Jornais e Revistas de 19 de maio de 2014

Page 1

SÍNTESE DE JORNAIS E REVISTAS 19 DE MAIO DE 2014

FAÇA PARTE DESSE TIME ASSOCIE-SE (WWW.OESC.ORG.BR)

1


‘É preciso ir além com o gasto social’, diz ex-secretário executivo da Fazenda Na primeira de uma série de entrevistas do 'Estado' com economistas, Nelson Barbosa diz que o próximo governo deve avançar em habitação, transporte público e inclusão digital. Desde que deixou a secretaria executiva do Ministério da Fazenda, em meados do ano passado, o economista Nelson Barbosa faz aparições públicas esporádicas, ora criticando, ora elogiando a gestão do governo com o qual ainda mantém laços no mínimo políticos. “Apoio o governo atual e a reeleição da presidente”, diz. Barbosa frequenta o Instituto Lula, organização liderada pelo ex-presidente, mas falou ao Estado como acadêmico interessado em contribuir para o debate econômico. Na visão de Barbosa, o mote do próximo governo é aperfeiçoar a estrutura das finanças públicas para que o Estado leve os benefícios sociais a um novo patamar. “Não coloco a necessidade de fazer um grande ajuste em 2015, mas, sim, um grande debate estrutural sobre para onde vão as finanças do orçamento público”, diz. Aperfeiçoar a política industrial, modernizar a regulação, fomentar o, mercado de capitais e promover a retomada das exportações são outros temas que o economista Nelson Barbosa acredita que devem constar da agenda do novo governo à medida que as condições econômicas internacionais se estabilizarem. Para o ex-secretário do Ministério da Fazenda, o baixo crescimento do País é conjuntural e não tem relação com o fato de o governo ter apostado no modelo de desenvolvimento baseado no consumo e não no investimento. "O investimento foi o que mais cresceu. O governo não apostou no consumo. Apostou no fim da desigualdade", diz Barbosa. A seguir, a entrevista completa com Nelson Barbosa, que faz parte de uma série de entrevistas com economistas iniciada hoje pelo Estado. Serão ouvidos especialistas de tendências políticas variadas. Os entrevistados têm como característica comum o perfil de formadores de opinião, com papel de destaque no debate econômico e político nacional. Podem ser especialistas que, eventualmente, sejam ligados a candidatos a presidente da República. Eles darão sua opinião pessoal sobre a economia. Devem tratar dos desafios do próximo presidente, descrever o que julgam ser o melhor modelo de desenvolvimento para o País e apresentar propostas para que o Brasil acelere o desenvolvimento econômico. Eles também deverão falar sobre como o País pode fazer uma travessia segura até a posse do novo presidente, em janeiro de 2015. Janeiro de 2015, o governo toma posse. O que será preciso fazer? Nelson Barbosa - Há questões conjunturais a resolver, como a pressão sobre o preço 2


da energia. É o assunto da hora. O governo está absorvendo o custo e avaliando como isso será repassado para o preço - rápida ou gradualmente. Mas há questões estruturais. Avançamos na distribuição de renda e criamos uma extensa rede de proteção social. Isso reduziu o grau de desigualdade, desenvolveu o mercado interno. A construção da rede de proteção social implicou um aumento das transferências de renda como porcentual do PIB. Elas eram da ordem de 6,5% e hoje são de quase 10%. Daqui para a frente o desafio, que não é apenas para 2015, mas para ser cumprindo em vários anos, é manter essa conquista e ir além. Não é não voltar atrás. Pode ter alguém que queira voltar o relógio histórico, mas acho impossível e incorreto. Olhando para frente, é preciso ampliar o programa de concessões - e isso vai acontecer - e promover investimentos em tecnologia. Na esfera social, é necessário ampliar gastos com saúde, educação, transporte urbano. O senhor se refere a atender às demandas das manifestações? Sim. Fazer inclusão social com saneamento, habitação, transporte urbano e inclusão digital - que eu acho importantíssima. Lula gosta de dizer que o programa Luz para Todos levou uma grande parcela da população do século 19 para o 20. Para levar essa parcela ao século 21 é preciso inclusão digital. Muitos ganhos podem ser obtidos simplesmente com a adoção aqui de coisas que já são comuns lá fora. Assim como o celular promoveu uma salto de produtividade ao ser difundido, a adoção de banda larga mais rápida pode promover um salto de produtividade nas empresas e nas famílias.

Mas como arrumar o dinheiro? Houve queda na arrecadação porque você teve que adotar uma série de desonerações para estimular a economia e absorver o choque da elevação de alguns preços. Mas há uma parada técnica nas desonerações. A receita tributária tende a subir gradualmente. Como estamos conversando sobre médio e longo prazos, teremos a receita do 3


petróleo. A velocidade em que tudo será feito vai depender da parte macroeconômica - quanto a população está disposta a pagar vai determinar como agir. É preciso elevar a carga tributária? Não. Temos que manter. É possível baixar? Neste momento é difícil, até porque é preciso recompor o resultado primário em bases recorrente para manter a estabilidade da dívida. Os críticos do governo dizem que estão sendo adiados problemas para 2015, como a inflação de tarifas públicas e o ajuste das contas públicas. Como o senhor vê as cobranças? Você tem necessidade de obter resultados primários em bases recorrentes que sejam compatíveis com a estabilidade das finanças públicas. Isso implica uma discussão estrutural. Do lado do gasto, significa redefinir abono salarial, seguro-desemprego, regra de salário mínimo, política para o funcionalismo. Na previdência, o grande debate é se vamos ou não avançar. Há propostas de reforma no Congresso e no governo. Na minha opinião, para quem já se aposentou, a regra não pode mudar. Mas essa discussão não amadureceu, apesar de ser muito importante. Previdência e saúde são dois temas que tocam no centro do orçamento público, até por causa do envelhecimento da população. No curto prazo, porém, tem coisa que pode avançar mais rápido, porque sofre menos divergências, como as questão do benefício de risco (criar novos critérios para pensões por morte e invalidez). O avanço na previdência vai ditar a evolução das transferências em relação ao PIB. O reajuste do salário mínimo, por sua vez, vai definir a velocidade de crescimento do valor dos benefícios. A política atual de aumento do salário mínimo cumpriu um papel importante. Elevou o salário mínimo de cerca de 30% para 40% do salário médio - nível de país desenvolvido da Europa. Não falo pelo governo, não falo pelo PT, mas na minha opinião como economista, porque tenho um projeto de pesquisa sobre isso, acredito que no próximo ciclo 2016-2019 o adequado seria aumentar o salário mínimo em linha com o salário médio. O salário médio cresceu 1,8% no ano passado. É menos que o PIB, mas ainda assim é aumento real. Em linhas gerais, o salário médio acompanha o crescimento da produtividade. O mínimo manterá o patamar e passa a andar junto com o salário médio. Isso deixa de colocar pressão sobre o mercado de trabalho e estabiliza a distribuição salarial. Não coloco a necessidade de fazer um grande ajuste em 2015, mas, sim, de fazer um grande debate estrutural sobre para onde vão as finanças do orçamento público. A questão é se deve ser rápido ou gradual. Acho que precisa ser mais gradual. Você não desmonta de uma hora para outra uma série de subsídios criados nos últimos anos. Basta ver o que os países, dos EUA à Europa, estão fazendo. 4


