e adotam crenças, normas e valores.

25

A remuneração digna, o nível de escolaridade

superior, melhora a satisfação do profissional e cria um ambiente de trabalho saudável sendo um fator predispor para o desenvolvimento de atividades de promoção da saúde e prevenção do uso e abuso de álcool. O estresse pode está ligado ao consumo de álcool no ambiente de trabalho, e este pode se associar a outros comportamentos de risco como pressão do grupo, familiares de dependência e expectativas positivas quanto ao uso. 26 Segundo os dados coletados referente a idade mostra que a idade do inicio de consumo de álcool esta entre 12 e 20 e dos 21 aos 40 anos ambos somando uma totalidade de 42,5%. O primeiro contato com o álcool tem sido cada vez mais 450

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cedo. Em análise populacional referente ao uso de álcool entre adolescentes aponta inicio do consumo de álcool aos 11 e a prevalência entre 14 e 15 anos.

27

Um estudo verificou consumo de álcool em adolescentes com 14 e 15 anos, destes os que não trabalhavam consumiam esporadicamente, eram de família de baixa renda e tinham um baixo rendimento escolar e os que trabalhavam conviviam com pessoas mais velhas que faziam uso de algum tipo de droga sendo um fator motivador para o inicio do consumo, tinham dinheiro e tempo disponível aumentado por mais horas de trabalho, tensão no trabalho e a transição precoce dos papéis de adulto que conecta a vida do adolescente com o mundo do trabalho também pode ser um fator motivador para o inicio do consumo de álcool e outras drogas. 28 Dados dos pacientes que fizeram tratamento para alcoolismo anteriormente revelam que 62,5% já haviam feito tratamento e 37,5% nunca fizeram antes. O tratamento tem inicio após encaminhamento por hospitalização por excesso de álcool, por Unidade Básicas de Saúde ou por demanda espontânea. O tratamento é ofertado a pessoas com grave sofrimento psíquico relacionado a substancias psicoativas, os indivíduos podem ser encaminhados devido a internações psiquiátricas ou ter sido atendidos em outros serviços de saúde (ambulatórios, hospitais-dia, consultórios etc).

15

Foram encontrados poucos estudos que dizem

a respeito dos fatores que motivam à procura pelo tratamento. No entanto um estudo realizado sobre internações de dependentes químicos numa unidade de internação psiquiátrica destacou como principais motivos da internação de dependentes de álcool agitação psicomotora, agressividade, tremores, insônia, alucinações audiovisuais, delírios e sudorese. 29 A amostra segundo o inicio do tratamento anteriores para alcoolismo e seu término mostra que 38,4% iniciaram tratamento anteriormente e terminaram e 61,5% iniciaram e não terminaram. O abandono ao tratamento é considerado após três faltas consecutivas e a adesão é considerada após três meses de tratamento. Melo 2005 refere que os pacientes que consumiam álcool e outras drogas abandonavam mais precocemente o tratamento principalmente os que E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

451


mantinham vinculo superficial, sendo estes indivíduos considerados menos graves e que permitem menor freqüência ao tratamento.

30

A adesão pode ser

considerada a obediência ao tratamento relacionado ao grau em que o paciente segue as recomendações médicas, ou do profissional da saúde consultado, retorna e mantém o tratamento indicado, o comparecimento às consultas marcadas e a freqüência até seu final.

31

Em um estudo em relação à média de

permanência em tratamento no CAPS-ad, verificou que, dos 227 dependentes de álcool e outras drogas que compõem a amostra, houve interrupção de 129 (56,8%) e permanência de 98 (43,1%) com mais de três meses de tratamento.

16

Alvarez 2007 identificou em seu estudo alguns fatores que podem favorecer recaídas sendo estes: pressão social: influência prejudicial de amigos bebedores, ir a lugares onde se consome, festa e celebração; dependência: necessidade de beber, beber com controle e falta de vontade para deixar de beber; conflitos interpessoais, fundamentalmente com a família (separação, brigas, falta de apoio familiar); estados emocionais negativos (ansiedade, depressão, raiva). 9 A amostra sobre a motivação ao tratamento iniciado para alcoolismo no Caps ad (Tabela 12) mostra que, 65,0% está muito motivado e 30,0% está regularmente motivado com o tratamento iniciado. Em uma pesquisa sobre motivação pode-se destacar menor média no estágio de pré-contemplação fase em que o paciente esta resistente em reconhecer ou modificar seu problema, sendo uma das fases a ser melhor trabalhada no objetivo de facilitar a adesão do individuo ao tratamento, já no estágio de contemplação obteve-se um melhor resultado pois nesta fase o individuo esta apto a reconhecer seu problema e a responder as intervenções. 39 A motivação passa a ter maior significado quando os profissionais estão mais bem preparados para identificar a motivação do paciente nas fases de pré-contemplação, contemplação e ação onde eles necessitam de mudanças praticas de comportamento. 40

452

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e

outras

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455


38.

O

PAPEL

DO

ENFERMEIRO

NOS

CUIDADOS

A

PACIENTES

PORTADORES DE ESQUIZOFRENIA Cely de Oliveira*; Márcia Aparecida Ferreira de Oliveira**; Tatiane Fernandes Alves*** *Enfermeira Universidade Paulista - celyolive@yahoo.com.br **Enfermeira EEUSP - marciaap@usp.br ***Enfermeira Universidade Paulista – tatianefaa@bol.com.br

RESUMO Investigar a atuação do enfermeiro no setor de psiquiatria, especificamente, no tratamento de pacientes com transtorno mental esquizofrenia. Pesquisa de campo do tipo descritivo-explorátorio, de natureza qualitativa sobre o papel do enfermeiro nos cuidados a pacientes portadores de esquizofrenia. A coleta de dados ocorreu no mês de setembro de 2011 e foi realizada por meio da aplicação de um questionário. Participaram do estudo 6 enfermeiros que atuam no CAPS, região leste, da cidade de São Paulo. Os resultados referem sobre a atuação da equipe de enfermagem em sua rotina de trabalho. A prática em enfermagem psiquiátrica se baseia em ações que visam a melhorar as condições da qualidade de vida do paciente e de sua família. A equipe de enfermagem considera o exercer da função no CAPS, uma atuação fácil por não cuidar de pacientes acamados e tem como dificuldades as questões emocionais deles próprios e as alterações comportamentais e psicológicas do paciente. Pode-se supor que as dificuldades em prestar assistência a portadores de esquizofrenia, se deva ao pouco conhecimento acerca da temática. Considera-se importante ressaltar a necessidade de atualização profissional da equipe de enfermagem.

Palavras-Chave: Esquizofrenia; Assistência; Enfermagem. 456

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38.1. INTRODUÇÃO Antigamente, os doentes mentais eram vistos como pessoas possuídas por demônios e eram mantidos isolados, acorrentados e muitas vezes tratados como criminosos

(1)

. Eis que no século XIX, na América Latina foi construído o primeiro

hospital psiquiátrico público para o tratamento dos transtornos mentais. Já no Brasil, a construção da primeira instituição psiquiátrica, também conhecida como hospício ou manicômio, ocorreu no estado do Rio de Janeiro e foi inaugurado em 1852 com objetivo de tratar dos doentes que ali podiam permanecer por muito tempo ou até mesmo pelo resto da vida (2). Acreditava-se que a solução para o tratamento dos transtornos mentais havia sido encontrada com a criação dos hospitais psiquiátricos, mas havia superlotação, maus tratos, falta de higiene e principalmente a falta de prognóstico e perspectiva em relação à patologia do paciente. A luta antimanicomial levou, principalmente os profissionais da área psiquiátrica, a uma nova visão das pessoas com transtornos mentais, com base na abordagem terapêutica que visa respeito ao individuo em suas diferenças e singularidade, através da escuta e acolhimento, por meio de projetos terapêuticos e aproximação e preservação dos vínculos sociais e familiares. No Brasil, teve início a partir de 1970, em oposição ao modelo tradicional de assistência psiquiátrica, o qual estava baseado na exclusão do individuo do convívio social através da internação (2). Nosso

país

teve

como

inspiração

à

experiência

Italiana

de

desinstitucionalização e sua crítica radical ao manicômio, pois esta revelou a possibilidade de ruptura com os antigos paradigmas. Foi no ano de 1978 o início efetivo do movimento social pelos direitos dos pacientes psiquiátricos. Tal movimento foi chamado de Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental – MTSM

formado

por

trabalhadores

integrantes

do

movimento

sanitário,

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457


associações

de

familiares,

sindicalistas,

membros

de

associações

de

profissionais e pessoas com longo histórico de internações psiquiátricas (3). Entre as décadas de 80 e 90, se fortalecem as iniciativas por parte de alguns profissionais da área da saúde descontentes com os tratamentos dados aos internados. Tais iniciativas clamavam pelos direitos dos pacientes psiquiátricos e pelo reconhecimento de sua cidadania. Com isso, em 1989 o Deputado Paulo Delgado, propôs um Projeto de Lei para fechamento dos manicômios e proibição da eletroconvulsoterapia (2). Os movimentos sociais inspirados pelo Projeto de Lei do Deputado Delgado, em 1992, conseguem aprovar as primeiras leis que determinavam a substituição dos leitos psiquiátricos por uma rede integrada de atenção à saúde mental. Neste período a política do Ministério da Saúde Mental para saúde mental junto com as diretrizes, em construção, da Reforma Psiquiátrica começa a ganhar contornos mais definidos (3). A década de 90 foi marcada pelo compromisso firmado pelo Brasil na assinatura da Declaração de Caracas e pela realização da II Conferência Nacional de Saúde Mental. Sendo que, neste período, em 1992, entraram em vigor as primeiras normas federais que regulamentaram a implantação de serviços de atenção diária CAPS, NAPS e Hospitais-Dia e também as primeiras normas para fiscalização e classificação dos hospitais psiquiátricos (3). Em 06 de abril de 2001, depois de 12 anos de tramitação no Congresso Nacional, a Lei Paulo Delgado, chamada de Lei Federal 10.216, foi sancionada, mas com modificações significativas no texto normativo em substituição do Projeto de Lei original. Ela redirecionou a assistência em saúde mental, privilegiando o oferecimento de tratamento em serviços de base comunitária, além de dispor sobre a proteção e os direitos dos indivíduos com transtornos mentais, porém não instituiu mecanismos claros para a progressiva extinção dos manicômios (3). 458

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A Lei Federal 10.216 impôs novo impulso e ritmo para o processo de Reforma Psiquiátrica no Brasil. Então, foi no contexto da promulgação desta Lei e da III Conferência Nacional de Saúde Mental que a política de saúde mental do governo federal, unida com as diretrizes da Reforma Psiquiátrica, passou a consolidar-se (3). Portanto, conclui-se que a Reforma Psiquiátrica teve como principal finalidade atualizar o modelo tradicional de assistência psiquiátrica através de recursos centrados em ações sociais dirigidas aos aspectos psicológicos, sociais,

econômicos

e

culturais,

assim

como

a

desinstitucionalização

promovendo o surgimento de novos serviços como os Núcleos de Atenção Psicossocial – NAPS, os Centros de Atenção Psicossocial – CAPS e HospitaisDia, o envolvimento da família no tratamento para melhor compreensão do transtorno (2). De acordo com a Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento da CID-10, a esquizofrenia é caracterizada por distorções fundamentais e características do pensamento e da percepção, além do afeto inadequado ou embotado. Ao contrário do que se acredita no senso comum, a pessoa com esquizofrenia tem a consciência e a capacidade intelectual mantidas, sendo que déficits cognitivos podem ou não surgir

(5)

. Percebe-se que os sintomas mais

marcantes desta patologia são os delírios e as alucinações. Apesar dos avanços na medicina, as causas da esquizofrenia permanecem desconhecidas, mas essa patologia representa um transtorno heterogêneo que tem como característica sintomas psicóticos que causam prejuízos significativos com perturbações em várias funções psíquicas, principalmente emoções, pensamento e comportamento. É uma doença crônica e para o seu diagnóstico é necessária a exclusão de causas orgânicas e de outros transtornos mentais (6). Apesar das mudanças ao longo do tempo relacionadas à assistência aos portadores de Transtornos Mentais – TM, percebe-se que a abordagem de temas como a esquizofrenia são correlacionados com atos criminosos. Portanto, E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

459


julgou-se oportuno desenvolver esse estudo para investigar a atuação do enfermeiro em assistência ao portador de esquizofrenia a fim de possibilitar o discernimento entre a doença e atos de criminalidade. 38.2. METODOLOGIA Pesquisa de campo do tipo descritivo-explorátorio, de natureza qualitativa sobre o papel do enfermeiro nos cuidados a pacientes portadores de esquizofrenia.

38.2.1. PARTICIPANTES A população deste estudo foi composta por 06 (seis) membros da equipe de enfermagem, sendo dois enfermeiros, três técnicos e um auxiliar em enfermagem, em todos os turnos de trabalho, os quais prestam assistência aos pacientes portadores de esquizofrenia.

38.2.2. INSTRUMENTOS O instrumento de coleta de dados foi um questionário contendo questões do tipo fechadas e abertas para atendimentos do objetivo desse estudo.

38.2.3. PROCEDIMENTOS Após a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa, da Secretaria Municipal da Saúde, a pesquisadora foi até a instituição para a realização da coleta de dados. Estava de posse do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para que os enfermeiros o assinem. O questionário foi entregue ao profissional pelo próprio pesquisador. Ocorreu também observação da rotina de trabalho do enfermeiro. 460

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38.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS A análise dos resultados foi realizada com base nos estudos propostos por Laurence Bardin, análise de conteúdo. No encadeamento desta interpretação, considera-se conveniente desenvolver a discussão dos resultados, no sentido de melhorar a exposição destes com elaboração de categorias. A análise de conteúdo é, considerada um instrumento de análise, caracterizada por sua grande diversidade de formas e adaptação a um campo de aplicação muito vasto, o campo das comunicações (9).

38.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS A primeira categoria estabelecida foi referente à Qualificação Profissional. Observou-se que um membro da equipe de enfermagem, enfermeiro, possui especialização em “Saúde Pública e Saúde Mental e Psiquiátrica”, dois técnicos em enfermagem participaram de um curso pelo COFEN, sendo um em “Cuidados Específicos com Doenças Mentais” e o outro “Comportamento dos Pacientes Psiquiátricos em Clínica”. Ao contrário do que se preconiza a literatura os sujeitos da pesquisa demonstraram que a especialização em saúde mental e psiquiátrica não é necessária conforme se pode comprovar em suas respostas: “Sou auxiliar de enfermagem desde 1986 - realizei e participei de muitos cursos durante esse período. Em 2007 fiz o Técnico em Enfermagem e outros como: urgência e emergência pelo SENAC. Especialização em DST-HIV/AIDS em 2008 e cuidados específicos com Doenças Mentais pelo COFEN em 2011”. (Resposta 2) “Administração Hospitalar.” (Resposta 3) E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

461


“Palestras, cursos e treinamentos da Educação Continuada da Prefeitura, Capacitação Basico em Lian’Gong...” (Resposta 6) A prática em enfermagem psiquiátrica tem como base ações que visam melhorar a qualidade de vida do paciente e de sua família; contribuir no controle do surto; tornar a doença estabilizada; ajudar na adesão ao tratamento, na integração social e na adaptação de sua nova condição

(7)

. Para tal, faz-se

necessário incentivar e possibilitar aos profissionais da área de enfermagem psiquiátrica a realização de cursos para capacitação e aperfeiçoamento de técnicas voltadas aos cuidados a pacientes com transtornos mentais, pois é importante ser um profissional qualificado e atuar de forma coerente e eficaz para atender a demanda destes pacientes. A categoria Experiência na Assistência a Portadores de Esquizofrenia demonstrou que, conforme as respostas, a maior parte dos participantes não tinham atuado anteriormente na área psiquiátrica e a experiência deu-se através do trabalho no CAPS, do contato com os pacientes e participação nos grupos. A contratação dos enfermeiros e da auxiliar de enfermagem foi através de concurso público e, dos técnicos terceirizada. “Trabalho há 10 meses no CAPS, aprendi a trabalhar com esses pacientes devido a convivência com os mesmos e também com profissionais da área que atuam a mais tempo que eu”. (Resposta 1) “Trabalho no CAPS há 2 anos observo os pacientes na ambiência e nas discussões de casos na equipe multiprofissional. Também fiz um curso (30 horas) pelo COFEN e foi muito bom, mas é pouco”. (Resposta 2) “A experiência de trabalhar em CAPS, principalmente nas atividades de grupo”. (Resposta 4) “(...) Comecei adquirir experiência há 1 ano com esses pacientes”. (Resposta 5) 462

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Com base na resposta da participante 2 somente a realização de curso pelo COFEN não é suficiente para atuar. Segundo as Diretrizes Gerais de Saúde Mental e Atenção Básicas é importante incorporar ações de supervisão e participação de iniciativas de capacitação (4). O parágrafo acima confirma o já discutido na primeira categoria, a importância da capacitação e aperfeiçoamento. Quando questionados sobre a atuação emergiu a categoria Cuidados de Enfermagem. Sabe-se que a assistência em enfermagem é fundamental, principalmente, para os pacientes com transtorno mental, pois estes necessitam de uma atenção diferenciada, na qual o profissional deve ser acolhedor, atencioso e empático.

A assistência em enfermagem visa atender as

necessidades básicas humanas, envolvendo um grande rol de ações e intervenções. Essas necessidades estão relacionadas aos cuidados como administração de medicamentos e observação dos efeitos colaterais; avaliação diária dos sinais vitais (peso, diurese e evacuação); anotações de enfermagem; visita domiciliar; coordenação de grupos de pacientes em oficinas e demais atividades e; evolução do paciente e família frente ao tratamento

(2-7)

. Tais

procedimentos aparecem nas respostas da equipe de enfermagem, conforme abaixo: “(...) anotação em enfermagem, coleta de material biológico, administração de medicação prescrita, controle dos sinais vitais, AVD (atividades da vida diária)”. (Resposta 1) Ainda referente à categoria Cuidados de Enfermagem os participantes técnicos e a auxiliar de enfermagem responderam que realizam “ambiência” que segundo uma das participantes é: “(...) recepção, receber os pacientes e desenvolver uma atividade até chegar a equipe de psicólogos e terapeutas.” (Resposta 6)

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463


A categoria Fatores Facilitadores e Dificultadores no Exercício da Atuação surgiu com base nas respostas da equipe de enfermagem sobre as facilidades e dificuldades no exercer da função. As respostas sobre as facilidades revelaram que alguns membros da equipe de enfermagem consideram fácil sua atuação com portadores de transtornos mentais (esquizofrenia) por não realizarem esforços físicos; outros por executarem atendimentos em grupo; ou seja, fazendo parte de a uma equipe multiprofissional e um por acompanhar a melhora do quadro patológico. “Facilidade por não trabalhar com paciente acamado, apenas orienta, ajuda porque eles são muito inteligente.” (Resposta 6) Em oposição ao que ocorria antigamente, quando o tratamento dos doentes mentais era mantê-los isolados em hospícios com privação de visitas, atualmente o

tratamento

do

paciente

com

transtorno

mental

é

voltado

para

a

desinstitucionalização e realizado por equipe multiprofissional, ou seja, por médicos psiquiatras, enfermeiros com especialização em psiquiatria, psicólogos, assistentes sociais e terapeutas ocupacionais, tendo como objetivo a inserção social e familiar, inclusive quando possível colocação e recolocação profissional. Quanto às dificuldades, as respostas foram de cunho administrativo e emocional, como também a falta de adesão ao tratamento (dos pacientes e familiares). “Constante troca de psiquiatria na unidade. Observação permanente devido á freqüente alteração comportamental e psicológica, manter equilíbrio emocional perante nossos pacientes”. (Resposta 1) A freqüente falta de adesão da família é um assunto de escassa referência bibliográfica. No entanto, provavelmente, esteja vinculada a falta de condições estruturais, econômicas e emocionais para aceitar e conduzir satisfatoriamente esses aspectos da convivência com a doença

464

(11)

. Alguns membros da equipe de

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


enfermagem apontam a necessidade de manter o equilíbrio emocional perante os pacientes.

38.5. CONCLUSÕES A equipe de enfermagem atua com número reduzido de funcionários. A experiência profissional dos participantes deste estudo ocorreu por meio de atuação no CAPS, por meio de intervenções básicas como administração de medicamentos, avaliação diária dos sinais vitais, entre outras e negligenciados os cuidados psicossociais com pacientes e familiares, uma vez que a assistência está pautada na reinserção dos portadores de transtorno mental no ambiente social, bem como o mesmo seja respeitado como cidadão de diretos. A equipe de enfermagem considera o exercer da função na área psiquiátrica, no CAPS, uma atuação fácil por não cuidar de pacientes acamados e tem como dificuldades, principalmente, as questões emocionais deles próprios e as alterações comportamentais e psicológicas do paciente. Pode-se supor que as dificuldades em prestar assistência à pacientes com transtorno mental, em especial esquizofrenia, se deva ao pouco conhecimento acerca da temática. Considera-se importante ressaltar a necessidade de atualização profissional da equipe de enfermagem.

REFERÊNCIAS 1 - Teixeira B T. Breve História da Psiquiatria e da Assistência de Enfermagem Psiquiátrica. In: Teixeira M B, Mello I M, Grando L H, Fraiman D P. Manual de Enfermagem Psiquiátrica. São Paulo: Atheneu; 1997. 2 - Lobo G O, Mattiolli T C, Santos A S. Esquizofrenia: perspectiva histórica e assistência de enfermagem. In: Cuidarte

Enfermagem.

2008.

Disponível

em:

www.fundacaopadrealbino.org.br/facfipa/ner/pdf/ed03enfpsite.pdf>. Acessado em: 20/03/2011.

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

465


3 - Brasil. Mistério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. DAPE. Coordenação Geral de Saúde Mental. Reforma Psiquiátrica e Política de Saúde Mental no Brasil. Documento apresentado a Conferência Regional de Reforma dos Serviços de Saúde Mental: 15 anos depois de Caracas. OPAS. Brasília, novembro de 2005. 4 - Brasil. Mistério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas/Departamento de Atenção Básica. Coordenação Geral de Saúde Mental. Coordenação de Gestão da Atenção Básica. Saúde Mental e Atenção Básica O Vínculo e o Diálogo Necessários – Inclusão das

Ações

de

Saúde

Mental

na

Atenção

Básica.

Disponível

em:

http://portal.saúde.gov.Br/portal/arquivos/pdf/diretrizes.pdfministeriodasaude. Acessado em: 06/04/2011. 5 - Organização Mundial da Saúde. Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento da CID-10: Descrições Clínicas e Diretrizes Diagnósticas. Trad. Dorgival Caetano. Porto Alegre: Artmed, 1993. Reimpressão 2007. 6 - Pheula G F, Reisdorfer S. Transtornos Psicóticos. In: Souza J C, Guimarães L A M, Ballone G J, orgs. Psicopatologia e Psiquiatria Básicas. São Paulo: Vetor Editora; 2004. 7 - Giacon B C C, Galera S A F. Primeiro episódio de esquizofrenia e assistência de enfermagem. Rev. Eletr. Enf. USP 2006. Disponível em: www.ee.usp.br/reeusp/. Acessado em 20/03/2011. 8 - Castro S A, Furegato A R F. Conhecimento e Atividades da Enfermagem no Cuidado do Esquizofrênico. Rev. Eletr. Enf. 2008. Disponível em: www.fen.ufg.br/revista/v10/n4/v10n4a08.htm. Acessado em 20/03/2011. 9 - Bardin L. Análise de Conteúdo. Trad. Luis Antero Reto e Augusto Pinheiro. 3ª ed. Lisboa (Portugal): Edições 70; 2004. 10 - Alda M. Transtorno Bipolar. Rev. Bras. Psiquiatr. Vol. 21 s.2 São Paulo 1999. Disponível em: www.scielo.br/. Acessado em 04/11/2011. 11 - Vilares C C, Redko C P, Mari J J. Concepções de doença por familiares de pacientes com diagnóstico de esquizofrenia. Rev. Bras. Psiquiatr. Vol. 21 n.1 São Paulo 1999. Disponível em: www.scielo.br. Acessado em 04/11/2011. 12 - Arruda E A. Assistência de enfermagem aos pacientes com esquizofrenia. Minas Gerais 2010. Disponível em

www.pirapetinga.mg.gov.br/blog/2010/11/10/assistencia-de-enfermagem-aos-pacientes-com-

esquizofrenia/. Acessado em 12/05/2011.

466

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


39.

PERCEPÇÃO

ASSISTÊNCIA

DOS

AO

GRADUANDOS

ADOLESCENTE

DE

ENFERMAGEM

PORTADOR

DO

SOBRE

TRANSTORNO

BIPOLAR DO HUMOR Cely de Oliveira*; Márcia Aparecida Ferreira de Oliveira**; Anselmo Amaro dos Santos*** *Enfermeira - Universidade Paulista - celyolive@yahoo.com.br **Enfermeira - EEUSP - marciaap@usp.br ***Enfermeiro - Universidade Paulista - aasantos@usp.br

RESUMO Identificar as principais dificuldades dos graduandos de enfermagem na percepção do papel do enfermeiro na assistência ao adolescente portador do transtorno bipolar. Estudo descritivo exploratório com abordagem qualitativa realizado com 15 estudantes de enfermagem do sétimo semestre com idade entre 20 e 57 anos. A coleta de dados foi realizada no período de 20 de julho a 20 de agosto de 2011, por meio da aplicação de um questionário com questões semiestruturadas e analisadas pelo método da Análise de Conteúdo. Evidenciou-se que os alunos não possuem clareza de quem deve dar as devidas orientações para o adolescente e a família do adolescente portador do transtorno bipolar. A maioria acha que o responsável pela assistência é o médico psiquiatra ou o psicólogo. Também foi evidenciado no estudo que mesmo estando no sétimo semestre da graduação de enfermagem, alguns alunos ainda não sabem o que é o transtorno bipolar. Concluiu-se com este estudo que é necessário o esclarecimento sobre a assistência de enfermagem bem como o papel do enfermeiro na assistência ao portador de transtorno bipolar.

Palavras-chave: Percepção; Graduando; Enfermagem; Assistência. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

467


39.1. INTRODUÇÃO O Brasil possui 24.528.962 adolescentes, em São Paulo este número é 4.854.473 de adolescentes na faixa etária de 12 a 18 anos de acordo com o Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e a definição segundo eles é que a adolescência marca a transição da infância para a vida adulta. É um momento de busca por uma identidade pessoal. É abandonar as coisas de criança e começar a prestar atenção no que é o mundo e no significado de estar no mundo. Podemos notar de acordo com as informações do IBGE, identificamos um crescimento no número de adolescente devido ao aumento da expectativa de vida. A adolescência é um período fundamental do desenvolvimento humano e devem-se considerar aspectos importantes nesta fase da vida como a puberdade, que ocorrem diversas transformações no adolescente, entre elas anatômicas e fisiológicas. A adolescência caracteriza-se por um período de crise devido às mudanças que ocorrem e as ansiedades deste jovem em relação ao presente e futuro. O individuo na sociedade também deve ser abordado na adolescência, porque o contexto no qual ele está inserido tem influência em suas atitudes e suas escolhas, Seja na família, nas comunidades reais e virtuais, na escola, etc. o individuo comporta-se de formas diferentes, gerando mais questionamentos sobre seu papel na sociedade. Em relação aos aspectos psicológicos a adolescência é um período importante no aprendizado dele, pois o desenvolve para construção dos valores éticos, profissionais e culturais, e é fundamental para formação de sua identidade. De acordo com o portal da saúde2 é difícil que um adolescente procure ajuda com profissionais da saúde mental, geralmente isso só acontece com orientação dos pais ou de profissional como médico, assistente social, ou professor. A criação de um relacionamento de confiança entre o adolescente e o profissional de saúde mental é fundamental para que se possa tratar com maior facilidade transtornos inerentes a esta fase da vida. 468

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


De acordo com o estatuto da criança e adolescente art.7 a criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência (ECA, 2004). Entre os transtornos que acontecem neste período existe o transtorno bipolar do humor, que é caracterizado por oscilações de humor, com momentos de depressão e mania, que é entendido como uma euforia intensa sem motivo, por mudanças de comportamentos e por fases assintomáticas. São mudanças extremas, pois são diferentes dos altos e baixos normais que uma pessoa pode passar ao longo da vida. O início deste transtorno comumente ocorre entre os 20 e 30 anos, mas isto não é uma regra. De acordo com O Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais (DSM-IV-TR) há dois tipos de Transtorno Bipolar: o tipo I e o tipo II. O Transtorno Bipolar I é definido como a ocorrência de pelo menos um episódio maníaco com episódios de depressão maior durante o curso do transtorno. Não ocorre necessariamente a alternância, pode haver o predomínio de um extremo do humor e poucas crises do outro extremo. O Transtorno Bipolar do tipo II é caracterizado por apresentar episódio de hipomania acrescido da depressão.

Para uma pessoa ser diagnosticada com transtorno bipolar é necessário que os episódios maníacos durem pelo menos uma semana. A falta de tratamento ocasiona um período maior de episódios com alguns sintomas como elevada autoestima ou grandiosidades excessivas; diminuição da necessidade de dormir; fuga de idéias, isto é, uma necessidade muito grande de falar com um fluxo tão elevado que não se consegue concluir uma idéia. Emenda uma idéia a outra e facilidade em se distrair quando qualquer estímulo tira sua atenção. Nesta fase maníaca é comum que exista um descontrole e a pessoa faça compras desnecessárias, mesmo quando não pode pagar por elas. Também E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

469


pode ocorrer aumento da libido, irritabilidade, impaciência excessiva e vontade de fazer planos grandiosos. Os sintomas dos episódios depressivos ocorrem por no mínimo duas semanas, como por exemplo, estado de ânimo deprimido, mudança significativa no apetite (aumento ou diminuição) e no sono (insônia ou hipersonia), sentimentos de inutilidade ou culpa excessiva, perda de energia ou fadiga, indecisão e diminuição da capacidade de concentração, pensamentos recorrentes de morte ou de suicídio e até tentativas de suicídio. De acordo com (Passos, 2005) por vezes ocorre os quadros mistos, no qual os sintomas depressivos e maníacos são praticamente simultâneos. Em alguns casos de transtorno bipolar, podem aparecer sintomas psicóticos como alucinações (ouvir, ver ou sentir a presença de algo não efetivamente presente) ou delírios (falsa crença de que é outra pessoa, de que está sendo perseguido ou de grandeza). Estes episódios não são mais bem explicados por Transtorno Esquizoafetivo nem estão sobrepostos a Esquizofrenia ou a outros transtornos semelhantes. Todos os sintomas citados trazem prejuízos claros à vida do portador deste transtorno. Fatalmente há uma dificuldade nas relações interpessoais, no trabalho, com a família e com os amigos, por conta das flutuações nos níveis de sociabilidade. Tem-se um sentimento de confusão por não entender o porquê destas variações de humor e de comportamentos. Apesar da gravidade deste transtorno, o tratamento é possível. A pessoa pode conseguir uma estabilização e ter uma vida produtiva. No caso deste transtorno, o tratamento medicamentoso é fundamental. No geral, o objetivo da psicoterapia comportamental cognitiva é controlar os episódios agudos e prevenir novos episódios. Métodos para monitoramento e auto-estabilização são ensinados ao portador. Da mesma forma, são trabalhadas em terapia estratégias para dar conta de problemas cognitivos, afetivos e comportamentais que são associados com os sintomas maníacos e depressivos. 470

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


O acompanhamento familiar é muito importante, já que a família também sofre com as variações de humor desta pessoa.

O transtorno bipolar do humor e adolescência tem aumentado muito nos últimos anos. Talvez um dos grandes desafios do profissional de saúde mental quando atende um adolescente é tentar separar os sintomas próprios da idade com os da doença. A utilização de drogas e seu abuso dificultam o diagnostico abuso de drogas, é comum adolescentes apresentarem sintomas de doenças mentais, mas que são provenientes de abusos de substâncias. O certo é que um profissional capacitado irá eliminar todas as possibilidades, a fim de diagnosticar o tratamento correto. Talvez para os pais fica a tarefa mais difícil: Até que ponto meu filho(a) está reagindo como um adolescente normal. É muito difícil para os pais neste momento ir ao médico e solicitar um parecer. Alias é muito difícil para os pais aceitarem que seu filho (a) tem uma doença. É mais fácil acreditar que os sintomas são próprios da adolescência e que tudo mais cedo ou mais tarde irá passar. O transtorno bipolar do humor na adolescência pode ser diagnosticado por sintomas que devem ser avaliados principalmente pelos pais, médicos, psicólogos e profissionais da saúde. Entre os sintomas que devem ser investigados o fato do adolescente isolar-se em seu quarto com freqüência passando várias horas negando até mesmo refeições habituais, dormindo muito ou dorme pouco. Há casos de bipolares adolescentes que chegam a dormir 15 horas por dia, e outros que com 4 horas de sono estão se sentido plenos,gastos excessivos de dinheiro, ou controle demasiado para idade, o abuso de drogas. O adolescente começa a beber fumar e envolver-se com más companhias, rejeita constantemente convites para passear, festas entre outros, alguns até incitam a se matar, rebatem críticas com maestria, não aceitam críticas em hipótese alguma. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

471


A dificuldade em separar o que são sintomas do transtorno e características inerentes a fase adolescente é o que torna muito difícil para o profissional de enfermagem dar a assistência adequada ao adolescente com a bipolaridade.

39.2. METODOLOGIA Para identificar as principais dificuldades dos graduandos de enfermagem na percepção do papel do enfermeiro na assistência ao adolescente portador do transtorno bipolar a opção foi a pesquisa qualitativa. Pois permite trabalhar com universos de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes que correspondem a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos, justificando a indicação para um estudo qualitativo.

39.2.1. PARTICIPANTES Os sujeitos deste estudo foram 15 graduandos do curso de enfermagem que já cursaram a matéria de saúde mental.

39.2.2 INSTRUMENTOS A coleta de dados foi realizada por meio de questionário com questões semi estruturadas relacionadas com o objetivo do estudo.

39.2.3. PROCEDIMENTOS Após a aprovação do comitê de Ética em pesquisa com seres humanos da Universidade Paulista, a coleta de dados foi feita através de aplicação de questionário realizado pelo próprio pesquisador. Aconteceu na sala de aula, 472

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durante o período de aulas, durante os intervalos, após assinatura do termo de consentimento.

39.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS O material transcrito foi relido inúmeras vezes, e o procedimento é definido como “leitura flutuante”, que permite apreender as idéias centrais dos sujeitos da pesquisa sobre o tema em foco. Desta forma, os relatos foram organizados e buscou-se uma classificação inicial dos dados, de acordo com a semelhança dos temas surgidos.

39.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS A primeira variável pesquisada foi a faixa etária dos entrevistados e 27% dos entrevistados tem entre 20 e 29 anos de idade, 46% têm de 30 a 39 anos de idade e 27% dos entrevistados tem acima de 40 anos de idade. Com relação à área de ocupação 28% dos entrevistados trabalha na área da saúde como técnico de enfermagem e 39% como auxiliar de enfermagem, já 39% é estudante de enfermagem. Foi constatado que todos entrevistados estão cursando o 7° semestre do curso de enfermagem. Quando questionados sobre a importância do enfermeiro na assistência do portador do transtorno bipolar do humor, 100% dos entrevistados responderam que o papel do enfermeiro é importante na assistência do paciente. O que leva o autor a supor que já deveriam conhecer os problemas relacionados ao transtorno bipolar do humor. O transtorno bipolar do humor acomete cerca de 1% da população geral brasileira (Almeida-Filho et al.,1992). Mesmo sendo pouco freqüente, seu impacto sobre a vida dos indivíduos e seus grupos de convívio se traduz em um sério problema de saúde pública. Além disso, o conceito da doença sofreu E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

473


reformulações significativas nos últimos anos, ampliando-se o seu espectro (Angst, 2004). Desse modo, estudos mais recentes apontam para índices de prevalência até cinco vezes maiores, se comparados aos atuais (Akiskal, 1996). A partir desses novos critérios, cerca da metade dos indivíduos com diagnóstico para depressão unipolar poderia ser considerada portadora de transtorno bipolar tipo II (Perugi e Akiskal, 2002). Isso significa que essa categoria de transtorno bipolar pode ser mais prevalente que a depressão maior, requerendo atenção redobrada por parte dos profissionais e órgãos de saúde (Angst, 2004). Questionados em relação ao conhecimento do transtorno bipolar do humor, 14% dos entrevistados não conhecem o transtorno bipolar do humor e 86% sabem o que é o transtorno. Sobre quem deveria dar as orientações para o adolescente com o transtorno bipolar do humor e sua família, 40% respondeu que o médico deveria ser o responsável, 27% respondeu que deveria ser um psicólogo, já para 20% dos entrevistados o responsável deveria ser o enfermeiro e 13% acham que a família é a responsável por orientar o adolescente. Médico e psicólogo são citados como responsáveis pela orientação ao adolescente com transtorno bipolar do humor totalizando 67% das respostas dos entrevistados. Mas surge um dado curioso que podemos notar é que 100% dos entrevistados são alunos de enfermagem, mesmo assim obtivemos nas respostas dos sujeitos do estudo de que 14% deles desconhecem o transtorno bipolar do humor.

39.5. CONCLUSÕES A capacitação do graduando de enfermagem está aquém das complexidades do transtorno bipolar do humor devido às semelhanças entre as características 474

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da fase adolescente que marca a transição da infância para a vida adulta, nesta fase da vida como a puberdade, que ocorrem diversas transformações no adolescente, como mudança de humor, despertar para vida sexual, aceitabilidade como parte integrante da sociedade e rebeldia. Ficou evidenciado através das pesquisas que o adolescente não procura ajuda e a família tem menos conhecimento

em

relação

aos

sintomas

do

transtorno

dificultando

o

encaminhamento do paciente a um médico ou psicólogo, que são as pessoas mais preparadas para acompanhar e orientar esse jovem em relação ao tratamento do transtorno bipolar do humor. A pouca informação por parte dos graduandos de enfermagem sobre o assunto é um ponto relevante que foi levantado durante a elaboração desta pesquisa. As universidades devem estudar formas de ampliar o conhecimento para os graduandos, para que os mesmos possam orientar adolescentes que apresentem o transtorno bipolar do humor. REFERÊNCIAS APA – Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (4a ed. texto revisado). 2002. Almeida Filho, N.; Mari, J.J.; Coutinho, E. et al. – Estudo Multicêntrico de Morbidade Psiquiátrica em Áreas Urbanas Brasileiras (Brasília, São Paulo, Porto Alegre).Rev ABP-APAL 14: 93-104, 1992. Angst, J. - Bipolar Disorder: A Seriously Underestimated Health Burden [editorial]. Eur Arch Psychiatry Clin Neurosci 254: 59-60, 2004. Appolinário, Fabio. Dicionário de Metodologia Científica – Um Guia para a Produção do Conhecimento Científico. São Paulo: Atlas, 2004. Bercherie, Paul. Os Fundamentos da Clínica: história e estrutura do saber psiquiátrico. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2009. Título original: Les Fondements de la Clinique: Histoire et structures du savoir psychiatrique Perugi, G.; Akiskal, H.S. - The Soft Bipolar Spectrum Redefined: Focus on the Cyclothymic, Anxious-Sensitive, Impulse-Dyscontrol, and Binge-Eating Connection in Bipolar II and Related Conditions. Psychiatr Clin North Am 25(4): 713-737, 2002. São Paulo. Planalto da Republica. Estatuto da criança e do adolescente. São Paulo. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069.htm. Ministério da Saúde. A saúde de adolescentes e jovens: competências e habilidades.

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475


40.

ABUSO

E

NEGLIGÊNCIA

A

PESSOAS

IDOSAS:

FATORES

ASSOCIADOS À INTERVENÇÃO DOS ENFERMEIROS Helena Maria Júdice*; Carlos Alberto Sequeira**; José Ferreira-Alves*** *Escola Superior de Enfermagem de São Francisco das Misericórdias (Portugal) **Escola Superior de Enfermagem do Porto (Portugal) ***Escola de Psicologia da Universidade do Minho (Portugal)

RESUMO Nos últimos 20 anos o fenómeno do abuso e negligência na população idosa tem sido considerado como um fenómeno de grande impacto social que cruza os domínios da saúde, da justiça e dos direitos humanos. E apesar da dificuldade em tornar visível esse fenómeno, há já alguma literatura que identificou alguns dos seus determinantes e factores associados; é necessário, contudo, haver mais informação e formação junto de profissionais de saúde que os habilite a fazer o despiste do abuso e a saber lidar com as suas manifestações e implicações clínicas e psico-sociais. De entre os profissionais de saúde, os profissionais de enfermagem, devido à centralidade dos seus cuidados em contextos de saúde e à proximidade junto da pessoa, família e comunidade, podem estar numa posição privilegiada para efectuar o despiste e lidar com as manifestações do abuso à população idosa. (Trevitt & Gallagher, 1996; White, 2000; Baker & Heitkemper, 2005; Erlingson,Saveman &Berg, 2005; Pearsall, 2006; Muehlbaue & Crane, P.,2006; Stein, 2007) Nesta comunicação, apresentam-se dados descritivos sobre a prevalência do abuso na população idosa, explora-se o papel do enfermeiro na detecção do abuso, identificam-se dificuldades no despiste e na referenciação de casos e termina-se com a importância de investigar sobre os factores associados ao diagnóstico e intervenção dos enfermeiros em Portugal. 476

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Palavras-chave: abuso; idoso; diagnostico; enfermeiros

40.1. INTRODUÇÃO Desde os anos 60 que a violência familiar, infantil e doméstica, esta mais centrada na violência sobre as mulheres tem sido um tópico na agenda politica, social e jurídica. No entanto, desde os anos 70 acresceu a estas, a preocupação com o Abuso e Negligência a Pessoas Idosas, escondida frequentemente pelos outros tipos de violência familiar, (Gordon, R& Brill, D., 2001) Factores como o rápido envelhecimento da população, mudanças na organização social (estrutura familiar, papel das mulheres como cuidadoras principais nos contextos familiares), assim como a concepção do estatuto social do indivíduo com mais de 65 anos, numa perspectiva de desciminação pela idade (“ageism”/idadismo), têm contribuído para uma maior ocorrência de situações de abuso e negligência de idosos, em diferentes contextos, nomeadamente em casa. O abuso e negligência de idosos é definido como “ a acção única ou repetida, ou a falta de uma resposta apropriada, que ocorre dentro de qualquer relação onde exista uma expectativa de confiança e a qual produza dano ou angustia a uma pessoa idosa” (WHOb,2002). Embora existam diferentes classificações do tipo de abusos, uma das mais utilizadas

é

a

do

National

Center

of

Elder

Abuse,

(http://www.ncea.aoa.gov/ncearoot/Main_Site/index.aspx) que considera como categorias, o abuso físico, abuso psicológico / emocional, abuso de cariz sexual, abuso financeiro / exploração material, abandono, negligência, e ainda a categoria de auto negligência.

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

477


Estas situações têm importantes consequências para a saúde e bem-estar da

pessoa

idosa,

nomeadamente

baixa

qualidade

de

vida,

sofrimento

psicológico, múltiplos problemas de saúde e aumento da mortalidade. (PerelLevin, 2008).

40.2. DIMENSÃO DO PROBLEMA Numa revisão sistemática, realizada por Espindola & Blay (2007), que abrangeu estudos a nível mundial, a prevalência oscilou entre 0,8% e 16,6%. Nos estudos revistos, a definição de tipo de abuso, instrumentos utilizados, Idade da vítima e metodologias adoptadas variaram, o que poderá explicar o intervalo de prevalência encontrado. Embora exista ainda pouca informação acerca da extensão do problema, nos países desenvolvidos, a OMS estima que 4 a 6% de pessoas idosas em países desenvolvidos, experienciaram alguma forma de abuso em casa. (WHO, 2011) Relativamente a estudos de prevalência na Região Europeia, um estudo multicêntrico, ABUEL, que incluía a Alemanha (Estugarda); Grécia; Itália (Ancona); Lituânia (Kaunas), Portugal (Porto), Espanha (Granada), Suécia (Estocolmo) revelaram valores globais de 19,4% de abuso psicológico (29 milhões de idosos), 3,8% de abuso financeiro (6 milhões de idosos), 2,7% de abuso físico (4 milhões de idosos) e 0,7% de abuso sexual (1 milhão de idosos) (Soares et al, 2010) De salientar que os dados de Portugal, que são referentes à cidade do Porto são superiores aos valores de cada uma das cidades envolvidas, destacando-se o abuso psicológico e o abuso financeiro e com menor frequência o abuso físico e o abuso sexual. (Soares et al, 2010)

478

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Noutro estudo realizado a nível nacional (Ferreira - Alves & Santos, 2011), inserido no Projecto AVOW, relativo apenas ao abuso sobre mulheres idosas, registou-se um valor global de 39,4%, ou seja aproximadamente 4 em cada 10 mulheres idosas são sujeitos a algum tipo de abuso; esta foi a percentagem mais elevada de entre o conjunto dos países participantes. Numa revisão bibliográfica rectrospectiva, realizada por Santos,A.; FerreiraAlves,J. & Penhale, B. (2011) relativa a estudos de prevalência realizados em Portugal, estes revelam uma elevada prevalência de abuso, com valores entre 66,7% e 86,7%. O abuso emocional e negligência foram as formas mais prevalentes de abuso, seguidas do abuso financeiro, sendo o abuso fisico o menos prevalente. Baixa percepção de saúde, isolamento (não fazerem/terem visitas) e residir em áreas urbanas, foram os factores associados ao abuso de pessoas idosas.

40.3. PAPEL DO ENFERMEIRO Os enfermeiros, individualmente ou num contexto multidisciplinar têm sido considerados “the frontline workers”, na comunidade, nos serviços de urgência, nos cuidados intensivos ou em qualquer outro contexto de prestação de cuidados de enfermagem, qualquer que seja a sua especialidade, desde saúde comunitária à psiquiatria e saúde mental, dado que são os primeiros a ter a possibilidade e a responsabilidade de avaliar o risco, detectar e intervir face a situações de abuso. (Trevitt & Gallagher, 1996; White, 2000; Baker, Heitkemper, 2005; Erlingson,Saveman, Berg, 2005; Pearsall, 2006; Muehlbauer; Crane, P. ,2006; Stein, 2007) Na área da prestação de cuidados de saúde, os profissionais que trabalham em contextos comunitários, como os médicos de clínica geral (Gonçalves, 2006), e enfermeiros (Oh e tal, 2006), detêm uma posição privilegiada na prevenção e detecção precoce de casos. Destes, os enfermeiros que trabalham em Cuidados E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

479


Domiciliários estão numa posição chave no reconhecimento e intervenção no abuso a pessoas idosas nas suas diferentes formas, uma vez que a forma mais frequente de abuso ocorre no âmbito familiar e em contexto domiciliário.

40.3.1 DIFICULDADES DE DIAGNÓSTICO E SUB-REFERENCIAÇÃO O diagnóstico de situação de abuso coloca inúmeras dificuldades ao profissional de saúde. Frequentemente existem sintomas como perda de peso, fadiga, depressão, dificuldade de cicatrização de feridas, aspectos que são dificeis de diferenciar se ocorrem como resultado de abuso ou como resultado da fase de envelhecimento. Mesmo sinais de abuso fisico como equimoses, hematomas e fracturas podem ser consideradas como resultado de quedas ou dificuldades na mobilidade (Utley,1999), alem de que os abusos psicológicos e financeiros não são detectáveis pela observação e relativamente ao financeiro, muito frequente em Portugal, como referido anteriormente, é dificil perceber se eventualmente quando o familiar/cuidador assume o papel de gestor do dinheiro,o faz apenas por dificuldades da pessoa idosa e utiliza-o para suprir todas as necessidades deste, ou se o utiliza para outros fins e está com algum nivel de negligência, por exemplo no fornecimento de proteses oculares ou outras. Face à complexidade e multidimensionalidade do fenómeno é consensual a ideia de que é um problema sub-diagnosticado e sub-referenciado (Oh et al, 2006; Gonçalves, 2006). As representações sociais da pessoa idosa, as atitudes de discriminação com base na idade(“ageism”) a falta de conhecimentos sobre o que constitui abuso, tendência para minimizar queixas ou sintomas e atitudes de negação, vergonha ou medo são factores que contribuem para que estas situações sejam sub-diagnosticadas.. Por outro lado o, desconhecimento de procedimentos

de

deteção

e

de

referenciação,

fronteiras

entre

a

confidencialidade e o medo da quebra de sigilo, são também aspectos que constituem barreiras sentidas pelos diferentes profissionais de saúde e que 480

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


contribuem

para

a

sub-referenciação.

(Anetzberger,2004;

Bernal

&

Gutierrez,2005; Pearsall, 2006, Phelan, 2008) Por outro lado, a pessoa idosa frequentemente receia denunciar a situação aos familiares, amigos ou autoridades, e é relutante em pedir ajuda devido, entre outros factores: ter diferentes conceitos de situações que possam ser abusivas, tendo

em

conta

as

suas

experiências

de

vida,

com

consequente

dessensibilização para algumas formas de abuso; medo de recriminação e baixa auto-estima; medo de ficarem sós ou serem institucionalizados; medo de represálias; vergonha; isolamento e /ou dependência do cuidador; consideraremse a causa do problema; considerar a situação de abuso como um acontecimento isolado provocado pelo elevado nível de stress do abusador; e dificuldade em admitir que está a ser abusado por um familiar, habitualmente próximo. (Anetzberger,2004; Bernal & Gutierrez,2005) No estudo realizado em Portugal (Ferreira-Alves & Santos, 2011) as causas apontadas pelos idosos para não denunciarem a situação, são semelhantes, e relacionam-se com a percepção de que ninguém pode fazer nada( 84,8 %), o incidente é considerado como trivial (78,9%), não quer intervenção exterior (73,9%), têm vergonha / sentimentos de culpa (55,6%), medo de retaliação pelo agressor (37,5%), não querer que o agressor seja preso (36,4%), ou medo de ninguém acreditar no abuso (33,3%).

40.3.2.

GESTÃO

DA

SITUAÇÃO

PELOS

PROFISSIONAIS

DE

SAÚDE

-

INTERVENÇÃO Se a confirmação de uma suspeita e consequente diagnóstico de abuso e negligência é complexa, não o é menos a gestão desta informação / conhecimento pelo profissional de saúde. A estas dificuldades acrescem as barreiras sentidas pelos profissionais de saúde, sendo importante conhecer as barreiras conscientes ou não, que E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

481


impedem os profissionais de detectar e gerir situações de maus tratos e o conhecimento do que pode ser feito para ultrapassar essas mesmas barreiras é essencial (Perel-Levin, 2008) Dos estudos existentes cujo foco se centrou nos profissionais de saúde existem estudos essencialmente referentes a médicos, que trabalham em contextos de Cuidados de Saúde Primários, (Krueger & Patterson, 1997, Rodriguez et al, 2006; Taylor et al, 2006), e um realizado com enfermeiros (Pearsell, 2006) Nestes, os factores associados ao diagnóstico e intervenção em situações de abuso e negligência de idosos eram: o idoso ou a família negarem a situação, oposição à intervenção, falta de conhecimento sobre a definição de maus tratos e da prevalência, (Krueger & Paterson, 1997; Pearsell, 2006 ), alterações na relação terapêutica, percepção da qualidade de vida do idoso, e o que consideram ser do melhor interesse para o idoso, (Rodriguez et al, 2006), desconhecimento sobre procedimentos de denuncia (Taylor et al, 2006); inexistência de um organismo para a denúncia da situação e a falta de consenso sobre o diagnóstico e sobre a implementação de intervenções face a situações de abuso e negligência de idosos. (Krueger & Paterson, 1997) De acordo com a revisão sistemática da literatura realizada por Perel-Levin (2008), os diferentes estudos referentes às dificuldades sentidas pelos profissionais de saúde na identificação e gestão de situações de violência doméstica (criança, adulto e idoso), surgiram factores relacionados sobretudo com medo de serem alvo de violência, medo de ofender, sentimento de impotência, medo de retaliação e a “tirania do tempo” sendo estes aspectos não referenciados em vários estudos especificamente realizados na área de abuso e negligência a idosos. No entanto, a maioria dos estudos tem uma perspectiva essencialmente de evidência médica, sendo importante aprofundar outra perspectiva referente às dificuldades dos profissionais de saúde relacionadas por um lado aos contextos culturais e por outro aos aspectos ligados à 482

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


discriminação com base na idade(“ageism”), que podem condicionar as atitudes dos profissionais na não valorização das situações como abuso. . Para que os profissionais possam detectar e intervir, necessitam de ter consciência da existência do problema, dos sinais e sintomas e das consequências (Perel-Levin, 2008). Para que seja possível implementar estratégias preventivas de Abuso e Negligência a Pessoas Idosas, é necessário que existam serviços de apoio e protecção, programas educativos e a declaração obrigatória dos casos suspeitos ou em risco de existir abuso, pelos diferentes profissionais de saúde (WHO, 2002) Para isso é essencial a formação de todos os profissionais de saúde nesta área para que desenvolvam competências de forma conhecer os factores predictores (Giurani & Hasan, 2000) assim como conhecer, e identificar precocemente os sinais de Abuso e Negligência a Pessoas Idosas (Giurani & Hasan, 2000; WHO, 2002). Em Portugal o Plano Nacional de Saúde (DGS, 2004) define nas Orientações estratégicas e intervenções necessárias no objectivo “Promover e desenvolver, intersectorialmente, ambientes capacitadores de autonomia e independência dos idosos” a estratégia de desenvolver as competências dos profissionais de saúde para detectar e encaminhar, adequadamente, situações de violência e de abuso e negligência a pessoas idosas. No entanto para dar resposta cabal a estes objectivos é necessário conhecer a realidade. Só identificando um padrão de conhecimentos, atitudes e práticas se pode delinear estratégias de intervenção. Neste sentido investigar nesta área em Portugal é uma necessidade premente. Com o objectivo de identificar os factores associados ao diagnóstico e intervenção dos enfermeiros em Portugal será desenvolvido um estudo exploratório, descritivo, correlacional.

