PUCRS Saúde nº 24 – Outubro de 2014

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OUTUBRO DE 2014 – Nº 24

FOTO: GILSON OLIVEIRA

Especialista apresenta tendências na área do câncer

Iniciativa propõe capacitação de médicos em regiões carentes

idoso Atenção ao

Com equipe e estrutura diferenciadas, HSL destaca-se no atendimento geriátrico


EDITORIAL

Desde a criação O

cuidado com os idosos está intimamente relacionado aos primórdios do Hospital São Lucas da PUCRS (HSL), quando foram estabelecidos o Serviço de Geriatria e o Instituto de Geriatria e Gerontologia da PUCRS (IGG). Em quatro décadas de trabalho, muitos avanços ocorreram, tanto no que se refere às pesquisas e à maneira de

atender esse público, como na expectativa de vida. Nesse período, mudou o perfil das doen­ças que acometem as pessoas na terceira idade, desafiando aqueles que atuam na assistência. A revista PUCRS Saúde apresenta nesta edição os esforços do HSL e do IGG para formar profissionais especialistas e oferecer um serviço de qualidade aos pacientes.

Mostra ainda as tendências na área do câncer, sob o ponto de vista de Olufunmilayo Olopade, especialista nigeriana reconhecida internacionalmente por suas pesquisas e pelo seu trabalho de disseminação do conhecimento. Nessa mesma linha, enquadra-se o projeto Echo, criado pelo gastroenterologista Sanjeev Arora, da Universidade do

Novo México (Estados Unidos), para levar a formação médica especializada a regiões carentes e melhorar o atendimento oferecido à população, sem que esta necessite deslocar-se aos grandes centros. A revista traz também muitos exemplos do que é feito no HSL nas suas frentes de atuação: assistência, ensino e pesquisa. Boa leitura!

SUMÁRIO Reitor: Joaquim Clotet Vice-Reitor: Evilázio Teixeira Hospital São Lucas da PUCRS Diretor-geral e administrativo: Leomar Bammann Diretor administrativo adjunto: Lauri Heck Diretor técnico e clínico: Plínio Vicente Medaglia Filho Diretor acadêmico: Marlow Kwitko Diretor financeiro: Ricardo Minotto PUCRS Saúde Editora: Angela Vencato Repórter: Jeniffer Caetano Estagiária: Cássia Marques Martins Fotógrafos: Bruno Todeschini e Gilson Oliveira Revisão: Antônio Dalpicol Arquivo fotográfico: Analice Longaray e Camila Paes Keppler Conselho editorial: Fábio Etges, Lauri Heck, Magda Achutti, Marlow Kwitko, Plínio Vicente Medaglia Filho, Raquel Martins, Ricardo Minotto e Salvador Gullo Neto Impressão: Epecê-Gráfica Editoração eletrônica: PenseDesign Colaborou nesta edição: João Paulo Wandscheer A revista PUCRS Saúde é editada pelo núcleo de Imprensa do Hospital São Lucas da PUCRS – Avenida Ipiranga, 6.690 – 2º andar – CEP: 90.610-000 – Porto Alegre (RS) – Fone: (51) 3320-3445 – Fax: (51) 3320-3401

imprensa.hsl@pucrs.br www.hospitalsaolucas.pucrs.br

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Palavra da Direção

4 Acontece Cuidado completo para câncer de pele 5 Acontece Comunicação facilitada 6 Capa Vocação para cuidar de idosos 12 Pesquisa Direto ao ponto 13 Pesquisa Sem controle 14 Humanização Hora de brincadeira 16 Entrevista Olufunmilayo Olopade – Acertando o alvo 18 Especialidade Ciência de muitas doenças 19 Investimento Precisão que salva 20

Viva melhor Incômodo comum, vários problemas

22 Diagnóstico Tensão nos vasos sanguíneos 23 Integra Parceria aprimora a assistência 24 Segurança Eliminando riscos 26 Curtas 27 Bastidores Acolhendo o público 28 Internacionalização Rede de conhecimento 30 Trajetória Lulimar Maciel Machado – Trabalho que dá frutos 31 Crônica Alexander Sapiro – Super-heróis

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PA L AV R A D A D I R E Ç Ã O

Programa Gestão da Ética reforça os valores maristas

LAURI HECK, diretor administrativo adjunto FOTO: GILSON OLIVEIRA

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no ambiente de trabalho. Além disso, é memória constante dos valores maristas com os quais nos comprometemos em nossa ação enquanto gestores, educadores e responsáveis pela promoção da saúde. Cada um, em sua especificidade profissional, já possui um código de ética próprio; porém, o novo Código de Conduta apresenta, de forma norteadora, as atitudes esperadas pela instituição através dos irmãos e colaboradores da Rede Marista do Rio Grande do Sul, Distrito Federal e Amazônia. Viver o Código de Conduta da Rede Marista é uma forma de testemunhar os valores institucionais, o que nos permite estabelecer um ambiente de trabalho por excelência, em que se destacam o respeito, a cordialidade, a cooperação, a solidariedade e a segurança, de tal forma que todos se sintam comprometidos com os objetivos da Instituição e identificados com o “jeito marista” de ser e agir. A vivência dos valores inspira e orienta as decisões que permitem aos irmãos e colaboradores afastar incerte-

s novas perspectivas e a complexidade em que estamos inseridos exigem e pedem parâmetros relacionais bem definidos. A nossa instituição tem características peculiares, ou seja, movemo-nos e organizamos nossa vida e missão de acordo com princípios institucionais que nos foram legados desde a fundação do Instituto Marista. Do fundador, São Marcelino Champagnat, herdamos um conjunto de valores: amor ao trabalho, espírito de família, espiritualidade, presença, simplicidade, solidariedade e interculturalidade. Recentemente, a Província Marista do Rio Grande do Sul, da qual faz parte o Hospital São Lucas da PUCRS (HSL), oficializou o programa Gestão da Ética através do Código de Conduta. A instituição, desde o tempo de Champagnat, já contava com um código: o Guide des Écoles. Assim como esse e outros documentos institucionais anteriores, esse Código tem caráter orientador e serve como balizador, possibilitando o alinhamento de conceitos e processos

zas e escolher com segurança os caminhos a seguir para o desenvolvimento de uma sociedade justa e fraterna. Desejamos viver intensamente os nossos valores maristas, para melhor desempenho de nossas ações e para melhor exercício de nossa missão, na educação e na promoção da saúde.

AGRADECIMENTOS A família do paciente e ex-combatente Genico F. Hart agradece à equipe médica do Hospital São Lucas da PUCRS, em especial ao Dr. Leonardo Kroth, que une conhecimento, sensibilidade e pulso firme nas decisões, e aos médicos Maurício Schuck, Florencia Barreiro e Andres Ferrari. À equipe de enfermagem e funcionário do 8º andar, Rodrigo, da direção do hospital, Fabiano, da internação e raio-x, e à emergência, nosso agradecimento. Familiares de Genico F. Hart Gostaríamos de agradecer e parabenizar os esforços do enfermeiro Marcelo Cardozo, da triagem do ProntoPUC, no atendimento ao paciente Daniel Lumertz Garcia. Acreditamos que a saúde brasileira em geral precisa cada vez mais de pessoas tão humanas, preocupadas com os pacientes e empenhadas em desenvolver um bom trabalho assim como ele faz. Obrigada! Camila Lumertz Garcia

Muito obrigada pelo atendimento e por todo o carinho dos médicos Fernando Martins Tetta­ manzy, Mário Sérgio Fernandes e Luciana Viola; das enfermeiras Luciana Ibarra, Maria Cristina Magalhães, Luciana Fonseca, Cristiane Scher e Marla Santos; das técnicas do Sul e Norte do oitavo andar, que muito nos aguentaram nas idas e vindas do quarto à enfermaria em busca de ajuda, sempre com dedicação. Meu agradecimento ao Banco de Sangue, que durante um ano atendeu o meu pai, através do carinho do João Saturno Dias Rodrigues e do amor e dedicação da enfermeira Clarisse Pereira de Oliveira, das técnicas e dos médicos. À enfermeira das tantas coletas de sangue Cristina Mendes Oliveira, um beijo no coração! Fatima Lindamar Possa Nunes

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ACONTECE

câncer de pele

FOTO: ORGANICSKINCARETREATMENT.COM

Cuidado completo para

C E N T R O D E D E R M A T O - O N C O L O G I A R E A L I Z A A T E N D I M E N T O M U LT I P R O F I S S I O N A L

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Instituto Nacional do Câncer (Inca) aponta o câncer de pele como o tipo mais comum no Brasil, correspondendo a cerca de 25% dos tumores malignos registrados. Porto Alegre é uma das cidades com alta incidência da doença, com 15% dos casos do País. Para oferecer atendimento de forma rápida e especializada, o Hospital São Lucas da PUCRS criou o Centro de Dermato-Oncologia (Cedo), onde o paciente tem acesso a cirurgiões, oncologistas e dermatologistas. O Cedo existe desde 2006 e já atendeu mais de 3 mil pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS). Desde julho de 2014, as consultas foram abertas a convênios e particulares e são realizadas às terças-feiras, das 16h às 19h. A marcação é feita através da Central de Agendamento do HSL, pelo telefone (51) 3320-3200. Para atendimento pelo SUS, o encaminhamento é feito pelo posto de saúde. O câncer de pele apresenta diversos tipos. O carcinoma basocelular responde por 70% dos casos e é menos agressivo. Possui altos índices de cura se diagnosticado e tratado precoce e adequadamente e, na maioria dos casos, não se espalha pelo organismo. Identificado em cerca de 25% dos tumores de pele, o carcinoma epidermoide ou espinocelular é mais agressivo e pode migrar para outras áreas e gânglios se o início do tratamento demorar a ocorrer. Assim como o basocelular, tem relação com o tempo de exposição solar sem proteção e tende a aparecer nas pessoas mais velhas. O melanoma, apesar de representar 5% dos casos, é o mais perigoso, pois pode gerar metástases em outros órgãos rapidamente, e apresenta crescimento de 5% ao ano no número de diagnósticos. Normalmente, afeta os mais jovens e está relacionado a queimaduras de pele. Inicia-se nas pintas e é responsável por 75% das mortes por câncer de pele. Na luta contra uma doença tão complexa, diversos profissionais são necessários. Por isso, o Centro oferece um atendimento voltado à “solução total”, o que inclui consultas com especialistas, sessões de medicina nuclear e cirurgia. Além do trabalho em conjunto, são oferecidas consultas individuais com cada médico, fazendo de forma isolada, por exemplo, o diagnóstico, o planejamento do tratamento ou a cirurgia. “A ideia central é proporcionar ao paciente o tratamento na medida certa, disponibilizando os profissionais das áreas necessárias e retornando ao médico de origem após a conclusão da avaliação multidisciplinar”, explica o cirurgião Jeferson Krawcyk de Oliveira, coordenador cirúrgico do Cedo. “O ápice do nosso atendimento ocorre sempre no último sábado de novembro, quando é realizada a Campanha Nacional de Prevenção do Câncer de Pele, em conjunto com a Sociedade Brasileira de Dermatologia.”

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PREVINA-SE • Aplique protetor solar (FPS superior ao fator 15), de acordo com o grau de sensibilidade ao sol, 30min antes de sair de casa e reaplique a cada 2h, após transpiração excessiva ou muito tempo dentro da água. • Utilize bonés, camisetas, guarda-sol e óculos escuros quando estiver exposto ao sol. • Evite o sol entre 10h e 15h, quando as radiações são mais nocivas.

IDENTIFIQUE O MELANOMA COM A REGRA ABCD • Assimetria – Enquanto as pintas comuns são redondas, as formas iniciais de melanoma são assimétricas; se dividir a lesão ao meio, não há metades iguais. • Borda – Diferente das pintas, que apresentam bordas regulares, melanomas possuem irregularidades e saliências. • Cor – Melanomas apresentam variação na coloração, enquanto as pintas têm coloração uniforme. • Diâmetro – O tamanho de uma pinta comum não ultrapassa 6 mm, mas melanomas tendem a ser maiores.


