fronteira de especulação para os mercados financeiros, uma
Comentários finais
verdadeira privatização financeira dos bens comuns. Este é somente um exemplo de como as IFIs representam os interesses
Esta análise sobre a reconfiguração das IFIs, especialmente após
das elites financeiras na agenda da chamada “economia verde”.
o colapso financeiro de 2008, não objetiva ser exaustiva a respeito
Além disso, como já afirmado, as IFIs têm sido fundamentais
das diversas formas através das quais as IFIs têm se reconfigurado
na criação e manutenção de marcos regulatórios permissivos
dentro da continuidade do paradigma capitalista neoliberal. O que
e promotores da financeirização, assim como da privatização
se busca mostrar aqui é que este processo de reconfiguração – em
e da comodificação dos bens comuns . E isso se dá também
um contexto de gradual mudança geopolítica com a ascensão
via assessoria técnica, que promove diretrizes de política e
dos chamados países emergentes e o estabelecimento do G20
desregulamentação, favorecendo uma infraestrutura econômico-
como principal fórum da governança econômica global – está
financeira de acordo com o interesse dos investidores.
para além da reconfiguração da relação de forças interestatal. Está
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especialmente calcada em um aprofundamento da aliança entre o O BID tem grande influência na determinação das
capital financeiro e o poder político institucional. As IFIs têm sido
diretrizes da IIRSA [Iniciativa para a Integração da
fundamentais na criação e manutenção de marcos regulatórios
Infraestrutura Regional Sul-Americana], através da
permissivos e promotores da financeirização, assim como da
ocupação de postos-chave na estrutura de gestão e
privatização e da comodificação dos bens comuns.
de assistência técnica, áreas importantes na definição
Neste contexto, a questão de como a estratégia da política
do arcabouço institucional da IIRSA, dos projetos
externa do Brasil “que se entende como país emergente” para
considerados prioritários, bem como das diretrizes para o
as IFIs tem mudado surge como central. O papel que o país
financiamento deles, incluindo os estudos de viabilidade.
tem jogado na disputa por mais poder na governança destas
Em relação ao modelo energético brasileiro, as IFIs têm
instituições pode ter implicado maior autonomia relativa, mas
investido pesadamente para a construção de um marco
também tem prevenido o Brasil de ter uma voz mais crítica em
regulatório que preserve os interesses da iniciativa
relação a elas. Esta estratégia avançada tem um custo político, não
privada que atua no setor: segurança jurídica, retorno dos
só para o país, mas para o Sul Global, os países que permanecem
investimentos e liberdade para remessa de lucros. Isto
excluídos do G20 e das IFIs e que dependeriam de países como
sem falar na alteração da legislação ambiental, bem como
o Brasil para liderar o campo mais crítico. Além disso, o escasso
do processo de licenciamento .
debate público sobre a atuação do Brasil no G20 é representativo
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do déficit democrático da política externa brasileira. Assim, através de suas recomendações técnicas, o Banco
A mobilização dos movimentos sociais e das organizações
Mundial tem criticado o processo de licenciamento ambiental
brasileiras é central no questionamento desta estratégia que tem
no Brasil e o Ministério Público como entraves aos projetos de
favorecido a reinvenção das IFIs dentro de um aprofundamento
infraestrutura do país , em uma demonstração clara de que a
do paradigma neoliberal e de um modelo de globalização
criação de um “ambiente favorável” aos investidores é prioritária,
dominado pelas elites financeiras transnacionais.
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em detrimento dos impactos sociais e ambientais causados pelos próprios projetos de infraestrutura e pelo processo de privatização, comodificação e financeirização dos bens comuns associado a estes projetos. 128
* Diana Aguiar é mestre em Relações Internacionais pela Pontífice Universidade Católica (PUC-Rio), facilitadora do Grupo de Trabalho sobre Arquitetura Econômica Internacional (GT-AEI) da Rede Brasileira pela Integração dos Povos (Rebrip) e Facilitadora de Projeto da Campanha Global contra o Poder Corporativo (Global Corporate Power Campaign Network)