Nova edição do "Rússia", 18 de dezembro

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O melhor da Gazeta Russa GAZETARUSSA.COM.BR

Sem luz, com ‘baby boom’

ALEKSANDR RUMIN / TASS

Crimeia espera alta demográfica para 2016 após boicote de estações de fornecimento P. 3

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ESTE SUPLEMENTO É ELABORADO E PUBLICADO PELO JORNAL ROSSIYSKAYA GAZETA (RÚSSIA), SEM PARTICIPAÇÃO DA REDAÇÃO DA FOLHA DE S.PAULO. Publicado e distribuído com The New York Times (EUA), The Washington Post (EUA), The Daily Telegraph (Reino Unido), Le Figaro (França), La Repubblica (Itália), El País (Espanha), La Nacion (Argentina) e outros.

Economês Russos terão que fazer cortes para festejar

Feliz Ano Novo (mas com a mão no bolso)!

MIKHAIL MORDASOV

Economia levará orçamento familiar com festas a R$ 930 no país. Além de ceia e presentes, viagens estão entre pontos a sofrer cortes. SIMON SCHÜTT ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA

Diferentemente do Brasil, a principal celebração no final do ano na Rússia é o Ano Novo, e não o Natal. Generosos, os russos adoram presentear e preparar fartas ceias na data. Em 2015, porém, a crise

econômica está forçando muitos no país a reconsiderar suas despesas para o Réveillon. Neste ano, os salár ios rea is ca í ra m 13%, levando a população a sentir no bolso as consequências da macroeconomia.

maiores que os dos russos, de quase 8,6%. Já os alemães, aumentarão os gastos em 0,9%, chegando a um orçamento de R$ 1.800 por família na data.

com os da consultoria Deloitte, segundo a qual os russos devem gastar R$ 930 nas festas de Réveillon, ou seja, 7% a menos que no ano passado. Na Europa, só os gregos planejam fazer cortes ainda

De acordo com uma pesquisa do instituto de pesquisas IRG, 75% dos russos limitarão seus gastos no Ano Novo, chegando aos 16.900 rublos (cerca de R$ 930), em média, por família. Os resultados coincidem

planejam celebrar a data. Assim, 20% dos 1.200 entrevistados do IRG disseram que planejam festejar, mas abrirão mão de pratos requintados, já que precisam esco-

Para além da mesa Mesmo com cortes, os russos

CONTINUA NA PÁGINA 4

Golpe Esquema promete lucros fáceis e ganha investidores

Tradutor de Grossman é premiado no Jabuti 2015

Pirâmide que enganou milhões chega ao Brasil

Perpétuo se divide entre jornalismo, crítica musical e literatura

Tradução de “Vida e Destino” rendeu 2° lugar em premiação a Irineu Franco Perpétuo. Título é considerado o “Guerra e Paz soviético”. MARINA DARMAROS GAZETA RUSSA

“O segundo colocado é o primeiro perdedor.” Foi assim que Irineu Franco Perpétuo, 44, rebateu no Facebook uma felicitação pelo segundo lugar na categoria de Tradução do Jabuti, maior premiação da literatura nacional. Mas não foi apenas a “alma russa” de Perpétuo - que, aliás, não tem qualquer as-

cendência eslava - que lhe rendeu a distinção. A tradução de “Vida e Destino”, de Vassíli Grossman (1905-1964), tomou-lhe dois anos de dedicação e longas pesquisas. “Subestimei muito o texto quando recebi, ainda em inglês, e disse que o faria em um ano. Quando o prazo terminou, estava na página 127 - de 877. Lembro até hoje do e-mail, cheio de lágrimas, que recebi do editor: ‘Isso significa que o livro não sairá nunca’”, conta, hoje aos risos, à Gazeta Russa. Mas, com os problemas pessoais do primeiro ano supe-

rados, o “Guerra e Paz do século 20”, como é apelidado o romance, não só saiu, como também levou Perpétuo no último dia 3 de dezembro ao Auditório Ibirapuera para a cerimônia de entrega do 57° Prêmio Jabuti.

Jornalistas Perpétuo passou a se dedicar ao “capricho adolescente” do russo em um curso da União Cultural Pela Amizade dos Povos - entidade fundada por intelectuais como Caio Prado Jr. ainda nos anos 1960 para fomentar as relações culturais Brasil-URSS.

Já na Folha de S.Paulo, no final da década de 1990, passou a aplicar o conhecimento da língua na redação do jornal. A primeira oportunidade foi em uma entrevista com o tradutor pioneiro Boris Schneiderman, depois, com um cineasta armênio em visita ao Brasil que só falava russo e armênio, e assim por diante. “Grossman também era jornalista e traz essa reportagem histórica de ‘O inferno de Treblinka’ - que, se fosse americana, seria chamada de ‘new journalism’. Gosto de acreditar que nós temos isso em comum”, arremata.