Comunicação

facilitada

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ompreender os anseios e necessidades dos pacientes é uma das grandes tarefas dos psicólogos. A terapia através da fala é o maior instrumento dos profissionais da área, mas muitas das enfermidades existentes dentro de um hospital impossibilitam ou dificultam esse diálogo. Para vencer esse obstáculo, o Serviço de Psicologia do Hospital São Lucas da PUCRS (HSL) conta com uma ferramenta diferenciada e inédita para o atendimento dessas pessoas. O grupo utiliza uma pasta, composta por figuras, números e letras, para se comunicar com esse público, permitindo a realização de um atendimento mais completo. O instrumento foi criado e desenvolvido pela psicóloga e mestranda em Gerontologia Biomédica da PUCRS Valéria de Carvalho Fagundes durante seu estágio na Instituição, entre agosto de 2011 e julho de 2012, nas áreas de Emergência e nas Unidades de Tratamento Intensivo (UTI). Desde o início de seu trabalho na UTI, a dificuldade de comunicação com pacientes que, por uma limitação física ou orgânica, como o uso da traqueostomia, não conseguiam usar a voz para se expressar, mostrou-se um desafio e uma angústia para ela. Valéria buscou informações na literatura para tentar superar essa dificuldade e oferecer uma assistência psicológica não apenas à família, mas também ao internado. Encontrou apenas soluções para o diálogo e a reabilitação do público infantil. Entrou em contato com colegas da Fonoaudiologia e se baseou no que já existia para criar, junto à sua supervisora, orientadora de estágio e psicóloga do HSL, Mariana Paranhos, uma alternativa inovadora para o atendimento psicológico dentro do hospital, que obteve retorno positivo imediato. “Ficou claro que os pacientes se sentiram muito valorizados, acolhidos e incluídos no seu tratamento”, ressalta Valéria. Inicialmente, o projeto era composto por cartas com algumas imagens. No entanto, a dificuldade de manuseio por parte dos pacientes, alguns bastante debilitados e com limitações de movimento, tornou a pasta uma melhor alternativa. Ela é dividida em cinco cores: branca, azul, amarela, verde e rosa. Na primeira parte, estão o alfabeto, os números e algumas frases prontas. Depois, aparecem os estados emocionais e o profissional pergunta como a pessoa está se sentindo. Em seguida, aborda-se a família e a equipe, possibilitando ao paciente o contato com algum familiar ou membro da Instituição. Na quarta e quinta etapas, respectivamente, surgem os verbos e substantivos, permitindo a montagem de frases.

INSTRUMENTO CRIADO DURANTE ESTÁGIO NO HSL PERMITE O DIÁLOGO COM PA C I E N T E S D E B I L I TA D O S

FOTO: GILSON OLIVEIRA

Mariana (à esquerda) e Valéria mostram a pasta criada para facilitar a conversa com pacientes

“A pasta é simples e pode ser usada por pessoas alfabetizadas ou não, pois conta com várias áreas ilustradas. Nas folhas, são impressas figuras de acordo com o tema e, abaixo de cada imagem, está escrita uma palavra ou frase referente ao assunto. Assim, o paciente só precisa ler ou ver a imagem e apontar para o que quer dizer. Ela facilita o atendimento e a comunicação não apenas da psicologia, mas também das outras áreas”, explica. Segundo Mariana, o instrumento preenche uma lacuna importante no atendimento aos internados na UTI. Permite que o psicólogo forneça não apenas uma rede de apoio, mas consiga compreender o que está se passando na parte emocional dos pacientes. “Em algumas patologias dentro da UTI, a parte cognitiva está totalmente preservada. Então, ele está entendendo tudo que está acontecendo ao redor dele sem conseguir se expressar. Com isso, acabam ficando mais sozinhos. Encontrar uma forma de dialogar com eles é muito importante para o tratamento como um todo”, avalia. Após inserir a ferramenta na rotina do HSL, o objetivo é expandir o uso a outras instituições de saúde. Valéria já apresentou a Pasta da Comunicação na área de Psicologia do Hospital da Ulbra, em Canoas; no Hospital Pompeia e na Faculdade da Serra Gaúcha, ambos em Caxias do Sul; e em alguns congressos e eventos. Além disso, mostrou o instrumento à equipe do Hospital de Clínicas. Em todos os locais, deixou alguns instrumentos para uso da equipe, difundindo a ideia e possibilitando uma assistência mais especializada aos pacientes.

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C A PA

Vocação para c Schneider, à direita, junto à equipe do Serviço de Geriatria

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Serviço de Geriatria do Hospital São Lucas da PUCRS (HSL) passou por reestruturações físicas em 2014 para atender cada vez melhor. Depois de 38 anos instalado no 3º andar, os 13 leitos destinados à internação de idosos foram transferidos ao 7º andar, onde a área foi modernizada para proporcionar mais conforto. O local foi adaptado às necessidades dos pacientes, com a instalação de camas automáticas, barras de apoio nos quartos e no corredor e climatização. Entre as novidades estão ainda a sala de estar para convívio de internados e acompanhantes e a sala de round. O atendimento ambulatorial foi transferido para o 2º andar, no conjunto 205, ficando inserido na área de Ambulatórios.

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O Instituto de Geriatria e Gerontologia (IGG), que trabalha em parceria com o Serviço, passou a ocupar uma ampla área no 7º andar do Parque Esportivo, localizado ao lado do Hospital. Para o diretor do IGG, o geriatra Newton Terra, as melhorias refletem a preocupação da Instituição em prestar uma assistência qualificada, opinião compartilhada com o diretor técnico e clínico do HSL, Plínio Vicente Medaglia Filho. “O Serviço de Geriatria, pioneiro no Brasil, é um dos diferenciais do Hospital São Lucas na assistência, hoje com área diferenciada e adequada às necessidades dos seus pacientes. Está associado ao Instituto de Geriatria e Gerontologia, que possui um forte e conceituado programa de pós-graduação, formando


cuidar de idosos NOVA ESTRUTURA ALIA-SE À EXCELÊNCIA DOS PROFISSIONAIS PA R A O F E R E C E R AT E N D I M E N T O D I F E R E N C I A D O A PA C I E N T E S P O R A N G E L A V E N C AT O

mestres e doutores em linhas de pesquisa de ponta na especialidade”, afirma Medaglia Filho. O HSL é um dos poucos hospitais do Estado com ala de internação geriátrica e a demanda por serviços médicos entre essa população é crescente, conforme verificado pelo chefe do Serviço de Geriatria, Rodolfo Schneider. Em Porto Alegre (RS), há 211 mil pessoas acima de 60 anos e, no Estado, são mais de 1,5 milhão. Este número deve superar os 2 milhões em 2025, conforme as projeções; elas apontam que os idosos devem somar 32 milhões no Brasil até lá. No censo de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população de nonagenários foi a que mais cresceu, com quase 80% de incremento em relação ao levantamento de 2000. A única

população que diminuiu foi a de centenários, com redução de 20%. Schneider ressalta que, com o avanço da idade, aumenta a ocorrência de enfermidades e sabe-se que, em média, são três doenças principais: diabete, hipertensão e depressão. “As pessoas envelhecem como elas viveram. O que fizeram durante a vida vai se refletir na terceira idade, como o tabagismo, o consumo de álcool, o sedentarismo, o excesso de peso. Por isso, são usuários em grande medida do sistema público de saúde e de medicamentos”, explica. Os pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) chegam ao HSL a partir do encaminhamento do posto de saúde e são atendidos no ambulatório, criado em 1975. São contempladas as áreas de Neuropsicologia Geriátrica, Longevos, Envelhecimento Indígena e Geral. Além de cuidar dos problemas existentes, o objetivo é prevenir doenças cardiovasculares e demência. O perfil das enfermidades que afetam os idosos, explica Schneider, começou a mudar em 1950 e, em especial, nos últimos 30 anos. A prevalência das doenças infectocontagiosas diminuiu, em grande parte, pelo uso de vacinas, enquanto a incidência das crônicas (hipertensão e diabetes), neurodegenerativas (como o Mal de Alzheimer) e de câncer cresceram. Além disso, com o envelhecimento, é maior a chance de ocorrer acidentes domésticos, como quedas e fraturas, interferindo na independência e na mobilidade. O uso de muitos medicamentos contribui para essas situações. O chefe da Geriatria defende que o idoso preserve a autonomia e a independência e mantenha-se ativo intelectualmente, com leituras, palavras cruzadas e atividades que o desafiem e façam uma “musculação cerebral”. É importante ainda ter participação social, interações na sociedade, na vida em família, ajudando a cuidar dos netos, por exemplo. “A aposentadoria não pode ser o fim. A pessoa tem que ter condições de viver essa etapa com qualidade. Precisa ter objetivos, hobbies, envolver-se com a família”, orienta. Para Terra, “o idoso que envelhece cuidado, é outro idoso e o Estado tem que se preocupar”.

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C A PA

FOTOS: GILSON OLIVEIRA

Schneider atende paciente na nova estrutura de internação

BASE SÓLIDA A expertise no cuidado com os idosos, conquistada graças ao trabalho conjunto de ensino e pesquisa desenvolvido pelo IGG, torna a Geriatria do HSL referência no País, contribuindo com o Ministério da Saúde na definição de políticas e condutas que serão adotadas para a população. Dessa forma, o conhecimento gerado com estudos retorna como benefício à sociedade, modificando a prática clínica quando necessário. Esse é o principal objetivo do IGG, fundado em 1973. De acordo com o diretor Newton Terra, o Instituto foi criado para ajudar o indivíduo a envelhecer melhor. Por isso, a maioria das pesquisas tem como foco fazer as pessoas terem mais qualidade de vida na velhice. Em 41 anos de atuação, o IGG formou cerca de 80 residentes e mais de mil especialistas. O Programa de Pós-Graduação em Gerontologia Biomédica, criado em 2000, é o único do Brasil com nota seis da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e contabiliza

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270 mestres e doutores. O Instituto conta com a participação de professores da Faculdade de Medicina e de médicos do corpo clínico do Hospital para ministrar as aulas, que incluem também cursos de extensão para cuidadores. “O idoso não é uma continuidade do adulto, assim como a criança não é uma miniatura. Ele é outro ser com peculiaridades próprias que devem ser bem conhecidas”, frisa Terra. Entre os alunos estão médicos de diferentes especialidades, como nefrologistas, ortopedistas, ginecologistas, e profissionais da área da saúde, a exemplo de fisioterapeutas, nutricionistas, assistentes sociais e psicólogos. Voltado a médicos, em março de 2014, o IGG lançou o 1º Curso de Especialização em Geriatria Clínica e Preventiva, visando a orientar no diagnóstico precoce das doenças e no tratamento. O objetivo é que esses profissionais, vindos de outros municípios, retornem às suas regiões qualificados para proporcionar uma melhor assis-

tência. Na área da pesquisa, iniciou-se uma nova linha de trabalho: a da saúde pública. Reflexo disso foi a realização do 1º Curso de Especialização em Envelhecimento Ativo, promovido em parceria com a Escola de Saúde Pública nos anos de 2010 e 2011, e a pesquisa Identificação do Perfil Biopsicossocial do Idoso Gaúcho. Também faz parte desse posicionamento a criação do Ambulatório do Envelhecimento Indígena, em 2013, motivada pelo fato de que a expectativa de vida dessa população não chega a 50 anos, enquanto o gaúcho vive em média 76 anos. Terra explica que os índios estão morrendo por doenças que poderiam ser evitadas até mesmo por vacinas e pequenas modificações no estilo de vida. Com o ambulatório, o objetivo é colaborar com o Estado para proporcionar um envelhecimento com mais qualidade aos índios. Outra meta do diretor do IGG é constituir uma parceria com a Secretaria Estadual da Saúde para formar cuidadores de idosos.


ANOTE NA AGENDA Durante a 60 ª Feira do Livro de Porto Alegre, o IGG lançará o livro Sexualidade, menopausa, andropausa e disfunção erétil no envelhecimento – compreensão e manejo, obra editada pela Edipucrs. Haverá sessão de autógrafos no dia 5 de novembro, às 17h, no Pavilhão Central da Praça da Alfândega, com os autores Newton Terra, Carlos Cairoli, Marcelino Poli, Nina Furtado e Cristiano Flôres.

De 17 a 19 de setembro de 2015, o IGG e o Programa de Pós-Graduação em Gerontologia Biomédica, com apoio da Faculdade de Medicina (Famed), promovem o 16 º Simpósio Internacional de Geriatria e Gerontologia e o 7 º Simpósio de Psiquiatria Geriátrica, no teatro do prédio 40 da PUCRS (Av. Ipiranga, 6.681, Porto Alegre). Realizado a cada dois anos, terá a participação de professores da

Famed e do exterior, vindos da Itália, de Portugal e da Suíça. Entre os convidados, estão o psiquiatra suíço Armin Von Gunten (veja entrevista na próxima página), que atua como professor visitante na PUCRS dentro do programa de intercâmbio Ciência Sem Fronteiras. Haverá apresentação de temas livres e tradução simultânea. Informações pelo telefone (51) 33536031 e pelo e-mail igg@pucrs.br.