Para muita gente, a saída é um câmbio mais competitivo. O câmbio é flutuante e as ações do governo até podem ter um efeito no curto prazo, mas o câmbio é guiado por questões internacionais. Uma frase a mais de Janet Yellen (presidente do banco central dos EUA) tem mais efeito sobre a nossa taxa de câmbio do que uma mudança no IOF (Imposto sobre Operações Financeiras). Na questão cambial, o importante é resistir às tentações - de apreciar demais para baixar a inflação ou de depreciar demais para tentar conseguir competitividade no curto prazo. Você acha que governo precisa ter metas a partir de 2015 para o superávit, para dívida e para gasto público? A gente precisa evitar a profusão de metas para não dar confusão e manter as que existem: meta de inflação, de resultado primário. Propus um intervalo de flutuação no primário - mais para melhorar a comunicação. Na prática, o governo já faz isso. A ideia é: você coloca um intervalo e deu. O mínimo é esse e abaixo disso não cai. O máximo é tanto, porque tem que ter um máximo. Às vezes a coisa está boa e muito arrocho é desnecessário. A partir do máximo, discute-se desonerações ou a criação de outro gasto. Você precisa ter um cronograma - não é meta - de quanto será aportado em banco público para os próximos anos, sendo decrescente. Como tratar inflação represada? Vivemos um paradoxo. A expectativa de inflação não cede porque há incertezas sobre se e quando preços de produtos como gasolina e energia serão reajustados. A melhor forma de fazer o ajuste é rapidamente. Em ano eleitoral a gente imagina que, se algo for feito, será suavemente. Não gosto de comentar o que governo pode ou não pode fazer por um motivo óbvio. E essa não é uma decisão trivial. O que posso dizer é que estamos em ano eleitoral e a Selic está subindo. No ano eleitoral de 2010, também subiu. O brasileiro está maduro para separar eleição de ajuste normal de uma economia que está sofrendo pressão de preços. Não seria tão categórico em dizer que nenhum preço se move. Acho que o governo sabe disso e tenta suavizar, mas alguma movimentação ocorre neste ano. Acho que haverá um reajuste dos combustíveis. Não integral, como querem alguns, mas alguma coisa. Na energia está sendo discutido. Como a conta é bem grande, a tendência é que seja distribuída no tempo, com alguma coisa vindo neste ano. Mas como baixar a inflação para voltar no centro da meta? Outra questão da inflação é o câmbio. Sofremos uma depreciação forte em 2012 e 5


2013. E no Brasil, depreciação cambial pressiona a inflação para cima e o crescimento para baixo. Historicamente é assim. Foi assim em 1999, em 2003, em 2009 e está sendo agora. A questão é: o câmbio atingiu o teto ou sobe mais? Acho que sobe um pouco mais, ficará entre R$ 2,40 e R$ 2,50. Passada a turbulência lá fora, o câmbio se estabiliza e cessa a pressão inflacionária. A questão agora é como será a suavização dos preços administrados. Será em 1, 2 ou 4 anos? Qual a melhor convergência de preço do combustível para a Petrobrás? A presidente Dilma foi muito criticada por ter se distanciado do empresariado, mas recentemente deu sinais de aproximação. Foi a Davos, acenou com ajuste fiscal, privatizou... Eu não acho que concessão é privatização. Há uma diferença entre alugar e vender. Mas essa é uma discussão semântica. ...fez concessões à iniciativa privada, mas há dúvidas sobre a postura em um eventual segundo mandato. É equivocada essa visão que o atual governo é contra o mercado. O governo da presidente Dilma não é intervencionista. Nos caso das concessões, é errado o governo querer um serviço com preço mais baixo para o consumidor? De jeito nenhum. Isso é ser intervencionista? Não. É defender os interesses do consumidor num mercado que é naturalmente oligopolizado. É papel do governo fazer isso. A questão foi a forma de fazer. A primeira não deu certo. O governo ajustou e parece que já está no caminho. O senhor disse que o governo quer evitar a ação de oligopólios, mas do outro lado o BNDES colocou dinheiro nos campeões nacionais. Não são ações contraditórias? A maior parte do volume de recursos do BNDES foi canalizada para linhas voltadas à infraestrutura e bens de capitais. O banco fez empréstimos para a consolidação de empresas devido à dinâmica do mercado e da economia. Depois, concluiu-se que seria melhor transformar empréstimo em participação acionária. Não tenho informação suficiente para saber se foi mais adequado ou não. O presidente Luciano Coutinho (do BNDES) disse que essas operações não geraram perdas e acredito nele. O senhor tem conversado com o pessoal do governo e participado de reuniões no Instituto Lula... Trabalhei no governo, tenho amigos lá e converso com várias pessoas. Apoio o governo atual, a reeleição da presidente, participo de algumas reuniões no Instituto Lula, mas não é nada formal. Não sou de nenhum equipe, apenas dou minhas ideias. Conversa com a presidente? 6


Não. Houve uma frustração no primeiro mandato da presidente Dilma, a inflação veio maior e o crescimento, menor. O que deu errado? Já escrevi sobre isso. Houve três fatores. Uma mudança no cenário internacional no final de 2011, quando recrudesceu a crise na Europa e a polêmica do orçamento nos Estados Unidos. Aquilo gerou uma desaceleração mundial, que mudou o câmbio e o preço das commodities, afetando vários países. O Brasil foi afetado por vários choques. Teve o choque da energia, o do etanol e teve também a transição, que é natural, de quando o governo mudou de um modelo baseado no investimento público para um modelo baseado em concessões. Por vários fatores, essa transição acabou sendo mais lenta do que se esperava. Houve problemas com licenças ambientais e atraso em alguns projetos, o que acabou prejudicando o investimento. Essa combinação, desacelerou o crescimento. Houve também a estabilização do crescimento. Para crescer, um país de classe média precisa de mais e mais oportunidades. Precisa ser cumulativo, manter o que se conquistou e dar um passo à frente. Alguns críticos dizem que o problema foi o governo apostar no consumo... Se você pegar os 12 anos do governo, verá que o investimento foi o que mais cresceu. O governo não apostou no consumo. Apostou no fim da desigualdade. A gente quer crescimento com inclusão social. Um dos efeitos da inclusão é que você transforma as pessoas em cidadãos e elas passam a ter acesso a bens e serviços. E a alta do consumo gera oportunidades de negócio e crescimento. Se você estiver na dúvida, olha o número. Ele mostra que o investimento cresceu mais. Esse preconceito com o consumo na verdade é um preconceito contra a distribuição de renda. É achar que inclusão social não é uma coisa tão boa. Eu penso o contrário. O governo de Fernando Henrique Cardoso foi o da estabilização, o do Lula foi claramente o da distribuição de renda. Qual seria é cara do governo Dilma e qual deveria ser o mote em uma eventual reeleição? Difícil dizer. Isso é pergunta para marqueteiro. Tem gente que ganha muito para responder isso. Eu coloco como governo do PT. O mote é crescimento com inclusão. No governo do presidente Lula, você teve uma forte inclusão e no da presidente Dilma você manteve a inclusão, mesmo num cenário mais adverso. É fato que está sendo ampliado, principalmente via educação. Não falo por nenhum candidato. Não sei qual é o mote. Mas justamente porque tivemos sucesso com a inclusão, a linha é desenvolver mais oportunidades - oportunidades para as empresas investirem e para as pessoas se desenvolverem, qualificarem, melhorarem de vida. E isso não é só trabalho da área econômica. Se faz inclusão social além da renda. Do ponto de vista 7