MMM, que marcou os anos 1990 na Rússia, entra nos mercados de 107 países, com sucesso peculiar na China e na África do Sul. MARINA DARMAROS, MARINA OBRAZKOVA GAZETA RUSSA

Nos anos 1990, surgiram na Rússia recém-aberta diversos esquemas em pirâmide, ou seja, modelos comerciais que dependem do recrutamento de outras pessoas a níveis insustentáveis sob a promessa de g ra ndes rendimentos. O maior e mais marcante deles na Rússia foi o MMM, de Serguêi Mavródi, que, em seis meses a partir do início das operações, em 1992, recebeu investimentos de 15 milhões de pessoas. Quase todas saíram perdendo no negócio. Agora, aos 60 anos de

KOMMERSANT

FOTO DO ARQUIVO PESSOAL

Prêmio Púchkin e Turguêniev também já passaram pelas mãos de Perpétuo

Fundador do esquema, Mavródi ficou preso de 2003 a 2007

idade, quatro deles atrás das grades, esse matemático volta a usar seu método duvidoso, desta vez no exterior. Além do Brasil, seu novo “Fundo Global de Ajuda Mútua” já foi implementado em 106 países, gozando de particular interesse na África do Sul, na China e na Índia. Em sites de downloads como o Pirate Bay, a página

brasileira do esquema aparece em um pop-up indesejável e em mau português.

Fugindo da fama Após o colapso da MMM na Rússia, em 1997, a figura de Mavródi é causa de aversão em todo o país. Assim, seu novo empreendimento, a CONTINUA NA PÁGINA 4

GAZETA RUSSA, FONTE CONFIÁVEL DE NOTÍCIAS 83% consideram a gazetarussa.com.br como fonte para novos pontos de vista de especialistas russos

81% acreditam que a gazetarussa.com.br fornece informações e análises que vão além da cobertura tradicional da mídia sobre o país 77% dizem que nossos projetos on-line são relevantes para todos - e não apenas a quem tem algum interesse especial pela Rússia * P e s q u i s a re a l i z a d a co m l e i to re s d a G a ze t a R u ss a e d o p ro j e to R BT H e m m a rço d e 2 0 1 5

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Opinião

RÚSSIA O melhor da Gazeta Russa gazetarussa.com.br

As partes começariam a cooperar na Síria em diversas questões m i l ita res e políticas. A utopia desse cenário é que seria preciso existir um nível de confiança elevado entre as partes que se apoiasse em mecanismos de real cooperação Rússia-Otan.

AS CRISES DE IMIGRAÇÃO E O IMPERIALISMO

Furada dupla

DMITRY DIVIN

IMPASSE NO JOGO POLÍTICO ENTRE RÚSSIA E TURQUIA Aleksêi Tchesnokov CIENTISTA POLÍTICO

crise iniciada após a derrubada de um caça russo na fronteira turca entrou em um impasse após o presidente Vladímir Pútin assinar um decreto com medidas de retaliação ao país. A falta de disposição do presidente russo para se reunir com o seu homólogo turco, Recep Tayyip Erdogan, na Conferência do Clima, em Paris, assim como sua recusa em responder aos telefonemas desse, deixam claro que Moscou não está satisfeito com o pedido de desculpas turco. Diferentes cenários podem surgir do quadro atual. A escalada da crise é um deles e permanece latente enquan-

A

to Ancara continuar a apoiar os turcomanos sírios, e a Rússia, a bombardear áreas controladas por turcomanos e opositores sírios aliados da Turquia. Um incidente qualquer pode levar a consequências militares imprevisíveis. Motivações políticas também podem causar danos, se medidas tomadas por um dos lados lesarem o equilíbrio de interesses mútuos. Um desses casos seria o bloqueio do Estreito de Bósforo às embarcações russas.

Congelamento Outro cenário possível seria o da manutenção do atual, com uma retórica política afiada, mas sem ações que possam piorar a situação efetivamente. Para impedir a imposição de novas sanções entre os países, provavelmente a Rússia teria

que suspender as atividades de suas Forças Aéreas na fronteira sírio-turca, e Ancara teria que deixar de apoiar os turcomanos e fechar as fronteiras para evi-

perspectiva de recuperação gradual das relações bilaterais - pelo menos em termos militares e diplomáticos. Nesse cenário, parte das sanções seriam gradualmen-

Um cenário possível seria o da escalada, com bloqueio do Bósforo a embarcações russas

Com congelamento da situação, Moscou evita outra guerra, e Erdogan não perde mais o prestígio

tar a infiltração de militantes do EI (Estado Islâmico), de armas, de munições e de contrabando.

te suspensas. Mas os turcos teriam que se concentrar em buscar um discurso mais poderoso que simples pedidos de desculpas.

Seja como for, nenhum dos países ganha com a escalada da situação. Para a Rússia, mergulhada em uma crise econômica, isso seria um fardo para o orçamento federal, já que Moscou teria que bancar os custos de uma a meaça per ma nente de novos confrontos com forças aéreas estrangeiras. Além disso, qualquer coalizão na Síria falharia, e os países da Otan ver-se-iam obrigados a apoiar a Turquia. Para Ancara, a escalada também é ruim: cresce o descontentamento europeu com o comportamento turco e, em caso de novo conflito com a Rússia, a atitude em relação à T u rqu ia pode r ia mudar. Um aumento do número de refugiados também teria efeito negativo no país e no resto da Europa. Mas a reaprox imação entre Moscou e Ancara não parece estar próxima. Após sanções e declarações mordazes, qualquer passo para trás será visto como sinal de fraqueza. As contradições começam nos diferentes pontos de vista quanto ao conflito sírio. Assad no poder é uma prioridade para o Kremlin, enquanto sua queda é prioritária para Ancara. Porém, é preciso reconhecer que, mesmo com a dura retórica, nada é feito para minar o compromisso entre os países, e as sanções contra a Turquia têm caráter limitado. Será necessário ainda se chegar a um acordo com a Síria quanto à demarcação das rotas aéreas, mas Moscou não vê sentido em manter duas frentes em uma mesma guerra – uma aberta, contra o EI, e outra oculta, contra a Turquia. Erdogan também não pode dar as costas à situação se quiser manter o prestígio. Por isso, o cenário mais realista hoje ainda é do congelamento das relações.