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

483


Este estudo tem como objectivos específicos, explorar e identificar os factores associados ao diagnóstico e intervenção, na área do abuso e negligência de pessoas idosas, pelos profissionais de enfermagem em Portugal, assim como caracterizar as práticas de diagnóstico e intervenção utilizadas. Identificar os factores associados ao diagnóstico/intervenção e caracterizar as práticas permitirá gerar contributos para a definição e priorização de estratégias ao nível Micro e Macro sistémico. Nomeadamente: •

Construção de Curricula, ao nível pré-graduado, pós-graduado e formação contínua, adaptados à realidade portuguesa;

Construção de normas de orientação clinica

Definição de circuitos de referenciação de casos

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Anetzberger,G.J. et al (2004) A model intervention for Elder Abuse and Dementia. The Gerontologist, 40, p. 492-497 Baker, MW; Heitkemper, MM (2005) The roles of nurses on interprofessional teams to combat elder mistreatment. Nursing Outlook, 53 (5) p. 253-259 Bernal, A. M. & Gutierrez, J.B. Coord. (2005) Malos tratos a personas mayores. Guia de actuacion. Madrid: Ministerio de Trabajo y Asuntos Sociales, IMERSO Direcção Geral da Saúde (DGS) (2004) Plano Nacional de Saúde 2004-2010- Orientações estratégicas. Vol. 2. Ministério da Saúde, Portugal Erlingson,C ; Saveman&B; Berg, A (2005) Perceptions of Elder Abuse in Sweden: Voices of Older Persons. Brief Treatment and Crisis Intervention, 5, p. 213-227 Espindola, C.& Blay, L. (2007) Prevalência de maus tratos na 3ª idade: Revisão sistemática. Revista de Saúde Pública, 41 (2) p. 303-304 Ferreira- Alves, J.& Santos, A. J.( 2011) Prevalence Study of Violence and Abuse Against Older Women. Results of the Portugal Survey (Avow Project). Portugal: Minho University, Braga 484

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


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486

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41. ESTUDO DE CASO – DEPRESSÃO MAJOR Nelson Alexandre Simões de Oliveira*; Catarina Cardoso Tomás**

*Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria, Mestre em ESM Psiquiatria. Enfermeiro na Unidade CHMT – Tomar , 912299452, enfenelson@hotmail.com, PORTUGAL **Enfermeira Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria, Doutoranda em Ciências de Enfermagem, Professora Assistente na Escola Superior de Saúde de Leiria do Instituto Politécnico de Leiria, 919173035, catarina.cardosot@gmail.com, PORTUGAL

RESUMO A depressão, atualmente a maior causa de incapacidade, compromete a satisfação das necessidades humanas básicas, bem como a realização das atividades de vida diárias. Várias terapias, como a psicoterapia de apoio, terapias cognitivo

e

cognitivo-comportamentais,

terapias

interpessoais,

de

aconselhamento e familiar, têm-se revelado úteis na abordagem ao doente deprimido. O enfermeiro assume um papel fundamental no desenvolvimento e aplicação destas terapias. O estudo de caso apresentado descreve uma compreensão do fenómeno da depressão major e a sua evolução num espaço de três semanas, tendo por base a intervenção particular de enfermagem em contexto de internamento a um doente depressivo selecionado por método de conveniência. A intervenção foi realizada recorrendo ao processo de enfermagem, linguagem CIPE, e adequando a intervenção ao doente selecionado e patologia expressada. Os principais objetivos deste estudo foram: conhecer o ambiente familiar e sociocultural do doente, de forma a compreender a evolução cronológica da doença; descrever os diagnósticos e intervenções de enfermagem em linguagem CIPE em função das necessidades particulares do doente; e compreender a eficácia da intervenção de enfermagem na recuperação patológica do doente.

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

487


Foram utilizadas diversas metodologias de colheita e gestão de dados, como vários instrumentos de avaliação (coping resiliente, ansiedade, crenças acerca dos fármacos e estado mental), bem como diário de bordo, guião de entrevista semiestruturada, Intervenção familiar modelo de Calgary, duas entrevistas sistémicas com a presença do doente e observação do comportamento do doente. Obteve-se uma evolução significativamente favorável no doente em que se interveio, em termos de sinais e sintomas, avaliados tendo em conta o exame mental e a aplicação de instrumentos de avaliação quantitativa. Demonstrou-se assim uma eficácia de prestação de cuidados de enfermagem adequada com a evolução

clinica

aqui

expressada,

revelando

ganhos

substanciais

na

independência em AVD´s.

Palavras-chave: Depressão; Intervenção de enfermagem; Psicoterapia.

41.1. INTRODUÇÃO A doença depressiva apresenta um conjunto de sintomas físicos e mentais, de intensidade e duração variáveis, que envolvem o pensamento, os impulsos e a capacidade crítica. Caracteriza-se geralmente por um aumento exagerado das sensações diárias que acompanham a tristeza (Wilkinson, Moore & Moore, 2005). Na depressão grave, a ideação, planeamento ou tentativa de suicídio está muitas das vezes presente, sendo a depressão maior causa de suicídio (WHO, 2002). A depressão é atualmente a maior causa de incapacidade (11.9%), sendo considerada a quarta maior causa de patologia a nível mundial, prevendo-se que atinja o segundo lugar nos próximos 20 anos. (WHO, 2002). Para além dos sintomas físicos que comprometem o normal funcionamento do indivíduo, sintomas como fadiga, diminuição de interesse ou prazer, lentificação 488

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


psicomotora,

sentimentos

de

desvalorização

ou

culpa,

dificuldade

de

concentração, indecisão, perda de desejo sexual e ausência de resposta emocionais habituais, entre outros, levam geralmente a uma dificuldade expressa da satisfação das necessidades humanas básicas, realização das atividades de vida diárias e a um empobrecimento das relações e papéis sociais, que, por sua vez, agravam a sintomatologia (Wilkinson, Moore & Moore, 2005). Quando utilizadas de modo apropriado, terapias psicológicas como a psicoterapia de apoio, terapias cognitivo e cognitivo-comportamentais, terapias interpessoais, de aconselhamento e familiar, têm-se revelado úteis na abordagem ao doente deprimido. O desenvolvimento de competências pessoais e interpessoais, bem como a reestruturação cognitivo-comportamental realizada com recurso a estas terapias, permite ao doente o aumento de competências e recursos para uma redução da sintomatologia depressiva (Wilkinson, Moore & Moore, 2005). A intervenção de enfermagem em utentes com perturbação depressiva deve envolver uma capacidade grande de autocontrolo e compreensão. É essencial dar tempo ao doente para se expressar, confiar ou realizar as suas atividades, que devem ser planeadas cuidadosamente. Atividades individuais poderão ser importantes quando o objetivo é diminuir a estimulação, enquanto atividades de grupo se tornam benéficas para a construção e desenvolvimento da autoestima. O enfermeiro deve privilegiar uma postura de honestidade, consistência, compreensão e calma perante o utente, procurando oferecer um apoio mais concreto e definido em situações específicas, evitando os reforços gerais sem intenção objetiva (Neeb, 2000). O autor Yin (1994:13) define “estudo de caso” com base nas características do fenómeno em estudo e com base num conjunto de características associadas ao processo de recolha de dados e às estratégias de análise dos mesmos. Ponte (2006) considera que é um tipo de investigação que se assume como particularística, isto é, que se debruça deliberadamente sobre uma situação E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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específica que se supõe ser única ou especial, pelo menos em certos aspetos, procurando descobrir a que há nela de mais essencial e característico e, desse modo, contribuir para a compreensão global de um certo fenómeno de interesse.” (Ponte, 2006:2). O presente estudo descreve e relata uma compreensão do fenómeno da depressão major e a sua evolução num espaço de três semanas na intervenção particular de enfermagem em contexto de internamento. A intervenção foi realizada com recurso a processo de enfermagem, linguagem CIPE, e adequando a intervenção ao doente e patologia expressada, procurando rever práticas de enfermagem, adequação de diagnósticos e intervenções de enfermagem realizadas. Os principais objetivos deste estudo foram: •

Conhecer o ambiente familiar e sociocultural do doente, de forma a

compreender a evolução cronológica da doença; •

Descrever os diagnósticos e intervenções de enfermagem em linguagem

CIPE em função das necessidades particulares do doente; •

Compreender a eficácia da intervenção de enfermagem na recuperação

patológica do doente.

41.2. METODOLOGIA Em

contexto

de

intervenção

clinica

realizou-se

uma

abordagem

metodológica de investigação de estudo de caso na depressão major, procurando compreender, explorar e descrever acontecimentos e contextos complexos, nos quais estão simultaneamente envolvidos diversos fatores de abordagem de intervenção de enfermagem em saúde mental e psiquiátrica, no caso particular da abordagem científica de enfermagem na depressão major. Foi 490

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salvaguardado o Consentimento informado, bem como a confidencialidade da identidade através da utilização de nomes e local de atuação fictícios.

41.2.1. PARTICIPANTES O presente estudo foi realizado com recurso a uma amostra de conveniência (amostra que evidencia características distintas das amostras probabilísticas presentes nas investigações de carácter quantitativo), com um participante. A utente A. S. é do sexo feminino, tem 58 anos, é natural e residente numa aldeia da Região Centro, vivendo sozinha, em casa própria. É viúva e vive da pensão de viuvez, residindo durante o dia em centro de dia.

41.2.2. INSTRUMENTOS Para a avaliação do estado mental e evolução sintomatológica do doente foram utilizadas quatro escalas: •

Questionário de Crenças acerca dos Fármacos (elaborado por Horne,

Weinman & Hankins, 1997, traduzido e validado para a população portuguesa por Pereira e Silva, 1998), que avalia a crença dos doentes em relação aos efeitos nocivos e uso excessivo dos fármacos; •

Escala Breve de Coping resiliente (desenvolvida por Sinclair & Wallston,

2003, traduzida e adaptada para a população portuguesa por Ribeiro e Morais, 2010), com o objectivo de avaliar o nível de coping resiliente, através de um padrão ativo de resolução de problemas; •

Escala de avaliação de Ansiedade de Hamilton (criada por Hamilton em

1959) que avalia os sintomas físicos e os sintomas somáticos da ansiedade; E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

491


Mini Mental State Examination (elaborado por Folstein, Folstein, & McHugh,

1975, traduzido e validado para a população portuguesa por Guerreiro, Silva, Botelho, Leitão, Castro-Caldas, & Garcia, 1994) permite a avaliação da função cognitiva ao nível da orientação no tempo e espaço, memória, competências visuais e espaciais, verbais e de escrita. Para além dos instrumentos referidos, foram utilizados outras metodologias de colheita e gestão de dados, como diário de bordo, guião de entrevista semiestruturada, Intervenção familiar modelo de Calgary, duas entrevistas sistémicas com a presença do doente e observação do comportamento do doente.

41.2.3. PROCEDIMENTOS O doente foi acompanhado durante três semanas consecutivas. O diagnóstico inicial foi realizado numa entrevista com base na utilização dos instrumentos referidos e das metodologias de colheita de dados. A partir desta avaliação inicial, foram levantados os diagnósticos prioritários de intervenção em enfermagem de acordo com a linguagem CIPE, nomeadamente adesão ao regime terapêutico comprometido em grau elevado, coping ineficaz em grau elevado e a ansiedade em grau muito elevado. Foram então planeadas e aplicadas intervenções de enfermagem com base nos diagnósticos de enfermagem (Tabelas 1, 2 e 3). Avaliações regulares foram realizadas, utilizando as mesmas formas de colheitas de dados, com vista à avaliação da evolução do processo sintomatológico do doente.

492

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Tabela 1 – Processo de enfermagem (1.ª semana) Diagnóstico

Resultados

de enfermagem Adesão

Intervenções de enfermagem

esperados

ao -

a - Conhecer o esquema terapêutico realizado

Reduzir

regime

crença

de pela utente no domicílio

terapêutico

efeitos nocivos

comprometido e uso excessivo em que grau dos

fármacos

elevado

8

para

- Validar com a utente a gestão farmacológica realizada no domicílio

12 - Questionar acerca da forma de gestão dos respetivamente, fármacos, nomeadamente doses e horários no

e

prazo

de - Realizar ensinos acerca dos efeitos dos

uma semana

fármacos e da necessidade de aderir ao regime -

Aumentar

adesão regime

a medicamentoso ao - Ensinar acerca dos benefícios dos fármacos e da

terapêutico,

importância

de

seguir

o

regime

o medicamentoso

durante internamento Coping ineficaz

-

Aumentar

a - Encorajar a verbalização de perceções,

em resiliência para sentimentos e medos;

grau elevado

um nível médio (13 pontos na escala breve de coping

habilidades; - Ajudar a identificar as suas capacidades de realizar determinadas tarefas, como as que

resiliente) durante

- Ajudar a identificar as suas forças e

uma

realiza no centro de dia ou em casa - Ajudar a identificar as suas características

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

493


semana

positivas

que

permitiram

ultrapassar

problemas no passado - Ajudar a procurar os recursos disponíveis para atingir os objetivos propostos; -

Promover

a

identificação

de

meios

adequados para a resolução de problemas, como o centro de dia, a vizinha e o irmão L. M. - Ajudar na identificação dos sistemas de suporte disponíveis; Ansiedade em grau

Diminuir

a - Oferecer escuta ativa

muito ansiedade para

elevado

um elevado

grau (18

pontos: 12 no

- Nos momentos de maior ansiedade, realizar entrevista

encorajando

a

verbalização

de

sentimentos, perceções e medos

humor ansioso - Ajudar a identificar situações que precipitem e 6 nos ansiedade sintomas

- Ajudar a associar os sintomas de ansiedade

físicos) durante com os momentos em que se confronta com uma semana determinados problemas - Promover suporte emocional -

Nos

momentos

de

maior

ansiedade,

permanecer com o utente, num ambiente calmo,

com

sensorial,

diminuição

permitindo

a

da

estimulação

expressão

sentimentos

494

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

de


Tabela 2 – Processo de enfermagem (2.ª semana) Diagnóstico

Resultados

de enfermagem Adesão

Intervenções de enfermagem

esperados

ao -

Reduzir

a - Realizar ensinos acerca dos efeitos dos fármacos e

regime

crença de efeitos da necessidade de aderir ao regime medicamentoso

terapêutico

nocivos

e

comprometido excessivo

uso dos

em que grau fármacos para 5 moderado

- Ensinar acerca dos benefícios dos fármacos e da importância de seguir o regime medicamentoso

e

10 - Ensinar acerca das características dos fármacos e respetivamente, dos seus efeitos no prazo de uma semana

- Conhecer a disponibilidade dos técnicos do centro de

-

Aumentar

adesão

dia

para colaborar

na

gestão do regime

a medicamentoso da utente e realizar ensinos aos ao mesmos

regime terapêutico, durante

- Propor estratégias de gestão do regime terapêutico o à utente e aos técnicos do centro de dia

internamento

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

495


Coping ineficaz

-

Aumentar

em resiliência

grau elevado

a -

Encorajar

a

verbalização

de

perceções,

para sentimentos e medos;

um nível forte (17 pontos na escala

- Ajudar a identificar as suas forças e habilidades;

breve de coping - Ajudar a identificar as suas capacidades de realizar resiliente) determinadas tarefas, como as que realiza no centro durante

uma de dia ou em casa

semana - Ajudar a identificar as suas características positivas que permitiram ultrapassar problemas no passado - Ajudar a procurar os recursos disponíveis para atingir os objetivos propostos; - Promover a identificação de meios adequados para a resolução de problemas, como o centro de dia, a vizinha e o irmão L. M. - Ajudar na identificação dos sistemas de suporte disponíveis; - Ajudar a pessoa a reorientar os objetivos complexos, para pequenas etapas;

496

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


Ansiedade em grau

Diminuir

muito ansiedade

moderado

a - Oferecer escuta ativa para

um grau reduzido (8 pontos: 7 no humor ansioso e

- Nos momentos de maior ansiedade, realizar entrevista

encorajando

a

verbalização

de

sentimentos, perceções e medos

1 nos sintomas - Ajudar a identificar situações que precipitem físicos) durante ansiedade uma semana - Ajudar a associar os sintomas de ansiedade com os

momentos

em

que

se

confronta

com

determinados problemas - Promover suporte emocional - Nos momentos de maior ansiedade, permanecer com o utente, num ambiente calmo, com diminuição da estimulação sensorial, permitindo a expressão de sentimentos - Proporcionar ajuda na tomada de decisões -

Ajudar

a

identificar

os

problemas

e

as

possibilidades de resposta aos mesmos - Ajudar a perceber as vantagens e desvantagens de cada solução e a identificar a mais vantajosa

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

497


Tabela 3 – Processo de enfermagem (3.ª semana) Diagnóstico

Resultados

de enfermagem Adesão

Intervenções de enfermagem

esperados

ao -

Reduzir

regime

crença

terapêutico

efeitos

a -

ensinos

acerca

dos

efeitos

dos

de fármacos e da necessidade de aderir ao regime nocivos medicamentoso

comprometido e uso excessivo em que grau dos

fármacos

moderado

3

para

Realizar

e

6

respetivamente,

- Ensinar acerca dos benefícios dos fármacos e da

importância

de

seguir

o

regime

medicamentoso

no prazo de uma - Ensinar acerca das características dos fármacos semana e dos seus efeitos -

Aumentar

adesão

a - Conhecer a disponibilidade dos técnicos do ao centro de dia para colaborar na gestão do regime

regime

medicamentoso da utente e realizar ensinos aos

terapêutico,

mesmos

durante internamento

o -

Propor

estratégias

de

gestão

do

regime

terapêutico à utente e aos técnicos do centro de dia - Propor estratégias como a utilização de caixas de distribuição de doses e lembretes e em várias zonas visíveis da casa para a toma da medicação - Articular com o ambulatório de psiquiatria o seguimento do caso após alta hospitalar. Coping 498

-

Aumentar

a -

Encorajar

a

verbalização

de

perceções,

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


ineficaz

em resiliência

grau

um

nível

moderado

(17

pontos

para sentimentos e medos; forte na

- Ajudar a identificar as suas forças e habilidades;

escala breve de - Ajudar a identificar as suas capacidades de coping realizar determinadas tarefas, como as que realiza resiliente) durante semana

no centro de dia ou em casa uma - Ajudar a identificar as suas características positivas que permitiram ultrapassar problemas no passado - Ajudar a procurar os recursos disponíveis para atingir os objetivos propostos; - Promover a identificação de meios adequados para a resolução de problemas, como o centro de dia, a vizinha e o irmão L. M. - Ajudar na identificação dos sistemas de suporte disponíveis; - Ajudar a pessoa a reorientar os objetivos complexos, para pequenas etapas;

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

499


Ansiedade em grau

Diminuir

muito ansiedade

moderado

pontos:

a - Oferecer escuta ativa (3

3

no

humor ansioso e 0 nos sintomas

- Nos momentos de maior ansiedade, realizar entrevista

encorajando

a

verbalização

de

sentimentos, perceções e medos

físicos) durante - Ajudar a identificar situações que precipitem uma semana ansiedade - Ajudar a associar os sintomas de ansiedade com os momentos em que se confronta com determinados problemas - Promover suporte emocional - Nos momentos de maior ansiedade, permanecer com

o

utente,

num

ambiente

calmo,

com

diminuição da estimulação sensorial, permitindo a expressão de sentimentos - Proporcionar ajuda na tomada de decisões -

Ajudar

a

identificar

os

problemas

e

as

possibilidades de resposta aos mesmos - Ajudar a perceber as vantagens e desvantagens de cada solução e a identificar a mais vantajosa - Ajudar a utente a encontrar estratégias de tomada de decisão perante problemas - Ajudar a identificar problemas, soluções e a escolher a solução mais adequada.

500

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41.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS Verificou-se uma evolução crescente do estado mental patológica da doente, observando-se: Primeira semana: Doente que mantém humor deprimido, fácies pouco expressivo, com o contacto fácil. Comunicativa quando solicitada, com discurso coerente e organizado. Orientada auto e alopsiquicamente. Mantém ideias delirantes persecutórias. Sem crítica para o internamento e para a doença. Nega ideação

suicida.

Sem

perspectivas

de

futuro.

Mantém

comportamentos

adequados. Apresenta Mini Mental State Examination com score 27, Questionário de Crenças Acerca de Fármacos (Factor Uso excessivo, 15 pontos; Factor efeitos nocivos, 12 pontos); Escala Breve de Coping resiliente (4 pontos – resiliência baixa), Escala de Avaliação de Ansiedade de Hamilton (28, muito elevado – sintomas de humor ansioso, 21 pontos; sintomas físicos, 7 pontos). Segunda semana - A utente encontra-se calma, colaborante, com adesão ao regime terapêutico. Apresenta humor deprimido, fácies pouco expressivo, expressando alguns sorrisos, e postura retraída. O contacto é fácil, interativa e comunicativa,

o

discurso

é

coerente

e

pronto.

Orientada

auto

e

alopsiquicamente, demonstra comportamentos adequados. Não manifesta atividade psicótica, negando ideação suicida. Sem perspectivas de futuro. Apresenta: Questionário de Crenças Acerca de Fármacos (Factor Uso excessivo, 13 pontos; Factor efeitos nocivos, 7 pontos), Escala Breve de Coping Resiliente (10 pontos – resiliência baixa), Escala de Avaliação de Ansiedade de Hamilton (14, moderado – sintomas de humor ansioso, 11 pontos; sintomas físicos, 3 pontos). Terceira Semana: A utente encontra-se calma, colaborante, aderindo ao regime terapêutico. Humor é eutímico, o fácies expressivo, expressando alguns sorrisos, e a postura mais expansiva. O contacto é fácil, está interativa e comunicativa, com discurso coerente e pronto. Manifesta interesse em comunicar com os profissionais. Orientada auto e alopsiquicamente, e com um comportamento E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

501


adequado. Não manifesta atividade psicótica, e nega ideação suicida. Demonstra preocupação com a sua aparência física. Revela perspectivas de futuro (quer voltar para o centro de dia) e uma maior capacidade de resolução de problemas. Apresenta: Questionário de Crenças Acerca de Fármacos (Factor Uso excessivo, 10 pontos; Factor efeitos nocivos, 5 pontos), Escala Breve de Coping Resiliente (14 pontos – resiliência média) Escala de Avaliação de Ansiedade de Hamilton (7, reduzido – sintomas de humor ansioso, 6 pontos; sintomas físicos, 1 pontos).

41.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Verificou-se uma evolução significativa no doente em termos de sinais e sintomas, avaliados tendo em conta o exame mental e a aplicação de Instrumentos de avaliação quantitativa. Observou-se uma diminuição dos níveis de ansiedade que se verificou por uma redução dos sintomas reveladores da mesma, quer físicos, quer de humor. Também uma maior adesão ao regime terapêutico, bem como uma redução da perceção de efeitos nocivos e uso excessivo em relação aos fármacos foi verificada, o que evidencia uma maior capacidade de gestão terapêutica promotora de uma diminuição de probabilidade de reinternamento. A capacidade de resolução de problemas e desenvolvimento de estratégias de adaptação às novas situações e adversidades foi uma das competências que sofreu um desenvolvimento significativo, demonstrado pelo aumento dos níveis de coping resiliente. De uma forma global, o desenvolvimento das competências pessoais, bem como a progressão positiva do humor, atitude, pensamento, de entre outros parâmetros avaliados permite verificar que, tal como sugere Wilkinson, Moore & Moore (2005) a aplicação de terapias cognitivas e cognitivo-comportamentais são eficazes no desenvolvimento de competências pessoais e sociais e recursos com vista à redução da sintomatologia depressiva, bem como à promoção da 502

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capacidade de realização das atividades de vida diárias e satisfação das necessidades humanas básicas do doente. Percebeu-se também que, tal como Neeb (2000) descreve, a intervenção de enfermagem no doente depressivo ao nível da psicoterapia e terapia comportamental, apresenta um caráter essencial na evolução do seu quadro sintomatológico.

41.5. CONCLUSÕES Com a prática de estudo de caso na clínica revelada denota-se uma evolução positiva do estado mental do doente, revelando uma correta administração de diagnósticos de intervenção em enfermagem com particular evidência quantificada nas escalas de avaliação quanto à qualidade da independência expressada pelo doente. Consideramos uma eficácia de prestação de cuidados de enfermagem adequada com a evolução clinica aqui expressada, revelando ganhos substanciais na independência em AVD´s.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Neeb, K (2000). Fundamentos de Enfermagem de Saúde Mental. Trad. Fernandes, G. Loures: Lusociência. Ponte, J (2006). Estudos de caso em educação matemática. Bolema, 25, 105-132. Wilkinson, G, Moore, B & Moore, P (2005). Guia Prático Climepsi do Tratamento da Depressão. 1.ª Edição. Lisboa: Climepsi Editores. World Health Organization (2001). Relatório Mundial de Saúde. Saúde mental: nova conceção, nova esperança. Lisboa: Direção Geral de Saúde/OMS. Yin, R (1994). Case Study Research: Design and Methods. 2ª Edição. Thousand Oaks, CA: SAGE Publications.

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503


42. MOVIMENTO E RELAXAMENTO: UMA ESTRATÉGIA NO CONTEXTO DA INTERVENÇÃO DE ENFERMAGEM Olga Maria Martins de Sousa Valentim*; Maria do Céu Monteiro** *Enfermeira Especialista de Saúde Mental e Psiquiátrica, Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa, Universidade Atlântica; ommvalentim@gmail.com **Enfermeira Especialista de Saúde Mental e Psiquiátrica, Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa, ceumonteiro1@gmail.com

RESUMO Os enfermeiros frequentemente utilizam a técnica de relaxamento muscular progressivo de Jacobson (1938) com algumas variações. Acredita-se nos benefícios dos diversos métodos de relaxamento, para uma melhor saúde mental. Esta técnica tem como premissa básica a tensão muscular que está de algum modo relacionada com a ansiedade, e que um indivíduo experimentará uma redução bastante acentuada e reconfortante da ansiedade sentida, se os músculos tensos puderem ser relaxados. Foram realizadas sessões de movimento e relaxamento com pessoas internadas em unidades na crise do Adulto. A formação do grupo baseou-se na disponibilidade dos utentes. A actividade consistiu numa série de exercícios simples de movimento e flexibilidade em que se trabalhava também a interacção, com exercícios de apresentação. Numa fase final realizou-se uma sessão de relaxamento adaptado de Jacobson, utilizando-se os colchões. A actividade concluiu com a partilha de sentimentos e sensações obtidas com a actividade realizada. Este trabalho propôs-se, além de procurar um referencial teórico que subsidiasse a aplicação desta técnica para acompanhar as necessidades do utente em crise, avaliar a eficiência desta actividade. A avaliação desta intervenção mostra que há uma diminuição da ansiedade inicial e verbalização por parte dos utentes de sentimentos de bem-estar.

504

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Palavras-chave:

Movimento;

Relaxamento;

Estratégia

de

intervenção

em

enfermagem

42.1. INTRODUÇÃO Nos últimos anos, o campo de acção para a prática de enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria tem-se expandido de forma acentuada, pelo que os enfermeiros têm assumido uma responsabilidade cada vez maior no que respeita à prevenção, tratamento e reabilitação dos utentes. A nossa intervenção foi desenvolvida em unidades de crise do Adulto, dando ênfase a gestão da ansiedade e situações de stresse. O método de relaxamento progressivo de Jacobson, é um dos vários métodos de relaxamento, foi criado pelo médico fisiologista Edmund Jacobson, que por meio de um plano sistemático, abrange os principais grupos musculares do corpo humano. A alternância entre contracção e distensão muscular, resulta em profundo relaxamento (Sousa Filho, 2009). Das várias intervenções focalizadas na pessoa/grupo que desenvolvemos iremos abordar a actividade “movimento e relaxamento”. Como objectivos foram traçados os seguintes: - Incentivar o debate e a reflexão sobre a aplicação do relaxamento como uma estratégia de intervenção de enfermagem; - Avaliar a eficácia das sessões de relaxamento em utentes em crise.

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505


42.2. METODOLOGIA 42.2.1. PARTICIPANTES Estudo descritivo simples sendo a população considerada, as pessoas com doença mental em crise internadas numa unidade de intervenção na crise. A amostra foi de 72 utentes que participaram em 9 sessões de movimento e relaxamento durante o internamento no ano de 2011.

42. 2.2. INSTRUMENTOS A avaliação da intervenção foi através de um instrumento constituído por: a escala visual analógica da dor, que visa a identificação da face que mais se assemelha com o estado de bem-estar do utente; uma escala tipo likert de 0 a 10 para avaliação da ansiedade e uma pergunta aberta para a expressão em uma só palavra como o utente se sente. A escolha destas escalas prendeu-se com o facto de ser de fácil leitura e percepção, ao contrário de diversas escalas utilizadas na avaliação da ansiedade. O instrumento foi aplicado antes e depois de cada sessão (cada sessão teve em média 50 minutos de duração), sendo posteriormente analisados os dados.

42.2.3. PROCEDIMENTOS Os critérios de inclusão do grupo basearam-se na disponibilidade dos utentes e os que tinham como diagnóstico de enfermagem: ansiedade, insónia e stresse. Foi estabelecido como critério de exclusão os utentes que apresentavam sintomatologia psicótica, em fase aguda, ou com agitação psicomotora. A actividade consistiu numa série de exercícios simples de movimento e 506

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flexibilidade em que se trabalhava também a interacção entre os vários utentes, com exercícios de apresentação aos outros elementos do grupo. Numa fase final foi realizada uma sessão de relaxamento adaptado de Jacobson, utilizando-se os colchões disponíveis para que os utentes pudessem estar mais confortáveis. A actividade concluiu com a partilha de sentimentos e sensações obtidas com a actividade realizada, em que os utentes fizeram uma avaliação da mesma. Para um relaxamento muscular progressivo é importante começar por treinar as pessoas de forma a detectarem e reconhecerem níveis de tensão muscular, para que possam ao executar esta técnica. Para começar esta técnica o procedimento consiste em contrair um determinado grupo muscular durante cinco a dez segundos e seguidamente soltá-lo concentrando-se na libertação da tensão durante mais ou menos trinta segundos implicando trabalhar em cada sessão dezasseis grupos musculares. Ao relaxar devemos não esquecer de respirar profundamente e estar atento à sensação de bem-estar físico e de peso que se espalham pelo corpo. Uma introdução que descreva o método e que justifique a sua utilização é defendida pelos proponentes de todas as abordagens e relaxamento. Tal introdução tem a vantagem de aumentar o interesse e a motivação e afastar o medo do desconhecido. Lichstein (1988) citado por Payne (2002, p.16), acredita que os participantes querem saber duas coisas acima de tudo: que a abordagem é bem sustentada e que funciona. Deverá ser explicado aos participantes o método a ser usado no relaxamento, fazendo uma pequena demonstração. O local escolhido também deve ser agradável e tranquilo tanto quanto possível um lugar especial ou improvisá-lo de forma a torná-lo especial. Recomenda-se que o utente seja encorajado a praticar este procedimento sozinho, após ter adquirido um mínimo de instrução por parte do enfermeiro, especialmente como uma maneira de lidar com o stresse.

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507


42.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS

Caracterização Da População A amostra foi constituída por 72 utentes, a quem foi pedida colaboração anónima e voluntária num serviço de internamento de psiquiatria em fase aguda. A amostra recolhida é constituída maioritariamente por mulheres (62,2%). A idade da amostra varia entre os 22 e os 55 anos, com uma média de idade de 34,2 anos (DP=8,42). Os anos de escolaridade variam entre os 6 e os 10 anos, com uma média de 7,5 (DP=5,77). Em relação à situação profissional, 62,8% dos utentes encontram-se desempregados, 21,4% são trabalhadores, 10,8% reformados e 5% estudantes. A tabela 1 apresenta as principais características sócio-demográficas dos participantes no estudo. Tabela 1 – Caracterização sócio-demográfica Idade Média (Desvio Padrão)

34,2 (8,42)

Género Mulheres (%)

62,2

Escolaridade (em anos) Média (Desvio Padrão)

7,5 (5,77)

Situação Profissional

508

Desempregado (%)

62,8

Trabalhador (%)

21,4

Reformado (%)

10,8

Estudante (%)

5,0

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Em

relação

ao

diagnóstico

médico,

40.5%

dos

indivíduos

são

diagnosticados com esquizofrenia, 35.9% depressão, 15.8% doença bipolar e 7.8% perturbação da personalidade. Quanto à escala de avaliação de bem-estar pretendeu-se que os doentes se identificassem com uma das faces apresentadas.

Imagem 1 – escala visual analógica que serviu de referência para avaliação do bem-estar

(Escala adaptada da escala da dor)

Esta escala foi apresentada aos participantes antes e depois da actividade. Notou-se sem dúvida um aumento do bem-estar, uma vez que a média da avaliação inicial foi de 4,5 e na avaliação final a média de respostas rondaram o valor 2,1, sendo que esta actividade promoveu um aumento de bem-estar quantificável em 2,4 pontos, segundo esta escala.

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509


Imagem 2 – escala tipo likert de 0 a 10 para avaliação da ansiedade

Nada ansioso

Muito ansioso

Os resultados também foram significativos da influência desta actividade na diminuição da ansiedade dos participantes, uma vez que a média da avaliação inicial foi de 4,9 enquanto a média da avaliação final foi de 2,7. Assim os doentes apresentaram uma diminuição da ansiedade em 2,2. Foi também construída uma questão de verificação e controle que validou estas respostas. Descreva como se sente numa só palavra?

510

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Tabela 2 – Sentimentos experienciados

Como se sente? – 1ª Avaliação (n=72 Como se sente? – 2ª Avaliação (n=72 )

)

Sentimentos

N (%)

expostos

Sentimentos

N (%)

expostos

Tristeza

22 (30,5%)

Relaxamento

15 (20,8%)

Ansiedade

20 (27,8%)

Tranquilidade

15 (20,8%)

Infelicidade

9 (12,5%)

Bem-estar

13 (18,1%)

Zanga

6 (8,3%)

Felicidade

12 (16,7%)

Bem-estar

4 (5,6%)

Alivio

6 (8,3%)

Nada

4 (5,6%)

Tristeza

6 (8,3%)

Apatia

3 (4,2%)

Serenidade

3 (4,2%)

Revolta

3 (4,2%)

Descontracção

2 (2,8%)

Cansaço

1 (1,4%)

Relativamente a avaliação de como a pessoa se sente antes e após a actividade, realizámos a análise descritiva dos resultados que são apresentados na tabela 2. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

511


Os sentimentos mais experienciados pelos inquiridos antes da actividade foram a tristeza (30,5%), seguido de ansiedade (27,8%). O termo “relaxado” é usado quer para referir relaxamento muscular quer para pensamentos de tranquilidade (Payne, 2002, p.3), após a actividade, os sentimentos mais referidos pelos participantes foram o relaxamento e tranquilidade (ambos com 20,8%), seguidos de bem-estar (18,1%) e felicidade (16,7%). Os sentimentos positivos referenciados

pelos

participantes,

reforça

a

pertinência

da

actividade

“movimento/relaxamento”.

42.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS O relaxamento progressivo de Jacobson tem sido utilizado, segundo vários autores, no tratamento de tensão muscular, insónia, depressão, fobias, irritabilidade, fadiga, espasmos musculares, bem como hipertensão arterial. Sequeira (2006), prevê a execução de técnicas de relaxamento, nomeadamente o método de Jacobson para os seguintes diagnósticos de Enfermagem: ansiedade, euforia, insónia e stresse. Ainda durante o internamento, a ajuda do enfermeiro torna-se fundamental. Posteriormente, o indivíduo poderá gravar a sessão de relaxamento e escutá-la em casa, ao mesmo tempo que procederá à contracção e descontracção muscular, de forma progressiva. Como qualquer outro método de relaxamento, deverá ser preferencialmente realizado num local tranquilo, isento de ruídos e de possíveis interrupções, sendo aconselhável que o ambiente esteja semi – obscurecido. Pode ser efectuado numa cama, num colchão pousado no chão, num divã ou numa cadeira confortável, de preferência com braços que lhe possam servir de apoio. Na

implementação

desta

intervenção

de

enfermagem

(Movimento/relaxamento) torna possível a constatação da diminuição dos níveis

512

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de ansiedade e bem-estar, assim como a verbalização de sentimentos positivos, indicadores de tranquilidade e relaxamento. Neste contexto podemos afirmar que é indispensável a inclusão deste tipo de actividades nos Serviços de internamento de Psiquiatria e sugerimos que este estudo seja realizado numa amostra maior em que correlacione a frequência dos utentes com o bem-estar.

42.5. CONCLUSÕES O objectivo da realização das sessões de “Movimento/Relaxamento” é que as pessoas aprendam a relaxar, gerir o stress e a ansiedade, para que possam usufruir de uma melhor qualidade de vida e melhorar a sua saúde mental. O relaxamento constitui um espaço teórico e prático onde o psicológico e fisiológico (somático), se apresentam intrinsecamente ligados, sendo sempre condicionada e influenciada pelos factores inter e intra-relacionais. A pertinência da presente actividade prende-se no benefício que proporcionou aos utentes a nível da saúde física, mental e emocional, com poucas contra-indicações, muito abrangente, com poucos custos económicos e grandes ganhos de bem-estar, relaxamento e harmonia imediata. O balanço das sessões é positivo, os utentes tiveram uma boa adesão, participando activamente nas sessões. Através dos resultados obtidos, num modo geral observou-se diminuição da ansiedade e melhoria de bem-estar. Observou-se também a presença de sinais de relaxamento que serviram de indicadores, tais como a posição não vertical dos pés, separação das arcadas dentárias e suspensão do maxilar inferior, inspirações progressivamente mais lentas, facies “lisas”, adormecimento, bem como a expressão positiva na partilha de experiências com o grupo.

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513


Após a avaliação do estado de ansiedade e bem-estar de cada participante, poderá existir a necessidade de programação de mais sessões, individualmente ou em grupo. É importante tentar perceber o que se passa com cada pessoa, e quais são os seus maiores factores de ansiedade e stress e reconhecer a sua origem. E mediante as conclusões ajudar a pessoa a encontrar e a definir estratégias de coping eficazes para o controle da sua ansiedade. Perante as conclusões do estudo, podemos desde já lançar pistas de análise para futuras pesquisas: Que dimensões do relaxamento a utentes com doença mental necessitam de aprofundamento? Que vantagens do relaxamento em utentes com doença mental em crise e seu potencial terapêutico na gestão da doença? Apesar de este estudo não ter representatividade estatística o estudo demonstra regularidades que justificam uma reflexão. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Albuquerque, M. (2001). Relaxamento: uma estratégia no contexto da assistência em enfermagem. In Revista Brasileira de Enfermagem Rio de Janeiro. Vol. 54, nº 2 – Abril/Junho. Dossey, B. (1992) Psychophsisiologic self – regulation interventions. In Critical care nursing: body – mind – spirit. Dossey, B. M. & Guzzeta, C. E. & Kenner, C. V. 3rd, Philadelphia, Lippincott. Chap.3. Geissmann, P. & Bousingen, R. (1989). Métodos de relaxação. Trad. Helenita Garcez. São Paulo, Loyola. Payne, R. (2002). Técnicas de Relaxamento. Um guia Prático para profissionais de Saúde. Loures: Lusocência. Sequeira, C. (2006). Introdução à prática clínica: do diagnóstico à intervenção em enfermagem de saúde mental e psiquiátrica. Edições Quarteto. 1ª Edição. Serra, A. V. (2002). O stress na vida de todos os dias. 2ª edição. Coimbra. Sousa Filho, P. (2009). Introdução aos métodos de relaxamento. In Encontro Paranaense, congresso Brasileiro de Psicoterapias corporais XIV, IX. Anais. Curitiba: centro Reichiano.

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43. QUALIDADE DE VIDA EM PESSOAS COM ALCOOLISMO Olga Maria Martins de Sousa Valentim*; Célia Samarina Vilaça de Brito Santos**; José Pais-Ribeiro*** *Enfermeira Especialista de Saúde Mental e Psiquiátrica, Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa, Universidade Atlântica; ommvalentim@gmail.com **Escola Superior de Enfermagem do Porto ***Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto

RESUMO A qualidade e importância dos cuidados de saúde prestados as pessoas com alcoolismo e familiares é um desafio permanente que se coloca aos enfermeiros. Só trabalhando em conjunto, poderemos assegurar que as necessidades de saúde das pessoas com alcoolismo e famílias são ajudas, proporcionando-lhe saúde e bem-estar. Este estudo, tem como objectivo contribuir para uma melhor compreensão da qualidade de vida. Método: aplicámos o SF36v2 a 444 pessoas com dependência alcoólica, diagnosticada há pelo menos um ano. A amostra é essencialmente composta por elementos do género masculino, casados, desempregados, e diagnosticados em média, há cerca de sete anos. Resultados: as pessoas com alcoolismo percepcionam uma razoável qualidade de vida, também observamos que as pessoas que apresentam melhorias da saúde comparativamente com o que acontecia à um ano, têm menores valores de Desempenho Físico (DF), Dor Corporal (DC), Saúde Geral (SG), Vitalidade (VT), Funcionamento Social (FS) e Saúde Mental (SM). Os profissionais necessitam cada vez mais, de reflectir e questionar a forma como eles encaram a sua doença e que valores atribuem à sua saúde, não esquecendo a qualidade de vida.

Palavras-chave: Qualidade de vida; Alcoolismo; Enfermagem

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43.1. INTRODUÇÃO O alcoolismo é uma doença crónica, como tal, as condições clínicas têm efeitos previsíveis de degradação do bem-estar e da qualidade de vida (Adés, & Lejoyeux, 2004). Segundo dados de World Drink Trends (2005), no ano de 2003, foram consumidos em Portugal 9.6 l de álcool puro per capita, colocando-nos no oitavo lugar dos países da Europa com maior consumo. A qualidade e importância dos cuidados de saúde prestados as pessoas com alcoolismo é um desafio permanente que se coloca para os enfermeiros e a outros profissionais de saúde. O interesse na avaliação da qualidade de vida tem crescido, muito substancialmente nos últimos anos. Do ponto de vista da saúde pública é importante o estudo da qualidade de vida, visto que à medida que existam melhorias neste campo, menores serão as taxas de internamentos psiquiátricos, menor será a sobrecarga para a família e/ou sistema de saúde, com uma consequente economia de recursos (Lino, 2006). Não obstante a multiplicidade de estudos acerca da síndrome de dependência alcoólica, nos últimos anos, particularmente em Portugal, é notória a falta de estudos sobre a qualidade de vida das pessoas com dependência alcoólica. A qualidade de vida tem sido reconhecida como uma medição de resultados importantes para tomadas de decisão respeitantes aos recursos e criação de modelos de intervenção específicos. Surge-nos assim a questão de investigação: Que qualidade de vida tem a pessoa com dependência alcoólica? Temos, como objecto contribuir para uma melhor compreensão da qualidade de vida, com a finalidade de desenvolver estratégias de intervenção em enfermagem. No decorrer deste estudo os termos dependência alcoólica, e alcoolismo são usados indistintamente.

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43.2. METODOLOGIA

43.2.1. PARTICIPANTES Optámos por um estudo do tipo exploratório, descritivo e transversal (Almeida & Freire, 2000). Neste estudo participaram 444 pessoas com o diagnóstico de dependência alcoólica há pelo menos um ano, com idade igual ou superior a 18 anos, ainda como critérios de inclusão consideramos, o saber ler e escrever e que não apresentassem alterações neurológicas ou cognitivas impeditivas do preenchimento do questionário. A amostra foi de conveniência, colhida após consentimento por parte dos inquiridos, em serviços de alcoologia e grupos de auto-ajuda.

43.2.2. INSTRUMENTOS Utilizamos neste estudo os seguintes instrumentos: 1. Questionário de caracterização sócio-demográfica, com informação sobre a idade, género, anos de escolaridade, situação profissional e situação conjugal. 2. Informação clínica: Idade em que começou a beber, tempo/duração da dependência alcoólica, número de internamentos. 3. Questionário de Estado de Saúde SF-36v2 (Short Form-36), para avaliar a qualidade de vida, desenvolvido por Ware e Sherbourne (1992) e validado para a população portuguesa por Ferreira, apresentando boas qualidades psicométricas (2000a; 2000b). O SF36v2 é constituído por 36 itens de autoresposta e destina-se a avaliar conceitos de saúde que representam valores humanos básicos relevantes à funcionalidade e ao bem-estar de cada um, abrangendo oito dimensões de estado geral de saúde, que E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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detectam tanto os estados positivos como os negativos. É uma escala frequentemente utilizada para avaliar a qualidade de vida.

O SF-36 é um questionário de auto-administração que demora cerca de 5-10 minutos a completar. É constituído por escalas de resposta tipo Likert, e avalia oito dimensões de saúde: 1. FF - Função Física (10 itens); 2. DF - Desempenho Físico (4 itens); 3. DC - Dor Corporal (2 itens); 4. SG - Saúde em Geral (5 itens); 5. VT - Vitalidade (Energia/Fadiga – 4 itens); 6. FS - Função Social (2 itens); 7. DE - Desempenho Emocional (3 itens); 8. SF - Saúde Mental (5 itens); Contém ainda um item único sobre percepção de alteração de saúde – MS Mudança de Saúde (Ferreira, 2000a,b; Ware et al., 1993).

43.2.3. PROCEDIMENTOS Para a concretização do estudo, solicitámos a colaboração formal a Unidades de Alcoologia das regiões de Lisboa e Vale do Tejo, Coimbra. Também solicitámos a colaboração de grupos de auto-ajuda (Alcoólicos Anónimos). Finalmente requeremos autorização para utilização do SF36v2. Na realização deste trabalho foram respeitadas as normas éticas constantes da declaração de 518

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Helsínquia. Todos os esclarecimentos necessários foram facultados desde o início do processo. A cada pessoa da amostra foi pedida colaboração voluntária e ainda consentimento informado. Também foi garantido sigilo sobre todas as informações recolhidas. A análise dos questionários será feita através da utilização do programa informático SPSS (Statistical Program for Social Sciences – versão 17.0). Para análise dos dados foi utilizada exclusivamente a estatística paramétrica. 43.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS A amostra é essencialmente composta por elementos do género masculino, casados, desempregados, e diagnosticados em média, há cerca de sete anos e com uma média de 2 internamentos. O alcoolismo é considerado e descrito por vários autores como uma doença crónica, multifactorial, que se detecta quase sempre numa fase já tardia, devido ao seu curso insidioso e prolongado, existindo, em muitos casos, co-morbilidade e, com diminuição na qualidade de vida para o utente com dependência alcoólica (Lino, 2006). Os quadros 1 e 2 apresentam respectivamente as principais características sócio-demográficas e clínicas dos participantes no estudo.

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Quadro 1: Caracterização sócio-demográfica (N 444) Idade Média

Situação Profissional (Desvio 45,4 (9,29)

Desempregado (%)

Padrão) Género Masculino (%) Escolaridade

82,6 (em

Trabalhador (%)

41,5

Reformado (%)

13,6

Estudante (%)

anos) Média

(Desvio 7,6 (3,67)

43,9

1,0

Situação Conjugal

Padrão)

520

Casado/união de facto (%)

43,4

Solteiro (%)

28,6

Divorciado/separado (%)

26,6

Viúvo (%)

1,4

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Quadro 2: Variáveis clínicas Ampl

M

DP

Idade em que começou a beber

5-55

17,82

7,89

Período de diagnóstico

1-45

7,24

7,28

Número de internamentos

0-21

2,01

2,46

Do quadro 3, constam os valores das subescalas do SF36v2. Da sua análise pode dizer-se que, em média, os indivíduos da amostra, apresentam valores razoáveis para as várias subescalas. A subescala em que apresentam valores mais elevados é a DE, o que indica que não apresentam problemas emocionais graves que dificulte o trabalho ou outras actividades diárias. Deve referir-se que nesta subescala, estão avaliados somente 67 indivíduos dos 444, pois os restantes não responderam, a pelo menos, metade dos itens, pelo que os valores omissos não foram substituídos pela média das respostas transformadas do mesmo indivíduo aos restantes itens da subescala. Refira-se ainda, que, relativamente às restantes subescalas, o total de indivíduos avaliados difere de 444 (total da amostra) pelo motivo já referido.

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521


Quadro 3: Medidas descritivas das subescalas do SF 36 Subescala

Nº itens

N

Mínimo

Máximo

Média

Desvio padrão

FF

10

390

,00

100,00

69,38

27,29

DF

4

389

,00

100,00

56,73

27,52

DC

2

412

,00

100,00

59,11

25,89

SG

5

219

,00

100,00

56,84

20,06

VT

4

394

,00

100,00

50,06

22,53

FS

2

371

,00

100,00

54,51

24,28

DE

3

67

,00

100,00

72,39

29,95

SM

5

391

,00

100,00

50,47

23,40

Funcionamento Físico (FF); Desempenho Físico (DF), Dor Corporal (DC), Saúde Geral (SG), Vitalidade (VT), Funcionamento Social (FS); Desempenho Emocional (DE) e Saúde Mental (SM).

522

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Os gráficos das figuras 1 a 8, mostram a distribuição das avaliações das subescalas do SF 36 por classes de amplitude 10, para maior facilidade de análise.

Figura 1: Distribuição da avaliação da subescala FF

Figura 2: Distribuição da avaliação da subescala DF

Figura

3:

Distribuição

da

avaliação

da

subescala DC E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

523


Figura 4: Distribuição da avaliação da subescala SG

Figura 5: Distribuição da avaliação Figura 6: Distribuição da avaliação da subescala VT

524

da subescala FS

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Figura 7: Distribuição da avaliação Figura 8: Distribuição da avaliação da subescala DE

da subescala SM

Da análise dos gráficos das figuras 1 a 8, verifica-se, relativamente a cada uma das subescalas do SF36, que: FF → a maior parte dos inquiridos (35,9%) tem uma FF muito boa, entre os 90 e os 100%; DF → a maior parte dos inquiridos (17,75%) tem um DF razoável, entre os 50 e os 60%, logo seguidos de 14,91% com um DF muito bom, entre os 90 e os 100%; DC → A maior parte dos inquiridos (31,79%) tem uma DC de intensidade moderada, entre os 40 e os 60%, 16,02% tem uma DC muito fraca, entre os 90 e os 100%; SG → A maior parte dos inquiridos (35,16%) tem uma SG moderada, entre os 40 e os 60% e com uma SG razoavelmente boa, entre os 60 e os 70%, tem-se 25,11%; VT → A maior parte dos inquiridos (38,84%) tem uma VT moderada a boa, entre os 50 e os 70% e com uma VT relativamente fraca, entre os 30 e os 40%, encontram-se 15,99% dos avaliados; FS → A maior parte dos inquiridos (38,54%) tem uma FS moderada a boa, entre os 50 e os 70% e com uma FS relativamente fraca, entre os 30 e os 40%, encontram-se 15,63% dos avaliados; E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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DE → A maior parte dos inquiridos (46,27%) tem um DE muito bom, entre os 90 e os 100% e com uma DE moderado, entre os 50 e os 60%, encontram-se 16,42% dos avaliados; SM → A maior parte dos inquiridos (28,64%) têm uma SM moderada a fraca, entre os 30 e os 50%, logo seguidos de quem tem uma SM moderada, entre os 50 e os 60%; MS → Relativamente à mudança de saúde, a maior parte dos inquiridos (33,1%) refere algumas melhoras, 20,48% refere estar aproximadamente igual, 26,67% refere estar um pouco pior ou muito pior e 19,76% refere estar muito melhor.