Terra busca capacitar cada vez mais pessoas para atender os idosos

ATENÇÃO ESPECIAL O geriatra é o profissional que realiza residência médica nessa especialidade e tem no espectro de ação aspectos emocionais, sociais, culturais e psicológicos do envelhecimento. O chefe do Serviço de Geriatria, Rodolfo Schneider, aponta como principais desafios desse especialista entender o idoso e compartilhar o conhecimento. Para entendêlo, é preciso levar em consideração os vários tipos de atendimento e procedimentos pelos quais já passou. Com essa visão global, poderá priorizar o que

precisa ser tratado e avaliar o uso dos medicamentos. Além disso, quando necessário, indicará o suporte de outros especialistas e profissionais para cuidar do paciente. O diretor do Instituto de Geriatria e Gerontologia (IGG), Newton Terra, frisa que o trabalho interdisciplinar é fundamental. Por isso, o atendimento no HSL é composto por preceptores, residentes (tanto médicos quanto das áreas de Educação Física, Enfermagem, Fisioterapia e Nutrição), cursistas, enfermeiros e técnicos de enfermagem.

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C A PA

Origem da demên sob análise

P S I Q U I AT R A S U Í Ç O E S T U D A A I N F L U Ê N C I A D A P E R S O N A L I D A D E E D A D E P R E S S Ã O N O D E S E N V O LV I M E N T O D E D O E N Ç A S M E N TA I S N A T E R C E I R A I D A D E

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prevalência de doenças demenciais neurodegenerativas, como o Mal de Alzheimer, é estimada em 1% da população com 65 anos. Conforme a idade avança, o índice cresce e chega a uma pessoa a cada três a partir dos 85 anos. O problema é mais frequente em países em desenvolvimento econômico, e as estatísticas apontam que entre 65% e 70% de todos os pacientes com demência vivem hoje na América do Sul, China, Índia e África. O impacto desse cenário é muito grande sobre a pessoa, os familiares e a saúde pública, e demonstra a importância do desenvolvimento de pesquisas para melhorar a qualidade de vida daqueles que são afetados pela enfermidade. É o que busca o psiquiatra geriá­trico Armin Von Gunten, chefe do Serviço Universitário de Psiquiatria Geriátrica do Centro Hospitalar Universitário Vaudois, em Lausanne (Suíça). O serviço que ele lidera colabora com a Organização Mundial da Saúde na área. Gunten realiza intercâmbio na PUCRS como professor visitante e investiga os fatores que determinam a expressão da demência, como o tipo de personalidade, depressão, renda e escolaridade. No fim da análise, os dados serão comparados aos obtidos na Suíça. Confira a entrevista concedida pelo psiquiatra à revista PUCRS Saúde. O que é preciso fazer para melhorar a qualidade de vida das pessoas que sofrem de demência? A primeira coisa é a conscientização. A pessoa deve ter a consciên-

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cia de que tem algo errado e que é uma doença. Você ataca o problema de maneira diferente. Deve-se ter também consciência coletiva em termos de saúde pública, do povo e das estruturas capazes de fazer o diagnóstico diferencial das outras demências. Depois, deve-se ter capacidade e recursos para tratar e aumentar a qualidade de vida, pois não há cura. O tratamento tem de ser na casa das pessoas, tanto para o doente como para o familiar, porque o sofrimento fica mais do lado dos familiares. O sistema público de saúde tem condições de atender ao crescimento da população idosa? Não. O governo com certeza tem um problema aqui e em todos os outros países. O segmento da população idosa cresce muito mais que os jovens e tem muitas doenças. As coisas estão mudando e o sistema de saúde tem de mudar. Os hospitais foram construídos para atender pessoas relativamente jovens com uma doença aguda. Hoje, estão cheios de pacientes idosos com uma série de doenças ao mesmo tempo. Os hospitais têm que se tornar o que se chama em inglês senior friendly (amigos dos idosos). O que é importante para se envelhecer com saúde mental? A receita, provavelmente, é viver bem, o que é uma coisa muito pessoal. Certo número de fatores de risco faz a pessoa ter chance maior

de ter, mais tarde, uma doença do tipo demencial. Os fatores vasculares, a maneira de se alimentar, de beber, mas sem excesso, são coisas muito simples. A depressão é um fator de risco para demência e uma maneira de preveni-la, ou de diminuir a probabilidade, é o tratamento da depressão durante a vida. Hoje tem um problema que são as doenças mais modernas devido aos excessos, como diabetes. A saúde pública consegue diminuir, pela educação, os fatores de risco e o número de pessoas sofrendo desse tipo de doença, mas não existe ainda a consciência das doenças mentais. Em termos de saúde pública, elas representam em torno de 20% do total de doenças, mas a pesquisa só recebe cerca de 3% do orçamento. É muito pouco em comparação ao peso que tem. Além da depressão, tem outros fatores de risco, como poluição, medicamentos, escolaridade baixa. As pessoas que não têm escolaridade mais alta apresentam uma reserva cognitiva mais baixa e a probabilidade de uma doença de Alzheimer ou desse tipo se manifestar mais tarde na vida aumenta. Por quê? Porque prejudica o aspecto cognitivo. É como uma criança que não teve a alimentação correta na infância e é mais vulnerável a pegar uma doença. Melhorar o sistema escolar é uma maneira de diminuir a probabilidade, porque uma pessoa com baixa escolaridade tem risco mais alto. As


ncia pesquisas que estamos fazendo aqui direcionam-se à ideia de que certos traços de personalidade, a maneira como uma pessoa é na adolescência e na vida adulta, provavelmente influenciam sobre a possibilidade de desenvolver uma doença demencial. Pessoas com um nível de neuroticismo (instabilidade emocional) elevado, que têm uma ansiedade muito grande e não sabem como responder a ela, a maneira de tratá-la e de diminuí-la, é também um fator de risco. Queremos estudar o tipo de personalidade e o apego durante a infância e a vida adulta. Porque a qualidade das relações no início da vida, e também durante a vida de adulto, é muito importante. Se a qualidade for ruim, talvez seja um fator de risco para esse tipo de doença. O que é ter uma boa base na infância? É a capacidade de a família, da mãe e do pai, promover um clima de confiança que permita à criança criar uma confiança na vida. Isso é uma das coisas mais importantes. Como saúde pública, ajudar os jovens na educação dos filhos, para dar confiança aos jovens, é muito importante na vida, não só porque talvez seja um fator que diminua o risco para a doença de Alzheimer. Como o apego e a personalidade influenciam no desenvolvimento das doenças mentais? Os estudos são muito preliminares, mas temos resultados de

FOTO: BRUNO TODESCHINI

Gunten diz que a maneira como a pessoa vive influencia na possibilidade de desenvolver Alzheimer

que alguns tipos de personalidade influenciam, mais tarde, a expressão clínica da demência e o cérebro como órgão, como matéria. No início da doença de Alzheimer, há uma atrofia do hipocampo e uma correlação muito forte com a capacidade de aprender, com a memória. Mas, no estudo que fizemos, encontramos que não só a memória tem uma relação muito forte com a atrofia daquela região, mas também a personalidade. Em particular, o nível de neuroticismo muito alto prediz uma boa parte da atrofia hipocampal. Uma das ideias seria que a mudança da personalidade seja um pré-indicador ( da demência ), porque começa muito precocemente, mesmo antes da memória. A depressão também predispõe à demência? Sim, a depressão tem um efeito de toxicidade sobre o cérebro. A personalidade é um fator mais importante em termos de comportamento na vida. Você tem uma personalidade e uma tendência a se comportar de certa maneira. A hipertensão arterial talvez seja mais ligada à personalidade que a outra coisa, ao estresse. O diabete e a obesidade também. Às vezes tenho a impressão de que a personalidade vem antes e depois as coisas se desencadeiam. Levando-se em conta que alguns fatores são difíceis de mudar e não são influenciados diretamente pela medi-

cação, a exemplo da personalidade, como atenuar o desenvolvimento da doença? É muito mais fácil engolir o medicamento do que ter que mudar de comportamento. São coisas que já se fazem no tratamento do alcoolismo, por exemplo, o trabalho motivacional, de grupo ou individual, e psicoterapia, porque se sabe que o sucesso é mais provável se você tem uma motivação. Com outros tipos de comportamentos, é também importante começar com o trabalho motivacional antes de simplesmente prescrever um medicamento. Pelo menos 50% das pessoas que recebem um tratamento com medicamentos não os usam de maneira correta. Então só vale se a pessoa tiver a consciência de que tem alguma coisa para fazer; ela tem que ser motivada para conseguir. Todo o mundo acha que não tem que mudar; são os outros que têm que mudar. É muito difícil, mas é possível. Atividades de integração social ajudam a ter um bom envelhecimento? Tenho certeza que ajudam. O homem é uma espécie social. O brasileiro sabe disso mais do que o suíço. E também o exercício físico ajuda. Sabe-se que o esporte tem um efeito antidepressivo e, provavelmente, antidemencial. Mas tem que começar jovem e não depois que tem uma doença. Todo mundo sabe disso, mas as pessoas fazem o contrário. O idoso também tem de ser ativo.

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PESQUISA

ponto N O VA T E R A P I A T E S TA D A N O H S L P E R M I T E T R ATA M E N T O M A I S EFICAZ CONTRA O CÂNCER

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FOTO: GILSON OLIVEIRA

Direto ao

tacar de forma específica células tumorais é o objetivo da inovadora terapia alvo molecular. O Centro de Pesquisa Clínica (CPC) do Hospital São Lucas da PUCRS (HSL) oferece essa alternativa revolucionária de tratamento do câncer em seus projetos, dos quais participam pacientes voluntários. Os novos medicamentos atuam em cada mutação de maneira quase exclusiva, levando em conta as características genéticas de cada uma delas. O grupo de Oncologia do CPC realiza essas pesquisas em áreas dos cânceres de mama, gastrointestinais, melanomas, linfomas, de pulmão, geniturinário, dentre outros. Portadores de câncer apresentam crescimento desordenado de células que acabam gerando tumores (neoplasias malignas). Anteriormente, utilizavam-se tratamentos com quimioterápicos, de forma exclusiva. Esses medicamentos, por vezes muito tóxicos, ainda são indispensáveis, mas, gradualmente, tendem a ser substituídos. Isso porque atacam todas as células, indiscriminadamente, atingindo também as células sadias, sendo menos eficientes e com maiores efeitos colaterais. Queda de cabelo, depressão hematológica e náuseas são alguns exemplos dos problemas causados. Na terapia alvo, a meta é desenvolver um remédio capaz de atingir, de maneira precisa, cada célula tumoral. O medicamento trabalha nas cadeias das moléculas responsáveis pelo desenvolvimento do tumor, diferente das quimioterapias tradicionais, que impedem a divisão celular e causam danos em estruturas genéticas de forma inespecífica. Assim o tratamento torna-se mais eficaz e com menores efeitos indesejáveis. Essa tecnologia permite ainda o tratamento de diferentes tumores com drogas iguais ou semelhantes. Basta que eles apresentem mutações celulares com as mesmas características biológicas para serem atingidas. Em outras palavras, o tratamento passa a ser em células doentes e não mais em órgãos. Como essa é uma alternativa recente e o tempo de observação desses pacientes relativamente curto, ainda não é possível ter uma conclu-

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Voluntários de pesquisas clínicas têm acesso aos melhores medicamentos

são definitiva, mas os resultados obtidos até o momento são animadores, com aumento do percentual de pacientes potencialmente curados. Os participantes dos ensaios, além de terem acesso ao que existe de mais moderno na farmacologia mundial gratuitamente, são acompanhados pela equipe do CPC com maior frequência, tendo a saúde monitorada com precisão durante todo o processo. As consultas e exames ocorrem de acordo com protocolos rígidos preestabelecidos, oferecendo a maior segurança possível. O chefe do Serviço de Oncologia do HSL, Sérgio Lago, explica que os voluntários de estudos clínicos recebem o melhor tratamento existente até o momento (“grupo de controle”) ou o melhor tratamento mais a droga em estudo (“grupo experimental”), que se acredita ser ainda melhor. “Além da possibilidade de receberem um tratamento superior, contribuem para o desenvolvimento da terapêutica oncológica, que beneficiará outros pacientes em todo o mundo”, afirma.

REFERÊNCIA NACIONAL Com projetos como os da terapia alvo, o Centro de Pesquisa Clínica do HSL é referência na área no Brasil. Com estrutura de 750 metros quadrados, atualmente, possui 162 pesquisas em andamento, realizadas por 32 investigadores de 16 especialidades distintas. O setor iniciou as atividades em 2008 e integra a Rede Nacional de Pesquisa Clínica, iniciativa conjunta dos Ministérios da Ciência e Tecnologia e da Saúde para testar medicamentos utilizados no Sistema Único de Saúde (SUS). Entre as rígidas regras seguidas pelos protocolos está a aprovação pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) e pelo Comitê de Ética em Pesquisa da PUCRS.