bem economicista, mudou o ciclo mundial. O preço de commodities dificilmente vai voltar ao patamar que teve nos últimos dez anos, muito provavelmente o que vai fazer a diferença é a produtividade. Em relação à questão do intervencionismo, ele não se limita às concessões... Você se refere a questão macroeconômica? Também é um exagero achar que houve a tentativa de fazer controle de preços. Durante um tempo as pessoas acharam que o governo queria controlar o câmbio. O câmbio flutuou. Depois disseram que o governo queria controlar a taxa SELIC. A SELIC subiu. Disseram que o governo não iria deixar a SELIC subir neste ano porque tinha eleição. A SELIC está subindo. Depois disseram que o governo não tem mais meta de superávit primário. O governo já está sinalizando meta de primário. Não é o resultado primário do passado porque as condições do Brasil e do mundo mudaram. Mas continua tendo meta de superávit primário. Acho que você tem o mesmo arcabouço de política macroeconômica: meta de superávit primário, meta da inflação e câmbio flutuante. Mas isso em uma situação macroeconômica diferente, na qual mudou a taxa de câmbio, a arrecadação do governo caiu e a taxa de juros por questões internacionais caiu e agora subiu. Taxa de juros real também flutua. Ela está subindo agora, mas posso garantir que depois ela vai cair. E quando ela voltar a cair, vai cair a um nível mais baixo do que caiu anteriormente. O que há no Brasil é uma redução da taxa real de juros para padrões internacionais - e essa redução acontece com flutuações. Ora ela cai, ora sobe, mas numa trajetória decrescente. O piso de um ciclo é sempre menor que o piso do ciclo anterior. Hoje nós temos uma taxa de juros de um ano da ordem de 5,5%. É a taxa real de juros que a gente tinha no início da crise. Mesmo com uma flutuação, não voltamos aos patamares de 2007. Fomos abaixo disso. O senhor sabe como é o debate interno do PT sobre o papel do Estado e das empresas privadas? Só posso falar por mim. Não sou filiado ao PT e passei pelo governo. Eu tenho amigos no governo e as vezes sou convidado para algumas discussões. Mas eu já fui discutir economia em Campinas (na universidade Unicamp) e na Casa das Garças. Eu discuto com todos os lados. Obviamente, eu me alinho com o governo atual. Apoio o governo atual. Mas só posso falar por mim. Por etapas: todos concordam que o Estado tem um papel importante na estabilidade macroeconômica. Da extrema direita à extrema esquerda. Da Casa das Garças à Campinas. Nem todos concordam, mas eu acho que o governo tem um papel importante na redução da desigualdade e na distribuição de renda. Isso acontece no mundo inteiro. Até nas democracias avançadas, como nos Estados Unidos, o Estado tem papel na distribuição de renda. Tanto nas transferências - seguro desemprego, combate à pobreza e previdência social - quanto em programas que não são ligados à renda, mas melhoram a vida da parcela mais pobre universalização da educação e da saúde pública. Tem gente que acha que temos de ter 8


igualdade total. Eu acho que temos que ter igualdade e oportunidade. O Estado tem papel regulador, principalmente em mercados oligopolizados, aqueles que pela própria natureza tem poucos ofertantes. Podemos separar o que é objetivo e o que é forma. No caso das concessões é um exemplo claro. O objetivo é claro, mas a forma adotada no início não deu certo e foi ajustada. O Estado também precisa fomentar o desenvolvimento de empresas, setores ou atividades. Vários países fazem isso. Não é um debate novo. Alexander Hamilton falava sobre isso no final do século 18, inicio do 19. O Brasil tem exemplos. A Embraer foi criada com incentivos e proteção e hoje compete internacionalmente de igual para igual com as maiores do mundo. A Petrobrás foi criada com incentivos e proteção e virou a maior operadora offshore do mundo. Há casos que deram errados? Claro. Mas isso não quer dizer muito. Você precisa ter política industrial - todo mundo precisa - a questão é saber quando parar com os benefícios. Você não pode ter uma política que ofereça benefícios permanentes. Você dá benefícios por um tempo, mas depois a empresa precisa andar com as próprias pernas. Escolher os vencedores é saber eliminar perdedores. Dar incentivo por um período - dois, cinco anos. É preciso ter um prazo. Mas não pode ser permanente. Caso contrário, deixa de ser política industrial para ser política de proteção. São muitas nuances. Mas eu coloco que o Estado no Brasil tem o papel de fomentar, não as empresas, mas atividades. Por empresa é mais complicado. Mas há setores que se não tiverem ajuda do Estado não vão se desenvolver. O governo Dilma foi o que teve o maior número de medidas protecionistas e menos acordos. Como deveria ser um segundo mandato? O primeiro mandato de Dilma teve mais proteção porque em 2010 a taxa real de câmbio estava no nível mais baixo em 15 anos. Teve uma abertura comercial, via depreciação cambial fortíssima. O governo tentou compensar isso adotando medidas tarifárias. À medida que a taxa de câmbio mudou, retira-se a pressão por políticas tarifárias e podemos ampliar o número de acordos. O Brasil ainda tem um grande potencial para exportar para a América Latina e países em desenvolvimento, como na África. Infelizmente, nosso principal cliente, a Argentina, está com problemas, mas ouvi alguém dizer que a Argentina agora vai resolver o problema. Se deixar o câmbio flutuar, vai ser bom para eles e para nós. A história mostra que quando Brasil e Argentina estão com a taxa de cambio alinhada é bom para os dois países. A situação da Argentina vai levar um tempo para se normalizar - uns dois anos. O grande potencial de expansão do comércio exterior do Brasil está no mundo emergente. Isso não quer dizer que não se possa ter alguns acordos com os Estados Unidos e a União Europeia, mas acho que dependem mais deles do que da gente. Como fazer isso na prática? Esse câmbio e as medidas concessões são suficientes para fazer o País crescer mais? O câmbio é flutuante. Você não toma uma medida direta sobre o câmbio. Você toma 9