Do quadro 4 constam as correlações das subescalas do SF36 com a idade, anos de escolaridade e com o tempo de diagnóstico da doença de alcoolismo. Foram detectadas as seguintes correlações significativas (p<0,01 ou p<0,05): •

A subescala da função física (FF) está correlacionada com a idade em sentido negativo e de intensidade fraca (r=-0,108), o que significa que com o aumento da idade há tendência para que a função física diminua; está também correlacionada com os anos de escolaridade com intensidade fraca e em sentido positivo (r=0,226), o que significa que há tendência para que a função física aumente com o número de anos de escolaridade;

As subescalas relativas à saúde geral (SG) e à vitalidade (VT) estão correlacionadas com intensidade fraca e em sentido negativo com o tempo de diagnóstico da doença alcoólica (r=-0,183 e r=-0,121, respectivamente), o que significa que com o aumento do tempo de diagnóstico da doença alcoólica menor saúde geral e menor vitalidade;

As subescalas função social e saúde mental estão correlacionadas com a idade com intensidade fraca e em sentido positivo (r=0,168 e r=0,112, respectivamente), o que significa que com o aumento da idade há

526

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tendência para que o doente alcoólico tenha melhor função social e melhor saúde mental.

Quadro 4: Correlação de Pearson das subescalas do SF36 com a idade, anos de escolaridade e com o tempo de diagnóstico da doença de alcoolismo

Subescala

Idade

Anos escolaridade

de

quanto

diagnosticado

tempo a

é

que

doença

foi de

alcoolismo? (anos)

FF

-0,108**

0,226*

-,082

DF

,042

,010

-,021

DC

-,051

,099

-,084

SG

-,025

,112

-0,183*

VT

-,008

-,036

-0,121**

FS

0,168*

-,044

-,032

DE

,001

,092

,021

SM

0,112**

-,043

-,011

* Correlação significativa ao nível de significância de 1%; ** Correlação significativa ao nível de significância de 5%

Para avaliar a forma e intensidade da relação entre a subescala MS com as restantes e também com a idade e anos de escolaridade, recorreu-se ao coeficiente de correlação de Spearman (Quadro 5). Da sua análise, verifica-se que E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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a melhoria do estado de saúde está relacionada em sentido negativo e com intensidade fraca, mas significativamente, com o desempenho físico (rS=-0,187, p=0,000), dor corporal (rS=-0,300, p=0,000), saúde geral (rS=-0,369, p=0,000), vitalidade (rS=-0,388, p=0,000), FS (rS=-0,231) e saúde mental (rS=-0,300, p=0,000). Estes resultados, apontam para que quem apresenta maiores melhorias da saúde comparativamente com o que acontecia à um ano, tenha menores valores de DF, DC, SG, VT, FS e SM.

Quadro 5: Correlação Spearman’s entre as dimensões do SF-36, idade e anos de escolaridade com a subescala MS do SF-36 (Comparação estado saúde actual com o que acontecia há um ano) Idad e

Anos

de

escolarida FF

DF

DC

SG

VT

FS

DE

SM

de

Com o que acontecia há um

ano,

como descreve seu

o

-,030 ,067

-,042 -0,187* -0,300* -0,369* -0,388* -0,231* -,116

estado

geral

actual

(MS): * Correlação significativa ao nível de significância de 1%

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-

0,300


43.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS O SF-36 é um instrumento de fácil manejo e permite a qualquer profissional de saúde detectar genericamente aspectos importantes do momento de vida em que a pessoa se encontra. A amostra estudada mostrou de forma genérica uma qualidade de vida razoável, uma vez que os resultados giraram em torno de 50 a 72 baseados na medida utilizada para avaliar o nível da qualidade de vida do indivíduo, na qual considera-se "0" para “saúde fraca” e "100" para “saúde boa”, isto é, melhor padrão de qualidade de vida (Ferreira, 2000a,b). Os participantes avaliam como mais positiva a sua saúde ao nível do “Desempenho Emocional” e do “Funcionamento Físico”. A identificação precoce do alcoolismo geralmente é prejudicada pela negação, embora seja uma doença reconhecida pelas graves consequências que acarreta, mesmo quando o diagnóstico é evidente e o doente concorda em tratar-se (Lino, 2006). Podemos pensar que a negação da doença pode estar relacionada com uma avaliação razoável da qualidade de vida. Por sua vez existem estudos que mostram pontuações elevadas na alexitimia em pessoas com alcoolismo (Fabião, 2002). Esta incapacidade ou dificuldade para descrever ou consciencializar-se das próprias emoções e estados de ânimo pode estar relacionada com os participantes não referirem dificuldades com o trabalho ou outras actividades diárias, devido a problemas emocionais. Sugere-se um estudo para avaliar esta relação. Por sua vez, verificou-se uma menos percepção de saúde quanto às dimensões “Saúde Mental” e “Vitalidade”. Isto é, os participantes sentem-se ansiosos e deprimidos. Também referem que se sentem cansados e exaustos a maior parte do tempo. As políticas de saúde relativas ao álcool devem “pesar” todas as consequências do alcoolismo, bem como qualidade de vida (Costa, et al. 2004). Neste âmbito, há a necessidade de intervenções mais adequadas no tratamento de pessoas com dependência de álcool, uma vez que estes possuem um estilo de vida comprometido, e que essa doença está directamente associada a factores E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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como família, cultura e sociedade. A melhora da qualidade de vida pode funcionar como um estímulo motivador para a suspensão do consumo de bebidas alcoólicas. Assim, os esforços de enfermagem e dos restantes técnicos de saúde deverão ter o propósito de oferecer aos utentes vida com qualidade.

43.5. CONCLUSÕES O interesse pela qualidade de vida existe há já algum tempo, embora a sua avaliação sistemática e científica seja relativamente recente. Os conceitos de saúde, bem-estar e qualidade de vida por vezes tendem a confundir-se. O aumento da esperança de vida, a par de uma cada vez maior capacidade de intervenção na doença, fizeram com que, hoje em dia, sejam valorizados não apenas os anos de vida mas, igualmente, a forma como são vividos. Neste contexto, a avaliação da qualidade de vida das pessoas que sofrem de um qualquer problema de saúde torna-se cada vez mais relevante.

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44. CULTURA, STRESS E DOENÇA MENTAL Carlos Manuel Ferreira Monteiro*; Liliana Castanheira Rebelo** *Enfermeiro Especialista em ESMP, Centro Hospitalar Psiquiatrico de Lisboa. E-mail: carlosmonteiro1@gmail.com **Estudante Licenciatura ESEL. E-mail: liliana.c.rebelo@gmail.com

RESUMO Foram

necessários largos passos na história para alcançar a compreensão

da posição actual do homem na evolução da vida, no mundo social e no mundo da cultura, como nos recorda Pichot e Fernandes (1983). No entanto, os rituais, crenças, artes, leis, costumes, hábitos, aspectos morais, atitudes face à saúde, valores culturais e pessoais do individuo ou comunidade onde se insere, influenciam a percepção que tem sobre o estado de saúde e a necessidade de cuidados. A pessoa como ser único, merece ser visto como pertencente a um grupo étnico e cultural, onde todos partilham um conjunto normas único e exclusivo para um melhor funcionamento da comunidade e adaptação do indivíduo aos agentes stressores. Ao mudar de comunidade, o indivíduo enfrenta um choque cultural podendo experienciar stress e desequilíbrio mental, como alertam vários autores. Na saúde mental é primordial ter em conta a cultura, atitudes e crenças do indivíduo, mas, apesar de ser um conceito simples, é de operacionalização complexa, como alerta Kaplan (1990). É necessário desenvolver a nossa competência cultural para um melhor atendimento aos utentes das diversas culturas, baseando os cuidados na “singularidade da cultura da pessoa”, como alertam Stanhope e Lancaster (1999). Palavras-chave: Cultura, Stress, Enfermagem, Saúde Mental.

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44.1. INTRODUÇÃO A sociedade actualmente deslumbra-nos com um vasto conhecimento científico. No entanto, tal facto obriga-nos igualmente a ter comportamentos mais conscientes, adequados ao meio envolvente e saudáveis. Como nos esclarece Abreu (2003:23), “os antropólogos chamaram a atenção para a distância entre os conhecimentos científicos e as percepções profanas dos riscos: a relação entre ambos, importante para uma qualquer acção de educação para a saúde”. Estar informado não é a mesma coisa do que estar educado para comportamentos saudáveis. A sociedade actual está mais competitiva, o ritmo de vida é mais stressante, e “a exposição ao stress aumenta o risco de perturbação mental”, como alertam Thornicroft e Tansella (2001:63). Por vezes o indivíduo experimenta estados em que perde o contacto com a realidade, apesar de não possuir história psiquiátrica, estes distúrbios apresentam elevado risco de mortalidade, em particular de suicídio (Marneros e Pillman, 2004).

44.2. A INFLUÊNCIA DA CULTURA EM SAÚDE MENTAL Embora todos entendamos o significado semântico da palavra cultura, ela é ambivalente no que toca à concepção evolucionista, acumulando ao mesmo tempo a noção antropológica e de civilização. Etimologicamente, segundo Silva et al (2008) a palavra cultura é oriunda do latim colere, que se traduz por cultivar, cuidar da terra. Na idade média colere deos, era o cuidar dos deuses da terra. No renascimento, séc. XVI, passou-se a designar cultura como o cultivo do espírito. Segundo Cuche (1998), é durante o iluminismo que culture tem um sentido mais contemporâneo. No séc. XIX a palavra assume-se como uma noção de unidade nacional, em especial para a sociedade alemã. Kaplan (1990) define cultura como um conjunto de costumes, habilidades, crenças e padrões de comportamentos de uma sociedade organizada como tal. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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Esta noção vai de encontro à apresentada por Tylor (1871), citado por Abreu (2003:41), que definia cultura “como sendo um complexo formado por conhecimentos, crenças, artes, moral, leis, costumes e toda e qualquer capacidade ou hábito adquiridos pelo homem enquanto membro de uma sociedade. Kaplan (1990:105) avança ainda que a cultura é “tradicional, no sentido em que as práticas sociais são passadas de uma geração para outra. Também como indica Cuche (1998:21), Cultura é “a soma de saberes acumulados e transmitidos pela humanidade (…) associada às ideias de progresso, de educação e de razão.”. Já Madeleine Leininger, enfermeira e antropóloga, define cultura como os “(…) valores, crenças, normas e modos de vida apreendidos, partilhados e transmitidos pertencentes a um grupo especifico que orienta o seu pensamento decisões e acções de formas padronizadas”, por citado por Welch (2004:571) Podemos concluir que a cultura modela os indivíduos enquanto membros de uma comunidade que partilham um único conjunto de expectativas normativas, mostrando-lhes a forma de se comportar e funcionando como uma lente através da qual o homem vê o mundo, tal como defende Helman (1994:23). Para Robinson (1983) e citado por Townsend (2002:15) saúde mental é “um estado

dinâmico

em

que

se

demonstra

pensamentos,

sentimentos

e

comportamentos apropriados para a idade e congruentes com as normas locais e culturais”. Verifica-se pois que, tal como acrescenta Kaplan (1990:107), “o estudo da cultura, atitudes e crenças têm especial importância para a psiquiatria”. De facto, como alerta Fabrega (1980), citado por Oliveira (1996), os conceitos de doença, cultura e de cura estão intimamente relacionados, na medida em que sem compreender a cultura muitas doenças são incuráveis. Os termos saúde e doença são eles também definidos cultural e socialmente. Para Bourdieu (2003), todas as práticas culturais se classificam num espaço social e as culturas diferem quanto ao que consideram saudável e normal. 534

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Para Fabrega (1986) citado por Abreu (2003), existem vários factores pessoais que condicionam as definições de doença, nomeadamente, as crenças, as intenções e os modos de pensamento. Estas crenças são desenvolvidas pelos indivíduos desde a infância e orientam e conduzem o seu quotidiano. Constituem conhecimentos, muitas vezes são acompanhadas de fortes sentimentos e modelam as atitudes como refere Frasquilho e Guerreiro (2009). Estas atitudes e comportamentos

influenciados

pela

vertente

cultural

constituem

uma

preocupação para a OMS no que diz respeito às classificações de distúrbios mentais entre as várias culturas, como nos relembra Townsend (2002). A intervenção da cultura no desenrolar dos distúrbios mentais é bastante visível na explicação dada por Laplantine (1978:70): “não aceitamos assumir o trágico, o facto bruto, o insólito do real. Deliramos. Pois bem, a cultura delira connosco e promete-nos o impossível: a felicidade absoluta, e a reconciliação total. O paradoxo reside no facto de a cultura ser um esforço colossal para tentar negar e reparar o traumatismo que ela própria por outro lado provocou (…) cria válvulas de escape, rituais e revolta teatralizada, amortecedores dessa mesma realidade.” A sociedade é detentora da capacidade de demarcar e limitar até onde podem ir as ambições do indivíduo e faz com que ele seja cada vez mais autónomo mas também mais dependente. Temos pois o paradoxo das sociedades modernas (Durkheim, 2001). Actualmente, vivemos numa sociedade multicultural originada pelos crescentes fenómenos migratórios. Os indivíduos abandonam a sua comunidade de origem, integrando-se numa outra sociedade e em culturas contrastantes (Nunes, 2010). Quando “a mudança é aguda e devastadora, os mecanismos adaptativos dos indivíduos e o seu apoio social podem ser subjugados. O choque cultural caracteriza-se por ansiedade e depressão, um senso de isolamento, desrealização e despersonalização.” (Kaplan, 1990:107). A migração é considerada uma acção psíquica, na medida que a ruptura do contexto que ela implica, conduz a uma ruptura do quadro interno cultural interiorizado pelo paciente, dando origem a estruturação cultural e psíquica. Há E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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uma perda do quadro cultural interno da pessoa, a partir do qual se descodifica a realidade externa (Pussetti et al, 2009). Este processo migratório leva a perda de vários elementos para o indivíduo, nomeadamente da família e dos amigos, da casa, da cultura, da língua, da posição social, do contacto com o grupo étnico e religioso. Torna-se possível concluir que este fenómeno migratório constitui um factor de risco para a saúde, na medida em que os indivíduos experienciam uma maior vulnerabilidade aos transtornos mentais e/ou às perturbações emocionais, como alerta Pussetti et al (2009) baseando-se em diversos autores.

44.3. STRESS COMO FACTOR DE RISCO DE DOENÇA MENTAL O conceito de stress foi descrito pela primeira vez por Hans Selye como uma resposta generalizada do organismo às exigências ambientais. É um mecanismo fisiológico inerente que prepara o organismo para reagir face dessas exigências (Serra, 2002). Frasquilho e Guerreiro (2009:65) recordam que “Stress deriva do latim strictus, que significa aperto, constrição. (…) O ser humano ao longo de toda a sua existência interage com um número infinito de estímulos que terá de lidar para sobreviver e desenvolver-se. Esses estímulos universais, ou situações de complexidade e natureza variável são percepcionados de modos distintos por diferentes pessoas, ou até pela mesma pessoa conforme as diferentes fases da sua vida, e cada um reage a seu modo.” Mas como esclarece Helman (1994:216) “nem todo stress é prejudicial. Num nível moderado (eustress) possui uma função protectora e adaptadora. Num nível mais elevado (distress) pode causar mudanças patológicas e até a morte.” O primeiro leva a um adequado rendimento nas suas actividades e para um desempenho eficaz, já o segundo é-nos prejudicial. Como o segundo aspecto é o mais estudado, utiliza-se, para ele, o termo genérico de “stress” (Martins, 2004). Uma situação indutora de stress é aquela em que indivíduo excede seus próprios recursos, habilidades e capacidades disponíveis e prejudica o seu bem536

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estar. Quando a exigência é superior à sua capacidade de resposta, ou meios disponíveis para ultrapassar com êxito. O stress representa, pois, uma adaptação inadequada às mudanças (Serra, 2002; Helman, 1994) ou uma “desarmonia entre as partes do sistema”, como diria Betty Neuman (citada por Freese, 2004), o que “pode aumentar a probabilidade do indivíduo desenvolver problemas de comportamento” (Martins, 2004:256). Actualmente, o progresso, as novas tecnologias e o desenvolvimento social exige às pessoas uma crescente capacidade de adaptação, o que levou o stress a tornar-se um fenómeno comum e familiar. Tal como alerta Helman (1994:253), “A cultura pode tanto proteger o indivíduo do stress quanto torná-lo mais vulnerável ao mesmo. Ou seja, determinadas crenças, valores e práticas culturais podem aumentar o número de factores estressantes aos quais o indivíduo se expõe”.

44.4. O CUIDAR CULTURALMENTE CONGRUENTE EM SAÚDE MENTAL A relação entre o profissional de saúde e o utente é muitas vezes prejudicada pelas diferenças religiosas e culturais. Muitas vezes as crenças e os valores do utente não são devidamente valorizados e os enfermeiros têm dificuldade em compreender estas diferenças, mas reconhecem que o utente, enquanto ser único, é merecedor de ser visto como pertencente a um grupo étnico e cultural (Phaneuf, 2005). Numa sociedade multicultural, é desafiante na Saúde Mental a interpretação de sintomas e diagnósticos de um utente de cultura diferente. Exige-se que o enfermeiro esteja receptivo à diversidade e consciencialização cultural, seja detentor de saberes técnicos e saberes relacionais, para o equilíbrio mental da pessoa a que se presta cuidados, como refere Oliveira (2011). A autora (2011:40) cita ainda Alarcon et al (2004) ao referir que devemos “atacar” as diferenças culturais, as barreiras da língua e implicações da classificação nosológica no raciocínio clínico enquanto determinantes do comportamento do doente.” E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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O processo migratório origina uma grande diversidade de culturas, religiões e etnias. Portugal constitui um exemplo prático de um país multicultural, e como refere Nunes (2010:5) “(…) assiste-se já à necessidade de apoiar, na saúde e na doença, pessoas oriundas de outros países, de diferentes raças, credos e culturas”. O emigrante ao alterar o seu meio envolvente está mais susceptível ao stress e sujeito a isolamento social, a estigmatização e discriminação (Frasquilho e Guerreiro, 2009). Os autores alertam ainda que os costumes, crenças e representações acerca de saúde, doença e tratamento, influenciam os comportamentos em saúde, os comportamentos de risco e a necessidade percebida de utilizar os serviços de saúde. Ao interagir com pessoas de diferentes culturas torna-se central e essencial, ao todo o cuidado em saúde mental, o conceito de consciência cultural, que segundo Oliveira (2011:42) “(…) é a base da comunicação e envolve a capacidade de nos afastar da própria identidade cultural construída e tomar consciência dos nossos valores culturais, crenças e percepções.” Revela-se oportuno a alusão ao modelo teórico de Leininger que constitui a primeira construção teórica em enfermagem no que respeita à necessidade de uma abordagem holística, centrada entre o indivíduo e o meio envolvente. Neste modelo, a autora identifica um modo de intervenção de enfermagem baseada na preservação dos padrões culturais, negociação, redefinição e estruturação de cuidados, como refere Oliveira (2011). Para Leininger (1999) citado por Nunes (2010:109), “(…) a negligência do profissional em relação aos factores culturais pode impedir o alcance dos objectivos do cuidado e a recuperação da saúde das pessoas, até mesmo de um apoio adequado às situações de morte. As acções do cuidar, devem fundamentar-se nas crenças e nos valores dos clientes, pois estes influenciam os seus modos de cuidar da sua própria saúde e de enfrentar a doença e a morte.” Deste modo, aceita-se as diferenças nas concepções de saúde/doença tendo por base a cultura do utente, como indica Oliveira (2011). Nunes (2010:110) acrescenta ainda que “os profissionais de saúde devem 538

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desenvolver habilidades, conhecimento e estratégias que lhe permitam validar e explorar os aspectos que se prendem com a forma de agir dessas pessoas”.

44.5. CONCLUSÃO Hoje em dia tem-se uma maior preocupação pelos valores e aspectos culturais da pessoa que se cuida, pois é inevitável que diferentes sociedades, com diferentes culturas vivam a problemática da díade saúde mental/doença mental de forma diferente. Se por um lado temos uma partilha mais unitária, por outro temos a diversidade de culturas. O homem vive num “espaço” que transforma em função das suas necessidades. “Neste sentido, ao compreender a doença como realidade cultural ou a forma como as diversas culturas lidam com o processo, poder-se-ia ter acesso ao património cultural colectivo e, por consequência, ao conhecimento das próprias sociedades” Abreu (2003:26). O stress é intrínseco à natureza humana (Serra, 2002). Ao ser tolerável, defende o autor, é útil como fonte propulsiva para o alcance de objectivos, constituindo momentos de aprendizagem e uma maior realização pessoal. Helman (1994:253) alerta que a cultura “pode proteger o indivíduo do stress mas também torná-lo mais vulnerável. Determinadas crenças, valores e práticas culturais podem aumentar o número de agentes stressores”. O profissional de saúde deve identificar e analisar adequadamente as circunstâncias culturais numa situação de stress, no sentido de ajudar o indivíduo a modificar ou minimizar os seus efeitos negativos. Conferindo assim, uma maior humanização aos cuidados prestados. Somos da opinião que os Enfermeiros, principalmente em Saúde Mental, têm que se envolver, conhecer e compreender os valores culturais e as crenças das pessoas para que o processo de cuidar se torne mais eficiente. Não nos podemos esquecer que é por eles que existimos! E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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45.

FAMÍLIAS

QUE

INTEGRAM

PESSOAS

DEPENDENTES

NO

AUTOCUIDADO: PERCEÇÃO DA AUTOEFICÁCIA DOS MEMBROS DA FAMÍLIA PRESTADORES DE CUIDADOS Susana Carla Ribeiro de Sousa Regadas*; Cândida Assunção Santos Pinto**; Abel Avelino de Paiva e Silva*** *Aluna do Doutoramento em Enfermagem, do Instituto de Ciências da Saúde (ICS), da Universidade Católica Portuguesa (UCP), a.regadas@sapo.pt **Professora Coordenadora da Escola Superior de Enfermagem do Porto (ESEP), candida@esenf.pt ***Professor Coordenador da Escola Superior de Enfermagem do Porto (ESEP), abel@esenf.pt

RESUMO Perante

as

céleres

transformações

estruturais,

económicas,

sociais

e

demográficas, a dependência no autocuidado assume indubitavelmente uma relevância ímpar nas sociedades contemporâneas. Este fenómeno encerra um interesse crescente quer no que concerne às políticas de saúde e sociais dos diferentes países, nomeadamente em Portugal. A insuficiência de dados sobre esta problemática, justifica cabalmente e forçosamente, a urgência de um diagnóstico de situação, crucial para o planeamento de modelos de intervenção que respondam assertivamente às necessidades detetadas. Neste contexto surge uma investigação efetuada no concelho de Paços de Ferreira, na região norte litoral do país, recorrendo a uma técnica de amostragem probabilística, aleatória, estratificada e proporcional. Foram identificadas 2126 famílias clássicas do referido município, numa abordagem “porta a porta”, das quais 248 integravam pessoas dependentes. Dessas, 241 famílias aceitaram participar no presente estudo, de perfil quantitativo, exploratório, descritivo-correlacional, que visa o conhecimento das famílias e das pessoas dependentes no autocuidado que nelas se integram, 542

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apontando no sentido da caracterização da perceção da autoeficácia dos membros familiares prestadores de cuidados. Da investigação resulta claro, que urge (re)direcionar os sistemas de apoio e fornecimento dos cuidados de saúde, para modelos centrados nas respostas humanas das pessoas e famílias nos seus processos de vida.

Palavras-Chave: Dependentes;

Autocuidado;

Autoeficácia; Prestadores de

cuidados.

45.1. INTRODUÇÃO Hodiernamente e face aos indicadores demográficos existentes são inequívocas as tendências evolutivas da população em geral, sendo consensual que a população idosa irá incontestavelmente continuar a crescer, seja como consequência direta do aumento da esperança média de vida, ou indiretamente, pela diminuição da natalidade. Concomitantemente, o aumento da prevalência de doenças crónicas é sugestivo de um incremento significativo de pessoas que se tornam dependentes de outras. Por outro lado, as céleres convulsões socioeconómicas e estruturais que caracterizam o panorama atual, constituem-se numa enorme preocupação nomeadamente das políticas de saúde e sociais dos países que convivem com estes fenómenos. Considerando esta panóplia de aspetos, aos quais se adicionam o facto de a família ser um dos principais agentes do cuidado e em que cada vez mais precocemente os dependentes regressam ao domicílio, pósepisódio de internamento hospitalar, é incontornável a exigência com que se confrontam os membros da família prestadores de cuidados. Por conseguinte a caracterização da perceção da autoeficácia do familiar que presta cuidados é um fenómeno crucial a conhecer, porque cada vez adquire maior expressão, e E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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assume maior relevância no planeamento dos cuidados à unidade familiar, pelos enfermeiros.

45.1.1. OBJETIVOS O presente estudo, visa contribuir para o conhecimento da: •

Caracterização dos membros da família prestadores de cuidados;

Caracterização da perceção da autoeficácia, dos membros da família prestadores de cuidados, em cada um dos domínios do autocuidado.

45.2. METODOLOGIA O estudo alicerça-se numa abordagem quantitativa, de base populacional, de carácter exploratório, descritivo-correlacional e transversal. Engloba a recolha, o tratamento, a análise e a discussão dos dados respeitantes a características da população, através de um inquérito amostral.

45.2.1. PARTICIPANTES A investigação foi realizada com a população de um concelho localizado na região norte de Portugal, Paços de Ferreira, cuja área geográfica se encontra dividida em 16 freguesias, pelos quais se distribuem 56 333 habitantes. A população concentra-se predominantemente nas freguesias de Freamunde e Paços de Ferreira. Conhecido como a “Capital do Móvel”, o concelho de Paços de Ferreira afirma-se, economicamente, através da sua atividade industrial no sector do mobiliário.

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Para determinar a dimensão da amostra, utilizamos a fórmula publicada pela Organização Mundial de saúde (OMS), de Lwanga e Lemeshow (1991). A seleção das unidades familiares que integram a amostra foi efetuada com base na BGRI (Base Geográfica de Referenciação de Informação) e num SIG (Sistema de Informação Geográfico) - QGis® (open source). Permitiu-nos a obtenção de uma amostra areolar, geograficamente representativa da população em estudo. Os outputs com as referidas subsecções geográficas, bem como com o número de famílias clássicas a amostrar, depois de importados para o Bing Maps, facilitaram a recolha de dados no terreno. Com base numa abordagem do tipo “porta a porta”, os investigadores dirigiram-se a 2126 alojamentos, conforme procedimento amostral. Destas 2126 famílias clássicas, 11 recusaram participar no inquérito preliminar, sendo que 2115 aceitaram responder. Das famílias que aceitaram responder, 248 integravam pelo menos uma pessoa dependente no autocuidado. Dessas, 7 recusaram participar na investigação, pelo que a nossa amostra foi constituída por um total de 241 famílias (11,7%).

45.2.2. INSTRUMENTOS Para a realização da colheita de dados foi utilizado o formulário, por ser aplicável aos diversos segmentos populacionais e possibilitar a obtenção de dados facilmente quantificáveis, sendo que a presença do investigador era uma condição que se deveria verificar, pois era ele que registava as respostas obtidas. Esta opção baseou-se na probabilidade de poderem estar envolvidas no estudo, como participantes, um número significativo de pessoas idosas, ou de pessoas com baixo nível de escolaridade, que poderiam ter dificuldades na compreensão e na colocação das respostas relativas a um questionário. Assim, como instrumento de colheita de dados, foram usados os formulários intitulados: “Famílias que integram Dependentes no Autocuidado”, E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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desenvolvidos no âmbito de investigações de cariz disciplinar em Enfermagem, servindo os mesmos de base a estudos realizados noutros concelhos. Estes formulários são constituídos por duas partes: Parte I – Inquérito Preliminar; Parte II – Formulário PCD (Prestador de Cuidados do Dependente). Relativamente aos instrumentos usados, importa referir que já foram efetuados estudos de validade e credibilidade, o que por sua vez garante segurança na sua aplicação, tendo deste modo sido dispensada a realização do pré-teste.

45.2.3. PROCEDIMENTOS DE RECOLHA DE DADOS A colheita de dados foi realizada por um conjunto de cinco investigadores, nos domicílios das famílias clássicas residentes no concelho de Paços de Ferreira. De acordo com o plano de amostragem definido, a colheita de dados foi realizada “porta a porta”; cada um dos investigadores apresentou-se às famílias selecionadas, munido do seu cartão da Ordem dos Enfermeiros. A colheita de dados decorreu, de acordo com o seguinte procedimento: realização do inquérito preliminar; pedido de colaboração voluntária na investigação; informação sobre os objetivos da investigação e sobre a confidencialidade das respostas, garantindo-se o esclarecimento de quaisquer dúvidas; e, por fim, aplicação dos instrumentos. De acordo com os princípios definidos para a colheita de dados, os formulários foram, preferencialmente, aplicados aos membros da família prestadores de cuidados. Durante a aplicação dos instrumentos de colheita de dados, foi o investigador a colocar as questões, preenchendo ele próprio o formulário, de acordo com os dados fornecidos. Este tipo de administração permitiu em simultâneo esclarecer as perguntas e ter uma 546

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maior adesão nas respostas. Para além disso, permitiu que alguns dados fossem documentados pelo investigador, após o seu juízo clínico, nomeadamente nas questões que assim o exigiam. A aplicação do formulário PCD teve uma duração aproximada de 45 a 60 minutos. Este trabalho de campo foi realizado com o conhecimento da Proteção de dados.

45.2.4. PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE DE DADOS Os formulários usados na investigação foram desenhados utilizando o software TELEform® que, por sua vez, permitiu que o processo de lançamento dos dados fosse totalmente automático. Os dados ficaram armazenados numa base de dados ACESS da Microsoft, tendo sido, posteriormente, verificados, com o intuito de despistar incoerências. A natureza dos “erros” encontrados, essencialmente nas partes dos formulários, em que era exigido a colocação números, explica-se pela dificuldade do software em ler algumas particularidades da caligrafia humana. Após esta fase, os dados foram exportados para o SPSS (Statistical Package for the Social Sciences). Para o tratamento estatístico dos dados, utilizámos o já referido programa informático de estatística, versão 19.0, a partir do qual se procedeu às análises estatísticas do tipo descritivo e inferencial. Na análise inferencial, recorremos aos testes paramétricos e não paramétricos, sendo esta opção baseada na natureza das variáveis. No caso das variáveis qualitativas nominais, cujos valores não têm uma relação de ordem entre eles, utilizámos o teste QuiQuadrado. Este teste permitiu-nos medir a probabilidade das diferenças encontradas serem devidas ao acaso, partindo do pressuposto de que, na verdade, não há diferenças entre os grupos na população de onde provêm. Quando pretendemos estudar a relação entre variáveis ordinais e intervalares, E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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recorremos ao teste estatístico ANOVA. Através deste teste paramétrico estudamos a significância das diferenças entre as médias, permitindo a comparação de médias de mais do que duas amostras. Importa referir que, uma vez que a amostra era superior a 30 elementos e a sua distribuição não é extremamente

achatada

ou

enviesada,

não

foi

necessário

averiguar

a

normalidade das variáveis, dado que, neste caso, o teorema do limite central se aplica e, portanto, garante a aproximação à distribuição normal.

45.3. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS A nossa amostra foi constituída por um total de 241 famílias (11,7%), em que todas têm um prestador de cuidados familiar principal e 32 das quais têm mais do que um prestador de cuidados. Relativamente ao prestador de cuidados principal, a sua grande maioria são mulheres (n=216, 89,6%), com idades que variavam entre os 18 e 82 anos, sendo a média de 56,33 anos (DP= 12,43). A maioria dos prestadores de cuidados eram casados ou viviam em união de facto (n=183, 75,9%) e 35 eram solteiros. Relativamente ao nível de escolaridade, verificou-se uma predominância do 1.ºciclo (n=122), estando os demais prestadores de cuidados distribuídos pelos outros níveis. Constatou-se um número ainda considerável de prestadores de cuidados (n=27),sem qualquer tipo de escolaridade. Quanto à profissão, 81 prestadores de cuidados eram domésticos, 51 pensionistas/reformados e 22 desempregados. Estes resultados revelam que um número elevado de prestadores de cuidados (n=154) não apresentava uma atividade profissional ativa. No que se refere ao grau de parentesco com a pessoa dependente, os prestadores de cuidados eram, na sua maioria, filhos (n=103, 42,7%), cônjuges (n=67) e pais (n=39). Apenas 6 prestadores não tinham qualquer grau de parentesco com a pessoa dependente. Verificou-se que um número elevado de prestadores de cuidados (n=193) coabitava com a pessoa dependente. 548

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Na perceção da autoeficácia global, as médias obtidas permitiram concluir que os autocuidados em que a perceção é mais elevada são: “andar”, “vestir e despir”, “alimentar”, “tomar banho”, enquanto “usar WC”, “posicionar”, “tomar medicação” e “transferir” estão abaixo da média global. Os autocuidados com menor perceção de autoeficácia são os que pressupõem um maior nível de dependência, logo o prestador de cuidados perante uma maior exigência de cuidados pode sentir menos confiança no seu desempenho. É possível ainda concluir que a perceção da autoeficácia do prestador de cuidados é maior quando o dependente é do sexo feminino e quando o motivo de dependência é a doença aguda ou a doença crónica, sendo que quando é a doença crónica essa diferença é altamente significativa. Constatamos que as ações em que os prestadores de cuidados se sentem genericamente menos competentes (incompetentes e pouco competente), estão relacionadas com as ações de promoção do autocuidado por parte do familiar dependente, isto é, promover a participação e incentivar o seu familiar. Eventualmente a isto estará associado a assunção de um papel substitutivo por parte dos cuidadores, o que de algum modo pode potenciar a dependência da pessoa dependente.

45.4. CONCLUSÃO A integração na família de uma pessoa dependente, incapaz de realizar as atividades de autocuidado, acarreta mudanças profundas e significativas para todos os atores intervenientes neste processo, constituindo-se num desmedido desafio pessoal e em termos da dinâmica familiar. No contexto dos cuidados domiciliários e no que concerne aos cuidadores familiares, embora a perceção de autoeficácia não se refira às competências que as pessoas têm, mas á ideia que têm sobre aquilo que podem fazer, esta pode ser um importante preditor comportamental, no cuidar. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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Da leitura global dos resultados, sobressaem, desde logo, diferentes aspetos, uns relacionados com as famílias, outros relacionados com os prestadores de cuidados e, por fim, outros relacionados com o perfil das pessoas dependentes. Um valor percentual de 11,73% de famílias clássicas do concelho de Paços de Ferreira integravam pessoas dependentes no autocuidado. Relativamente aos prestadores de cuidados, emerge um perfil que veicula uma realidade social: maioritariamente mulheres (filhas, esposas, mães), com idades compreendidas entre os 18 e os 82 anos, casadas ou a viverem em união de facto e domésticas ou reformadas. Salientamos o seu baixo nível de escolaridade, poucos tinham habilitações superiores, e evidenciou-se uma percentagem considerável de prestadores de cuidados sem escolaridade ou com o ensino básico. A elevada proporção de filhas prestadoras de cuidados pode ser explicada pelas características sociodemográficas das pessoas dependentes, que eram maioritariamente idosas (67,2%). Por sua vez, o perfil das pessoas dependentes, é o já evidenciado noutras investigações, nomeadamente idosos, com

maior

predominância

do

género

feminino,

maioritariamente

pensionistas/reformados, sendo a doença crónica e o envelhecimento as principais causas da condição de dependência, que por esse motivo era predominantemente gradual. No que concerne à dependência por domínio de autocuidado, os resultados demonstraram elevados graus de dependência, sendo que a maioria das pessoas dependentes precisava, no mínimo, de ajuda de pessoa, para a concretização das atividades de autocuidado. É de salientar a quase totalidade das pessoas que apresentaram dependência face ao autocuidado tomar medicação (92,4%). Os resultados que se reportam aos outros tipos de autocuidado evidenciam níveis de dependência percentualmente elevados no que concerne ao alimentar-se (83,8%), arranjar-se (83,0%), tomar banho (82,8%) e vestir-se e despir-se (81,7%). No que diz respeito ao grau de dependência, face ao autocuidado global, dos resultados obtidos podemos afirmar que 7,9% das pessoas eram totalmente dependentes, não participantes, 91,7% tinham necessidade de ajuda de pessoa e 550

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0,4% tinham só necessidade de equipamento, dados que espelham uma dependência deveras preocupante. Após a discussão dos resultados obtidos pode concluir-se ainda que o prestador de cuidados se considera medianamente competente na prestação do seu papel no autocuidado, assumindo diferentes variâncias de acordo como os diferentes domínios avaliados. Contudo, o facto de se ter encontrado um valor percentual relativamente constante no score medianamente competente pode conduzir-nos à colocação da hipótese, de que as respostas tenham sido influenciadas pela desejabilidade social, ou seja, pela vontade das pessoas em transmitirem uma imagem de si que seja positivamente valorizada pela sociedade. De acordo com a Ordem dos Enfermeiros (2005, p.4), este tipo de estudos revestem-se de particular importância na identificação do perfil dos portugueses dependentes no autocuidado e integrados em famílias, podendo “tornar-se um importante vetor para a melhoria das respostas às necessidades em cuidados de saúde dos cidadãos”.

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46. IMPACTO DA PSICOEDUCAÇÃO NA ANSIEDADE E PERSPETIVAS FACE Á MORTE EM MÉDICOS E ENFERMEIROS DE CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS Cláudia Cristina de Sousa Mourão*

*Enfermeira Graduada em Contrato de Trabalho em Regime de Funções Públicas Mestre e Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica 5-E-02749 ACES Serra D’Aire – UCSP (Atendimento Complementar) da Unidade de Saúde de Torres Novas, claudiamourao1972@gmail.com

RESUMO Objetivo: Avaliar o impacto da psicoeducação na ansiedade e perspetivas face à morte em profissionais de saúde dos Cuidados de Saúde Primários do Entroncamento. Metodologia: Estudo quantitativo, quase-experimental do tipo pré teste e pós teste desenvolvido no período de abril a julho de 2011, na Unidade de Cuidados na Comunidade do Centro de Saúde do Entroncamento, com grupo de sete sujeitos (amostra não probabilística). Realizou-se intervenção específica de psicoeducação para seis sessões de duas horas semanais. Aplicaram-se os questionários Death Anxiety Questionnaire e Escalas breves sobre diversas perspetivas de morte antes e após as sessões e uma parte qualitativa no final: “Avaliação das conquistas”. Compararam-se as médias com a prova de Wilcoxon (α = 0,05), utilizando-se o programa SPSS 14.0 Resultados: O valor médio da ansiedade foi antes MA = 35,42 e depois MD = 29,28 (Z = -2,043; p = 0,041), apresentando diminuição estatisticamente significativa, enquanto

558

as

perspectivas

da

morte

não

apresentaram

diferenças

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estatisticamente significativas. A análise de conteúdo realizada serviu para suportar alguns achados e apontou para conquistas positivas.

Palavras-chave: morte; ansiedade; perspetivas; psicoeducação.

46.1. INTRODUÇÃO A morte sempre foi (é e será) um tema atual, por fazer parte da própria vida. É melhor refletir sobre a morte e encará-la como natural, a viver como se não existisse! Os profissionais de saúde no geral e os enfermeiros em particular são alvo de vários estudos acerca das atitudes face à morte e ao morrer e discute-se muito a importância da educação para a morte e final de vida na formação científica e humanística dos mesmos. No entanto, acerca das perspetivas de morte (que toca em parte a abordagem face às atitudes), desconhece-se realmente como a encaram. Tal como referem Barros-Oliveira e Neto (2004, p. 355) “Em Portugal é ainda escassa a investigação neste domínio (…)”. “Entre as muitas razões por que o tema da morte se foi impondo, é que ela pertence a todas as idades e condições, e está na origem de muitos sintomas e doenças psíquicas, como as insónias, a depressão, doenças psicossomáticas, diferentes medos e obsessões (no fundo, todos os medos são medos de morte).” (Barros-Oliveira & Neto, 2004, p. 355). “A maior parte dos profissionais de saúde protegem-se das perdas e lutos evitando, com custos elevados, fazerem os seus lutos e curarem as suas perdas.” (Bernardo, Rosado & Salazar, 2010, p. 779). Ao pensarmos naqueles custos elevados, a ansiedade pode ser incluída nos mesmos, para além de outros sintomas e/ou sinais face à morte. Na opinião de Kübler-Ross (2008), E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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existem profissionais de saúde que evitam a todo o custo enfrentar e aceitar sequer que têm pessoas com doenças em fase terminal e outros, ainda, negam por completo tudo e todos revelando o desconforto, revolta, ansiedade e frustração que sentem em relação à morte. Campelos (2006) deu a conhecer que os profissionais de saúde (enfermeiros) apresentam níveis de ansiedade face à morte elevados. Wasner, Longaker, Fregg e Borasio (2005), referem que a constante confrontação com as mortes de outros pode ter como resultado, nos cuidadores, algum grau de ansiedade. A própria capacidade que o Homem tem para refletir a sua morte e o sentido da vida conduz a implicações na forma como vivemos a vida e como temos estratégias para lidar com a ansiedade face à morte (Wong, 2002). Rebelo (2004) segue a mesma linha de pensamento ao referir que a capacidade cognitiva que temos acaba por nos levar a evocar imagens perturbadoras e negativas que fazem sentir ansiedade e medo perante a morte. A ansiedade face à morte é algo generalizado e inacessível à consciência, revelando-se pelos pensamentos, medos e emoções relacionadas com o fim da vida, de acordo com Wong (2002). É o grau de aceitação da nossa morte que condiciona todo o sentimento envolto na morte e no processo de morrer! “Reflectir sobre a morte e a vida” (Bernardo, Rosado & Salazar, 2010, p. 781) constitui-se numa das estratégias eficazes de auto-cuidados face ao medo e ansiedade. Do mesmo modo, pensa Barbosa ao falar do processo de luto e abordar questões relacionadas com os profissionais de saúde, manifestando “ser muito importante: a formação geral e específica dos profissionais de saúde nesta área, e a introdução de momentos de reflexão ou de partilha de sentimentos sobre os processos de luto (…).” (2010, p. 529), o que promove a prevenção da exaustão. Campelos (2006), Inci e Oz (2009), Khader, Jarrah e Alasad (2010), KüblerRoss (2008) e Silva, Ribeiro e Kruse (2009), argumentam para a necessidade de uma educação para a morte no sentido de encarar uma realidade que faz parte do 560

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ciclo vital da pessoa e do processo de cuidar inerente aos profissionais de saúde, mais direta ou indiretamente, em qualquer fase da vida laboral. Wee e Hughes (2007), perspetivam programas de base experienciais comparativamente metodologias

aos

ativas

didáticos, para

reunindo

discutir

vários

atitudes,

recursos

materiais

sentimentos,

e

emoções,

comportamentos, processos, aspetos culturais e religiosos acerca da morte, do morrer e após a morte, pensando-a como natural, inevitável e conducente a uma habilidade para viver uma vida mais enriquecida e morrer tranquilamente. Este tipo de programas reduziu significativamente a ansiedade face à morte. Como dizem Barros-Oliveira e Neto, “A aceitação da morte constitui certamente um dos maiores sinais de maturidade humana. Daí a necessidade duma educação sobre a morte, duma ars moriendi, porque a morte, paradoxalmente, pode ensinar a viver.” (2004, p. 355). Também Parkes, Laungani e Young (2003) eTwycross (2003) reforçam esta ideia. Assim, os objetivos para este trabalho são avaliar a ansiedade e perspetivas face à morte dos enfermeiros e médicos dos CSP do Entroncamento antes e depois da participação em sessões de psico-educação e avaliar o impacto da psico-educação na ansiedade e perspetivas face à morte nos enfermeiros e médicos dos CSP no Entroncamento.

46.2. METODOLOGIA O estudo classifica-se como quase experimental do tipo pré teste pós teste sem grupo de controlo (Ribeiro, 1999), para conhecer a influência da psicoeducação em grupo sobre as variáveis em estudo: ansiedade face à morte e perspetivas sobre a morte. O esquema do estudo de investigação-ação foi definido da seguinte forma:

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561


1. Aplicou-se num primeiro momento o instrumento constituído por três partes (questionário sócio-demográfico e modo de experienciar a morte e o morrer para caracterizar a amostra; Death Anxiety Questionnaire e as Escalas breves sobre diversas perspetivas de morte – ambos validados para a população portuguesa); 2. Desenvolveram-se intervenções de enfermagem de saúde mental: psicoeducação de caráter experiencial, em seis sessões de grupo de duas horas cada, uma vez por semana, com recurso a dinâmicas de grupo, role playing, narrativa, escuta ativa, livre expressão de sentimentos, técnicas de relaxamento, metodologias ativas e participação de um perito externo, constituindo-se o participante como veículo ativo do processo. 2.1. Primeira sessão – “Morte?! O que é isto?...”; 2.2. Segunda sessão – “Diferentes abordagens: a morte através de mim”; 2.3. Terceira sessão – “O que sinto e o que digo”; 2.4. Quarta sessão – “Tema livre”; 2.5. Quinta sessão – “Quando se vê com outro olhar”; 2.6. Sexta sessão – “Pensar a morte na despedida…”. 3. Após a última sessão, avaliou-se a ansiedade e perspetivas face à morte depois da intervenção psicoeducação em grupo através do Death Anxiety Questionnaire e das Escalas breves sobre diversas perspetivas de morte para averiguar do impacto da intervenção nas variáveis estudadas face ao grupo selecionado. Aplicaram 6 questões abertas – “Avaliação das conquistas” para análise de conteúdo face à evolução sentida. As questões de investigação foram: Que impacto tem a psico-educação na ansiedade face à morte? Que impacto tem a psico-educação nas perspetivas de morte? 562

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Seguindo o raciocínio definiram-se as hipóteses: H1: Existem diferenças estatisticamente significativas na ansiedade face à morte antes e depois da psico-educação. H2: Existem diferenças estatisticamente significativas nas perspetivas da morte antes e depois da psico-educação.

46.2.1. PARTICIPANTES Da população constituída por 24 médicos e enfermeiros dos Cuidados de Saúde Primários do Entroncamento que exerciam funções a tempo inteiro (4 UCC, 12 USF, 8 UCSP), definiram-se quotas no sentido de proporcionar a representatividade face a cada Unidade, ou seja, 2 participantes da UCC, 6 participantes da USF e 4 participantes da UCSP. A amostra foi não probabilística, não aleatória ou intencional (Maroco, 2007; Ribeiro, 1999), constituída por 7 participantes (5 enfermeiros e 2 médicos), recrutados na UCSP e USF.

46.2.2. INSTRUMENTOS Efetuou-se o preenchimento de um questionário constituído por três partes: a primeira constituída por um questionário sócio-demográfico, no sentido caracterizar a amostra nas variáveis independentes como a idade, o género, anos de serviço, estado civil. A segunda pela escala Death Anxiety Questionnaire (DAQ) adaptada por Oliveira (1998), com 11 afirmações na primeira pessoa, com respostas numa escala de Likert com pontuação de 1 a 5, na qual o 1 corresponde a totalmente em desacordo e o 5 totalmente de acordo. A pontuação máxima será 55 pontos e a mínima de 11 pontos. O coeficiente de alfa de Cronbach foi de 0,86. Segundo Campelos (2006), a escala apresenta razoáveis qualidades psicométricas. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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A terceira parte, pelas Escalas Breves sobre Diversas Perspetivas da Morte (EBDPM), baseadas nas Death Perspective Scales de Spilka, Shout, Minton e Sizemore (1977 citado por Oliveira & Neto, 2004), com identificação de diversas reações emotivas experimentadas por quem pensa na morte. Tem 8 sub-escalas que avaliam diferentes perspetivas face à morte. Apresentam 43 itens, com subescalas entre os 4 e os 6 itens, com respostas em escala tipo Likert com 6 parâmetros, em que 1 diz respeito ao totalmente em desacordo e o 6 refere-se ao totalmente de acordo. A pontuação máxima nas sub-escalas é: morte como sofrimento e solidão (sub-escala 1) – 36; morte como vida do Além de recompensa (sub-escala 2) – 36; sub-escala 3 – indiferença frente à morte – 30; na morte como desconhecido (sub-escala 4) – 36; na morte como abandono dos que dependem de nós com culpabilidade (sub-escala 5) – 30; na morte como coragem (sub-escala 6) – 36; na sub-escala 7 em que a morte é como fracasso – 30 e na sub-escala 8 – morte como fim natural – 24. É considerado por BarrosOliveira e Neto (2004) e Campelos (2006) como muito útil para avaliar um quadro amplo de atitudes ou reações face à morte. Os valores de cada fator apresentaram saturações médias superiores a 0,60 no geral, tratando-se de escalas com boa estrutura fatorial. O alfa de Cronbach apresentou os seguintes valores para cada fator, do primeiro ao último: 0,83, 0,94, 0,84, 0,86, 0,83, 0,83, 0,87, 0,78.

46.2.3. PROCEDIMENTOS A investigação decorreu entre o mês de abril e julho de 2011, nos Cuidados de Saúde Primários no Entroncamento. Como refere Ribeiro (1999), teve-se em conta a importância e a implementação dos aspetos éticos na aplicação do estudo.

As

autorizações

necessárias

foram

pedidas

formalmente

aos

participantes, à entidade patronal – ACES Serra D’Aire e aos autores das escalas. O tratamento estatístico foi efetuado recorrendo ao Statistic Package for the Social Sciences (SPSS), versão 14.0 para Windows XP – estatística descritiva 564

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para as variáveis sócio-demográficas (média, desvio padrão, amplitude, valor mínimo e máximo) e estatística inferencial com teste não paramétrico Wilcoxon, com um p ≤ 0,05 (Maroco, 2007). Efetuou-se análise de conteúdo selecionando os extratos mais significativos (Bardin, 2011), relacionados com as hipóteses levantadas ou que se tenham considerado oportunos para reforçar dados quantitativos obtidos.

46.3. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Amostra constituída por enfermeiras (5; 71,43%) e médicas (2; 28,57%) da UCSP e USF, sendo a totalidade do sexo feminino (N = 7; 100%), com idades compreendidas

entre

os

22

e 47 anos

de

idade

(M=29,85;

DP=8,07),

maioritariamente solteiras (5; 71,43%), com um tempo de experiência profissional entre os 0 e 24 anos (M=5,85; DP=8,35), em que 42,86% exerciam na Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados e de 57,14% eram da Unidade de Saúde Familiar. Na ansiedade face à morte antes e depois, os valores médios resultantes (MA = 35,42; MD = 29,28) apontaram para diminuição da mesma, tendo os valores mínimos e máximos acompanhado esta tendência, tal como se observa no Quadro 1. Pelos dado apresentados no Quadro 1, verificou-se um aumento do valor médio nas sub-escalas 1 (MA = 6,57; MD = 8,00), sub-escala 2 (MA = 13,57; MD = 16,14), sub-escala 3 (MA = 10,00; MD = 13,14), sub-escala 4 (MA = 20,71; MD = 24,28), sub-escala 6 (MA = 13,42; MD = 15,28) o que leva a indiciar que a morte como sofrimento e solidão, a morte como vida do além de recompensa, a indiferença frente à morte, a morte como desconhecido

e a morte como

coragem, passaram a ser perspetivadas com mais significado por parte dos profissionais de saúde após a intervenção. Relativamente à sub-escala 5 (MA = 9,57; MD = 8,00) apresentou diminuição dos valores médios, o que para estes E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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profissionais representa que passaram a perspetivar menos a morte como abandono dos que dependem de nós com culpabilidade. A sub-escala 7 (MA = 7,85; MD = 7,71) e sub-escala 8 (MA = 20,71; MD = 20,57), apresentaram valores tendencialmente semelhantes, ou seja, os profissionais de saúde mantiveram a perspetiva da morte como fracasso e da morte como fim natural.