Sem

controle E S T U D O A P O N TA Q U E M E TA D E D A S C R I A N Ç A S A S M Á T I C A S N Ã O FA Z O T R ATA M E N T O A D E Q U A D O PA R A E V I TA R C R I S E S

R

eferência no tratamento de casos graves de asma em crianças, o Hospital São Lucas da PUCRS (HSL) beneficia-se das pesquisas desenvolvidas na Universidade para aprimorar a assistência. Exemplo disso é o estudo ProAsma, realizado no Programa de Pós-Graduação em Pediatria e Saúde da Criança e no Centro Infant da PUCRS, com a colaboração de professores e alunos de Enfermagem da Faculdade de Enfermagem, Nutrição e Fisioterapia (Faenfi). O levantamento identificou que o percentual de jovens afetados pela asma é um dos maiores do País. Segundo a análise, 20% das crianças porto-alegrenses têm asma, ou seja, duas em dez, e mais da metade delas não controla a doença, gerando sofrimento para o paciente e a família e refletindo nas hospitalizações. A amostra analisada é composta por 2.500 jovens de sete escolas públicas e de seis Estratégias de Saúde da Família de Porto Alegre, com idade média de 11 anos. O educador físico e doutorando Cristian Roncada diz que o objetivo era verificar o impacto da asma em crianças, verificando quantos alunos são afetados, como é a qualidade de vida delas e a prevalência de alergias. Os resultados impressionam porque a doença é tratável e a medicação é distribuída gratuitamente na rede pública. “É um número alarmante, uma epidemia de doença respiratória”, avalia o pneumologista pediátrico do HSL Paulo Márcio Pitrez, orientador da pesquisa e diretor do Instituto de Pesquisas Biomédicas da PUCRS. Ele ressalta que, se a criança consulta, faz o diagnóstico e segue à risca

o tratamento, em 95% dos casos terá uma vida normal. “Mas as pessoas não seguem o tratamento, não entendem a doença. São pacientes que sofrem e a sociedade sofre”, afirma Pitrez. Os dados confirmam o prejuízo: apenas um terço dos asmáticos utiliza a medicação preventiva corretamente. Além disso, a política de saúde pública está aquém da meta, pois aproximadamente 90% dos pacientes deveriam estar com a doença controlada, saber como proceder em caso de crise e confiar no medicamento. A parte emocional e social também é bastante afetada e são verificados casos de depressão e ansiedade. A pesquisa propõe-se ainda a acabar com alguns mitos. “Um quarto acha que o filho fazer exercício físico faz mal, mas ao contrário, é essencial”, afirma Pitrez. Os índices apontam que 60% são sedentários e 30% têm sobrepeso. Outro mito é o da “bombinha”, medicamento à base de corticoide e essencial para a prevenção. Um terço dos entrevistados acredita que ela vicia, o que é incorreto. O pneumologista explica que, quando o paciente não usa o medicamento de forma contínua, os episódios de crise são mais frequentes e requerem o uso da bombinha de resgate, com broncodilatador. Ela aumenta a frequência cardíaca, mas é um efeito colateral normal, sem nenhum risco. Os dados da pesquisa serão encaminhados às Sociedades de Pediatria e de Pneumologia e à Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre. Na avaliação de Pitrez, “a raiz de todo o problema é a educação e depois a dificuldade de atendimento. O sistema tem que estar funcionando

para detectar e atender essas crianças e para mostrar aos pais que eles têm que usar o tratamento contínuo, todos os dias. Isso modificaria o cenário de asma em Porto Alegre e no País”. O ProAsma recebeu investimento do laboratório farmacêutico Novartis para realização da pesquisa.

ATENDIMENTO ESPECIALIZADO O Ambulatório de Pneumologia Pediátrica do HSL é reconhecido no Brasil em asma grave e é o único em Porto Alegre, até o presente, a aplicar o anticorpo Xolair aos pacientes do Sistema Único de Saúde que não respondem ao tratamento convencional. Para ser atendida no local, a criança precisa ser encaminhada pelo posto de saúde.

O QUE O ESTUDO APONTA SOBRE OS ASMÁTICOS • 53% não controlam a doença; • 60% faltaram à escola no último ano; • 7,5% internaram pelo menos uma vez no último ano; • 60% têm alergia, em especial a ácaro (poeira) e antígenos da barata; • 55% convivem com fumante em casa. Fonte: ProAsma

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HUMANIZAÇÃO

Hora de

brincad P R O J E T O D O V O L U N TA R I A D O DE TODAS AS IDADES COM

A

“Achamos que a pessoa está triste por ficar internada em um hospital, mas, às vezes, ela está pronta para dar risada e só espera por uma oportunidade” Fernanda Germani (ao centro) 14

s tardes de sábado do Hospital São Lucas da PUCRS (HSL) ganharam um novo brilho desde março de 2014. A partir das 15h, personagens, músicas e estórias tomam conta dos quartos da Pediatria. O Voluntariado passou a atuar no quinto andar com instrumentos já conhecidos, mas muito animadores: os dedoches, fantoches de dedos. Um grupo de cinco voluntários dedica um pouquinho do seu tempo para arrancar risadas, distrair e educar os pequenos. O coordenador do Voluntariado, Leandro Rasia, acredita que o caráter educacional das brincadeiras tem efeito terapêutico. “É interessante que se trabalhe com o lúdico, um pouco parecido com o que o palhaço faz, mas com o fantoche como ferramenta. Assim a criança sai do ambiente hospitalar e vai ao imaginário”, explica. Quando idealizado, os integrantes do projeto pretendiam ir de quarto em quarto contar uma estória ensaiada previamente, planejar cada momento. No entanto, bastou um dia para perceberem que cada criança é diferente e improvisar pode ser muito mais divertido. Foi assim que deu certo. A dinâmica consiste em interagir com os pacientes e deixá-los conduzir a diversão. Segundo a voluntária Fernanda Alves Germani, elas adoram nomear os bonecos — os nomes mais recorrentes são de personagens de desenhos animados, como A Bela Adormecida, Cinderela e Anastácia. Fernanda conta que os dedoches preferidos são a fadinha e a princesa, provavelmente por serem mais coloridas que os bichinhos. Outra brincadeira muito comum é a do fantoche de palhaço perguntando quem namora. “Um pega no pé do outro. Os pais se divertem vendo. Se não sabiam algo do filho, já ficam sabendo e participam também”, conta a voluntária. A participação dos pais sempre torna a alegria maior ainda. Fernanda lembra que, certo dia, uma mãe colocou para tocar músicas da Xuxa e da


FOTOS: BRUNO TODESCHINI

adeira AT I N G E C R I A N Ç A S FANTOCHES DE DEDOS Galinha Pintadinha que tinha no celular. O sábado virou uma verdadeira festa. Fernanda diz que a experiência fez o grupo pensar em formas de incluir canções nas brincadeiras. O coordenador Rasia frisa que as atividades são um alívio para o sofrimento dos pais também. “Eles se aliviam com o filho sorrindo. Quantas vezes uma criança sorri em um hospital?”, pondera. Para os recém-nascidos, o Voluntariado guarda outras brincadeiras, que vão de cócegas na barriga até fingir que os dedoches estão voando. A coordenadora de Relacionamento, Raquel Martins, ressalta que o grande trunfo do projeto é atingir toda a Pediatria. “Muitas crianças não

podem sair do quarto para ir à sala de Recreação ou à Biblioteca Infantil, por causa de medicamentos ou por serem pequenas demais. Com os dedoches, os voluntários vão a todos os quartos e divertem todos os pacientes”, destaca. A voluntária Fernanda impressiona-se com a alegria das crianças. “Achamos que a pessoa está triste por ficar internada em um hospital, mas, às vezes, ela está pronta para dar risada e só espera por uma oportunidade”, comenta. Com muito otimismo, Rasia revela que o projeto Dedoches pode se expandir a outras áreas do Hospital, como, por exemplo, os ambulatórios. “É um trabalho que não tem contraindicação”, brinca o coordenador.

DIVERSÃO E RELIGIOSIDADE Com o objetivo de difundir a espiritualidade e os ensinamentos de Jesus Cristo às crianças internadas no quinto andar, o grupo Pastoral da Saúde promove o Projeto Belém, que traz atividades recreativas e educacionais aos sábados pela manhã na sala de Recreação e nos quartos da Internação Pediátrica. Com temas de cunho religioso, as brincadeiras são ministradas por cinco voluntários, encaminhados pelo Núcleo de Voluntariado da Associação do Voluntariado e da Sociedade (Avesol), juntamente com a Irmã Iolanda Schneider, que atua no HSL. O Projeto Belém surgiu em 9 de novembro de 2013 e recebeu esse nome em homenagem à cidade em que Cristo nasceu. “Ao longo da semana, a pedagoga Juliana Pierdoná realiza atividades durante o dia. No

fim de semana, não havia atividades, então surgiu a ideia de criar o projeto”, conta a coordenadora de Relacionamento, Raquel Martins. Com a voluntária Josileide Rodrigues à frente do projeto, as atividades iniciam às 9h e encerram às 11h. São realizadas apresentações de música, teatro, corais, fantoches, leitura de histórias bíblicas, realização de artesanatos e desenhos para colorir. O material é comprado por meio da doa­ç ão de colaboradores. Com a iniciativa, os pequenos entram em contato com a fé e não perdem o costume de socializar. Os familiares acompanham e entram junto na diversão. As canções têm letras fáceis de assimilar e decorar para que os pacientes consigam cantar junto e compreender a mensa-

gem. Conforme Ir. Iolanda, as ações do grupo de voluntários levam conforto e esperança aos pequenos que estão internados. O entretenimento e o Evangelho unem-se para proporcionar apoio espiritual, emocional, educacional e recreativo. Em datas comemorativas, o grupo de voluntários prepara atividades temáticas. Na Páscoa de 2014, a programação contou com leitura de histórias sobre a ressurreição de Jesus Cristo, apresentação de canto e violão, teatro de fantoches e distribuição de kits com guloseimas e brinquedos — tudo obtido mediante doações. Ir. Iolanda lembra que os pacientes ficaram muito felizes e a previsão é que, no segundo semestre, ocorra celebração similar no Dia das Crianças (12 de outubro).

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E N T R E V I S TA – O L U F U N M I L AY O O L O PA D

Acertando o alvo

P R E C U R S O R A D A M E D I C I N A D E P R E C I S Ã O , O N C O L O G I S TA N I G E R I A N A T R A Z U M A N O VA P E R S P E C T I VA S O B R E O T R ATA M E N T O E A P R E V E N Ç Ã O D O C Â N C E R P O R J E N I F F E R C A E TA N O

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stima-se que, em alguns anos, o câncer será a causa número um de morte no mundo, tornando o desenvolvimento de estratégias inovadoras de prevenção e tratamento cada vez mais importante. O Hospital São Lucas da PUCRS (HSL) recebeu uma das profissionais mais relevantes dentro desse cenário. A professora da Universidade de Chicago (Estados Unidos) Olufunmilayo Olopade é reconhecida internacionalmente por seus trabalhos em aconselhamento genético, que utiliza a medicina de precisão para individualizar a terapia oncológica e determinar a possibilidade de uma pessoa ter câncer; e por democratizar e difundir o tratamento da doença. A visita ocorreu entre os dias 23 e 25 de junho e foi intermediada pelo oncologista do HSL Márcio Debiasi, aluno de doutorado em Epidemiologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e ex-fellow da Universidade de Chicago, na Breast Cancer Clinic, sob orientação de Olufunmilayo. Em Porto Alegre, ela participou do Simpósio de Oncologia: Genoma, Medicina de Precisão e Aspectos Bioéticos, promovido pela Faculdade de Medicina e pelo HSL; discutiu casos e conheceu a estrutura da Instituição. O encontro buscou ainda estabelecer parceria com a PUCRS e o Hospital. O objetivo é que a união esteja vinculada a projetos de pesquisa e ensino, colaborando com a formação de novos profissionais e com o desenvolvimento de trabalhos científicos. O que a trouxe a Porto Alegre? Em primeiro lugar, estou aqui por causa do Dr. Márcio Debiasi, que

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esteve comigo por um ano como parte do PhD dele. Além disso, sou presidente do Subcomitê de Pesquisa Global de Câncer do Instituto Nacional de Câncer dos Estados Unidos, onde sirvo como orientadora para o presidente norte-americano em todas as questões relacionadas à doença. Um dos nossos papéis no subcomitê é assegurar parcerias ao redor do mundo para tentar erradicar o câncer. Para isso, queremos ajudar a desenvolver pesquisadores que possam resolver os problemas dos seus países. Fiquei muito feliz que o governo brasileiro nos mandou o Márcio e agora ele está de volta para contribuir com a Universidade daqui e para treinar a próxima

geração de pesquisadores. O futuro é brilhante quando você tem novos investigadores comprometidos em desenvolver o tratamento do câncer no Brasil. Seu trabalho com câncer enfatiza a importância da avaliação de risco. Por que esse aspecto é essencial? Meu trabalho está focado em fazer o tratamento do câncer mais acessível, diminuindo o custo e aumentando a qualidade. Isso depende de quão cedo as pessoas são diagnosticadas. O aumento no número de mortes por câncer acontece quando as pessoas chegam aos médicos estando a do-

FOTO: ARQUIVO PESSOAL

Debiasi durante trabalho com Olufunmilayo em Chicago

Aprendi Trabalhar lado a lado com grandes nomes da Medicina foi a rotina do oncologista do HSL Márcio Debiasi durante um ano. Entre março de 2013 e fevereiro de 2014, realizou parte do seu doutorado na Universidade de Chicago. Lá conviveu com Olufunmilayo Olopade e seu grupo de pesquisadores, além de participar do atendimento aos pacientes e vivenciar o dia a dia do grupo. Segundo ele, a experiência foi transformadora. “Ter a oportunidade de conviver com a Dra. Olufunmilayo e vê-la praticando a medicina ba-


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FOTO: GILSON OLIVEIRA

Olufunmilayo palestrou em evento no HSL

ença já em uma situação avançada. Quando detectados cedo, alguns tipos de câncer são 100% curáveis. Por isso, a avaliação de risco é tão importante: detecção precoce. Quais são os avanços que temos na identificação do câncer? O progresso começa ao entendermos os fatores de risco. Sabemos que envelhecer é o fator mais importante. Qualquer mulher que tenha mais de 50 anos tem mais risco de ter câncer de mama e, por isso, deve consultar um especialista. Os recursos são muitos, desde exames de imagem a testes genéticos. Porém, o mais importante é conhecer o histórico pessoal e familiar da paciente para saber qual estratégia deve ser adotada.