medidas para evitar uma volatilidade maior da taxa de câmbio. A principal maneira de fazer isso é com política de estimulo ao investimento. Você garante que o câmbio vai ficar num patamar mais competitivo indiretamente, com uma política fiscal que seja capaz de manter a estabilidade da inflação. A política de juros mantém a estabilidade da inflação e, indiretamente, o câmbio estável em certo patamar - depende dos fundamentos, tanto do lado monetário quanto fiscal. Então, tem que atuar do lado do investimento para aumentar a produtividade e desenvolver o que eu chamo de novas frentes de expansão da economia brasileira. O País teve inclusão via renda. As pessoas estão tendo mais acesso a bens de consumo, bens duráveis e estão se alimentando melhor. Agora precisamos avançar em outras áreas, como habitação. O investimento habitacional vem crescendo no Brasil e ainda tem muito a crescer. Essa é uma área que pode ser uma fonte tanto de investimentos quanto de crescimento, tanto de demanda quanto de oferta muito forte nos próximos anos. Também temos de investir mais na expansão da educação e da inovação. Seria possível ampliar as possibilidades de investimento para capital nacional e internacional. O que mais há na sua agenda de reformas? Há questões ligadas à regulação. Para continuar ampliando o investimento em concessões, é preciso ter uma discussão de cunho financeiro. Não nesse momento, em que a taxa de juros não está baixa. Mas no momento em que a inflação voltar a cair e a taxa de juros voltar a ser negativa - o que os economistas chamam de inverter a curva você tem possibilidade de desenvolver o mercado financeiro por meio de títulos privados. Os bancos públicos podem ter um papel importante pare que eles tomem direto do mercado. Ao invés de o Tesouro tomar emprestado para o BNDES, o próprio BNDES pode ir a mercado. E, teoricamente, vai tomar o dinheiro à mesma taxa do Tesouro, que é a menor taxa da economia. Ele empresta e dinamiza o mercado privado de longo prazo. Empresta com uma taxa um pouco maior e pode subsidiar aquelas linhas são mais prioritárias - como é feito no resto do mundo. Banco de desenvolvimento foca muito em infraestrutura, micro e pequena empresa e inovação. Áreas que têm um retorno social maior, o que justifica algum subsídio. Não seria uma grande reforma. A maior parte do arranjo o governo fez. Aqueles títulos privados de longo prazo, debêntures de infraestrutura, títulos de "duration" com mais de quatro anos não pagam imposto de renda. Isso não se desenvolveu muito porque a taxa de juros subiu, a inflação está volátil e o investimento está retraído. Mas em condições normais, essas medidas que já foram tomadas podem ter mais efeito. Outra discussão importante, mas não acho que tem possibilidade de avançar, é a questão trabalhista terceirização, simplificação da CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas). Como o senhor vê isso? Esse é um assunto muito polarizado. Não sei se é possível chegar a um consenso. Mas existe a possibilidade de melhorar muito a produtividade da economia com algumas 10


medidas que sejam boas para os dois lados - dos trabalhadores e das empresas. Recentemente, houve uma iniciativa, acredito que do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC em conjunto com algumas empresas e apoio da Justiça do Trabalho - que defende a implantação do acordo coletivo de trabalho com propósito específico. É um instrumento que existe na Alemanha. Aqui é flexibilização, mas se você vai perguntar para os alemães, eles dizem que é muito rígido. Esse debate ainda está muito verde. Só retomar o debate já seria uma avanço. No caso da Previdência, o principal seria limitar o benefícios para os herdeiros. Eu nem chego a esse ponto. O congresso precisa discutir muito, mas colocar princípios nessa discussão. No caso do benefício de risco: se vai para um cônjuge, precisa ser proporcional ao tempo de relacionamento, ao número de filhos que tiveram, e à idade da pessoa. Não quero brincar de Deus - definir se o benefício é para 40, 45 anos. O que temos que estudar são as regras de outros países e olhar qual é a realidade do Brasil, Mas normalmente a regra diz que se o cônjuge morreu ou ficou desabilitado, e você está casado há 30 anos, o seu benefício é diferente de quem está junto há um ano. Se está casado há um ano, mas você tem 70 anos, seu benefício é diferente de quem 18 anos. Se está casado há um ano, mas tem três filhos, o beneficio é proporcional ao número de filhos. Já existem regras e sistemas dos mais variados. Acho que temos de analisar o que é feito no resto do mundo e ver o que é adequado para o Brasil. É para a Previdência em geral? Nesse caso, as centrais sindicais, de um lado, querem acabar com o fator previdenciário. De outro lado, o governo tem restrição a isso - o que eu acho correto. Se acabar com o fator previdenciário e não colocar nada no lugar, você pode criar um desequilíbrio previdenciário muito grande. Algumas lideranças querem acabar não apenas com o fator previdenciário. Querem acabar com ele de forma retroativa, o que seria desastre. Seria injusto. As pessoas que se aposentaram com fator previdenciário sabiam qual era a regra quando se aposentaram. Então não pode aposentar com o fator, ter um rendimento e depois de tomar a decisão de se aposentar mais cedo, o rendimento é muito baixo e quero voltar. Isso é muito injusto. Se for para eliminar o fator previdenciário é preciso colocar outra coisa no lugar. Essa é uma discussão que precisa envolver a questão da idade mínima. Sempre para nova geração. À princípio o senhor está satisfeito com atual fator previdenciário, mas se tiver que mudar, tem que trocar pela idade mínima, é isso? Essa é uma discussão de idade mínima. A discussão que apareceu, não dentro do governo, mas no Congresso e nas centrais sindicais, era fazer um sistema misto, em que você adotasse aquela regra 8575 - uma versão atual daquela proposta dos anos 90, para os jovens. Para quem entrou no mercado de trabalho agora. Para quem já se 11


aposentou, a regra não muda. A discussão não amadureceu. Há economistas que dizem que o Brasil está preso numa armadilha de baixo crescimento. O senhor concorda com esse ponto de vista? Não. Acho que vivemos uma mudança forte em alguns preços relativos, como câmbio, o que tem impacto destrutivo no curto prazo. Também sofremos, vou usar uma metáfora, uma mudança de marcha no crescimento. O País teve um forte crescimento baseado na forte expansão da transferência de renda e na inclusão social. Quando você sai de 6% de transferência para quase 10% você dá um impulso ao consumo e à demanda. No momento em que estabiliza, os ganhos sociais se mantêm, mas não há mais aquele impulso no crescimento. O impulso agora precisa vir de outro lugar. O próprio sucesso da política faz com que ela tenha menos efeito. A forma de estimular o crescimento pelo lado da demanda é o investimento. Nesse caso, é preciso esclarecer um ponto: a taxa de investimento no Brasil, considerando o conceito relevante para os economistas, que desconta a variação de preço, subiu. Foi de 16,5% para 20% até 2010. Desde então ela está a 20% do PIB em preços constantes. Por um lado o copo está meio cheio, por outro, meio vazio. Houve um recrudescimento da crise mundial e a taxa de investimento no Brasil parou de subir, mas continua em 20%. Não caiu. Tem gente que prefere ser pessimista e dizer que ela parou de subir. Mas ela também não caiu. O desafio agora é retomar o investimento. Para mim está claro, pelas ações do governo, qual é a prioridade - crescimento puxado pelos investimentos e a recomposição das exportações. Isso não será de imediato porque a Argentina está com problemas, mas o mundo está se recuperando e com o câmbio mais competitivo, as exportações vão voltar a contribuir para o crescimento. Brasil tem pouca dependência de capital externo, afirma Tombini 'Temos tranquilidade para atravessar esse período de transição da economia mundial', destacou o presidente do Banco Central. A economia brasileira é pouco exposta a moedas estrangeiras e pouco dependente de capital externo. "Possuímos um sistema financeiro sólido, com elevados níveis de capital e de provisão, baixa exposição a moedas estrangeiras e pouca dependência de recursos externos", afirmou o presidente da autoridade monetária, em seu discurso de encerramento no XVI Seminário de Metas para a Inflação. Além disso, segundo Tombini, a regulação e supervisão prudenciais realizadas pelo BC são mais rigorosas do que as observadas na maioria das economias avançadas, o que ajuda na avaliação do comportamento dos mercados. "Nossa supervisão é intrusiva e conta com importantes sistemas de registros e monitoramento, permitindo uma avaliação abrangente e precisa do comportamento dos agentes e dos mercados", disse. Políticas monetárias. O "arcabouço de políticas monetária e financeira" do Brasil é resiliente, disse Tombini. Em discurso, o presidente do BC resumiu essa estrutura em 12


quatro pilares: o regime de metas para a inflação, o regime de câmbio flutuante, a política de acumulação de reservas e a regulação e supervisão prudenciais. "O nosso arcabouço (...) foi testado em diversas situações adversas e se mostrou sólido, eficiente e com flexibilidade suficiente para se adaptar a cada contexto. Por isso, temos tranquilidade para atravessar esse período de transição da economia mundial, bem como a sua nova normalidade, qualquer que seja a sua configuração", afirmou Tombini.