Degelo Neste caso, mediados por algum vizinho (sabe-se de tentativas já realizadas por Azerbaijão e Cazaquistão), Ancara e Moscou manteriam contatos regulares, com a

Retomada Aqui, um encontro entre Pútin e Erdogan seria necessário. A partir disso, Moscou talvez pudesse suspender as sanções já impostas.

Aleksêi Tchesnokov é diretor do Centro para Políticas Atuais e foi vice-chefe de política interna da administração presidencial (2001 2008).

a restringir a entrada de refugiados sírios, mesmo expressando solidariedade às vítimas do EI (Estado Islâmico) ou do governo Assad. Muitos lamentam que as novas necessidades tenham levado à restrição da liberdade de circulação de pessoas entre os países-membros da UE. Um novo controle de fronteiras já foi restabelecido entre a França e a Itália, a Áustria e alguns vizinhos dos Bálcãs, e até Dinamarca e Suécia. Entre Rússia e ex-repúblicas soviéticas, um projeto equivalente ao da zona Schengen também vinha sendo levado a cabo: a União Econôm ic a E u r a s i át ic a , que pressupunha a livre circulação de produtos, capital e força de trabalho. Quando revelado, ainda em 2011, o projeto levou à ideia de que se circularia entre os países com tanta liberdade quanto durante a era soviética. Mas a Rússia já estabeleceu regimes de visto com dois membros da CEI (Comunidade dos Estados Independentes). Ainda em 1998, por iniciativa própria, o Turcomenistão instituiu um sistema de vistos com outras ex-repúblicas soviéticas; após conflitos com a Rússia, a Geórgia seguiu o exemplo em meados dos anos 2000. Moscou, por sua vez, restringiu a entrada de azeris, uzbeques e tadjiques, as três nacionalidades que mais migram para o país; enquanto os cidadãos do pequeno e pobre Quirguistão não viram condições muito melhores, mesmo com a entrada na União Econômica Eurasiática, em 2014. Assim, no quesito migração, a Rússia continua bastante europeia: atraente, mas, ao mesmo tempo, assustadora para os habitantes de suas “ex-províncias”, seduzindo e repelindo esses cidadãos. Aqui, mesmo a existência de uma língua comum significa tanto união, como inimizade, exatamente como no caso da Inglaterra, França e Portugal imperialistas.

Dmítri Babitch CIENTISTA POLÍTICO

os últimos anos, Rússia e União Europeia enfatizam suas diferenças, especialmente as de valores. Mas em pelo menos uma área nossos problemas e soluções são similares: a de migração e controle de fronteiras. O dilema dos refugiados ucranianos na Rússia não ficou sob o foco da mídia internacional como o drama dos sírios e africanos que têm chegado em grandes números à UE. Mas as situações são equiparáveis. Desde abril de 2014, 404 mil cidadãos ucranianos pediram asilo na Rússia e 265 mil solicitaram status de re-

N

Assim como a zona Schengen perdeu a livre circulação, União Econômica Eurasiática se esfacela sidentes, de acordo com o Serviço Federal de Migração da Rússia. Com capacidade limitada para absorver imigrantes, a Rússia está agora sobrecarregada pela entrada dos migrantes econômicos provenientes da Ásia Central e do Cáucaso. A ausência de barreira linguística e cultural é uma das razões para a absorção dos ucranianos do leste no país. Segundo o VTsIOM (Centro de Estudos de Opinião Pública), esses conseguiram encontrar moradia e trabalho com certa facilidade, e a atitude dos russos para com eles é, em geral, positiva. O fato de os ucranianos terem gozado, por um longo período, do direito de permanecer no país vizinho sem registro ou status de refugiado também colaborou na absorção. Mas, com a crise na imigração, a regalia foi cancelada não apenas a ucranianos, como a uzbeques e azeris. A posição do governo russo é muito semelhante à de governos europeus, que passam

Dmítri Babitch é jornalista e colunista da agência de notícias RIA Nôvosti.

COMO FICARIA MOSCOU SEM DILMA? Alexandre Massi CIENTISTA POLÍTICO

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Brasil dá importância real ao Brics, do qual é sócio-fundador e goza de igualdade de condições Isso derivou do acelerado processo de industrialização brasileiro a partir da década de 1960, pois antes o país exportava basicamente commodities: café, açúcar e outros.

E a Rússia? Nessas quatro orientações, onde se encaixa a relação atual com a Rússia? Em primeiro lu ga r, n a de promoç ão comercial.