Quadro 1 – Estatística descritiva dos dados obtidos relativos aos instrumentos Ansiedade face à morte e Escalas breves sobre diversas perspetivas de morte

H1: Existem diferenças estatisticamente significativas na ansiedade face à morte antes e depois da psico-educação. Para avaliar o impacto da psicoeducação na ansiedade face à morte recorreu-se ao teste não paramétrico de Wilcoxon com α = 0,05, observando-se pelo Quadro 2 uma redução da ansiedade face à morte do momento antes da intervenção de psicoeducação em grupo para o momento depois, sendo que as diferenças foram estatisticamente significativas (Z = -2,043; p = 0,041). Neste sentido, a hipótese um vai no sentido de se poder confirmar, ou seja, o tipo de intervenção

desenvolvido

junto

dos

profissionais

de

saúde

dos

CSP

relativamente à ansiedade face à morte teve impacto positivo e estatisticamente

566

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significativo. A psicoeducação em grupo – nos moldes em que foi concebida – fez com que a ansiedade face à morte diminuísse neste grupo de participantes.

Quadro 2 – Resultado da aplicação do Teste de Wilcoxon à comparação dos níveis ansiedade antes e após as sessões de psicoeducação

Verificou-se que à luz dos argumentos teóricos pesquisados, este tipo de intervenção experiencial estruturada face a aprender a lidar, falar, partilhar e pensar a morte e o morrer, mostrou resultados que podem afirmar o desenho da investigação realizada em grupo como algo que merece atenção pelo alcançado. Quando Bernardo, Rosado e Salazar (2010) afirmaram que refletir sobre a morte e a vida constitui uma entre muitas estratégias eficazes de auto-cuidado relativamente ao medo e ansiedade face à morte, pensou-se que talvez o trabalho fosse ao encontro de tal suposição… e assim foi! Para as Escalas breves sobre diversas perspetivas de morte e para a hipótese levantada, apresenta-se o Quadro 3 alusivo à estatística de teste para a totalidade das sub-escalas. H2: Existem diferenças estatisticamente significativas nas perspetivas da morte antes e depois da psico-educação. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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Através do teste de Wilcoxon no Quadro 3 validou-se que as diferenças encontradas não foram estatisticamente significativas em nenhuma das subescalas. Na morte como sofrimento e solidão (Z = -1,342; p = 0,180) surgiram duas ordens positivas, o que demonstra que a morte como sofrimento passou a ter maior ponderação por dois sujeitos após a intervenção. Face á morte como vida do além de recompensa (Z = -1,890; p = 0,059), quatro sujeitos avaliaram a dimensão com mais pontuação face à sua perspetiva inicial, constituindo a dimensão que parece ter sido a que mais impacto pode ter sofrido com a psicoeducação em grupo. Na indiferença frente á morte (Z = -1,361; p = 0,174), quatro sujeitos passaram a considerar esta dimensão como mais expressiva face ao primeiro momento e um como menos expressiva, atribuindo-lhe valorização menor. Relativamente à morte como desconhecido (Z = -1,214; p = 0,225), três participantes atribuíram maior significação a esta dimensão enquanto dois passaram a atribuir-lhe menor ponderação. A morte como abandono dos que dependem de nós com culpabilidade (Z = -1,473; p = 0,141), três participantes passaram a perspetivá-la como uma atitude de menos abandono, existiu um que a valorizou mais e três mantiveram a perspetiva que tinham. Na morte como coragem (Z = -0,674; p = 0,500), três participantes passaram a ter mais esta perspetiva, dois mantiveram e outros dois passaram a ter uma tendência menor para ver a morte como coragem. Na morte como fracasso (Z = -0,954; p = 0,340) as médias antes e depois não tiveram praticamente oscilação. Notou-se que cinco participantes atribuíram ponderação menos negativa à dimensão morte como fracasso, um sujeito pontuação idêntica e outro com uma perspetiva para sentir mais a morte como fracasso. Para a dimensão morte como fim natural (Z = -0,378; p = 0,705) as médias antes e depois foram muito próximas. Três participantes assumiram a morte como fim natural de forma idêntica, três tenderam a ponderá-la como menos natural e um sujeito passou a encarar mais a morte como um fim natural.

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A

hipótese

de

que

a

psicoeducação

em

grupo

teria

impacto

significativamente estatístico nas perspetivas de morte não se veio a revelar, isto é, a hipótese é rejeitada.

Quadro 3 – Resultado da aplicação do Teste de Wilcoxon à comparação das perspetivas da morte antes e após as sessões de psicoeducação

A ausência de diferenças estatisticamente significativas e atendendo ao que os autores referem, também foi validado em parte pelo contributo das respostas dadas à questão “Como via a morte e como vejo agora?”, das quais revelo alguns excertos: “Da mesma forma ou mantendo a mesma visão” referido pela maioria dos participantes, apesar de alguns referirem “mais serenamente e falarem mais serenamente”. Na generalidade dos participantes a visão da morte não foi alterada face ao que era considerada para os mesmos no início. Com tudo que se constatou e pensando como Barbosa (2010), abordar questões de morte e morrer com os profissionais de saúde, apresenta-se como E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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muito importante, sendo a formação geral e específica e a introdução de momentos de reflexão ou de partilha de sentimentos o promotor da prevenção da exaustão e de crescimento. “O que melhorei…”: “abordagem, respostas, pensamento, refletir, falar sobre a morte” e “refletir sobre a vida” e com “Consegui com o grupo…” aspetos como “abrir horizontes, falar sobre tema tabu, ideias, conhecer e dar-me a conhecer, refletir, aprender, partilhar sobre a morte”. Sendo

o

conceito

de

morte

relativo,

ou

seja,

dependente

do

desenvolvimento psíquico e situação afetiva de cada pessoa, da religião, de ser complexo e mutável e depender do contexto situacional e idade como referiram os autores (Barros de Oliveira, 1998; Kübler-Ross, 2008; Oliveira, 1999), dever-seia ter esperado que as perspetivas face à morte não apresentassem diferenças de resultados estatisticamente significativos. De notar que a idade das participantes e o tempo de experiência profissional pode ter influencia na forma como perspetivam a morte e como sentem ansiedade face à mesma. Apesar de em Portugal (Barros-Oliveira & Neto, 2004) ser escassa a investigação no domínio das perspetivas de morte nos profissionais de saúde, considera-se ter deixado neste registo uma pequena amostra para essa contribuição, tendo-se noção do tamanho limitado e condicionante da amostra para extrapolar informação. No final ficou “Uma palavra…” – “Vida; Vida; Partilha; Vida; Saúde; Vida”. Pensa-se que vem reforçar muito do que se conseguiu apurar e validar face a alguns dos aspetos teóricos encontrados. Parafraseando e repetindo-se “A aceitação da morte constitui certamente um dos maiores sinais de maturidade humana. Daí a necessidade duma educação sobre a morte, duma ars moriendi, porque a morte, paradoxalmente, pode ensinar a viver.” (Barros-Oliveira & Neto 2004, p. 355).

570

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


46.4. CONCLUSÕES A morte é um tema que talvez gere ansiedade nas pessoas devido ao facto de fazer parte da vida em si mesma. A intervenção proposta logrou modificar aspetos relacionados com a morte conseguindo que os indivíduos tivessem menos ansiedade perante aquela. Ou seja, a utilização da psicoeducação em grupo

recorrendo-se

a

diversas

metodologias

nas

diferentes

sessões,

demonstrou ser uma mais-valia face á ansiedade. Para as perspetivas face à morte, considera-se que aspetos sociais, culturais, educacionais, religiosos/espirituais, geracionais e do ciclo de vida, são condições que não são facilmente mutáveis ou influenciáveis apenas pelas 6 sessões, percebendo-se porque não se obtiveram alterações merecedoras de referência. No futuro seria interessante replicar-se e validar o realizado, com 8 a 10 sessões, grupo de 10 a 12 participantes, abranger mais profissionais e poder avaliar as mesmas questões estudando melhor variáveis como a idade, o tempo de trabalho, a religiosidade, as diferenças por género, grupo profissional, área de intervenção, entre outras. A avaliação a posteriori dirigida aos profissionais relativamente à ansiedade e aos utentes face à forma como os profissionais os abordam, constitui-se numa outra vertente para abordar a temática e validar o efetuado. Cada vez mais, visando a humanização do cuidar, os profissionais de saúde em CSP vão ter grandes desafios pela frente no que concerne à morte! Enfrentar a própria morte, as próprias limitações pessoais/profissionais, partilhar, enfrentar crenças e lidar de forma honesta com emoções, poderá ajudar a preservar a saúde mental e física e contribuir para a prevenção do esgotamento pelo aumento da ansiedade, neste caso relativamente à MORTE...

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

571


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E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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47. A LINGUAGEM CLÍNICA CONVOCADA PELOS ENFERMEIROS: DO PROCESSO DE DIAGNÓSTICO ÀS INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM NUMA UIPIA Ana Margarida Esteves Pereira*; Vanessa Sofia Daniel Lages** *Enfermeira, Unidade de Internamento de Psiquiatria da Infância e Adolescência, Hospital Dona Estefânia, Centro Hospitalar de Lisboa Central, EPE, a.margarida.pereira@gmail.com **Enfermeira, Unidade de Internamento de Psiquiatria da Infância e Adolescência, Hospital Dona Estefânia, Centro Hospitalar de Lisboa Central, EPE, vanessa.lages7@gmail.com

RESUMO A problemática apresentada centra-se na linguagem clínica mobilizada por enfermeiros numa Unidade de Internamento de Psiquiatria da Infância e Adolescência (UIPIA), e emerge no âmbito de um percurso académico (mestrado/pós-licenciatura em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica), em que será implementado e desenvolvido o presente projecto. Com a realização do mesmo, pretende-se compreender o processo de diagnóstico elaborado pelos enfermeiros e identificar as intervenções de enfermagem desenvolvidas ao longo da sua prática clínica. Será, nesse contexto, realizada uma colheita de dados de toda a documentação de enfermagem que consta no processo clínico, objectivando-se, com a análise desses dados, proceder à sua categorização e posterior adaptação à Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem (CIPE®). No entanto, não sendo evidente o modelo conceptual em uso na UIPIA, torna-se pertinente, numa primeira fase, a sua identificação no seio da equipa de enfermagem, recorrendo-se, para isso, ao desenvolvimento/moderação/análise de

um

Focus

Group.

Este

trabalho

compreende

um

estudo

descritivo/exploratório, que se insere numa abordagem qualitativa, sendo esperado que, através dele, se melhore a prática de cuidados de enfermagem na área de Saúde Mental da Infância e Adolescência (SMIA).

574

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


. Palavras-chave: Linguagem clínica; Processo de diagnóstico; Intervenções de Enfermagem; Psiquiatria da Infância e Adolescência.

47.1. INTRODUÇÃO Apesar de ser consensual a importância que a informação sobre os cuidados de saúde prestados ao cliente tem para a disciplina de enfermagem, nem sempre a documentação do processo de tomada de decisão é eficaz, existindo uma lacuna entre o processo de decisão que ocorre enquanto interagimos com o cliente e a sua descrição na documentação de enfermagem (Jesus, 2006, citado por Simões e Simões, 2007). Com frequência, os registos de enfermagem não reflectem os cuidados que foram prestados ao cliente e impossibilitam o planeamento de cuidados a prestar, não cumprindo a função de elo de ligação ou de meio de comunicação intra e inter-equipa (Simões e Simões, 2007). Falta-lhes conteúdo. De acordo com Goosen (1997), citado por Silva (2006, p.31), “existe na enfermagem uma resistência ao registo de informação significativa, concisa e relativa aos cuidados de enfermagem”. A documentação de enfermagem, ao ser constituída por narrações livres do processo de cuidados, é pouco estruturada, não sendo possível extrair conhecimento da experiência que é documentada (Silva, 1995, citado por Silva, 2006). Ao sentirmos esta problemática como a nossa realidade, ao longo da prática de cuidados numa UIPIA temos vindo a ser confrontadas com a necessidade de harmonizar a linguagem clínica mobilizada pelos enfermeiros, desde o processo de diagnóstico às intervenções de enfermagem. Para uma maior compreensão, entende-se como processo de diagnóstico as “fases de tomada de decisão usadas para elaboração de diagnósticos” (Carnevali & Thomas, 1993, citados por Perry & Potter, 2006, p.92). Inicia-se com a validação e agrupamento dos dados, que têm origem na apreciação inicial, seguidos de análise e interpretação dos E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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dados, identificação das necessidades do cliente e formulação de diagnósticos de enfermagem (Perry & Potter, 2006). Apesar de poder assumir uma outra definição, segundo a CIPE® – Versão 2, a «intervenção de enfermagem» é uma “acção tomada em resposta a um diagnóstico de enfermagem de modo a produzir um resultado de Enfermagem” (Ordem dos Enfermeiros [OE], 2011, p.16). As inquietações sentidas poderão relacionar-se com a singularidade da área e com as diferentes compreensões que se desenvolvem em torno dos problemas identificados, que podem dar origem a diferentes formas de pensar e prestar cuidados de enfermagem. Temos evidência deste facto nas passagens de turno morosas, registos de enfermagem exaustivos e perda de informação. Decorrente desta dificuldade, cada enfermeiro tende a definir e descrever de forma diferente os diagnósticos e as intervenções que desenvolve, necessitando de os explicitar totalmente, pois só assim sente ser claro e conseguir, então, promover a continuidade

dos

cuidados

prestados.

Segundo

Santos

et.

al

(2008),

“considerando a impossibilidade do enfermeiro permanecer 24 horas, dia após dia junto do cliente, torna-se fundamental encontrar formas de comunicação que permitam a continuidade do cuidar” (p.54). Quando nos referimos à área de SMIA, estamos a fazer referência a uma área clínica de enfermagem que não se define nem pela Saúde Mental em geral, nem pela Saúde Infantil, mobilizando conceitos, definições, princípios e modos de actuação de ambas as áreas e, simultaneamente, de si própria. Tratando-se de uma área tão específica e, concomitantemente, tão complexa, e, possivelmente, pelo facto de existirem, em Portugal, apenas dois internamentos capazes de lhe dar resposta (em Lisboa2 e no Porto3), com início de actividade relativamente

2

Inicialmente como Internamento de Pedopsiquiatria, do HDE. Desde 1992, foi associado ao Departamento de Psiquiatria da Infância e da Adolescência, do mesmo Hospital (local onde será implementado o presente projecto).

3

Inicialmente como Internamento Infantil e Juvenil no Hospital Magalhães de Lemos. Desde 1992, foi associado ao Departamento de Psiquiatria da Infância e da Adolescência, do Centro Hospitalar do Porto Hospital Maria Pia.

576

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


recente (respectivamente, em 2001 e 1974) (Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) e Coordenação Nacional para a Saúde Mental (CNSM), [201?]), parece impulsionar a existência de lacunas na documentação que os enfermeiros produzem. Esta constatação parece agravar-se pelo facto de a natureza dos cuidados prestados ao cliente se centrar, sobretudo, na relação terapêutica - “a base sobre a qual a enfermagem psiquiátrica se estabelece” (Townsend, 2011, p.120), e devido à grande diversidade de quadros psicopatológicos, durante a infância e a adolescência, exigir uma elevada diferenciação de diagnósticos de enfermagem e a implementação de intervenções que sejam adequadas às várias etapas do desenvolvimento. “Não só cada uma [das crianças] apresenta um grupo de patologias específicas dessa faixa etária, como também a expressão sintomática de uma determinada patologia se manifesta de forma distinta ao longo do desenvolvimento” (ACSS e CNSM, [201?], p.13). Consequentemente, o contexto da UIPIA parece um desafio à uniformização da linguagem usada para descrever os cuidados de enfermagem. Torna-se emergente disponibilizar mais tempo para a prestação de cuidados, garantir a continuidade de cuidados e promover a Prática Baseada na Evidência (PBE), facilitando a investigação (Doenges & Moorhouse, 1992, citados por Silva, 2006).

Linguagem clínica – CIPE®

Intimamente relacionada com a temática proposta, encontra-se a CIPE®. David Benton, o CEO4 do International Council of Nurses [ICN]), apresenta a CIPE® como sendo reconhecida, desde 2008, “como membro (…) da Família de Classificações Internacionais da OMS” (OE, 2011, p.11) e considerada, pela OE,

4

“Chief Executive Officer”. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

577


como “uma ferramenta (…) fundamental para o desenvolvimento contínuo da profissão” (OE, 2011, p.3). A CIPE® consiste numa ferramenta de informação que descreve a prática de enfermagem dentro de Sistemas de Informação de Saúde - SIS (ICN, 2007, citado por Jones et al., 2011). Apresenta uma terminologia que pode ser combinada, facilitando o desenvolvimento e o cruzamento entre os termos locais e as terminologias

existentes.

Esta

terminologia

apresenta

três

elementos

fundamentais: fenómenos/diagnósticos de enfermagem, acções de enfermagem e resultados de enfermagem. A utilização da CIPE® em contextos específicos, como é o caso da UIPIA, ajuda a cumprir os seus objectivos (Cubas, Silva & Rosso, 2010), já que promove a adesão e identificação com a mesma. Acreditamos que, desta forma, torna-se possível a divulgação do trabalho a desenvolver, pois quanto maior a sua mobilização nos mais variados contextos e, particularmente, neste contexto singular, maior aplicabilidade prática a linguagem adquire.

Sistemas de Informação em Enfermagem (SIE)

Outro dos conceitos que neste projecto assume grande importância é o de SIE. Decorrente dos SIS, os SIE referem “o esforço de análise, formalização e modelação dos processos de recolha e organização de dados, e de transformação dos dados em informação e conhecimento (…) [que visam] alargar o âmbito e aumentar a qualidade da prática profissional de enfermagem” (Goosen, 2000a, citado por Silva, 2006, p.33). Partindo desta definição, torna-se clara a natureza do presente projecto, na medida em que nos propomos a analisar, formalizar e modelar o método de definição e organização do processo de diagnóstico e intervenções de enfermagem, almejando, para o futuro, que com a sua sistematização, se transformem os dados em informação e conhecimento 578

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


(investigação), o que se repercutirá nos cuidados de enfermagem prestados (PBE) na área da SMIA.

47.2. METODOLOGIA Perante a problemática descrita, considerou-se pertinente a realização do presente projecto, de análise e intervenção, que será desenvolvido em contexto académico (mestrado/pós-licenciatura em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria), durante o ano lectivo 2012/2013. Para tal, definiu-se como objectivo geral: - Analisar e descrever a linguagem clínica convocada pelos enfermeiros, na identificação de diagnósticos e intervenções de enfermagem; E, como objectivos específicos: - Identificar o(s) modelo(s) conceptual(ais) orientador(es) da prática clínica numa UIPIA; - Compreender o processo de diagnóstico elaborado pelos enfermeiros numa UIPIA; - Identificar os diagnósticos e as intervenções de enfermagem, à luz de uma linguagem clínica classificada. 47.2.1.

PARTICIPANTES/INSTRUMENTOS/PROCEDIMENTOS

47.2.1.1. Focus Group Simões e Simões (2007) referem que existe uma “não utilização ou a utilização deturpada, dos modelos de cuidados de enfermagem adoptados pelas instituições de saúde” (p.10). Uma perspectiva real face à UIPIA em análise, uma E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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vez que não é evidente o modelo conceptual de enfermagem usado. Não obstante, Silva (2006) ressalva, a importância de analisarmos o contexto das práticas, tendo em consideração os modelos conceptuais adoptados que devem ser consistentes e independentes da linguagem classificada. Estes proporcionam um quadro de referência que permite uma abordagem sistemática sobre os fenómenos relacionados com a disciplina de enfermagem (Alligood & Tomey, 2004). Cada enfermeiro apresenta uma “imagem privada” da prática de cuidados, que influencia a sua interpretação dos dados e as suas decisões e acções (Logan, Roger & Tierney, 1995, citados por Fawcett, 1984). Desta forma, como pode uma disciplina continuar a desenvolver-se quando os seus membros possuem imagens tão diferentes e privadas? No sentido de dar resposta a esta questão

e,

simultaneamente,

aos

objectivos

do

projecto

propostos,

considerámos realizar um Focus Group, destinado a todos os enfermeiros da UIPIA. Perspectivamos, através desta estratégia, identificar o modelo conceptual em uso pelos enfermeiros e aumentar a sua consciência sobre a respectiva prática clínica, bem como o seu envolvimento face à mudança. O Focus Group é usado, desde 1940, como uma metodologia de investigação

das

Ciências

Sociais

sendo,

posteriormente,

utilizado

na

investigação em enfermagem como uma ferramenta de compreensão dos diferentes fenómenos da disciplina (Andreou & Papastavrou, 2012). Morgan (1997), citado por Galego e Gomes (2005), afirma que se trata de uma técnica qualitativa, de recolha de dados, que “visa o controlo da discussão de um grupo de pessoas, inspirada em entrevistas não directivas. Privilegia a observação e o registo de experiências e reacções dos (…) participantes (…), que não seriam possíveis de captar por outros métodos” (p.177). Permite, assim, que os participantes possam trocar, discutir, concordar ou discordar sobre as suas opiniões, atitudes e experiências, tendo o intuito de provocar atitudes ou opiniões dos participantes face a temas sensíveis (Kitzinger 1995, Kevern & Webb, 2001, Curtis & Redmond, 2007, Parahoo, 2007, citados por Shaha et. al, 2011). 580

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


47.2.1.2. Da Colheita de Dados da Documentação de Enfermagem à sua Análise No sentido de se identificarem os diagnósticos e as intervenções de enfermagem desenvolvidas na UIPIA, será alvo de colheita de dados toda a documentação produzida por enfermeiros que reside nos processos clínicos dos clientes (impressos de apreciação inicial, notas de enfermagem, folhas de avaliação, folha de transferência e folha de terapêutica). O período definido para a colheita de dados será de sete semanas (Outubro e Novembro de 2012), sendo, também, tido em consideração que os representantes legais das crianças tenham, previamente, consentido a consulta do processo clínico, para realização de “auditoria clínica e/ou projectos de auditoria da qualidade”; sem existirem, à partida, outros critérios de exclusão. Para tal, serão construídas categorias a priori, segundo a linguagem CIPE®, que procurem dar resposta à diversidade de diagnósticos e intervenções de enfermagem realizadas nesta unidade. A análise dos dados será realizada segundo a análise de conteúdo, temática e categorial, descrita por Laurence Bardin e Jorge Vala (Bardin, 1977; Vala, 1986). Esta análise “trata-se da desmontagem de um discurso e da produção de um novo discurso através de um processo de localização – atribuição de traços de significação, resultado de uma relação dinâmica entre condições de produção do discurso a analisar e as condições de produção de análise” (Vala, 1986, p.114). O conjunto de expressões encontradas no Focus Group, que reflictam o que se pretende estudar, e os diagnósticos e as intervenções de enfermagem desenvolvidas na UIPIA, apresentadas na documentação produzida, constituirão o “corpus de análise”. No final, visa-se conseguir descrever os principais diagnósticos e intervenções de enfermagem desenvolvidas na UIPIA, de acordo como um linguagem clínica classificada, que se adeque à conceptualização da equipa. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

581


47.3. CONCLUSÕES A compreensão do processo de diagnóstico elaborado pelos enfermeiros, como estratégia de elaboração efectiva de diagnósticos de enfermagem, e posterior identificação de intervenções de enfermagem, ambas mediante a terminologia da CIPE®, consiste numa estratégia de melhoria das práticas dos cuidados de enfermagem. Além disso, o presente projecto parece ser, ao mesmo tempo, inovador. Tal como afirma Sequeira (2006), a documentação dos cuidados de enfermagem em Saúde Mental não se encontra a um nível equitativo, comparativamente com outras áreas. No que respeita a área de Psiquiatria da Infância e Adolescência esse diferencial parece ser superior, possivelmente devido à sua especificidade e origem relativamente recente.

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E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

583


48. AVALIAÇÃO DO AUTOCONCEITO NUM GRUPO DE ADOLESCENTES PORTUGUESES Catarina Cardoso Tomás*; João Paulo Branco Gaspar Dias Balau**; Maria dos Anjos Coelho Rodrigues Dixe***; José Carlos Rodrigues Gomes**** *Enfermeira, Assistente na Escola Superior de Saúde de Leiria do Instituto Politécnico de Leiria, 919173035, catarina.cardosot@gmail.com, PORTUGAL **Enfermeiro nas Forças Armadas, Ramo Exército, Regimento de Artilharia n.º 4, Leiria, 936470198, jpbalau@gmail.com, PORTUGAL ***Enfermeira Especialista em Enfermagem Médico-cirúrgica, Professora Coordenadora na Escola Superior de Saúde de Leiria do Instituto Politécnico de Leiria, 964881092, manjos.dixe@gmail.com, PORTUGAL ****Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria, Professor Coordenador na Escola Superior de Saúde de Leiria do Instituto Politécnico de Leiria, 919969120, jcrgomes@ipleiria.pt, PORTUGAL

RESUMO Introdução: O autoconceito é umas das competências pessoais a desenvolver e promover na adolescência como forma de promover a saúde mental e prevenir a doença mental. Metodologia:

Um estudo quantitativo,

transversal,

descritivo-analítico foi

realizado com o objetivo principal de determinar a relação entre o nível de autoconceito do adolescente e a idade, o sexo, a realização de atividades extracurriculares, a existência de um amigo ou amigos fora do ambiente escolar, a existência de um melhor amigo, o agregado familiar e a fraternidade. Este estudo foi realizado com 48 alunos a frequentar o 8.º ano de escolaridade de uma escola do Distrito de Leiria. Estes preencheram um questionário (dados sociodemográficos e familiares e a escala de autoconceito de Piers & Herzberg, 2002) após o cumprimento dos procedimentos formais e éticos. Resultados: Os participantes apresentaram valores de autoconceito e seus fatores mais elevados que a mediana do instrumento. Determinaram-se relações 584

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


estatisticamente significativas entre o autoconceito e seus fatores mais elevados em adolescentes de 14 anos, do sexo masculino, que realizam algum tipo de atividade extracurricular e que coabitam com irmãos. Conclusões: Este estudo demonstra a necessidade de intervir prioritariamente em adolescentes cujas características demonstram níveis mais baixos de autoconceito (sexo feminino, não ter atividades extracurriculares, não ter amigos fora do contexto escolar ou não ter um melhor amigo nem irmão em coabitação), devendo a mesma incidir na perceção da aparência física e da ansiedade.

Palavras-chave: Adolescência; Autoconceito, Promoção de Saúde Mental

48.1. INTRODUÇÃO A adolescência, é um período desenvolvimental intenso a nível físico, emocional, social e cognitivo, o que exige dos adolescentes competências e recursos de adaptação às alterações e experiências vivenciadas. É desde a infância que a aquisição de competências vai ocorrendo, competências estas que permitem o sucesso nas interações sociais e o aumento de sentimento de autoeficácia e autoestima, essenciais para o desenvolvimento saudável e níveis de bem-estar satisfatórios (Remédios, 2010). O autoconceito, definido por Vaz Serra (1986), citado por Teixeira (2010, p. 7) consiste na “perceção que um indivíduo tem de si próprio nas mais variadas facetas, sejam elas de natureza social, emocional, física ou académica”. De acordo com Veiga (2012), citando Baldwin (1987), Cooley (1902), Mead (1934), Sullivan (1953), Gordon (1968) e Ziller (1973), o autoconceito é por vezes considerado com um “traço”, outras vezes a influência do meio social na sua estruturação é evidenciada, sendo nestes casos o autoconceito considerado uma essência, uma estrutura com origem na experiência social. O autoconceito é E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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muitas vezes visto como a forma como o indivíduo percebe os outros, como os outros o percebem e como ele supõe que o percebem. Sangeeta & Sumitra (2012) consideram que o autoconceito engloba e se altera com a estrutura do adolescente, tornando-se mais diferenciado e organizado ao longo do processo de transição. Um estudo realizado por estes autores, utilizando uma amostra de 240 adolescentes, demonstrou que enquanto os rapazes apresentam maior autoconceito pessoal, as raparigas apresentam níveis mais elevados de autoconceito em geral, físico e social. Adolescentes que participam em qualquer tipo de atividade extracurricular, desportivas ou não, demonstram também níveis mais elevados de autoconceito, de acordo com um estudo realizado numa amostra de 1489 adolescentes por Blomfield & Barber (2009). Os objetivos da prevenção da doença mental passam por capacitar os indivíduos para atingir positivamente as metas desenvolvimentais, bem como para promover o desenvolvimento adequado de autoestima, mestria, bem-estar e inclusão social (Tusaie, 2008). A promoção de competências pessoais e sociais é, segundo Moreira & Melo (2005) uma das estratégias a adotar na promoção de saúde mental e prevenção de patologia psiquiátrica, quer na adolescência, quer na idade adulta. Em relação ao ambiente familiar, um estudo realizado por Kaur, Rana & Kaur (2009), demonstra que ambientes familiares favoráveis (com boas relações pais-filhos) estão

corelacionados

com

níveis

mais

elevados

de

autoconceito

nos

adolescentes. Perceber os níveis de autoconceito de uma população, bem como a sua relação com determinadas características pessoais, permite ao Enfermeiro Especialista em Saúde Mental e Psiquiatria o desenvolvimento e aplicação de programas psicoterapêuticos adequados e adaptados à população em causa e ao

586

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


contexto em que se inserem, promovendo o desenvolvimento de competências com vista à promoção de saúde mental. Este estudo quantitativo realizado numa amostra de alunos do 8.º ano de uma Escola do Distrito de Leiria teve como objetivo: - Conhecer o nível de percepção do aspecto comportamental, do estatuto intelectual, da aparência física, da ansiedade, da popularidade e da satisfação e felicidade, tendo em conta a idade, o sexo, a realização de atividades extracurriculares, a existência de um amigo ou amigos fora do ambiente escolar, a existência de um melhor amigo, o agregado familiar e a fraternidade. - Determinar a relação entre o nível de percepção do aspecto comportamental, do estatuto intelectual, da aparência física, da ansiedade, da popularidade e da satisfação e felicidade e a idade, o sexo, a realização de atividades extracurriculares, a existência de um amigo ou amigos fora do ambiente escolar, a existência de um melhor amigo, o agregado familiar e a fraternidade.

48.2. METODOLOGIA O presente estudo é de carácter quantitativo, transversal, descritivoanalítico. Pretende-se com este estudo uma análise do autoconceito numa amostra de adolescentes que frequentam o 8.º ano de uma Escola do Distrito de Leiria, sendo a mesma realizada com base na avaliação dos seis fatores do autoconceito definidos por Piers & Herzberg (2002), e a sua correlação com características sociodemográficas como a idade, o sexo, o facto de ter melhor amigo ou amigos fora do ambiente escolar, a fraternidade, entre outras.

48.2.1. PARTICIPANTES

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

587


A população deste estudo compreende os alunos adolescentes que frequentavam o 8.º ano de escolaridade no ano letivo 2011/2012 de uma Escola Básica do Distrito de Leiria (194 alunos) O método de amostragem utilizado foi não probabilístico de conveniência, tendo sido selecionadas duas turmas do 8.º ano dessa mesma Escola (43 alunos, ou seja, 22,16% da população). Os critérios de inclusão definidos para a amostra foram aceitar participar no estudo, os seus pais autorizarem a sua participação e pertencer às turmas selecionadas.

48.2.2. INSTRUMENTOS Os

dados

foram

colhidos

tendo

por

base

um

questionário

de

autopreenchimento, constituído por duas partes. Uma primeira parte continha questões sociodemográficas e de caracterização da amostra. A segunda parte inclui o instrumento de avaliação do autoconceito, o Piers-Harris Children’s SelfConcept Scale 2 Piers & Herzberg (2002), elaborada por Piers & Herzberg (2002), e traduzida e validade para a população portuguesa por Veiga (2006). Trata-se de uma versão reduzida da PHCSCS destinada a crianças e adolescentes (do 2.º ao 12.º anos de escolaridade), desde que tenham pelo menos 7 anos e revelem competências de leitura até aos 18 anos de idade, podendo aplicar-se individualmente ou a pequenos grupos. É constituída por 60 itens de resposta do tipo Thurstone (itens dicotómicos de resposta Sim/Não), que avaliam seis fatores: aspeto comportamental, estatuto intelectual, aparência física, ansiedade, popularidade e a satisfação e felicidade. Cotações mais altas revelam atitudes mais positivas em relação a si.

588

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


48.2.3. PROCEDIMENTOS Os dados foram colhidos no terceiro trimestre do ano letivo 2011/2012, durante um tempo letivo, e tratados com recurso ao programa estatístico SPSS. Em termos formais e éticos foram solicitadas autorizações às entidades competentes (DGIDC e Direção da Escola), bem como autorização aos encarregados de educação para a participação dos jovens no estudo. Foi salvaguardada a possibilidade de recusa por parte dos participantes, bem como a confidencialidade dos dados obtidos.

48.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS A amostra é constituída por 43 indivíduos, com idades compreendidas entre os 13 e os 15 anos, sendo que a maioria é do sexo masculino (58,14%), realiza alguma atividade extracurricular 55,81% da amostra, 86,05% tem algum amigo ou grupo de amigos fora do ambiente escolar, 79,07% considera ter um melhor amigo e 74,42% tem irmãos. O autoconceito apresenta uma média superior (42,84) ao valor médio da escala (30). O aspeto comportamental, a popularidade e a satisfação/felicidade são os fatores do autoconceito que apresentam valores mais elevados. Os valores mais baixos são encontrados nos factores aparência física e ansiedade. Para perceber esta ponderação, realizou-se uma análise relacionando a média obtida em cada item, com o total possível para cada um, obtendo assim valores percentuais em relação à pontuação máxima possível (Tabela 1).

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

589


Tabela 1 – Médias obtidas dos fatores de autoconceito Pontuação

Média das

Ponderação da média das

máxima

respostas

respostas obtidas em relação à

possível

obtidas

pontuação máxima possível (%)

Aspeto

13

10,3023

79,25

Ansiedade

8

4,8372

60,47

Estatuto

13

8,4651

65,12

Popularidade

10

7,6512

76,51

Aparência física

8

4,8372

60,47

Satisfação-

8

6,7442

84,30

60

42,8372

71,40

comportamental

intelectual

Felicidade Autoconceito TOTAL

Perceberam-se diferenças estatisticamente significativas (p<0,05) em alguns fatores do autoconceito (e o autoconceito em si) tendo em conta algumas variáveis sociodemográficas, nomeadamente o sexo, a prática de algum tipo de atividades extracurriculares, a existência ou não de um amigo ou grupo de amigos da mesma idade fora do contexto escolar e a presença ou não de irmão que viva na mesma casa que o adolescente inquirido (Tabela 2). Obtiveram-se valores mais elevados nos fatores ansiedade, aparência física, Satisfação590

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Felicidade e no autoconceito no sexo masculino. Os jovens com atividades extracurriculares ou com amigos da mesma idade fora do ambiente escolar apresentam níveis mais elevados de popularidade. Os jovens com irmão a viver na mesma casa, apresentam níveis mais elevados dos fatores aspeto comportamental, estatuto intelectual e Satisfação-Felicidade.

Tabela 2 – Resultados da aplicação do teste de Mann-Whitney U aos fatores de autoconceito de acordo com o sexo, prática de atividades extracurriculares, existência de amigos fora da escola e existência de irmãos a viver na mesma casa Médi a Masculino

25.76

Ansiedade

Aparência física

SatisfaçãoFelicidade

Autoconceito TOTAL

Feminino

16.78

Masculino

25.46

Feminino

17.19

Masculino

25.10

Feminino

17.69

Masculino

25.20

Feminino Com

Popularidade

17.56 atividades Sim

extracurriculares fora da

U

131.00 0

138.50 0

147.50 0

145.00 0

-2.344

-2.151

-1.998

-1.973

27.35 99.500

Não

Z

-3.206

15.24

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

p

0.01 9

0.03 1

0.04 6

0.04 9

0.00 1

591


escola? Com amigo ou grupo de Sim Popularidade

amigos da mesma idade Não

11.17

Com amigo ou grupo de Sim

24.04

fora da escola? Autoconceito TOTAL

amigos da mesma idade fora da escola?

Não

Aspeto

Com irmãos a viver na Sim

comportamen

mesma habitação?

intelectual

SatisfaçãoFelicidade

25.58 17.03

Com irmãos a viver na Sim

26.74

mesma habitação?

Não

15.42

Com irmãos a viver na Sim

25.74

mesma habitação?

Não

46.000

-2.324

35.500

-2.651

9.42

Não

tal Estatuto

23.76

16.81

135.50 0

106.50 0

131.50 0

-2.247

-2.951

-2.410

0.02 1

0.00 6

0.02 5

0.00 3

0.01 6

Encontraram-se também diferenças estatisticamente significativas (p<0,05) de alguns fatores em relação à idade dos participantes (Tabela 3). Os adolescentes com 14 anos revelaram valores mais elevados de popularidade e autoconceito total, enquanto os adolescentes com 15 anos apresentaram valores mais elevados de Satisfação-Felicidade.

592

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Tabela 3 – Resultados da aplicação do teste Kruskal Wallis aos fatores de autoconceito de acordo com a idade Média

Popularidade

SatisfaçãoFelicidade

Autoconceito TOTAL

13 anos

17.19

14 anos

27.03

15 anos

25.10

13 anos

17.29

14 anos

25.62

15 anos

29.50

13 anos

17.48

14 anos

27.47

15 anos

22.40

ϰ2

6.362

6.750

5.978

p

0.04 2

0.03 4

0.05 0

Alguns fatores de autoconceito estão correlacionados com a idade dos adolescentes (Tabela 4), nomeadamente a popularidade (p=0.019), a satisfaçãofelicidade (p=0.008) e o próprio autoconceito (p=0.047). Ambos os fatores e o autoconceito em si parecem aumentar com a idade, tal como se verifica na correlação determinada.

Tabela 4 – Correlação entre fatores de autoconceito e idade (Spearman)

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593


Idade

rho

p

Popularidade

0.355

0.019

Satisfação-Felicidade

0.400

0.008

Autoconceito TOTAL

0.305

0.047

48.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS De uma forma global, os jovens inquiridos apresentam níveis de autoconceito bastante satisfatórios, tendo em consideração que qualquer um dos fatores e do autoconceito em si, se encontram com médias superiores ao seu valor mediano. Valores mais elevados de autoconceito e seus fatores foram encontrados no sexo masculino, o que contraria os dados do estudo de Sangeeta &

Sumitra

(2012).

Estas

diferenças

podem

relacionar-se

com

fatores

sociodemográficos ou da própria amostra. Valores mais elevados foram detetados em idades superiores, o que vai de encontro à conceção de autoconceito, que refere que o mesmo se vai definindo e construindo ao longo da idade e das experiências, sendo assim de esperar valores mais elevados em idades superiores. À semelhança do referido por Blomfield & Barber (2009), valores mais elevados do autoconceito e seus fatores foram encontrados nos adolescentes que praticam algum tipo de atividade extracurricular, têm irmãos a viver com eles e que têm um amigo ou grupo de amigos fora do ambiente escolar. Participar em atividades extracurriculares parece promover a popularidade, bem como o facto de ter amigos fora do ambiente escolar, o que poderá estar relacionado com o fato de estas amizades serem construídas durante a realização dessas mesmas atividades extracurriculares. 594

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


Perceberam-se diferenças estatisticamente significativas (p<0,05) nos fatores do autoconceito (e o autoconceito em si) tendo em conta algumas variáveis sociodemográficas, revendo-se haver valores mais elevados de autoconceito nos rapazes com 14 anos, com atividades extracurriculares, com amigos fora da escola e com irmãos no agregado familiar. Já o estatuto intelectual, o aspeto comportamental e a satisfação-felicidade parecem ser potenciados pela coabitação com irmãos, o que poderá estar relacionado com a estimulação e desenvolvimento de competências realizada pela interação entre irmãos e potencializado por ambientes familiares favoráveis (Kaur, Rana & Kaur, 2009) Foram também encontradas correlações entre autoconceito e os seus fatores Popularidade e satisfação-felicidade, com a idade, aumentando com a mesma.

48.5. CONCLUSÕES A partir dos dados recolhidos pode concluir-se que a intervenção por parte do Enfermeiro Especialista de Saúde Mental e Psiquiatria nesta população deve incidir sobretudo a nível do desenvolvimento e aplicação de programas e intervenções que visem a promoção da perceção da aparência física e da ansiedade, como forma de promover o autoconceito geral dos adolescentes, pois são estes os valores mais baixos encontrados. Para além disso, a intervenção, individual ou em grupo deverá incidir nos adolescentes que apresentem as características que se relacionem com níveis mais baixos de autoconceito e os seus fatores, como ser do sexo feminino, não ter atividades extracurriculares, não ter amigos fora do contexto escolar ou não ter um melhor amigo nem irmão em coabitação. Desta forma, a intervenção deve procurar foca-se sobretudo nas situações de maior necessidade, não descurando a necessidade de intervir em termos preventivos e de promoção de saúde em todos os adolescentes. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

595


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Blomfield, C & Barber, B (2009). Brief report: Performing on the stage, the field, or both? Australian adolescent extracurricular activity participation and self-concept. Journal of Adolescence, 32 (3), 733-739.

Kaur, J, Rana, J & Kaur, R (2009). Home Environment and Academic Achievement as Correlates of SelfConcept among Adolescents. Student Home Community Science, 3 (1), 13-17.

Moreira, P & Melo, A (2005). Saúde mental: do tratamento à prevenção. Porto: Porto Editora. Remédios, C (2010). O bem-estar psicológico e as competências pessoais e sociais na adolescência. Dissertação de Mestrado em Psicologia da Universidade de Lisboa.

Sangeeta, R & Sumitra, N (2012). Adolescent’s self-concept: Understanding the role of gender and academic competence. International Journal of Research Studies in Psychology, 1(2), 63-71.

Teixeira, M (2010). Estudo sobre a eficácia de um programa de inteligência emocional no autoconceito de alunos do 2.º Ciclo do Ensino Básico. Dissertação de Mestrado em Psicologia Clínica e da Saúde, Universidade Fernando Pessoa: Porto.

Tusaie K (2008). Positive Development in Children and Adolescent. Archives of Psychiatric Nursing, 22(6), 389-390.

Veiga, F (2012). Transgressão e Autoconceito dos jovens na escolar. 3.ª Edição. Lisboa: Editora Fim de Século.

596

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


49. LITERACIA EM SAÚDE MENTAL DOS ADOLESCENTES E JOVENS – UMA REVISÃO SISTEMÁTICA DA LITERATURA Tânia Morgado*; Lúcia Sousa**; Susana Conceição***; Luís Loureiro****

*Enfermeira, Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica, CHUC-HUC, EPE, tmorgado@gmail.com **Enfermeira, Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica, CHUC-HUC, EPE, sousa_lu84@hotmail.com ***Enfermeira, Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica, CHUC-HUC, EPE, susana-conceicao@hotmail.com ****Professor Adjunto, EsenfC, luisloureiro@esenfc.pt

RESUMO Nacionalmente, a existência de reduzida evidência científica sobre a literacia em saúde

mental

dos adolescentes e

jovens

conduziu-nos

à

questão de

investigação: qual a evidência científica produzida sobre o nível de literacia em saúde mental dos adolescentes e jovens acerca das perturbações alimentares, depressão, ansiedade, psicoses e uso de substâncias?. Definiram-se objectivos específicos: identificar o nível de literacia em saúde mental dos adolescentes e jovens sobre a perturbação mental; identificar as crenças; analisar os factores associados à literacia em saúde mental e identificar as estratégias de promoção da literacia em saúde mental. Realizou-se uma revisão sistemática da literatura sem metanálise. Na selecção dos artigos utilizou-se a estratégia PI[C]OS. A pesquisa foi realizada na plataforma electrónica de base de dados: B-On, no “Campo das Ciências da Saúde”, utilizando as palavras-chave: “literacia em saúde mental”/”mental health literacy”; “adolescentes/adolescents” e “jovens”/”young(ers)” e os operadores boleanos: “and” ou “+” para resultados em full-text de Janeiro de 2000 a Novembro de 2011. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

597


Foram identificados 229 artigos, excluídos 196 e incluídos 33. Esta revisão sistemática da literatura aumentou o conhecimento sobre a literacia em saúde mental dos adolescentes e jovens, sugerindo-se que outros estudos testem programas de promoção da literacia em saúde mental no contexto escolar.

Palavras-chave: Literacia; saúde mental; adolescentes/jovens

49.1. INTRODUÇÃO O conceito de literacia em saúde mental foi definido por Jorm et al. (1997; 2000) como o conhecimento e as crenças acerca da saúde mental que permitem auxiliar no reconhecimento, manutenção ou prevenção. É constituída por diversas componentes que incluem: competência em reconhecer patologias específicas ou diferentes distúrbios psicológicos; conhecimentos e crenças acerca de factores de risco e causas; conhecimentos e crenças acerca de intervenções de auto-ajuda; conhecimentos e crenças acerca da ajuda profissional disponível; atitudes facilitadoras do reconhecimento e procura de ajuda adequada; conhecimento acerca de como procurar informações em saúde mental. O autor reforça que, se a literacia em saúde mental não for promovida pode resultar num entrave, para a população, na aceitação dos cuidados de saúde mental baseados na evidência e que as pessoas portadoras de perturbação mental poderão ser menosprezadas e não ter acesso aos cuidados de saúde, nem apoio por parte da comunidade (Jorm, 2000). Desde então, vários autores internacionalmente têm estudado a literacia em saúde mental e têm sugerido a implementação de projectos e programas de intervenção nesta área nos adolescentes e jovens como uma das estratégias

598

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


para a diminuição do estigma e da discriminação perante a pessoa com doença mental. De acordo com Rickwood et. al (2005), a adolescência e a jovem adultez são fases de vida críticas para a saúde mental. Várias perturbações mentais têm o seu pico de incidência nestas fases, sendo as mais frequentes: a depressão, ansiedade,

perturbações

alimentares,

uso

de

substâncias

e

psicoses

(Commonwealth Department of Health and Aged Care & AIHW, 1999 e Early Psychosis Prevention and Intervention Centre, 1997 citados por Rickwood et. al, 2005). Nacionalmente, a existência de reduzida evidência científica sobre a literacia em saúde mental dos adolescentes e jovens conduziu-nos à seguinte questão de investigação: “Qual é a evidência científica produzida sobre o nível de literacia em saúde mental dos adolescentes e jovens (10-25 anos), no âmbito das perturbações

alimentares,

depressão,

ansiedade,

psicoses

e

uso

de

substâncias?”, definindo-se como objectivo geral: identificar a evidência produzida sobre o nível de literacia em saúde mental dos adolescentes e jovens e como objectivos específicos: identificar o nível de literacia em saúde mental dos adolescentes e jovens sobre as perturbações alimentares, depressão, ansiedade, psicoses e uso de substância; identificar as crenças relacionadas com a doença mental dos adolescentes e jovens; analisar os factores associados à literacia em saúde mental e identificar as estratégias de promoção da literacia em saúde mental em adolescentes e jovens. 49.2. METODOLOGIA E PROCEDIMENTOS Procedeu-se a uma pesquisa retrospectiva, descritiva e documental revisão sistemática da literatura, sem metanálise. A pesquisa foi realizada de Janeiro a Novembro de 2011, na plataforma electrónica de base de dados: B-On, “Campo das Ciências da Saúde”, utilizando as palavras-chave, na língua portuguesa e na língua inglesa: “literacia em saúde mental”/”mental health literacy”; “adolescentes/adolescents” e “jovens”/”young(ers)” e os operadores E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

599


boleanos: “and” ou “+”, dirigida para os resultados em full-text de Janeiro de 2000 até Novembro de 2011.

49.3. PARTICIPANTES E INSTRUMENTOS Na selecção dos artigos e na definição dos critérios de inclusão e de exclusão

utilizaram-se

os

elementos

PI[C]OS

(Centre

for

Reviews

and

Dissemination, 2009).

Quadro 1 – Critérios de inclusão e exclusão Critérios de Selecção

Critérios de Inclusão

Critérios de exclusão

Participantes

Adolescentes e Jovens com idades

Outras faixas etárias.

(Population/Participants)

compreendidas entre 10 e 25 anos.

Intervenção (Intervention)

Todos os tipos de intervenção

de

Intervenções

de

promoção da literacia em saúde mental

promoção da literacia em

no

saúde mental, no âmbito

âmbito

alimentares,

das depressão,

perturbações ansiedade,

de outras perturbações.

psicoses e uso de substâncias. Comparações/contexto

Contexto escolar.

Outros contextos.

do estudo (Comparators) Resultados (Outcomes)

Todos os resultados.

Desenho do estudo/Tipo

Quantitativos

de estudo (Study Design)

Qualitativos e Revisões da Literatura.

49.4. APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS

600

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


Foram identificados 229 artigos, nas diferentes bases de dados. Tendo em consideração os critérios de inclusão e exclusão definidos, 196 artigos foram excluídos e 33 artigos foram incluídos nesta revisão sistemática da literatura (Quadro 2).

Quadro 2 – Processo de selecção dos artigos Razões de Exclusão

de

artigos

excluídos Excluídos por repetição

18

Excluídos pelo título

30

Excluídos pela leitura do resumo

14

Excluídos por não apresentação de 10 full-text Excluídos pela leitura integral (Full Text): - Revisões da Literatura - Qualitativos - Faixa etária - Outras perturbações

25 5 83 11

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601


Apresentam-se seguidamente os artigos incluídos (Quadro 3) nesta revisão sistemática da literatura.

Quadro 3 - Artigos Incluídos Nº

Referência/País

1

SCHULZE, B [et al.] (2003) - Crazy? So what! Effects of a school project on students` attitudes towards peoples with schizophrenia. Acta Psychiatr Scand, 107, 142-150.

2

PINFOLD, V. [et al.] (2003) - Reducing psychiatric stigma and discrimination: evaluation of educational interventions in UK secondary schools. Journal of Psychiatry, 182, 342346.

3

SHEFFIELD, J.K.; FIORENZA, E.; SOFRONOFF, K. (2004) - Adolescents’Willingness to Seek Psychological Help: Promoting and Preventing Factors. Journal of Youth and Adolescence, 33 (6), 495-507.

4

WRIGHT, A [et al.] (2005) - Recognition of depression and psychosis by young Australians and their beliefs about treatment. The Medical Journal of Australia, 183 (1), 18-23.

5

BURNS, J.R.; RAPEE, R.M.(2006) - Adolescent mental health literacy: Young people’s knowledge of depression and help seeking. Journal of Adolescence, 29, 225-239.

6

KELLY, C.M.; JORM, A. ; RODGERS, B. (2006) - Adolescents’ responses to peers with depression or conduct disorder . Australian and New Zealand Journal of Psychiatry, 40, 63-65.

7

WRIGHT, A. [et al.] (2006) - Development and evaluation of a youth mental health community awareness campaign – The Compass Strategy. BMC Public Health, 6(215), 1-13. 602

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


8

COTTON, S.M. [et al.] (2006) - Influence of gender on mental health literacy in young Australians. Australian and New Zealand Journal of Psychiatry, 40 (9), 790–796.

9

PUSKAR, R. [et al.] (2006) - School Based Mental Health Promotion: Nursing Interventions for Depressive Symptoms in Rural Adolescents. Californian Journal of Health Promotion, 4, 13-20.

10

KELLY, C.M.; JORM, A. (2007) - Adolescents’ intentions to offer assistance to friends with depression or conduct disorder: associations with psychopathology and psychosocial characteristics. Early Intervention in Psychiatry, 1 (2), 150-156.

11

MOND, J.; MARKS, P. (2007) - Beliefs of adolescent girls concerning the severity and prevalence of bulimia nervosa. Australian Journal of Psychology, 59 (2), 87-93.

12

MORGAN, A.; JORM, A. (2007) - Awareness of beyondblue: the national depression initiative in Australian young people. Australian Psychiatry, 15 (4), 329- 333.

13

HIDES, L. [et al.] (2007) - Feasibility and acceptability of a mental health screening tool and training programme in the youth alcohol and other drug (AOD) sector. Australasian Professional Society on Alcohol and other Drugs, 26 (5), 509-515.

14

WRIGHT, A. [et al.] (2007) - What’s in a name? Is accurate recognition and labeling of mental disorders by young people associated with better help-seeking and treatment preferences? Soc Psychiatry Psychiatr Epidemiol, 42 (3), 244–250.

15

MOND, J.; MARKS, P. (2007) - Beliefs of adolescent girls concerning the severity and prevalence of bulimia nervosa. Australian Journal of Psychology, 59 (2), 87-93.

16

GOLDNEY, R.; TAYLOR, A.; BAIN, M. (2007) - Depression and remoteness from health services in South Australia. Aust. J. Rural Health, 15(3), 201–210.

17

WILSON, C.; RCKWOOD, D.; DEANE, F. (2007) - Depressive symptoms and help-seeking intentions in young people. Clinical Psychologist, 11 (3), 98-107.