O uso da genética para avaliação do risco de câncer ainda é caro? Uma coisa que aprendi no meu país (Nigéria) é que a prevenção é sempre melhor do que a cura da doença estabelecida. A longo prazo, o custo da prevenção vai ser sempre mais barato. Fazer um teste genético e realizar algumas intervenções, como tomar alguns medicamentos ou até, em casos mais drásticos, a remoção do órgão, pode poupar-te do tratamento de um futuro câncer. Por isso, a genética é tão importante. Além disso, se você sabe que tem risco de ter uma doença cardía­ca, você vai ao médico e toma um remédio para diminuir seu colesterol e ajudar a manter seu coração em boas condições. É a mesma coisa com o câncer. Temos que nos perguntar qual o nosso risco de ter câncer assim como nos perguntamos sobre o nosso nível de colesterol.

izado internacional seada no mais alto rigor técnico e, ao mesmo tempo, de forma humanizada e centrada no paciente, foi uma grande oportunidade. Tudo isso foi muito enriquecedor e, agora, tento implantar o que aprendi lá, adaptando para a nossa realidade.” O uso de tecnologias para o diagnóstico precoce do câncer, como o aconselhamento genético, é um dos principais pontos do trabalho desenvolvido por Olufunmilayo e acompanhado pelo médico brasileiro. Atualmente, existem serviços de aconselhamento genético no Sistema Único de Saúde (SUS). No

entanto, ainda são raros, o que torna o acesso bastante restrito. Debiasi ressalta que, no contexto da saúde suplementar, o acesso a essa tecnologia é regulamentado por lei, devendo ser ofertado a todos os pacientes, apesar de alguns convênios tentarem impor restrições. “Acredito que a tendência é a ampliação do acesso a essas tecnologias no SUS. Nesse processo, é essencial que o profissional da saúde tenha a consciência de que ele é parte integrante dessa transformação e adote uma postura proativa frente a esse desafio”, explica.

Debiasi explica que a aplicação desse conhecimento deve ser baseada em dois pilares principais. Na prática clínica, é necessário que o manejo dos pacientes no ambulatório esteja o mais próximo possível da excelência vista nos Estados Unidos. Além disso, a possibilidade multiplicadora que ele, como preceptor do Serviço de Oncologia, possui é importante para passar adiante as informações obtidas fora do país. “Investir na formação do médico residente é a melhor forma de estabelecer no Brasil uma prática clínica de excelência e beneficiar nossa população”, avalia.

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ESPECIALIDADE

Ciência de

R E U M AT O L O G I A É A Á R E A QUE CUIDA DE MAIS DE 100 ENFERMIDADES, VÁRIAS DELAS COMUNS À POPULAÇÃO

muitas doenças

P

ouco conhecida do público em geral, a Reumatologia está relacionada ao tratamento de dores nas articulações, tendões e músculos e abrange mais de 100 doenças, conforme a classificação internacional. As enfermidades reumáticas são apontadas como a terceira causa de incapacidade entre os que estão em auxílio-doença. O Hospital São Lucas da PUCRS (HSL) possui um serviço de ponta nessa especialidade, com destaque tanto na assistência quanto no ensino e na pesquisa. A estrutura começou a se organizar em 1981, com a chegada do atual chefe do Serviço, Mauro Keiserman. Em cinco anos, formou uma sólida equipe. Atualmente, o grupo é integrado por nove reumatologistas, dois dos quais com atuação em pesquisa clínica. A formação especializada é oferecida por meio da residência médica e, hoje, há seis residentes. Keiserman diz que ainda são poucos os especialistas, apesar de a área abranger uma quantidade grande de doenças comuns entre a população. “Um homem jovem vai para o traumatologista quando tem dor lombar. Mas esse médico acaba procurando uma causa cirúrgica e fica acompanhando algo que nunca vai encontrar, pois dor lombar crônica em jovens, principalmente do sexo masculino, muitas vezes está relacionada com espondilite anquilosante, doença inflamatória na coluna vertebral e articulações da bacia. Sempre que alguém tiver dor em articulação, tendão ou músculo, é um problema reumático”, esclarece. Alguns dos problemas atendidos pelos profissionais são artrose; osteoporose; doenças não cirúrgicas da coluna; doenças de tendão; lúpus; artrite reumatoide; psoríase com comprometimento articular; e síndrome de Sjögren, inflamação das glândulas que produzem secreção para fora do organismo, como boca e olhos. Doenças como essas são tratadas no ambulatório de Reumatologia, que recebe até 500 pacientes ao mês. Com supervisão de um membro do Serviço, médicos residentes em Reumatologia e Medicina Interna, estagiários de diversas universidades e alunos da Faculdade de Medicina da PUCRS participam das consultas, realizadas de segunda a sexta-feira. Está em fase de desenvolvimento o ambulatório de Reumatologia profissional, coluna vertebral e de partes moles, incluindo fibromialgia.

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FOTO: GILSON OLIVEIRA

Keiserman (ao fundo) discute com a equipe os casos atendidos no ambulatório

ALCANCE INTERNACIONAL A pesquisa também se destaca no setor. Sob orientação do reumatologista Henrique Staub, mestrandos e doutorandos utilizam o Serviço e seus pacientes como base para dissertações e teses, muitas delas publicadas em revistas internacionais. Os estudos clínicos iniciaram em 2002, quando os medicamentos biológicos mudaram o panorama do tratamento. Para inserção no mercado, os novos produtos precisam passar por pesquisa orientada pela indústria e supervisionada por agências do ramo. O primeiro projeto da área desenvolvido no HSL incluiu mais de 20 pacientes, um recorde em comparação com outros centros do País, rendendo ao grupo premiação oferecida pela indústria. Artrite reumatoide e lúpus são os mais abordados nos cerca de 30 protocolos desenvolvidos, que contaram com cerca de 300 pacientes. A qualidade do trabalho é atestada pela indústria farmacêutica, que monitora os centros. Além de incluir pessoas que serão beneficiadas pela ação dos novos medicamentos, é importante fazer uma pesquisa de qualidade. Mauro Keiserman explica que é essencial uma equipe de alto padrão, capaz de acompanhar e registrar cada passo com precisão. O grupo de pesquisa da Reumatologia é composto por 15 profissionais.


INVESTIMENTO

Precisão que salva N O V O E Q U I PA M E N T O P R O P O R C I O N A M A I S E X AT I D Ã O N O D I A G N Ó S T I C O E T R ATA M E N T O D E O B S T R U Ç Õ E S N A S A R T É R I A S D O C O R A Ç Ã O

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diagnóstico veloz e correto das doenças cardíacas é essencial para evitar a evolução para situações mais graves. O Hospital São Lucas da PUCRS conta, desde maio, com um equipamento de última geração, capaz de aprimorar o tratamento nessa área. A Tomografia de Coerência Ótica (OCT, na sigla em inglês) permite visualizar o interior das artérias e enxergar alterações com apenas 0,01 a 0,02 milímetros, o que é dez vezes superior à resolução do ultrassom intravascular e 100 vezes superior à obtida com o cateterismo cardíaco, cuja imagem é similar a do raio-x. Com precisão muito maior, a OCT avalia, por meio de um cateter fino, mais de mil pontos simultaneamente dentro das artérias coronárias, permitindo a aquisição ultrarrápida de informações sobre a doença cardíaca de pacientes com angina e infarto agudo do miocárdio. “A imagem que temos aqui no Hospital, em termos de cateterismo, é a melhor disponível, mas, como em qualquer tecnologia, estão surgindo coisas ainda melhores. Com a OCT, possuímos um aparelho que é o estado da arte, o que existe de mais moderno. É uma máquina com capacidade de elucidação diagnóstica impressionante”, ressalta o cardiologista Paulo Caramori, chefe do Centro de Diagnóstico e Terapia Intervencionista (CDTI). A precisão anatômica proporcionada pelo equipamento afeta todas as etapas do atendimento. Além de melhorar o diagnóstico, aprimora o processo de escolha e inserção do stent, uma endoprótese expansível em formato de tubo que evita a obstrução do fluxo sanguíneo. Com a OCT, consegue-se definir o tamanho da lesão de forma exata e escolher a prótese mais adequada. Até recentemente, essa seleção era feita por meio de uma estimativa, com base no que é visto no cateterismo. Além disso, após a colocação do stent, o aparelho permite visualizar se algum ajuste ainda é necessário. “A OCT fornece uma visualização mais detalhada tanto das estruturas do vaso como dos dispositivos utilizados para o tratamento de obstruções. Isso permite a fácil identificação de situações que podem ser corretamente tratadas pelo cardiologista. Essa tecnologia também é um avanço importante por facilitar o uso dos novos stents bio-

FOTO: GILSON OLIVEIRA

absorvíveis, já utilizados na Europa e que estarão disponíveis para uso clínico no Brasil em breve”, afirma Caramori. Os stents bioab­ sorvíveis são feitos de um polímero similar ao plásTomografia de tico que é Coerência Ótica (à direita) fornece imagem absorvido pelo organismo. Eles com qualidade 100 são pouco visíveis ao raio-x e vezes superior à do exigem maior precisão durante cateterismo a implantação, por terem uma menor chance de ajuste em comparação ao stent convencional de metal. Por isso, a OCT é essencial para inserção e escolha do tamanho correto. O diferencial trazido pelo investimento foi comprovado na prática. No primeiro caso em que foi utilizado, a paciente apresentava sintomas, mas não era possível visualizar nenhuma alteração clara na imagem do cateterismo. Sabendo do histórico da pessoa, a equipe valeu-se da OCT e encontrou uma obstrução grave. Com isso, a paciente foi encaminhada para cirurgia cardíaca de colocação de uma ponte de safena. “A lesão estava muito próxima a uma bifurcação e não teríamos como enxergá-la apenas com o cateterismo. Olhando a pequena mancha que aparece nele, podíamos até pensar que era um efeito ou ilusão de ótica. Inclusive, o cirurgião cardíaco, ao ver o filme, não identificou a obstrução. Ele só ficou convencido após termos enviado a imagem da OCT”, explica Caramori. A novidade tecnológica permitiu o diagnóstico correto e a paciente livrou-se da obstrução e das possíveis consequências trazidas por ela, como a dor no peito, o ataque cardíaco e o risco de morte.