As exportações brasileiras para a Rússia situam-se na faixa dos US$ 4 bilhões anuais, e os principais produtos enviados são carnes (bovina, suína e de frango), café, soja e d e r iv a d o s , a ç ú c a r e tabaco. A Rússia é uma das dez maiores economias do planeta, com potencial para absorver ainda mais produtos e serviços brasileiros. Empresas como a Rosneft (petróleo e gás) e a Miratorg (alimentos) também já investiram no Brasil, sendo ainda enorme o potencial de investimentos de outros grupos russos no país. Mas, além da promoção comercial, há o grupo dos Brics, que virou uma das prioridades da política externa do Brasil - e que inclui a Rússia. Ainda é cedo para saber se ele veio para ficar ou se é modismo com prazo de validade reduzido. Seja como for, o Brics reflete a transição de um mundo unipolar (centrado nos EUA) para o multipolar, em que alguns grandes países, in-

DMITRY DIVIN

o caso de um afastamento da presidente Di l ma Roussef f, quais seriam as consequências para o relacionamento Brasil-Rússia? A política externa brasileira passou a ter, a partir do Barão do Rio Branco (ministro das Relações Exteriores entre 1902 e 1912 e maior expoente da diplomacia brasileira), três orientações básicas: a política da boa vizinhança, a prioridade dada às relações com Washington - em um período histórico ainda sob a “Pax Britannica” no qual ainda não era evidente que o século 20 seria dominado pelos EUA - e o apoio ao primado do Direito Internacional sobre as relações de força. Nessa linha, o Brasil deu prioridade à Organização das Nações Unidas desde sua fundação em 1945, bem como à Organização Mundial do Co-

mércio (em sua formação inicial, em 1947, como GATT, ou “General Agreement on Tariffs and Trade”). Nas décadas de 1970 e, sobretudo, de 1980, uma quarta orientação básica foi adicionada à política externa brasileira: a promoção das exportações.

cluindo os Brics, deverão ter crescente influência nos assuntos regionais e globais. A importância que o Brasil confere ao Brics se deve, portanto, ao fato de se tratar do primeiro clube com protagonismo global do qual é sóciofundador e parceiro em igualdade de condições.

Isso não acontece, por exemplo, na ONU, onde o Brasil não é membro permanente do Conselho de Segurança. Tampouco no Fundo Monetário Internacional, onde o poder de voto do país é muito inferior ao das potências ocidentais, sobretudo os EUA. Dito isso, a pergunta inicial

deste artigo fica já encaminhada. A promoção comercial com a Rússia continuará, sem dúvida, em qualquer novo governo que venha, porventura, a assumir o Brasil. A prioridade dada aos Brics deve permanecer também, a não ser que a agenda do grupo passe a confrontar aberta-

mente os EUA - algo improvável, já que China e Índia têm parcerias econômicas essenciais com Washington. Por fim, as relações políticas com a Rússia sempre foram cordiais e positivas desde o Império, por exemplo, quando D. Pedro II visitou São Petersburgo, em 1876. Durante a Guerra Fria, o Brasil manteve-se relativamente neutro quanto à disputa Leste-Oeste e teve um diálogo fluido com Moscou. E nos últimos vinte anos de pós-Guerra Fria, o relacionamento político bilateral estreitou-se cada vez mais. Portanto, em caso de afastamento da atual presidente, substituída por seu vice, que já visitou Moscou diversas vezes, ou mesmo por algum político de oposição, a relação do Brasil com a Rússia deverá manter sua orientação atual, que historicamente veio sendo pautada por interesses de Estado. Alexandre Massi é professor de Relações Internacionais.

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Política e Sociedade

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Causa-efeito Península recebe energia russa desde o dia 4

Com corte de luz, Crimeia espera ‘baby boom’ ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA

Depois de semanas enfrentando apagões após ativistas ucranianos explodirem as torres que conduziam energia elétrica para a Crimeia, dois milhões de pessoas na península estão retomando sua rotina. “Em 2016, por causa dessa situação, simplesmente haverá uma explosão demográfica”, declarou à agência de notícias Interfax o chefe da administração do município de Ie v p at ór i a , A nd r ê i Filonov. Para lidar com o iminente “baby boom”, Filonov já solicitou ao primeiro-ministro da Crimeia, Serguêi Aksionov, verba extra para reformar a maternidade local.

Além de sabotagem em torres de energia, ucranianos cortaram água que península recebia do Dniepre Para muitos, porém, o significado da primeira ligação era apenas simbólico. Dos 500 MW de potência de que a Crimeia precisa (ela tem capacidade para produzir outros 500 MW), apenas 200 MW provêm da Rússia. Ainda não se divulgou se o contrato para recebimento de energia ucraniana pela península será renovado em 2016. De acordo com a agência

Sem mais apagão O Ministro da Energia da Rússia, Aleksandr Novak, informou que o fornecimento de energia à Crimeia já foi totalmente restabelecido. Agora, a península recebe eletricidade

No escuro Quando a rede de eletricidade da Crimeia ficou completamente paralisada, nas primeiras horas do dia 22 de novembro, a Ucrânia fornecia cerca de 80% da energia da Crimeia, seguindo acordo firmado com a Rússia. Assim, as autoridades se viram forçadas a fornecer energia somente a hospitais, enquanto os demais consumidores, inclusive clínicas, ficaram sujeitos a constantes apagões. A economia local chegou então a um impasse. Ligações de telefones celulares e sem fio, iluminação das ruas e gasolina tornaram-se escassos. O governo teve que transferir imediatamente um grande volume de geradores a diesel para a península e acelerar o desenvolvimento do cabo de eletricidade ligando Krasnodar à Crimeia.

