Revista 2016 02

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ano VII โ ข aBR/MaI/JUn 2016

Dep. Lucas Vergilio Apoio para conquista dos Honorรกrios no Congresso Nacional


A ANAJUR conclama todos a se mobilizarem em prol da aprovação da PEC 443/2009 na Câmara dos Deputados. A proposta busca corrigir a disparidade remuneratória existente entre os membros das carreiras da Advocacia-Geral da União (AGU) e as carreiras que compõem o Judiciário e as demais Funções Essenciais à Justiça. A PEC foi aprovada pelos deputados, em 10 turno, no dia 11 de agosto de 2015. Agora, precisa passar pelo 20 turno na Câmara, e por dois turnos no Senado. Segundo a proposta, o subsídio do nível mais alto dos membros da AGU equivalerá a 90,25% do subsídio mensal dos ministros do Supremo. O autor da proposta, deputado Bonifácio de Andrada (PSDB/MG), explica a urgente necessidade de tal correção. “Enquanto o Poder Judiciário e o Ministério Público dos Estados alcançaram a maturidade por meio de leis nacionais que concederam remuneração semelhante em todos os Estados da Federação, o mesmo não foi feito para as procuradorias dos Estados e do Distrito Federal, e o que se vê é uma grande disparidade no tratamento remuneratório dos procuradores, o que não é conveniente para a Federação Brasileira. A eficiência da Advocacia da União e dos Estados é de responsabilidade desta Casa e não pode haver prejuízo ao interesse público”, afirmou Bonifácio de Andrada (PSDB/MG). Vale lembrar que a aprovação da PEC 443/09 não trará impacto orçamentário imediato. A implementação do aumento se dará em até dois exercícios financeiros, não comprometendo o Ajuste Fiscal. A ANAJUR considera que a valorização da Advocacia Pública é medida fundamental para a prevenção e o combate à corrupção, considerando que são os Advogados Públicos os responsáveis pela defesa da União. São os guardiões do erário e lutam, diariamente, para evitar as perdas do Estado Brasileiro. A valorização das carreiras passa, dentre outras atitudes, por um tratamento remuneratório adequado aos profissionais que a integram. A luta continua!


leia nesta edição Ano VII • abr/mai/jun 2016

cApA: foto pRINcIpAL de JoNAS peReIRA / AGÊNcIA SeNAdo

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caRta ao leItoR

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anaJUR eM ação

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MoBIlIZação

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aPoIo PaRlaMentaR

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aRtIgo

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noRMas da agU

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ação PaRlaMentaR

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saúde

A conquista dos honorários para os advogados públicos Reflexos da atuação política sobre questões sensíveis para a Advocacia Pública Federal Vitória: Sancionada a lei que garante honorários para a Advocacia Pública Lucas Vergilio: parceiro fiel nas demandas da Advocacia Pública Histórico da Previdência Social e questões atinentes a uma nova reforma Normas de interesse dos membros da Advocacia-Geral da União Projeto de lei cria normas de proteção a vítimas e testemunhas de violência Benefícios da atividade física para o bem-estar do coração

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cIdadanIa

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cIdadanIa

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coletÂnea

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PUBlIcações e eVentos

Alimentação para cidadãos em estado de vulnerabilidade social Em Recife, um exemplo de como enfrentar o flagelo da fome A ingerência fiscal estadual em colônia federal, no ano de 1911 XXX Congresso Brasileiro de Direito Administrativo


ana jur Associação Nacional dos Membros das Carreiras da Advocacia Geral da união

DiretoriA eXeCutiVA PResIdêncIa Joana d’arc alves Barbosa Vaz de Mello secRetaRIa geRal tItUlaR: nicóla Barbosa de azevedo da Motta adJUnto: thaís Helena Ferrinho Pássaro dIRetoRIa FInanceIRa tItUlaR: geneide Palmeira Machado adJUnto: cargo vago

Pioneira na defesa da Advocacia Pública Federal

dIRetoRIa JURídIca tItUlaR: Márcia Regina Vicente Barbosa adJUnto: Ruth Jehá Miller

visão

dIRetoRIa de RecReação e esPoRte tItUlaR: Sérgio Ernesto Kopp
 adJUnto: cláudia Maria Vilela Von sperling

“Consolidar-se como referência na defesa das prerrogativas e interesses de seus associados, firmando-se como pilar da categoria na promoção do conhecimento, valorização e integração da advocacia pública federal junto ao estado e à sociedade brasileira”.

Missão

“representar e assegurar, com a expertise de seu pioneirismo e excelência de atuação, os interesses dos seus associados e da Advocacia Pública Federal perante os poderes constituídos e em benefício da sociedade brasileira”.

VALorEs

Ética, respeito, credibilidade, profissionalismo, integridade, transparência, união e democracia.

dIRetoRIa de adMInIstRação e conVênIos tItUlaR: lúcia Helena Pigossi neves adJUnto: laura Maria costa silva souza

dIRetoRIa de Relações assocIatIVas tItUlaR: luiz Fabrício thaumaturgo Vergueiro adJUnto: Ulisses Fernandes silva dIRetoRIa de eVentos tItUlaR: luciana Villela de souza adJUnto: Vânia Rons lamor Pinheiro dIRetoRIa de coMUnIcação socIal tItUlaR: Maura campos domiciana adJUnto: Merly garcia lopes da Rocha dIRetoRIa de assUntos legIslatIVos tItUlaR: Maria Madalena carneiro lopes adJUnto: luciano Brochado adjuto dIRetoRIa cUltURal tItUlaR: leslei lester dos anjos Magalhães adJUnto: cargo vago dIRetoRIa de assUntos de aPosentados e PensIonIstas tItUlaR: cargo vago adJUnto: tânia Maria carneiro santos dIRetoRIa de Relações coM o congResso nacIonal tItUlaR: Maria lucila Ribeiro Prudente de carvalho adJUnto: Maristela de souza Ferraz calandra CoNSeLHo CoNSuLtiVo

setor de Autarquias sul – Quadra 03 – Lote 02 Bloco C sala 705 – Edifício Business Point – Cep 70070-934 PABX: (61) 3322-9054 – Fax: (61) 3322-6527

www.anajur.org.br revistA ANAjur

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eFetIVos Jurema santos Rozsanyi nunes Maria da glória tuxi F. dos santos nicóla Barbosa de azevedo da Motta Maria anália José Pereira Manoel teixeira de carvalho neto José silvino da silva Filho annamaria Mundim guimarães Borges Messin Merly garcia lopes da Rocha Jacyra Medeiros sUPlentes Regina Maria Fleury curado Felinto césar sampaio neto Maria olgaciné de Moraes Macedo CoNSeLHo FiSCAL

jornalistas responsáveis: Flávia soledade e Cidinha Matos edição: Glória Maria varela reportagens: Flávia Metzker e Matheus Feitoza revisão: Corina Barra soares Projeto gráfico: Cláudia Barcellos – Design Editorial Edição gráfica: Lúcia Helena de Assis Impressão: Gráfica Ipanema tiragem: 2 mil exemplares

eFetIVos Álvaro alberto de araújo sampaio Maria socorro Braga gilberto silva sUPlentes norma Maria arrais Bandeira tavares leite lídio carlos da silva conceição das graças amoras Mira


Carta ao leitor

A conquista dos honorários para os advogados públicos

falada Reforma da Previdência. De maneira analítica, o autor faz um passeio histórico ao longo do marco legal que trata de nosso sistema previdenciário e discute os pontos que podem levar o governo a acelerar o processo de reforma. Preparamos uma entrevista com Demetrius Demetrio, fundador da instituição Pequenos Profetas, que realiza um relevante trabalho social em Recife (PE), atendendo a jovens moradores de rua. A importância desse trabalho foi merecidamente reconhecida quando a instituição ficou entre as finalistas do Prêmio ODM, criado pelo governo federal. Na seção Saúde, entrevistamos o cardiologista Daniel França, que nos fala sobre os benef ícios da atividade f ísica para o bem-estar do coração. O médico discorre sobre o tipo e a intensidade das atividades recomendadas para prevenir doenças cardíacas, bem como sobre os exercícios que devem integrar o tratamento de quem já apresenta problemas cardiovasculares. Como sempre, publicamos, em nossa coletânea A História do Brasil Contada pela Advocacia Pública, interessantes fatos narrados pelas sábias palavras de Arnaldo Godoy. Para encerrar, apresentamos, na coluna Publicações e Eventos, algumas sugestões de livros e eventos de interesse de todos os advogados públicos. Boa leitura!

foto: bernardo rebello

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urante o primeiro semestre deste ano, a categoria dos advogados públicos federais enfrentou fortes embates, inseridos em uma fase particularmente turbulenta da vida política nacional. Mas, encerrado esse período, pudemos finalmente celebrar algumas conquistas, que com galhardia fizemos por merecer. Depois de muita luta, configurada principalmente no empenho dos membros da Anajur, o PLC nº 36/2016 foi aprovado no Senado Federal e sancionado pela Presidência da República. Essa é uma vitória que precisa ser intensamente comemorada. Conseguimos, com o trabalho de convencimento dos parlamentares, incluir os advogados públicos aposentados na percepção dos honorários, estendendo, assim, o benef ício a todos de direito. Conheça um pouco dessa história na entrevista com o jovem deputado federal Lucas Vergilio (SD/GO), autor do substitutivo apresentado em Plenário para estender aos aposentados o pagamento dos honorários. Esse é, aliás, o tema central desta edição. Mas não só ele. Como de costume, buscamos apresentar em nossa Revista Anajur um apanhado de assuntos de nosso interesse que vieram à tona no último trimestre. Essas informações estão concentradas na coluna Anajur em Ação. O relançamento da Frente Parlamentar em defesa da Previdência Social e a aproximação entre os advogados públicos e o novo presidente do Conselho Federal da OAB, Cláudio Lamachia, fazem parte desse registro. Nesta edição, demos prosseguimento à seção Normas de Interesse, fazendo um compilado das principais alterações nas normas internas da AGU, acompanhando as publicações no Diário Oficial. Assim, nosso leitor fica bem informado sobre as demandas internas da instituição. O nosso analista parlamentar Antônio Queiroz, o Toninho do Diap, preparou um texto sobre o histórico das emendas constitucionais referentes à Previdência Social e as perspectivas da tão

Joana d’Arc Alves Barbosa Vaz de Mello Presidente da anajur

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ANA JuR eM Ação

Reflexos da atuação política nas questões sensíveis para a Advocacia Pública Federal o segundo trimestre de 2016 foi um tempo conturbado por intensa movimentação política em Brasília. com o afastamento temporário da presidente dilma Rousseff, assumiu o comando do Poder executivo o presidente interino Michel temer. a direção da advocacia-geral da União também foi trocada, tendo José eduardo cardozo sido substituído por Fábio Medina osório.

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urante esse período, a Anajur acompanhou atentamente as mudanças políticas, ao mesmo tempo que mantinha contato com autoridades aptas a tornar efetivos os direitos dos advogados públicos, tanto os ativos quanto os aposentados. O principal projeto de interesse dos advogados públicos em tramitação no Congresso Nacional foi o então Projeto de Lei nº 4.254/2015 – convertido no PLC nº 36/2016, depois de aprovado na Câmara dos Deputados –, referente ao acordo remuneratório assinado pelas entidades que representaram a Advocacia Pública e o governo federal, no ano de 2015.

Membros da Anajur visitam gabinetes de parlamentares em ações de mobilização no Congresso Nacional 6

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O projeto também trata da regulamentação dos honorários para a Advocacia Pública, tema previsto no texto do novo Código de Processo Civil. Na busca por apoio institucional, no mês de abril, a presidente da Anajur, Joana Mello, e a diretora-jurídica-adjunta da entidade, Ruth Jehá Miller, participaram de uma reunião na sede da Advocacia-Geral da União (AGU), com o vice-advogado-geral da União, Fernando Luiz Albuquerque. Durante o encontro, foi apresentado um modelo de percepção dos honorários, a ser proposto ao Parlamento, na forma de emenda ao projeto que ali tramitava. As entidades que representam os advogados públicos no âmbito federal e a cúpula da AGU estabeleceram, em consenso, como parâmetro a ser trabalhado no Congresso Nacional, o modelo de escalonamento por prazo de 10 anos. A AGU desdobrou-se, também, em contatos feitos nos corredores e gabinetes do Parlamento, em busca de adesão à sua causa.

Aprovação do reajuste remuneratório na Câmara dos Deputados Do projeto de lei referente ao acordo remuneratório constava também a inserção dos advogados públicos aposentados na percepção dos honorários. Uma vitória buscada pela Anajur e consolidada graças ao apoio concedido pela Câmara dos Deputados. Essa vitória resultou de muito empenho! Os encontros de associados com deputados, nas bases parlamentares, e a mobilização no dia da votação foram atos fundamentais para que o texto fosse aprovado, com a inclusão, é claro, dos aposentados. No dia 3 de junho, o PL nº 4.254/2015 foi aprovado na Câmara dos Deputados, depois de o texto ter entrado em regime de urgência, dispensando, assim, sua análise pelas comissões da Casa e seguindo direto para a apreciação do Plenário. As galerias da Câmara estavam repletas de advogados públicos, todos eles unidos no mesmo propósito: dar força à carreira. O desafio passou a ser, então, convencer os senadores sobre a importância do projeto, além de garantir que os parâmetros estabelecidos para os aposentados fossem respeitados e mantidos pelo Senado e pela Presidência da República,no momento da sanção do projeto.