Demanda do consumidor por crédito cai 11,0% em abril A demanda dos consumidores por crédito no País caiu 11,0% em abril ante o mesmo mês do ano passado, devido à quantidade menor de dias úteis pelo feriado da Páscoa, que no ano passado ocorreu em março, informou nesta sexta-feira a Serasa Experian. Segundo economistas da Serasa Experian, as sucessivas elevações do custo dos empréstimos, um menor grau de confiança dos consumidores e a aceleração da inflação vêm desestimulando consumidores a buscar crédito. Na análise por faixas de renda, a maior queda na procura por crédito em abril, de 28,4%, ocorreu na faixa de renda mais baixa, de consumidores com rendimento de até R$ 500 mensais. Na faixa de renda de R$ 500 a R$ 1 mil por mês, a queda foi de 11,0%, enquanto nas faixas de R$ 1 mil a R$ 2 mil e de R$ 2 mil a R$ 5 mil houve recuo de 5,1% e 11,1%, respectivamente. Entre aqueles que ganham R$ 5 mil a R$ 10 mil por mês, a queda foi de 16,6% no primeiro trimestre, e na faixa de renda mais alta, acima de R$ 10 mil, a procura recuou 16,9%, segundo a Serasa. Por regiões, a queda da procura por crédito em abril foi mais expressiva nas regiões Norte e Nordeste, com um recuo de 14,5% nas duas regiões. A região Centro-Oeste viu uma queda de 11,5% na busca por crédito, e Sudeste houve recuo de 9,8%, seguido por quedas de 9,4% Sul.

O gato que caça o rato Na crise de 2008, a China não teve problemas de crédito como muitos países. Seu problema, gravíssimo, foi comercial. O motor da economia chinesa eram as exportações para os EUA e para a Europa ocidental, e sua redução levou Pequim a embarcar num projeto contracíclico de investimentos maciços em infraestrutura e de expansão do crédito, particularmente o imobiliário. A China vive hoje a ressaca desse projeto. Ironicamente, o país que entrou na crise sem problema de crédito passou a tê-lo por causa da expansão exagerada dos financiamentos e criação de bolha imobiliária, como foi o problema americano, num contexto diferente. Além disso, a ação contracíclica causou grande distorção na alocação de recursos, produzindo projetos ineficientes e excesso de capacidade nos setores imobiliário, industrial e de infraestrutura. 13


Há um consenso hoje em Pequim de que não se deve persistir naquela estratégia para enfrentar a atual desaceleração econômica. O país é rigoroso no ajuste do mercado de crédito e na transição do modelo exportador primeiro para o modelo de investimento em infraestrutura e agora para o modelo de desenvolvimento do mercado de consumo doméstico. Um quadro agravado pelo problema agudo da poluição, que pode fechar indústrias no médio prazo. Esse enfrentamento vigoroso dos problemas é comum na história da China. Ela passou de confucionista onde a tradição pesava mais do que a ciência e o futuro, congelando o país na Idade Média a um país comunista, com o líder Mao Tse tung impondo processo de destruição sistemática dos valores e da tradicional estrutura política e social, chegando ao extremo de, no conceito de revolução permanente, destruir a estrutura administrativa que ele próprio havia criado. A Revolução Cultural maoista buscou a ciência ideológica, submetendo cada ato e cada passo, não só político, mas também científico e econômico, à matriz ideológica. Uma vantagem dessa experiência radical foi que chegou aos limites da ideologização da política, da economia e da ciência, levando à desorganização econômica. Com a ascensão de Deng Xiaoping, em 1978, houve a grande inflexão da economia, simbolizada pela sua frase: "Não me interessa a cor do gato desde que ele cace o rato". A China passou do extremo ideológico para o pragmatismo, buscando na economia, na ciência e na administração pública as soluções mais eficazes para cada situação específica. É uma lição para todos, principalmente na América Latina, ainda contaminada, em graus diferentes, por pensamentos ideológicos onde eles não são aplicáveis. O exemplo chinês mostra que o foco na eficiência e no resultado é o melhor caminho para a sociedade. Henrique Meirelles é presidente do Conselho da J&F (holding brasileira que controla empresas como JBS, Flora e Eldorado) e chairman do Lazard Americas. Ele foi presidente do Banco Central do Brasil de 2003 a 2010 e, antes disso, presidente global do FleetBoston e do BankBoston.

O governo da gerentona está tonto A doutora Dilma deveria chamar os ministros Aloizio Mercadante e Guido Mantega para saber se é verdade que seu governo está represando tarifas e preços de combustíveis. Um diz que está, para o "bem da sociedade". O outro diz que não. Essa pode ser uma discussão interminável, sobretudo se depender da retórica de sábios como Mercadante e Mantega. Ambos patrocinam mais uma versão do Refis (pode me chamar de Bolsa Sonegador). Na sua oitava temporada, ele ressurgiu no entulho da medida provisória 627. Trata-se de um mecanismo pelo qual quem deve à Receita Federal inscreve-se no programa, livra-se de multas e parcela o débito a perder de vista. O Congresso aprovou um absurdo, esquecendo-se até mesmo de estabelecer um prazo para a quitação. A doutora Dilma vetou a maracutaia, mas sua essência tramita numa nova MP, a 638. 14


Os beneficiários desse mimo serão, sobretudo, grandes empresas. Nas versões anteriores, bancos e multinacionais safaram-se de autuações que chegavam a R$ 680 bilhões. A Vale ganhou um desconto de R$ 45 bilhões. A Companhia Siderúrgica Nacional livrou-se de um espeto de R$ 5 bilhões, e a petroquímica Braskem limpou uma conta de R$ 1,9 bilhão. Em 12 anos de governo, com sucessivas versões do Refis, o comissariado criou uma segunda porta nas relações com o fisco. Numa, quem deve paga. Nessa modalidade estão pequenos empresários apanhados num pulo de gato ou num erro. Grandes empresas, com serviços financeiros (e advogados) de primeira, aprenderam que o governo se assusta quando fica sem caixa e, para raspar o tacho, reduz suas cobranças a preços camaradas. Assim, o melhor negócio é não pagar o que a Receita cobra, à espera do próximo Refis. BOLA NA REDE A doutora Dilma cobrou e marcou. Vetou o contrabando incluído na medida provisória 627 que aliviava as operadoras de planos de saúde do pagamento das multas por negativa de serviços contratados pelos quais recebem. Era uma verdadeira gracinha. Quanto mais procedimentos a operadora negasse, menor seria o custo unitário da multa. Um claro estímulo à delinquência. Fica um mistério: quem pôs o gato na tuba e conseguiu aprovar a medida na Câmara e no Senado. O deputado Eduardo Cunha, relator da MP, diz que não foi ele. Quem foi, não diz. Informa apenas que discutiu o assunto com comissários da Casa Civil e do Ministério da Saúde. Sabe-se que pelo menos uma grande operadora achou que aquilo era uma maluquice. Sabe-se também que o próprio Cunha teria advertido os interessados que o truque ia dar bolo. O LOBO DE TRILUSSA Vendo-se a fala de Lula propondo que o PT recupere "o orgulho" no combate à corrupção, sai da tumba do poeta italiano Trilussa (1871-1950) uma de sua fábulas: "Um lobo disse a Deus: —Algumas ovelhas dizem que eu roubo muito. Precisamos acabar com essa maledicência. E Deus respondeu: —Roube menos." (A fábula vale para qualquer cacique que venha com o mesmo discurso). A GRANDE REFINARIA De um sábio: "Pela tradição, as CPIs em torno da Petrobras dão em nada ou em denúncias envolvendo quinquilharias. Se essa nova comissão trabalhar a sério, vai-se perceber que a refinaria de Pasadena é mixaria se comparada com o que aconteceu na Abreu e Lima, de Pernambuco”. EREMILDO, O IDIOTA Eremildo é um idiota e há anos insiste em proclamar que se faz uma injustiça quando se diz que Paulo Maluf tinha milhões de dólares no exterior. O deputado nega que esse 15


