Relatório Azul 2012

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1 - ÉTICA, MERCADO E DIREITOS HUMANOS - Thomas Kesselring

vimos, as regras morais nascem da cooperação e têm a função de garantir o seu caráter pacífico. A concorrência ou competição é algo bem diferente. No esporte é comum pôr em ordem hierárquica as realizações dos participantes. A competição, então, desempenha um papel central: No futebol, por exemplo, concorrem dois times; nas olimpíadas concorrem, em cada modalidade, dezenas de atletas. Nessas circunstâncias, agir segundo a Regra de Ouro seria não apenas inédito, mas simplesmente absurdo. Pois se um atleta renunciasse a se esforçar ao máximo para melhorar as chances dos seus concorrentes, ele não seguiria as regras do jogo. Pior ainda: Se a maioria dos atletas fizesse isso, eles aniquilariam as condições da competição. As circunstâncias vigentes no mercado mostram aspectos parecidos. Uma vez que o mercado baseia-se na competição, a Regra de Ouro nele tampouco é válida. Isso torna-se óbvio, por exemplo, quando negociamos o preço de algo: Como compradores estamos interessados em preços baixos, ao passo que enquanto vendedores preferimos preços mais elevados. Se o comprador negociasse segundo a Regra de Ouro, ele deveria, para agradar o seu contraente, fazer com que pela negociação o preço subisse, e o vendedor que aplicasse a Regra de Ouro deveria baixar o preço ao máximo. Tal negociação invertida não apenas seria paradoxal, mas sim contrária aos mecanismos do mercado. Se todos (ou se a maioria) dos atores no mercado negociassem assim, eles tornariam inválidas as condições do mercado. Eles as destruiriam. Aparentemente há uma tensão entre a competição e a ética. Em outras palavras: A ética não nasce nem da competição nem da negociação. Na competição desportiva e na negociação a Regra de Ouro desempenha um papel apenas indireto: Os atores devem seguir certas normas, como, evidentemente, a norma de não matar nem agredir o outro e de seguir as regras do jogo. No futebol a “falta” não é nada mais e nada menos que a infração de uma regra (Kesselring, 2009, cap. I.8). Quando negociamos, seguimos, em primeiro lugar, as leis da competição e, em segundo lugar, as leis da cooperação: Consideramos o outro, por um lado, como alguém com quem pretendemos fazer um negócio e com quem (ou contra quem), ao mesmo tempo, queremos ganhar uma vantagem. Segundo, consideramos o outro também como parceiro, com quem queremos cooperar. Portanto, logo que a negociação terminar, temos que cumprir o nosso compromisso [“pacta sunt servanda”, diz o provérbio latino]: Enquanto compradores devemos pagar o preço combinado, e enquanto vendedores devemos entregar a mercadoria. Ambos os parceiros esperam mutuamente que o outro coopere, segura e fidedignamente.

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