Frente Parlamentar Mista em Defesa da Previdência Social No dia 31 de maio, evento realizado no Au-

ditório Petrônio Portela, na Câmara dos Deputados, marcou o relançamento da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Previdência Social. Durante o encontro, foi realizado o seminário Desmistificando o Déficit da Previdência no Contexto da Seguridade Social, oportunidade em que foram discutidos temas importantes, como: aposentadoria especial; pensão e redução de direitos; o mito do déficit e as fontes do financiamento previdenciário; convergência dos regimes; e Previdência Social. O encontro foi coordenado pelo senador Paulo Paim (PT/RS) e pelo deputado federal Arnaldo Faria de Sá (PTB/SP). Na ocasião, o presidente do Instituto Movimento dos Servidores Públicos Aposentados e Pensionistas (Mosap), do qual a Anajur faz parte, Edison Guilherme Haubert, lembrou os presentes sobre a necessidade de se dar continuidade à luta em favor da PEC nº 555/2006, que extingue a contribuição previdenciária dos servidores aposentados e pensionistas. A PEC nº 555/2006 é de autoria do ex-deputado federal e advogado público Carlos Mota. A proposta, que já está pronta, espera apreciação pelo Plenário da Câmara dos Deputados.

Representantes da Anajur conversam com o senador Romero Jucá e a deputada Maria Helena, em reunião da CCJ reVista

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Anajur participa de reunião na sede da OAB A presidente da Anajur, Joana Mello, participou de reunião com o presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cláudio Lamachia, na sede da OAB, em Brasília, no dia 6 de junho. Do encontro também participaram representantes das entidades que congregam a Advocacia Pública no âmbito federal. Na pauta, o pedido de apoio ao presidente do Conselho da OAB pela aprovação, no Senado Federal, do PLC nº 36/2016. A presidente da Anajur, Joana Mello, enfatizou a necessidade de inclusão dos aposentados na percepção dos honorários, conforme termos do substitutivo aprovado na Câmara dos Deputados: “Esta é uma medida que obteve consenso entre todas as entidades, e é fundamental que os senadores aprovem o projeto, garantindo os honorários a todos, ativos e aposentados”. Cláudio Lamachia garantiu que a Ordem vai apoiar os pleitos da Advocacia Pública. “Seria dif ícil não apoiar este pleito. Trata-se de um direito já corroborado no texto do novo Código de Processo Civil. Cabe a nós, da OAB, apoiar todos os advogados públicos. Eventuais discussões que venham a surgir poderão ser apresentadas ao Plenário da OAB”.

Primeira reunião entre novo advogado-geral da União e líderes associativos Em 20 de maio, a presidente da Anajur, Joana Mello, participou da primeira reunião entre o novo advogado-geral da União, Fábio Medina Osório, e os líderes associativos. O objetivo do encontro foi colocar a nova direção da AGU em contato com os representantes das carreiras. “Este é o primeiro contato institucional com as entidades associativas, com as quais vamos dialogar de modo muito estreito ao longo da nossa gestão”, confirmou o advogado-geral. Durante a reunião, a presidente da Anajur apresentou um documento ao advogado-geral, no qual lhe dava as boas-vindas, ao mesmo tempo que lhe expunha os principais pleitos das carreiras. Joana Mello destacou, ainda, a importância da atuação das entidades no fortalecimento da AGU: “Não podemos esquecer que a AGU é uma instituição em construção, e nosso dever é ajudar a consolidá-la como função essencial à Justiça”.

Presidente da OAB garante apoio aos pleitos da Advocacia Pública que tramitam no Congresso Nacional 8

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MoBILIzAção

VITÓRIA Sancionada a lei que garante Honorários para a Advocacia Pública desde o ano de 2015, os advogados públicos de todo o País lutam pelo encaminhamento do projeto de lei estruturado a partir de um acordo firmado, na época, entre os membros da advocacia-geral da União e o governo federal, intermediado pelo Ministério do Planejamento, desenvolvimento e gestão (MPog). o acordo previa vários direitos: o reajuste remuneratório, o aumento nos valores dos benefícios e, seu ponto central, a regulamentação da percepção dos honorários para os advogados públicos, prevista no texto do novo código de Processo civil.

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o final do ano passado, finalmente o texto foi encaminhado ao Congresso Nacional, em conjunto com outros projetos de acordos remuneratórios assinados com os membros das diversas carreiras da administração pública federal. O que tratava especificamente dos membros da AGU era o Projeto de Lei nº 4.254/2015. Na noite do dia 30 de maio, foi votado, em regime de urgência, o projeto de lei. Esse regime implica a dispensa de tramitação pelas comissões que analisariam previamente a proposta até sua chegada ao plenário. O PL nº 4.254/2015 foi, então, analisado diretamente por todos os deputados. Na ocasião, em nota, o advogado-geral da União, Fábio Medina Osório, pronunciou-se a respeito:

Aprovação do PLC 36/2016 na Comissão de Constituição e Justiça no Senado Federal reVista

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Superada essa primeira barreira, o objetivo comum se torna a aprovação de ambos, no menor espaço de tempo possível, com a aprovação das emendas consensuais e com a efetiva concentração de esforços para a votação célere junto ao Congresso Nacional, em atuação efetiva do AGU, da instituição, das carreiras de advogado da União, de procurador da Fazenda Nacional, de procurador federal e de procurador do Banco Central do Brasil, e dos servidores.

Na Câmara dos Deputados, o requerimento de percepção dos honorários para os advogados públicos aposentados foi muito bem recepcionado. A vitória foi fruto da mobilização dos advogados públicos, expressa em frequentes reuniões e outras atividades de convencimento dos parlamentares. Depois de aprovado na Câmara, o projeto foi encaminhado ao Senado Federal. Nessa Casa, ele ingressou sob a designação de Projeto de Lei da Câmara nº 36/2016. A proposta foi encaminhada à Comissão de Constituição, Justiça e de Cidadania do Senado (CCJ), responsável por avaliar a legalidade do texto. Ali, o senador Valdir Raupp (PMDB/RO) foi designado relator da matéria. Na última semana do mês de junho, o relatório do projeto estava pronto para entrar em votação na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. A data designada para tal foi 29 de junho de 2016. O relatório previa, porém, a exclusão dos advogados públicos inativos do direito de percepção dos honorários, situação repudiada pelos representantes da Anajur e demais advogados públicos presentes, que se empenharam, então, em intenso trabalho de visitas aos gabinetes parlamentares, em busca de apoio. Os associados da Anajur pediram ao senador Valdir Raupp que reestruturasse o texto, de forma que a proposta se assemelhasse à da Câmara dos Deputa-

dos, ou seja, com a extensão da previsão dos honorários aos advogados públicos aposentados. Em sua defesa, os advogados alegavam que os honorários tinham natureza de verba privada, não gerando, então, qualquer ônus para o Estado. Destacaram, ainda, que o valor a ser repartido seria o mesmo, não representando nenhum aumento de despesa para os cofres públicos. O pedido foi atendido pelo senador, que apresentou uma alteração, incluindo os aposentados no relatório. Depois de um pedido de vista coletivo, solicitado pelo senador Hélio José (PMDB/DF), o projeto foi analisado e aprovado na CCJ e, posteriormente, na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). Faltava apenas passar pela análise do Plenário do Senado. No fim da tarde do dia 13 de julho, o Plenário do Senado Federal aprovou finalmente o PLC 36/2016. Diretoria e associados da Anajur acompanharam ansiosos, dentro do plenário, a votação do texto. Na oportunidade, a presidente da Anajur, Joana Mello, parabenizou todos os associados da entidade que lutaram pela aprovação: Este resultado é fruto da mobilização de todos os advogados públicos que atuaram incansavelmente no convencimento dos parlamentares. Os associados da Anajur, que já haviam feito história durante a luta para a criação da AGU, mais uma vez mostraram a sua força, ao incluírem os aposentados no texto do PLC.

O projeto seguiu para a sanção presidencial e foi sancionado sem qualquer veto no que se refere aos honorários para a Advocacia Pública. O texto foi convertido na Lei nº 13.327/2016 e publicado em edição extra do Diário Oficial da União no dia 29 de julho.

Senador Romero Jucá recebe representantes dos advogados públicos e garante apoio ao PLC 36/2016 10

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ApoIo pARL AMeNtAR

DEP. LUCAS VERGILIO

Parceiro fiel nas demandas da Advocacia Pública as vitórias no congresso nacional não são alcançadas com uma luta solitária e descoordenada. É preciso buscar o apoio de lideranças parlamentares comprometidas com as causas da advocacia Pública. nesta edição especial de comemoração da concessão dos honorários para a advocacia Pública, entrevistamos o deputado federal lucas Vergilio (sd/go), autor do substitutivo apresentado em Plenário para a inclusão dos aposentados na percepção dos honorários. com apenas 27 anos, lucas Vergilio foi eleito deputado federal, respaldado por 78.387 votos. desde então, vem respondendo pela autoria de diversos projetos de lei de grande

nesta entrevista, acompanhe um pouco da vida pública desse deputado, principalmente da sua relação com a advocacia Pública. Como surgiu seu interesse pela vida pública? Como iniciou sua trajetória na carreira política? – Minha trajetória de vida sempre esteve ligada a atividades públicas. Desde criança acompanhei meu pai, Armando Vergilio, em ações públicas, como na criação e na estruturação do Sindicato dos Corretores de Seguros de Goiás (Sincor-GO), que tem praticamente a minha idade.

Aceitei encampar a luta da categoria e trabalhar na Câmara para evitar que uma injustiça fosse cometida.

relevância para a sociedade, como: seguros de vida, terceirização, previdência privada e farmácia popular. também foi relator de outros importantes projetos, que já foram aprovados em comissões da câmara.

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Hoje, com muito orgulho, sou um dos vice-presidentes da entidade. Meu pai também ocupou vários cargos públicos em Goiás e Brasília. No Estado de Goiás, assumiu várias secretarias antes de ser eleito deputado federal, em 2010. Sempre acompanhei seu trabalho. Essa vivência, principalmente na Câmara dos Deputados, me deu a experiência necessária para iniciar meu primeiro trabalho com mandato eletivo. Em 2014, fui eleito o deputado federal mais jovem do meu estado. Estava, então, com 27 anos. Como foi a chegada à Câmara dos Deputados? O que o senhor esperava encontrar e o que o surpreendeu ao assumir a função de deputado federal? – A indicação do meu nome para disputar um mandato de deputado federal nas eleições de 2014 se deu durante a formação de chapa para concorrer ao governo de Goiás em 2014, ocasião em que meu pai saiu como candidato a vice do ex-governador, Iris Rezende, do PMDB. Eu já tinha certa familiaridade com a Câmara graças à ação do meu pai como deputado federal na legislatura de 2011 a 2014, pois, como disse, sempre acompanhei seu trabalho, no qual, aliás, eu me espelho. O trabalho na Câmara não me surpreendeu, mas convém lembrar que requer muito conhecimento técnico sobre a tramitação dos projetos nas diversas comissões e no Plenário da Casa. Exige também bastante habilidade na articula-

ção política, para construir os acordos e apoios necessários para a aprovação das matérias. Quais são as principais bandeiras de defesa do senhor no Parlamento? Quais são os temas mais tratados em seu mandato? – Como exerci a profissão de corretor de seguros, acho muito natural representar e defender as bandeiras desse segmento na Câmara dos Deputados. Há, aliás, em discussão, muitas questões sobre a legislação que rege esse setor, e sou, aliás, uma das principais referências para as diversas entidades de seguro privado do País na Casa. Mas a ação parlamentar é bem mais ampla. Um dos trabalhos que considero relevante é a destinação de recursos do Orçamento da União – por meio de emendas parlamentares a que temos direito – a obras e à compra de equipamentos para vários municípios e instituições do estado. Ademais, tenho vários projetos em tramitação na Câmara que atendem a outros segmentos da sociedade. E há o trabalho, não menos importante, de receber os representantes dos mais distintos segmentos sociais e encaminhar suas solicitações. Foi o que se deu, por exemplo, com os representantes do Movimento dos Advogados Públicos Federais Aposentados (Mapa), que me procuraram para discutir a emenda que garantiria o pagamento dos honorários de sucumbência para a categoria.

O deputado federal Lucas Vergilio ressalta que, entre as mais de 50 emendas apresentadas, a única acatada no Plenário foi a que estendeu a percepção dos honorários sucumbenciais aos advogados públicos aposentados 12

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É de suma importância a mobilização dos representantes dos advogados públicos, para que detalhes relevantes e de interesse da categoria possam ser levantados e, se for o caso, as falhas possam ser sanadas.