dinheiro fosse dele e tem razão. O ervanário é do idiota, que está pronto para assumir a paternidade das contas. Agora, um tribunal suíço revelou que a Alstom depositou US$ 2,7 milhões numa conta controlada por Robson Marinho e sua mulher. Ele foi chefe da Casa Civil no governo tucano de Mário Covas e hoje é conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo. O doutor diz que nunca recebeu dinheiro da Alstom. É verdade, de novo. O ervanário era do cretino. Se a Justiça aceitar o pleito de Eremildo, resolve-se uma parte do problema, pois ninguém precisará perguntar para onde ia o dinheiro depois que a Alstom pingava os capilés. PEDRA CANTADA O senador Aécio Neves sabia perfeitamente em que água navegava quando orgulhouse de ter no Solidariedade o primeiro partido a apoiar sua candidatura. Se não lhe bastasse a sombra do mensalão mineiro, aproximou-se da rede de influência do doleiro Alberto Youssef, que estava restrita ao PT e ao PP. O deputado Luiz Argôlo, do Solidariedade, trocou 1.411 mensagens com o doleiro. REFIS-PILOTO Nos próximos quatro domingos o signatário estará ausente deste espaço, integralmente dedicado ao projeto-piloto de um novo tipo de Refis. Em vez de trabalhar e pagar impostos, continuará pagando o que lhe cobram, mas ficará sem trabalhar. Se der certo, muda a história do mundo. CELSO DANIEL VOLTA A ASSOMBRAR O PT O sequestro e assassinato de Celso Daniel parecia esquecido. O prefeito de Santo André era o coordenador da campanha de Lula em 2002, foi capturado na saída de um restaurante e dois dias depois seu corpo apareceu numa estrada deserta, com 11 tiros. Segundo a polícia paulista, o sequestro foi coisa de uma quadrilha que o confundiu com outra pessoa. A execução teria sido praticada por um menor de idade. Parte da família de Celso Daniel não acredita nessa conclusão. Passados 12 anos, coisas esquisitas aconteceram: seis pessoas envolvidas no caso foram assassinadas a tiros e uma promotora que investigava o caso sofreu um acidente automobilístico, mas sobreviveu. Os inquéritos da polícia foram contestados pelo Ministério Público, mas a iniciativa foi travada na Justiça, iniciando-se um litígio que está no Supremo Tribunal Federal. Os promotores acusam de envolvimento no crime o empresário Sérgio Gomes da Silva, o Sombra, que dirigia o carro do prefeito quando ele foi sequestrado. Se essa tese prevalecer, não houve delito comum, mas outra coisa, mais grave. A deputada Mara Gabrilli (PSDB-SP), filha de um empresário de transportes de Santo André, diz a quem quiser ouvir que seu pai era extorquido por uma quadrilha anexa à prefeitura que levava o dinheiro ao comissário José Dirceu. Segundo ela, Celso Daniel queria desmontar o bando. Assim como o tucanato desafiou a sorte mantendo o caso do cartel da Alstom em banho-maria, o comissariado poderá perceber que a procrastinação do julgamento do

16


empresário foi manobra temerária. Gabrilli pergunta: "Porque 'Sérgio Sombra' não foi julgado?". Se o STF destravar o processo, é difícil, mas pode até acontecer de Sombra ir a julgamento antes da eleição. Elio Gaspari, nascido na Itália, veio ainda criança para o Brasil, onde fez sua carreira jornalística. Recebeu o prêmio de melhor ensaio da ABL em 2003 por 'As Ilusões Armadas'. Escreve às quartas-feiras e domingos.

Metade das famílias de classe média vive 'enforcada' Metade das famílias de classe média brasileira tem problemas para pagar as contas enquanto os mais pobres tem controle rigoroso das finanças.

Classe média endividada: 47% dos inadimplentes são da classe C, segundo o SPC São Paulo - As classes C, D e E podem dividir a base da pirâmide, mas não lidam com questões financeiras da mesma maneira. Essa é outra constatação da pesquisa realizada pela consultoria Plano CDE. Apesar de ter mais renda, a classe média - aquela que puxou o consumo nos últimos anos - demonstra menos habilidade do que os mais pobres para lidar com as contas. A Plano criou três perfis de relacionamento de orçamento familiar. O organizado (faz a gestão de ganhos e gastos, se priva e, quando consegue, poupa). O desorganizado (não sabe quanto ganha ou gasta e entra no vermelho regularmente). O orientado pela dívida (que destina tudo que ganha ao pagamento das contas e vive com a corda no pescoço). Apesar de serem considerados mais arriscados pelo sistema financeiro, porque têm renda inferior, os mais pobres se mostram bem mais organizados - 71% têm controle rigoroso das finanças. 17


As famílias de classe média que participaram da pesquisa tiveram um comportamento bem diferente - 22% se mostraram desorganizados e 28%, orientados pelas dívidas. Ou seja: metade deste grupo teve problemas para pagar as contas. "Não podemos expandir o dado para o Brasil e dizer que metade da classe média, que reúne 98 milhões de pessoas - incluindo os 64 milhões de classe C - estão nessa condição", diz Luciana Aguiar, sócia diretora da Plano CDE. "Mas é possível dizer que há uma forte propensão a esse comportamento." Na avaliação de Luciana, vários fatores contribuem para colocar a classe média nessa situação, além do fato de a renda oscilar. A falta de instrumentos financeiros adequados é uma delas. A classe média hoje recorre muito, por exemplo, ao cartão de crédito. Integrantes da pesquisa tinham cinco, alguns até dez cartões, que funcionavam como cheque especial. Essa ineficiência também foi percebida em outras pesquisas. O SPC Brasil, empresa de cadastro de crédito, identificou no final do ano passado que 47% dos inadimplentes eram da classe C e estranhou o dado. "Na nossa avaliação, esse dado mostrou que a classe C não consegue se blindar com alternativas de crédito e rolagem de dívidas, como as classes A e B", diz Luiza Rodrigues, economista do SPC. Dívidas Há também questões comportamentais. As famílias que participaram da pesquisa responderam a 1.107 entrevistas. Nesses momentos, muitas diziam não ter dívidas. Mas, ao olhar em detalhe o orçamento nos diários financeiros, a Plano encontrava as dívidas. Mercado espera inflação maior em 2014 e crescimento econômico menor 19/05/2014 às 09h03 Por Ana Conceição | Valor SÃO PAULO - Os analistas do mercado financeiro voltaram a elevar suas apostas para a inflação, mas a projeção não chegou a superar o teto da meta perseguida pelo Banco Central (BC), como há algumas semanas, de acordo com o Boletim Focus. As estimativas para o juro básico continuam as mesmas. Após ter suavizado para 6,39% de alta na semana anterior, a mediana das estimativas para o avanço do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) passou para 6,43%, a pouca distância do teto da meta de 6,50%. A estimativa em 12 meses seguiu inalterada em 5,88% de aumento, assim como a projeção para o IPCA de maio, que ficou em 0,47% de alta. Para a SELIC, tudo igual. Os analistas continuam a estimar que o juro básico encerre em 11,25% neste ano ante os atuais 11%. Até o fim de 2015, o mercado vê o juro em 12,25%. Houve ajustes nas estimativas para o aumento dos preços administrados, de 5% para 4,95% neste ano, e de 6,03% para 6,28% em 2015. Os analistas Top 5 – aqueles que mais acertam as previsões – continuam a ver o IPCA acima do teto da meta neste ano, mas revisaram sua estimativa, de 6,69% para 6,62% de avanço. Reduziram ainda a projeção para a taxa SELIC, de 11,75% para 11,50%. 18