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VIVA MELHOR

Incômodo co AT U A Ç Ã O I N T E R D I S C I P L I N A R É E S S E N C I A L PA R A T R ATA R U M A D A S Q U E I X A S M A I S R E C O R R E N T E S : A D O R N A S C O S TA S

Q

ualquer movimento que realizamos está relacionado à coluna, que funciona como um eixo de estabilidade do corpo. Segurar um copo, erguer peso, caminhar e tantas outras ações envolvem alguma posição e esforço associados a ela. Por isso, uma dor nas costas pode prejudicar até o mais simples dos atos, sendo muito comum pacientes com esse tipo de problema sofrerem de depressão em função da dor e limitação funcional. O tratamento dos quadros crônicos é complexo e demanda uma intervenção interdisciplinar entre os profissionais da saúde, contemplando áreas como Ortopedia, Neurologia, Fisiatria, Fisioterapia, Educação Física, Psiquiatria e Psicologia, conforme o caso. A dor da coluna vertebral pode ter origem em três níveis: cervical (próxima ao pescoço), dorsal (na região torácica) e lombo-sacral (próxima à bacia). Esta é a mais recorrente, sendo a primeira causa de falta no trabalho. Estima-se que cada pessoa, pelo menos uma vez na vida, sofrerá uma crise de dor lombar. O problema está associado ao grande trabalho mecânico que a coluna realiza diariamente. As causas podem ser traumáticas (fraturas, contusões e distensão de ligamentos), inflamatórias, infecciosas (no osso ou nos discos intervertebrais), degenerativas (“desgastes” que ocorrem devido ao avanço da idade), reumáticas e neoplásicas (câncer nos ossos ou tecidos circunvizinhos à co-

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luna). A coluna é o foco mais comum de disseminação de metástases dos tumores malignos. O cirurgião ortopedista do Hospital São Lucas da PUCRS (HSL) Erasmo Zardo aponta a degeneração dos discos e articulações como a principal causa de dor na coluna e de procura de consulta médica com os profissionais da ortopedia e fisiatria após os 30 anos. As dores de origem músculo-ligamentares são predominantes nos jovens. Ele ressalta que, para traçar um eficaz planejamento estratégico de controle do problema, é imprescindível um diagnóstico preciso. Além de uma análise detalhada do histórico do paciente, são realizados exames físicos, radiográficos, tomográficos e de ressonância magnética, nos casos mais complexos. “Não existe competição nessa área, mas uma associação de ideias e esforços”, explica Zardo sobre a multidisciplinaridade no tratamento. A Ortopedia tem o papel de identificar se a dor descrita pelo paciente tem relação com a coluna e recomendar hábitos que eliminem riscos, como perda de peso, prática de exercícios físicos, cuidados com a alimentação e correção postural. Esse método costuma obter êxito em mais de 90% dos casos. Os procedimentos cirúrgicos revelam-se necessários na menor parte das situações e, geralmente, estão relacionados à compressão pelos discos intervertebrais herniados ou “bicos de papagaio” (sindesmófitos).

TRABALHO CONJUNTO A Fisiatria, também responsável pelo diagnóstico, foca-se na rea­ bilitação, que consiste na recuperação de movimentos e na eliminação do desconforto por meio de atividades físicas. É estudada minuciosamente a rotina do paciente e são apontadas mudanças, inclusive no ambiente de trabalho. “A dor lombar não se resume a uma dor, um diagnóstico e a um remédio. Ela envolve vários aspectos que devem ser remanejados”, ressalta o fisiatra Carlos Musse, chefe do Serviço de Fisiatria. Quanto ao escritório, afirma que um bom mobiliário, como cadeiras confortáveis, mesas adequadas e suporte para os pés, é essencial não apenas para a melhora, como para a prevenção da dor lombar. O fisioterapeuta trabalha, com acompanhamento do fisiatra, dire-


comum,

vários problemas CUIDADO PERMANENTE Algumas atitudes fazem considerável diferença para prevenir a dor nas costas, como subir escadas em vez de utilizar o elevador e, para os usuários do transporte público, estimular o hábito de caminhar descendo uma parada de ônibus anterior à mais próxima de casa. Além disso, quando for carregar muito peso, pedir ajuda a alguém. Ao buscar objetos pesados no chão, procurar agachar-se, em vez de inclinar as costas para pegá-lo.

tamente na prática dos exercícios, os quais têm a finalidade de permitir que o paciente retome sua rotina normal. A Fisioterapia utiliza o corpo para tratar o próprio corpo. São realizadas atividades que estimulam a flexão, a extensão, a rotação e o reforço da musculatura, sempre respeitando os limites do paciente. O fisioterapeuta do Centro de Reabilitação da PUCRS Marcelo Fagundes conta que esse cuidado é ainda maior no caso da dor lombar, uma vez que a coluna está associada a um grande número de músculos, e a força excessiva pode provocar contrações musculares difíceis de serem revertidas. Para que a coluna não seja sobrecarregada e ocorra uma recuperação plena, a musculatura precisa permanecer reforçada. O paciente deve seguir praticando atividades físicas, uma vez que o sedentarismo é fator de risco para

Ter uma constante vigilância quanto à postura e evitar o excesso de peso e o tabagismo, já que o cigarro danifica a microcirculação de sangue, prejudica o metabolismo muscular e a hidratação dos discos intervertebrais, são iniciativas essenciais. Embora a dor lombar seja comum, existe uma grande variedade de maneiras de preveni-la, como ter hábitos de vida saudáveis e condicionamento físico adequado.

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: FR EE degeneIMA GE S ração dos discos, resultado da instabilidade do corpo. Recomendam-se pilates, musculação, natação e hidroginástica. Contudo, muitos não aderem a um estilo de vida mais ativo e retornam à condição de dor. A depressão é outro ponto preocupante no tratamento, sendo frequentemente necessário o acompanhamento de psicólogo e psiquiatra. “O paciente com dor quer atenção, tem uma carência”, revela Fagundes. Ele ressalta a importância de acolher o paciente e auxiliá-lo a encontrar motivações para conti­nuar dedicando-se às atitudes terapêuticas.

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DIAGNÓSTICO

A P E S A R D E N Ã O A P R E S E N T A R S I N T O M A S , P R E S S Ã O A LT A P R E C I S A S E R T R ATA D A PA R A E V I TA R C O M P L I C A Ç Õ E S À S A Ú D E

O

Rio Grande do Sul está à frente em uma estatística preo­cupante. É o Estado com maior número de hipertensos, com prevalência estimada de 32,5%, chegando a 75% em pacientes acima de 70 anos. O índice é superior à incidência nacional, que foi de 23,3% da população em 2010. A doença de caráter crônico, conhecida como pressão alta, tem a sua origem associada ao uso excessivo de sal nos alimentos e ao sobrepeso. Outro dado que chama a atenção é apontado pelo chefe do Serviço de Cardiologia do Hospital São Lucas da PUCRS (HSL), João Carlos Guaragna: 50% dos hipertensos não sabem que têm a doença e apenas 30% aderem ao tratamento. O diagnóstico é feito quando a pressão sanguínea permanece superior a 140 mm Hg por 90 mm HG por um período de três dias consecutivos. Em pessoas acima de 70 anos, toleram-se máximas de 160/80 e, em diabéticos, o valor é menor: 130/80. Descobre-se o problema pela aferição, pois normalmente não há sintomas. A incidência é um pouco maior em homens, sendo que os negros sofrem duas vezes mais da enfermidade que os brancos. O mesmo ocorre em relação às mulheres negras, que enfrentam a doença cinco vezes mais.

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Guaragna destaca o crescimento do diagnóstico de hipertensão em jovens com cerca de 30 anos. “Tenho 38 anos de profissão e não via pes­soas de 25 a 30 anos consultarem”, explica. O cardiologista ressalta a maior preocupação dessa faixa etária com a saúde e o aumento da obesidade. Em casos de crianças e adolescentes hipertensos, procuram-se causas como tumores. Quanto aos adultos, medir a pressão regularmente é a melhor forma de evitar complicações futuras. Entre elas, estão acidente vascular cerebral (AVC), insuficiência renal, infarto e doenças coronarianas (nos vasos sanguíneos do coração), acarretadas devido a danificações no sistema circulatório. O tratamento é feito com remédios e mudança de hábitos, como controle do colesterol e da diabete, diminuição de peso, prática de exercícios físicos

e abandono do tabagismo. Como a hipertensão não tem cura, torna-se necessário o uso contínuo de medicamentos, que agem, basicamente, com a finalidade de dilatar os vasos sanguíneos. Os diuréticos, por exemplo, auxiliam na eliminação de líquido do organismo. Deve-se evitar ainda o excesso de sal, que contém sódio, elemento já existente em qualquer alimento e que retém água, aumentando assim o volume de sangue na artéria. Também é recomendado combater o estresse e, nesse caso, praticar atividades físicas pode ser uma excelente solução. Se por um lado o esporte auxilia a produção de endorfinas, substâncias que relaxam o corpo, por outro o sedentarismo pode levar ao aumento de peso, deixando as artérias endurecidas em virtude de inflamações e permitindo o acúmulo de colesterol.

EM DETALHES Pressão arterial refere-se à pressão que o sangue exerce contra a parede das artérias. Os valores são medidos em milímetros de Mercúrio (mm Hg) e escritos com a pressão sistólica (exercida nas artérias durante os batimentos cardíacos) antes da diastólica (pressão nas artérias nos intervalos entre as batidas). Para aferição, usa-se um aparelho chamado esfigmomanômetro, que consiste em um estetoscópio, um revestimento para o braço, um mostrador, uma bomba e uma válvula.

FOTO: DIVULGAÇÃO

Tensão nos vasos sanguíneos


INTEGRA

Parceria aprimora a assistência

EQUIPE FORMADA POR PROFESSORES DA PUCRS E PROFISSIONAIS DO HSL É RESPONSÁVEL POR ELABORAR PROTOCOLOS D E AT E N D I M E N T O

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trabalho integrado vai além da realização de reuniões entre diversas áreas. Para que seja realmente efetivo, é essencial a criação de uma rotina capaz de abranger a todos. Uma das ações do Programa de Integração Ensino-Serviço (Integra), que envolve os cursos da área da saúde da Universidade e seus correspondentes no Hospital São Lucas da PUCRS (HSL), é a elaboração de protocolos assistenciais com visão multiprofissional. Eles servem como guia para as ações do HSL, favorecendo a qualidade do serviço, a segurança dos pacientes e as atividades práticas de ensino. Os protocolos seguem o que foi estabelecido pelo Ministério da Saúde, com base nas orientações da Organização Mundial da Saúde para melhorar a qualidade da assistência. São seis instrumentos usados para construir uma prática segura: Lavagem de Mãos; Identificação de Paciente; Risco de Queda; Prevenção de Úlcera de Pressão; Cirurgia Segura e Segurança na Prescrição e Administração de Medicamentos. Esses documentos já existiam no HSL; no entanto, os integradores do ensino e do serviço, grupo formado por docentes e profissionais do HSL responsáveis pelas atividades do Integra, estão enriquecendo-os com um olhar interdisciplinar. Em conjunto,

buscam visualizar como cada área profissional está inserida no processo e com quais ações podem colaborar. “Esse olhar amplamente interdisciplinar é um diferencial no Programa. A equipe reúne-se e discute, periodicamente, cada protocolo. A partir da contribuição de cada área, abre-se caminho para o trabalho integrado”, ressalta Valéria Corbellini, coordenadora de Programas Especiais da Pró-Reitoria Acadêmica (Proacad). “Os integradores aprimoram e promovem a validação técnica dos protocolos, e o Hospital os implanta e monitora por meio do Núcleo de Segurança do Paciente”, explica Marlow Kwitko, diretor acadêmico do Hospital. As capacitações dos profissionais do HSL para os protocolos são elaboradas e promovidas pelo Núcleo de Segurança do Paciente. Na parte acadêmica, os integradores de ensino são os responsáveis por repassar o conhecimento aos alunos e docentes. Em torno de 200 acadêmicos receberam os treinamentos. “A participação do Núcleo é muito importante e efetiva e o retorno que nós temos é muito positivo. A atividade é

bastante lúdica e baseada em um caso real, que se aplica ao dia a dia”, explica Valéria. Para o coordenador do Núcleo, Salvador Gullo Neto, o grupo sozinho “não teria estrutura para treinar todas as pessoas. Com a colaboração dos professores/ integradores do ensino, conseguimos manter o Hospital nesse status de capacitação”. Os resultados alcançados com esse trabalho conjunto têm beneficiado pacientes, alunos e profissionais da Instituição. “No processo de execução dos protocolos, obtém-se não apenas a integração dos estudantes às Unidades Assistenciais do Hospital, mas também que todos os cursos atuem de forma conjunta no âmbito do HSL. O protocolo é um indutor da integração”, enfatiza Kwitko.