Em que situação se deu o primeiro contato com a Advocacia Pública? O que levou o senhor a atuar em defesa dos advogados públicos? – O primeiro encontro foi no meu escritório político de Goiânia, no início de abril, após o senhor Antônio Augusto solicitar audiência em nome do MAPA. Fizemos uma discussão do projeto do governo de reajuste dos salários dos servidores públicos federais que tramitava na Câmara dos Deputados e foi mostrado por eles a injustiça que seria a proposta ser aprovada na forma original do governo. A partir dali aceitei encampar a luta da categoria e trabalhar na Câmara para reverter a situação. O senhor foi o autor do substitutivo apresentado em Plenário pela inclusão dos advogados públicos aposentados na percepção dos honorários sucumbenciais. Por que o senhor decidiu apresentá-lo? – Reforçando o que disse, fui convencido pelos advogados públicos federais de que a aprovação do projeto nos termos da versão original do governo representaria uma grande injustiça. Com efeito, os honorários de sucumbência não representam o trabalho de um só dia, mas de anos de acompanhamento da tramitação de ações. Portanto, nada mais justo que esses advogados aposentados, que, ao longo do tempo, haviam atuado para que ações se revertessem em favor do governo, fossem beneficiados. Como era o clima da Câmara naquele dia de votação? O que o senhor pressentia observando os seus pares? – Na Câmara, requer-se muita atenção na tramitação e na votação dos projetos, porque o que estava acertado no início da sessão plenária pode, em seguida, ser mudado, por acordo de lideranças. O clima na véspera e até o dia da votação dos reajustes para os servidores era de muita mobilização por parte das di-

versas entidades representativas, e até mesmo de certa apreensão, pois o previsto era votar apenas parte das propostas que estavam na mesa da Presidência. Mas, no dia da votação, por pressão das bancadas, decidiuse por colocar em votação o conjunto das propostas. Nesse momento, decidi que era chegada a hora de convencer os colegas parlamentares simpatizantes com a causa dos advogados públicos aposentados a garantir a inclusão e a aprovação da emenda que viria a beneficiar a categoria. Vale ressaltar que foi a única emenda acatada entre as mais de 50 apresentadas. Como o senhor avalia a atuação dos advogados públicos aqui na Casa? Qual a importância da atividade diária e ativa nos corredores do Parlamento? – A atuação dos advogados públicos, bem como de outras categorias na Câmara, é de fundamental importância. É graças a essa atuação que se fazem conquistas, como essa dos honorários de sucumbência. Com base apenas na estrutura de gabinete, seria impossível atentarmos para todos os detalhes das centenas de projetos e demais proposituras em tramitação na Casa. É, então, de suma importância a presença dos representantes dos advogados públicos nos corredores, nos gabinetes, para que detalhes relevantes e de interesse da categoria possam ser levantados e, se for o caso, as falhas possam ser sanadas. Atualmente, há outros pleitos tramitando na Câmara dos Deputados, como as PECs 82/2007 e 443/2009, ambas prontas para a apreciação do Plenário. O senhor acredita que elas sejam apreciadas em breve?– A PEC 443/2009, que vincula o salário da Advocacia-Geral da União (AGU), da carreira de delegado da Polícia Federal, das carreiras de delegado de reVista

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Polícia Civil dos estados e do Distrito Federal e dos procuradores municipais a 90,25% do subsídio dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), já foi aprovada pela Câmara dos Deputados em primeiro turno, ainda em 2015. O segundo turno ocorrerá, entretanto, somente depois de aprovada e promulgada outra PEC (172/2012), em tramitação no Senado Federal, que proíbe o repasse a estados e municípios de encargos sem o respectivo recurso necessário. Esse foi o acordo firmado em agosto de 2015, que precisa ser referendado pelo presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, e pelas lideranças partidárias, além do governo Temer. A PEC 172/2012 faz parte do debate sobre novos parâmetros relacionados ao pacto federativo. Já a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 82/2007, que dá autonomia administrativa e financeira à Advocacia-Geral da União (AGU) e às procuradorias dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, ainda aguarda inclusão na ordem do dia do Plenário da Câmara dos Deputados. A Proposta recebeu um substitutivo apresentado pelo deputado Lelo Coimbra (PMDB-ES), aprovado em maio de 2014, pela comissão especial que analisou a PEC. Entendo como muito importante a autonomia da AGU, órgão responsável pela representação judicial da União e pela consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo. Os advogados públicos são os únicos do sistema jurídico que ainda não têm autonomia, já que o financiamento desses órgãos é contin-

genciado pelo Ministério do Planejamento, ou seja, fica limitado à programação financeira do governo. E essa situação dificulta a estruturação das advocacias públicas, impedindo que elas funcionem a contento, razão pela qual essa PEC precisa ser pautada ainda neste ano. O senhor foi homenageado em Goiânia pela sua atuação em defesa dos pleitos dos advogados públicos. Como se sentiu ao ser homenageado? – Ah, se fosse para resumir em uma palavra, eu diria emoção. É gratificante sentir o reconhecimento pelo trabalho que a gente desenvolve como parlamentar, às vezes enfrentando muitas incompreensões. Mas, conforme eu disse aos representantes das entidades ligadas aos advogados públicos da União, durante a comemoração, considero nossa ação pequena em comparação com o conjunto de conquistas alcançadas por eles. O que indiscutivelmente foi determinante para o sucesso foi a mobilização dos advogados públicos, o acompanhamento da tramitação do projeto e o trabalho corpo a corpo realizado na Câmara, de convencimento dos deputados. Eu fui apenas o canal para que uma justa reivindicação – a emenda ao projeto do governo – fosse apresentada e aprovada. Expresso aqui meu agradecimento a todos pela homenagem recebida, ao mesmo tempo em que reitero que o gabinete e toda a minha equipe estão à disposição para o recebimento de futuras demandas.

Lucas Vergilio acompanha na Câmara Federal a tramitação de duas PECs de interesse da Advocacia Pública: a 443/2009, que altera o salário de várias carreiras, entre elas a dos advogados públicos, e a 82/2007, que dá autonomia administrativa e financeira à AdvocaciaGeral da União e às procuradorias dos estados, do Distrito Federal e dos municípios

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ARtIGo

Histórico da Previdência Social e questões atinentes a uma nova reforma desde a promulgação da constituição Federal de 1988 foram aprovadas seis emendas à constituição, com mudanças na Previdência social, nos três regimes: geral, Próprio e complementar. correspondem às emendas constitucionais (e.c.) nºs 3/1993, 20/1998, 41/2003, 47/2005, 70/2112 e 88/2115.

A

E.C. nº 3/1993, promulgada durante o Governo Itamar Franco, instituiu o caráter contributivo da Previdência no Serviço Público, ao determinar que “as aposentadorias e pensões dos servidores públicos federais serão custeadas com recursos provenientes da União e das contribuições dos servidores, na forma da lei”. A E.C. nº 20/1998, aprovada durante o Governo FHC, promoveu ampla reforma da Previdência: I – Para todos os regimes: a) a instituição de critérios financeiros e atuariais nos regimes previdenciários; b) a substituição do tempo de serviço por tempo de contribuição; c) o fim da aposentadoria especial do professor universitário; d) a extinção da aposentadoria proporcional. II – Para os servidores públicos: a) a adoção de idade mínima, sendo de 55 para mulheres e 60 para homens na regra permanente, com redução de sete anos na regra de transição; b) a exigência de dez anos no serviço público, e cinco no cargo; c) a previsão de adoção, por lei complementar, da previdência complementar para os servidores públicos.

A E.C. nº 41/2003, no Governo Lula, ampliou as exigências da reforma anterior em relação aos servidores públicos: a) a ampliação de dez para 20 anos do tempo de permanência no serviço público para aposentadoria integral do servidor que ingressou no serviço público até 31/12/2003;

b) o fim das regras de transição da E.C. 20; c) a instituição do redutor de pensão; d) o fim da paridade para novos servidores; e) o fim da integralidade para novos servidores, com cálculo pela média; f) a instituição da cobrança de contribuição de aposentados e pensionistas, incidente sobre a parcela acima do teto do RGPS; g) a adoção de tetos e subtetos na administração pública; h) a previsão de adoção, por lei ordinária, da previdência complementar do servidor.

A E.C. nº 47/2005, aprovada também durante o Governo Lula, suaviza os efeitos perversos da E.C. nº 41/2003 e institui regra de transição, em relação a: a) paridade e integralidade, desde que o servidor conte com mais de 25 anos de serviço público, com redução da idade mínima de 60 anos para homens e 55 para mulheres caso a soma da idade com o tempo de serviço supere a fórmula 85/95, sendo indispensável pelo menos 35 de contribuição, no caso do servidor (homem), e 30, no caso da servidora (mulher); b) isenção do dobro do teto do INSS na parcela do provento de aposentadoria ou pensão quando o beneficiário for portador de doença incapacitante.

A E.C. nº 70/2012, aprovada no Governo Dilma, assegura a integralidade para a aposentadoria por invalidez, porém só abrange quem ingressou no serviço púbico até 31 de dezembro de 2003. A E.C. nº 88/2015, também aprovada durante o Governo Dilma, amplia de 70 para 75 anos a idade para efeito de aposentadoria compulsória.

No plano infraconstitucional, houve dezenas de mudanças em matéria previdenciária nos últimos 20 anos, duas das quais só no ano de 2015. Uma das mudanças foi o fim da vitaliciedade da pensão. reVista

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ANTÔNIO AUGUSTO DE QUEIROZ *

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a) pelo menos 18 contribuições mensais ao regime previdenciário; b) pelo menos dois anos de casamento ou união estável anteriores ao óbito do segurado, que assegurem ao pensionista/ beneficiário o direito de usufruir do benef ício: 1) por três anos, se tiver menos de 21 anos de idade; 2) por seis anos, se tiver entre 21 e 26 anos de idade; 3) por dez anos, se tiver entre 27 e 29 anos de idade; 4) por 15 anos, se tiver entre 30 e 40 anos de idade; 5) por 20 anos, se tiver entre 41 e 43 anos de idade; 6) vitalício, se tiver mais de 44 anos de idade.

A mudança positiva foi a flexibilização do fator previdenciário. Ela foi instituída pela Medida Provisória nº 676 e transformada na Lei nº 13.183/2015, com o objetivo de amenizar os efeitos perversos do fator previdenciário, e permitir, alternativamente, que o segurado possa garantir a aposentadoria sem o redutor, se atender aos requisitos da fórmula 85/95. A fórmula consiste na soma do tempo de contribuição com a idade, desde que o segurado conte com pelo menos 30 anos de contribuição, se mulher, e pelo menos 35 anos de contribuição, se homem. A fórmula 85/95 será aumentada, gradualmente, para 95/100 até o ano de 2027, na seguinte proporção: a) 86/96, a partir de 31 de dezembro de 2018; b) 87/97, a partir de 31 de dezembro de 2020; c) 88/98, a partir de 31 de dezembro de 2022; d) 89/99, a partir de 31 de dezembro de 2024; e e) 95/100, a partir de 31 de dezembro de 2026. Como, pela regra do fator, ninguém consegue chegar à integralidade com menos de 60 anos de idade, mesmo com a fórmula progressiva, a nova regra beneficia quem ingressou mais cedo no mercado de trabalho. A fórmula 85/95 já tinha sido instituída para o servidor público pela E.C. 47/2005. 16

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A fórmula 85/95 consiste na soma do tempo de contribuição com a idade, desde que o segurado conte com pelo menos 30 anos de contribuição, se mulher, e pelo menos 35 anos de contribuição, se homem.

No plano infraconstitucional, houve dezenas de mudanças em matéria previdenciária nos últimos 20 anos, duas das quais só no ano de 2015, sendo uma negativa e a outra positiva. A mudança negativa foi o fim da vitaliciedade da pensão. Ela foi instituída pela Medida Provisória nº 664 e transformada na Lei nº 13.135/2015, para assegurar apenas quatro meses de benef ício para o pensionista, caso ele não preencha as novas exigências ou requisitos. De acordo com a nova regra, válida para os regimes Geral e Próprio dos servidores, a pensão por morte será devida para além dos quatro meses – e condicionada à idade do beneficiário – somente se forem comprovadas as seguintes carências:

Pois bem, antes mesmo da efetivação das mudanças constitucionais e infraconstitucionais, já se discute uma nova reforma da Previdência, na qual seriam feitas mudanças profundas para garantir “sustentabilidade” ao sistema de Previdência. Entre as mudanças em debate no Governo Michel Temer, segundo a opinião de aliados do presidente interino, constariam as seguintes: a) adoção de idade mínima para a aposentadoria por tempo de contribuição dos segurados do INSS e aumento da idade mínima para os servidores públicos, exceto em caso de invalidez e de aposentadoria especial; (mudança constitucional) b) fixação da idade mínima em 65 anos para os regimes Geral e Próprio, bem como para os trabalhadores urbanos e rurais de ambos os sexos; (mudança constitucional) c) equiparação, de modo gradual, do diferencial do tempo de contribuição das mulheres ao dos homens, bem como dos trabalhadores urbanos e rurais, na aposentadoria por tempo de contribuição; (mudança constitucional) d) ampliação da carência para efeito de aposentadoria por idade, que hoje é de 15 anos; (mudança infraconstitucional, lei ordinária) e) ampliação do tempo de contribuição para efeito de aposentadoria especial; (mudança infraconstitucional, lei complementar) f) aposentadoria por idade: aumento de 60 anos, para mulher, e de 65 anos, para homem, para algo entre 70 e 75 anos para ambos os sexos, incluindo os trabalhadores rurais; (mudança constitucional) g) instituição de novo redutor na pensão, com previsão de 50% do valor do benefício, acrescido de 10% por dependente; h) distinção entre o piso dos benefícios previdenciários e o piso dos benefícios assistenciais, incluindo aí as aposentadorias rurais; (mudança constitucional) i) proibição do acúmulo de aposentadorias, e destas com pensões; (mudança constitucional) j) aumento do valor da contribuição previdenciária, especialmente a do servidor público; (mudança infraconstitucional, lei ordinária)


Essas perspectivas de mudança podem parecer exagero, mas que não se subestime o Governo Temer, nem em sua disposição de propor mudanças com esse escopo, nem em sua capacidade de reunir apoio para aprová-las no Congresso. E há várias razões para isso. Trata-se de um governo integrado por partidos e pessoas conservadoras e comprometidas com uma agenda neoliberal, expressa na chamada “ponte para o futuro”, que propõe, entre outras mudanças: a) a desindexação geral, inclusive dos reajustes do salário mínimo e dos benef ícios previdenciários; b) a desvinculação orçamentária, desobrigando a União, os estados e os municípios de gastar percentuais da sua receita com saúde, educação e ciência e tecnologia; c) a privatização selvagem, com venda de ativos para compor superávit primário; d) a melhoria do ambiente de negócios, a partir da flexibilização dos direitos trabalhistas; e) a nova reforma da Previdência, que propõe, entre outras coisas, o aumento da idade mínima para a aposentadoria.