Para 2015, a expectativa de inflação seguiu em 6,35% e para a SELIC, em 13%. As estimativas são medianas de médio prazo. O Boletim FOCUS mostra uma melhor nas expectativas dos analistas com relação a outros indicadores de inflação, que foram revisados para baixo. A mediana das projeções para o IPC-Fipe, por exemplo, foi de elevação de 6,10% para 5,94%. Há quatro semanas estava em 6,19%. Para o IGP-DI, passou de 7,25% para 6,87% de alta. Há um mês estava em 7,35%. Para o IGP-M, a expectativa saiu de 7,21% para 7,11% de avanço. Com relação ao desempenho da economia, os analistas consultados pelo BC preveem crescimento de 1,62% em 2014 e de 2% em 2015. Antes, estimavam expansão de 1,69% e 1,90%, respectivamente. No caso da taxa de câmbio, a previsão é de dólar a R$ 2,45 no encerramento deste ano, sem alteração pela sexta semana seguida, e a R$ 2,51 em 2015, acima da estimativa anterior, de R$ 2,50.

A boa análise de volta Depois de algumas colunas em que procurei refletir sobre temas econômicos pontuais volto hoje minha atenção para a conjuntura econômica neste mês de maio. Em um mundo em que as principais economias caminham de mãos dadas, em função principalmente das operações de arbitragem dos agentes financeiros, o analista tem que manter sua atenção em três grandes blocos: Estados Unidos, Europa e China. As outras economias são figurantes e respondem aos movimentos que ocorrem nestas três grandes forças do mundo globalizado dos últimos anos. A este fenômeno de sincronização de expectativas é que nós analistas profissionais chamamos de arbitragem. Explicando melhor: a cada informação relevante no centro econômico seguem-se movimentos de mercado na periferia, respondendo a um soft construído pelos agentes financeiros, usando muita matemática. Vejamos alguns destes movimentos que marcaram nos últimos doze meses, o comportamento dos ativos brasileiros. Em maio de 2013 o Federal Reserve emitiu o primeiro sinal claro de que iria começar a reduzir os estímulos monetários da terapia pouco ortodoxa, de inspiração keynesiana, que ele usou no enfrentamento da crise nos Estados Unidos. Imediatamente iniciou-se o processo de arbitragem nos mercados financeiros do mundo que se seguiu ao aumento dos juros de prazo mais longo na maior economia do mundo. Alinhamento entre BCE e Bundesbank levou juros europeus ao ponto mais baixo, elevando a atratividade do Brasil Em cinco meses os juros dos títulos de dez anos do governo americano passaram de 1,5% ao ano para 3%. A reação normal e equilibrada a esta mudança deveria ter sido um ajuste nos mercados emergentes, principalmente nos países que dependem da entrada de capitais internacionais para o equilíbrio de suas economias. Juros mais elevados nos Estados Unidos certamente levariam a ajustes para cima nos juros externos de equilíbrio e, em função disto, a uma redução no crescimento econômico. 19


E foi realmente o que ocorreu entre maio e julho de 2013 no mundo emergente, com desvalorização das taxas de câmbio, ajustes nos juros futuros e nos preços de ações e, no nível macro, uma correção para baixo nas expectativas de crescimento econômico. Este ajuste deveria ser suave e espaçado ao longo do tempo em função das mensagens claras enviadas pelo Fed de que os juros americanos seriam elevados apenas entre fins de 2015 e início de 2016. Mas os especuladores desenvolveram uma teoria conspiratória segundo a qual a normalização dos juros na maior economia do mundo criaria um efeito semelhante ao de um grande aspirador de recursos financeiros, gerando uma crise de liquidez sem precedente nos países emergentes com déficits em conta corrente. Sem liquidez, os mercados financeiros locais entrariam em colapso e estaria criada uma terceira onda da crise financeira iniciada em 2008 com a quebra do banco Lehman Brothers. Com esta teoria ficou muito fácil especular contra o real e a Bovespa, pois o Brasil teria uma componente adicional na direção do cenário da catástrofe perfeita, com o governo Dilma sem credibilidade e cometendo erros seguidos na gestão da economia. Felizmente os governos e, principalmente os Bancos Centrais dos países eleitos para o cenário da catástrofe perfeita agiram com rapidez e correção. O BC brasileiro foi um dos mais ativos deste grupo pois, além dos aumentos dos juros, criou um sistema inteligente de prover liquidez no mercado de câmbio, evitando com isto que os especuladores aproveitassem o pânico para ganhar a guerra. Os ânimos se acalmaram no trimestre final de 2013 na medida em que o discurso do Fed de que os ajustes nos juros só viriam muito à frente e as ações oficiais nos países do cenário de catástrofe perfeita serviram como amortecedor da crise. Mas no início de 2014, aproveitando a pouca experiência da nova presidente do Fed em tourear os políticos do Congresso americano, os defensores do efeito aspirador nos mercados financeiros voltaram à tona. Os juros de dez anos dos títulos do governo americano viveram um novo pico de alta e os mercados emergentes novamente sofreram com o pessimismo. Mas, como disse há muito tempo um experiente político que "não se pode enganar a todos o tempo todo", a onda especulativa em março chegou mais como uma última marola no mundo emergente. Além disto um novo ventilador de dinheiro - que funciona no sentido inverso do aspirador - pode estar sendo acionado na próxima reunião do Banco Central europeu, anulando pelo menos em parte o fim do "Quantitative Easing" nos Estados Unidos. Em uma mudança de 180 graus em sua posição, o Bundesbank - Banco Central da Alemanha - passou a apoiar um novo relaxamento monetário em uma região com um PIB do tamanho dos Estados Unidos. Com este inesperado alinhamento entre o BCE e o Bundesbank os juros europeus estão em seu ponto mais baixo da história, forçando o investidor deste mercado a buscar aplicações com juros reais mais elevados em países como Brasil. Com este cenário mais racional, pelo menos nos próximos meses, deveremos ter uma estabilidade maior no mundo emergente. No caso do Brasil esta estabilidade estará influenciada pelas novas pesquisas eleitorais que vão ocorrer nas próximas semanas. 20


Luiz Carlos Mendonça de Barros, engenheiro e economista, é diretor-estrategista da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações. Escreve mensalmente às segundas. Jornal Valor Online.