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SEGURANÇA

Eliminando D

isseminar e acompanhar processos e políticas para prevenir qualquer incidente são os objetivos do Núcleo de Segurança do Paciente do Hospital São Lucas da PUCRS (HSL). Formado em 2013, o grupo é responsável por desenvolver e implantar um plano para tornar os riscos para os pacientes cada vez menores. A cultura da segurança vem de outras indústrias, como a da aviação e do automobilismo. Esses ramos possuem riscos inerentes ao seu trabalho diário e, por isso, sempre se mostraram preocupados com essa questão. Há aproximadamente 20 anos essa ideia foi incorporada aos hospitais, que se reconheceram como um ambiente potencialmente perigoso. Apesar de serem locais de assistência, muitas ações necessárias ao atendimento trazem algum nível de risco para os envolvidos. A política de segurança do paciente tem o conceito de minimizar ou, se possível, eliminar os riscos inerentes ao tratamento daqueles que estão internados nessas instituições. Dentro do HSL, sempre existiu uma forte tradição de segurança. O processo esteve ligado diretamente com a enfermagem e era supervisionado pela Comissão de Segurança do Paciente, a Cosepa. O grupo abordava o tópico de forma intensa e buscava alertar as pessoas sobre a relevância do assunto. No entanto, tornou-se necessário expandir o trabalho e criou-se o Núcleo de Segurança do Paciente. Ele atende a resolução publicada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pelo Ministério da Saúde, que determina a realização desse tipo de iniciativa em instituições de saúde e orienta o desenvolvimento de um plano de segurança, norteado pelas seis metas do Ministério (confira no box). O Núcleo é ligado ao diretor técnico e clínico do HSL, Plínio Vicente Medaglia Filho, ressaltando sua importância institucional. O grupo organizou o trabalho em etapas. De novembro de 2013 a janeiro de 2014, realizou-se um diagnóstico situacional. Analisou-se o banco de dados de notificações de

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riscos

não conformidades feitas pelos profissionais do Hospital, tabulando os resultados e verificando quais eram os casos mais prevalentes. Em seguida, organizaram-se encontros com todos os gestores para produzir o mapa de risco de cada unidade assistencial. Nessas reuniões, os responsáveis avaliaram e identificaram os principais perigos para os pacientes dentro daquele setor e, em seguida, classificaram-nos através de uma matriz de priorização. Com esses dados, foram montados mapas de risco para cada unidade e para a Instituição. “A prioridade são os riscos mais críticos. Cada gestor deve trabalhar primeiro com eles, desenvolvendo protocolos e treinamentos internos. O Núcleo funciona como apoiador nessas atividades”, explica a farmacêutica Mayara Becker Delwing. O passo seguinte foi a disseminação das seis metas de segurança do Ministério da Saúde e dos seus respectivos protocolos institucionais entre os profissionais. Para isso, realizou-se uma grande campanha com a promoção de palestras, distribuição de lâminas informativas e divulgação nos veículos de comunicação interna do HSL. As metas foram divididas em grupos para facilitar o trabalho de conscientização. No primeiro semestre de 2014, discutiu-se a higienização das mãos e a prevenção de quedas. No segundo semestre, o Enfermeira Sílvia foco são a prevenção de úlcera por Soares (segunda à direita) apresenta pressão e a identificação correta do as metas de paciente. segurança no Centro Cirúrgico


Fernanda (segunda à esquerda) realiza simulação realística no Centro Obstétrico

NÚCLEO É RESPONSÁVEL P O R D E S E N V O LV E R E DIVULGAR PROTOCOLOS PA R A P R E V E N Ç Ã O DE ACIDENTES

FOTOS: ANGELA VENCATO

BLITZ Com o objetivo de contemplar o maior número de profissionais e alunos durante a campanha, o Núcleo passou a aplicar a Blitz da Segurança do Paciente nos setores do Hospital. Com duração entre 15 e 20 minutos, a atividade utiliza a técnica de simulação realística, colocando a pessoa em uma situação vivida diariamente. No caso da higienização das mãos, a equipe usa uma caixa com luz neon para visualizar como está a limpeza das mãos dos participantes e falar sobre a forma e frequência correta para fazer a higiene. Para abordar a prevenção de quedas, um dos componentes do Núcleo veste-se como um paciente, simula um tipo de risco e o grupo discute sobre os sinais que devem ser observados nele. “O pessoal está bem aberto e motivado com relação às blitz que já realizamos. Temos feito as atividades de uma maneira que considero inovadora. Não utilizamos sala de aula. Criamos cenários e, de forma lúdica, trabalhamos com o problema. Com essa iniciativa, estamos vendo um cuidado maior por parte dos colaboradores”, explica o assessor da direção técnica e clínica e coordenador do Núcleo, Salvador Gullo Neto. No primeiro semestre, mais de 1,4 mil pessoas, entre

estudantes e profissionais da Instituição, passaram pela capacitação. Manter os processos corretos no dia a dia e repassá-los para os demais colegas são tarefas contínuas e que devem ser trabalhadas sempre. Por isso, são usados indicadores de desempenho para medir como cada área está aplicando os protocolos implantados. A incidência de quedas, o uso de soluções alcoólicas para higiene de mãos e o número de oportunidades para higienização de mãos aproveitadas por profissionais são alguns dos dados usados nesse controle. Esse projeto, que conta com a colaboração do Serviço de Controle de Infecção, da Supervisão de Enfermagem e de participantes do Programa de Integração Ensino-Serviço (Integra), busca a conscientização a longo prazo, tornando os ensinamentos e procedimentos parte da rotina. “Nosso objetivo é que, em um ano e meio, estejamos com as seis metas amplamente estabelecidas na rotina de trabalho do Hospital. O mais importante é perceber que isso não é uma coisa diferente do que eles já fazem. Com isso, queremos que as pessoas entendam que não é algo

desconectado da nossa realidade. Isso faz parte do gerenciamento da rotina”, ressalta Gullo Neto.

SEIS METAS DE SEGURANÇA DO MINISTÉRIO DA SAÚDE 1. Identificação do paciente 2. Comunicação efetiva 3. Segurança na prescrição e administração de medicamentos 4. Cirurgia segura 5. Lavagem de mãos 6. Prevenção de queda e úlcera por pressão

Núcleo de Segurança do Paciente • Integrantes: Salvador Gullo Neto, Fernanda Boaz Jacques e Mayara Becker Delwing • Contato: (51) 3320-300, ramal 2657 • E-mail: segurancadopaciente@ pucrs.br

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FOTO: ARQUIVO PESSOAL

C U R TA S DOAÇÃO DE ÓRGÃOS

TURISMO MÉDICO

A organização Via Vida – Pró-Doações e Transplantes homenageou o HSL por ter captado o maior número de doadores de órgãos no Estado em 2013. No período, foram efetivados 18 doadores e estima-se que cada um possa beneficiar até oito pessoas. O resultado foi obtido com o trabalho da Comissão Intra-Hospitalar de Doação de Órgãos, Tecidos e Transplantes (Cihdott), vinculada à Organização de Procura de Órgãos (OPO) do HSL.

O Porto Alegre Health Care (PAHC), grupo sem fins lucrativos que reúne os hospitais São Lucas da PUCRS (HSL), Mãe de Deus, Moinhos de Vento e Santa Casa de Misericórdia, realizou novas ações em 2014. Com o objetivo de potencializar o turismo na capital gaúcha e promover sua excelência médica, foi lançado o portal +Porto Alegre, plataforma colaborativa e dinâmica, criada para entreter, informar e prestar serviços aos visitantes e moradores da cidade. Em 5 de agosto, o grupo assinou contrato de parceria com as operadoras de saúde uruguaias Medicina Personalizada, Blue Cross Blue Shield Uruguay e Hospital Britânico. No dia 4 do mesmo mês, representantes das operadoras visitaram as instituições e conheceram as estruturas disponíveis. No HSL, a comitiva foi recebida pelo diretor financeiro, Ricardo Minotto.

Coordenador da OPO, nefrologista Leonardo Kroth, recebe a homenagem da presidente da Via Vida, Maria Lucia Kruel Elbern

CURSO DE PATOLOGIA VULVAR O HSL recebeu o curso Patologia Vulvar. A atividade foi realizada com uma nova proposta de ensino, conhecida como One Day Course, com abordagem intensa, compacta e completa. Os temas foram apresentados pelas professoras Isabel do Val, responsável pelo Ambulatório de Patologia Vulvar da Universidade Federal Fluminense; e Lana Maria de Aguiar, responsável pela Patologia Vulvar do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP). A iniciativa foi promovida pelo Grupo de Oncologia Ginecológica e Endoscopia da PUCRS, que completa 20 anos de formação, integrante do Serviço de Ginecologia do HSL.

SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE NEONATOLOGIA A Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) Neonatal do HSL promoveu, entre 29 e 31 de maio, o 4º Simpósio Internacional de Neonatologia de Porto Alegre. O evento contou com palestras de profissionais do Brasil e do exterior e discutiu enfermidades, cuidados e práticas de atendimento aos bebês prematuros e recém-nascidos. Entre os convidados estiveram Ivan Frantz III (Harvard Medical School/EUA), Raquel Tamez (Piedmont Henry Hospital/EUA), Richard Polin (Columbia University/EUA), Cléa Leone (Universidade de São Paulo) e Navantino Alves Filho (PUC Minas/ Belo Horizonte). No dia 28, ocorreu a 5ª Jornada de Enfermagem Neonatal, com a participação da enfermeira Raquel Tamez. FOTO: BRUNO TODESCHINI

CENTRO DE REABILITAÇÃO O Centro de Reabilitação da PUCRS completou dez anos em 13 de julho. O espaço integra assistência fisioterapêutica, ensino e pesquisa, com serviço interdisciplinar. Nesse período, realizou 308 mil procedimentos de Fisioterapia e presta, atualmente, uma média de 2,8 mil atendimentos por mês a pacientes de convênios e particulares.

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Raquel Tamez ministra palestra na Jornada de Enfermagem Neonatal


BASTIDORES

Acolhendo o

público

S E R V I Ç O D E AT E N D I M E N T O A O C L I E N T E R E C E P C I O N A E P R E S TA O R I E N TA Ç Õ E S A Q U E M B U S C A O H O S P I TA L

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m dos primeiros contatos de quem chega ao Hospital São Lucas da PUCRS (HSL) é com os funcionários do Serviço de Atendimento ao Cliente (SAC), localizados nas entradas do térreo e do segundo andar. Eles prestam informações sobre a Instituição a pacientes, clientes e acompanhantes, realizando, em média, 24 mil atendimentos pessoais e cinco mil por telefone ao mês. Normalmente são esclarecidas dúvidas referentes a exames, profissionais, localização e funcionamento de setores. Com plantão 24 horas, o SAC conta com 16 funcionários (distribuídos em turnos), sob a coordenação da relações públicas Raquel Martins. Criado em 1998, é responsável ainda pela distribuição de correspondências, reposição e recolhimento de pesquisas de satisfação, montagem do Espaço Cultural e organização da estrutura do Anfiteatro Irmão José Otão e do Auditório C para eventos. O primeiro contato da Ouvidoria também é feito na recepção do 2º andar. Os integrantes do SAC ficam à disposição do público, uniformizados e identificados pelo crachá.

Raquel destaca a importância de atender ao público com empatia, iniciativa, receptividade e tranquilidade. “As pessoas chegam estressadas, cansadas, nervosas, com medo e com dor. Precisamos saber disso e nos colocarmos no lugar do outro para tentarmos ajudar da melhor maneira possível”, ressalta a coordenadora. O auxiliar administrativo Leonardo Oliveira de Oliveira, que trabalha há mais de um ano no setor, tenta colocar essa concepção em prática diariamente, fornecendo orientações detalhadas, com calma e simpatia. “Temos que estar sempre sorrindo e tratar as pessoas com educação, para que se sintam confortáveis conosco”, conta o colaborador. Há casos em que os visitantes perguntam, inclusive, como se deslocar em Porto Alegre, pois um elevado número de pacientes vem do interior do Estado, sem conhecer linhas de ônibus e nomes de ruas. Em virtude da grande circulação de pessoas no Hospital e da variedade de funções, revela-se essencial a atuação em equipe. “Trabalhamos em conjunto, porque temos diferentes tarefas. Um depende do outro e é preciso ser dinâmico, porque vêm muitos pacientes”, explica Oliveira.

Oliveira integra a equipe do setor há mais de um ano

FOTO: GILSON OLIVEIRA

INTEGRAÇÃO Cada funcionário contratado passa por treinamento, que consiste em observar, nas duas primeiras semanas, a rotina de um colega mais experiente e entregar correspondências, uma vez que a atividade auxilia o novo colaborador a se localizar na complexa estrutura do Hospital. A coordenadora do SAC, Raquel Martins, frisa que a exatidão das informações é essencial e, para tanto, coloca-se à disposição para esclarecer as dúvidas dos funcionários. “Minha porta está sempre aberta. Não importa se estiver perguntando pela quinta vez, mas não se deve passar informações sem ter certeza”, enfatiza. O auxiliar administrativo Leonardo Oliveira de Oliveira conta que levou cerca de dois meses para conhecer toda a Instituição. Ele reforça a preocupação em orientar corretamente os visitantes. “Às vezes chegam três ou quatro pessoas ao mesmo tempo e a informação tem de ser precisa; temos que indicar o lugar certo. Fazemos todo o possível para ajudar os clientes do Hospital.”