Com a base de que dispõe, o governo não terá dificuldades de encampar medidas impopulares, a começar pelo próprio presidente interino. Vale lembrar que foi o então deputado Michel Temer quem relatou, em plenário, a reforma da Previdência do Governo FHC, transformada na Emenda Constitucional nº 20, que suprimiu diversos direitos dos segurados do INSS e do Regime Próprio dos servidores. Se o seu parecer tivesse sido aprovado naquela época, muito dos pontos acima citados já estariam valendo desde 1998! Foi também Michel Temer, na condição de vicepresidente da República, quem pilotou a aprovação no Congresso, como coordenador político do Governo Dilma, das medidas provisórias nº 664 e nº 665, que eliminaram o caráter vitalício das pensões, restringiram o acesso ao seguro-desemprego, ao seguro-defeso e ao abono salarial, além de terem modificado o cálculo do auxílio-doença, entre outras restrições ou supressões

Que não se subestime o Governo Temer, nem em sua disposição de propor mudanças com esse escopo, nem em sua capacidade de reunir apoio para aprová-las no Congresso.

de direitos. A redução no valor das pensões só não foi aprovada em virtude da resistência de alguns parlamentares, como o então líder do governo no Congresso e ex-ministro da Previdência José Pimentel, que defendeu a inconstitucionalidade da redução. Aliás, uma das primeiras medidas de seu governo foi incorporar a Previdência Social no Ministério da Fazenda, transferindo para o domínio da equipe econômica, além da arrecadação previdenciária, que já estava sob o controle da Secretaria da Receita Federal do Brasil, o poder de formular políticas públicas em matéria previdenciária, o que é um verdadeiro despropósito. Acrescente-se mais um fato: as equipes econômicas, além de desconhecerem a complexidade dos regimes previdenciários do ponto de vista dos direitos que asseguram, não têm a mesma sensibilidade da área social, sendo seu raciocínio orientado exclusivamente para a questão fiscal, preocupadas que elas estão com o corte de gastos. Isso significa que o caráter solidário tenderá a desaparecer. O que vai prevalecer é uma visão puramente financeira e atuarial, e com foco apenas na receita das contribuições previdenciárias dos empregados e empregadores, sem considerar a participação da sociedade, por meio das contribuições sociais e dos demais tributos sobre o consumo e a renda. Quanto ao eventual apoio no Congresso, basta lembrar que o novo governo conta com uma enorme base de sustentação, tendo como oposição real apenas o PT, o PCdoB, o PDT, o Psol e o Rede Sustentabilidade, partidos que, juntos, somam no máximo 100 deputados. É claro que um tema polêmico e complexo como a reforma da Previdência pode provocar dissidências na base, mas isso vai requerer muito esforço, mobilização e pressão sobre os parlamentares. Por tudo que foi exposto, não resta nenhuma dúvida quanto à disposição governamental de realizar a reforma da Previdência, tanto no que respeita ao seu conteúdo – que será puramente fiscalizador, voltado, então, para a redução de despesas com benef ícios previdenciários –, quanto no que concerne ao empenho para a sua efetivação. E esse propósito já se mostra na entrega da condução desse processo ao Ministério da Fazenda – esse já deixou claro que, qualquer que seja o resultado das discussões com as entidades sindicais, enviará em curto prazo a reforma da Previdência ao Congresso.

* Jornalista, analista político e diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) e assessor parlamentar da Anajur. reVista

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NoRMAS dA AGu

Normas de interesse dos membros da Advocacia-Geral da União na última edição da Revista Anajur, expusemos as ações normativas no âmbito da advocaciageral da União que são de interesse da advocacia Pública. nesta edição, selecionamos três ações implantadas ou anunciadas pela agU, entre os meses de abril e junho de 2016.

AGu orienta sobre restabelecimento de benefícios previdenciários Em norma publicada no Diário Oficial da União do dia 26 de abril deste ano, a Advocacia-Geral da União apresentou uma série de orientações aos órgãos de execução da Procuradoria-Geral Federal sobre processos que tratem da concessão do restabelecimento de benef ícios previdenciários por incapacidade. A Portaria nº 258/2016 ainda estabelece diretrizes para acordos judiciais que tratem do tema. O benef ício por incapacidade a que se refere aquela norma está previsto na Lei nº 8.213/1991, que trata dos planos de benef ícios da Previdência Social. Sobre a aposentadoria para os casos de incapacidade, o art. 42 da lei mencionada destaca: A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.

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A lei ainda prevê que a concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de incapacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o segurado, a sua expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança. Desse modo, a portaria da AGU estabelece que: Art. 2º Nas ações em que houver a designação de médico perito como assistente técnico do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, o Procurador Federal oficiante atuará em juízo levando em consideração os laudos e subsídios fáticos apresentados pelo assistente técnico. Parágrafo único. Tendo o médico perito judicial reconhecido a existência de incapacidade laboral, poderá o Procurador Federal oficiante celebrar acordo judicial, reconhecer o pedido e não recorrer, quando a controvérsia entre laudos versar apenas sobre a incapacidade ou seu tempo de duração, observadas as orientações do Advogado-Geral da União ou do Procurador-Geral Federal.

A portaria recomenda atenção aos laudos judiciais, estabelecendo que, no caso específico do auxílio-doença, o Procurador Federal oficiante poderá deixar de recorrer de sentença ou de decisão judicial, inclusive as que concedam tutela provisória, quando o laudo do perito judicial tiver constatado a existência de incapacidade e a decisão ou sentença judicial tiver fixado a data de cessação do benef ício.

Já em âmbito recursal, a portaria permite que as procuradorias regionais federais e as procuradorias federais nos estados possam organizar mutirões e aderir a eles nos respectivos tribunais regionais federais, nos tribunais de justiça e nas turmas recursais, para o oferecimento de acordos sobre o restabelecimento do benefício.

NorMASNoNromrmaass

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Procedimentos relativos à atuação judicial e extrajudicial em prestação de contas eleitorais O ano de 2016 é um ano eleitoral. Em outubro, serão escolhidos os chefes dos executivos municipais e os membros das câmaras legislativas locais. Cabe, então, à Advocacia-Geral da União atuar na cobrança dos valores decorrentes de ações da Justiça Eleitoral que tratam de prestações de contas eleitorais. Os valores são apurados em favor do Tesouro Nacional ou do Fundo Partidário. Em maio deste ano, a Advocacia-Geral da União publicou a Portaria nº 2, de 12 de maio de 2016, que disciplinou o procedimento dessas cobranças, tanto no âmbito judicial quanto no extrajudicial. De acordo com a norma, depois de a sentença ter transitado em julgado no órgão da justiça eleitoral que determine o recolhimento, será aberto um prazo de 15 dias para que seja feito tal pagamento. Frustrada essa expectativa, os autos serão encaminhados para os órgãos competentes da AGU, para a execução do título judicial. A norma prevê um juízo prévio dos membros da AGU que estiverem de posse dos processos. Assim dispõe a norma: Art. 5º Ao receber os autos, o órgão de execução da PGU, previamente à instauração da fase de cumprimento de

sentença, deverá adotar medidas extrajudiciais, visando à satisfação do crédito, especialmente: I – avaliar a conformidade dos valores informados, pela Secretaria Judiciária do Tribunal ou pelo Cartório Eleitoral, no memorial demonstrativo do débito, saneando-o, se for o caso; II – expedir of ício ao devedor, informando que a Justiça Eleitoral requisitou a atuação da Advocacia-Geral da União na condução do processo de cobrança do valor apontado na decisão, ocasião em que deverá estipular prazo para pagamento voluntário da obrigação.

A portaria destaca que, no of ício a ser encaminhado ao devedor, ele deverá ser alertado de que, na falta de pagamento voluntário da dívida, ela será acrescida em até 20%, a título de multa processual, e de honorários advocatícios, além do que a sentença poderá ser levada a protesto, nos termos dos arts. 517 e 523, § 1º, do CPC. Se nenhuma medida extrajudicial for capaz de satisfazer o pagamento da dívida, o membro da AGU deverá passar para a fase de cumprimento de sentença, requerendo, na falta de pagamento voluntário da obrigação, a expedição, desde logo, de mandado de penhora e avaliação, seguindo-se os atos de expropriação.

Cartilhas para a defesa de agentes do estado Entre as atribuições da Advocacia-Geral da União consta a defesa dos agentes públicos, considerando sua função de guardiã do Erário brasileiro. Em algumas hipóteses, para defender o Erário, é preciso que se realize a defesa do agente público autor daquele ato, atestando a legalidade de sua conduta. Pergunta-se, então, quando entraria a figura do advogado público na defesa de uma pessoa? Para auxiliar os membros da AGU a identificar as situações e a atuar na defesa dos agentes, foram editadas duas cartilhas, que esclarecem os fundamentos da atuação de advogados públicos em defesa de agentes do Estado. Um dos documentos é a cartilha Representação de agentes públicos pela Advocacia-Geral da União, que detalha os requisitos para que a AGU preste o asses-

soramento a agentes acionados, administrativa ou judicialmente, por atos funcionais, em nome do interesse público. Um dos objetivos é evitar que, nos casos em que o ato praticado pelo agente, com vista ao interesse público, o servidor tenha a salvaguarda de ser defendido por um advogado público. A cartilha é composta de três capítulos. O segundo produto é o Manual de representação extrajudicial de órgãos e agentes públicos da Consultoria-Geral da União da AGU, que apresenta as principais questões que envolvem a representação extrajudicial exercida pela Consultoria-Geral da União (CGU), órgão da Advocacia-Geral. As duas publicações estão disponíveis no site da Advocacia-Geral da União. reVista

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Ação pARL AMeNtAR

Projeto de lei cria normas de proteção a vítimas e testemunhas de violência na câmara dos deputados tramita o Projeto de lei nº 3.792, de 2015, que estabelece o sistema de garantia de direitos de crianças e adolescentes vítimas e testemunhas de violência. além de normatizar e organizar esse sistema, cria mecanismos para prevenir e coibir a violência, nos termos do art. 227 da constituição da República, da convenção sobre os direitos da criança, do Protocolo Facultativo para a convenção sobre os direitos da criança que trata da venda de crianças, prostituição e pornografia infantis, e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil. estabelece também medidas de assistência e proteção às crianças e adolescentes em situação de violência e dispõe sobre a criação de órgãos especializados em crimes contra crianças e adolescentes.

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disposto no projeto de lei, se aprovado, representará um avanço nas medidas de proteção dos jovens e respeito à sua dignidade. Cria-se a obrigação, para qualquer pessoa, de denunciar às autoridades todo tipo de violência – f ísica, psicológica, sexual ou institucional – contra a criança e o adolescente de que tenha conhecimento, de forma que a sociedade, de modo geral, passa a ser efetivamente responsável pela proteção à criança e ao adolescente. Crianças e adolescentes vítimas de violência, especialmente sexual, só poderão ser ouvidos por profissionais devidamente capacitados, dos órgãos da saúde, da assistência social e da segurança, responsáveis diretamente pelo atendimento dessas situações. 20

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Atualmente, o depoimento da vítima ou testemunha com menos de 18 anos não é cercado dessas garantias e, na maior parte das vezes, esses jovens acabam passando por processos traumáticos, com repetidas oitivas e sem ambiente adequado ao resguardo de sua integridade psicológica e emocional. O projeto de lei, que é uma iniciativa da deputada federal Maria do Rosário (PT-RS), também prevê serviços de saúde específicos para o atendimento de crianças e adolescentes vítimas de violência, oferecendo, para tanto, atendimento humanizado, observados os princípios do respeito da dignidade da pessoa humana, da não discriminação, do sigilo e da privacidade. Outro aspecto igualmente importante diz respeito a medidas de proteção complementares àquelas, como evitar o contato direto entre a criança ou adolescente vítima ou testemunha de violência e o acusado ou indiciado, solicitar o afastamento do investigado da residência, em se tratando de pessoa da família, requerer a prisão preventiva do investigado, quando houver suficientes indícios de ameaça à criança ou ao adolescente vítima ou testemunha de violência e incluir a criança ou o adolescente vítima ou testemunha de violência em programa de proteção. Em face desses aspectos contidos na proposta legislativa, é importante que se imprima celeridade ao Projeto de Lei nº 3.792/2015, para que essas alterações possam ser inseridas na legislação atual com a maior rapidez possível.