Salvação chinesa A ligação ultramarina demandava a instalação de qua-

Administração de Ievpatoria solicitou verba extra para reforma de maternidade prevendo resultados do apagão para 2016

estimado em quase US$ 700 milhões. Consequentemente, a Rússia está trabalhando na resolução de todos esses problemas – mas não tão rápido qua nto os moradores gostariam. Além dos problemas energéticos, a Crimeia enfrenta falta de água após a Ucrânia bloquear as comportas do Canal da Crimeia do Norte, de onde a água do rio Dniepre era canalizada para a península. Desde então, Moscou pôde oferecer apenas soluções temporárias para a crise hídrica. A Crimeia consome cerca de dois bilhões de metros cúbicos de água por ano, dos quais 80% são usados na agricultura.

tro linhas de cabos no fundo do Estreito de Kerch, de 13,4 quilômetros cada. Mas os russos não produzem cabos desse comprimento, e muitos dos fornecedores estrangeiros rejeitaram a transação devido às sanções econômicas impostas após a integração da península pela Rússia, em março de 2014. O material finalmente acabou sendo adquirido da China. Mas o navio chinês chegou em Kerch apenas em 11 de outubro, e os trabalhos começaram uma semana depois. Além disso, a ligação implicou a construção de linhas de alta tensão e de novas subestações. O custo total do projeto está

Por onde a Crimeia recebe energia?

ALYONA REPKINA

GUEVORG MIRZAIAN

de notícias Tass, Novak afirmou que a Crimeia ganhará, até 2018, usinas geradoras com capacidade para produzir 940 MW.

ALEKSANDR RUMIN / TASS

tanto da Ucrânia, como da Rússia. A inauguração oficial, em 2 de dezembro, da ligação energética ultramarina com a Rússia continental, que atravessa o Estreito de Kerch, foi motivo de celebração para os habitantes locais. Além disso, na última terça-feira (15), o presidente russo Vladímir Pútin lançou a segunda linha de cabos, que deverá suprir, segundo Novak, de 80% a 100% da demanda da Crimeia.

Península passou a receber energia russa por cabos ultramarinos. Continuidade de contratos ucranianos em 2016 ainda não é confirmada.

Velho Oeste? Grupo terrorista se disse pronto a liderar levante na Tchetchênia e libertá-la do país, oferecendo US$ 5 milhões por seu presidente

Estado Islâmico representa ameaça ao país Com imams idosos, regiões muçulmanas da Rússia tornam-se alvo de líderes espirituais mais carismáticos e radicalizados.

Operações antiterroristas no Cáucaso se encerraram, mas ainda há insurgências

OPINIÃO PÚBLICA

Onde Rússia lutará contra EI?

ALEKSÊI TIMOFEITCHEV

ESTUDO REALIZADO PELO INSTITUTO DE PESQUISAS CENTRO LEVADA COM 1.600 ENTREVISTADOS, EM 46 REGIÕES RUSSAS, ENTRE 13 E 16 DE NOVEMBRO

GAZETA RUSSA

59% dos russos acreditam que, nos próximos 10 anos, as Forças Armadas da Rússia estarão em confronto com o Estado Islâmico no exterior, enquanto 33% não excluem a possibilidade de que os conflitos possam penetrar no território nacional.

© ALEKSEY FILIPPOV / RIA NOVOSTI

Na véspera dos atentados em Paris no mês passado, o EI (Estado Islâmico) publicou um vídeo em russo dizendo que “em breve, muito em breve” haveria “um mar de sangue”. Segundo analistas de defesa, o grupo representa uma ameaça real à Rússia, principalmente após a derrubada, ainda em 31 de outubro, de um avião comercial russo que levava turistas de Sharm-el-Sheikh, no Egito, para São Petersburgo. O ataque custou as vidas de 224 pessoas. Os primeiros indícios divulgados pelos serviços de segurança do Reino Unido sugeriam que o EI era o responsável, e posteriormente o grupo terrorista publicou fotografias de uma bomba em uma lata de refrigerante que teria sido usada para destruir o avião. Em 20 de novembro, outros seis cidadãos russos morre-

ram quando terroristas ligados ao grupo atacaram um hotel em Mali.

Ameaça interna Embora o EI tenha feito vítimas russas somente no exterior por enquanto, o país tem uma história turbulenta nas regiões internas predominantemente muçulmanas do sul. “A penetração do grupo em nosso território por essas áreas é muito possível”, diz o presi-

dente da Associação Internacional dos Veteranos do esquadrão antiterrorista Alpha, Serguêi Gontcharov. Os principais pontos fracos da Rússia estão no Cáucaso do Norte e nas fronteiras do sul com as ex-repúblicas soviéticas. Dentro do próprio país, há estimativas de que, dos 16,5 milhões de muçulmanos, o EI possa ter ganhado a simpatia de até meio mil h ão, de acor do com o

pesquisador do Centro Carnegie de Moscou, Aleksêi Malachenko. “Muitos desses se opõem ao uso do terrorismo pela organização, mas ainda a veem como uma espécie de democracia muçulmana que concede justiça social e igualdade”, explica Malachenko.