Populismo econômico Em um livro cujo título em inglês tem um evidente duplo sentido (Left Behind; The University of Chicago Press, 2010), Sebastian Edwards retomou o tema do "populismo econômico" na América Latina, analisado por ele e por Rudiger Dornbusch em 1991. Para eles o populismo econômico existe quando "é enfatizado o crescimento e a distribuição de rendas sem qualquer ênfase nos riscos de inflação e de geração de desequilíbrios externos". Discutindo o caso do Chile, Edwards expõe em seu livro que, depois de um período de 17 anos de ditadura, no qual foi executado um programa econômico objetivando o equilíbrio fiscal, o controle da inflação e a abertura da economia ao comércio internacional, o recém-eleito presidente, Patrício Alwyn, recebia pressões dos partidos que o apoiaram para aumentar os gastos sociais, visando combater a pobreza e desconcentrar a distribuição de rendas. Quando, em entrevista dada à Newsweek, seu Ministro de Finanças, Alexandro Foxley, foi questionado se o governo continuaria com as políticas econômicas do governo anterior, às quais eram atribuídos os maus resultados no campo social, ele respondeu: "Manteremos uma economia aberta, plenamente integrada nos mercados mundiais, junto com o dinamismo das exportações e um setor privado plenamente comprometido com o crescimento econômico". Ao continuar com políticas próximas do que mais tarde se definiu como o "Consenso de Washington", às quais eram atribuídos os maus resultados no campo social, Alwyn não renunciava ao objetivo de combater a pobreza e a concentração de rendas: apenas reconhecia que as duas coisas podiam ser feitas ao mesmo tempo. Desde então, o Chile tem sido exemplo de sucesso na manutenção do crescimento acelerado e na melhora de todos os indicadores sociais. Ainda que em graus diferentes, FHC e Lula em seu primeiro mandato cuidaram do equilíbrio fiscal, do controle da inflação, e realizaram reformas voltadas ao crescimento econômico, ao mesmo tempo em que combatiam a pobreza e agiam na direção de melhorar a distribuição de rendas. Mostraram que as duas coisas são possíveis ao mesmo tempo. No entanto, ainda que o Brasil esteja distante dos casos agudos de populismo econômico, como os de Argentina, Venezuela e Bolívia, tem dado passos nessa direção. O combate à inflação foi afrouxado, dependendo mais da repressão dos preços administrados do que das ações do Banco Central; a taxa de juros transformouse em objetivo de política econômica; e a política fiscal tornou-se expansionista, quer reduzindo os superávits primários - que se escondem atrás contabilidade criativa -, quer transferindo recursos por fora do orçamento para bancos públicos. 21


Para voltar a crescer, o Brasil teria de retornar ao regime macroeconômico que esteve em prática até o fim do primeiro mandato de Lula, aprimorando-o e afastando-se do populismo econômico. Mas esta não é a única alteração. Ao explorar as razões para o baixo crescimento na América Latina, Edwards ressalta o fechamento das economias com relação ao comércio internacional. Ainda que existam visões contrárias, há, na literatura, fartas evidências de que os países que crescem mais são os mais abertos ao comércio exterior. Não se trata de gerar superávits mais elevados no balanço comercial e nas contas correntes, mas simplesmente de elevar ao mesmo tempo o volume de importações e exportações em relação ao PIB, aumentado a proporção de produtos trocados internacionalmente. Um desses países é a Coreia, que também tem sido usada como um exemplo de sucesso das "políticas industriais". Mas as "políticas industriais" na Coreia não foram usadas para erigir barreiras protegendo a indústria local contra a competição internacional, com empresas multinacionais trazendo investimentos para explorar o seu mercado interno, como ocorre no caso brasileiro. Elas foram usadas para que o aumento das importações reduzisse custos de produção, contribuindo para elevar as exportações. Proteção. O caminho que vem sendo perseguido pelo Brasil tem uma marca de "proteção à indústria nascente" (que nunca fica adulta), como a que foi usada no período da substituição de importações, e tende a fechar a economia em vez de abri-la ao comércio internacional. No caso da indústria automobilística, por exemplo, a proteção tarifária e não tarifária mantém elevados os preços dos automóveis, mas são baixas as tarifas sobre partes componentes, o que gera uma forte proteção sobre o valor adicionado, aumentando os lucros, estimulando que mais e mais montadoras de automóveis se mudem para o Brasil. Contrariamente ao que ocorre na Coreia, no entanto, onde maiores importações baixaram os custos dos produtos voltados para a exportação, no caso brasileiro o desestímulo às importações gerou uma ampliação das margens de lucro dos produtos voltados para o mercado interno, atraindo capitais que entram para explorar as grandes dimensões do nosso mercado doméstico. No final dos anos 1960 e início dos anos 1970 vivíamos algo semelhante, e a solução encontrada pelo governo foi criar subsídios às exportações. A introdução dos subsídios, que são nitidamente uma distorção, teve o papel de anular (ou pelo menos reduzir) outra distorção, gerada pela elevada proteção (tarifária e não tarifária) às importações. Entrou em cena o que os economistas chamam de "teorema do segundo ótimo" (o teorema do "second best"). O nome é estranho, mas o resultado é obvio. Tudo começa quando um aumento da proteção reduz as importações, o que, por um jogo simples das curvas de oferta e procura de moeda estrangeira, leva à valorização cambial, que, por sua vez, penaliza as exportações. Ou seja, por este mecanismo, um 22


imposto sobre as importações se transforma em um imposto sobre as exportações, desestimulando-as. O esquema de subsídios às exportações era interessante, porque visava anular o efeito da valorização cambial, mas infelizmente eles são ilegais em acordos internacionais, e não puderam ser mantidos. Por algum tempo reduziram-se as tarifas e as barreiras não tarifárias, mas insidiosamente vêm se elevando, disfarçadas em várias roupagens, como a dos níveis mínimos de conteúdo nacional. A distorção gerada pela proteção tarifária e não tarifária tem um nome: valorização cambial. É curioso que os empresários da indústria, que são extremamente ativos em combater certas manifestações de valorizações do câmbio nominal, como a que ocorreu quando o Federal Reserve começou a usar as várias versões do quantitative easing, se calem diante da valorização que vem de um protecionismo excessivo. A explicação está no campo da defesa mais imediata de seus interesses. Quando o câmbio se valoriza porque o diferencial de taxas de juros atrai capital, há um inimigo comum, que são os "especuladores", contra os quais todos se unem. Mas quando a valorização vem de políticas que superprotegem a produção doméstica contra as importações, o setor industrial fica dividido, e a preferência recai sobre o aumento das pressões no governo, que é instado a gerar compensações como o crédito subsidiado, as desonerações tributárias ou outras formas que atendem os interesses dos "rent seekers". Atualmente, o Brasil não consegue mais crescer absorvendo a mão de obra, como ocorria nos anos do pós-guerra, porque não há mais um "exército industrial de reserva", como havia nos anos 1950 e 1960. Terá de crescer elevando a taxa de investimentos e a produtividade do trabalho, e um caminho é o do aumento da competitividade das exportações, através da maior abertura da economia. Se seguisse este caminho, aumentando importações e exportações, complementado pelos investimentos em capital humano, aumentaria a taxa de investimentos e a produtividade do trabalho. Colheria um crescimento mais acelerado do PIB e uma melhora na distribuição de rendas. Mas, se continuar com as políticas atuais, progrediremos por algum tempo no campo da distribuição de rendas, mas no campo do crescimento econômico seremos "deixados para trás", como prevê a análise de Edwards.

23


24


25


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.