Aprovado, o projeto de lei representará um avanço nas medidas de proteção dos jovens vítimas de violência e respeito à sua dignidade.

MARIA HELENA VERONESE*


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Trabalhamos para que o Projeto de Lei nº 3.792/2015 seja apreciado com rapidez e que, ao final, venha a ser aprovado como medida de proteção às crianças e adolescentes do nosso país.

Se o nosso sistema de atendimento a crianças vítimas de violência ou testemunhas desses atos não proporcionar a devida proteção e resguardo à saúde e à integridade desses jovens, não conseguiremos avançar no combate a esses delitos e na sua consequente punição, nem seremos capazes de impedir o processo de revitimização. Esse projeto conta com o apoio de autoridades de diversos setores envolvidos no tratamento dessas questões, como membros do Ministério Público, conselheiros tutelares, policiais, magistrados, psicólogos e assistentes sociais. Desse modo, reiteramos pleno apoio à aprovação desse projeto de lei, que contribuirá sobremaneira para prevenir e punir adequadamente os atos de violência contra crianças e adolescentes, além de implantar medidas eficientes de proteção à dignidade e à integridade desses jovens, vítimas de violência ou testemunhas desses crimes.

Trabalhamos para que o Projeto de Lei nº 3.792/2015 seja apreciado com rapidez e que, ao final, venha a ser aprovado como medida de proteção às crianças e adolescentes do nosso país. *Deputada federal (PSB/RR) e associada da Anajur.

ASSoCiADo, AtuALiZe oS SeuS DADoS com o propósito de estreitarmos o nosso relacionamento, é importante que o associado comunique, de imediato, quaisquer alterações cadastrais, por meio dos telefones pABX: (61) 3322-9054, ramal 4, fax (61) 3322-6527 e/ou e-mail: anajur1986@gmail.com

Contamos com a sua colaboração! reVista

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saúde

Benefícios da atividade física para o bem-estar do coração a prática de exercícios físicos tem crescido no Brasil, tanto em academias particulares como em equipamentos instalados em áreas públicas. Isso é muito bom, argumenta o cardiologista Daniel França, responsável pela linha cardiovascular do Hospital Universitário da Universidade de Brasília (UnB). nesta entrevista à Revista Anajur, ele fala sobre o tipo e a intensidade das atividades físicas recomendadas para prevenir doenças cardíacas, bem como sobre os exercícios que devem integrar o tratamento de quem já apresenta problemas cardiovasculares.

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Qual a relação entre a prática de exercícios físicos e doenças cardiovasculares? – São dois cenários. No primeiro, tem-se o indivíduo sem doença cardiovascular; para ele, o exercício físico entra como atividade preventiva. No segundo, o indivíduo já tem uma doença cardiovascular; aí, o exercício faz, necessariamente, parte do tratamento.

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No primeiro caso, que tipo de exercício serve para prevenir doenças cardíacas? – Antes de tudo, cabe entender o que é ser saudável. É ter uma alimentação equilibrada, é dormir bem, é não se expor em demasia ao estresse e é praticar exercícios físicos. para o indivíduo que atende a esses requisitos, a gente recomenda o exercício aeróbico, cientificamente comprovado como saudável. A musculação, que é um exercício isométrico, também faz parte desses exercícios, mas não deve ser o único foco. A ela também devem ser associadas outras atividades, que trabalham a flexibilidade e o alongamento, como pilates e RpG. o ideal é que se pratiquem todas elas. ou, então, que se opte pela natação, exercício considerado completo. com efeito, pela natação, desenvolve-se a flexibilidade, a musculação e a atividade aeróbica, além de trabalhar a respiração. Mas, de qualquer forma, o exercício com esse perfil é saudável e reduz o desenvolvimento de doença cardiovascular e de outras doenças, como câncer e doenças crônicas degenerativas. para quem pratica atividade física regular, a prevalência e a incidência dessas doenças diminuem sensivelmente. Como o exercício atua no organismo, chegando até mesmo a prevenir o câncer? – os benefícios são incontáveis. Quando faz exercícios físicos, você interfere na atividade metabólica e reduz os radicais livres, que são nocivos, pois tanto desenvolvem doenças cardiovasculares quanto doenças neoplásicas. diminui a destruição celular e renova funcionalmente os tecidos. É como se o condicionamento alcançasse para além do indivíduo que o pratica, chegando a atuar no nível celular. A célula vai se acostumando a ele. enfim, o exercício provoca atividades funcionais saudáveis dentro do organismo, além de liberar a endorfina, o que dá a sensação de bem-estar. Na verdade, a prática de um exercício regular provoca várias mudanças no comportamento bioquímico e celular, e até mesmo genético, tudo isso promovendo a saúde do indivíduo.

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Quando uma academia condiciona a liberação da atividade física à entrega de um atestado médico, ela está fazendo mais mal do que bem.

o senhor aconselha tomar algum tipo de cuidado antes de iniciar uma atividade física? – esse é um assunto bastante pertinente nos dias atuais. As academias exigem atestado de saúde dos alunos, para atender a uma exigência legal, condição essa, aliás, que atualmente está sendo revista. Quando uma academia condiciona a liberação da atividade física à entrega de um atestado médico, ela está fazendo mais mal do que bem. Vejamos então como isso se dá. Aquele indivíduo que quer se inscrever numa academia e pode pagar uma consulta médica particular, não terá dificuldade de conseguir um atestado. Mas, para quem só pode recorrer à rede pública, o atestado médico é um empecilho. Se essa pessoa sequer consegue uma consulta para tratar problemas de saúde, imagine, então, como conseguiria uma avaliação preventiva?! Além desse fator discriminativo, que dá acesso a um benefício a um cidadão, mas o nega a outro, há outra questão a verificar. Impedir o acesso de um aluno a atividades físicas por causa da falta de atestado é pior do que correr o risco de esse mesmo aluno sofrer mal-estar durante os exercícios. Se o risco é representado pelo grau do tipo de exercício praticado, que se tomem, então, providências para que as pessoas façam exercícios de maneira cuidadosa e orientada. Isso é muito melhor do que privá-las dos benefícios dele. digo e

repito: fazer exercícios é melhor do que não fazer. Isso é uma coisa bem definida na ciência médica. Então, que tipo de exercício e em que quantidade deve ser feito? – Se o indivíduo não se queixa de nada, pode fazer, sem riscos, exercícios de intensidade baixa moderada, como uma caminhada. essa atividade não exige nenhum preparo. Não sendo deficiente físico ou portador de necessidade especial, ele poderá praticar a caminhada regularmente. em termos de proteção cardiovascular, a caminhada é um santo remédio. Basta caminhar por aproximadamente 2 horas e meia a 3 horas por semana. esse tempo, distribuído ao longo da semana, representa apenas meia hora de caminhada por dia. Mas cabe aqui uma observação. A gente sempre orienta que todo tipo de exercício seja precedido de alongamento, para proteger as articulações. Nossa preocupação maior é com exercícios que provocam impacto ósseo-muscular, porque eles podem gerar lesões ortopédicas e, assim, impedir que o praticante volte a fazer exercícios. Esses exercícios são suficientes para prevenir doenças cardiovasculares? – Vamos pensar assim: não fazer exercícios é ruim; fazer poucos exercícios é um pouco melhor; e o benefício vai aumentando à proporção que se intensifica a prática dos exercícios. reVista

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É claro que, quanto mais praticar, melhor será. Agora, quanto ao tipo de exercício a fazer – de intensidade moderada, de intensidade baixa e de alta intensidade –, esse tema faz parte de outra discussão. A caminhada resolve. Se puder fazer caminhada, alternando-a com corrida de baixa intensidade, tanto melhor! Mas aí vêm as ressalvas. por exemplo, se a pessoa está com sobrepeso, a corrida vai aumentar o grau de impacto e, consequentemente, a pessoa poderá sofrer lesão. para quem está acostumado a fazer exercícios, o organismo não se ressente porque já está preparado; mas, para quem nunca o fez, o ideal é começar com um exercício de intensidade baixa, enquanto tenta reduzir o peso corporal. A partir dessa redução, a pessoa já vai poder alternar a baixa intensidade com a intensidade moderada e, mais na frente, com a alta intensidade. Isso traz não só proteção, como também bem-estar. Quem faz exercícios regularmente tem baixa chance de desenvolver hipertensão arterial, de apresentar colesterol acima dos níveis normais e de desenvolver diabetes. os exercícios beneficiam até mesmo quem fuma ou bebe, já que, com a sua prática, vai acabar fumando ou bebendo menos. São benefícios secundários, que são alcançados com a atividade física. e tem mais: o praticante passa a dormir melhor e comer menos e de forma mais equilibrada. e, assim, acaba consumindo menos cigarro e menos álcool. Várias coisas estão acopladas ao estilo de vida que o indivíduo incorpora a partir do momento que adere à prática de exercícios. e o que aconselha para as pessoas que têm doenças cardiovasculares? – Há doenças com o acometimento do coração e doenças sem o acometimento do coração. doenças sem o acometimento são representadas por hipertensão, colesterol alto e açúcar um pouco aumentado. para essas pessoas, o exercício faz parte do tratamento. Se esse paciente fizer exercícios, vai abaixar de 4 a 6 milímetros em

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Os exercícios beneficiam até mesmo quem fuma ou bebe, já que, com a sua prática, vai acabar fumando ou bebendo menos. abr/mai/jun 2016

termos de mercúrio, a pressão máxima, e de 2 a 4 milímetros, a pressão mínima; o colesterol vai ser reduzido, assim como os triglicerídeos. e a glicose vai ficar mais controlada. Se somar a isso a dieta do sal e a pobre em gordura, o efeito será único. Já para quem tem problemas no coração, sofreu um infarto, por exemplo, haverá certa perda de capacidade física, de desempenho. Nesse caso, os exercícios deverão ser praticados com bastante segurança. Aí, a gente recomenda os programas de reabilitação, em que a pessoa começa a fazer exercícios supervisionados e, lentamente, ao longo de uns 2 ou 3 meses de atividade supervisionada, recebe um progressivo aumento da carga. Sabe-se que, quando um indivíduo sofre um infarto, ele costuma ficar muito inseguro e, assim, bastante vulnerável. A autoestima, consequentemente, fica muito baixa. Assim, à medida que ele for incorporando exercícios ao tratamento (remédios que ele terá de tomar), ele tenderá a se sentir cada vez mais seguro, reconquistando a autoestima e melhorando a saúde. Pessoas que sofreram um infarto ficam com dificuldade de fazer exercícios? – depende da extensão. tem infartos pequenos e grandes, mas, para todos os graus, o exercício é benéfico, respeitando-se, é claro, as limitações de cada condição clínica. E devem ser monitoradas com aparelhos? – É por aí. Vai ser preciso fazer um eletrocardiograma. A quantidade de exercícios é definida por uma avaliação clínica prévia, com teste de esforço. por aí vai se avaliar a frequência cardíaca daquele paciente e determinar que exercícios ele pode fazer, sem colocar em risco sua saúde. Onde é feita essa reabilitação? – em clínicas de reabilitação. em algumas academias especializadas, há equipes multidisciplinares que, às vezes, são compostas por um profissional da educação física, um fisioterapeuta, um cardiologista etc. É importante para quem pratica atividade física usar esses equipamentos que monitoram a frequência cardíaca ou esse é um cuidado excessivo? – Não considero um cuidado excessivo, mas preciso lembrar que são equipamentos relativamente caros. e quem usa costuma ficar excessivamente preocupado. os aparelhos servem como moderadores da intensidade do exercício, isto é, a pessoa


Sabe-se que o ritmo cardíaco depende da faixa etária da pessoa. Existe uma diferença muito grande entre os limites de quem tem doença cardíaca e de quem não tem? – uma pessoa pode até ter doença cardiovascular, mas, se não tem problema cardíaco, normalmente a gente calcula a atividade física em torno de 65%, 75% da frequência cardíaca máxima. Numa fórmula simples: subtrair a idade de 220. Numa pessoa de 40 anos, por exemplo, a frequência cardíaca máxima é de 180. Aí você calcula 65%, 75% dessa frequência cardíaca e estabelece os níveis de atividade física para queimar gordura, para condicionamento físico e para proteção cardiovascular. A caminhada já resolve. Não precisa, então, de nenhum tipo de controle. Mas, para quem quer fazer um pouco mais de exercício, deve monitorar essa frequência cardíaca para não superar um ponto máximo, ou seja, sem forçar o coração. A outra questão diz respeito à avaliação: saber quem precisa fazer avaliação cardiológica antes de iniciar a atividade física. em princípio, são as pessoas que têm histórico de infarto recente ou de AVc em pessoas jovens da família. então, um paciente de 35 a 40 anos, cujo pai teve infarto com 50 ou a mãe com 60 anos, antes de dar início a uma atividade física, mesmo que não se queixe de nenhum problema, deve passar por uma avaliação prévia. Quem nunca fez exercício também. Quem já faz a vida inteira, depois de completar 40 anos, é recomendável fazer, mas apenas de forma preventiva, para avaliar, por exemplo, a pressão arterial. Há sintomas que indiquem que uma pessoa está correndo riscos durante a prática de uma atividade física? – Há, sim. certas manifestações clínicas, coisas que o indivíduo não sentia e passou a sentir, por exemplo, uma dor no peito, desencadeada durante um exercício. Isso é um forte indicador. um cansaço fora do habitual. por exemplo, antes, a pessoa conseguia correr durante uma hora sem sentir nada e, de repente, passou a cansar-se tanto depois de praticar por 20 minutos que precisa interromper a atividade. Manifestações de tontura, alterações visuais ou auditivas, sugerindo que a pressão possa estar subindo acima do normal, dor de cabeça, palpitações, desmaios, tudo isso são sintomas que demonstram que alguma coisa está errada.