montam ainda ao século 18, e os conflitos mais recentes chegaram a um pico com a Primeira Guerra da Tchetchênia (1994-1996), após a região declarar independência da Rússia em 1991. Um cessar-fogo durou até 1999, quando se iniciou a Segunda Guerra da Tchetchênia. Em 2009, a Rússia encerrou oficialmente suas operações antiterroristas na região, embora certa insurgência tenha

Tchetchênia na mira As raízes da atual insatisfação no Cáucaso do Norte re-

persistido, sobretudo nas repúblicas da Tchetchênia, da Inguchétia e do Daguestão. Com diversos ataques terroristas realizados na Rússia a partir dos anos 2000 e atribuídos a radicais do Cáucaso do Norte, analistas passaram a relacioná-los, nesta nova fase extremista, com o EI. “O grupo proclamou estar pronto a liderar um levante na Tchetchênia e ‘libertá-la’ da Rússia - e, portanto, de [seu

presidente Ramzan] Kadirov. Eles ofereceram 5 milhões de dólares pela cabeça de Kadirov”, diz Malachenko.

Mesquitas dominadas Na reunião do Comitê Nacional Antiterrorista em outubro deste ano, o diretor do FSB (Serviço Federal de Segurança), Aleksandr Bortnikov, afirmou que a inteligência evitou pelo menos 20 ataques terroristas em 2015. Observadores acreditam que os esforços do órgão devam passar à localização de células terroristas e de centros de recrutamento, que se expandem para além do que se imaginava inicialmente. “Os islamistas ‘salafitas’ ou ‘wahhabitas’ estão explorando cada vez mais as fraquezas do Islã comum na Rússia, onde 75% dos imams têm mais de 70 anos de idade e estão por fora do mundo moderno. Clérigos jovens mais radicais e carismáticos, muitos formados em universidades do Oriente Médio, estão agora manobrando para dominar e s s a s m e s q u it a s”, d i z Malachenko.

Educação Seis áreas de estudos prioritárias já foram definidas

Intercâmbio será grátis em Rede Universitária do Brics GLEB FIÔDOROV GAZETA RUSSA

Criada em novembro de 2015, a Rede Universitária do Brics iniciará, no começo de 2017, seus primeiros programas de intercâmbio, que serão gratuitos para a lu no s d a s f ac u ld ade s participantes. As datas exatas de início dos intercâmbios serão determinadas em meados de 2016, durante a primeira conferência geral da rede. O evento acontecerá em

Iekaterinburgo, na UrFU (da sigla em russo, Universidade Federal dos Urais). Durante a conferência também serão definidas as instituições que farão parte da rede - na fase inicial, até 12 universidades de cada país. “A rede ajudará a aumentar a mobilidade acadêmica, principal recurso da educação moderna”, diz a diretora do Instituto de Educação da Escola Superior de Economia, Irina Abánkina. A mobilidade a que ela se refere é não apenas a estudantil, como também dos professores e de práticas. “Com o desenvolvimento econômico dos países do

Brics, podemos usar o potencial de cooperação e integração de programas das universidades dos países

Objetivo do projeto é aumentar mobilidade de estudantes, professores e práticas educacionais participantes para buscar novas soluções e a formação de equipes internacionais”, completa.

Coordenadora nos Urais A UrFU, em Iekaterinburgo, coordena as atividades das universidades russas na

criação da rede e abriga o Centro de Estudos do Brics, entidade que formulou a documentação russa da rede. “Na prática, a formação de especialistas com experiência intercultural garantirá a realização de projetos especializados dentro do próprio Brics. O primeiro desses é o Novo Banco de Desenvolvimento. Atualmente, existe uma grande demanda por profissionais com conhecimento prático de um país específico do Brics”, disse o vice-reitor para relações internacionais da UrFU, Maksim Khomiakov, à Gazeta Russa.

Áreas e financiamento

A UrFU (Universidade Federal dos Urais) foi fundada em 2011 e tem mais de 1.500 alunos estrangeiros. A instituição possui mais de 400 parcerias pelo mundo e, hoje, implementa cooperações com brasileiras como a UFMG, a UFRGS e a Unesp. A instituição figura no ranking das 10 melhores universidades russas e ocupa o 77º lugar no ranking QS BRICS.

REUTERS

Programas internacionais serão custeados pelos próprios países, que estudam possibilidade de conceder dois diplomas a participantes.

Urais no topo

“Estudos do Brics” é uma das áreas prioritárias do programa

Inicialmente, a rede cobrirá programas de mestrado e doutorado em seis áreas prioritárias: energia, TI (tecnologia da informação) e segurança da informação, estudos do Brics, ecologia e alterações climáticas, recursos hídricos e combate à poluição, e economia. As instituições escolhidas deverão receber apoio dos próprios países para o finan-

ciamento dos intercâmbios dentro da Rede Universitária do Brics. No caso da Rússia, o orçamento estatal cobrirá determinadas vagas para estudantes da rede. Assim, os intercâmbios serão gratuitos aos alunos e, para concorrer às vagas, eles terão que se inscrever em cursos de pós-graduação das universidades partici-

pantes da rede nas áreas prioritárias pré-definidas. Ao concluir o intercâmbio, o aluno receberá diploma da universidade em que concluir oficialmente o curso e um certificado da Rede Universitária do Brics. Mas ainda se considera a possibilidade de concessão de diplomas de ambas as universidades cursadas nos Brics, além do certificado da rede.