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603


18

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49.5. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Relativamente ao nível de literacia em saúde mental dos adolescentes e jovens sobre as várias perturbações, Sheffield, Fiorenza e Sofrono (2004) no seu estudo referem que 99,2% dos alunos estão cientes de que as pessoas vivenciam doença mental, sendo que 95,2% tomaram consciência da doença mental há 2 E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

605


anos. Acrescentam que as patologias mais referenciadas foram: Depressão (13%); Ansiedade (13%); Distúrbios alimentares (13%); outros problemas (39,2%). Posteriormente, Wright et al. (2005) mencionam que quase metade dos jovens que entrevistaram foram capazes de identificar correctamente a depressão, no entanto apenas um quarto foi capaz de identificar a psicose, ao contrário de Burns e Rapee (2006), que referem que os adolescentes não foram capazes de diferenciar deprimidos de não deprimidos, em termos de gravidade e tempo de recuperação prevista. Morgan e Jorm (2007) no estudo que realizaram na Austrália no âmbito da campanha nacional de conscientização da comunidade na área da depressão – Beyondblue, concluíram que 44% dos jovens estavam esclarecidos

acerca

desse

programa

referindo

mesmo que

12,1%

dos

adolescentes sabiam tratar-se de uma organização relacionada com problemas de saúde mental. Também no estudo de Swords, Hennessy e Heary (2011) é afirmado que os adolescentes distinguiram as personagens das vinhetas com perturbações mentais da personagem sem perturbação. Estes autores reforçam ainda que os adolescentes reconheceram que as personagens com sintomas de perturbação mental precisavam de ajuda. Mais recentemente, no estudo de Klineberg et al. (2010) verificou-se que os sintomas depressivos graves foram reconhecidos por 61,4% dos jovens entrevistados. Apesar destas evidências relativamente à literacia em saúde mental dos adolescentes e jovens, no que se refere às crenças relacionadas com a doença mental alguns autores referem que os adolescentes acreditam as pessoas com doença mental “estão fracos ao invés de doentes” (Morgan e Jorm, 2009; Oh, Jorm e Wright, 2009). Também é referida a crença de que as doenças mentais são problemas de comportamento (Oh, Jorm e Wright, 2009). Segundo o estudo desenvolvido por Yap, Reavley e Jorm (2011), os participantes que tinham experimentado recentemente problemas de saúde mental; os mais jovens; as raparigas e os não expostos a informações de saúde mental eram mais propensos a ter crenças que são diferentes das de profissionais de saúde ou das evidências disponíveis. Morgan e Jorm (2007) referem que os adolescentes foram 606

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


mais propensos a lidar com os seus problemas de saúde mental sozinhos ou utilizando álcool, havendo a crença de que estas são formas de tratamento eficazes. Cotton (2006) já havia apresentado esta crença, referindo que os adolescentes do sexo masculino bebiam álcool como forma de lidar com a depressão e antibiótico para a psicose. Mond et al. (2006) salientam que as crenças podem ser favoráveis à baixa e/ou inadequada procura de tratamento nomeadamente para distúrbios alimentares entre as adolescentes. Quanto aos factores associados à literacia em saúde mental, os estudos encontrados evidenciam a idade, o género e as condições sócio-demográficas no que se refere ao meio rural e ao meio urbano. Morgan

e

Jorm

(2007)

referem

que

com

a

idade

aumenta

a

consciencialização para os problemas de saúde mental. Do mesmo modo, Swords, Hennessy e Heary (2011), num estudo realizado com grupos de adolescentes de 12, 14 e 16 anos, verificaram que os adolescentes de 16 anos foram os mais propensos a diferenciar os tipos de ajuda em função dos sintomas clínicos da hiperactividade e da depressão. Os seus resultados indicam um aumento da consciência das fontes profissionais de ajuda para os problemas de saúde mental com a idade, no entanto não referiram nada sobre a fonte deste conhecimento. Relativamente ao género, Pinfold et al. (2003) referem que existiram diferenças na forma como os homens e as mulheres jovens aprendem sobre saúde mental e doença mental, sendo que as mudanças ao nível da literacia em saúde mental foram mais marcantes para as estudantes do sexo feminino. Os autores sugerem que as sessões de ensino devem adoptar métodos que reconheçam essas diferenças. Sheffield, Fiorenza e Sofronoff (2004) defendem que as adolescentes tiveram atitudes menos estigmatizantes apresentando melhor conhecimento sobre a doença mental e maior nível de apoio social, em comparação com os adolescentes. Para Wright et al. (2005) foi visível que os adolescentes e os jovens reconheceram a depressão, no entanto verificou que o E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

607


género masculino apresentou mais dificuldade em detectar esta doença. Relativamente à psicose constou que os adolescentes tiveram mais dificuldade em a identificar, não se verificando diferenças significativas entre os géneros masculino e feminino. Cotton (2006) concluiu que 60,7% do género feminino identificaram correctamente a vinheta da depressão, enquanto apenas 34,5% do género masculino o fez correctamente. Verificou-se assim que o género masculino apresenta menor conhecimento acerca dos sintomas da doença mental e o modo como lidar com a doença. A autora verificou também que o género masculino é menos susceptível a procurar ajuda no tratamento da psicose, ideia também reforçada por Klineberg et al. (2010) e por Shandley et al. (2010). Kelly e Jorm (2006) referem também que as raparigas tendem a responder de forma diferente para ambas as vinhetas, da depressão e do transtorno a conduta, enquanto os rapazes respondem de forma semelhante para as duas vinhetas. Burns e Rapee (2006) verificaram que os rapazes foram menos propensos a participar no estudo que realizaram sobre o conhecimento da depressão e a procura de ajuda, do que as raparigas. Morgan e Jorm (2007) referem que os jovens do género masculino têm menor consciência para os problemas de saúde mental, reforçando que estes podem ser alvo de estratégias de melhoria dos seus conhecimentos sobre a saúde mental. Estudos mais recentes têm também suportado esta ideia (Leighton, 2009; Klineberg et al., 2010). Quanto às condições sócio-demográficas, Goldney, Taylor e Bain (2007) mencionam que os achados do seu estudo indicam que a depressão não é mais prevalente nas regiões menos acessíveis do sul da Austrália e que quando está presente, o seu tratamento, é com antidepressivos, o que pode ser considerado como um marcador para a gestão global da depressão, sendo semelhante ao tratamento em áreas mais acessíveis. Deste modo, os autores enfatizam que não existem diferenças entre o meio rural e meio urbano para a detecção e o tratamento da depressão. Por seu lado, Klineberg et al. (2010) reforçam que os jovens do sexo masculino, principalmente dos meios rurais, reconheceram os 608

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problemas de saúde mental menos do que as jovens mulheres, sendo que os grupos sócio-demográficos de maior risco de suicídio são os menos propensos a reconhecer

a

depressão.

Estes

autores

evidenciam

a

necessidade

de

desenvolver intervenções orientadas para os homens, sobretudo de meios rurais. Relativamente às estratégias de promoção da literacia em saúde mental em adolescentes e jovens, os resultados desta revisão sistemática da literatura evidenciam

que

na

última

década

muitos

têm

sido

os

estudos

que

desenvolveram programas e/ou projectos de promoção da literacia em saúde mental, recorrendo a maior parte deles aos desenhos experimentais, quasiexperimentais ou pré-experimentais com evidência em ganhos para a saúde nesta área. Schulze et al. (2003) referem que os projectos anti-estigma realizados a nível escolar podem ser uma promissora abordagem para melhorar as atitudes dos jovens e prevenir o reforço dos estereótipos. Pinfold et al. (2003) referiu também que sessões de ensino sobre a saúde mental para os jovens são uma abordagem útil para reduzir o estigma e a discriminação em relação à pessoa com doença mental e que mesmo sessões educativas sob a forma de workshops podem produzir mudanças positivas nas atitudes dos jovens perante pessoas com doença mental. Posteriormente, Sheffield, Fiorenza, Sofronoff (2004) afirmam a importância e a necessidade de desenvolver intervenções de saúde mental em contexto escolar que levem os adolescentes a procurar ajuda. Lauber (2005) reforça mesmo que a fim de melhorar a literacia em saúde mental, o ensino desta área deve ser integrado no currículo do ensino médio ou de aprendizagem especial. Wright et al. (2006) desenvolveram um programa de sensibilização dos jovens para a literacia em saúde mental, cujos resultados evidenciam um impacto positivo sobre várias variáveis relativas à literacia em saúde mental. Por sua vez, Tacker e Dobie (2008) implementaram um workshop em sala de aula, de baixo custo, eficaz, adaptável e com a duração de 6 semanas, intitulado “MasterMind”. Os autores reforçam que este tipo de programa tem potencial para fornecer aos estudantes ferramentas de optimização da saúde mental. Outros autores

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

609


desenvolveram programas em que avaliaram a satisfação dos adolescentes e jovens, cujos resultados apoiaram estas ideias (Fraser e Pakenham, 2008). Estudos mais recentes evidenciam a implementação de programas de promoção da literacia em saúde mental com recurso às novas formas de comunicação como a internet (Oh, Jorm e Wright, 2009; Horgan e Sweeney, 2009). Mais recentemente, Shandley et al. (2010) avaliaram a implementação de um programa de jogos on-line Reach Out Central (ROC) destinado a apoiar/ajudar os adolescentes relativamente à saúde mental através de estratégias cognitivocomportamentais, reforçando que a satisfação com o programa foi elevada para ambos os sexos.

49.6. CONCLUSÕES Os estudos evidenciam que os adolescentes e jovens em geral reconhecem que as pessoas vivenciam a doença mental sendo capazes de a identificar, no entanto possuem a crença de que a perturbação mental é sinónimo de fraqueza ou de alteração comportamental e que o álcool é uma forma de tratamento eficaz. Quanto aos factores associados à literacia em saúde mental verificou-se que: com a idade aumenta a consciencialização para os problemas de saúde mental; existem diferenças entre géneros, possuindo o género feminino, atitudes menos estigmatizantes em relação à doença mental e não existem diferenças significativas entre o meio rural e urbano na detecção e tratamento da depressão. Os estudos evidenciam que os projectos anti-estigma realizados em contexto escolar são uma abordagem útil para reduzir o estigma relativamente à pessoa com perturbação mental, havendo ganhos ao nível da literacia em saúde mental. Apesar das suas limitações, esta revisão sistemática da literatura contribuiu para um maior conhecimento da evidência científica sobre a literacia em saúde mental dos adolescentes e jovens, sugerindo-se a realização de estudos futuros

610

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que testem programas de intervenção de promoção da literacia em saúde mental, preferencialmente no contexto escolar.

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611


50. QUALIDADE DE VIDA E BEM-ESTAR DOS IDOSOS Sandra Moreira*; Teresa Rodrigues Ferreira**; Elizabete Borges*** *Enfermeira Especialista em Saúde Mental e Psiquiatria, Agrupamento de Centros de Saúde de Matosinhos - Unidade de Cuidados na Comunidade de S. Mamede de Infesta; Email: sandra.moreira@ulsm.min-saude.pt **Professora Doutora; Escola Superior de Enfermagem do Porto; Email: teresarodrigues@esenf.pt ***Professora Doutora; Escola Superior de Enfermagem do Porto; Email: elizabete@esenf.pt

RESUMO A promoção da saúde e bem-estar do idoso é imprescindível constituindo a segunda orientação prioritária de intervenção, referida no Plano Internacional para o Envelhecimento de 2003, evidenciando as preocupações com o envelhecimento bem-sucedido, promotor de Qualidade de Vida (QV) e Bem-Estar. O presente estudo teve como objetivo analisar a relação entre Qualidade de Vida e Bem-estar dos idosos. É um estudo exploratório, transversal, descritivo e correlacional,

que

se

desenvolveu

segundo

o

paradigma

quantitativo.

Participaram no estudo 50 idosos, com idade média de 78,10 anos, que cumpriam os critérios de inclusão. Os participantes da amostra vivem sós entre 1 e 38 anos. O questionário aplicado foi de auto-resposta, com questões para caraterização psicossocial da amostra e escalas. A Escala de Bem-Estar Psicológico (α=0,85) avalia o bem-estar psicológico (total e subescalas). O Short-Form com 12 itens (α=0,84) avalia a perceção do estado de saúde e a Qualidade de Vida (total, componentes: físico e mental) dos idosos. Nos resultados verificou-se que mais Bem-Estar Psicológico associa-se a melhor perceção de Qualidade de Vida (Total e componentes física e mental) dos idosos.

612

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O enfermeiro assume um papel preponderante na promoção da Qualidade de Vida dos idosos, devendo considerar na sua prática as componentes do Bemestar Psicológico.

Palavras-chave: Bem-estar Psicológico; Envelhecimento; Idosos; Qualidade de Vida; Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria.

50.1. INTRODUÇÃO A saúde é definida pela Organização Mundial de Saúde (OMS, 1998) como um estado de bem-estar físico, mental e social e não somente ausência de doença. Acrescenta ainda que a promoção da saúde e da QV podem ser consideradas sinónimos, sendo esta posição também assumida pelo Grupo Português para o Estudo da QV. Chegar à velhice com boa saúde e bem-estar requer por um lado um esforço individual durante toda a vida, mas por outro um ambiente em que esse esforço possa ter êxito (ONU, 2003). A responsabilidade individual consiste no facto das pessoas desenvolverem um modo de vida saudável. Relativamente aos governantes, a ONU, refere que estas entidades devem promover a criação de um ambiente favorável à saúde e ao bem-estar, inclusive na velhice. No âmbito da saúde, o conceito de QV desenvolve-se numa perspetiva de avaliação holística e neste sentido, a QV é considerada uma dimensão pessoal, multidimensional e bipolar. Santos (2008), refere ainda que este conceito é dinâmico, inerente ao fator tempo, experiências e acontecimentos vivenciados. É indiscutível que o envelhecimento bem sucedido está relacionado com a QV, tal como nos recorda Sequeira (2010), quando menciona que o envelhecimento bem sucedido, determina os conceitos centrais para a E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

613


Gerontologia, onde construtos como bem-estar e a QV dos idosos constituem os principais indicadores de uma adaptação bem sucedida. A velhice constitui um período de grandes mudanças (a nível biológico, psicológico e social), que exigem ao idoso um esforço de adaptação às novas condições de vida, tratando-se de um momento de risco para o equilíbrio e BEP (Sequeira e Silva, 2002 e Coimbra, 2008). As variáveis positivas, como o bem-estar, são assim relevantes. Em 1997 Folkman, fazia referência à sua importância, identificando esta variável como protetora no lidar com as diferentes circunstâncias da vida ao longo do ciclo vital (Ribeiro, 2006a). De igual modo, as ciências de enfermagem não são indiferentes à importância deste conceito e consideram-no como um foco de atenção, que deve estar implícito na abordagem holística do indivíduo e na prestação de cuidados diários. Neste contexto, o bem-estar é definido, segundo CIPE (Versão Beta 2, 2002, p.43), como sendo um tipo de autoconhecimento com as caraterísticas específicas: imagem mental de se sentir bem, de equilíbrio, contentamento, amabilidade ou alegria e conforto, usualmente demonstrada por tranquilidade consigo próprio e abertura para as outras pessoas ou satisfação com a independência. Torna-se premente a descrição de variáveis positivas como o Bem-estar, uma vez que esta é capaz de influenciar a QV dos idosos e de aumentar a probabilidade de um envelhecimento bem-sucedido. Até porque, se o papel de um conjunto de variáveis é a preservação das doenças mentais, como refere Ribeiro (2006a), é de todo pertinente efetuar a abordagem a estas variáveis aquando da avaliação dos idosos em contexto de saúde.

614

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O objetivo deste trabalho foi analisar a relação entre QV e o Bem-estar dos idosos. Emerge assim a seguinte questão: Qual a relação entre QV e Bem-estar dos idosos?

50.2. METODOLOGIA No que concerne ao tipo de estudo, este é exploratório, descritivo, transversal e correlacional integrado no paradigma quantitativo. Para o presente estudo definiram-se como variável principal a Qualidade de Vida e como variáveis secundárias o Bem-estar e as variáveis psicossociais nomeadamente: sexo, idade, estado civil, escolaridade, situação ocupacional, origem do rendimento familiar, habitação, religião, tempo que vive só, situação de saúde e vigilância de saúde, regime terapêutico, atividades e estilos de vida, dependência no autocuidado e as necessidades de suporte: formal e informal.

50.2.1. PARTICIPANTES (POPULAÇÃO E AMOSTRA) O estudo de Investigação desenvolveu-se no Concelho de Matosinhos em contexto de habitação social tipo bairro. A amostra de conveniência constitui-se por um grupo de idosos que aceitaram participar no estudo e que reuniam os seguintes critérios de inclusão: - ter idade igual ou superior a 65 anos de idade; - residir na Freguesia de S. Mamede Infesta; - residir só, pelo menos há 12 meses; - reunir competências cognitivas que lhe permitissem a compreensão do conteúdo do questionário. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

615


50.2.2.

INSTRUMENTOS

Para efetuar a recolha de dados, optou-se pela aplicação de um questionário, constituído por duas partes. A primeira parte com a caraterização da amostra alusiva às variáveis psicossociais. A segunda parte do questionário é referente às escalas utilizadas: o Short-Form com 12 itens (SF-12) e a Escala de Bem-Estar Psicológico (EBEP).

Short-Form com 12 items (SF-12)

O SF-12 permite avaliar a perceção do estado de saúde e a QV, tendo como única opção de pontuação o cálculo de dois Componentes: o Físico (CF) e o Mental (CM) (Pais-Ribeiro, 2007; Ribeiro, 2005c). A valores mais elevados corresponde uma melhor Perceção do Estado de Saúde e variam entre 0 -100 (Ribeiro, 2005c). Na amostra em estudo a consistência interna para a Escala SF-12, apresentou valores semelhantes aos encontrados por Ribeiro (2005c), ou seja, para o SF-12 total um valor de 0,84; para o componente físico do SF-12, o Alpha de Cronbach é de 0,79 e de 0,77 para o componente mental.

Escala de Bem-Estar Psicológico (EBEP)

A EBEP é um instrumento de avaliação desenvolvido com o intuito de avaliar a saúde mental com base num critério normativo sustentado segundo Kafka e Kozma (2002, cit. in Fernandes, 2007), num modelo alternativo e mais abrangente do conceito de bem-estar durante a vida adulta e a velhice.

616

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A EBEP (18 itens) é constituída por seis dimensões que correspondem a seis subescalas: Aceitação de Si (AS), Crescimento Pessoal (CP), Objetivos na Vida (OV), Relações Positivas com os Outros (RPO), Domínio do Meio (DM) e Autonomia (AUT), (Couto, 2005). Estas dimensões identificam respetivamente as seis caraterísticas do bem-estar (Pais-Ribeiro, 2007). Cada um dos itens da EBEP é mensurado numa escala de concordância tipo Likert de 6 pontos (1 - Discordo completamente a 6 - Concordo completamente). O resultado final obtido em cada subescala corresponde ao nível de bem-estar no domínio avaliado (Couto, 2005 e Novo, 2003). Os valores de consistência interna para os diferentes estudos realizados com a EBEP (18 itens) variaram entre 0,33 a 0,59. No presente estudo os valores variam entre 0,55 a 0,64 (excluindo o valor de 0,03 para a subescala Autonomia). O valor da consistência interna da EBEP Total foi de 0,85. Boa consistência, em consonância com o valor da consistência interna da escala original, que varia entre 0,70 e 0,89 (Novo, 2003). A subescala Autonomia apresenta no presente estudo o valor de consistência interna de 0,03, valor baixo de Alpha, pelo que recomenda a prudência a utilização dos resultados com esta subescala como meros indicadores.

50.2.3.

PROCEDIMENTOS

Previamente à construção do questionário foi efetuado o pedido de autorização aos autores para a utilização das escalas neste estudo. A recolha de dados foi realizada através de contato individual com os idosos, na sua residência habitual, tendo sido aplicados questionários a 50 idosos que cumpriam os critérios de inclusão.

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617


Para a análise quantitativa dos dados, recorreu-se ao programa SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) versão 18.0 e a testes da estatística paramétrica.

50.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS No que se refere à caraterização dos participantes, 41 são do sexo feminino e 9 são do sexo masculino. Dos 50 participantes, 42 são viúvos e 31 estão reformados por idade. Quanto à escolaridade (em anos), o valor mínimo é de zero e o valor máximo é de 9 anos de escolaridade, com uma média de 3,24 anos de escolaridade. Relativamente à situação laboral, 31 dos idosos estão reformados por idade e 19 por invalidez, sendo a Origem do Rendimento Familiar para 49 idosos a pensão ou reforma. Trinta e quatro idosos residem em habitação tipo casa e 16 em apartamento. Para 36 dos idosos a casa é arrendada e 14 são os proprietários da casa que habitam. Relativamente à religião, 45 idosos professam a religião católica e 2 a evangélica. Quarenta idosos referem ser praticantes. Os idosos da amostra vivem, entre 1 e 38 anos, sós no domicílio habitual, com o valor da moda de 4 anos. Quarenta e nove dos idosos referiram recorrer aos cuidados de saúde com frequência, sendo que 34 referiram polipatologia e 16 idosos uma patologia. No domínio da vigilância de saúde, a totalidade dos idosos (50), referiram que iam ao médico habitualmente e a frequência das consultas, foi para 36 idosos duas vezes por ano. 618

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Quarenta e sete dos idosos referiu tomar habitualmente medicação. Dos 40 idosos que referiram não ter doença mental tomavam medicação psicotrópica. Relativamente à Gestão do Regime Terapêutico, 45 dos idosos referiram cumprir as orientações para o tratamento adequado da patologia. Quanto à Adesão ao Regime Terapêutico 48 idosos mencionaram cumprir as exigências terapêuticas dos cuidados de saúde. Quarenta e nove idosos referiram que não consumiam tabaco. No que diz respeito ao Uso de Álcool, 39 (78%) dos idosos referiram não consumir. Relativamente ao consumo de outras substâncias a totalidade dos idosos referiu não consumir. Trinta e nove idosos referiram ter atividades recreativas e 25 idosos referiram realizar atividade física. Quarenta e sete idosos referiram não ter qualquer tipo de apoio formal: serviços sociais, 2 referiram ter o apoio de uma empregada doméstica e 1 referiu ter o apoio do Centro de Dia. Trinta e oito idosos referiram ter apoio formal: serviços de saúde, nomeadamente médico/enfermeiro, 11 referiram ter apoio exclusivo do médico e 2 não tinham apoio formal dos serviços de saúde. Quanto aos Apoios Informais, 30 idosos referiu ter o apoio simultâneo da família e dos vizinhos/amigos, 15 referiram ter o apoio dos familiares; 3 o apoio dos amigos/vizinhos e 2 idosos referiram não ter apoio informal. Para responder à questão Qual a relação entre a QV e o Bem-estar, efetivouse a análise da correlação r de Pearson entre EBEP (Total e subescalas) e o SF12 (Total e componentes), apresentando-se os resultados descriminados na tabela 1.

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619


Tabela 1: Correlação r de Pearson entre a EBEP (Total e subescalas) e o SF-12 (Total, CF e CM) SF-12

CF SF12

CM SF 12

r/p

r/p

Subescala DM EBEP

0,49 **

0,42 **

0,52 **

Subescala CP EBEP

0,33 *

0,28 *

0,35 *

Subescala RPO EBEP

0,30 *

0,23 n.s.

0,30 *

Subescala OV EBEP

0,52 **

0,45 **

0,56 **

Subescala AS EBEP

0,38 **

0,48 **

0,49 **

EBEP Total

0,51 **

0,50 **

0,58 **

Total r/p

Legenda: n.s. - não significativo; * p<0,05; ** p<0,01

Da análise da tabela 1, verifica-se que existem associações positivas fracas e moderadas, estatisticamente significativas, entre a EBEP (Total e subescalas) e o SF-12 (Total, CF e CM), com exceção para a subescala RPO da EBEP e o CM do SF-12. As correlações entre a EBEP (Total e subescalas) e o SF-12 (Total, CF e CM) são positivas. Verificam-se maiores valores de associação para a subescala DM, OV e EBEP Total com a QV (avaliada pelo SF-12 Total, CF e CM) dos idosos. A associação entre a subescala AS da EBEP apresenta também um valor elevado na CM do SF-12. A subescala DM da EBEP apresenta uma correlação moderadamente positiva com o SF-12 Total (r(48)=0,52;p<0,01) e uma correlação fraca positiva com o CF e CM do SF-12 (CF: r(48)=0,49;p<0,01 e CM: r(48)=0,42;p<0,01).

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A subescala OV da EBEP apresenta uma correlação moderadamente positiva com o SF-12 Total e CF (SF-12 Total: r(48)=0,56;p<0,01 e CF: r(48)=0,52;p<0,01). Para o CM do SF-12 a correlação é fraca positiva (r(48)=0,45;p<0,01). A correlação entre a EBEP Total e o SF-12 (Total, CF e CM) é moderadamente positiva (SF-12 Total: r(48)=0,58; CF: r(48)= 0,51; p<0,01 e CM: r(48)= 0,50; p<0,01). A perceção de melhor Bem-estar Psicológico avaliada pela EBEP (Total e subescalas) associa-se a perceção de melhor QV avaliada pela SF-12 (Total, CF e CM), à exceção da subescala RPO (EBEP) com o CM do SF-12.

50.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS O bem-estar (avaliado pela EBEP Total e subescala OV) associa-se positivamente à melhor perceção de QV (Total, CF e CM). A subescala DM da EBEP associa-se positivamente a melhor perceção de QV (avaliada pelo SF-12 Total e CF). A subescala AS associa-se positivamente à melhor perceção de QV (avaliada pelo CM). Os idosos que participaram no estudo quanto ao BEP, apresentavam capacidade para escolher e criar um meio envolvente adequado às condições física e psíquica (DM), ainda capacidade para a existência, definirem objetivos que contribuam para direcionar o comportamento e atribuir sentido à sua vida (OV) e capacidade à manutenção de atitudes positivas para com o self, a aceitação dos seus múltiplos aspetos, bons e maus e sentimentos positivos acerca da vida passada (AS). A subescala AS da EBEP, segundo Ryff (1989, cit. in Rodrigues 2010), é um dos critérios centrais de saúde mental. A descrição anterior associa-se a valores mais elevados de QV, caraterizando as subescalas DM, OV e AS da EBEP, respetivamente. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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Ressalva-se o que Silva (2009, p.95) refere: o BEP integra entre outras componentes, a QV percebida. Se atendermos à perspetiva de Ribeiro et. al (2004), que consideram que uma boa vida, com QV, é algo desejável que ocorra ao longo do ciclo vital e considerando a definição da OMS sobre QV, deduz-se que existe uma associação entre o constructo QV e BEP. Sendo o BEP uma entidade multidimensional do bem-estar deve ser considerado quando se pretende avaliar a QV dos idosos numa perspetiva de envelhecimento bem-sucedido. O conceito de QV embora não equivalente relaciona-se com vários conceitos, dos quais o bem-estar enquanto variável positiva (Ribeiro, 2005a). Neste estudo validou-se esta afirmação, ou seja: melhor BEP (avaliada pela EBEP Total e subescalas) associa-se a perceção de melhor QV (avaliada pelo SF-12 Total, CF e CM) dos idosos que fizeram parte da amostra. Os idosos do presente estudo apesar de viverem sozinhos, encontram-se adaptados a esta circunstância de vida que resultou maioritariamente da viuvez. Por sua vez, mantêm na sua vida atividades recreativas e físicas, são autónomos nas atividades de vida diárias e autocuidado, são ativos, têm o suporte de saúde de acordo com as necessidades, o que lhes permite preservar o seu bem-estar, associando-se o melhor bem-estar psicológico à melhor perceção de QV dos idosos.

50.5. CONCLUSÕES O estudo do BEP assume particular relevância quando aplicado aos idosos face quer ao impacto do envelhecimento nos aspetos associados ao seu bemestar, quer à necessidade de preservação de níveis satisfatórios de BEP, enquanto recurso adaptativo ao longo da velhice. Assim, nos dias atuais é fundamental promover um envelhecer bemsucedido, que busque possibilidades de estar saudável, de acordo com os 622

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limites associados ao processo de envelhecimento, na necessidade de contabilizar práticas deste viver com crenças positivas, de modo que os idosos sejam felizes, tenham satisfação com a vida, bem-estar e que sem dúvida de modo direto dará origem à promoção da QV e envelhecimento bem sucedido. Ao analisar a relação entre a QV e o BEP dos idosos concluiu-se que:

Melhor BEP (avaliado pela EBEP Total) associa-se melhor perceção de QV (avaliada pelo SF-12 Total, CF e CM).

Melhor BEP (avaliado pela EBEP Total) associa-se ao Domínio do Meio e Objetivos de Vida, indicando que os idosos que vivem sós da amostra têm melhor perceção de QV (Total e CF).

Melhor BEP (avaliado pela EBEP Total) associa-se ao Aceitação de Si e Objetivos de Vida, indicando que os idosos que vivem sós da amostra têm melhor perceção de QV (CM).

O BEP deve ser uma variável positiva que os enfermeiros de saúde mental devem ter em atenção aquando da intervenção com idosos, uma vez que esta variável se associa a melhor perceção de QV.

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51. QUALIDADE DE VIDA E ESPIRITUALIDADE DE PESSOAS IDOSAS QUE VIVEM SÓS Sandra Moreira*; Teresa Rodrigues Ferreira**; Elizabete Borges***

*Enfermeira Especialista em Saúde Mental e Psiquiatria, Agrupamento de Centros de Saúde de Matosinhos - Unidade de Cuidados na Comunidade de S. Mamede de Infesta; Email: sandra.moreira@ulsm.min-saude.pt **Professora Doutora; Escola Superior de Enfermagem do Porto; Email: teresarodrigues@esenf.pt ***Professora Doutora; Escola Superior de Enfermagem do Porto; Email: elizabete@esenf.pt

RESUMO A espiritualidade desempenha um papel importante na Saúde Mental dos indivíduos, na sua perspetiva de vida e estilos de vida. Atualmente os enfermeiros encontram vários costumes espirituais que podem influenciar as respostas dos indivíduos à prática de cuidados de saúde. Este estudo teve como objetivo analisar a relação entre Qualidade de Vida (QV) e Espiritualidade dos idosos que vivem sós. Desenvolveu-se segundo o paradigma quantitativo, é exploratório, transversal, descritivo e correlacional. A amostra de conveniência foi constituída por 41 mulheres e 9 homens, com idades compreendidas entre os 65 e 90 anos. Quarenta e cinco (90%) idosos referem professar a religião católica e 2 (4%) a evangélica. Quarenta (80%) idosos referem ser praticantes. Para a recolha de dados foi aplicado um questionário. A primeira parte com questões para caraterização psicossocial da amostra e a segunda com escalas (a Escala de Avaliação da Espiritualidade (α=0,61) e o Short-Form com 12 itens (α=0,84)).

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Nos

resultados

verificou-se

que

mais

Espiritualidade

(dimensão:

esperança/otimismo) associa-se a melhor perceção de Qualidade de Vida (TotalSF12 e componentes física e mental) dos idosos que vivem sós. O papel do enfermeiro na promoção da Qualidade de Vida é essencial atendendo às componentes religiosas/espirituais dos idosos na prestação de cuidados.

Palavras-chave: Espiritualidade; Envelhecimento; Idosos; Qualidade de Vida; Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria.

51.1. INTRODUÇÃO Só a partir dos anos 90 é que a Investigação com variáveis espirituais e religiosas começa a salientar-se, pois até essa data e apesar de existir fortes evidências da relevância de fatores espirituais e religiosos estes não eram alvo de investigação e análise (Rodrigues, 2010). Para além disso, a espiritualidade e a religiosidade eram termos mal definidos e muitas vezes considerados como sinónimos (Miller e Thoresen, 2003). A OMS (1998) menciona que a espiritualidade é uma dimensão tão importante para o homem como a dimensão biológica, psicológica, emocional e social, constituindo assim o que determina a sua singularidade enquanto pessoa. A espiritualidade desempenha um papel importante na Saúde Mental dos indivíduos, na sua perspetiva de vida e estilos de vida. Na atualidade, existe uma diversidade de práticas religiosas, os enfermeiros encontram vários costumes espirituais que podem influenciar as respostas dos indivíduos à prática de cuidados de saúde. As pessoas consideram imprescindível o uso de recursos espirituais como forma de obter força, significado e apoio perante dificuldades na vida (Ribeiro, 2006b). E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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Atualmente existem muitas evidências empíricas que relacionam a religião/espiritualidade, à saúde física e mental, à QV e a outros construtos relacionados com o bem-estar. Esta relação é salientada ao longo dos anos por vários autores, pela influência que a religião/espiritualidade têm nestes construtos e em particular na QV das pessoas (Panzini e Bandeira, 2007). De acordo com Battini, Maciel e Finato (2006, p.457), a questão do bem-estar na velhice é algo que também tem sido evidenciado como relevante. Neste contexto, os estudos apontam que se determinadas variáveis estiverem presentes, a probabilidade de uma boa adaptação à velhice aumenta consideravelmente. Entre elas, destacam-se, 1) a autonomia, 2) o manter redes de apoio (amigos, vizinhos, pessoas significativas), 3) autoaceitação, 4) continuar a estabelecer objetivos de vida e 5) crenças religiosas/espiritualidade. No que concerne, ao nível da relação entre a religiosidade e o envelhecimento, vários estudos têm sido efetuados e têm evidenciado uma correlação positiva entre a religiosidade e indicadores de saúde mental, quer na relação das pessoas consigo próprias, quer nas relações interpessoais (Rodrigues, 2010). Outro ponto importante que se relaciona com o envelhecimento prende-se com a questão das incapacidades, que remete para a aceitação da mudança, destacada no trabalho de Ryff e Keys (1995). Neste contexto, a religiosidade assume um papel muito importante no enfrentar das incapacidades e o coping religioso parece assumir-se, para Moberg, como um importante mecanismo no reforço do bem-estar (Rodrigues, 2010). A profissão de enfermagem não fica indiferente a este construto e à sua importância na avaliação da QV dos indivíduos, considerando o Bem-estar Espiritual, como um foco de enfermagem pertinente e alvo de intervenção dos enfermeiros. Este constructo é definido como um tipo de bem-estar com as caraterísticas específicas: imagem mental de estar em contato com o princípio da 628

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vida que impregna todo o ser e que integra e transcende a natureza biológica e psicossocial de cada um (CIPE - Versão Beta 2, 2002, p.44). A espiritualidade é uma dimensão importante da existência do ser humano, desde os primórdios da humanidade, devendo ser considerada ao abordar o ser humano na sua globalidade (Pinto e Pais-Ribeiro, 2007). A sua relevância nos contextos de saúde está relacionada com a preocupação crescente em compreender o Homem em todas as dimensões, para além da saúde. É pertinente avaliar a dimensão espiritual/religiosa, para determinar a QV dos idosos que vivem sós, dado que o construto QV vai para além da condição física e inclui um sentido abrangente de todos os aspetos da vida humana. Neste sentido, deduz-se que a dimensão espiritual/religiosa deve ser incluída na avaliação multidimensional do ser humano (Panzini e Bandeira, 2007). O objetivo deste estudo foi analisar a relação entre a QV e a Espiritualidade dos idosos que vivem sós. Neste sentido emerge a seguinte questão: Qual a relação entre a QV e a Espiritualidade dos idosos que vivem sós?

51.2. METODOLOGIA No que se refere ao tipo de estudo de investigação este foi exploratório, descritivo e transversal. A metodologia de pesquisa implementada foi a do paradigma quantitativo. Definiu-se para o presente estudo como variável principal a Qualidade de Vida e secundária a Espiritualidade. Efetuou-se ainda a caraterização da amostra segundo variáveis psicossociais.

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51.2.1.

PARTICIPANTES (POPULAÇÃO E AMOSTRA)

O estudo de Investigação desenvolveu-se numa freguesia do Concelho de Matosinhos, tendo sido desenvolvido em contexto de tipologia habitacional bairro social. A amostra de conveniência constitui-se por um grupo de pessoas idosas com idade igual ou superior a 65 anos de idade, que aceitaram participar no estudo e que reuniam os seguintes critérios de inclusão: residir sós no domicílio habitual, pelo menos há 6 meses e ter competências cognitivas para reter e utilizar a informação disponibilizada.

51.2.2.

INSTRUMENTOS

Para efetuar a recolha de dados, optou-se pela aplicação de um questionário: a primeira parte alusiva à caraterização da amostra referente às variáveis psicossociais. A segunda parte do questionário é referente às escalas utilizadas, que permitiram avaliar as variáveis em estudo: o Short-Form com 12 itens (SF-12) e a Escala de Avaliação da Espiritualidade (EAE). O SF-12 forma abreviada de 12 itens do SF-36 Health Survey, permite avaliar a perceção do estado de saúde e a QV (Pais-Ribeiro, 2007; Ribeiro, 2005c). Apresenta as mesmas dimensões do SF-36, agrupadas em dois componentes: o Componente Físico (CF) com 6 itens e o Componente Mental (CM) com 6 itens. O SF-12, utilizado neste estudo de Investigação tendo como única opção de pontuação o cálculo de dois Componentes: o Físico (CF) e o Mental (CM) (Ribeiro, 2005c). A valores mais elevados corresponde uma melhor Perceção do Estado de Saúde e variam entre 0 -100 (Ribeiro, 2005c).

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Na amostra em estudo a consistência interna para a Escala SF-12 total, foi de 0,84 (para 12 os itens). Para o CF do SF-12, o Alpha de Cronbach foi de 0,79 e de 0,77 para o CM. Valores semelhantes aos encontrados por Ribeiro (2005c). A EAE tem duas subescalas, uma constituída por dois itens que se referem à dimensão vertical da espiritualidade, que foi denominada de Crenças e outra constituída

por

três

itens

que

se

referem

à

dimensão

horizontal

da

espiritualidade, tendo sido denominada Esperança/Otimismo. (Pinto e PaisRibeiro, 2007). As questões 1 e 2 que constam na EAE centram-se, na dimensão espiritual focalizadas na atribuição de sentido/significado da vida. As questões seguintes, nomeadamente 3, 4 e 5 têm subjacente a construção da esperança e de uma perspetiva de vida positiva. Dada a descrição e o papel importante da Dimensão Esperança/Otimismo, esta é a que mais se relacionada com as dimensões da QV (Pinto e Pais-Ribeiro, 2007). Cada um dos itens é mensurado numa escala de concordância tipo Likert de 4 pontos (1 não concordo a 4 plenamente de acordo). Os valores mais elevados obtidos em cada dimensão da EAE implicam maior concordância com a dimensão avaliada (Pinto e Pais-Ribeiro, 2007). Pinto e Pais-Ribeiro (2007) no sentido de analisarem a consistência interna da EAE referem valores de 0,74 para a escala total e para as suas dimensões: Crenças - 0,92 e Esperança/Otimismo - 0,69. No presente estudo os valores de consistência interna foram de 0,61 para a EAE Total, 0,99 para a dimensão Crenças e 0,66 para a dimensão Esperança/Otimismo. São valores aceitáveis dado o número de itens e tendo em conta os valores de referência limite em psicometria (Pinto e Pais-Ribeiro, 2007, p.50).

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51.2.3.

PROCEDIMENTOS

Foram respeitados os princípios éticos inerentes ao processo investigativo. A forma de chegar aos idosos implicou ir de porta em porta, a cada uma das habitações sociais. A recolha de dados foi efetuada através de contato presencial com a aplicação do questionário previamente determinado para este estudo a 50 idosos que cumpriam os critérios de inclusão. Recorreu-se para a análise quantitativa dos dados, ao programa SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) versão 18.0 e a testes da estatística paramétrica.

51.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS Dos 50 participantes, 41 (82%) são do sexo feminino e 9 (18%) são do sexo masculino, com uma média de idades de 78,10 anos (DP=6,43). A maioria dos participantes 42 (84%) são viúvos. Tinta e um (62%) estão reformados por idade e em média trabalharam até 57,16 anos (DP=11,74). Quanto à escolaridade (em anos) o valor mínimo é de zero (nunca frequentou escola) e o valor máximo é de 9 anos de escolaridade, com uma média de 3,24 anos de escolaridade (DP=1,63). Relativamente à situação laboral a totalidade da amostra está em situação de reforma; 31 (62%) dos idosos estão reformados por idade e 19 (38%) por invalidez. Dada a situação profissional a Origem do Rendimento Familiar é para 49 (98%) idosos a pensão ou reforma.

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Trinta e quatro (68%) idosos residem em habitação tipo casa e 16 (32%) em apartamento. Para 36 (72%) dos idosos a casa é arrendada e 14 (28%) são os proprietários da casa que habitam. Relativamente à religião, 45 (90%) idosos professam a religião católica, 2 (4%) a evangélica. Quarenta (80%) idosos referem ser praticantes e 10 (20%) não. Os participantes da amostra vivem, entre 1 e 38 anos, sós no domicílio habitual, com uma média de 13,76 anos (DP=8,79). O valor da moda é de 4 anos. Quarenta e nove (98%) dos idosos referiram ter doença que obriga a recorrerem aos cuidados de saúde com frequência. Destes, 34 (68%) referiram polipatologia e 16 (32%) idosos uma patologia. Das doenças referidas com mais frequência: 6 (12%) idosos patologia cardiovascular. A patologia do foro mental é referida por 10 (20%) dos idosos. Quarenta (80%) idosos não fazem referência à ocorrência de doença mental. No domínio da vigilância de saúde, a totalidade dos idosos (50), respondem que iam habitualmente ao médico. A frequência das consultas, foi para: 36 (72%) idosos duas vezes por ano. Relativamente à toma habitual de medicação, 47 (94%) dos idosos referiu tomar habitualmente medicação. Quarenta (80%) idosos referiram não ter doença mental, porém tomavam medicação psicotrópica. Relativamente à Gestão do Regime Terapêutico, 45 (90%) dos idosos referiram cumprir o programa de tratamento da patologia. Quanto à Adesão ao Regime Terapêutico 48 (96%) idosos responderam desenvolver atividades para satisfazer as exigências terapêuticas dos cuidados de saúde. Relativamente ao Uso de Tabaco 49 (98%) idosos não consumiam tabaco. No que diz respeito ao Uso de Álcool, 39 (78%) dos idosos referiram não

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consumir. A totalidade da amostra em estudo referiu não consumir outras substâncias. Trinta e nove (78%) idosos referiram ter atividades recreativas. Vinte e cinco (50%) dos idosos referiram realizar atividade física. Quanto aos Apoios Formais: Serviços Sociais, 47 (94%) idosos referiram não ter qualquer tipo de apoio formal, 2 (4%) referiram ter o apoio de outros (empregada doméstica) e 1 (2%) referiu ter o apoio do Centro de Dia. Nos Apoios Formais: Serviços de Saúde, 38 (76%) idosos referiram ter apoio médico/enfermeiro, 11 (22%) referiram ter apoio do médico e 2 (4%) não tinham apoio formal dos serviços de saúde. Quanto aos Apoios Informais, 30 (60%) idosos referiu ter vários apoios (o apoio simultâneo da família e dos vizinhos/amigos), 15 (30%) referiram ter o apoio dos familiares; 3 (6%) o apoio dos amigos/vizinhos e 2 (4%) idosos não referiram ter apoio informal. Para responder à questão: Qual a relação entre a QV e a Espiritualidade, procedeu-se à análise da correlação r de Pearson entre a EAE (Total e dimensões) e o SF-12 (Total, CF e CM), resultados que se apresentam na tabela 1.

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Tabela 1: Correlação r de Pearson entre a EAE (Total e dimensões) e o SF-12 (Total, CF e CM) SF-12

CF SF12

CM SF 12

r/p

r/p

Dimensão Crenças (D:C)

0,09 n.s.

-0,16 n.s.

-0,03 n.s.

Dimensão:

0,47 *

0,54 *

0,57 *

0,45 *

0,37 *

0,47 *

Total r/p

Esperança/Otimismo (D:E/O) EAE Total

LEGENDA: n.s. - não significativo; * p<0,05

Da análise da tabela 1, verifica-se que a correlação entre a EAE (Total e D:E/O) e o SF-12 (Total, CF e CM) é positiva e estatisticamente significativa. Não existem diferenças estatisticamente significativas na correlação entre a D:C da EAE e o SF-12 (Total, CF e CM). A D:E/O apresenta uma correlação moderadamente positiva com o SF-12 Total (r(48)= 0,57; p<0,05) e para o CM (r(48)= 0,54; p<0,05). A correlação entre a D:E/O e o SF-12 (CF) é fraca positiva (r(48)= 0,47; p<0,05). A correlação entre a EAE Total e o SF-12 (Total, CF e CM) é fraca positiva (SF-12 total: r(48)= 0,47; p<0,05; CF: r(48)= 0,45; p<0,05; CM: r(48)= 0,37; p<0,05). A Espiritualidade avaliada pela EAE (Total e D:E/O) associa-se positivamente à QV dos idosos que vivem sós no domicílio habitual (avaliada pelo SF-12 Total, CF e CM). Mais Espiritualidade (Total e D:E/O) associam-se a mais QV (Total, CF e CM) nos idosos. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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51.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Os idosos que participaram no estudo referiram professar a religião católica. A amostra tem idosos com média de idade de 78,10 anos, o que leva a evidenciar as pesquisas bibliográficas consultadas (Fernandes (2007), Pais-Ribeiro (2007), Panzini e Bandeira (2007), Pinto (2007) e Rodrigues (2010)), nomeadamente da importância que a espiritualidade tem na vida das pessoas idosas, que está relacionada muitas vezes com fatores de ordem cultural, mas também com o facto de nesta etapa do ciclo vital os idosos dedicarem ainda mais tempo à prática de religião. Os idosos consideram imprescindível o uso de recursos espirituais como forma de obter força, significado e apoio perante dificuldades na vida. Por sua vez valorizam e percecionaram a Espiritualidade como variável importante para a sua vida. Este resultado seria esperado uma vez que a dimensão da religiosidade/espiritualidade é valorizada desde o princípio da Humanidade, sendo considerada uma dimensão pertinente a ser utilizada quando se pretende avaliar a QV dos idosos (Pinto e Pais-Ribeiro, 2007). Existem

muitas

evidências

empíricas

que

relacionam

a

religião/espiritualidade, à saúde física e mental, à QV. Esta relação é salientada ao

longo

dos

anos

por

vários

autores,

pela

influência

que

a

religião/espiritualidade têm nestes construtos e em particular na QV das pessoas. No que concerne, ao nível da relação entre a religiosidade e o envelhecimento, vários estudos têm sido efetuados e evidenciam uma correlação positiva entre a religiosidade e indicadores de saúde mental, quer na relação das pessoas consigo próprias, quer nas relações interpessoais.

636

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Neste

estudo

à

semelhança

de

outras

investigações

acerca

da

espiritualidade verificou-se que esta é uma variável que na generalidade influencia favoravelmente a perceção de QV dos idosos que vivem sós.

51.5. CONCLUSÕES O conceito de QV varia de indivíduo para indivíduo, independentemente de estes estarem na mesma fase do ciclo vital. Cada indivíduo é acompanhado de uma história de vida, que faz de si aquilo que ele é no presente. Quando falamos de idosos, esta afirmação é ainda mais relevante e pertinente para este grupo etário. Apesar de existir algo em comum entre os indivíduos, todos têm as suas diferenças em função, segundo Silva (2009), dos determinantes genéticos, do seu património psicossocial, do seu estilo de vida, das suas perceções e expectativas de vida, que sem dúvida condicionam a QV na sua vertente multidimensional. Nesta perspetiva, o contexto sócio cultural em que o idoso se insere é um fator que importa ter em atenção quando se estuda a QV numa lógica de envelhecimento bem-sucedido. Segundo Novo (2003, p.67), a natureza interativa das relações entre a saúde mental e a saúde física, está no centro da compreensão do funcionamento psicológico positivo. Neste sentido assume primordial importância o continuar a investigar sobre a relação entre variáveis positivas, como a espiritualidade e a QV dos idosos que vivem sós, numa lógica positiva “saudável” e não negativa “doença”. Com base nesta pesquisa, pode-se indiciar estratégias mais apropriadas para o acompanhamento do idoso dentro da abrangência do programa de saúde mental possibilitando um enfoque maior na sua promoção e na obtenção da QV associado a um envelhecimento bem sucedido. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

637


Ao analisar a relação entre a EAE e a QV dos idosos que vivem sós, concluindo-se que:

A perceção de maior recurso à espiritualidade associa-se a melhor perceção de QV nos idosos que vivem sós (avaliada pelo SF-12 Total, CF e CM).

A Esperança/Otimismo associa-se a melhor perceção de QV dos idosos (avaliada pelo SF-12 Total, CF e CM).

Genericamente a espiritualidade e em particular a esperança e o otimismo são variáveis que os enfermeiros especialistas em saúde mental e psiquiatria devem ter em atenção aquando da prestação de cuidados, uma vez que estas se associam a melhor perceção de QV dos idosos que vivem sós.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Concelho Internacional De Enfermeiros – ICN. CIPE/ICNP: Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem – Versão Beta 2, 2002. Folstein, M. F.; Folstein, S. E. e Mchugh, P. R.. Mini-mental state: A practical method for grading the cognitive state of patients for the clinician. Journal of Psychiatric Research, 12, (p.189-198), 1975. Fortin, M. F.. Fundamentos e etapas do processo de Investigação. Loures: Lusociência – Lusodidacta, 2009. Miller, W. R. e Thoresen, C. E.. Spirituality, religion, and health – An emerging research field. American Psychologist, 58(1), (pp. 24-35), 2003. Novo, R. F.. A diversidade dos espaços psicossociais e o Bem-Estar Psicológico. In R. Novo, Para além da eudaimonia: O Bem-Estar Psicológico em mulheres na idade adulta avançada (pp. 449-488). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian e Fundação para a Ciência e a Tecnologia, 2003. Organização Mundial Da Saúde. Rapport sur la santé dans le monde: la vie au 21 Siécle. Une perspective pour tous. Genéve: OMS, 1998. Ribeiro, J. L. P.. Avaliação em Saúde e QV. In: Atas do II Congresso Saúde e QV. Unidade de Investigação em Saúde e QV da Escola Superior de Enfermagem de S. João, (pp. 57-66), (2005a). 638

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Ribeiro, J. L. P.. Introdução à Psicologia da Saúde. Coimbra: Quarteto, (2005b). Ribeiro, J. L. P.. O Importante é a Saúde: estudo de adaptação de uma técnica de avaliação do estado de Saúde – SF-36. Edição: Merck Sharp & Donhme, (2005c). Ribeiro, J. L. P.. As variáveis psicológicas positivas como amortecedores entre situações de doença grave traumática e stress. In: P. Costa, Carlos Lopes Pires, J. Veloso e Catarina Lopes Pires (Org.). Stresse PósTraumático - Modelos, Abordagens e Práticas (pp. 13-19). Leiria: Editorial Diferença, (2006b). Vilelas, J.. Investigação: O Processo de Construção do Conhecimento. 1.ª ed. Lisboa: Edições Sílabo, 2009. SITIOGRÁFICAS Battini, E.; Maciel, E. M. e Finato, M. S. S.. Identificação de variáveis que afetam o envelhecimento: análise comportamental de um caso clínico, 2006. [Em linha] [Consult. a 14 de Junho de 2011] disponível em WWW: URL:http://www.scielo.br/pdf/estpsi/v23n4/v23n4a13.pdf Panzini, R. e Bandeira, D.. Coping (enfrentamento) religioso/espiritual. Rev. Psiq. Clín. 34, supl 1, (pp.126135),

2007.