Os aparelhos servem como moderadores da intensidade do exercício, isto é, a pessoa vai controlar os exercícios conforme sua capacidade cardíaca. Todo mundo tem um teto. Cabe ao praticante respeitar esse teto.

vai controlar os exercícios conforme sua capacidade cardíaca. todo mundo tem um teto. então, cabe ao praticante respeitar esse teto.

o senhor falou da importância do sono no começo da nossa conversa. Muitas pessoas têm problemas de insônia. A falta de sono pode contribuir para agravar problemas cardíacos? – Médicos estrangeiros, tratando desse assunto, acham um absurdo a quantidade de medicamentos que os brasileiros usam para dormir, como ansiolíticos e antidepressivos. É bem acima da média mundial. o fato é que o sono de qualidade é fundamental para o bemestar do indivíduo – esse é o primeiro aspecto. tem gente que tem dificuldade de dormir, outras acordam com muita frequência durante a noite. A gente chama isso de insônia inicial e insônia terminal. tem gente que passa a noite toda acordada. tem gente que tem ronco, apneia, e acaba tendo o sono fortemente comprometido. A falta de sono é causa de muitos distúrbios: pressão alta, obesidade, resistência à insulina, aumento da glicose, alta do colesterol, entre tantos. o ideal é que o indivíduo consiga desenvolver mecanismos para dormir bem. desconectar-se dos problemas, por exemplo, antes de ir para a cama. o exercício ajuda muito, pois quem faz exercício tem um sono melhor. praticar natação também é ótimo. Há várias técnicas de relaxamento que podem ser usadas. e também exercícios de memória. Aliás, há uma coisa, chamada higiene do sono, que deve ser levada em conta. Maus hábitos acabam gerando insônia, por exemplo, assistir tV na cama, fazer leituras tensas, trabalhar na cama, consumir álcool antes de ir para a cama, usar alimentação pesada à noite. Isso tudo representa falta de higiene do sono. também é falta de higiene do sono insistir em dormir quando não se está com sono. Mas, quando a qualidade do sono fica muito prejudicada, é preciso procurar um profissional. reVista

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Cidadania

Alimentação para cidadãos em estado de vulnerabilidade social A gastronomia aliada às boas práticas sociais DEMETRIUS DEMETRIO*

Para além das estatísticas, a desigualdade social pode ser constatada no cotidiano de milhares de pessoas que se encontram abaixo da linha da pobreza, principalmente das que por não terem onde se abrigar, passaram a viver nas ruas. como a gastronomia social pode agilizar o resgate desses brasileiros que se encontram à margem dos direitos que lhes são pertinentes? a relevância do debate sobre esse tema reside, sobretudo, na apresentação de uma resposta à sociedade, de como boas práticas sociais, por meio da gastronomia, podem propiciar a essa camada da população acesso aos direitos fundamentais, entre eles a alimentação equilibrada.

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direito humano à alimentação adequada deve ter espaço garantido na Academia, seja em discussões específicas sobre Direitos Humanos, seja na seara do Direito em geral, com efetivas ações que façam crescer o sentimento de que, se existem pessoas com fome, é porque não há justiça; e se não há justiça, o direito nada (ou pouco) fez e, assim, sua validade é questionada. O alerta sobre a fome no mundo data dos anos 40 do século passado, mas os programas efetivamente voltados para o combate à fome só começaram a vigorar a partir da década de 1990. Alguns segmentos carentes da sociedade curiosamente não foram incluídos entre a população a ser assistida. É o caso dos moradores de rua. Vítimas de uma sociedade elitista, esses miseráveis, muitas vezes

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tangidos pelo abandono, acabam por descambar para a marginalidade. Nessa crescente camada de brasileiros esquecidos, que perambulam pelas vias públicas, estão crianças e adolescentes, oriundos de famílias desfeitas, os quais, sem a devida proteção do Estado, são vítimas fáceis de todo tipo de violência, como abuso sexual e incitação à prostituição. No Brasil, não faltam exemplos dessa população “invisível” para a sociedade, exposta, pela sua fragilidade, a todo tipo de mazelas. Em Pernambuco, por exemplo, onde se registra um crescimento desordenado do consumo e tráfico de drogas ilícitas e um consequente envolvimento em crimes, a tragédia ronda os moradores de rua. São frequentes os registros policiais de morte de crianças e adolescentes. Em situação de risco social e geralmente excluídos do foco das políticas públicas, inclusive do direito natural à educação formal, sequer podem ser nomeados cidadãos, pois, para tanto, teriam de portar um documento oficial de identidade e ter acesso ao menos à educação básica. Progressos nas conquistas dos Direitos Humanos, verificados principalmente de meio século para cá, contemplam a questão da fome e da alimentação mal equilibrada, ambas gerando desnutrição e doenças, e até provocando a morte. Nesse assunto, o ordenamento jurídico brasileiro acompanha o posicionamento e o entendimento dos Direitos Universais, iniciando-se pela Carta Magna de 1988, em seu art. 6º, recentemente modificado para indicar a alimentação como direito fundamental do cidadão brasileiro. Na realidade, porém, esse direito não se cumpre, haja vista a quantidade de crianças e adolescentes em situação de risco social. Alimentando-se eventual e inadequadamente, fazendo uso de drogas ilícitas, com alto poder de destruição da saúde, e sem um teto onde se abrigarem dos rigores do tempo, eles apresentam, ao longo da vida, todo tipo de debilidade f ísica.


A Comunidade é um refúgio para a população desassistida que busca alternativas de melhores condições de vida

nidade, faz apenas um pouco mais de meio século que esse tema veio a compor as pautas de reivindicações de órgãos de âmbito internacional, instituições e grupos que discutem políticas públicas e ações sanitárias. Um médico pernambucano, Josué de Castro, escreveu, em 1946, o livro Geografia da fome, onde alertava sobre essa que é uma das maiores mazelas da humanidade. “Denunciei a fome como flagelo fabricado pelos homens, contra outros homens”, já dizia Josué de Castro. E para combater a crença da época, de que a fome era um fenômeno irreversível, e que deveria, portanto, ser tratado de forma natural, o médico pernambucano acrescentava: “Interesses e preconceitos de ordem moral e de ordem política e econômica de nossa chamada civilização ocidental tornaram a fome um tema proibido, ou pelo menos pouco aconselhável de ser abordado”.

Josué de Castro escreveu, em 1946, o livro Geografia da fome, onde alertava sobre essa que é uma das maiores mazelas da humanidade. reVista

Como consequência da fome ou da desnutrição crônica, ficam altamente vulneráveis a inúmeras doenças e à morte precoce. Mesmo os jovens das famílias que apresentam uma renda familiar abaixo do patamar capaz de assegurar uma vida com dignidade têm o seu futuro comprometido, pois podem ser facilmente aliciados pelos chefes do tráfico ou da prostituição. Em contrapartida, essa população desassistida, quando beneficiada por programas sérios e comprometidos – que se distanciam de ações meramente cerceadoras da liberdade de seus “assistidos”, típicas da metodologia de “depósito de delinquentes” –, responde condignamente. Quando lhes é fornecida uma alimentação equilibrada, com responsabilidade fincada na sustentabilidade, essas crianças e adolescentes tendem a se afastar das drogas, a recuperar a saúde e, principalmente, a autoestima. Segmentos da sociedade que se comprometem a neutralizar o quadro da fome e da má alimentação acreditam que, quando se criam meios e ações mais eficazes, que contribuam para o resgate de um sujeito, fornecendo-lhe meios para uma vida digna, propiciam-lhe o repensar sobre os processos do próprio crescimento, como algo inerente ao desenvolvimento humano, desvinculando-o, assim, da exclusão social. Entretanto, a fome não é uma questão fácil de combater. Mesmo sendo um dos problemas seculares da história da huma-

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No início dos anos 1990, o sociólogo Herbert de Souza, mais conhecido como Betinho, mobilizou a sociedade civil brasileira com sua Ação de Cidadania contra a Fome e a Miséria e pela Vida, um movimento nascido de uma sociedade descrente da ação do Estado. No Governo Lula, criou-se, em 2003, o Ministério Extraordinário de Combate à Fome, com o intuito de implementar ações de governo pautadas no Programa Fome Zero. Entretanto, nenhum programa efetivamente atendeu à população de moradores de rua. O Bolsa-Família, por exemplo, é destinado a famílias, e não a quem não compõe uma delas, e, aliás, mora nas ruas. Ademais, esses programas assistenciais não se pautam pela garantia da segurança alimentar. Ou seja, comer por comer, per si, não dá garantia de qualidade nem de segurança alimentar, não significando, portanto, nem saúde, nem resgate de cidadania. É nesta perspectiva que entra a gastronomia como uma ferramenta de conquista social, que, de

forma pedagógica e com muita criatividade (comida com proteínas/vitaminas, saborosa e de baixo custo), transcende a questão de que o ato de alimentar é um direito humano. Muito oportunas são aqui as palavras de Hannah Arendt (1989), ao dizer que: “Os direitos humanos não são um dado, mas um constructo, uma intervenção humana, em constante processo de construção e reconstrução”. Assim, toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar, para si e para sua família, saúde e bem-estar. A alimentação é o principal propiciador dessa condição, posto que o ser humano devidamente alimentado é capaz de construir seu caminho e intervir efetivamente na construção do todo social. E o que é gastronomia social? É o potencial que a gastronomia tem de influenciar o mundo de maneira social, ambiental, econômica e cultural, a começar pelas comunidades. A gastronomia social facilita, em primeira instância, a diminuição das desigualdades

A gastronomia social possui toda a instrumentação para levar aos menos favorecidos opções de uma alimentação saudável e equilibrada.

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O ser humano devidamente alimentado é capaz de construir seu caminho e intervir efetivamente na construção do todo social.

sociais, na medida em que, numa sociedade capitalista, reconhece que os segmentos desfavorecidos da população sofrem todo tipo de problemas associados a uma alimentação imprópria, como: desnutrição ou obesidade, quantidade insuficiente de alimentos e consumo de alimentos contaminados ou vencidos. Essa mesma gastronomia social possui toda a instrumentação para levar aos menos favorecidos opções de uma alimentação saudável e equilibrada. Ela também propicia o exercício da criticidade, do questionamento, da criatividade, da solidariedade e da organização grupal. * Fundador e gestor da organização não governamental Comunidade dos Pequenos Profetas, que atua em Recife (PE).

ReFeRêncIas BIBlIogRÁFIcas: cascUdo, c. História da alimentação brasileira. Belo Horizonte: Itatiaia, 1983. castRo, Josué de. Geografia da Fome. editora o cruzeiro, Rio de Janeiro, 1946. última edição – gryphus, RJ, 1992. coMPaRato, Fábio Konder. Ética: direito, moral e religião no mundo moderno. são Paulo: companhia das letras, 2006. dÓRIa, c.a. A formação da culinária brasileira. são Paulo: Publifolha, 2009. FReYRe, g. Açúcar: uma sociologia doce com receitas de bolo e doces do Nordeste brasileiro. são Paulo: companhia das letras, 1997. MondInI, l.; MonteIRo, c. a. Mudanças no padrão de alimentação da população. Revista de Saúde Pública, v.28, n.6, p.433-439, 1994. neUMann, a. I. de la c. P.; sHIRassU, M. M.; FIsBeRg, R. M. consumo de alimentos de risco e proteção para doenças cardiovasculares entre funcionários públicos. Revista de Nutrição, v.19, n.1, p.19-28, 2006.

Projeto Hortas Verticais: cultivo de hortaliças em garrafas PET garante alimentos saudáveis e de boa qualidade reVista

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Cidadania

Em Recife, um exemplo de como enfrentar o flagelo da fome em 2011, a comunidade dos Pequenos Profetas, organização não governamental que atende a jovens moradores de rua, em Recife (PE), ficou entre as 20 finalistas do Prêmio odM Brasil, criado pelo governo federal, com o apoio das nações Unidas, do Movimento nacional pela cidadania e solidariedade e de um conjunto de empresas e associações.