Economia e Negócios

RÚSSIA O melhor da Gazeta Russa gazetarussa.com.br

Festas de Réveillon sofrerão cortes no país

© SERGEY PYATAKOV / RIA NOVOSTI

Queda geral

Venda de passagens aéreas para o exteior também caiu

Russos gastam R$ 930 com festa, 7% menos que em 2014

comerciantes - mas não sem uma queda na receita. A rede de eletrônicos Sviásnoi, por exemplo, explica que, com a queda dos salários, as pessoas continuaram comprando, mas optaram por artigos mais baratos. Assim, a perspectiva é que, neste ano, os russos continuem gastões - mas com os salários e o poder de compra reduzidos.

© EVGENIYA NOVOZHENINA / RIA NOVOSTI

Em 2015, o volume de negócios deve ser bem menor em diversos setores do mercado russo e europeu, em comparação ao ano anterior. A queda brusca do rublo há um ano, em meados de dezembro, levou os russos a fazerem compras antecipadas para evitar o aumento dos preços. Uma das principais lojas de produtos eletrônicos do país, a M. Vídeo, observou uma alta de 73% em suas vendas no último mês de 2014. Assim, é difícil comparar a balança de 2014 com a deste ano. É improvável que tal fenômeno se repita, mas, apesar do câmbio continuar elevado, as pessoas se adaptam à situação e aos preços praticados. Prova disso é que a Black Friday russa foi declarada como um sucesso por muitos

ALYONA REPKINA

lher se os cortes serão feitos na ceia ou nos presentes. Um em cada três russos ainda considera efetuar cortes em ambos os tipos de gastos. Entre os respondentes da Delloite, 21% buscarão lojas populares, mais baratas, para as compras, contra os 8% de 2014. Além disso, 7% dos russos dizem que não darão nenhum presente neste ano, contra os 4% de 2014. “Não economizo no orçamento dos meus presentes. Gosto muito de presentear e em 2015 não haverá exceção: nada pode me impedir de gastar o que tenho, como sempre faço, nem mesmo a crise econômica”, diz, sorrindo, o professor moscovita Serguêi, de 25 anos. Para tanto, porém, Serguêi terá que cortar em outros gastos, como os de viagens. Em 2013, ele passou o Réveillon em Praga, enquanto em 2014 foi para Murmansk, no norte da Rússia, fotografar a aurora boreal - apesar dos planos iniciais de vê-la na Islândia. “Neste ano, fico em Moscou. Ou vou para a Carélia, perto da fronteira com a Finlândia, mas isso sairá um pouco mais caro”, diz. Ele não é o único a economizar nesse aspecto. Segundo a operadora de turismo

OneTwoTrip, a venda de passagens aéreas para aproveitar as festas de Ano Novo em destinos no exterior caiu 30%. Os mais afetados foram os voos para a Alemanha e para a Áustria - que caíram, respectivamente, 68% e 60%. As sanções econômicas e o medo de atentados também levaram os russos a renunciar a dois de seus destinos mais populares, o Egito e a Turquia, nas celebrações de fim de ano.

MIKHAIL MORDASOV

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7% não darão presentes em 2015, contra os 4% de 2014

Antes, o clima de investimentos no país não era muito melhor, mas havia crescimento... A falta de crescimento começou nos últimos 10 anos e foi marcada pelo caso Yukos [com a prisão, em 2003, do proprietário da petrolífera, Mikhail Khodorkóvski]. A economia não é algo maleável. Ela depende não só das decisões de alguns investidores, mas de milhares de empresários. Por isso, casos como o da Yukos afetam permanentemente a economia. Depois da crise financeira mundial, o país sofreu o efeito dominó entre 2010 e 2011, e só em 2012 voltamos aos níveis pré-crise. Desde aí, não houve mais crescimento.

RAIO-X

ENTREVISTA SERGUÊI ALEKSÁCHENKO

IDADE: 56

‘País precisa de clima de negócios e imprensa livre’ MIKHAIL BOLÔTIN ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA

Economistas passaram a falar em um degelo nas relações entre a Rússia e o Ocidente. A crise poderia dar uma virada? Não vejo nenhuma aproximação. Há, sim, um limitado diálogo sobre a Síria, mas os problemas são muito mais profundos e, enquanto os Acordos de Minsk não forem implementados por completo, as sanções serão mantidas.

Quais seriam as consequências de um levantamento das sanções para a economia russa? Os principais empecilhos à economia russa não são as sanções, mas os baixos preços do petróleo. Ainda em 2013, quando eles subiam e não havia sanções, verificou-se um crescimento econômico total de 1,3%. As sanções à tecnologia energética praticamente não funcionam, porque recaem sobre a produção offshore, que quase não é rentável diante dos preços do petróleo. Já as financeiras, se fossem levantadas, poderiam melhorar, em curto prazo, a situação. Mas, sem investimento,

ECONOMIA PELA MGU

Ex-ministro das Finanças (19931995) e ex-vice-presidente do Banco Central da Rússia (19951998), Serguêi Aleksáchenko foi nomeado especialista-sênior da Comissão de Reformas Econômicas do Conselho de Ministros da URSS em 1990, ainda aos 31 anos. Em 1991, passou a compor o conselho de diretores da União de Produção Científica da URSS, cargo que ocupou até 1993. Após o ministério e o Banco Central, fez parte de diversos outros conselhos diretores, mas deixou o país em 2013, quando se tornou pesquisador-sênior do Brookings Institution (EUA).