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INTERNACIONALIZAÇÃO

Rede de

conh

S A N J E E V A R O R A , F U N D A D O R D O P R O J E T O E C H O , A P R E S E N TA I N I C I AT I VA

P O R J E N I F F E R C A E TA N O

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tilizar a tecnologia para espalhar conhecimento e melhorar o atendimento de saúde à população. Esse é o objetivo do projeto Echo, elaborado pelo gastroenterologista e professor da Universidade do Novo México (Estados Unidos) Sanjeev Arora. Iniciado há mais de dez anos, o programa utiliza a tecnologia de videoconferência para melhorar a prestação de cuidados primários em áreas rurais e carentes, treinando e orientando médicos para entregar a gestão de melhores práticas das condições de saúde. Atualmente, 31 instituições ao redor dos Estados Unidos, como as universidades de Washington, Chicago e Harvard, participam do projeto. Além disso, nove países aplicam o Echo em seu sistema de

saúde. Canadá, Índia e Irlanda, entre outros, estão nesse grupo que passou a contar recentemente com o Uruguai. Após o encontro com o presidente uruguaio, José Mujica, Arora visitou a PUCRS e o Hospital São Lucas. Encontrou-se com o reitor da Universidade, Ir. Joaquim Clotet, participou de uma sessão clínica na Faculdade de Medicina e reuniu-se com a Secretária de Saúde do Estado, Sandra Fagundes, para apresentar o projeto. A ideia é implantá-lo no Rio Grande do Sul, o que pode ajudar a diminuir a longa fila de espera por atendimento em diversas especialidades. Esse é o trabalho capitaneado pelo HSL e pela PUCRS. “Temos trabalhado em parceria com a Secretaria de Saúde do Es-

Arora defende a implantação do projeto no Estado para disseminá-lo no País

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tado para estabelecer áreas prioritárias de abrangência desse projeto, visando ao melhor aproveitamento nas especialidades de maior necessidade no Rio Grande do Sul”, destaca Salvador Gullo Neto, assessor da direção técnica e clínica do Hospital. Arora falou com a Revista PUCRS Saúde sobre o Echo e as perspectivas para sua implantação no Brasil. Como surgiu a ideia do projeto Echo? Surgiu há dez anos, quando estava tratando a hepatite C, que possuía aproximadamente 70 milhões de portadores no mundo. O desafio com essa infecção é que, se não tratada, ela causa a morte de muitas pessoas, além de cirrose, câncer de fígado, sangramento do estômago, entre outros. Estima-se que 20 milhões de pessoas vão morrer por causa da hepatite C nos próximos 20 anos, pois poucas estão recebendo tratamento. Onde vivo, em 2004, 28 mil pacientes tinham sido diagnosticados. Como sou um especialista nessa doença, eles me procuravam. O Novo México é um estado muito grande e eles dirigiam centenas de quilômetros para me ver. Como o tratamento é feito com injeções de um remédio chamado Interferon, com efeitos colaterais muito sérios, eles tinham de fazer de 12 a 18 viagens durante esse período. Por isso, somente 5% das pessoas recebiam tratamento adequado. Estava preocupado e frustrado, pois, quando os pacientes chegavam até mim, já estavam morrendo de câncer de fígado. Eu pensava: “Se eu os tivesse visto antes, isso não teria acon-


hecimento Q U E P O D E A J U D A R A M E L H O R A R A Q U A L I D A D E D A S A Ú D E N O E S TA D O

tecido. Isso não está certo”. Então, comecei o projeto Echo. Como ele funciona? Echo significa extensão dos resultados em saúde para toda a comunidade. Nossa missão é oferecer uma assistência de melhor nível para doenças comuns e complexas a populações rurais e não atendidas. O Echo é baseado em ideias-chave. Em primeiro lugar, sabia que, para tratar bem um paciente com hepatite C, eram necessários especialistas. Não tínhamos isso nas áreas rurais. Queria aplicar a tecnologia para utilizar e repassar o conhecimento dos profissionais da universidade para os dessas regiões. Para fazer isso, criamos uma solução em videoconferência multiponto. Em segundo lugar, sabemos que existe um padrão para tratar a hepatite C, que eu já estava usando na universidade. Por isso, decidimos usar a mesma metodologia, criando um protocolo e distribuindo-o aos 21 pontos de conexão criados. Cada um desses pontos era comandado por um clínico geral ou médico de família, porque não existiam especialistas em fígado e gastroenterologistas lá. O desafio era não apenas fazê-los tratar os pacientes, mas transformá-los em especialistas na doença. Para isso, decidimos usar o mesmo modo pelo qual virei um especialista. Chamamos isso de case based learning . Costumava acompanhar e manejar pacientes com meus professores e, durante esse processo, tornei-me um especialista. Fizemos a mesma coisa com eles,

de quilômetros para vir até o HSL, perder um dia de trabalho e arrumar alguém para ficar com seu filho, é Como esse método é utilizado para muito difícil. O que queremos é levar o tratamento até eles. Além disso, o disseminar o conhecimento? O coração do nosso projeto é paciente é o beneficiado, mas o beessa inovação que chamamos de neficiário principal é o profissional da knowledge network (rede de co- área da saúde, pois o conhecimento nhecimento). Todos os 21 pontos e a experiência dele aumentam. Com isso, todos ao seu conectam-se simulredor se tornam betaneamente em uma neficiários também. videoconferência. “Nossa missão O conhecimento é Temos pequenas teé oferecer uma como perfume; ele levisões onde cada se espalha e benefium deles apresenta assistência de cia a todos. pacientes com hemelhor nível a patite C. Nosso time doenças comuns É possível implanajuda-os, mas eles tar o Echo no Rio também aprendem e complexas para Grande do Sul e no com as experiênpopulações rurais Brasil? O que seria cias uns dos outros. e não atendidas.” necessário? Assim, tornam-se O projeto pode especialistas. É o que chamamos de ser aplicado facill earning loop (ciclo de aprendiza- mente aqui no Rio Grande do Sul. gem). Agora, temos 21 locais tratan- Não existe barreira tecnológica, do hepatite C, ao invés de apenas mas precisamos do desejo de desum. Descobrimos que os resultados monopolizar o conhecimento dos eram tão bons quanto os de quando especialistas, de democratizar esse eu tratava a hepatite C na universi- conhecimento. Queremos uma coladade. Isso fez com que a espera na boração entre diferentes escolas de minha clínica caísse de oito meses Medicina e com o departamento de saúde. Não podemos pensar como para quatro semanas. uma instituição isolada, mas como Quais são os principais benefícios uma comunidade. Queremos que esse Estado seja o líder no Brasil trazidos pelo projeto? Se você tratar a doença no início para que todos possam aprender e da forma correta, terá melhores conosco. Estamos na direção certa. resultados. Com isso, vidas serão A Secretaria de Saúde está interesprolongadas e salvas, além de trazer sada em prosseguir com o projeto, maior satisfação para os pacientes e mas precisamos de todo o apoio menor custo. Para uma pessoa mais que conseguimos e da liderança da pobre, ter de se deslocar centenas PUCRS. mas usamos a tecnologia ao invés de fazer pessoalmente.

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TRAJETÓRIA

Trabalho que dá frutos COM 23 ANOS DE DEDICAÇÃO, LULIMAR MACIEL MACHADO RELEMBRA S U A H I S T Ó R I A N O H O S P I TA L FOTO: GILSON OLIVEIRA

Lulimar conta com apoio da família para estudar e se aperfeiçoar profissionalmente

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onstruir uma jornada de crescimento dentro de uma instituição, subindo cada degrau e evoluindo tanto profissional quanto pessoalmente, é uma tarefa que exige empenho, comprometimento e dedi-

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cação. Fazer isso, permanecendo por 23 anos no mesmo local, demonstra forte conexão entre empresa e empregado. Essa é a história de Lulimar Maciel Machado, 52 anos, no Hospital São Lucas da PUCRS (HSL). Ela iniciou sua caminhada na Instituição em 1991 como auxiliar administrativo II. Formada em técnica de Secretariado, ingressou com a função de auxiliar a única secretária da Direção e substituí-la durante suas férias. Em seis meses, aprendeu todos os processos e se adaptou ao desenvolvimento das tarefas. Vinte e três anos depois, o Hospital cresceu e a equipe também. Agora ocupa o cargo de coordenadora administrativa e de informações gerenciais, exercendo o controle de contratos e exigências legais, especialmente habilitações junto ao Ministério da Saúde. Também favorece a otimização de processos da Direção Executiva e promove o repasse interno e externo de informações do HSL e da área da saúde. “Procuro transmitir os meus conhecimentos para os colegas. Essa passagem de bastão é essencial para o HSL. Assim, utilizo a minha própria trajetória para incentivá-los a se capacitarem e evoluírem profissionalmente, assim como fui incentivada”, ressalta. Durante esse período, buscou o aperfeiçoamento e desenvolvimento por meio de cursos e, principalmente,

do conhecimento adquirido com os profissionais com os quais trabalhou, que foram orientadores nesse processo. Em 2009, diplomou-se como Tecnóloga em Gestão Financeira e, em 2014, concluiu especialização em Governança Corporativa e Gestão de Risco pela PUCRS. Lulimar considera essa atualização essencial e frisa que “conhecimento é algo que não se perde e nunca é demais”. A oportunidade de trabalhar na Secretaria da Direção proporcionou-lhe uma visão da dinâmica de um hospital de ensino, com sua complexidade de abrangência. Com tantos anos de experiência, sua trajetória está entrelaçada à da Instituição. “O Hospital é minha segunda casa; tenho uma história muito forte aqui dentro”, comenta. Para alcançar tanto êxito, sempre teve o valioso apoio familiar. Com 34 anos de casamento, sempre dividiu sua atenção entre o trabalho e a família. Por isso, contou com a ajuda de sua mãe, que cuidou de seus dois filhos, atualmente administradores, para que ela pudesse se dedicar ao HSL e aos estudos. Hoje é avó de dois meninos e entre suas paixões está a de almoçar com a família aos domingos, de ir ao cinema com os netos e de dançar com o marido. “Tudo isso me fortalece e revigora para iniciar uma nova semana”, conta.


CRÔNICA

Super-heróis ALEXANDER SAPIRO, pediatra e professor da Faculdade de Medicina

T

arde de quarta-feira, sala de aula do Serviço de Pediatria do Hospital São Lucas da PUCRS (HSL). Ao invés dos rostos familiares de alunos, doutorandos e residentes, deparo-me com uma legião de super-heróis (e heroínas): Homem Aranha, BatMan, Super-Homem, Capitão América, Mulher Maravilha e tantos outros que, como em sonhos de minha infância, desfilavam com desenvoltura em seus trajes coloridos e poderosos. Os super-heróis logo ganharam codinomes quando, ao me receber neste círculo seleto, apresentaram suas identidades secretas de acadêmicos de Medicina, das várias Faculdades da Grande Porto Alegre. Durante duas horas, deixaram de lado seus estetoscópios e, trajados a rigor, vieram de forma voluntária e solidária trazer um pouco de alegria para nossas crianças internadas no 5º andar do HSL. Atendendo a um chamado de nossa querida e eficiente equipe de recreação, chegaram em seus reluzentes trajes para abrilhantar a Festa da Pediatria. Além da euforia causada no saguão, a alegria espalhou-se por todos os quartos da internação quando os super-heróis entravam e, por breves, mas maravilhosos momentos, faziam as crianças esquecerem-se de suas dores e doen­ças, curtindo suas fantasias, tão importantes nesta idade. Confesso que senti ciúmes pelo êxtase que vi nos olhos das crianças. Senti inveja dos alunos de Medicina, que orgulhosamente vestiam e assumiam seus superpersonagens. Fiquei a pensar: como é importante construir em nosso imaginário

FOTO: RAMON FERNANDES

super-heróis que possam trazer es- mesma perseverança e teimosia da perança de justiça, igualdade; heróis equipe Marvel, lutam sob condições acima de qualquer suspeita, acima do adversas, trazendo conforto, alívio bem e do mal... Na vida adulta e real, e cura para muitos dos males que estamos em crise. afligem aos que paHá falta de heróis decem de dores e “Como é importante (já nem penso em sofrimentos. “super”): bons manSão esses superconstruir em nosso datários, dirigentes -heróis que, diariaimaginário super-heróis mente, se vestem e políticos, que nos que possam trazer de branco e lutam. tragam esperanças. Lutam com seus esEnquanto sonhaesperança de justiça, tetoscópios, otoscóva acordado, esigualdade; heróis acima pios, “esfigmos”, enfreguei os olhos e de qualquer suspeita, fim, com suas mãos então percebi. Ali e palavras, tentando estava uma legião acima do bem restaurar o equilíbrio de pessoas que toe do mal...” entre a saúde e a dos os dias ainda doen­ça, entre o bem pode fazer essa função: médicos, enfermeiras, psicólo- e o mal. Sim, os trabalhadores da saúgas, recreacionistas e outros tantos de ainda podem ser lembrados como profissionais que, diariamente, com a heróis...

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