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fundador da instituição, Demetrius Demetrio, é gastrônomo, especialista em Projetos Sociais e em Práticas Gastronômicas, ativista de Direitos Humanos, e também atua como chef social, desenvolvendo a gastronomia social com famílias empobrecidas da Região Metropolitana do Recife. Nesta entrevista à Revista Anajur, ele explica o potencial da gastronomia social como ferramenta de resgate da cidadania de pessoas que vivem à margem de direitos fundamentais.

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Afastar essa clientela do mundo do crime não é tarefa fácil. Exige dedicação e responsabilidade, além de muitos recursos que efetivamente os estimulem. E de forma rápida, sob pena de a ação não atingir os objetivos propostos. abr/mai/jun 2016

Por que se decidiu por trabalhar com a população de rua? – Vim morar no Recife na década de 1980, procedente de Brasília. O primeiro contato com o Recife me assustou, pois nunca tinha visto pessoas adultas, crianças e adolescentes catando restos de lixo no centro urbano. Por obra do destino, conheci Dom Hélder Câmara em uma palestra na qual se falava sobre o envolvimento e o compromisso do jovem, como cidadão, com causas sociais. Foi ele quem me informou sobre um grupo que ajudava moradores de rua. Fiz, então, contato com esse grupo, com o qual, em seguida, comecei a trabalhar voluntariamente. Meses depois, estando eu com 17 anos, decidi morar por um ano nas ruas do centro do Recife, com o apoio desse grupo e de Dom Hélder Câmara. Dessa experiência nasceu a Comunidade dos Pequenos Profetas, cujo objetivo maior é reescrever uma nova história na vida de crianças e adolescentes em situação de risco social. Hoje somos a maior organização do terceiro setor no atendimento ao público infantojuvenil em situação de risco social e pessoal da Região Metropolitana do Recife. Atualmente, que trabalho você desenvolve com essa população? – O projeto desenvolve uma ação chamada Despertando Valores, que beneficia diretamente 350 crianças, adolescentes e jovens, sendo, em média, 175 por ano, com idade entre 7 e 21 anos, de ambos os sexos e diversas orientações sexuais. Todos em situação de vulnerabilidade social. Indiretamente beneficia cerca de 5 mil pessoas – entre parentes, amigos e vizinhos – das comunidades de baixa renda que vivem em áreas próximas do projeto. São desenvolvidas oficinas sociopedagógicas (para a elevação da escolaridade), atividades socioeducativas (como música, dança, teatro de bonecos), passeios em espaços públicos, atendimento psicossocial (incluso atendimento psicológico, visitas domiciliares, atendimento a famílias, acompanhamento médico), oficinas de Direitos Humanos e Cidadania e oficinas gastronômicas, usando a gastronomia como ferramenta de desenvolvimento social e ambiental.


Demetrius Demetrio aposta na gastronomia social para resgastar quem vive à margem dos direitos fundamentais Com quais recursos esse projeto se sustenta? – O projeto é apoiado por vários institutos: Programa Petrobras Socioambiental; Fundo Socioambiental da Caixa Econômica Federal, Conselho Municipal dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes da Cidade do Recife (COMDICA); Rede SoliVida, que aglutina 28 organizações da sociedade civil, em vários estados (Bahia, Ceará, Pernambuco, Paraíba, Piauí, Maranhão e Rio de Janeiro); organizações internacionais, como a Misereor e a Kinderhilfe Brasilien (ambas da Alemanha), e Les Enfants de la Rue (da Bélgica). Como funcionam os projetos associados à gastronomia social que envolvem moradores de rua? – A Comunidade dos Pequenos Profetas lida com crianças, adolescentes e jovens em situação de risco social e pessoal. São, em sua quase totalidade, autores de furtos e crimes, e fazem uso de drogas. Afastar essa clientela do mundo do crime não é tarefa fácil. Exige dedicação e responsabilidade, além de muitos recursos que efetivamente os estimulem. Enfim, algo novo, interessante, que eleve a autoestima de cada um, e de forma rápida, sob pena de a ação não atingir os objetivos pro-

postos. Utilizamos a gastronomia como uma ferramenta de desenvolvimento social, que vai despertar valores essenciais para uma vida saudável. São ações simples, que estimulam a participação de cada um e a consolidação dos laços familiares. Por exemplo: produção de hortas verticais em garrafas PET, aulas de manipulação de alimentos e oficinas de degustação, que ajudam as famílias de baixa renda a se alimentarem melhor. Além dessas ações, desenvolvemos documentários sobre gastronomia social, bem como sobre as outras áreas em que atuamos. São exibidos no nosso canal do Youtube (www.youtube.com.br/pequenosprofetas), chegando a ter meio milhão de acessos. Essas ações colaboram para minimizar a extrema pobreza, proporcionando qualidade de vida para as famílias de baixa renda. Conforme relato do Jean Ziegler (sociólogo suíço, relator da ONU sobre alimentação), “hoje não existe falta de alimentos; o que existe é falta de acesso a eles”. Sabemos que as estatísticas sobre a fome são alarmantes: a cada 5 segundos, uma criança de menos de 10 anos morre de fome. No mundo, 56 mil pessoas morrem de fome por dia. E 1 bilhão de pessoas estão permanentemente subalimentadas. reVista

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Coletânea

História do Brasil contada pela Advocacia Consultiva

A ingerência fiscal estadual em colônia federal, no ano de 1911 ARNALDO SAMPAIO DE MORAES GODOY*

Problemas relacionados ao federalismo fiscal foram recorrentes ao longo da República Velha (1891-1930). no seu núcleo, a constituição de 1891, que fixou os tributos da União e dos estados, engendrando um modelo constitucionaltributário. não havia previsão de competência tributária municipal. O municipalismo fiscal é fato que só vai se realizar na década de 1940.

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art. 7º da Constituição de 1891 dispunha que era competência (exclusiva) da União decretar impostos sobre a importação de bens de procedência estrangeira e sobre direitos de entrada, saída e estadia de navios, declarando-se livre o comércio de cabotagem às mercadorias nacionais, bem como às mercadorias estrangeiras que já tivessem recolhido impostos de importação. A União decretava também taxas de selo e de correios e telégrafos. Observe-se que o verbo que a Constituição utilizava em matéria fiscal era o mandamental “decretar”. A Constituição de 1891 dispunha que os impostos decretados pela União deveriam ser uniformes para todos os estados. No mesmo contexto, vedava-se ao governo federal a criação, de qualquer modo, de distinções e preferências em favor dos portos, de uns contra os de outros estados.

Nos termos do art. 9º da Constituição de 1891, os estados detinham competência exclusiva para: decretar impostos sobre a exportação de mercadorias de sua própria produção; sobre imóveis rurais e urbanos; sobre transmissão de propriedade; e sobre indústrias e profissões. Aos estados também competia decretar (com exclusividade) taxas de selos quanto aos atos emanados dos respectivos governos e negócios de sua economia, a par de contribuições concernentes aos seus telégrafos e correios. Fixava-se também que seria isenta de impostos, no estado por onde se exportasse, a produção dos outros estados. Além disso, determinava-se que só seria lícito a um estado tributar a importação de mercadorias estrangeiras quando destinadas ao consumo no seu território, revertendo-se, porém, o produto do imposto para o Tesouro Federal. No que toca ao que hoje denominaríamos de “imunidade tributária recíproca”, proibia-se (art. 10) aos estados tributar bens e rendas federais ou serviços a cargo da União, e reciprocamente. Ademais (art. 11), vedava-se aos estados e à União a criação de impostos de trânsito pelo território de um estado, ou na passagem de um para outro, sobre produtos de outros estados da República ou estrangeiros, e, bem assim, sobre os veículos de terra e água que os transportassem. Não se podia tributar o exercício de cultos religiosos. No caso que se tem em pauta, datado de 1911, o Estado do Paraná cobrava impostos de indústrias e profissões, dos colonos que viviam em colônia militar da União sediada nos limites daquela unidade da Federação. Questionou-se, então, se o Estado do Paraná poderia ter ingerência fiscal em colônia militar da União. A questão não era nova. Em 1903, a Consultoria-Geral da República havia opinado que os estados deveriam cobrar impostos de exportação em relação a mercadorias exportadas em seus territórios, ainda que se tratasse de porções territoriais definidas como áreas de colônias militares da União. reVista

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Durante a República Velha, havia colônias militares nos territórios contíguos aos limites do Brasil com países estrangeiros, tradição que remontava ao tempo do Império. Reconhecia-se, nos exatos termos da Constituição, que, naquele caso, o Estado do Paraná estaria proibido de tributar bens e rendas federais, bem como serviços a cargo da União, em qualquer parte de seu território. Havia regulamentação da vida civil nas colônias militares. Os habitantes de tais vilas podiam praticar todos os atos da vida civil (casar ou testar, por exemplo). Havia, assim, atos praticados no estado em face dos quais incidiriam taxas e emolumentos de titularidade desse mesmo estado, o que justificava a pretensão de unidade da Federação exercer poder tributante em área de colônia militar nos limites de seu território. Declarar a incompetência tributária dos estados em relação a áreas de colônias militares, entendia a Consultoria-Geral da República, seria fórmula odiosa de se fixarem privilégios, não extensivos aos demais habitantes de uma mesma unidade da Federação. Entendeu mais uma vez a Consultoria-Geral da República que a presença fiscal de um estado em colônia militar não prejudicaria o andamento e a organização desta última. Segue o parecer.

Gabinete do Consultor-Geral da República. – Rio de Janeiro, 22 de dezembro de 1911. Senhor Ministro de Estado dos Negócios da Fazenda. – Com o Aviso nº 14, de 4 de fevereiro de 1908, transmitistes ao meu antecessor, para que emitisse parecer, o processo a que se refere o Aviso do Ministério de Guerra

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Trata-se de saber se o Governo do Estado do Paraná pode ter qualquer ingerência fiscal no território da colônia, sobre seus habitantes, ou se, sendo a colônia um estabelecimento federal, está, a todos os respeitos, sob a exclusiva autoridade federal.

nº 697, de 24 de agosto de 1907, relativo à cobrança do imposto de indústrias e profissões pelo Estado do Paraná aos colonos da Colônia Militar de Cachepó. A questão a que se refere a consulta é antiga, pois, dos papéis que acompanharam o mencionado Aviso, se vê que dura desde 1902, e a respeito dela já foi ouvida, uma primeira vez, a opinião do Consultor-Geral da República que a manifestou conforme o parecer publicado sob nº 30, págs. 113, do 1º vol. de Pareceres. Se bem que o honrado Ministro da Fazenda de então não houvesse adotado a opinião do primeiro Consultor-Geral, meu ilustre antecessor, defendendo no Aviso nº 18, de 17 de março de 1904, ao Ministério da Guerra, a doutrina oposta, não sei como deixar de concordar com a opinião emitida naquele parecer. Trata-se de saber se o Governo do Estado do Paraná pode ter qualquer ingerência fiscal no território da colônia, sobre seus habitantes, ou se, sendo a colônia um estabelecimento federal, está, a todos os respeitos, sob a exclusiva autoridade federal. O estabelecimento de colônias militares foi entre nós autorizado, numa zona de 10 léguas contíguas aos limites do Império com os países estrangeiros, pelo art. 82, do Regulamento de Terras Devolutas, aprovado pelo Decreto nº 1.318, de 1854. Nesse decreto, como na Lei nº 601, de 1850, a que ele veio dar regulamento, não há disposições acerca do regime fiscal da colônia, em relação aos seus habitantes que exercessem profissão e indústria. Nem naquele tempo a questão tinha importância prática em vista da organização política do Império. A República em sua Constituição firmou vários princípios, cuja aplicação tem de ser trazida, para solução do caso. Três disposições são: – a do art. 64, que reconhece o domínio dos Estados sobre as minas e terras devolutas nos seus respectivos territórios, cabendo à União somente a porção de território que for indispensável para defesa das fronteiras, fortificações, construções militares e estradas de ferro federais; – a do art. 34, nº 31, que reconheceu a competência privativa do Congresso Nacional para submeter à legislação especial os pontos do território da República necessários para a fundação de arsenais ou outros estabelecimentos e instituições de conveniência federal; – a do art. 10, que proibiu aos Estados tributar bens e rendas federais e serviços a cargo da União.

Completando, interpretando ou regulamentando qualquer destes textos, não foi ainda promulgada lei ou decreto.


1º) que todo o habitante da colônia está sujeito ao registro civil, por isso que pondo a cargo do escrivão da colônia registrar casamentos, óbitos e nascimentos que se derem na colônia, expressamente declarou que isso não prejudicava “o registro civil a que todo o cidadão é obrigado por lei” (artigo 16, nº 3). Ora, o registro civil está a cargo das autoridades locais do Estado, logo sob este ponto de vista, já o regulamento reconhece a ação administrativa do Estado sobre os habitantes da colônia. 2º) que todos os colonos em geral estão sujeitos à legislação civil e criminal da República, sendo nos crimes julgados e processados segundo os códigos respectivos e nos crimes militares sujeitos à legislação que regula a matéria.