[Em

linha]

[Consult.

a

11

de

Junho

de

2011]

disponível

em

WWW:

URL:

http://www.scielo.br/pdf/rpc/v34s1/a16v34s1.pdf Pinto, C. e Pais-Ribeiro, J. L.. Construção de uma Escala de Avaliação da Espiritualidade em Contextos de Saúde. ArquiMed: Arquivos de Medicina, vol.21, n.º2, (pp.47-53), 2007. [Em linha] [Consult. a 03 de Junho de 2011] disponível em WWW: URL:http://www.scielo.oces.mctes.pt/pdf/am/v21n2 /v21n2a02.pdf Rodrigues, F. M. S.. Religiosidade intrínseca e extrínseca: implicações no bem-estar psicológico de adultos seniores. In: Mestrado Integrado em Psicologia, 2010. [Em linha] [Consult. a 14 de Junho de 2011] disponível em WWW: URL: http://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/2507/1/ulfp035804_tm.pdf

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52. QUALIDADE DE VIDA E SATISFAÇÃO COM A VIDA DOS IDOSOS NA COMUNIDADE Sandra Moreira*; Teresa Rodrigues Ferreira**; Elizabete Borges***

*Enfermeira Especialista em Saúde Mental e Psiquiatria, Agrupamento de Centros de Saúde de Matosinhos - Unidade de Cuidados na Comunidade de S. Mamede de Infesta; Email: sandra.moreira@ulsm.min-saude.pt **Professora Doutora; Escola Superior de Enfermagem do Porto; Email: teresarodrigues@esenf.pt ***Professora Doutora; Escola Superior de Enfermagem do Porto; Email: elizabete@esenf.pt

RESUMO A Satisfação com a Vida é um processo de avaliação cognitiva, que se baseia na avaliação que cada indivíduo faz acerca da sua vida em geral, ou em domínios mais específicos, sendo um dos componentes do construto mais abrangente que é o bem-estar subjetivo. Este estudo teve como objetivo analisar a relação entre Qualidade de Vida (QV) e Satisfação com a Vida de idosos na comunidade. Participaram no estudo, 50 idosos, com idade média de 78,10 anos. O estudo desenvolveu-se segundo o paradigma quantitativo, é exploratório, transversal, descritivo e correlacional. Os participantes da amostra vivem sós na comunidade, em média há 13,76 anos (DP=8,79). Foi aplicado um questionário, constituído na primeira parte por questões para caraterização psicossocial da amostra e na segunda parte por escalas (a Escala de Satisfação com a Vida (α=0,88) e o Short-Form com 12 itens (α=0,84)). Verificou-se que mais Satisfação com a Vida, associa-se a melhor perceção de Qualidade de Vida (Total - SF12, componentes física - CF e mental - CM) dos idosos que vivem sós na comunidade. 640

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O papel do enfermeiro na promoção da Qualidade de Vida é essencial devendo atender à variável positiva, Satisfação com a Vida, na intervenção com os idosos.

Palavras-chave: Satisfação com a Vida; Envelhecimento; Idosos; Qualidade de Vida; Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria.

52.1. INTRODUÇÃO A Satisfação com a Vida refere-se a um processo de juízo pessoal, em que cada

indivíduo

avalia

a

QV

baseando-se

numa

comparação

entre

as

circunstâncias da sua vida e ideais ou standard (Dias, 2006, p.54). Da maior ou menor correspondência entre as duas, surge segundo Pavot e Diener (1993), uma maior ou menor satisfação com a vida. Neste sentido, as caraterísticas a ter em conta para qualificar a Satisfação com a Vida não são universais, pois não existe uma forma linear e comum de caracterizá-la nos idosos. Talvez porque são demasiadas as variáveis que influenciam os níveis de satisfação e provavelmente as mais relevantes ou as que têm maior influência ainda estão por determinar (Calixto e Martins, 2010). Quanto aos fatores que se predispõem como indicadores dos níveis de Satisfação com a Vida, existem segundo Calixto e Martins (2010, p.3), resultados contraditórios entre autores. Segundo os mesmos autores, são cinco os tipos de variáveis que mais influenciam e predizem a maior ou menor Satisfação com a Vida, nomeadamente: as variáveis sociodemográficas, os relacionamentos sociais, a personalidade, o coping e a autoestima. No entanto existem determinados fatores que podem ser apontados individualmente. Para Steinhagen-Thiessen e Borchelt (2001), a dependência dos idosos na execução das Atividades de Vida Diária tem um impacto significativo E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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na sua saúde e QV, enquanto Prull et. al (2000), evidenciam a importância do funcionamento cognitivo, pelo seu potencial impacto na funcionalidade do idoso. Por sua vez, a influência das alterações relacionadas com a idade na saúde, interação social e os recursos socioeconómicos devem ser também avaliadas, já que estas podem favorecer ou prejudicar a avaliação do indivíduo sobre a sua vida, principalmente na velhice (Bishop et. al, 2006). A adaptação ao envelhecimento é também mencionada por Berger e Mailloux-Poirier (1995). Ao longo da vida o ser humano é confrontado com uma diversidade de experiências, e a adaptação a estas situações é influenciada pela idade, pelas estratégias selecionadas para se adaptar, pelas forças pessoais, constata-se assim que o processo de adaptação ao envelhecimento pode ser difícil. Os idosos que conseguem ultrapassar os períodos mais difíceis da vida conservam a sua integridade, os valores pessoais e são assim capazes de aceitar positivamente esta nova etapa da vida. Isto significa que estes indivíduos foram bem-sucedidos na adaptação, por sua vez ao aceitarem a velhice como algo natural, implica que o envelhecimento foi bem-sucedido. Assim, torna-se fundamental descrever variáveis positivas, que foram analisadas neste estudo de Investigação, nomeadamente: Satisfação com a Vida, uma vez que esta é capaz de influenciar a QV dos idosos e de aumentar a probabilidade de um envelhecimento bem-sucedido. Até porque se o papel de um conjunto de variáveis é a minimização das doenças mentais como refere Ribeiro (2006a), é de todo pertinente efetuar a abordagem a estas variáveis aquando da avaliação dos idosos em contexto de saúde. O presente trabalho tem por objetivo analisar a relação entre a QV e a Satisfação com a Vida dos idosos que vivem na comunidade. Neste contexto emerge a seguinte pergunta: Qual a relação entre a QV e a Satisfação com Vida dos idosos que vivem na comunidade? 642

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52.2. METODOLOGIA O estudo de Investigação foi exploratório, descritivo e transversal, enquadrado num paradigma quantitativo.

52.2.1.

PARTICIPANTES

A amostra de conveniência foi constituída por 50 pessoas idosas residentes na Freguesia de S. Mamede de Infesta, e que reuniam os seguintes critérios: - residir na Freguesia de S. Mamede de Infesta; - residir em Habitação Social: tipologia habitacional – bairro; - ter idade igual ou superior a 65 anos de idade; - residir só no domicílio habitual, pelo menos há 6 meses; - ter competências cognitivas para compreensão do questionário, (avaliada pelo Mini Mental State Examination - MMSE); - aceitar participar no estudo.

52.2.2.

MATERIAL

Após validação das capacidades cognitivas dos idosos que vivem na comunidade, avaliada através do MMSE, foi aplicado o questionário, constituído por duas partes. A primeira parte com a caraterização da amostra alusiva às variáveis psicossociais (sexo, idade, estado civil, escolaridade, situação ocupacional, origem do rendimento familiar, habitação, tempo que vive só, situação de saúde e vigilância de saúde, regime terapêutico, atividades e estilos E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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de vida, dependência no autocuidado e as necessidades de suporte: formal e informal). Na segunda parte do questionário as escalas utilizadas, permitiram avaliar as variáveis em estudo. A variável principal - Qualidade de Vida avaliada pelo Short-Form com 12 itens (SF-12), e como variável secundária a Satisfação com a Vida avaliada pela Escala de Satisfação com a Vida (ESV). O SF-12, tem como única opção de pontuação o cálculo de dois Componentes: o Físico e o Mental (Ribeiro, 2005c). Esta escala é uma forma abreviada de 12 itens do SF-36 Health Survey, e permite avaliar a perceção do estado de saúde e a QV (Pais-Ribeiro, 2007; Ribeiro, 2005c). O SF-12 apresenta as mesmas dimensões do SF-36, agrupadas em dois componentes: o Componente Físico (CF) com 6 itens e o Componente Mental (CM) com 6 itens. A valores mais elevados corresponde uma melhor Perceção do Estado de Saúde e variam entre 0 -100 (Ribeiro, 2005c). Na amostra em estudo a consistência interna para a Escala SF-12 total, foi de 0,84 (para 12 os itens). Para o CF do SF-12, o Alpha de Cronbach é de 0,79 e de 0,77 para o CM. Valores semelhantes aos encontrados por Ribeiro (2005c). A avaliação da Satisfação com a Vida em geral foi efetuada através da versão portuguesa da The Satisfaction With Life Scale (SWLS). A versão portuguesa tem a denominação de Escala de Satisfação com a Vida (ESV), foi traduzida por Neto e Barros (1990, cit. in Pais-Ribeiro, 2007) e validada para a população portuguesa por António Simões (1992). Esta escala permite avaliar a capacidade cognitiva do bem-estar subjetivo (Pais-Ribeiro, 2007). É um instrumento constituído por cinco itens tipificados numa escala tipo Likert de concordância de 5 pontos (1 discordo muito - a 5 concordo muito). Segundo Neto e Barros (2001) a pontuação total varia entre 5 baixa satisfação e 25 - grande satisfação (Pais-Ribeiro, 2007). 644

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O valor de Alpha de Cronbach para a ESV foi de 0,88 para a escala total (5 itens), valor superior ao referido por Pais-Ribeiro (2007) para a mesma escala (0,80) e ao de Simões (1992), cujo valor foi de 0,78.

52.2.3.

PROCEDIMENTOS

Efetuado o pedido de autorização para a utilização das escalas aos respetivos autores, deu-se início à recolha de dados pelo investigador, através de contato presencial, em contexto domiciliário. Foram aplicados questionários a 50 idosos que cumpriam os critérios de inclusão e que aceitaram participar. Para a concretização deste estudo recorreu-se para a análise quantitativa dos dados, ao programa SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) versão 18.0 e ao recurso da estatística paramétrica.

52.3. RESULTADOS Dos 50 idosos que participaram no estudo, 82% são do sexo feminino e 18% são do sexo masculino, com uma média de idades de 78,10 anos e 84% são viúvos. 62% dos idosos estão reformados por idade e em média trabalharam até aos 57,16 anos. Quanto à escolaridade a média é de 3,24 anos de escolaridade (DP=1,63). A totalidade da amostra está em situação de reforma, atendendo à situação profissional a origem do Rendimento Familiar é para 98% dos idosos a pensão ou reforma.

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Todos os idosos vivem em habitação tipo bairro social, destes 68% em habitação tipo casa e 32% em apartamento. Para 72% dos idosos a casa é arrendada. Os idosos da amostra vivem sós na comunidade em média há 13,76 anos (DP=8,79). 98% dos idosos referiram ter doença que os obrigava a recorrerem aos cuidados de saúde com frequência. Destes, 68% referiram ser por polipatologia. Das doenças referidas com mais frequência: 12% idosos referem ter patologia cardiovascular. A patologia do foro mental é referida por 20% dos idosos. 80% dos idosos referiram não ter doença mental, todavia tomavam medicação psicotrópica. A totalidade dos idosos (50), efetuam vigilância de saúde sendo a frequência das consultas de duas vezes por ano para 72% idosos. Quanto ao Regime Terapêutico, 90% dos idosos referiram cumprir o programa de tratamento da patologia e 96% dos idosos responderam realizar atividades para garantir as exigências terapêuticas dos cuidados de saúde. Relativamente aos estilos de vida, 98% dos idosos não consumiam tabaco e 78% dos idosos referiram não consumir álcool. 78% dos idosos referiram ter atividades recreativas e 50% referiram realizar atividade física. Quanto aos Apoios Formais 94% dos idosos referiram não ter qualquer tipo de apoio formal, nomeadamente dos Serviços Sociais. Nos Apoios Formais relativos aos Serviços de Saúde, 76% dos idosos referiram ter apoio médico/enfermeiro, 22% referiram ter apoio do médico e 4% não tinham apoio formal dos serviços de saúde. No que concerne aos Apoios Informais, 60% dos idosos referiu ter vários apoios; 30% referiram ter o apoio dos familiares; 6% o apoio dos amigos/vizinhos e 4% dos idosos não referiram ter apoio informal. 646

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A tabela 1 apresenta a análise descritiva dos itens da ESV referentes à amostra em estudo.

Tabela 1: Análise descritiva dos itens da ESV referentes à amostra em estudo N

ESV

M

50 17,02

DP

Mín Máx

5,5

5,0

8

0

1,3

1,0

6

0

1,3

1,0

2

0

1,3

1,0

4

0

1,2

1,0

9

0

1,4

1,0

2

0

25,00

ITENS DA ESCALA A minha vida parece-se em quase tudo com o que eu desejaria que ela fosse.

3,12

As minhas condições de vida são muito boas.

3,30

Estou satisfeito com a minha vida.

3,68

Até agora tenho conseguido as coisas importantes da vida que eu desejaria. Se pudesse recomeçar a minha vida, não mudaria quase nada.

3,54

3,36

5,00

5,00

5,00

5,00

5,00

Relativamente à ESV, na amostra em estudo, o score mínimo obtido foi de 5 e o máximo de 25, com a média de 17,02 e um DP=5,58.

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Verifica-se que a média obtida em cada um dos itens se situa entre o “Não Concordo Nem Discordo” e o “Concordo um pouco”, correspondente aos valores de médias obtidas entre 3,12 e 3,68. O item com maior pontuação média foi “Estou satisfeito com a minha vida” (M=3,68; DP=1,34) e o que obteve pior pontuação foi “A minha vida parece-se em quase tudo com o que eu desejaria que ela fosse” (M=3,12; DP=1,36). Para dar resposta à questão Qual a relação entre a QV e a Satisfação com Vida, utilizou-se a correlação r de Pearson para determinar a associação da QV e Satisfação com a Vida, dos idosos que vivem sós na comunidade. Os resultados apresentam-se na tabela 2.

Tabela 2: Correlação r de Pearson entre a ESV e o SF-12 (Total, CF e CM) CF SF12

CM SF 12

r/p

r/p

Escala de Satisfação com a 0,40 *

0,53 *

SF-12 Total r/p 0,53 *

Vida LEGENDA: * p<0,05 Na análise da tabela 2, verifica-se que existe uma associação positiva entre a QV (SF-12 Total e componentes) e a Satisfação com a Vida, estatisticamente significativa. A associação existente entre a ESV e a QV é moderadamente positiva para o SF-12 Total e para o CM (r(48)= 0,53; p<0,05 para ambos) e fraca positiva para o CF (r(48)= 0,40; p<0,05). A Satisfação com a Vida associa-se positivamente à QV dos idosos que vivem sós na comunidade. Mais Satisfação com a Vida associase a mais QV (SF-12 Total, CF e CM) nos idosos. Porém, com valores de 648

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associação baixos, explicando a satisfação com a vida, entre 16 e 28% a variância da Qualidade de vida dos participantes neste estudo.

52.4. DISCUSSÃO A Satisfação com a Vida segundo Joia, Ruiz e Donalisio (2007), é um julgamento cognitivo de alguns domínios específicos na vida. É um processo de juízo de avaliação geral da própria vida de acordo com um critério próprio. O julgamento da satisfação depende de uma comparação entre as circunstâncias de vida do indivíduo e um padrão por ele estabelecido. Para avaliar a QV, é assim imprescindível saber o grau de satisfação ou insatisfação dos idosos com os vários aspetos da vida (Farquhar, 1995). A Satisfação com a Vida reflete o bemestar subjetivo individual, ou seja e como referem Joia, Ruiz e Donalísio (2007, p.132), o modo e os motivos que levam as pessoas a viverem suas experiências de vida de maneira positiva. Analisando os resultados obtidos nas respostas dos idosos da amostra do presente estudo, constatou-se que estes têm uma boa perceção de Satisfação com a Vida, uma vez que os valores de score total obtido na ESV aplicada, revelou que o resultado 17 (num score que varia entre 5 a 25 pontos) foi o mais frequente nos idosos da amostra (22%). Quando questionados sobre “Estou satisfeito com a minha vida”, a média de respostas foi maior para todos os itens da escala, apresentando um valor de 3,68 (numa escala de 1 a 5), seguindo-se a maior média à questão “Até agora tenho conseguido as coisas importantes da vida que eu desejaria” com o valor de 3,54. Perante estes resultados, parece poder referir-se que a Satisfação com a Vida é uma variável que influencia positivamente a perceção de QV dos idosos que vivem sós.

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52.5. CONCLUSÕES Um dos grandes desafios apontados aos profissionais de saúde que no seu dia-a-dia trabalham com idosos é mantê-los nas melhores condições de saúde mental e física, sendo que para isso é primordial conhecer e atender às suas principais necessidades de saúde, económicas e sociais e concomitantemente investir de forma intensa na promoção de saúde das gerações mais jovens, para que alcancem a terceira idade com maior satisfação, bem-estar e QV. É de primordial importância continuar a investigar sobre a relação entre as variáveis positivas, como a satisfação com a vida e a QV dos idosos que vivem na comunidade, numa lógica de envelhecimento bem sucedido. Com o presente estudo pode-se apontar estratégias mais adequadas para a prestação de cuidados ao idoso dentro do programa de saúde mental possibilitando uma intervenção com enfoque na sua promoção e na aquisição da QV associado a um envelhecimento bem sucedido. Assim, é fundamental incluir a variável positiva – satisfação com a vida – aquando da intervenção do enfermeiro de saúde mental e psiquiatria na avaliação dos idosos uma vez que esta variável se associa a melhor perceção de QV dos idosos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BIBLIOGRÁFICAS Berger, L. e Mailloux-Poirier, D.. Pessoas Idosas: Uma Abordagem global. Editions Études Vivantes, Lisboa: Lusodidacta, 1995. Folstein, M. F.; Folstein, S. E. e Mchugh, P. R.. Mini-mental state: A practical method for grading the cognitive state of patients for the clinician. Journal of Psychiatric Research, 12, (p.189-198), 1975. Fortin, M. F.. Fundamentos e etapas do processo de Investigação. Loures: Lusociência – Lusodidacta, 2009.

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53. ANÁLISE DO PROJETO TERAPÊUTICO INSTITUCIONAL: NÚCLEO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS DE SANTO ANDRÉ Maria Odete Pereira*; Isabela Alves Silveira Souza**; Márcia Aparecida Ferreira de Oliveira*** *Pós-doutoranda do Programa Nacional de Pós-Doutorado – PNPD/CAPES, no Departamento Materno-Infantil e Psiquiátrico da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP. Brasil. mariaodete@usp.br **Graduanda da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP. Brasil. isabela.alves.souza@usp.br ***Professora Associada do Departamento Materno-Infantil e Psiquiátrico da Enfermagem da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP. Brasil. marciaap@usp.br

RESUMO Os Projetos Terapêuticos Institucionais - PTIs se caracterizam como um dos critérios legais para a implantação dos Centros de Atenção Psicossocial – CAPS, no Brasil. Os objetivos foram: analisar o projeto terapêutico institucional; analisar o processo de trabalho da enfermagem e a satisfação dos usuários e familiares, em relação à assistência oferecida pelo Serviço. Trata-se de um estudo de abordagem quantitativa, de caráter exploratório – descritivo realizado com os profissionais de enfermagem, usuários e familiares de um CAPS. Participaram oito profissionais de enfermagem: (62,5%) homens e (62,5%) casados. Estavam satisfeitos com a forma com que o usuário era cuidado pela equipe (75%), retratando a satisfação com o PTI. Participaram 28 usuários: (67,9%) homens (50%) casados e (64,3%) desempregados. Alegaram satisfação com a discussão acerca do tratamento e acharam favorável o envolvimento dos familiares no seu tratamento (89,3%). Os familiares entrevistados eram: (N=16) mulheres (75%), casados (81,25%), e com idade superior a 50 anos (56,25%). Para (75%) dos participantes, os cuidados oferecidos ao familiar adoecido o ajudaram a lidar eficazmente com o problema e a maioria afirmou que o mesmo obteve o cuidado que necessitava, mas (75%) alegou não ter participado do tratamento do E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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seu familiar. O PTI atendia às determinações, no entanto, a Instituição apresentou obstáculos que dificultavam e interferiam o seu desenvolvimento.

Palavras-Chave: Projeto Terapêutico; Serviços; Saúde Mental.

53.1. INTRODUÇÃO Com a Reforma Psiquiátrica ocorrido no Brasil por volta da década de 1980, buscou-se um modelo alternativo ao modelo hospitalocêntrico. A assistência passou a ter caráter humanístico e as equipes a serem interdisciplinares, pondo fim às instituições fechadas que causavam a exclusão social dos indivíduos portadores de transtornos mentais, mediante prática das internações. Dessa forma, criaram-se serviços como os Centros e os Núcleos de Atenção Psicossocial (CAPS/ NAPS) com a proposta de se ter uma rede de serviços territoriais sustentada na atenção psicossocial de base comunitária, a fim de proporcionar a reabilitação do usuário com transtornos mentais na sua família e comunidade, por meio de um serviço ambulatorial de atenção diária (1). Atualmente, os transtornos mentais associados ao uso prejudicial de álcool e outras drogas tem se agravado, como por exemplo: o do uso de crack, que por sua vez está estatisticamente em ascendência nos estados brasileiros. Esse fenômeno acontece em um cenário em que as respostas institucionais não se adequaram às problemáticas apresentadas: uma precária rede de cuidados primários e intermediários inseridos na comunidade, em contraposição à excessiva oferta de leitos psiquiátricos, particularmente para álcool e outras drogas e que tem crescente implantação, sobretudo, no Estado de São Paulo, concentrando-se em algumas regiões, além de serviços não caracterizados como de saúde, como as chamadas comunidades terapêuticas, mas que são contratados por gestões estaduais e municipais. 654

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Nessa direção, um processo avaliativo dos Centros/Núcleos de Atenção Psicossocial em álcool e outras drogas (CAPS/NAPS ad) devem levar em conta que os mesmos, de forma isolada e fora de uma estrutura em rede, podem dar respostas parciais não apenas devido às suas limitações internas, mas também por não estarem inseridos em uma proposta política mais ampla. O presente estudo se faz necessário, pela premência de se olhar para essas novas modalidades públicas de atenção, que estão sendo implantadas no País há alguns anos, a fim de monitorar essas ações e aferir a sua validade. Avaliar um CAPS/NAPS ad implica acompanhar o funcionamento de um serviço que se propõe a atender e a inserir socialmente o usuário, com maior resolubilidade, com uma intervenção pautada na diversidade de saberes de uma equipe multiprofissional e na utilização de múltiplos recursos.

53.1.1. OBJETIVOS Este estudo tem por objetivo geral: analisar o Projeto Terapêutico Institucional do NAPS ad do município de Santo André. Para tanto, os seguintes objetivos específicos são necessários: analisar o processo de trabalho da enfermagem e analisar a satisfação dos usuários e familiares em relação à assistência oferecida pelo NAPS ad de Santo André.

53.2. METODODLOGIA Trata-se de um estudo de abordagem quantitativa de caráter exploratório – descritivo realizado no NAPS ad de Santo André com os profissionais de enfermagem, usuários e familiares. Os dados referentes para análise do Projeto Terapêutico Institucional foram coletados por meio de uma auditoria dos registros dos usuários, do próprio projeto terapêutico do serviço, plano terapêutico individual do usuário, normas e atividades padronizadas, sistema de E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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referência e contra-referência e registro de atendimentos em prontuários. Aos participantes,

foram

aplicados

questionários

por

meio

do

instrumento

SATIS/OMS, após assinarem o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, que contém informações precisas conforme Resolução do Conselho Nacional de Saúde (2). Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Secretaria de Saúde de Santo André, sob o registro: Protocolo CEPSS-SA/Nº 032/2011 e pelo Comitê de Ética da Escola de Enfermagem da USP (Processo nº 1001/2011).

53.3. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os dados do NAPS ad de Santo André serão apresentados em cinco agrupamentos temáticos na seguinte ordem: o projeto institucional terapêutico, a família, o usuário e os profissionais de enfermagem.

O Projeto Institucional Terapêutico O

Projeto Institucional

Terapêutico do referido serviço,

dentre as

características apresentadas a um NAPS ad determinadas pelo Ministério da Saúde, define o funcionamento em período integral e sistema de porta aberta (exceto feriados, períodos noturnos e finais de semana), ou seja, o atendimento acontece por livre demanda, sem posterior agendamento de consulta para acessar o serviço. O atendimento é permitido a qualquer pessoa com questões de saúde mental e consumo, abuso ou dependência de sustâncias psicoativas que procure o serviço. Segundo a organização do serviço, o corpo técnico, no período da coleta de dados,

estava

constituído

por

quatro

enfermeiros,

nove

auxiliares

de

enfermagem, um médico psiquiátrica, um assistente social e dois profissionais 656

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que conduzem oficinas terapêuticas. No entanto, há a necessidade de um médico clínico, responsável pela triagem, avaliação e acompanhamento das internações clínicas na instituição para completar uma equipe mínima estabelecida pelo Ministério da Saúde. Já o corpo de apoio, formado por cinco auxiliares de limpeza e uma cozinheira, não possui segurança, que é um elemento importante na composição dos membros da Instituição. Contudo, o Corpo Administrativo encontra-se completo, formado pela chefia e auxiliares administrativos. A partir da observação não participativa, verificamos que a Instituição apresenta obstáculos que dificultam e interferem no desenvolvimento do projeto terapêutico, destacando-se: a ausência de espaço para discutir o PTI com o usuário e a família; a falta de qualificação da equipe profissional em saúde mental; a sobrecarga de atividades laboriais; a dificuldade da equipe em definir o seu papel; a baixa inserção da equipe terapêutica na comunidade; a reduzida articulação com outros setores da sociedade, e a alta rotatividade de abandono do tratamento terapêutico.

O Processo de Produção do Serviço de Saúde Foi apresentado aos 9 profissionais de enfermagem que aceitaram participar um roteiro a ser preenchido, com questões propostas acerca do processo de produção do serviço de saúde, onde desenvolviam suas atividades. Os subtemas eram: o objeto de trabalho; a finalidade do trabalho; os meios e instrumentos do trabalho e a organização e divisão do trabalho (3). No subtema objeto de trabalho, os trabalhadores apontaram o usuário como sendo uma pessoa que necessita de cuidados no âmbito biopsicossocial, por meio de ações e atenções pautadas na humanização, como fica exemplificado nos depoimentos a seguir: E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

657


Da mesma forma, os profissionais de enfermagem apontaram como finalidade do trabalho os métodos com base na humanização e atendimento individual e em grupo, visando a reabilitação do usuário. Sob a perspectiva do subtema meios e instrumentos os profissionais elencaram os trabalhadores e os serviços prestados aos usuários, dentre eles grupo de acolhida, medicamentos, encaminhamentos e oficinas terapêuticas. Com relação à organização e divisão do trabalho, no NAPS este é dividido de acordo com as funções de cada profissional que compõe o corpo de trabalhadores da instituição (corpo administrativo – chefes e auxiliares; corpo técnico – equipe multidisciplinar; corpo de apoio – segurança, cozinheiras, faxineiras e comunidade). No entanto, no que se refere aos profissionais de enfermagem, alguns realizam atividades que não lhe competem.

A Família Os familiares entrevistados (N = 16) eram em sua maioria mulheres (75%), casados (81,25%), com idade superior a 50 anos (56,25%). Estes familiares carregam consigo experiências diversas de sofrimento e angustias vivenciadas pelo uso de drogas de seu familiar. No entanto, veem no NAPS a possibilidade de resultados positivos alcançados pelo tratamento. Para (31,25%) das famílias, o familiar adoecido tinha um problema social quando foi admitido no NAPS ad. Por outro lado, (18,75%) consideraram que o seu familiar possuía um problema de saúde mental. Acerca do tratamento dado ao seu familiar, (75%) das famílias receberam informações sobre a doença, sendo que (66,7%) as consideraram claras. Acerca do tratamento, (62,5%) dos familiares referiram receber informações, enquanto

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E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


que (37,5%) alegaram não receber. No entanto, para (75%) das famílias não foi pedida opinião a respeito o tratamento do seu familiar.

O Usuário Participaram do estudo 28 usuários (67,9% homens) com idades entre 22 e 78 anos, estando a maioria (60,7%) na faixa dos 32 aos 57 anos de idade. A maior parcela dos usuários (50%) era casada ou tinha uma relação estável; (53,6%) com escolaridade elementar (1 grau); (46,4%) não trabalhava e (64,3%) vivia em residência própria, sendo que (32,1%) residia com cônjuge e filhos. Ao serem admitidos no serviço (42,9%) dos usuários acreditavam que tinham um problema psicológico, diferentemente da percepção dos familiares, que acreditavam que o familiar adoecido tinha um problema social. Os usuários ficaram satisfeitos com a discussão feita acerca do tratamento que receberiam e (89,3%) acharam favorável o envolvimento dos familiares no seu tratamento.

Os Profissionais de Enfermagem Do total de profissionais de enfermagem (N=8) que participaram da pesquisa, houve o predomínio do sexo masculino (62,5%), variando a faixa etária entre 26 a 54 anos e a maioria era casada (62,5%). Com relação à escolaridade, (25%) cursaram até o 1º grau; (12,5%) até o 2º grau; (25%) cursando o ensino superior completo e (12,5%) o incompleto. Apenas (25%) apresentavam especialização ou pós-graduação na área de saúde mental. De acordo com o tempo de atendimento, (25%) começaram a trabalhar na Instituição há menos de um ano, enquanto que (25%) estavam entre três a cinco anos e os demais há mais de seis anos. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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Na perspectiva do ambiente de trabalho, (62,5%) dos profissionais perceberam com frequência um bom clima, (75%) classificaram como amigável a relação com as demais pessoas do Serviço. Quando questionados a respeito da sobrecarga ao lidar todo o tempo com dependentes químicos psicóticos, (75%) dos profissionais de enfermagem afirmaram estarem muito ou mais ou menos sobrecarregados. Nesse mesmo contexto, (62,5%) consideraram que o seu trabalho estava afetando mais ou menos o seu estado geral de saúde física. Um indício disso foi o aumento dos problemas ou queixas físicas que começaram ao iniciarem o trabalho na área de saúde mental. No entanto, não houve maior procura da ajuda médica e não aumentou o consumo de medicamentos deste que estavam empregados no referido NAPS ad. A insatisfação com o emprego ficou mais evidente quando os profissionais de enfermagem (50%) afirmaram pensar frequentemente em mudar de campo de trabalho. A fim de diminuir a sobrecarga no trabalho, os participantes mencionaram a diminuição da carga horária e o aumento do número de profissionais.

53.4. CONCLUSÕES O NAPS ad de Santo André funciona em um imóvel alugado, adaptado, de espaço físico reduzido e inadequado quanto à disposição das salas e à circulação

interna,

não

apresentando

condições

de

acessibilidade

aos

portadores de necessidades especiais. Além disso, não possui espaço para realização de atividades ao ar livre. O foco da construção e desenvolvimento do Projeto Terapêutico Individual é o usuário em sua singularidade. No entanto, a família não participa da elaboração das metas a serem alcançada em um determinado período de tempo junto ao seu 660

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familiar, ficando a margem do tratamento proposto. Contraditório, pois, no tratamento, os usuários veem a participação do familiar enquanto cuidador como favorável. Verificamos, também, que a relação entre os profissionais de enfermagem era bastante amigável e harmoniosa, se constituindo um fator que amenizava a sobrecarga do trabalho na Instituição. Isso acontecia porque que o clima de trabalho possibilitava momentos de descontração e relaxamento, favorecendo a eliminação de cargas de desgastes e estresse. Ressaltamos a importância deste estudo, por contribuir com conhecimentos e concepções segundo a avaliação dos usuários, familiares e profissionais de enfermagem acerca do cuidado e da atenção na saúde mental, a fim de direcionar melhorias na qualidade dos serviços prestados.

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E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

661


54.

PROMOÇÃO

DA

SAÚDE

MENTAL

NOS

ADOLESCENTES:

RESULTADOS DE UMA ESTRATÉGIA DE INTERVENÇÃO Luísa Campos*

*Faculdade de Educação e Psicologia do Centro Regional do Porto Universidade Católica Portuguesa. Centro de Estudos em Desenvolvimento Humano, Faculdade de Educação e Psicologia, Centro Regional do Porto da Universidade Católica Portuguesa, Rua Diogo Botelho, 1327, 4169-005 Porto, Portugal. ENCONTRAR+SE – Associação de apoio a pessoas com perturbação mental grave

RESUMO Nesta comunicação é descrita a estratégia de intervenção comum a três projetos: UPA Faz a Diferença (jovens 15-18 anos), P’UPA: Professores UPA Fazem a Diferença (professores ensino básico e secundário) e Abrir Espaço à Saúde Mental (jovens 12-14 anos). São projetos de promoção de saúde mental que têm como principal objetivo: contribuir para o aumento de conhecimentos sobre questões de saúde mental e para a diminuição do estigma associado às perturbações mentais.

54.1. ENQUADRAMENTO Os jovens são um grupo-alvo prioritário para o desenvolvimento de intervenções de promoção de saúde mental (Rickwood, Deane, Wilson & Ciarrichi, 2005; WHO, 2010) por duas razões fundamentais: 1 em cada 5 adolescentes irá

passar

pela

experiência

de

um problema

psicológico

significativo significativo (U.S. Department of Health and Human Services, 1999); 50% das perturbações mentais têm o seu início durante a adolescência (European Commission & Portuguese Ministry of Health, 2010). 662

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


Não obstante a promoção da saúde mental constituir-se uma prioridade de saúde pública (European Commission et al., 2010), dois importantes desafios deverão ser considerados, aquando do desenho de intervenções centradas nesta temática. Por um lado, a falta de conhecimentos sobre questões de saúde mental (literacia em saúde mental5); e, por outro lado, o estigma associado às perturbações mentais (Schulze, Richter-Werling, Matschinger & Angermeyer, 2003; Pinfold, Toulmin, Thornicroft, Huxley, Farmer & Graham 2003; Pinfold, Stuart, Thornicroft & Arboleda- Flórez, 2005; Stuart, 2006). Os resultados da literatura apontam para o facto de intervenções centradas na promoção da literacia em saúde mental possuírem importantes vantagens ao nível da prevenção, do reconhecimento e da intervenção precoce, bem como da redução do estigma associado à perturbação mental (Schulze et al., 2003; Pinfold et al., 2003; Pinfold et al., 2005; Stuart, 2006). Neste sentido, diversas iniciativas têm sido desenvolvidas, em contexto internacional, no sentido de aumentar a literacia em saúde mental e diminuir o estigma associado às perturbações mentais (Wyn, Cahill, Holdsworth, Rowling & Carson, 2000; MINDSET, 2002; Massey, Armstrong, Boroughs, Henson & McCash, 2005; Stuart, 2006; Tacker & Dobie, 2008), sendo salientadas as vantagens ao nível da prevenção, do reconhecimento e da intervenção precoce, bem como da redução do estigma associado à perturbação mental (Corrigan & Watson, 2002; Pinfold, Stuart, Thornicroft & Arboleda- Flórez, 2005; Kelly, Jorm & Wright, 2007). Em contexto nacional, embora a saúde mental seja considerada uma das áreas prioritárias para a promoção de estilos de vida saudáveis no Programa Nacional de Saúde Escolar (Ministério da Saúde, 2006), é possível constatar-se a escassez de intervenções de promoção de saúde mental sistematizadas.

5

Tradução de mental health literacy (Jorm, 2000) E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

663


É neste contexto que surgem os projetos UPA Faz a Diferença6,7 (jovens 1518 anos), P’UPA: Professores UPA Fazem a Diferença8 (professores ensino básico e secundário) e Abrir Espaço à Saúde Mental9 (jovens 12-14 anos).

54.2. TRÊS PROJETOS: UMA ESTRATÉGIA DE INTERVENÇÃO O desenvolvimento da estratégia da intervenção subjacente aos três projetos teve na sua base algumas linhas orientadoras, que a literatura aponta como fundamentais no desenvolvimento de intervenções centradas na promoção de saúde mental: (1) a elaboração prévia de uma pesquisa relativa ao públicoalvo com recurso, por exemplo, a focus groups, no sentido de assegurar a adequabilidade das mensagens que se pretendem transmitir; (2) a sistematização da informação numa base teórica consistente; (3) o desenvolvimento de estratégias de intervenção que cativem a atenção e promovam a participação ativa do público-alvo; (4) a realização de uma avaliação prévia à intervenção, de forma a perceber se as mensagens transmitidas alcançam os objectivos propostos procedendo-se, posteriormente, a eventuais reformulações (Noar, 2006); e (5) a avaliação da intervenção para aferir o seu impacto, bem como a

6

Projeto desenvolvido pela ENCONTRAR+SE – Associação de Apoio a Pessoas com Perturbação Mental Grave – com o apoio financeiro do Alto Comissariado da Saúde, da Fundação Calouste Gulbenkian, da Lilly Portugal e do Banco BPI, e com o apoio científico do Centro de Estudos de Desenvolvimento Humano (CEDH), Faculdade de Educação e Psicologia, Centro Regional do Porto da Universidade Católica Portuguesa, Rua Diogo Botelho, 1327, 4169-005 Porto, Portugal 7

Distinguido com o 1º prémio no concurso de Boas Práticas em Saúde Escolar, promovido pela Sociedade Portuguesa para o Estudo da Saúde Escolar (SPESE). 8

Projeto desenvolvido pela ENCONTRAR+SE, com o apoio financeiro da Lilly Portugal e com o apoio científico do Centro de Estudos de Desenvolvimento Humano (CEDH), Faculdade de Educação e Psicologia, Centro Regional do Porto da Universidade Católica Portuguesa, Rua Diogo Botelho, 1327, 4169-005 Porto, Portugal. 9

Projeto desenvolvido pela Faculdade de Educação e Psicologia, Centro Regional do Porto, da Universidade Católica Portuguesa (FEP-UCP), com financiamento da Fundação para a Ciência e Tecnologia (PTDC/PSIPCL/112526/2009), em parceria com a ENCONTRAR+SE.

664

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


possível mudança de atitudes e comportamentos (Patel, Flisher, Hetrick & McGorry, 2007). Tendo por base as anteriores linhas orientadoras, desenvolveram-se três projetos que partilham de um objetivo geral comum - contribuir para o aumento de conhecimentos sobre questões de saúde mental e diminuição do estigma associado às perturbações mentais - e que estão ancorados em dois conceitos fundamentais - literacia em saúde mental (Jorm, 2000, 2011) e estigma associado às perturbações mentais (Corrigan & Watson, 2002). Dirigem-se a um público-alvo - os jovens - quer direta, quer indiretamente (o projeto P’UPA: Professores UPA Fazem a Diferença destina-se a professores, embora tendo como pressuposto que a intervenção junto deste tipo de agentes educativos tem um efeito indireto - irradiativo e fundamental - nos jovens). Os três projetos são constituídos por duas fases: fase piloto e fase de intervenção. A fase piloto envolve, em todos os projetos, o desenvolvimento de focus group com os respetivos públicos-alvo, cujos resultados permitem (a) a construção dos instrumentos de avaliação e da estrutura e conteúdos das intervenções; e (b) o estudo psicométrico dos instrumentos de avaliação e a melhoria das intervenções desenvolvidas (Campos, Palha, Dias & Veiga, 2011; Campos & Palha, 2012; Campos, Palha, Dias & Costa, 2012; Campos, Palha, Dias, Lima, Veiga, Costa & Duarte, 2012a, 2012b; Campos, Palha, Dias, Veiga, Costa & Duarte, 2012). A fase de intervenção segue uma metodologia comum. É constituída por 2 sessões (embora com durações diferentes), realizadas com um intervalo de uma semana. As sessões baseiam-se numa metodologia interativa, com recurso a dinâmicas de grupo e música, sendo promovido o debate e o esclarecimento de dúvidas. Para avaliação do impacto das intervenções, os participantes são divididos em dois tipos de grupos – experimental e controlo – e os questionários de avaliação são aplicados no início e no final das intervenções (Campos et al., 2011; Campos & Palha, 2012; Campos, Palha, Dias & Costa, 2012; Campos, Palha, E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

665


Dias, Lima, Veiga, Costa & Duarte, 2012a, 2012b; Campos, Palha, Dias, Veiga, Costa & Duarte, 2012).

54.3. CONCLUSÃO O desenho da estratégia de intervenção aqui apresentada parte da incontornável necessidade de se entender a forma como os referidos públicoalvo pensam acerca das questões relacionadas com a saúde mental, sobre o modo como constroem o seu conhecimento, bem como quais os seus interesses e receios face à perturbação mental. Em seguida, e com base no referido entendimento, torna-se fundamental o desenvolvimento de uma intervenção teoricamente sólida, criativa e com uma linguagem adaptada aos diferentes públicos-alvo. Por último, o enquadramento dos projetos num modelo científico de avaliação do tipo pré/pós, assente numa metodologia rigorosa, permite intervenções sistematizadas, válidas e replicáveis. Entendimento, solidez, criatividade, linguagem, adaptação e rigor são palavras-chave para o desenvolvimento de estratégias de intervenção eficazes.

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55. FATORES QUE DIFICULTAM A APLICABILIDADE DA POLÍTICA NACIONAL DO MINISTÉRIO DA SAÚDE DO BRASIL PARA A ATENÇÃO INTEGRAL AOS USUÁRIOS DE ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS Maria Odete Pereira*; Márcia Aparecida Ferreira de Oliveira**; Paula Hayasi Pinho***; Heloísa Garcia Claro****; Divane de Vargas*****; Sônia Barros******

*Pós-Doutoranda PNPD/CAPES do Departamento Materno-Intantil e Psiquiátrico da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. Grupo de Estudo sobre álcool e outras drogas – GEAD **Professor Associado do Departamento Materno-Intantil e Psiquiátrico da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. Grupo de Estudo sobre álcool e outras drogas – GEAD ***Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. Grupo de Estudo sobre álcool e outras drogas – GEAD. phpinho@usp.br ****Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. Grupo de Estudo sobre álcool e outras drogas – GEAD *****Professor Associado do Departamento Materno-Intantil e Psiquiátrico da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. Grupo de Estudo sobre álcool e outras drogas – GEAD ******Professor Titular do Departamento Materno-Intantil e Psiquiátrico da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo.

Agradecimento: À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior – CAPES, pela concessão de Bolsa para Estágio Sandwich realizado no Centro de Estudos Sociais - CES, da Universidade de Coimbra – PO

RESUMO As demandas sociais mundiais geradas pelo consumo abusivo de álcool e outras drogas, faz com que Orgãos internacionais e nacionais coloquem a questão como prioridade em suas agendas políticas. Os objetivos foram: identificar os fatores que dificultam a aplicabilidade da Política Nacional do Brasil, para a atenção integral aos usuários de álcool e outras drogas e analisar os fatores de dificultam a aplicabilidade da Política Nacional na perspectiva de um referencial E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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sociológico. Estudo empírico e descritivo, de caráter qualitativo, resultante da Tese de doutoramento de um dos autores. As informantes foram coordenadoras de saúde mental das instâncias municipal e estadual de São Paulo – Brasil, e de dois Centros de atenção psicossocial para usuários de álcool e outras drogas, nas referidas instâncias. Os fatores dificultadores foram: definição das regras de financiamento; segurança pública; cunho ideológico dos fatores que inviabilizam a aplicabilidade da Política; predominância da lógica da abstinência na Secretaria Nacional sobre Drogas; resistência dos hospitais gerais em disponibilizar leitos para internação de dependentes químicos; internação psiquiátrica em oposição ao tratamento nos Centros de Atenção; índices de internação; número insuficiente de serviços com acolhimento noturno. Viu-se que algumas questões vivenciadas pelos trabalhadores de saúde mental nos serviços participantes da investigação não são consideradas no contexto da Política Nacional.

Palavras-Chave: Política de Saúde; Álcool; Serviços de saúde; Saúde Mental.

55.1. INTRODUÇÃO Estima-se que 205 milhões de pessoas no mundo utilizem drogas ilícitas, incluindo os 25 milhões que delas são dependentes. Isso se constitui um problema de saúde pública; afeta o desenvolvimento socioeconômico e gera demandas relacionadas à segurança, nos países industrializados e em desenvolvimento (OMS, 2008). Dados da OMS (2011) mostraram que numa população de 189.323.000 de brasileiros, considerando que 72% tinham idades superiores a 15 anos e que 85% viviam em áreas urbanas, 32,4%, entre homens e mulheres referiram ter feito uso pesado de álcool na vida, enquanto que 31.8% se consideravam bebedores formais. 670

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Segundo estudo da OMS, que avaliou a ingestão de álcool em 100 países, pelo menos 2,5 milhões de pessoas morrem por ano, em todo o mundo, por causa do consumo inadequado de álcool (Brasil, 2012). A amplitude e a gravidade dos problemas relacionados ao consumo prejudicial de álcool exigem que os Órgãos governamentais de todos os países adotem políticas e estratégias que diminuam o uso de drogas pela população em geral, bem como evitem as consequências da utilização nociva dessas substâncias. No entanto, não se pode traçar uma política com apenas um objetivo: o da abstinência, pois trabalhar dessa forma, em saúde, significa trabalhar com um entendimento muito estreito acerca da questão (Brasil, 2004). O Ministério da Saúde Brasileiro publicou, em 2003, a Política Nacional de Atenção aos Usuários de Álcool e outras Drogas, que neste estudo foi analisada (Brasil, 2004). 55.1.1. OBJETIVOS Os objetivos deste artigo foram: identificar os fatores que dificultam a aplicabilidade da Política Nacional do Brasil, para a atenção integral aos usuários de álcool e outras drogas e analisar os fatores de dificultam a aplicabilidade da Política Nacional, na perspectiva do referencial teórico das Sociologias da Ausência, de Santos (2006).

55.2. METODOLOGIA Trata-se de estudo descritivo e exploratório de abordagem qualitativa, para compreensão do fenômeno “álcool e outras drogas“, objeto do estudo. A investigação se constitui como parte da Tese de doutoramento de um dos autores.

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671


O estudo foi realizado junto às coordenações de Saúde Mental do município e do estado de São Paulo, bem como às de dois Centros de Atenção Psicossocial para álcool e drogas, sob a gestão das respectivas instâncias. O projeto da pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (CEP-EEUSP), e aprovado sob nº 656/2007. Foram garantidas todas as determinações da Resolução CONEP/MS nº 196/96. A coleta de dados se deu no período de maio de 2008 e agosto de 2009, e os dados foram coletados por meio de entrevistas semi-estruturadas, as quais foram gravadas e transcritas textualmente.

As colaboradoras nas entrevistas

foram identificadas pela letra E (entrevista), classificadas de E1 a E4 referentes às quatro colaboradoras. O referencial teórico de análise eleito foi a Sociologia das ausências, que propõe a sociologia como procedimento para a ampliação do mundo, a dilatação do presente. Trata-se de uma lógica que visa demonstrar que a não existência é genuinamente concebida como inexistente, a saber; é uma alternativa não crível à existência (Santos, 2006). O objetivo é transformar objetos impossíveis em possíveis e com base nesses, transformar ausências em presenças, centrandose nos fragmentos das experiências sociais não socializadas pela racionalidade de totalidade metonímica. Essa ampliação não se dá apenas por expandir as experiências credíveis existentes, mas também porque, com elas, aumentam as possibilidades de experimentação social no futuro. O que une as diferentes lógicas de produção de não-existência é que todas elas são manifestações da mesma monocultura racional. Não há uma única forma ou maneira de não existir, porque são várias as lógicas e os processos por meio dos quais a razão metonímica produz a não-existência do que não cabe na sua totalidade e no seu tempo linear. Dessa forma, existe produção de não existência sempre que uma entidade é desqualificada irreversivelmente, bem como tornada invisível e descartável. 672

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Neste estudo, os dados foram analisados na perspectiva da classificação social, da Sociologia das Ausências Santos (2006).

55.3. RESULTADOS Os dados resultaram nas subcategorias de análise: definição das regras de financiamento; segurança pública; cunho ideológico dos fatores que inviabilizam a aplicabilidade da Política; predominância da lógica da abstinência na Secretaria Nacional Antidrogas - SENAD; resistência dos hospitais gerais em disponibilizar leitos para internação de dependentes químicos; internação psiquiátrica em oposição ao tratamento nos CAPS ad; índices de internação e o número insuficiente de CAPS ad na Rede SUS. A falta de clareza quanto ao financiamento do Ministério da Saúde – MS para a Saúde Mental foi abordada no capítulo anterior, indicada como umas das fragilidades da Política Nacional de atenção aos usuários de álcool e outras drogas, e coerentemente apontada por uma das colaboradoras como sendo fator que dificulta a aplicação da Política, neste capítulo. A sua fala expressa: [...] “acho que falta clareza quanto aos financiamentos” (E1A). O segundo fator indicado por uma das colaboradoras, que se impõe com dificultador para a aplicação da Política em questão, é a segurança pública. Segundo sua percepção expressa no texto a seguir: [...] acho que é a segurança pública. Acho que as questões de segurança pública não estão afinadas com a nova Política, assim, horas radicaliza para um lado e horas para outro. Então depende muito do quanto o gestor assimila e concorda com aquilo. “Como se estivesse na governabilidade dele poder fazer essa escolha, mas na prática é isso que acontece” (E2A). Na perspectiva da colaboradora, a segurança pública, que é oferecida pela Polícia Militar (PM) não está bem articulada com a Política, pois a abordagem acerca da temática dependerá do perfil do alto comando da PM do estado e E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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município em questão. Assim, essa abordagem poderá ser repressora, mas com a autuação e detenção de usuários em primeiro flagrante ou repressora, autuando e detendo traficantes, o que a faz ser completamente diferente em uma e outra situação. Nessa lógica, uma das colaboradoras expõe em sua fala: Acho que todos os fatores são de cunho ideológico e de mercado, e eu acredito que no ponto de vista de ideologia, dependendo da gestão governamental, os gestores é que dão a direção da Política. Sob o ponto de vista da aplicabilidade dele, sem dúvida não dá para se questionar (E3A). Outra colaboradora complementa: [...] falta uma Política Pública mais focada na questão da dependência química e eu desconheço qual seja o fator, mas se levanta hipóteses que de acordo com a Secretaria de Saúde que está coordenando, gerenciando o serviço, tem um olhar com um determinado foco. Assim, em alguns anos de gestões políticas ele foi melhor e em outros deu uma decaída (E4A). É muito comum ao final de uma gestão, independentemente do âmbito em que se dê verem-se Programas desmantelados e Políticas públicas caírem por terra dando lugar a outras, que caiam sob medida aos interesses hegemônicos de quem governa. Ainda nessa lógica, uma das colaboradoras apresenta em sua fala, as tendências ideológicas de pessoas que compõem os conselhos municipais e estaduais ou que fazem consultoria para a Secretaria Nacional sobre Drogas SENAD, acerca da abstinência dos usuários de substâncias químicas, uma vez que o Ministério da Saúde propõe a redução de danos como estratégia para intervenção em álcool e outras drogas. A colaboradora alega: Nos conselhos de drogas e álcool nos municípios, em geral, inclusive o de São Paulo, ainda existe a idéia dos doze passos dos alcoólicos anônimos – AA, e dos narcóticos anônimos - NA. Parece que essa é a Política do álcool e outras drogas (E2B). Uma das colaboradoras se posiciona a respeito quando fala: Sempre nos posicionamos nos embates mais duros com o pessoal que defende a outra forma 674

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de trabalhar, pois contestam dizendo que esta Política é inviável porque os custos são absurdos.