não é possível alcançar o crescimento em longo prazo. Há um ano, quando o rublo despencou, muitos falaram de uma derrocada da Rússia... Então, muitos fatores ao mesmo tempo: a queda dos preços do petróleo, a imposição de sanções e o pico do pagamento da dívida externa. Mas o papel dos mercados financeiros não deve ser supervalorizado, e a política competente do Banco Central acalmou a situação. A situação é ruim em todos os setores da economia russa? Existem grandes diferenças. A situação da indústria da de-

VALERY SHARIFULIN / TASS

Crítico atroz da integração da Crimeia pela Rússia, exministro das Finanças traça panorama econômico do país e elogia política do Banco Central em tempos de crise.

FORMAÇÃO: DOUTOR EM

fesa não poderia estar melhor, com uma carteira de encomendas que não para de crescer. O crescimento da produção industrial nos últimos meses se explica, em partes, por isso. O setor agrícola vai bem, e o sistema de subsídios agrícolas criado no início dos anos

2000 tem funcionado, na medida do possível. Graças a ele, a indústria tem crescido, em média, 2% ou 3% ao ano. Mas, claro, a proibição das importações também colaborou. Os setores primário e de transportes também se mantiveram estáveis porque a de-

A alta do petróleo ajudaria? Nossa dependência do petróleo é imensa, mas não deve ser supervalorizada. Se o preço subir para US$ 100/barril, a situação melhorará por um ano ou dois anos. Mas, na essência, nada muda. É preciso melhorar as condições para se fazer negócios no país, aumentar a segurança jurídica, a competição política e os veículos de imprensa independentes. Sem isso, a economia russa terá dificuldades para sair do buraco.

manda por matérias-primas provenientes da Rússia praticamente não diminuiu. O pior cenário está no mercado consumidor: no comércio, na indústria automobilística, em projetos de desenvolvimento e no setor imobiliário.

Esquema que enganou milhões de russos chega ao Brasil CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 1

Bitcoins Hoje, a empresa trabalha com Bitcoins, ou seja, criptomoedas que compõem um sistema de pagamentos on-line que não é intermediado por qualquer instituição financeira. E os chineses passaram a buscar tanto os Bitcoins para depositá-los na MMM, que o preço da moeda virtual aumentou consideravelmente. Em uma entrevista ao “Financial Times” neste ano, Mavródi revelou que a MMM China iniciou as atividades em abril de 2015 e confirmou

que o novo esquema aceita Bitcoins, entre outras moedas. Mas sua MMM Global trabalha exclusivamente com Bitcoins e, segundo o fundador, rende lucros de 100% ao mês a seus investidores.

Modernização Mavródi também mostra ter modernizado as técnicas para atrair novos investidores: além dos pop-ups na internet, a publicidade da MMM é complementada com declarações em vídeo no YouTube feitas pelos próprios participantes.

DIVULGAÇÃO

MMM Global, preferiu apostar em mercados mais distantes: países africanos, asiáticos e sul-americanos. Já na Europa, suas atividades foram rapidamente detectadas e suspensas. “As pirâmides de Mavródi são muito características: os pagamentos são feitos pelos participantes seguintes. As pirâmides diferem das bolhas especulativas porque não têm quaisquer ativos: são um esquema pu-

ramente criminoso, e Mavródi não esconde que seu empreendimento é uma pirâmide”, explica a professora de sociologia econômica da Escola Superior de Economia, Olga Kúzina. Ela acrescenta que são as promessas de lucros acima do mercado que atraem pessoas que desconhecem princípios básicos da economia. Chineses e sul-africanos se deixam levar por promessas de até 30% de lucro ao mês; indianos, de 60%; e malásios, de 100%.

Site brasileiro da MMM abre em pop-up de página de download

Os investidores que conseguem receber algum lucro com o esquema antes do colapso da pirâmide (o “restart”, na terminologia de Mavródi) agradecem ao destino e a Mavródi em muitas línguas, que podem ser conferidas em clipes curtos na internet. O uso do vídeo em si, porém,

não é novidade para a MMM e, ainda nos anos 1990, o esquema chegou a proporções tão impensáveis que passou a se valer de comerciais de TV com uma das atrizes mexicanas mais famosas da época, Veronika Castro, que era a paixão nacional russa com seu protagonismo na no-

Sibéria sem mitos nem rótulos gazetarussa.com.br/545205

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vela “Simplesmente Maria”, transmitida então no país. A genialidade - ou sorte de Mavródi naqueles anos ficou provada até durante sua primeira detenção relacionada às pirâmides, em 1994 - ele já havia passado dez dias na prisão em 1983 por “atividade empresarial ilegal”, quando foi pego produzindo cópias piratas de fitas VHS. Em agosto de 1994, porém, de dentro da prisão, o matemático russo registrou-se como candidato a deputado. Quando obteve o registro, em setembro, foi solto. Em outubro, foi eleito e abriu mão do salário e de todos os privilégios, deixando claro que buscava apenas imunidade parlamentar. Não compareceu a uma única plenária durante o ano em que ocupou o cargo.

ATÉ

2016


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