Ambientalização dos Bancos e Financeirização da Natureza

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Na etapa de análise, aprovação e contratação dos projetos, o

não poderiam ser beneficiados em áreas dos biomas da Amazônia

Banco afirma realizar a “avaliação do beneficiário sobre a sua

e do Pantanal; de termelétrica a combustíveis, que estabelece

regularidade junto aos órgãos de meio ambiente, pendências

restrições na emissão de partículas na atmosfera; e da pecuária/

judiciais e efetividade da atuação ambiental”. Considerando

frigoríficos, que determina o cadastramento dos fornecedores e

novamente os casos aqui tratados, em que ocorrem graves e

a exigência da rastreabilidade progressiva do gado. Vale dizer que

recorrentes irregularidades e violações de direitos associadas a

a aplicação de tais salvaguardas está baseada, invariavelmente,

projetos financiados pelo Banco, fica também evidente que esta

na autodeclaração do tomador do empréstimo, não contando

avaliação, caso efetivamente ocorra, não tem efeitos práticos.

novamente o Banco com instrumentos de monitoramento e

O Banco afirma, ainda, que nesta etapa empreende a “avaliação dos empreendimentos quanto aos principais impactos sociais e

fiscalização do seu cumprimento. Além da revisão de suas práticas operacionais, a Política

ambientais, inclusive no seu entorno, sua correspondência, quando

Socioambiental do BNDES inclui mudanças na estrutura

for o caso, com as ações preventivas e mitigadoras propostas no

organizacional do Banco. Foi instituída, também em 2010, a área

licenciamento ambiental”, bem como a “inclusão de possíveis

ambiental, que elevou o status da temática ambiental, anteriormente

condicionantes de natureza social e/ou ambiental estabelecidas a

limitada a um departamento para uma superintendência

partir da análise realizada (do cliente e do empreendimento), em

do Banco. Tal superintendência compreende hoje o antigo

complemento às exigências previstas em lei, quando for o caso”.

Departamento Ambiental do Banco e o Fundo Amazônia.

Embora nos faltem os termos dos contratos de financiamento

A regulamentação do Fundo Amazônia, em 2008, também

firmados pelo Banco e os empreendimentos estudados, pode-se

consta como uma das contrapartidas do empréstimo SEM

afirmar, tomando mais uma vez os casos deste estudo, que tais

DPL, do Banco Mundial. A gestão pelo BNDES de novos fundos

avaliações e condicionantes ou não são praticadas ou são nulas.

ambientais voltados a estruturar um mercado do clima no país,

Mas, talvez, o que mais chame a atenção na descrição da Política

como o Fundo Amazônia e o Fundo Nacional sobre Mudança

Socioambiental do BNDES seja a forma como o Banco descreve a

do Clima, será tratada no artigo de Lúcia Ortiz. Outro aspecto

etapa de “acompanhamento das operações”, onde se lê que “são

da Política Socioambiental a ser abordado pela pesquisadora

verificados: o cumprimento de eventuais medidas mitigadoras,

diz respeito à abertura de uma linha de crédito pelo Banco para

obrigações em termos de ajuste de conduta e condicionantes

qualificar órgãos estaduais de licenciamento, no contexto de

presentes no contrato e nas licenças ambientais, quando for o

avanço das reformas no sistema de concessão de licenças e

caso”. Restaria perguntar, à luz dos casos aqui estudados, quando

gestão ambiental, avaliado pelo Banco Mundial como um dos

é que o Banco entende ser o caso de ele verificar o cumprimento

principais entraves para o desenvolvimento brasileiro.

de condicionantes, pois, novamente, parece tratar-se de letra morta. Tal percepção é ainda mais reforçada pelo fato de que não há nenhuma menção do Banco sobre se há e quais seriam os mecanismos de acompanhamento dos projetos intrinsecamente impactantes em termos sociais e ambientais. Somente para três setores específicos o BNDES estabelece obrigações adicionais ao que determina a lei, o que o Banco chama de “diretrizes e critérios socioambientais setoriais específicos”. Este é o caso das salvaguardas estabelecidas para os setores de etanol, que 18

* Responsável pela organização desta publicação, João Roberto Lopes Pinto é Coordenador do Instituto Mais Democracia e desde a IX Assembleia Geral da Rede Brasil, realizada em agosto de 2012, é membro da Coordenação Nacional da Rede Brasil. 1 Para uma análise mais detida sobre o papel do BNDES nos últimos vinte anos, ver TAUTZ, C. Et alli, 2011. 2 Segundo o economista Mansueto Almeida, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), “até 2008, o estoque de empréstimos do Tesouro ao BNDES era de R$ 10 bilhões, e hoje está em R$ 311,8 bilhões (dados de fevereiro de 2012). Com os R$ 45 bilhões a mais que o governo vai emprestar ao BNDES [provavelmente, entre 2012 e 2013], o volume chegará a quase R$ 360 bilhões” (O ESTADO, 2012).


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