Eu pergunto: e a possível internação e o custo da

hotelaria? O que é isso? Não vai tratar? (E3B). Na verdade cada qual defende o paradigma adotado para tratar o usuário de substâncias químicas. Assim, a colaboradora continua: [...] “para cada argumento que você possa ter, questionando o modelo extra hospitalar, você terá vinte para provar que ele é melhor, inclusive quanto aos custos” (E3C). Com relação ao tratamento a colaboradora coloca: Porque só internar não é tratamento, essa é a minha opinião. Não se trata internando, porque você não aborda integralmente o ser. Tem que fazer o trabalho extra-hospitalar mesmo, para tomar conta da integridade dessa pessoa, no biopsicossocial, inserindo socialmente, articulando com outras instituições. Isso o CAPS ad faz magnificamente. De fato sou grande defensora deste modelo, tanto que eu não acredito no outro modelo (E3D). Acerca da atenção aos usuários de álcool e outras drogas, a colaboradora continua sua fala: Eu acho que as pessoas procuram mais o ambiente extrahospitalar, e eu posso ter uma abrangência absurda ao número de pessoas que nos procuram, completamente diferente da internação, porque estamos aqui, e eles estão perto de nós, tanto é que já vimos isso: de 2004 para 2006, na pesquisa que fizemos na Secretaria de Estado da Saúde observamos que aumentou muito o registro do número de usuários de drogas, mas por quê? Aumentou o número de usuários? Não! Aumentou a procura, porque o serviço é acessível e é tão rápido (E3E). A existência de um serviço próximo à residência do usuário de substâncias químicas viabiliza o seu tratamento, pois no CAPS ad ele participa das sessões psicoterápicas

individuais

ou

grupais,

recebe

as

doses

diárias

dos

medicamentos, participa das oficinas terapêuticas, enfim, tem a possibilidade de ir ao serviço diariamente, dependendo da periodicidade estabelecida pelo seu projeto terapêutico individual, e de retornar para casa ao final do período de E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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tratamento, ao que a colaboradora expõe: Então você disponibiliza um serviço que antes não havia e se dizia: “- ah! só tem que internar!”. Agora a pessoa passa na porta, entra e vê as outras lá dentro sendo atendidas e não precisa de toda aquela confusão que envolve a internação (E3F). Uma das colaboradoras do presente estudo abordou neste capítulo acerca da redução dos índices de internação dos usuários do serviço, porque a cuidado que é destinado a eles, segundo o projeto terapêutico individual elaborado, faz com que se tenha acentuada redução. Assim ela argumenta: Qual é o nosso índice de internação? É baixíssimo, e olha que o Serviço só funciona de segunda a sexta-feira e fecha às 18 ou 19 horas, dependendo do paciente que estiver aqui. Porque eu resolvo! Percebe? Isso eu mostro e provo aqui no Serviço, mostramos isso o tempo todo, porque de fato eu acho que o CAPS ad é resolutivo (E3I). Ainda acerca da internação em hospital geral, a colaboradora expõe que: Somente internamos o paciente quando de fato é necessário. Temos essa consciência maior, porque se eu tenho um nível de hospital geral acessível, que eu possa dizer: - “desse nível de atendimento eu preciso...” Por exemplo: o paciente chegou na sexta-feira e não tenho como atendê-lo. Preciso que ele fique sábado e domingo no hospital, pois na segunda-feira às 7 horas da manhã, o hospital o manda de volta para mim ou vou buscá-lo. Preciso disso e não mais do que isso para ter a garantia de que verei o paciente bem na segunda-feira. (Assim, ele é beneficiado com esse regime e para isso, eu preciso ter esta continência no hospital) (E2J). O CAPS ad não possui as características de CAPS III, e, portanto, não possui leitos para internação, apenas de dois a quatro leitos para desintoxicação. As autoras pensam que o CAPS ad deveria ser classificado como uma modalidade de CAPS III, para que a existência dos leitos fosse coerente com o atendimento em turno de 24 horas, quando se faz necessária a permanência do usuário no período noturno, durante o período de desintoxicação. 676

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A colaboradora expressa a capacidade que um dos CAPS ad participantes do estudo tem em resolver muitas das demandas dos usuários que surgem no cotidiano do serviço. Acho realmente que no CAPS ad vai desde casos de internação para outros extremos. Quando falo de extremos me refiro a casos de internação em UTI, eu vou internar aquele que de fato necessita. Porque até quadro de psicose chega aqui no Serviço. Não somos um CAPS III e por isso não temos internação (E3H). Apesar da alta resolutividade do CAPS ad, duas colaboradoras apontam o número insuficiente dessa modalidade de CAPS II para atender a população brasileira dependente de substâncias químicas, como um fator que impossibilita a efetividade da Política Nacional de atenção aos usuários de álcool e outras drogas. Uma delas refere-se à questão: “Acho que os equipamentos de saúde são poucos ainda e por isso não fazem frente à necessidade, de maneira nenhuma” (E2E). Outra colaboradora completa: O que precisa mudar é termos um maior número de CAPS ad. [...] a questão que acho é quanto ao número de pessoas atendidas no CAPS ad. Na Portaria o Ministério restringe o número de pessoas a serem atendidas a cerca de 180 ou 200 e poucos. Isto é um absurdo! Você não pode restringir um CAPS ad a esse número! O CAPS ad tem o potencial de atender mais, desde que tenha maior número de pessoas trabalhando. Tem é que aumentar a eficácia do CAPS ad, de fato, aumentar o número de leitos de observação de um CAPS ad, o que otimiza muito e é fantástico (E3G).

55.4. DISCUSSÃO As colaboradoras trouxeram à baila algumas temáticas como, por exemplo, a dificuldade de articulação com a Polícia Militar, que dependendo do comandante geral, as condutas são articuladas com os coordenadores de saúde mental estadual e municipal ou não. Elas também apontaram a racionalidade E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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dentro da SENAD e dos Conselhos de Saúde, nos três âmbitos, para a política de abstinência do álcool e outras drogas, e não a de redução de danos, que é a estratégia adotada pela Política Nacional, além da dificuldade de articulação com os hospitais gerais, para que os mesmos disponibilizem leitos para a internação dos usuários dos CAPS ad, e da expressiva insuficiência do número de CAPS ad em todo o País. As autoras chamam a atenção para o que uma das colaboradoras chamou de cunho ideológico, aos fatores desencadeados por gestores que manipulam a Política, de acordo com suas convicções e interesses. Por todas as considerações realizadas pelas colaboradoras, entende-se que na hierarquia social, os direitos à saúde e à inclusão social ainda não constam como possibilidades para os usuários de álcool e outras drogas, porque a sociedade brasileira como toda sociedade ocidental, na perspectiva de Santos (2006), possui uma racionalidade metonímica, pois compreende apenas o todo, e por isso, considera apenas uma lógica que governa tanto o comportamento do todo, como o de cada uma de suas partes, desconsiderando-as individualmente. Logo, as partes são visualizadas pelo todo. Na racionalidade da classificação social, o usuário de drogas se constitui um problema social, que não contribui para a produção do capital como os demais cidadãos e, portanto, não deve ser atribuído a ele o mesmo valor e o mesmo direito de cidadão, porque ele é compreendido como parte do todo e avaliado pelo todo. As suas demandas individuais inexistem para a sociedade, que se faz no todo. A sociedade, segundo (Becker, 1977) é um mito vivo do significado da vida humana, que desafiadoramente estabelece significados, assim, loucos e drogado são significados não compartilhados. No entanto, a loucura não é loucura quando compartilhada, da mesma forma que o dependente de benzodiazepínicos não é considerado um drogado.

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Brasília;

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56. INTENÇÃO DE PROCURA DE AJUDA E AS BARREIRAS PERCEBIDAS NO CONSUMO DE ÁLCOOL Luís Manuel de Jesus Loureiro*; Aida Maria de Oliveira Cruz Mendes**; José Carlos Pereira dos Santos***; Nuno Rafael Neves de Oliveira****

*Ph.D. Professor Adjunto da ESEnfC [luisloureiro@esenfc.pt; 918096250] **Ph.D. Professora Coordenadora da ESEnfC [amendes@esenfc.pt] ***Ph.D. Professor Adjunto da ESEnfC [jcsantos@esenfc.pt; 913703104] ****Licenciado em Enfermagem, Bolseiro de Investigação da FCT, na Unidade de Investigação Ciências da Saúde – Enfermagem, da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra. [nrafael@esenfc.pt; 916436388]

RESUMO O consumo de álcool tem consequências graves para os indivíduos que consomem álcool em excesso, em particular para os adolescentes e jovens. O reconhecimento precoce deste problema através da promoção da literacia em saúde mental nesta população vem dar resposta a uma das prioridades do Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016. A realização deste estudo permitiu avaliar a intenção de prestação de ajuda e as barreiras percebidas à procura de ajuda, em 4938 adolescentes e jovens da região centro de Portugal, com idades compreendidas entre os 15 e os 24 anos, através da aplicação do questionário QuALiSMental. Deste

estudo

observou-se

que

os

adolescentes

e

jovens

estão

moderadamente disponíveis para prestar ajuda aos amigos que os rodeiam. As principais barreiras percebidas na procura de ajuda mais referidas foram: que a pessoa ficaria com uma opinião negativa sobre si; que a pessoa possa vir a pensar sobre si; que a pessoa possa vir a contar a outras pessoas; a pessoa considerasse-se tímida ou sentir vergonha. 680

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Os dados obtidos estão em consonância com outros estudos realizados. Palavras-chave: Abuso de álcool; Literacia em Saúde Mental; Intenção de procura de ajuda; Barreiras percebidas.

56.1. INTRODUÇÃO A procura de ajuda é uma dimensão da literacia em saúde mental relevante para a resolução atempada dos problemas relacionados com o consumo em excesso de álcool entre os adolescentes e jovens. Contudo, existem barreiras associadas (ex.: timidez e vergonha) que podem levar à agudização dos problemas e ao evitamento da procura de ajuda (Rickwood et al, 2005). O Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016 aponta a promoção da saúde e prevenção das doenças mentais como um dos caminhos a privilegiar em termos de saúde pública. Neste sentido, o Projeto Educação e Sensibilização para a Saúde Mental: Um Programa de Intervenção com base na Escola para Adolescentes e Jovens [PTDC/ CPE-CED/112546/2009]1, é um instrumento desenvolvido com o objetivo de dar resposta às preocupações e necessidades neste domínio. A promoção da saúde mental é feita a partir dos níveis de literacia em saúde, que compreende muito mais do que a capacidade de leitura e de escrita, visto que as experiências prévias, o acesso a informação e a serviços de saúde e, ao mesmo tempo, a cultura de cada região, influenciam a forma como cada pessoa percebe, compreende e age, em relação à sua saúde (Loureiro et al, 2012).

1

Projeto inscrito na Unidade de Investigação em Ciências da Saúde - Enfermagem (UICISA-E) da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra (ESEnfC), financiado por fundos nacionais através da FCT/MCTES (PIDDAC) e cofinanciado pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) através do COMPETE – Programa Operacional Fatores de Competitividade (POFC) do QREN. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

681


O presente estudo tem como objetivo caracterizar a opinião dos adolescentes e jovens portugueses relativamente à intenção de prestação de ajuda e barreiras percebidas à procura de ajuda no caso de abuso de álcool pelos pares.

56.2. METODOLOGIA Realizou-se um estudo descritivo-exploratório, para avaliação dos níveis de literacia em saúde mental nos adolescentes e jovens. A constituição da amostra probabilística foi feita por método de conglomerados na região centro de Portugal Continental (antiga zona de abrangência da DREC), de forma a obter uma representatividade dos adolescentes e jovens desta região. O instrumento de colheita de dados utilizado foi o QuALiSMental (Loureiro, Pedreiro e Correia, 2012) que é um questionário de avaliação da literacia em saúde mental, traduzido e adaptado para a população portuguesa a partir da versão australiana do Survey of Mental Health Literacy in Young People. No processo de tradução e validação, os aspetos do conteúdo foram analisados por investigadores e especialistas da área da saúde mental. A validação do QuALiSMental foi feita por um focus group de adolescentes (Loureiro, Pedreiro e Correia, 2012). Após realizar-se os procedimentos ético-formais da colheita de dados, o questionário foi aplicado a uma amostra aleatória de 4938 adolescentes e jovens portugueses que frequentam as escolas do 3º ciclo do ensino básico e o ensino secundário da Direção Regional de Educação do Centro (DREC). A amostra é constituída por 43,3% do género masculino e 56,7% do género feminino, com idades compreendidas entre os 15 e os 24 anos, sendo a média da idade de 16,75 anos e o desvio-padrão de 1,62 anos. Para o tratamento de dados foi utilizado o IBM-SPSS versão 19 tendo sido calculadas as medidas estatísticas adequadas. 682

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56.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS No QuALiSMental é apresentada uma vinheta com um jovem (designado de Jorge) que vive uma situação de consumo abusivo de álcool, de acordo com os critérios de diagnóstico de abuso de álcool da DSM-IV-TR, e a quem os adolescentes e jovens deveriam imaginá-lo como seu amigo próximo, sendo de seguida elaboradas questões referentes a cada componente do conceito de literacia em saúde mental. O questionário contém uma questão referente à intenção de prestação de ajuda, com o formato de resposta tipo Likert, de 1 a 5 pontos (1 “nada confiante” e 5 “muitíssimo confiante”). A média de resposta obtida foi de 3,20 pontos (desvio-padrão de 0,98 valores) correspondendo ao nível de confiança moderado. Em termos de distribuições percentuais das respostas observa-se (tabela 1) que 50,2% se sente confiante, 24,4% se sente muito confiante e 14,1% se sente muitíssimo confiante para prestar ajuda a um amigo.

Tabela 1 - Distribuição percentual das respostas da intenção de prestação de ajuda Em que medida te sentes confiante para ajudar o Jorge? Resposta (%) Muitíssimo Confiante

14,1%

Muito Confiante

24,4%

Confiante

50,2%

Pouco confiante

9,9%

Nada confiante

1,4%

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683


Em relação às barreiras percebidas na procura de ajuda (tabela 2), verificamos que o que se constitui como maiores impedimentos à procura de ajuda são: “pensar que a outra pessoa fica com uma opinião negativa sobre si” (63,8%); “pensar que a pessoa possa vir a pensar sobre si” (48,9%); “pensar que a pessoa possa vir a contar a outras pessoas” (46,2%); e a pessoa “ser tímida ou sentir vergonha” (44,3%).

Tabela 2 - Distribuição percentual das respostas às barreiras percebidas à procura de ajuda O que te poderia impedir de pedir ajuda a essa(s) pessoa(s)?

Resposta (%) 63,8%

5.1. Pensar que a pessoa fica com uma opinião negativa sobre mim.

32,4%

5.2. Pensar que a pessoa não valoriza o que eu digo.

46,2%

5.3. Pensar que a pessoa possa vir a contar a outras pessoas.

48,9%

5.4. Pensar o que a pessoa possa vir a pensar sobre mim.

32,7%

5.5. Pensar que nada me poderá ajudar.

12,1%

5.6. Pensar que se poderá saber que estou a ter ajuda de um profissional de saúde. 5.7. Pensar que poderei ter dificuldades em aceder a essa pessoa/profissional de saúde.

11,5%

5.8. Pensar que o tratamento tem efeitos secundários. 5.9. Ser muito tímido, sentir vergonha.

20,5% 44,3%

56.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Dos estudos publicados sobre a temática da intenção de prestação de ajuda e as barreiras percebidas na procura de ajuda perante uma situação de consumo 684

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excessivo de álcool, verificamos que os dados obtidos na amostra portuguesa não se distanciam dos resultados encontrados. Independentemente da desejabilidade social das respostas à questão “em que medida te sentes confiante para ajudar?”, estes resultados sugerem que os adolescentes e jovens portugueses têm confiança para prestar ajuda, ainda que não se saiba o alcance e o domínio da ajuda a prestar. Relativamente às barreiras percebidas para a procura de ajuda, as barreiras identificadas noutros estudos são: Desaprovação social (Schober e Annis, 1996); Vergonha ou embaraço/timidez pessoal (Schober e Annis, 1996; Saunders, Zygowicz e Angelo, 2005; Jorm, Wright e Morgan, 2007b); Quebra da confidencialidade (Jorm, Wright e Morgan, 2007b); Impressão negativa da pessoa (Jorm, Wright e Morgan, 2007b); Esperar que o problema se resolva por si mesmo (Saunders, Zygowicz e Angelo, 2005); Acreditar que sou capaz de lidar com o problema sozinho (Saunders, Zygowicz e Angelo, 2005). Os resultados no nosso estudo apontam para questões de confidencialidade e anonimato como entraves sérios à procura de ajuda, o que sugere uma visão estigmatizante e discriminatória destas perturbações. No caso do consumo excessivo de álcool estes resultados tornam-se ainda mais relevantes pelo facto de existir em simultâneo um incentivo e aceitação generalizada do consumo em ambientes recreativos. As intervenções não devem centrar-se exclusivamente no não consumo de álcool, mas sim no consumo responsável por parte desta população de risco.

56.5. CONCLUSÕES As barreiras percebidas à procura de ajuda e a intenção de prestar ajuda a um amigo condicionam o comportamento que os adolescentes e jovens tem perante um problema de saúde mental. As crenças desta população poderão ser modificadas através da promoção da literacia em saúde, o que realça o trabalho E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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desenvolvido pelo Projeto Educação e Sensibilização para a Saúde Mental: Um Programa de Intervenção com base na Escola para Adolescentes e Jovens. O aumento da literacia em saúde mental nos adolescentes e jovens portugueses vai permitir a “quebra” das barreiras percebidas à procura de ajuda, que em conjunto com o aumento da intenção de prestar ajuda a um amigo, levando consequentemente a um aumento da procura de cuidados de saúde mental por parte desta população.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Associação Americana de Psiquiatria (2006). DSM-IV-TR : manual de diagnóstico e estatística das perturbações mentais. Lisboa: Climepsi. Direcção Geral de Saúde. (2002). Relatório Mundial de Saúde. Saúde Mental: nova concepção, nova esperança. Lisboa. Jorm A. (2000) Mental Health Literacy: Public Knowledge and beliefs about mental disorders. British Journal of psychiatry, 177, 396-401. Jorm A., Wright A., Morgan A. (2007a) Beliefs about appropriate first aid for young people with mental disorders: findings from Australian national survey of young and parents. Early Intervention in Psychiatry, 1, 61–70. Jorm A., Wright A., Morgan A. (2007b) Where to seek help for a mental disorder? National survey of the beliefs of Australian youth and their parents. Medical Journal of Australian, 187 (10), 556-560. ISSN: 0025729X Loureiro L., Mendes A., Barroso T., Santos J., Oliveira R., Ferreira R. (2012) Literacia em saúde mental de adolescentes e jovens: conceitos e desafios. Revista de Enfermagem Referência, III (6), 157-166. Loureiro L., Pedreiro A., Correia S. (2012) Tradução, Adaptação e Validação de um Questionário de Avaliação da Literacia em Saúde Mental (QuALiSMental) para adolescentes e jovens portugueses a partir de um focus group. Revista Investigação em Enfermagem, 42-48. Ministério da Saúde. Coordenação Nacional para a Saúde Mental. (2008) Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016: Resumo executivo. Lisboa.

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Rickwood, D.; Deane, F.; Wilson, C.; Ciarrochi, J. (2005) Young people’s help-seeking for mental health problems. Australian e-Journal for the Advancement of Mental Health, 4 (3), Suplement, 1-34. ISSN: 14467984. Saunders S., Zygowicz K., Angelo B. (2005) Person-related and treatment-related barriers to alcohol treatment. Journal of Substance Abuse Treatment, 30, 261-270. Schober R., Annis H. (1996) Barriers to help-seeking for change in drinking: a gender-focused review of the literature. Addictive Behaviors, 21 (I), 81-92. Sheffield, J. K., Fiorenza, E., Sfronoff, K. (2004) Adolescents’ willingness to seek psychological help: promotion and preventing factors. Journal of Youth and Adolescence, 33 (6), 495-507. Zarcadoolas C, Pleasant A, Greer D. (2006) Advancing Health Literacy: A framework for Understanding and Action. San Francisco: Jossey-Bass.

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57. O ABUSO DE ÁLCOOL E A PROCURA DE AJUDA EM ADOLESCENTES E JOVENS PORTUGUESES Luís Manuel de Jesus Loureiro*; Teresa Maria Barroso**; Catarina Sofia Sousa***; Ana Teresa Martins Pedreiro****

*ESEnfC | luisloureiro@esenfc.pt | 918096250 **ESEnfC | tbarroso@esenfc.pt | 967214649 ***UICISA: E, ESEnfC| cfsousa@esenfc.pt | 968542253 ****UICISA: E, ESEnfC| apedreiro@esenfc.pt | 918416631

RESUMO Nos últimos anos, verificou-se um aumento significativo das perturbações mentais entre os adolescentes e jovens, sendo de realçar o consumo excessivo e mesmo abusivo de álcool. A literacia em saúde mental permite aos indivíduos a aquisição de competências para reconhecer e gerir uma situação de doença/problema mental, sendo o conhecimento e crenças acerca da ajuda profissional disponível uma das suas dimensões. Este estudo descritivo-exploratório foi realizado a partir de uma amostra de 4938 adolescentes e jovens da região centro de Portugal, tendo sido aplicado como instrumento de colheita de dados o QuALiSMental (Loureiro, Pedreiro & Correia, 2012). Apesar de o abuso de álcool ser das situações mais reconhecidas pelos adolescentes e jovens, estes não especificam um grupo profissional ou pessoa para os ajudar nessa situação. Sobressai a necessidade dos profissionais de saúde se aproximarem dos adolescentes e jovens uma vez que estes os 688

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reconhecem como úteis. Por outro lado, os amigos ao serem os mais referidos necessitam de competências para conseguirem adequadamente prestar ajuda e aconselhar a ida ao profissional.

Palavras-chave: Abuso de álcool; Literacia em Saúde Mental; Saúde Mental; Procura de ajuda

57.1. INTRODUÇÃO Portugal é um país onde o consumo de álcool é aceite muito devido a fatores culturais e históricos que rodam em torno da produção de vinho e toda a sua tradição. Raramente o consumo abusivo de álcool é visto como uma doença mental apesar de todas as consequências físicas, sociais e de outra ordem que isso pode vir a trazer. O consumo de álcool inicia-se cada vez mais cedo e os adolescentes e jovens assumem este consumo como algo que faz parte da sua vida social, apesar de todas as campanhas já realizadas neste âmbito, mantêm-se comportamentos de risco, não valorizando as consequências que estes acarretam e as implicações na vida futura. Neste sentido, é importante incrementar a literacia em saúde mental destes jovens que se traduz no reconhecimento das perturbações bem como na escolha da ajuda profissional que pode ser útil numa situação de doença mental. O conceito de literacia em saúde mental foi introduzido por Jorm et al. em 1997, definindo-o como o conhecimento e crenças acerca das perturbações mentais desde o reconhecimento e gestão até à prevenção das mesmas (Jorm, 2000). Este conhecimento traduz-se numa maior probabilidade de os jovens acederem às fontes de ajuda corretas, o que implica um conhecimento virado para a ação.

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A procura de ajuda é um processo complexo que envolve mais do que experienciar os problemas/perturbações mentais e procurar ajuda, este é influenciado pelos determinantes individuais e estruturais (Rickwood et al., 2007). A ajuda pode ser procurada a partir de diferentes fontes informais e formais. As fontes informais incluem os amigos, a família ou outras relações sociais informais. As fontes formais dizem respeito a fontes profissionais de ajuda como profissionais de saúde e professores (Rickwood et al., 2005). A procura destes profissionais está associada muitas vezes ao estigma o que faz com que as fontes de ajuda disponíveis na internet sejam cada vez mais procuradas. O Projeto Educação e Sensibilização para a Saúde Mental: Um Programa de Intervenção com base na Escola para Adolescentes e Jovens (PTDC/CPECED/112546/2009)1 avaliou numa primeira fase a literacia em saúde mental dos adolescentes e jovens portugueses. Neste artigo, analisamos os dados relativos à componente do conceito de literacia em saúde mental designada de conhecimentos e crenças sobre ajuda profissional disponível da vinheta representativa do abuso de álcool.

57.2. METODOLOGIA Este estudo descritivo-exploratório foi realizado com adolescentes e jovens da região centro de Portugal Continental a frequentar o 3º ciclo do ensino básico,

1

Projeto inscrito na Unidade de Investigação em Ciências da Saúde - Enfermagem (UICISA-E) da Escola

Superior de Enfermagem de Coimbra (ESEnfC), financiado por fundos nacionais através da FCT/MCTES (PIDDAC) e cofinanciado pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) através do COMPETE – Programa Operacional Fatores de Competitividade (POFC) do QREN.

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ensino secundário (10º, 11º e 12º ano) e primeiro ano do ensino superior de cursos da área da saúde com idades compreendidas entre os 14 e os 24 anos (média=16,75 anos; desvio padrão=1,62 anos), no período compreendido entre Outubro 2011 e Maio 2012. A constituição da amostra (N=4938) probabilística foi feita por método de conglomerados na região centro de Portugal Continental de forma a obter uma representatividade dos adolescentes e jovens desta região. Para a correcta avaliação da literacia em saúde mental foi aplicado o quesionário de avaliação da literacia em saúde mental QuALiSMental. Este questionário tem por base a versão australiana do Survey of Mental Health Literacy in Young People (em itálico) traduzida, adaptada e autorizada para a população portuguesa (Loureiro et al., 2012). Inicia-se com questões relativas aos dados sociodemográficos, seguindo-se três vinhetas que ilustram casos fictícios de adolescentes com depressão, psicose (esquizofrenia) e abuso de álcool. Por último, tem uma secção específica para a colheita de dados relativos à informação com a qual os adolescentes e jovens tiveram contacto no último ano e o Inventário de Crenças sobre as Doenças Mentais – versão breve. Este instrumento demorou em média 40 minutos a ser preenchido. Para a aplicação do instrumento QuALiSMental nas escolas foi necessário a autorização dos Serviços de Inovação Educativa do Ministério da Educação (processo n.º 0252500001) e a aprovação da Comissão de Ética da UICISA-E (parecer_p58_112011). Este questionário foi aplicado em contexto de sala de aula com supervisão de membros da equipa do projeto e a presença de um professor da turma. Cada uma das vinhetas apresenta questões relativas a: reconhecimento da perturbação; pedido de ajuda (e barreiras); prestação de ajuda; reconhecimento da ajuda profissional; comportamentos de risco/fatores protetores; estigma social

e

preconceito;

familiaridade

com

a

perturbação;

fontes

de

conhecimento/informação (Loureiro et al., 2012). Das dimensões do conceito de literacia selecionámos as questões relativas ao conhecimento e crenças acerca da ajuda profissional disponível (Jorm, 2000). E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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No questionário correspondem às questões relativas ao reconhecimento da ajuda profissional na vinheta representativa de um caso de abuso de álcool que era a seguinte: “ O Jorge é um jovem de 16 anos que frequenta o 11º ano de escolaridade. No último ano começou a beber bebidas alcoólicas e embriagou-se em todas as festas/convívios a que foi. Os pais andam preocupados porque o Jorge tem vindo a diminuir o seu rendimento escolar, faltando às aulas devido às ressacas, e tendo inclusive os pais sido chamados à escola por ter aparecido embriagado a uma aula. Na última festa, os amigos chamaram o 112 pois ele estava inconsciente”. A questão estudada foi: “Existem pessoas e profissionais de saúde que poderão ajudar o Jorge. Assinala para cada um a tua opinião”. Perante as opções disponíveis (médico de família, professor, psicólogo, enfermeiro, assistente social, psiquiatra, serviço telefónico de aconselhamento, familiar próximo, amigo significativo, resolver os problemas sozinho) o estudante deveria classificá-las como “útil”, “prejudicial” e “nem uma coisa nem outra”. Todos os dados foram inseridos no IBM-SPSS (versão 20) constituindo uma base de dados com 4939 casos, sendo posteriormente analisadas as variáveis relativas às questões selecionadas. A confidencialidade e anonimato dos dados foram garantidos ao longo de todo o processo.

57.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS O abuso de álcool em relação a outras situações como a esquizofrenia e a depressão é a situação mais reconhecida pelos adolescentes e jovens. No entanto, os adolescentes não especificam um grupo profissional ou pessoa para os ajudar numa situação de abuso de álcool. Com percentagens semelhantes os mais nomeados foram um amigo significativo (16,6%), médico de família (15,9%), psicólogo (15,7%), familiar próximo (15,3%) e enfermeiro (11,1%). É elevada a percentagem dos que consideram que é prejudicial resolverem sozinhos os seus 692

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problemas (48,3%) sendo um resultado que favorece a procura de ajuda junto de outra entidade, seja ela formal ou informal. No que diz respeito aos que não consideram nem útil nem prejudicial referem o assistente social (18,2%), o profess professor or (15,7%), o serviço telefónico de aconselhamento (15,4%), o psiquiatra (12,4 %) e o enfermeiro (10,9%).

Gráfico 1 – Distribuição percentual das pessoas/profissionais de saúde que podem ajudar numa situação de abuso de álcool segundo os adolescentes e jo jovens (14-24 24 anos) a frequentar o ensino secundário e o primeiro ano do ensino superior da Região Centro de Portugal Continental 60% 50% 40% 30% 20% 10%

Útil Prejudicial Nemumacoisanemoutra

0%

57.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Ao avaliar a literacia em saúde mental com um instrumento validado e adequado planeiam-se se melhor as intervenções neste âmbito. Os resultados mostram que não existe nenhum tipo de ajuda profissional que se distinga, revelando que os profissionais se devem a aproximar proximar deste grupo etário ou que deve ser melhorada a acessibilidade aos mesmos. O aumento dos níveis de literacia é necessário, principalmente nos adolescentes e jovens, uma vez que esta é a idade crítica para o aparecimento de doenças mentais, com metade meta das E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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pessoas que virão a sofrer de uma doença mental a experienciar o seu primeiro episódio antes dos 18 anos de idade (Kelly et al., 2011). Uma ajuda adequada e procurada precocemente pode prevenir complicações que possam advir de um problema/perturbação mental. A procura de ajuda adequada pode ainda funcionar como um mecanismo de coping (Rickwood et al., 2007). Rickwood et al. (2007) referem que o desenvolvimento na adolescência poderá levar o adolescente a acreditar que tem que resolver os seus problemas sozinho (citando Wilson, Deane & Ciarrochi, 2005) o que quando associado ao estigma existente para com a doença mental pode aumentar ainda mais a não procura de ajuda profissional. Por outro lado, na procura de ajuda para a saúde mental é necessária uma maturidade emocional que não está, muitas das vezes, presente na adolescência, principalmente nos rapazes (Rickwood et al., 2005). Apesar de os adolescentes passarem a maior parte do seu tempo na escola apenas 5,7% refere os professores como úteis numa situação de abuso de álcool, o que pode estar relacionado com a relação existente entre estes e os adolescentes ou com a sua confidencialidade. Contudo, a escola é o local ideal para o desenvolvimento de ações que se realizem com o intuito de aproximar os recursos de ajuda profissional aos adolescentes, uma vez que é onde estes passam a maior parte do seu tempo (Rickwood et al., 2007). Desta forma seria benéfica uma aproximação dos profissionais de saúde às escolas. Por outro lado, no que diz respeito aos serviços de saúde mental esta aproximação poderia melhorar a visão negativa que por vezes existe. A nomeação da família no grupo dos mais referidos como úteis na procura de ajuda pode ser explicada pela perceção que os adolescentes têm da mesma como sendo o mais importante para eles. Com o avançar da idade quem ocupa este lugar são os amigos (Rickwood et al., 2007; Jorm, Wright & Morgan, 2007). Por outro lado, os adolescentes e jovens dão preferência às ajudas informais (Rickwood et al., 2007).

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A falta de confidencialidade é uma das barreiras da procura de ajuda no caso de abuso de álcool (Rickwood et al., 2007). As experiências passadas também têm influência na procura de ajuda, uma vez que se o indivíduo teve uma experiência positiva com a ajuda profissional que contactou terá uma maior probabilidade de contactar este tipo de ajuda numa situação futura (Rickwood et al., 2005). Do grupo dos profissionais de saúde, os psiquiatras são aqueles que os adolescentes e jovens consideram mais prejudicial numa situação de abuso de álcool (6,8%), sendo considerado útil apenas por 9,2% da amostra. Assim, ainda existe estigma associado a estes profissionais de saúde que leva à não procura de ajuda junto destes, vistos como não sendo úteis nem prejudiciais por 12,4% da amostra.

57.5. CONCLUSÕES Tendo em conta o objetivo da realização deste trabalho concluímos que os adolescentes e jovens preferem o tipo de ajuda informal à formal sendo os amigos os mais referidos. Este dado revela o papel influente que os pares têm na adolescência e demonstra a necessidade de aumentar os níveis de literacia destes para acederem aos serviços de saúde. Por outro lado, os dados referentes às ajudas formais são discretos o que não as destaca das informais. Assim surge a necessidade de aproximar os serviços de saúde dos adolescentes e jovens diminuindo inúmeras barreiras à procura de ajuda. A escola apresenta-se como o local de eleição para se dar esta aproximação visando: conhecer os serviços de saúde; conhecer os profissionais que o podem ajudar e quais os recursos existente. Estas ações também devem combater o estigma associado à doença mental. Ao não incluir apenas os profissionais de saúde na ajuda formal e sendo a escola o local onde os adolescentes e jovens passam a maior parte do seu tempo E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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é necessário que os estudantes vejam os profissionais de educação como alguém a quem podem recorrer. No entanto, estes têm de ser capacitados para dar apoio em situações de doença mental, bem como orientá-los para os serviços adequados. Da análise e discussão dos resultados verifica-se a necessidade de uma abordagem multidisciplinar nas escolas tendo em vista ganhos em saúde através do aumento dos níveis de literacia. Esta é uma intervenção de primeiro nível que implica a união de vários profissionais, da família e das escolas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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58. IMPLEMENTAÇÃO DO SISTEMA DE GESTÃO DA QUALIDADE DO INSTITUTO SÃO JOÃO DE DEUS NA CASA DE SAÚDE DO TELHAL – CLÍNICA DE ALCOOLOGIA NOVO RUMO Jorge Cravidão *Enfermeiro Coordenador da Clínica de Alcoologia Novo Rumo – Casa de Saúde do Telhal – Instituto S. João de Deus; Enf Especialista em Enf Saúde Mental e Psiquiatria; Mestre em Comportamentos de Dependência e seus Tratamentos; Doutorando em Enfermagem – jorge.cravidao@isjd.pt

RESUMO Este artigo pretende descrever a implementação do Sistema de Gestão da Qualidade (SGQ) do Instituto S. João de Deus (ISJD) na Clínica de Alcoologia Novo Rumo da Casa de Saúde do Telhal e apresentar resultados decorrentes da referida implementação. O SGQ do ISJD teve por base o referencial EQUASS Assurance.

Palavras-chave: EQUASS; Alcoologia; Qualidade; Sistema de Gestão da Qualidade

ABSTRACT This paper describes the implementation of the Quality Management System (SGQ) of the Instituto S. João de Deus (ISJD) at Clínica de Alcoologia Novo Rumo of Casa de Saúde do Telhal and it presents results arising from such implementation. The SGQ of ISJD was based on EQUASS Assurance.

Keywords: EQUASS; Alcoholism Recovery; Quality, Quality Management System 698

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O Instituto S. João de Deus é uma Instituição Particular de Solidariedade Social que foi criada para proceder à gestão hospitalar dos Estabelecimentos Hospitalares da Província Portuguesa da Ordem Hospitaleira. A atuação do Instituto S. João de Deus é de âmbito nacional, prosseguindo fins de saúde, assistência, reabilitação e reinserção social nos seus 8 Estabelecimentos Hospitalares/Centros Assistenciais. De forma a garantir a melhoria contínua do desempenho do Instituto S. João de Deus foi aprovado pela sua Direção um Manual da Qualidade (Instituto S. João de Deus, 2010) – revisto anualmente – e um conjunto de Políticas que tiveram por base o referencial EQUASS Assurance. O EQUASS - European Quality in Social Services é uma iniciativa da EPR Plataforma Europeia de Reabilitação, que disponibiliza um conjunto abrangente de serviços na área do desenvolvimento, promoção, aprovação e certificação da qualidade, todos eles em conformidade com os requisitos Europeus para a qualidade da prestação dos Serviços Sociais. Tem como objetivo melhorar o setor dos serviços sociais através do compromisso dos prestadores de serviços com a qualidade e a melhoria contínua, e pela garantia de serviços de qualidade aos seus clientes (utentes/ pessoas servidas/ utilizadores) em toda a Europa. (European Quality in Social Services, 2012). A Certificação da Qualidade dos Serviços Sociais (EQUASS Assurance) é um programa de certificação para garantia da qualidade e controlo de qualidade nos serviços sociais, cujos elementos básicos são: (1) Identificação das necessidades e expectativas dos clientes; (2) Gestão dos processos; (3) Gestão das responsabilidades; (4) Gestão dos recursos; (5) Medição e análise de dados; (6) Satisfação dos clientes; e (7) Sistema de melhoria contínua (European Quality in Social Services, 2012).

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O referencial assenta nos seguintes princípios: (P1) LIDERANÇA: sendo avaliada a boa governação interna, assim como o impacto na sociedade; (P2) RECURSOS HUMANOS: abrangendo a gestão dos colaboradores, o seu desempenho e o seu enfoque numa prestação de serviços centrada no utente; (P3) DIREITOS: na defesa intransigente dos direitos dos utentes, igualdade de oportunidades,

igualdade

de

tratamento

e

liberdade

de

escolha,

autodeterminação e participação equitativa; (P4) ÉTICA: Código de Ética que respeita a dignidade dos utentes, suas famílias e cuidadores, protegendo-os de riscos indevidos; (P5) PARCERIAS: assegurando uma trabalho em rede e um contínuo de serviços; (P6) PARTICIPAÇÃO: assegurando a participação ativa dos utentes desde a concepção à avaliação dos serviços – cultura de empowerment; (P7) ABORDAGEM CENTRADA NOS CLIENTES: na melhoria da qualidade de vida dos utentes, com planeamento de intervenção individualizada, partindo das necessidades e expectativas do utente; (P8) ABRANGÊNCIA: uma abordagem holística e com uma gestão por processos; (P9) ORIENTAÇÃO PARA OS RESULTADOS: tanto em termos de como eles são percebidos, nos resultados alcançados, e que benefícios proporcionam a todos os envolvidos; (P10) MELHORIA CONTÍNUA: na proatividade da busca continua de melhores e renovadas soluções, de melhoria da qualidade, dos serviços e respostas às expectativas da sociedade. (European Quality in Social Services, 2012) Tendo por base o EQUASS e comprometido com o princípio de “fazer bem o bem”, o ISJD definiu um SGQ com uma série de objetivos, das quais destaco: Melhorar o desempenho da Instituição, para melhor servir os clientes; Promover a autonomia dos clientes; Atualizar permanentemente as competências dos colaboradores; Promover a hospitalidade, traduzida nomeadamente numa conduta humanizadora do trato e do cuidar; Garantir sustentabilidade; Solidificar e promover relações de parceria consistentes. Entende-se por SGQ um conjunto de processos inter-relacionados e interactuantes, de forma a permitir a compreensão das suas interações e a determinação do seu desempenho, através

700

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da monitorização contínua de um mapa de indicadores adequados (Instituto S. João de Deus, 2010). No âmbito do processo de Certificação da Qualidade do ISJD a Casa de Saúde do Telhal, enquanto Estabelecimento Hospitalar da referida instituição, propôs a certificação dos serviços de Reabilitação Psicossocial e da Clínica de Alcoologia Novo Rumo (CANR). Neste contexto os elementos da equipa transdisciplinar da CANR, em colaboração com o Responsável Local da Qualidade (RLQ) e com o Gestor da Qualidade (GQ), colaboraram na definição do processo “Problemas Ligados ao Álcool” e do procedimento “Internamento em Alcoologia”, assim como de todos os documentos associados. A Clínica de Alcoologia Novo Rumo – Casa de Saúde do Telhal – tem por objetivo a recuperação do doente alcoólico de ambos os sexos e de qualquer área de residência, não possuindo um setor geodemográfico pré-defenido. A recuperação visa a manutenção da abstinência/ prevenção da recaída e parte de um modelo teórico integrador, bio-psico-socio-espiritual, assumindo como referência o Modelo Minnesota. O internamento tem a duração de 4 semanas, podendo prolongar-se até às 6 semanas em casos excecionais. O programa de recuperação em internamento é dinamizado por uma equipa terapêutica transdisciplinar, sendo constituída por enfermeiros, psiquiatras, psicólogos, terapeuta ocupacional, assistente social, auxiliares e clínico geral, e inclui sessões psicoeducativas ao doente e/ou à sua família; treinos de afirmação pessoal (assertividade); treinos de relaxamento; planeamento ocupacional, biblioterapia e treino de prevenção de recaída, entre outros. Os grupos autoajuda de Alcoólicos Anónimos (AA) e de Al-Anon integram e colaboram, no seu âmbito próprio, com a equipa terapêutica, bem como a equipa da Pastoral de Saúde, Animação e Voluntariado. Ao nível da intervenção terapêutica na CANR foram definidos circuitos que nos ajudam a garantir a consecução dos objetivos definidos. Definiu-se que os utentes, após a admissão na CANR, são avaliados clinicamente e através de dois E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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questionários: a SF-36 – avaliação da qualidade de vida percebida – e o URICA – avaliação da motivação para a mudança. Estes dados servirão para definir os objetivos do Plano Individual de Intervenção (PII) que será formulado de acordo com a expectativa do utente para o internamento. O PII funcionará como documento orientador da intervenção da equipa transdisciplinar com o utente, de forma a orientá-lo para a maior autonomia e autodeterminação possíveis.No final do internamento estas escalas de avaliação são aplicadas novamente para se perceber a evolução dos utentes nas várias dimensões avaliadas. Os objetivos definidos são, portanto, mensuráveis e favorecem o empowerment do utente, tendo em vista o aumento da sua qualidade de vida. O "Medical Outcomes Study 36-Item Short-Form Health Survey” – SF-36 – (Ribeiro, 2005) é um questionário de autopreenchimento que avalia aspetos da qualidade de vida relacionada com a saúde percebida pelos utentes. Avalia 8 dimensões distintas: Funcionamento físico, Desempenho físico, Dor corporal, Saúde geral, Vitalidade, Funcionamento social, Desempenho emocional e Saúde Mental. Os itens são avaliados, dando-se um resultado para cada questão, que são posteriormente transformados numa escala de 0 a 100, em que zero é considerado o pior e 100 o melhor estado. O “University of Rhode Island Change Assessment Scale” – URICA – (McConnaughy, Prochaska, & Velicer, 1983) é um questionário que identifica os estádios de motivação e tem por base o Modelo Transteórico da Mudança. É de autopreenchimento e não necessita de treinamento prévio. Aplicado na população adulta, contém 32 perguntas divididas em quatro subescalas, as quais abrangem os seguintes estágios motivacionais de mudança comportamental: pré-contemplação, contemplação, ação e manutenção. Para cada uma das perguntas existem 5 possibilidades de resposta (1) Discorda Totalmente, (2) Discorda, (3) Indeciso, (4) Concorda, (5) Concorda Totalmente. As pontuações para cada uma das subescalas oscilam entre 8 e 40 pontos, sendo que pontuações mais elevadas traduzem uma melhor situação motivacional. 702

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O Modelo Transteórico da Mudança (MTM) tem como base uma análise comparativa de psicoterapia e modelos de mudança de comportamento, de onde provêm estádios e princípios de mudança (Prochaska & DeClemente, 1982). Segundo o MTM, a mudança comportamental não é um acontecimento em si, nem um processo contínuo, mas um processo que se desenvolve de acordo com seis estádios diferentes: (1) Pré-contemplação – nesta fase, o indivíduo não considera, nem tem nenhuma intenção de mudar o seu padrão actual de comportamento num futuro próximo. Em termos de intervenção, a tarefa será aumentar a consciência da necessidade da mudança e a preocupação acerca do padrão actual de comportamento, considerando seriamente a mudança deste comportamento. (2) Contemplação – o indivíduo tem consciência das vantagens e das desvantagens da mudança. Pela ambivalência gerada, poderá permanecer neste estádio longos períodos. Terá de se decidir, analisando os prós e os contras, os custos e os ganhos do padrão actual de comportamento. (3) Preparação – nesta fase, o indivíduo já tem a intenção de mudar, assumindo um compromisso

de

desenvolver

acções

para

mudar

o

comportamento

e

estabelecendo um plano de acção, acessível, realista e eficaz, para a mudança. (4) Acção – consiste na implementação do plano de acção por parte do indivíduo. Nesta fase, a pessoa já fez implementações claras e específicas relativamente ao seu padrão de comportamento e está a criar um novo padrão actual de comportamento por um período de tempo significativo. Face às dificuldades, é necessário manter o compromisso, implementar as estratégias de mudanças e rever o plano de acção, se necessário. (5) Manutenção – o indivíduo consegue manter o novo padrão actual de comportamento por um período extenso de tempo (de 5 meses a 6 anos), integrando-o no estilo de vida do indivíduo. Nesta fase, é notório o esforço para evitar recaídas. Durante o internamento existem ainda momentos em que os utentes têm a possibilidade de avaliar os serviços que lhe estão a ser prestados e a sugerir alterações, que são posteriormente analisadas pelo RLQ e pela equipa transdisciplinar da CANR. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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Para avaliar continuadamente o processo “Problemas Ligados ao Álcool” foram definidos os seguintes indicadores: % de objetivos Alcançados PII; % de alcance das metas PII; % de Utentes com avaliação de satisfação igual ou superior a “Satisfaz”; Taxa de ocupação; % de utentes abstinentes seis meses após alta; % de utentes abstinentes doze meses após alta. Da implementação efectuada de Abril a Agosto de 2012 verificou-se que 70% dos objetivos do PII foram alcançados; 72% das metas do PII foram atingidas; 100% de Utentes avaliaram a sua satisfação em relação ao serviço com avaliação global igual ou superior a “Satisfaz”; 74% das vagas da clínica foram ocupadas; 65% dos utentes estavam abstinentes seis meses após alta; 60% dos utentes estavam abstinentes doze meses após alta.

% de utentes abstinentes doze meses após alta

% de objectivos Alcançados PII 100% 80% 60% 40% 20% 0%

% de utentes abstinentes seis meses após alta

% de alcance das metas PII Meta Resultado % de Utentes com avaliação de satisfação igual…

Taxa de ocupação

Da aplicação do questionário SF36 verificou-se uma melhoria em todas as dimensões avaliadas, sendo que a componente física melhorou cerca de 13% e a componente mental cerca de 22%.

704

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Funcionamento físico 100,00 Saúde mental

80,00 60,00

Desempenho físico

40,00 20,00 Desempenho emocional

0,00

Funcionamento social

Dor Corporal

1ª Semana 4ª Semana

Saúde geral

Vitalidade

No que respeita à aplicação da URICA apurou-se que os utentes melhoraram as suas pontuações nas sub-escalas pré-contemplação, contemplação e acção e diminuíram o seu desempenho no que respeita à sub-escala manutenção.

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705


Pré-contemplação 5,00 4,00 3,00 2,00 Manutenção

1,00

Contemplação

1ª Semana 4ª Semana

Acção

A implementação do SGQ do ISJD na Clínica de Alcoologia Novo Rumo veio reforçar a noção de que trabalhar em equipa transdisciplinar, de forma conjunta e orientada para a necessidade e expectativa do utente, é essencial para melhorar a sua autonomia e autodeterminação, que se traduzirá em ganhos em saúde não apenas no imediato mas ganhos que se perpetuarão após a alta. A sistematização processual permitiu-nos também intensificar a discussão de casos clínicos, intervenções e ganhos terapêuticos, o que aliada à avaliação que os utentes fazem da sua qualidade de vida relacionada com a saúde, motivação e satisfação face ao serviço fornecido, nos permitiu aumentar o rigor nos registos clínicos e reflectir as práticas de forma a melhorar continuamente a assistência aos utentes. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS European Quality in Social Services. (2012). Equass Assurance - Critérios - Serviços Sociais de Interesse Geral 2012. (Associação Portuguesa para a Qualidade, Trad.) Lisboa: Associação Portuguesa para a Qualidade. Instituto S. João de Deus. (2010). Manual da Qualidade. Lisboa: Institutto S. João de Deus.

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59. CONFUSÃO AGUDA E DELIRIUM: IMPORTÂNCIA DA UTILIZAÇÃO DE INSTRUMENTOS PSICOMÉTRICOS DE DIAGNÓSTICO E/OU RASTREIO Francisco Miguel Correia Sampaio*; Carlos Alberto da Cruz Sequeira**

*Enfermeiro, Hospital de Braga – Serviço de Internamento de Psiquiatria, fmcsampaio@gmail.com **Professor Coordenador, Escola Superior de Enfermagem do Porto, carlossequeira@esenf.pt

RESUMO Contexto/Objetivos: A confusão aguda e o delirium são condições patológicas que,

frequentemente,

não

são

diagnosticadas

ou

são

diagnosticadas

erradamente. Para dar resposta a esta dificuldade foram criados instrumentos psicométricos para a sua avaliação. Assim, o objetivo do presente trabalho é analisar e refletir acerca das vantagens e desvantagens da utilização de instrumentos psicométricos de avaliação da confusão aguda e do delirium. Metodologia: revisão narrativa da literatura realizada com base em livros e artigos (com principal enfoque nos últimos cinco anos) presentes em bases de dados online. Resultados: A confusão aguda é uma condição patológica mais abrangente do que o delirium, sendo este uma entidade nosológica mais específica e que se inclui na confusão aguda. Os instrumentos psicométricos são importantes para a avaliação da confusão aguda e do delirium, destacando-se o CAM para rastreio do delirium e a Escala de Confusão NeeCham para avaliação da confusão aguda. Destacam-se ainda a Delirium Rating Scale e a Memorial Delirium Assessment Scale como bons instrumentos de avaliação do delirium.

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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Conclusões: A utilização de instrumentos psicométricos é muito importante, visto que reduz a subjetividade na avaliação da confusão aguda e do delirium, permitindo minimizar os erros e/ou défices diagnósticos a este nível.

Palavras-Chave: Confusão; Delirium; Escala; Diagnóstico.

59.1. INTRODUÇÃO A confusão aguda e o delirium constituem condições patológicas presentes, frequentemente, em contexto de internamento, sobretudo junto das pessoas idosas. Ainda que situações deste género possam ocorrer em qualquer faixa etária, torna-se clara a sua maior prevalência junto das pessoas de mais idade, sobretudo em contextos de internamento não psiquiátricos (por exemplo, em serviços de Medicina Interna ou Cirurgia Geral). Assim, o delirium pode ser definido como uma perturbação na consciência e na cognição podendo, no entanto, ser diferenciado com base nas suas possíveis etiologias: devido a uma condição médica geral (por exemplo, infeção sistémica, distúrbios metabólicos, desequilíbrios hidroeletrolíticos, doença hepática ou renal, etc.); induzido por uma substância (por exemplo, álcool – delirium tremens –, canabinóides, cocaína, opióides, benzodiazepinas, etc.); devido a múltiplas etiologias (quando o delirium apresenta mais do que uma condição médica geral etiologicamente relacionada); sem outra especificação (por exemplo, delirium por privação sensorial) (American Psychiatric Association [APA], 2002). O delirium pode ocorrer na forma hiperativa (sendo estes os doentes que os enfermeiros mais frequentemente classificam como “confusos”) (Marques, 2012), hipoativa ou mista, sendo caraterizado, sobretudo, pelo início súbito dos sintomas, curso flutuante e alteração do nível de consciência, distúrbio global da cognição ou anormalidades percetuais, e evidência de uma causa física. No entanto, esta 708

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entidade nosológica é frequentemente não identificada e até mesmo erradamente diagnosticada pelos profissionais de saúde (Martins e Fernandes, 2012). Assim, alguns autores indicam que entre um e dois terços dos casos de delirium não são identificados (Siddiqi, House & Holmes, 2006). Existe ainda um estudo recente, realizado por Han et al. (2009) num serviço de Urgência, que aponta para o não diagnóstico de delirium (pelos médicos de urgência) em 76% dos casos de delirium presente. Por outro lado, a confusão aguda trata-se de um diagnóstico de Enfermagem (contrariamente ao delirium, que é um diagnóstico médico) que pode ser definido como o início abrupto de distúrbios reversíveis ao nível da consciência, da atenção, da cognição e da perceção, que ocorrem durante um curto período de tempo (North American Nursing Diagnosis Association [NANDA] International, 2010). No entanto, não existem critérios tão precisos para o diagnóstico de confusão aguda como para o diagnóstico de delirium. O que se verifica é que os enfermeiros preferem a utilização do termo “confusão”, mas também não é certo que quando diferentes enfermeiros classificam dois doentes como confusos estejam a falar da mesma coisa, o que se justifica pelo facto de estes não estarem a utilizar um conhecimento diagnóstico preciso, mas antes critérios pessoais (Ried & Dassen, 2000) tendo por base, sobretudo, a sua experiência (Marques, 2012). Tal como é sugerido pela evidência científica, as condições acima referidas (confusão aguda e delirium) reportam, sobretudo nos seus estádios mais graves, a

emergências

médicas,

visto

que

a

sua

manifestação

representa,

frequentemente, o agravamento de distúrbios orgânicos. Como tal, torna-se indispensável a realização de um diagnóstico preciso o que, em questões ligadas ao foro mental, nem sempre é possível pela simples observação clínica. Assim, o presente trabalho tem como principal objetivo a análise e reflexão acerca da importância da utilização de instrumentos psicométricos para o diagnóstico e avaliação da confusão aguda e do delirium.

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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59.2. METODOLOGIA Para a realização do presente trabalho optou-se pela utilização de uma metodologia de revisão narrativa da literatura, com principal enfoque nos trabalhos mais recentes (entre 2008 e 2012) relativamente aos instrumentos psicométricos de diagnóstico e avaliação da confusão aguda e do delirium. Ainda assim, não se pretende analisar qual o melhor instrumento de diagnóstico e/ou de rastreio da confusão aguda e do delirium, mas antes explorar este tema e refletir acerca das vantagens e desvantagens da utilização de instrumentos psicométricos para avaliação das condições supracitadas. Será ainda dada particular atenção ao Confusion Assessment Method (CAM), instrumento mais recentemente validado para a população portuguesa para rastreio do delirium. Os dados utilizados para o presente trabalho foram obtidos através de pesquisa na biblioteca da Escola Superior de Enfermagem do Porto (ESEP), nas bases de dados CINAHL Plus® with Full Text, MEDLINE® with Full Text, MedicLatina®, Academic Search® Complete, Regional Business News®, Business Source®

Complete,

ERIC®,

Library®,

Information

Science

&

Technology

Abstracts®, SPORTDiscus® with Full Text, Psychology and Behavioral Sciences Collection®, Cochrane Central Register of Controlled Trials®, Database of Abstracts of Reviews of Effects®, Cochrane Database of Systematic Reviews®, NHS Economic Evaluation Database®, Health Technology Assessments®, Cochrane Methodology Register®, e em artigos científicos disponíveis no Google Scholar®.