É evidente que essa disposição do regulamento não inovou coisa alguma, nem podia inovar no seu caráter de mero ato regulamentar. Esse texto, reproduzindo disposições gerais, que sujeitam todos os habitantes da República à jurisdição civil e militar, conforme a natureza dos atos e delitos, só se compreende ali consignado para que não se pudesse levantar dúvida sobre isso em relação aos habitantes das colônias militares. E assim sendo, é inquestionável que essa jurisdição, civil ou criminal, a que estão sujeitos esses habitantes do território nacional, é federal ou estadual, conforme a natureza legal do ato. Entre nós a competência judiciária não obedeceu a critério territorial; ela é, segundo a regra geral, aliás, determinada ratione materiae e ratione personae. Não há atos ou crimes que determinem a competência federal ou estadual, para conhecer deles em virtude somente do lugar em que são praticados. Nos Estados tem jurisdição simultânea, coexistente, a Justiça Federal e a Estadual, cada qual para as questões de sua competência; e no Distrito Federal não foi aos Juízes Federais, que a Constituição instituiu que se atribuiu competência para conhecer das questões de direito comum. Criou-se para isso uma justiça local que, se é federal pela investidura, tem competência circunscrita às ma-

Nos Estados tem jurisdição simultânea, coexistente, a Justiça Federal e a Estadual, cada qual para as questões de sua competência.

Em relação ao caso especial das colônias militares, foi promulgada a Lei nº 733, de 21 de dezembro de 1900, que as reorganizou e a que deu regulamento o Decreto nº 4.662, de 12 de novembro de 1902. Essa lei é circunscrita à organização material da colônia, sob uma administração militar. Não cogita, porém, da subordinação jurisdicional dos habitantes dela, quer no ponto de vista fiscal ou administrativo, quer no ponto de vista judiciário. Completando suas disposições, o citado regulamento, em relação ao aspecto de que me ocupo, reconheceu:

térias deixadas pela Constituição à justiça dos Estados. Assim, mesmo nos lugares e territórios de “absoluta jurisdição do Governo Federal”, os crimes e atos que, por sua natureza ou pelas pessoas que os praticarem, não incidam na competência da justiça federal são da competência da justiça estadual. Foi o que expressamente declarou o art.15, § 1º, do Decreto nº 848, de 11 de outubro de 1890, que organizou a Justiça Federal. É certo que o Aviso do Ministério da Fazenda de 17 de março de 1904, já antes referido, afirmou em um dos seus considerando que essa disposição havia sido revogada ex-vis do art. 60, § 1º da Constituição. Nada menos sustentável, entretanto. O dispositivo constitucional invocado preceitua que é vedado ao Congresso cometer qualquer jurisdição federal às justiças dos Estados. Ora, proclamar que a justiça dos Estados é competente para, em qualquer lugar, conhecer das coisas que não são competência federal, não pode ser, de modo algum, considerado como atribuir jurisdição federal às justiças dos Estados; e mais não fez a disposição do Decreto nº 848, de 1890. Aquele texto constitucional vem logo em seguida e subordinado ao mesmo artigo que define a competência da justiça federal. Em nenhum dos itens desse artigo se firmou um princípio que, de qualquer modo, possa fazer incidir sob a jurisdição federal quaisquer atos pela só circunstância de terem ocorrido em certo lugar ou território. Logo, não há como ver delegação de jurisdição federal às justiças dos Estados na disposição fulminada que reconhece, “nos lugares de absoluta jurisdição do Governo Federal”, a competência da justiça dos Estados para crimes que não são da competência federal. É bem visto que a expressão – jurisdição – empregada no texto, não se refere à jurisdição judiciária, caso em que haveria uma incompreensível contradição de termos; essa expressão é usada num sentido geral de autoridade, administração. reVista

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A respeito da inteira vigência e aplicação desse texto, jamais de meu conhecimento, se suscitou dúvida e a sua matéria, aplicada às hipóteses similares, se acha consolidada na disposição do art. 6º, da 2º parte do Decreto nº 3.084, de 5 de novembro de 1898, que, como é notório, é obra do egrégio José Hygino. Têm-se, pois, verificado que o Decreto nº 4.662, de 1902, que deu regulamento para as Colônias Militares, longe de excluir a jurisdição do Estado nesses estabelecimentos federais, expressamente a reconheceu. E nem assim podia deixar de ser. Nessas colônias vão se estabelecer novos núcleos de população; ali, essa população vai viver, agir, contratar, casar, procriar, testar, morrer. Cada um desses atos da vida individual tem repercussão administrativa ou judiciária, tem uma consequência jurídica. Eles, em si, e as consequências deles, acham-se regulamentadas, em leis e decretos, em sua generalidade, da competência privativa dos Estados. Não há como furtar ao Estado a jurisdição nesse território, em relação aos habitantes dele, em tudo a respeito de que não tenha a União jurisdição legal e competentemente regulada. Quem celebra os casamentos, quem legaliza os testamentos, quem os abre, quem faz os inventários e partilhas? Quem reconhece as firmas dos contratos e registra as escrituras? Evidentemente os funcionários do Estado, de acordo com as leis do Estado. Todos estes atos estão sujeitos a selos e emolumentos. Que selos se pagam, que regulamentos fixam tais emolumentos? Evidentemente selos do Estado. Sobre tudo isso não pode haver dúvida. Ora, o Decreto de 1902, no art. 55, permite aos colonos ter casas comerciais; no art. 68 permite-lhes o exercício de qualquer indústria fabril ou manufatureira. Como subtrair essas casas de negócio e essas oficinas e fábricas aos regulamentos respectivos, aos impostos correspondentes, regulamentos e impostos a que estão sujeitos todos os demais que comerciam ou exercem profissão ou indústria no território do mesmo Estado? Essa é a questão que diretamente provocou a consulta a que respondo.

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O dispositivo constitucional invocado preceitua que é vedado ao Congresso cometer qualquer jurisdição federal às justiças dos Estados.

Parece-me que a solução que tem sido dada não pode ser mantida. Realmente, porque, e em virtude de que lei, se pode reconhecer que tais negociantes e industriais estão isentos dos impostos normalmente criados no Estado e a que todos os seus habitantes estão sujeitos? Isso certamente constituiria um privilégio odioso a favor desses comerciantes e indústrias, em prejuízo dos demais que não estivessem nas mesmas condições, o que seria injusto e não autorizado por disposição alguma de nossas leis vigentes. Nem se pretenda que essa intervenção fiscal do Estado possa afetar a autoridade da administração da colônia ou o regime militar a que ela está sujeita. Além de que essa interferência do Estado em coisa alguma colidiria com a ação da gerência da colônia, nada obsta a que se estabeleça com o governo do Estado um acordo para evitar a ocorrência de qualquer atrito ou mal entendido. Ventilado este ponto, convém agora averiguar se essa jurisdição fiscal do Estado encontrará obstáculo nos textos constitucionais. Desses textos o único que poderia ser invocado é o art. 10, que veda ao Estado taxar serviços a cargo da União. Se o Estado pretendesse taxar a colônia, o exercício de seus funcionários, a produção normal, agrícola ou pastoril dos colonos, que constitui um dos objetos da instituição, se pretendesse cobrar imposto territorial ou outra contribuição que afetasse a colônia propriamente, em qualquer de seus aspectos, evidentemente essa pretensão seria ilegal. Mas, ao lado de tudo o que, do modo mais lato, possa ser considerado como parte da colônia, como dependente dela, como serviço sob qualquer aspecto a cargo da União, há o trabalho particular, comercial ou industrial de terceiros, que deles tiram para si lucros ou proveito. Essa atividade privada, que é legal porque a lei a faculta, não pode de forma alguma ser considerada serviço a cargo da União, e, portanto, aqueles que a exercem não podem se acobertar no texto constitucional para fugir ao pagamento dos impostos com que normalmente o Estado taxa sua indústria ou profissão. Na conformidade desses princípios não posso concordar com a doutrina do Aviso já mencionado, comunicada pelo Ministério, ora a vosso cargo, ao Ministério da Guerra em 17 de março de 1904. O domínio privado da União sobre as terras dessas colônias não subtrai essas terras, de modo absoluto, à jurisdição dos Estados como quer esse Aviso. Com o caráter de bens de ordem privada, seja quem for o titular do domínio, essas terras, fazendo parte integrante do território do Estado, estão sob a jurisdição dele.


Todo o território do Brasil, salvo o Acre, adquirido posteriormente à Constituição e de natureza não cogitada por ela, todo o território nacional está repartido entre os Estados e o Distrito Federal. A zona que pertence à União não deixa por esse fato de fazer parte do território de um Estado.

Todo o território do Brasil, salvo o Acre, adquirido posteriormente à Constituição e de natureza não cogitada por ela, todo o território nacional está repartido entre os Estados e o Distrito Federal. A zona que pertence à União não deixa por esse fato de fazer parte do território de um Estado. O que poderia influir sobre a extensão da jurisdição do Estado seria o domínio, não privado da União, mas jurisdicional sobre esse território. Se, usando da faculdade que o art. 34, nº 31, lhe outorgou, a União submetesse esse território a um regi-

me especial, regulando do modo mais completo a feição administrativa, fiscal e judiciária de sua vida interna, isso certamente afetaria constitucionalmente a jurisdição do Estado em relação a ele. No regime vigente, porém, foi visto em que consiste a regulamentação federal a respeito desses territórios; apenas temos a lei relativa às colônias militares, que de modo absoluto se absteve de dispor a respeito da subordinação dos territórios respectivos a esta ou àquela jurisdição. Prevalece, pois, o direito comum e, assim sendo, não pode deixar de ser aceita a doutrina exposta no parecer do meu antecessor, de 20 de junho de 1903, que, por outros argumentos, procurei secundar neste meu parecer, que submeto à vossa esclarecida atenção. Devolvo os papéis que acompanharam o Aviso desse Ministério, de 4 de fevereiro de 1908, e tenho a honra de reiterar-vos os meus protestos de elevado apreço e distinta consideração. – Rodrigo Octávio.

* Doutor e Mestre em Filosofia do Direito e do Estado pela Pontif ícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

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PubliCações e eVentos

XXX Congresso Brasileiro de Direito Administrativo entre os dias 28 e 30 de dezembro deste ano, será realizado em Natal, RN, o XXX congresso Brasileiro de

direito Administrativo – A regeneração moral e jurídica da administração pública brasileira. o evento, organizado pelo Instituto Brasileiro de direito Administrativo, convida os participantes a proveitosas discussões com eminentes representantes do direito público nacional, visando identificar e compreender os desafios que se apresentam à atual Administração pública. o programa está focado em instrumental jurídico apto a fornecer suporte para o alcance dos objetivos expressos pela constituição, notadamente a promoção do bem de todos e o desenvolvimento do país. o tema central do congresso – “desafios para a transparência, probidade e desenvolvimento” – reflete o empenho da programação científica na discussão

de questões candentes, que frequentam a agenda atual da Administração pública brasileira. constam, entre os palestrantes, renomados estudiosos da área do direito Administrativo: celso Antônio Bandeira de Mello, José dos Santos carvalho filho, Maria Sylvia zanella di pietro e carlos Ari Sundfeld. As inscrições podem ser feitas pelo site www.ibda.com.br

Manual de Processo Administrativo Disciplinar e Sindicância o subprocurador-geral do distrito federal, e também advogado especialista em direito Administrativo e mestre em direito constitucional, Antonio carlos Alencar carvalho, lança a 5ª edição do livro Manual de processo Administrativo disciplinar e Sindicância, que resume os principais entendimentos sobre o processo administrativo disciplinar, a sindicância e o direito disciplinário, hauridos da jurisprudência, da casuística administrativa e da consagrada doutrina nos sistemas brasileiro, português, francês e espanhol. A publicação é produto de exaustiva pesquisa jurisprudencial, embasada em mais de 4 mil acórdãos sobre o tema. É, ademais, enriquecida com amplo e sólido acervo doutrinário, nacional e estrangeiro. A obra funciona como excelente meio de elucidação de dúvidas para os aplicadores do direito. o autor explica que o livro é baseado no sistema da Lei federal nº 8.112/1990, modelo adotado diretamente ou como referência, por praticamente todos os estados e municípios brasileiros, como estatuto disciplinar do respectivo funcionalismo público local. Seu tema é, então, de interesse nacional. o livro foi lançado pela editora fórum e já está disponível nas livrarias físicas e virtuais. 38

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temas essenciais do Novo Código de Processo Civil desde que entrou em vigor, o novo código de processo civil vem motivando consultas por um grande número de autores. o interesse se sustenta na necessidade de conhecer as alterações feitas nesse novo código e, assim, habilitar os interessados a produzir textos doutrinários, completamente atualizados, sobre o tema. No livro temas essenciais do Novo cpc, o autor investiga as recentes alterações feitas no campo do processo civil brasileiro. É um livro pequeno, de texto enxuto e linguagem objetiva, dividido em temas, que esclarecem as alterações empreendidas pelo novo código. tudo isso sem recorrer a digressões doutrinárias e sem discussões acadêmicas. o público-alvo é justamente o profissional, o aluno de pós-graduação ou do último ano de faculdade de direito, ávidos por tais informações. A Revista dos tribunais responde pela sua publicação.


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