59.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS Ainda antes de se partir para a exploração e análise dos instrumentos psicométricos de rastreio e/ou diagnóstico da confusão aguda e do delirium 710

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importa analisar estes conceitos, ou seja, perceber o seu diagnóstico diferencial. Esta questão apresenta relevância neste contexto visto que, sem se perceber o diagnóstico diferencial, existe o risco de utilizar um instrumento psicométrico para avaliar o delirium quando este, na realidade, apenas permite a avaliação da confusão aguda. Assim, e ainda que a maior parte dos autores e dos profissionais de saúde usem os termos “confusão aguda”, “estado confusional agudo” e “delirium” indistintamente, para descrever um tipo específico de perturbação cognitiva e/ou de consciência (Marques, 2012), o Iowa Veterans Affairs Nursing Research Consortium (IVANRC) (cit. por Rapp et al., 2000) apresenta uma perspetiva em que é defendido que a confusão aguda é um diagnóstico que inclui o delirium. Ou seja, reconhecendo-se que os critérios para o delirium são mais específicos, estritos e rígidos, entende-se que todos os doentes com delirium estarão também com confusão aguda, mas o contrário não se verifica. Portanto, em termos práticos, os enfermeiros identificarão, em primeiro lugar, a confusão aguda, antes de estarem cumpridos os requisitos de delirium. Chang (2002) veio ainda acrescentar a esta hipótese uma questão interessante, para a qual ainda não existe resposta: será que a “confusão” representa um “pré-delirium” que poderá, a posteriori, evoluir para delirium, ou “inquietação terminal”? No que concerne aos instrumentos psicométricos de avaliação da confusão aguda e do delirium verifica-se, desde logo, na literatura consultada, uma abordagem que torna algo complexa a análise a realizar. Assim, verifica-se o uso indiscriminado dos termos “confusão aguda” e “delirium”, o que pode conduzir a algum défice de rigor na análise, visto que pode ser realizada a referência, por exemplo, a um instrumento de avaliação da confusão aguda e do delirium quando este, na realidade, apenas permite a avaliação da confusão aguda ou do delirium (portanto, de apenas uma das condições em estudo). Contrariamente ao que se verifica em outros focos que afetam as pessoas e que os enfermeiros diagnosticam, e onde impera a objetividade, a confusão E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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aguda é uma condição em que predomina a subjetividade, a falta de linearidade, pelo que é mais difícil a sua identificação precisa (Marques, 2012). No que concerne ao delirium, a questão mantém alguma complexidade mas, ainda assim, a sua avaliação apresenta um pouco mais de objetividade, fruto do trabalho empreendido pela APA (2002) no desenvolvimento do Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM)-IV-TR®. Da revisão bibliográfica realizada ressalvam-se, sobretudo, três trabalhos. O primeiro foi realizado em 2000, por Rapp et al., tendo este sido dedicado ao estudo dos instrumentos de avaliação da confusão aguda (considerando os autores que a confusão aguda se tratava de um fenómeno mais geral, no qual estaria

incluído

o

delirium).

Baseando-se

a

seleção

dos

instrumentos

psicométricos na frequência da sua utilização e na sua disponibilidade, os autores identificaram cinco instrumentos psicométricos que permitiriam a avaliação da confusão aguda: CAM; Delirium Rating Scale (DRS); Delirium Symptom Inventory (DSI); Mini-Mental State Examination (MMSE); Escala de Confusão NeeCham. Desta análise, os autores destacaram a Escala de Confusão NeeCham, considerando que esta foi desenhada, especificamente, para avaliar a confusão aguda, permitindo aceder a dados que os outros instrumentos não eram capazes de obter (em específico, a identificação de doentes “em risco” ou “com confusão aguda ligeira”, estádios não identificáveis através da utilização dos outros instrumentos analisados). Neves, Silva e Marques (2011) realizaram um trabalho de tradução e adaptação cultural da Escala de Confusão NeeCham para Portugal, confirmando as boas indicações acerca das propriedades psicométricas do instrumento (α Cronbach=0,913) e sugerindo a utilização do instrumento se associada a formação relativamente ao fenómeno (confusão aguda). Já em 2010, Adamis, Sharma, Whelan e MacDonald realizaram uma revisão sistemática da literatura relativamente aos instrumentos psicométricos de avaliação do delirium (entidade nosológica mais específica do que a confusão aguda). Os autores referem que os investigadores têm verificado falhas ao nível 712

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


de uma aproximação categórica ao diagnóstico de delirium, pelo que se revela importante a utilização de instrumentos de diagnóstico e/ou rastreio. Partindo da análise de um número alargado de instrumentos, os autores concluíram que, considerando os testes realizados às suas propriedades psicométricas, os instrumentos mais robustos e facilmente utilizáveis são: o CAM; a DRS; a Memorial Delirium Assessment Scale (MDAS); a Escala de Confusão NeeCham. Assim, enquanto o CAM é apresentado como um excelente instrumento de diagnóstico (ainda que a sua principal autora refira que este deve ser utilizado para efeitos de rastreio) (Inouye, 2003), a DRS (e a sua revisão) e a MDAS são consideradas bons instrumentos de medida da gravidade dos sintomas, sendo a Escala de Confusão NeeCham apresentada como um bom instrumento de rastreio. Neste estudo, em particular, os autores referiram ter realizado uma análise de instrumentos de avaliação do delirium mas, na verdade, e analisando os instrumentos alvo do estudo, verifica-se que foram, igualmente, incluídos instrumentos de avaliação da confusão aguda (como é o caso da Escala de Confusão NeeCham). Finalmente, e ainda em 2010, Wong, Holroyd-Leduc, Simel e Straus realizaram uma revisão sistemática da literatura relativamente à evidência da eficácia dos instrumentos de diagnóstico do delirium em adultos. Neste caso, os autores referem que o delirium, ainda que seja sinónimo de maior risco de morte e admissão para cuidados de longa duração, continua a ser pouco identificado pelos médicos, pelo que a utilização de instrumentos de diagnóstico poderia significar importantes melhorias a este nível. Tendo em consideração a facilidade de utilização do instrumento, os testes de desempenho, e a importância clínica da heterogeneidade nos intervalos de confiança dos likelihood ratios, o CAM foi apontado como sendo o instrumento ideal (assumindo-se, ainda assim, que a escolha do instrumento deve ser ditada, sobretudo, pelo tempo disponível para a sua aplicação e pela disciplina do avaliador). Sampaio (2012) realizou um trabalho de tradução e validação do CAM para a população portuguesa, confirmando as boas propriedades psicométricas do instrumento (sobretudo ao E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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nível da especificidade, valor preditivo negativo, likelihood ratios e concordância entre observadores), mas confirmando a importância da formação dos avaliadores antes de se passar à sua utilização (visto que, sem esta, os valores de sensibilidade obtidos podem ser algo pobres, sobretudo quando o instrumento é utilizado por enfermeiros).

59.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS A literatura, embora não seja unânime na definição dos termos “confusão aguda” e “delirium”, é perfeitamente consensual no que concerne à utilização de instrumentos psicométricos de diagnóstico e/ou rastreio das condições referidas. Assim, no que se refere à definição de conceitos, embora a análise realizada pelos mais variados autores seja, frequentemente, indiscriminada (sobretudo pelo facto de os trabalhos realizados terem como autores profissionais da Medicina, em que o termo “confusão aguda” não é encarado como um diagnóstico), verifica-se que a reflexão realizada por Rapp et al. (2000), numa perspetiva centrada na Enfermagem, apresenta bastante relevância, considerando que o delirium se trata de um diagnóstico médico mais específico, que se inclui dentro de um diagnóstico de Enfermagem mais geral: a confusão aguda. Os resultados do estudo realizado por Sampaio (2012) vão ainda de encontro a outros trabalhos (Rapp, 2001, cit. por Marques, 2012), que apontam para o delirium como um possível estádio terminal da confusão aguda. Relativamente aos instrumentos psicométricos de diagnóstico e/ou rastreio da confusão aguda e do delirium, a literatura é unânime ao afirmar a relevância da sua utilização, sobretudo por se tratarem de condições cuja avaliação é altamente subjetiva (Marques, 2012). Assim, os instrumentos psicométricos são encarados como uma forma de objetivar algo que é dificilmente avaliável através de uma simples observação clínica, bem como um meio importante para conduzir à diminuição de erros ou “omissões” de diagnóstico de condições patológicas (confusão aguda e delirium) que se constituem como emergências médicas, ou 714

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seja, cuja deteção implica a necessidade urgente de uma intervenção médica (ao nível físico, e não mental, já que as condições patológicas referidas ocorrem em caso de distúrbio orgânico, com repercussões a nível mental). A literatura consultada aponta para a Escala de Confusão NeeCham como o instrumento de eleição para a avaliação da confusão aguda (permitindo classificar a mesma em níveis de gravidade) e para o CAM como instrumento de eleição para o diagnóstico de delirium. Os resultados obtidos vão de encontro aos achados do estudo realizado por Sampaio (2012), que aponta para a relevância do CAM como instrumento de rastreio de delirium (e não de diagnóstico, seguindo a sugestão dada pela autora principal do CAM) (Inouye, 2003) e da Escala de Confusão NeeCham como o instrumento ideal para a avaliação da confusão aguda (corroborando o estudo realizado por Neves, Silva e Marques, 2012).

59.5. CONCLUSÕES O presente trabalho, dando resposta ao objetivo inicialmente traçado, permitiu afirmar a utilidade e a importância da utilização de instrumentos psicométricos para o diagnóstico e/ou rastreio da confusão aguda e do delirium, sugerindo-se a utilização do CAM para rastreio do delirium e da Escala de Confusão NeeCham para avaliação da confusão aguda. Ambos os instrumentos podem ser aplicados por enfermeiros ou por médicos, mas enquanto um deles permite a obtenção de um diagnóstico de Enfermagem (Escala de Confusão NeeCham), o outros permite o rastreio de uma condição patológica que corresponde a um diagnóstico médico (CAM). No entanto, tal não implica que o CAM não deva ser utilizado por enfermeiros, antes pelo contrário, visto que o rastreio do delirium pode permitir a sua referenciação ao médico, já que este constitui uma emergência médica. Assim, verifica-se a importância da utilização de instrumentos psicométricos (devidamente validados para a população-alvo e, preferencialmente, com boas propriedades psicométricas) em Saúde Mental, E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

715


visto que todos (ou quase todos) os focos de atenção de Enfermagem nesta área apresentam uma extrema subjetividade no que concerne à sua avaliação. Relativamente à realização do presente trabalho, verificaram-se algumas limitações, sobretudo relacionadas com a relativamente escassa literatura encontrada acerca do tema em estudo (instrumentos de avaliação da confusão aguda e do delirium). Futuramente, seria importante a realização de mais estudos que permitam analisar a importância e a aplicabilidade da utilização de instrumentos psicométricos de avaliação da confusão aguda e do delirium, em contexto clínico, de forma sistematizada, e a sua relação com a efetividade do diagnóstico das condições patológicas referidas (permitindo assim perceber se o uso de instrumentos psicométricos permite, efetivamente, a redução de erros ou de “omissões” diagnósticas)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Adamis, D., Sharma, N., Whelan, P. J. P., & Macdonald, A. J. D. (2010). Delirium scales: a review of current evidence. Aging & Mental Health, 14 (5), 543-555. doi: 10.1080/13607860903421011. American Psychiatric Association (2002). DSM-IV-TR: manual de diagnósticos e estatística das perturbações mentais (4ª ed.). Lisboa, Portugal: Climepsi. Chang, V. T. (2002). The confusion about confusion. Journal of Palliative Medicine, 5 (5), 659-660. doi: 10.1089/109662102320880453. Han, J. H., Zimmerman, E. E., Cutler, N., Schnelle, J., Morandi, A., & Dittus, R. S. [et al.] (2009). Delirium in older emergency department patients: recognition, risk factors, and psychomotor subtypes. Academic Emergency Medicine, 16 (3), 193-200. doi: 10.1111/j.1553-2712.2008.00339.x. Inouye, S. K. (2003). The confusion assessment method (CAM): training manual and coding guide. New Haven:

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Association,

304

(7),

779-786.

doi:

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

717

10.1001/jama.2010.1182.


60. FAMÍLIA: GESTÃO DE CONFLITOS EM CONTEXTO PSIQUIÁTRICO Manuela Martins*, Júlia Martinho**, José Carlos Carvalho***, Ilda Fernandes**** *Professora Coordenadora na ESEP; Professora Doutora em Ciências de Enfermagem; mmartins@esenf.pt **Professora-Adjunta na ESEP; Doutoranda em Ciências de Enfermagem; julia@esenf.pt ***Professor-Adjunto na ESEP; Professor Doutor em Ciências de Enfermagem; zecarlos@esenf.pt ****Professora-Adjunta na ESEP, Professora Doutora em Ciências de Educação; ildafernandes@esenf.pt

RESUMO Atualmente assiste-se a um reconhecimento gradual da importância e contributo das famílias nos cuidados de Enfermagem estando cada vez mais atentos os enfermeiros às necessidades destas (Wright & Leahey, 2009). Com este estudo pretendemos identificar os estilos de gestão de conflitos desenvolvidos pelos profissionais de enfermagem que exercem funções nos serviços de internamento de psiquiatria perante a presença e participação da família nos cuidados. Utilizamos uma abordagem quantitativa e realizamos um estudo descritivo. Os dados foram colhidos utilizando um questionário que integra dados sociodemográficos e o inventário de gestão de conflitos de Rahim (ROCI-II) - de Rahim e Magner 1995, validada por Cunha et al. (2003) e adaptado para a família por Galinha (2009), aplicado a 56 enfermeiros de uma instituição psiquiátrica da região Norte de Portugal. Os resultados sugerem que os enfermeiros que participaram neste estudo apresentam como estilos de gestão de conflitos mais preponderantes, o estilo de integração e de compromisso.

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Este artigo, é resultado de uma parte do estudo sobre as atitudes, stress e gestão do conflito dos enfermeiros face à família, em contexto de internamento em Psiquiatria.

PALAVRAS - CHAVE: Gestão de conflitos; Enfermagem; Família; Psiquiatria.

60.0. INTRODUÇÃO O hospital é um sistema complexo, no qual a existência de diferentes interações entre enfermeiros, outros profissionais de saúde, doentes e familiares vai promover um elevado potencial para a ocorrência de conflitos. Um conflito implica sempre uma interação entre duas partes, com manifestações de alguma hostilidade (Almeida, 1999; Kelly, 2006). O relacionamento com equipas multidisciplinares, a burocracia que envolve a organização, o relacionamento com doentes e famílias, a exposição a situações de urgência, fatores psicológicos, falhas e/ou má comunicação, diferenças individuais, de valores e personalidade, divergência quanto aos métodos de trabalho, falta de cooperação, competição… (Saraiva, 2009) Por outro lado, a alta especialização e a estrutura organizacional hierárquica, os problemas com a autoridade e as posições hierárquicas, a capacidade e necessidade de trabalhar em equipa, as expectativas perante o tipo de trabalho que deve ser desenvolvido (Nayeri & Negarandeh, 2009). São fatores conhecidos como promotores do conflito no ambiente hospitalar e nomeadamente relacionados com a profissão de Enfermagem. A nível instrumental e organizacional, também se verificam fatores causais como: a falta de equipamentos em número adequado, o número de elementos E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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nas equipas multidisciplinares, o excesso de doentes nos serviços, podendo ser geradores de conflito, não só no staff, mas também nos doentes e seus familiares (Ib.). A melhoria da comunicação, a diminuição do stress familiar e a consequente gestão de conflitos entre os membros da família e os também entre os profissionais de saúde mental, é uma área que necessita de contributos e que nem sempre tem sido abordada, ainda que a investigação revele a existência de alguns problemas na interação entre os profissionais de saúde mental e a famílias dos doentes (Kuipers & Bebbington,1990). Consensual é a ideia de que são variadas e diferentes as causas e que o modo como cada um vai lidar com a situação depende da forma como cada um vai percecionar o conflito (Nayeri e Negarandeh, 2009) e de que é mais fácil gerir o conflito de forma construtiva quanto mais cedo se atuar (Vivar, 2006). Uma má ou inexistente gestão do conflito pode conduzir a problemas psicológicos, maior abstenção ao emprego, desmotivação e falta de energia. Outras consequências referem-se à perda de paciência, nervosismo, dificuldades em adormecer e depressão (Nayeri & Negarandeh, 2009). A origem do conflito entre enfermeiros e famílias surge por vezes de uma informação insuficiente e contraditória, regras hospitalares desadequadas, sensação de falta de controlo das situações, barreiras comunicacionais diversas e objetivos e expectativas diferentes, face à resolução do problema de saúde (Moore & Kordick, 2006 cit. Galinha, 2009). Estes preocupam-se essencialmente com os seus limites no que se refere à informação ministrada às famílias e menos com as diretrizes e normas institucionais que impõem restrições as quais podem ser promotoras do afastamento entre família e enfermeiro (Stayt, 2007). 60.1. Objetivos 720

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Pretendemos com este estudo identificar os estilos de gestão de conflitos desenvolvidos pelos profissionais de enfermagem que exercem funções nos serviços de internamento de psiquiatria perante a presença e participação da família nos cuidados e relacionar as características sócio demográficas e profissionais dos enfermeiros dos Serviços de Internamento de Psiquiatria com os estilos de gestão de conflitos identificados. 60.2 Metodologia - Estudo: Quantitativo, exploratório e descritivo. - População em estudo: Enfermeiros de um hospital psiquiátrico do Norte de Portugal (N=129). - Amostra: Não probabilística intencional, composta por 56 enfermeiros (43,2% da população).

- Técnica e instrumentos de recolha de dados: Questionário

de

autopreenchimento

constituído

por:

dados

sociodemográficos e a versão portuguesa do Rahim Organizacional Conflict Inventory (ROCI-II) ” de Rahim e Magner 1995, validada por Cunha et al. (2003) e adaptado para a família por Galinha (2009). Este instrumento, permite identificar quais os estilos de gestão do conflito inerentes à prática profissional dos enfermeiros perante os familiares dos seus doentes.

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721


Constituído por 28 itens com uma pontuação total de 140, utiliza uma escala de concordância de estrutura do tipo Likert (5 opções), que varia desde discordo fortemente (1) a concordo fortemente (5) e que avalia as dimensões de estilos de gestão de conflito: •

Servilismo – baixo interesse próprio e elevado interesse pelos outros.

Integração – elevado interesse próprio e elevado interesse pelos outros.

Evitação – baixo interesse próprio e baixo interesse pelos outros

Compromisso – interesse intermédio próprio e pelos outros

Dominação – elevado interesse próprio e baixo interesse pelos outros.

- Procedimentos: Foi pedida autorização ao Conselho de Administração da Instituição para realização do estudo. Foi explicado aos enfermeiros o objetivo do estudo, os procedimentos e pedida a sua colaboração no preenchimento do questionário e do consentimento livre e informado. O questionário foi aplicado a todos os enfermeiros da instituição, no mês de Abril de 2011. O procedimento para a análise dos dados obtidos nos questionários envolveu a estatística descritiva simples com a respetiva análise de frequências absolutas e medidas de tendência central e análise multivariada, considerando uma probabilidade de erro máximo de 5%. Utilizou-se estatística não paramétrica em amostras com menos de 30 sujeitos recorrendo ao SPSS versão 19.0.

722

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60.3. RESULTADOS: Participaram no estudo 56 enfermeiros (43,23%), de uma população de 129 enfermeiros, maioritariamente do sexo feminino (69,6%, n=39) VS masculino com (30,4%, n=17), com idades compreendidas entre os 22 e os 59 anos (M=32,4 DP= 7,9) e com experiência profissional compreendia entre 1 e 35 anos (M=9,63 DP=7,7). Dos inquiridos: 44,6% têm uma especialidade de Enfermagem sendo que, destes a maioria 41% possuem a especialidade de Psiquiatria e Saúde Mental, 14,3% têm pós-graduações (emergência, supervisão clinica, entre outras) Relativamente à formação no âmbito de Enfermagem de família, 41% dos inquiridos possuir formação mais específica, com 33,9% realizada em contexto académico e 7,1% através de autoformação. Dos participantes, 82,1% referem ter tido experiências pessoais anteriores, com familiares gravemente doentes. Ao analisamos os resultados procuramos identificar quais eram os estilos de gestão de conflitos preponderantes nos enfermeiros que exercem funções nos serviços de psiquiatria - Tabela 1.

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Tabela 1 – Estilos de gestão de Conflito - ROCI-II

ESTILOS DE GESTÃO DE CONFLITO

Integração

Compromisso

Evitamento

Dominação

Servilismo

Score Total

Mínimo

17

13

11

7

8

70

Máximo

34

29

24

20

21

122

Média

26,69

23,67

17,96

12,84

14,20

95,36

DP

3,22

2,78

2,75

3,18

3,07

10,24

Dos resultados obtidos pelo ROCI-II e apresentados na tabela, verifica-se que existe uma variação de 70 a 122 numa pontuação total da escala de 140, com uma média= 95.36 DP=10.24. O estilo de gestão de conflitos mais desenvolvido por estes enfermeiros no serviço de psiquiatria face à família é o estilo de Integração (M=26,69). O estilo de gestão de conflito menos desenvolvido é o estilo Dominação. Os itens da escala que apresentam maior nível de concordância são: “Perante uma solução aceitável para ambos”; Perante um conflito com o familiar do utente, procuro evitar que me coloquem numa situação difícil e tento não implicar ninguém no problema; Perante uma situação problemática com o familiar do utente, a informação que troco com ele é sempre verdadeira”

724

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E com menor nível de concordância: “Procuro não mostrar o meu desacordo com o familiar do utente, para evitar problemas; Perante um problema de trabalho, geralmente tento satisfazer as necessidades do familiar do utente; Procuro utilizar todos os recursos ao meu alcance, para que as minhas ideias sejam aceites”

Ao analisarmos os resultados relacionando os estilos de gestão de conflito com ao título profissional obtemos: Tabela 2 – Estilos de gestão de Conflito por título profissional (N=56) Titulo professional

N

Média

Enfermeiro

32

29,50

Enf.Especialista

24

26,06

Enfermeiro

32

28,68

Enf. Especialista

24

27,13

Enfermeiro

32

26,24

Enf.Especialista

24

30,27

Enfermeiro

32

28,95

Enf Especialista

24

26,77

Enfermeiro

32

26,11

Enf Especialista

24

30,44

Integração

Compromisso

Evitamento

Dominação

Servilismo

Relacionando os estilos de gestão de conflito com o título profissional dos enfermeiros verificamos que os estilos desenvolvidos com maior preponderância pelos enfermeiros são o estilo de Integração, Compromisso e Dominação. Os estilos de gestão de conflitos desenvolvidos pelos enfermeiros especialistas com maior preponderância são os estilos de Evitamento e Servilismo tendo estes maior média que os restantes estilos.

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60.4 Discussão dos resultados A evidência aponta que as famílias evitam partilhar preocupações com amigos e/ou outras pessoas conhecidas que as podiam apoiar, porque eles temem ser mal interpretados e ter a sua privacidade violada (Chafetz & Barnes, 1989;

Rose,

1997). Muitas famílias não têm uma base familiar de apoio, porque os conflitos emergem no que concerne a como lidar com o doente (Rose, 1997). O facto é que vários investigadores têm documentado que as famílias não recebem o apoio adequado dos profissionais de psiquiatria (Biegal, Song, & Milligan, 1995; Rose, 1998) sendo a principal dificuldade a má qualidade das interações com profissionais de saúde (Muhlbauer, 2002). Por outro lado os profissionais quando confrontados com tal facto referem algumas dificuldades como a falta de recompensa ou reconhecimento do seu trabalho com as famílias assim como poucas oportunidades para o desenvolvimento de habilidades e falta de espaços nos serviços que possibilitem a estes uma melhor interação com as famílias (Rose, Mallinson & Walton-Moss, 2004). Parece-nos que efetivamente as questões associadas ao envolvimento das famílias no cuidado na psiquiatria se vão mantendo sendo urgente refletir-mos sobre elas e encontrarmos caminhos efetivos na sua resolução. Este estudo indica-nos que os enfermeiros que participaram neste estudo desenvolvem maioritariamente o estilo de integração para a gestão de conflitos face à família. Este estilo revela um elevado interesse em causa própria assim como um elevado interesse pela causa dos outros procurando obter ganhos para ambas as partes. Estes dados, revelam-nos que a família é de alguma forma apoiada nas suas pretensões. No entanto quando relacionamos os estilos de gestão de conflitos com o título de exercício profissional e olhamos para os resultados emergem-nos algumas preocupações pois verificamos que os estilos desenvolvidos com maior preponderância pelos enfermeiros são o estilo de 726

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integração, compromisso e dominação enquanto os enfermeiros especialistas desenvolvem com maior preponderância os estilos de evitamento e servilismo. Os resultados apontam de alguma forma para uma ausência de confronto por parte dos enfermeiros especialistas mas também ausência na integração da família nos cuidados. Por seu lado os enfermeiros procuram integrar a família nos cuidados mas em algumas ocasiões denotam não gerir da melhor forma os conflitos emergentes recorrendo ao estilo dominação que denota um elevado interesse na sua causa próprio e um baixo interesse pela causa dos outros. Estes dados de facto vêm evidenciar que mais estudos devem ser desenvolvidos para entendermos a problemática na sua essência por forma a mudarmos comportamentos no sentido de alcançarmos a qualidade e excelência dos cuidados mas também um maior nível de satisfação de todos os envolvidos no processo de cuidados.

60.5 CONCLUSÕES O estilo de gestão de conflitos desenvolvido pelos enfermeiros face à família que é mais preponderante no contexto de psiquiatria é o estilo de integração, que gere os conflitos atendendo ao elevado interesse pela causa própria, como pela causa da família. Não deixa de nos fazer refletir o facto de este estilo ser desenvolvido maioritariamente por enfermeiros generalistas… Entendemos que este estudo exploratório, nos aponta alguns dados interessantes que consideramos de suma importância continuar a investigar para melhor compreender a gestão de conflitos dos enfermeiros face à família neste contexto específica “psiquiatria”. Estes resultados apontam para a necessidade d’“a colaboração entre os profissionais e a família, pois esta permite a partilha de conhecimentos e a E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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reciprocidade entre ambos, na compreensão conjunta da experiência da doença (Martins, 2004:93). Limitações do estudo: Uma limitação inerente ao estudo é a impossibilidade de generalização dos resultados, devendo-se essencialmente ao número limitado de participantes. Consideramos que a entrevista deveria ter sido associada ao questionário, potencializando a recolha de dados e uma melhor compreensão, face à família em contexto de Psiquiatria.

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Song,

L.,

&

Milligan,

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61. PREVALÊNCIA DO BULLYING NUMA EB2,3 DA REGIÃO NORTE DE PORTUGAL

Elizabete Borges*; Pedro Melo**

* Escola Superior de Enfermagem do Porto (elizabete@esenf.pt) ** Instituto de Ciências da Saúde – Universidade Católica Portuguesa (pmelo@porto.ucp.pt)

Resumo: O Bullying é um fenomeno real no contexto escolar e constitu um abuso com consequencias graves a curto, médio e longo prazo (Haber & Glatzer, 2009). No contexto do Programa Nacional de Saúde Escolar, a problemática da violência escolar é uma das oito prioridades de intervenção no âmbito dos estilos de vida. Foi objetivo deste estudo identificar a prevalência de Bullying, por ano letivo, no 2º e 3º ciclos do ensino básico. A amostra foi constituida por 399 alunos do 2º e 3º ciclos do ensino básico de uma escola da região norte de Portugal. O Questionário Bullying/ Agressividade entre alunos nas escolas de Pereira (2008) foi o instrumento implementado. Dos resultados obtidos salientamos que dos alunos vitimas de comportamento de bullying (7,3%), na sua maioria eram do 5º ano (55,2%), seguido pelo 6º ano (27,6%), 7º ano (10,4%) e 8º e 9º anos (3,4%).

Os tipos de agressão referenciados com mais

frequência foram do tipo psicológico, ocorreram no recreio e os agressores foram alunos mais velhos e do sexo masculino.

Palavras-chave: Bullying; Violência escolar; Promoção de saúde

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61.0 Introdução O Bullying é um fenómeno que ocorre no contexto escolar, com consequências graves para a saúde dos seus intervenientes. Para Beane (2006) a sua existência remonta aos primórdios da humanidade. Define-se por “comportamentos agressivos de intimidação e que apresentam um conjunto de características comuns, entre as quais de identificam várias estratégias de intimidação do outro e que resultam em práticas violentas exercidas por um individuo ou pequenos grupos, com carácter regular e frequente” (Pereira, 2008, p. 16). De salientar a intencionalidade por parte do agressor em magoar as vítimas, sendo estas identificadas como mais frágeis. Diferentes factores são identificados como possíveis indutores deste tipo de comportamentos

nomeadamente:

insuficiente

supervisão

das

crianças

e

dos

adolescentes, comportamentos agressivos em casa, punição muito severa, pares abusivo, entre outros. As implicações do Bullying podem manifestar-se na vítima a curto e longo prazo, com alterações no rendimento escolar, desenvolvimento físico, emocional e psíquico (Beane, 2006). Pode de igual modo, acarretar consequências no agressor como a destruição da vida dos jovens, crença na força para resolução de problemas, dificuldade em respeitar a lei e dificuldades no relacionamento afectivo e social e incapacidade (Pereira, 2008).

Objetivos: Identificar a prevalência de Bullying por ano letivo no 2º e 3º ciclos do ensino básico . 61.1. Metodologia O estudo integrado no paradigma de investigação quantitativa é do tipo transversal, exploratório e descritivo. Participantes

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A amostra foi constituida por 399 alunos do 2º e 3º ciclos do ensino uma escola da região norte de Portugal.

Material O material utilizado foi o questionário Bullying/agressividade entre os alunos nas escolas desenvolvido por Pereira (2008). Este instrumento é de carácter anónimo constituído por 5 grupos: dados pessoais, os amigos, as vítimas, os agressores e o recreio. A opção de resposta varia entre uma ou mais possibilidades sendo devidamente identificadas Procedimentos A informação foi recolhida em contexto de sala de aula, sustentadas na metodologia de projeto com o objetivo, entre outros, de promover a percepção de suporte para o fenómeno do Bullying na Comunidade Escolar. 60. 2 Resultados Numa amostra de 399 alunos do 2º e 3º ciclo do ensino básico 50,6% eram do sexo masculino e 49,4% do sexo feminino. Com uma amplitude de idades entre os 9 - 17 anos. Vivem com os pais 83% dos alunos, 69,7% frequentaram o infantário, 23,8% reprovaram pelo menos um ano, 53,4% praticam uma atividade extracurricular e 33,8% frequentam aulas de apoio. Constatamos que 7,3% (29) dos alunos identificam-se como vítimas desde que o período começou. Destes alunos, 55,2% são do 5º ano, seguido pelos do 6º ano (27,6%), do 7º ano (10,4%) e dos 8º e 9º anos (3,4%). No que diz respeito aos tipos de agressão 13,3% referem “chamaram-me nomes feios. Disseram coisas de mim ou do meu corpo”, 8,0% “bateram-me, deram-me murros ou pontapés”, 7,3% “andaram a falar de mim, dizem segredos sobre mim” e 6,5 “meteram-me medo”. Os locais onde ocorreram com mais frequência este tipo de comportamento foi o recreio (16,8%), a sala de aula (6,3%) e os corredores (5,8%). Relativamente aos

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agressores 9,5% foram alunos da mesma turma, 7% do mesmo ano mas de turma diferente, 11,3% alunos mais velhos e 9,8% alunos do sexo masculino. No que se refere à perceção de suporte constatamos que das vítimas 15,8 % disse aos pais que lhe fizeram mal, sendo que 9,0% recorreu ao professor. No que se refere ao apoio dos colegas 15,0% mencionam que 3 ou mais amigos os ajudaram, mas 6,0% indicam que ninguém os ajudou.

61.2 Discussão dos resultados Os comportamentos de violência em contexto escolar encontrados no presente estudo corroboram estudos de outros investigadores (Carvalhosa & Lima 2001; Freire, Veiga Simão & Ferreira, 2006; Haber & Glatzer, 2009; Mendes, 2010; Pereira, 2008). Este fenómeno apresenta uma diminuição da sua prevalência de acordo com idade dos estudantes, ou seja quanto mais velhos menor a sua ocorrência. Facto constatado na nossa amostra em que foram os alunos do 5º ano os que mais se identificaram como vítimas, desde que o período escolar se iniciou. Poderemos refletir se uma maior maturidade capacita os jovens de novas estratégias de lidar com estas situações (Carvalhosa & Lima 2001). Para Carvalhosa (2010, p.12) o “envolvimento em comportamentos de bullying parece ter um pico aos 13 anos, embora os mais novos (11 anos) se envolvem mais, enquanto vítimas.” Lopes Neto (2005, p. 3) refere que o bullying “é mais prevalente entre alunos com idades entre 11 e 13 anos, sendo menos frequente na educação infantil e ensino médio”. Dos tipos de comportamento identificados, os que se associam ao domínio psicológico obtiveram maior destaque, sendo que o “chamaram-me nomes feios. Disseram coisas de mim ou do meu corpo” foi o que mais se evidenciou. Resultados similares foram identificados por Carvalhosa (2010), Matos & Gonçalves (2009) e Pereira (2008). No que se refere ao local de agressão o recreio surge como um local privilegiado para a sua a ocorrência, fato corroborado pelo presente estudo e identificado de igual modo, no estudo de Pereira (2008). A sala de aula foi também referenciado pelos alunos

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como local de ocorrência no presente estudo, local também identificado pelo projeto ABRAPIA (Lopes Neto, 2005). Quanto aos agressores estes são identificados com maior prevalência como alunos da mesma turma, alunos mais velhos e do sexo masculino tal como, nos estudos de Carvalhosa, Lima & Matos (2001), Mendes (2010) e Pereira (2008).

61.3. Conclusões Concluímos que na escola estudada, os resultados vão ao encontro de outros estudos, indicando a necessidade de se desenvolverem projectos de promoção da saúde e prevenção da violência escolar, incluindo o fenómeno do Bullying.

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62. CARPE – CENTRO DE ACOMPANHAMENTO E REABILITAÇÃO PSICOEDUCATIVA Ana Maria Seco Alves de Sousa*; Luís Filipe Esteves Barbosa de Oliveira**; Célia Maria Fernandes Cerqueira*** *Professora Adjunta, Escola Superior de Saúde – IPVC, anasousa@ess.ipvc.pt **Psicólogo, CARPE, luyz76@gmail.com ***Animadora Sociocultural, CARPE, c_maria_cerqueira@hotmail.com

RESUMO É uma evidência que sem saúde mental não há saúde e que esta é indispensável para uma plena realização pessoal e profissional. Foi com esta crença que familiares e amigos de pessoas com doença mental reconheceram a urgência da criação e dinamização de um movimento associativo que fomentasse a implementação de uma estrutura, em Viana do Castelo, que permitisse a utilização de equipamentos destinados a pessoas em situação de desvantagem de índole psíquica, transitória ou crónica, com vista à sua reinserção socioprofissional e/ou profissional ou à sua integração em programas de formação ou de emprego protegido ou apoiado. De acordo com o que se encontra inscrito no seu Plano de Atividades, a Associação CARPE – Centro de Acompanhamento e Reabilitação Psico Educativa

pretende

implementar,

a

médio

prazo:

uma

Unidade

de

Acompanhamento da Pessoa com doença mental grave e seus cuidadores e uma Unidade Sócio-Ocupacional. São estas duas Unidades, assim como a filosofia da Associação, que a seguir se descrevem. PALAVRAS-CHAVE: Doença Mental; Reabilitação; Intervenção Comunitária E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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62.0. INTRODUÇÃO A Associação CARPE – Centro de Acompanhamento e Reabilitação Psico Educativa é uma associação sem fins lucrativos, constituída a 14 de Fevereiro de 2011 e que iniciou a sua atividade a 30 de Setembro do mesmo ano. Foi criada com o objectivo de se constituir como uma resposta de qualidade no âmbito da Saúde Mental e pretende contribuir para a reabilitação psicossocial e adaptação da pessoa/família à doença mental.

62.1. METODOLOGIA A metodologia e áreas de intervenção a implementar por esta associação nascem da crença na epistemologia dos cuidados de saúde mental de base comunitária. A sua atividade incluirá intervenções comunitariamente ativas na área social, jurídica, médica, enfermagem e psicológica, assumindo uma metodologia eclética orientada para o Recovery, a autonomização e a realização pessoal e social de pessoas portadoras de doença mental grave e dos seus familiares/cuidadores. 62.1.1.OBJECTIVOS - Desenvolver ação social e apoio à integração social e comunitária dos indivíduos/famílias, promovendo e aumentando a sua qualidade de vida. - Contribuir para um ambiente propício ao desenvolvimento físico, intelectual, moral, espiritual e social da família e de cada um dos seus membros, no respeito pela dignidade da pessoa humana. 62.1.2. ACTIVIDADES: Para concretização dos seus objetivos, a CARPE propõe-se criar e dinamizar as seguintes atividades principais: 736

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- Proporcionar às famílias as condições de acesso aos bens materiais, sociais e culturais indispensáveis a um desenvolvimento equilibrado da família; - Promover e desenvolver ações que contribuam para o bem-estar social dos indivíduos/famílias, nomeadamente no campo da solidariedade e segurança social, educação, formação profissional, emprego, saúde e habitação; - Conceber e operacionalizar programas de intervenção psicossocial; - Desempenhar um papel de mediador ou parceiro científico para impulsionar o desenvolvimento integrado da intervenção familiar e comunitária; - Organizar, preparar, assessorar, apoiar e divulgar cursos, ações de formação, estágios, congressos, jornadas, seminários, mesas-redondas e exposições que se relacionem com a investigação e desenvolvimento no âmbito da Saúde Mental; - Estabelecer protocolos e parcerias com entidades nacionais e internacionais,

federações,

confederações,

universidades,

institutos

superiores, institutos politécnicos, associações, grupos de trabalho formais ou informais, comissões, empresas e pessoas singulares para a prossecução dos objetivos estatutários.

62.2. ANÁLISE Familiares de pessoas com doença mental, que estiveram na génese da criação da Associação, reconheceram a urgência do desenvolvimento e criação de uma estrutura em Viana do Castelo que permita a implementação de equipamentos destinados a pessoas em situação de desvantagem de índole psíquica, transitória ou crónica, que auxiliem a sua reinserção socioprofissional

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e/ou profissional ou à sua integração em programas de formação ou de emprego protegido ou apoiado. Estudos epidemiológicos realizados pela Organização Mundial de Saúde (OMS) nos últimos anos demonstram que as perturbações psiquiátricas e os problemas de saúde mental se tornaram a principal causa de incapacidade, nomeadamente para o trabalho, e uma das principais causas de morbilidade nas sociedades atuais. A perspetiva futura aponta que no ano 2020, a depressão será a primeira causa de morbilidade em todos os países desenvolvidos. OMS (2001) Na Europa, as perturbações mentais são responsáveis por uma média de 40% dos anos vividos com incapacidades, tanto a nível profissional como pessoal. Em todo o mundo, esse valor atinge os 31%. Segundo a Organização Mundial de Saúde, das 10 principais causas de incapacidade, 5 são perturbações psiquiátricas. No “LIVRO VERDE – Melhorar a saúde mental da população, Rumo a uma estratégia de saúde mental para a União Europeia”, a Comissão Europeia “estima que mais de 27% dos europeus adultos (entre os 18 e os 65 anos) são afetados pelo menos por uma modalidade de doença mental no decurso de um dado ano”, o que representa quase 82,7 milhões de cidadãos numa população de 300,7 milhões (incluindo a Islândia, a Noruega e a Suíça). A doença mental custa à UE cerca de 3% a 4% do PIB, sobretudo através da perda de produtividade. É uma das principais causas de reforma antecipada e de pensões por invalidez. A estes vêm somar-se outros custos intangíveis em função do modo como a sociedade trata as pessoas doentes ou diminuídas mentais. Em Portugal, o número de pessoas atingidas por patologias do foro psicológico alcança o valor estimativo de 2,7 milhões. Se nos restringirmos às psicoses mais incapacitantes, como é o caso da esquizofrenia, cuja incidência é de 1%, e da perturbação bipolar e depressões ‘major”, cuja incidência é de 6,9 %, alcançamos valores da ordem de 120.000 pessoas afectadas por patologias do 738

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espectro da esquizofrenia e 690.000 pessoas que apresentam sintomas do quadro das depressões. (Plano de Ação 2007 – 2016) Segundo dados do Relatório da Comissão Nacional para a Reestruturação dos Serviços de Saúde Mental em Portugal (Plano de Ação 2007 – 2016), concluise

que,

relativamente

à

quantidade

de

respostas/programas

sociais

desenvolvidas por IPSS (ao abrigo do Despacho Conjunto 407/98) dirigidas a pessoas portadoras de doença mental, “o número de utentes em lista de espera é significativo (…) o que significa que os lugares existentes não cobrem as necessidades”. Constata-se também que a reduzida participação de utentes e familiares no processo terapêutico assim como a quase total ausência de programas de promoção de saúde mental e prevenção da doença o que reflete a necessidade de respostas enérgicas, comunitariamente ativas e, sobretudo, adequadas à realidade social e pessoal das comunidades onde esses utentes e familiares se inserem. Para além desta insuficiência de respostas, verifica-se uma concentração dos recursos nos grandes centros urbanos, nomeadamente em Lisboa e no Porto, deixando uma grande franja da população portadora de doença mental grave sem respostas adequadas às suas necessidades.

62.3. DISCUSSÃO Ultrapassados os obstáculos que surgem sempre durante a implementação e dinamização de um movimento associativo, inicia-se agora o processo de definição das estratégias a implementar. A Organização Mundial Saúde, no seu relatório anual de 2001, define a reabilitação psicossocial como “um processo que oferece aos indivíduos que estão debilitados, incapacitados ou deficientes, devido a perturbação mental, a oportunidade de atingir o seu nível potencial de funcionamento independente na comunidade, o que E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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envolve tanto o incremento das competências pessoais como a introdução de mudanças ambientais”. OMS (2001) Os objetivos desta associação firmam-se, assim, no desenvolvimento de serviços comunitários em saúde mental, a começar pela criação de uma Unidade de Acompanhamento e de uma Unidade Sócio-Ocupacional como as que aqui se estão a desenvolver. A

Unidade

de

Acompanhamento,

denominada

“Com_Sentimento”,

será

constituída por uma equipa multidisciplinar, e assenta numa lógica de estreita colaboração com o indivíduo portador de doença mental grave e/ou com os seus cuidadores, pretendendo reforçar a qualidade das relações familiares e da família com a comunidade através do seu empowerment e do fortalecimento das competências necessárias para a construção do seu bem-estar. A Unidade Sócio-Ocupacional define-se como uma resposta social/serviço comunitário de saúde mental, que tem como objetivo concretizar e respeitar o que está previsto na Lei 36/98, de 24 de Julho, e o Decreto-lei 35/99, de Fevereiro, que a regulamenta, e onde se afirma que a reabilitação psicossocial de pessoas portadoras de doença mental severa deve ser assegurada em estruturas residenciais e sócioocupacionais, centros de dia, unidades de inserção profissional, inseridos na comunidade e adaptados ao grau de autonomia dos utilizadores. A Unidade Sócio-Ocupacional que pretendemos implementar tem como referência ideológica o cumprimento dos objetivos definidos na “Declaração sobre Saúde Mental para a Europa”, subscrita em Helsínquia por todos os Ministros de Saúde do Estados Membros da União Europeia em 2005, incluindo Portugal.

62.4. CONCLUSÕES A CARPE pretende, no médio prazo, firmar-se na área do desenvolvimento de serviços comunitários em saúde mental. Tem procurado, na sua curta história, colaborar de forma sistemática e organizada, implicando parceiros na sua missão assistencial relativamente aos cuidados na saúde mental em Portugal, concentrando a sua ação no Distrito de Viana do Castelo. Tem como móbil a 740

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crescente humanização dos serviços e pretende adotar como metodologia o Recovery pela reabilitação psicossocial.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CARPE (2011). Centro de Acompanhamento e Reabilitação Psico Educativa: Registo Notarial nº 219/221; “Cartório Notarial de Viana do Castelo”, Fevereiro 2011. Ministério da Saúde (2008). Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016. Lisboa: Ministério da Saúde/ Alto Comissariado da Saúde/ Coordenação Nacional para a Saúde Mental. Organização Mundial de Saúde (2001). Relatório sobre a Saúde no Mundo: Saúde Mental: Nova concepção, nova esperança. Genéve: OMS. Organización Mundial de la Salud (2004). Promoción de la Salud Mental: conceptos, evidencia emergente, prática. Genéve: OMS. WHO (1978). Declaration of Alma-Ata. Health for All. Genevs, series 1, September 12.

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63.PREVENÇÃO DE COMPORTAMENTOS SUICIDÁRIOS: UM CONTRIBUTO DOS ENFERMEIROS José Carlos Santos* *Professor Adjunto RN, MSc, PhD Adjunto da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra

RESUMO

O suicídio e os comportamentos suicidários são um problema de saúde pública. Segundo a OMS (2012), todos os anos cerca de 1milhão de pessoas comete suicídio em todo o mundo, o que dá uma taxa global de 16 por 100.000 e uma morte a cada 40 segundos. Nos últimos 45 anos a taxa de suicídio aumentou cerca de 60% a nível mundial. É neste momento uma das três principais causas de morte entre os 15 e 44 anos nalguns países e a segunda entre os 15 e os 24 anos. Representava cerca de 1,8 da total da despesa em doença em 1998 e estima-se que este número suba para 2,4 em 2020. Nesse sentido a aposta na prevenção surge como um objectivo natural e necessário. A assinatura por parte de Portugal, do pacto europeu de Saúde Mental, em 2005 onde a prevenção do suicídio é uma prioridade e o Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016 ao eleger esta como uma das quatro áreas prioritárias permite-nos considerar que estamos em consonância com os objectivos da Europa e do país ao nível da saúde mental. Sabemos que em Portugal como em muitos outros contextos os números do suicídio estão subavaliados (De Leo & Evans, 2004): que dizer de algumas overdoses que mimetizam comportamentos suicidários? Alguns acidentes de viação aparentemente inexplicáveis? Algumas mortes por causa desconhecida que a ausência de um estudo mais aprofundado, nomeadamente a realização de uma autópsia psicológica deixam dúvidas por esclarecer? Da elevada quantidade de mortes por causa desconhecida? 742

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O suicídio é um fenómeno complexo com factores psicológicos, sociais, biológicos, culturais e ambientais envolvidos. Também por isso uma intervenção multidisciplinar é condição necessária mas não suficiente para a sua prevenção. Sectores como a educação, a segurança social, o trabalho, a justiça, a religião, os media, devem ser chamados a intervir e a sentir este assunto como uma tarefa global e não exclusiva da saúde, mas onde a saúde não pode abdicar das suas responsabilidades. O suicídio não pode ser compreendido como uma doença ou um acidente, mas comportamentos suicidários podem ser considerados como complicações severas, muitas preveníveis, de doenças e condições em que os aspectos sociais têm um papel importante. Logo, não se podem copiar modelos de prevenção de doenças ou acidentes mas podemos aproveitar alguns ensinamentos desses planos de prevenção. A preocupação com a prevenção do suicídio não é nova. Data de 1893, através da Lemberg Volunteer Rescue Society a primeira sociedade dedicada à prevenção do suicídio com actividade até 1906. Mas nesse mesmo ano apareceriam outras duas a The Salvation Army no Reino Unido e a National Save-A-Life League nos Estados Unidos. Pensamos ser necessário um Plano Nacional de Prevenção de Suicídio que além das medidas universais, para toda a população através de campanhas de educação, de prevenção nas escolas, restrição de meios, educação dos media; preveja medidas selectivas, para grupos de risco específicos, por exemplo através de programas de rastreio, treino de gatekeepers, constituição de serviços de intervenção em crise com acessibilidade facilitada, e por último medidas indicadas para indivíduos em elevado risco, através de grupos de apoio em contextos escolares, programas para pais, gestão de casos e intervenção em crise e tratamento. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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Segundo a Suicide Prevention Action Network USA (SPAN USA Inc., 2001) para a implementação de medidas preventivas devem ser tidos em conta os seguintes princípios: - os programas de prevenção devem de ser desenhados de forma a promover os factores protectores, mas devem também visar reverter ou reduzir os factores de risco conhecidos; - devem de ser para períodos longos com repetição das acções para reforçar os objectivos iniciais; - programas focados nas famílias têm maior impacto que os programas com impacto somente individual; - programas comunitários que incluam campanhas de média e alteração de politicas são mais efectivas quando são acompanhadas por intervenções individuais e familiares; - programas comunitários precisam de reforçar normas que apoiem o ajuda e o bem-estar em todos os contextos incluindo a família, o trabalho, a escola e a comunidade; - o programa de prevenção deve ser adaptado para responder às especificidades do problema detectado na comunidade local ou grupo de população; - quanto maior for o risco da população alvo, mais intensivo e precoce dever ser o plano de prevenção; - programas de prevenção devem ser específicos para uma determinada idade, adequados do ponto de vista desenvolvimental, e sensíveis culturalmente; e ainda que

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- programas de prevenção devem de ser implementados de forma fidedigna ao testado originalmente. Apesar de todos os problemas metodológicos que têm dificultado a produção de evidência, cinco áreas têm emergido nos planos de prevenção: educação e sensibilização da população e profissionais; programas de rastreio; tratamento de doenças psiquiátricas; restrição de meios letais; cobertura responsável dos media dos casos de suicídio (Mann et al, 2005; Mann & Currier, 2011). Destas, a formação de médicos dos CSP e restrição dos meios letais são eficazes para a prevenção do suicídio enquanto outros métodos incluindo educação pública / comunitária, programas de rastreio e formação dos media necessitam de mais provas / estudos (Mann et al, 2005) Com implicações na formação e prática o trabalho dos enfermeiros e, tendo em conta as recomendações da OMS (2007), podemos encontrar cinco eixos: formar cuidadores para o reconhecimento de sinais e comportamentos de risco; desenvolver e implementar intervenções efectivas; promover iniciativas para reduzir o acesso a meios letais; melhorar os sistemas de observação e seguimento; formar os cuidadores para a melhoria e implementação de mediadas terapêuticas (Cutcliffe & Stevenson, 2008; Cutcliffe & Santos, 2012). A necessidade de um plano de prevenção do suicídio e quais as contribuições dos enfermeiros especialistas em enfermagem de saúde mental será questionado e discutido no decorrer da apresentação.

Referências Bibliográficas

Cutcliffe, J. & Santos, J. (2012) Suicide and Self-harm: an evidence informed approach. Quay Books, London. Cutcliffe, J. & Stevenson, C. (2008a). Never the twain? Reconciling national suicide prevention strategies with the practice, educational, and policy needs of mental health nurses (part one). International Journal of Mental health Nursing, 17: 341-350 E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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De Leo, D. & Evans, R. (2004). International Suicide rates and Prevention strategies. Hogrefe & Huber Publishers, Gottingen Mann, J., Apter, A., Bertolote, J.,Beautrais, A., Currier, D., Haas, A., et al.(2005). Suicide prevention strategies: A systematic review. JAMA, 294, 2064–2074. Mann, J. & Currier, D. (2011). Evidence-Based Suicide prevention strategies: An overview, in Pompili, M. & Tatarelli, R. (Eds) Evidence-Based practice in Suicidology. Hogrefe Publishing, pg: 67-88 Organização

Mundal

de

Saúde

(2007).

Depression/suicide.

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Acessivel

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[http://www.int/health_topics/suicide/en/] Organização

Mundal

de

Saúde

(2012)

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http://www.who.int/mental_health/prevention/suicide/suicideprevent/en/ SPAN USA, Inc. (2001). Suicide Prevention: Prevention Effectiveness and Evaluation. SPAN USA, Washington, DC.

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