Altos dos Salgueiros - Primeiras Páginas

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... ela desenhou um arquejado riso de orvalho.


PRÓLOGO Era uma noite fria e nublada em Altos dos Salgueiros. O verão já tinha passado pela cidade e não voltaria tão cedo. Da rodoviária aos prédios habitacionais do complexo de Negromonte, uma névoa pálida se infiltrava em todos os cantos. Não era possível ver mais que cinquenta metros adiante de seu nariz, mas isso não deixava a noite menos agradável. Cristóvão gostava das noites mais frias e dos ventos mais cortantes; era o que mais adorava em sua cidade serrana. Ele nascera ali, dezoito anos antes, pelas mãos de uma parteira. Naquela época, as construções do único hospital da cidade ainda estavam sendo finalizadas e sua mãe estava com dores demais para descer a estrada até a capital. A parteira era uma mulher sem qualquer treinamento médico a não ser as coisas que ela aprendeu na vida e nas tradições de sua família. Sua mãe sempre lhe disse era impossível que aquela mulher tivesse tido algum filho, caso contrário não teria arrancado Cristóvão de seu útero com tanta maldade. Ele mesmo já tinha visto vídeos de um parto normal e não conseguia entender como as mulheres tinham feito aquilo durante tantas gerações. Já passava da meia-noite daquela terça-feira e Cristóvão caminhava vagarosamente na Avenida Montenegro, a única avenida da cidade, que cortava as principais ruas de Altos dos Salgueiros. Ele podia estar em casa, mas não havia muito o que se fazer por lá depois que ele ficou sozinho. Seu pai não vivia na cidade há alguns meses; ele não tinha nenhuma chance de emprego por ali e decidiu tentar a sorte na capital. Agora trabalhava como carteiro e seus horários não combinavam muito com os horários dos ônibus, então ele preferia ficar lá a semana inteira a ter que se preocupar em acordar duas horas antes do necessário para pegar o primeiro


ônibus, ou ter que dormir duas horas menos do que ele gostaria, por ter esperado o último. No mês passado, sua mãe decidiu que iria para lá também, porque Cristóvão sabia cuidar de si mesmo muito melhor do que o velho pai. Ela também tinha sofrido bastante com a falta de empregos, mas já tinha resolvido o problema fazendo bolos e doces para a vizinhança. Cristóvão já tinha se acostumado ao cheiro de massa crua e aos muitos ovos empilhados em sua casa, mas agora não tinha mais nada disso por lá. Na capital, sua mãe também fazia mais dinheiro do que ali, mas ainda não era muita coisa. Em Altos dos Salgueiros, ou se é muito rico, como os políticos e a família Montenegro, ou se é muito simples, como a opressiva maioria da cidade. Cristóvão atravessou a faixa de pedestres que cruzava a Rua do Comércio e lembrou-se que o aniversário de seu amigo Toni da faculdade estava chegando. A namorada do rapaz estava organizando uma festa surpresa que aconteceria na casa dele daqui a uma semana. Precisava comprar algum livro novo para dar de presente para ele. Toni dizia que lia mais de quinze livros por ano e tinha muito orgulho disso. Cristóvão não lia livro nenhum, então não sabia se isso já era motivo para ter orgulho. A névoa não deixava que ele visse nada muito bem, mas em meio ao frio da noite, ele conseguiu ouvir outros passos se aproximando, vindos da esquina da Avenida com a Rua Sul. Quando os sons ganharam uma imagem, ele só pode notar que estava diante de um homem que nunca tinha visto antes. O estranho estava notoriamente com frio, usava um casaco escuro de algodão grosso com um capuz. Mas o que Cristóvão mais notou nele não foram suas roupas, e sim a câmera que ele carregava nas mãos. – Olá, tudo bem? – disse o homem, ainda de longe. Era comum que as pessoas fossem simpáticas em Altos dos Salgueiros, especialmente as que não eram dali.


– Sim. – respondeu, tentando evitar parecer muito desconfortável. – O que você está fazendo sozinho a essa hora da noite por aqui? – o homem parou então de andar em sua direção, esperando que Cristóvão o alcançasse. Aquilo não era uma atitude tão comum assim. – Eu gosto da noite. – foi sincero, sem achar motivos para alarde. – Mesmo? – o estranho tinha um sorriso largo e um rosto simpático. Cristóvão teve certeza de que ele fazia muito sucesso com as meninas – Eu também sou muito fã da noite, prefiro passar uma noite inteira acordado vendo algum filme do que passar uma tarde na praia pegando sol. – Que bom. – achou educado dizer, enquanto passava pelo lado do homem. Ele tinha o rosto limpo e barbeado, mas os cabelos estavam cuidadosamente desgrenhados. Cristóvão entendeu que esse cara era um daqueles que gosta de fingir que não se importa com a aparência, só para que sua aparência chame mais atenção ainda, tentando parecer mais interessantes do que realmente são. Cristóvão geralmente não gostava desse tipo de gente. – E qual é seu nome? – aquilo pareceu tão invasivo quanto rude. – Porque você anda com uma câmera? – combateu, questionando quase tudo no comportamento do estranho. – A câmera? – ele riu, uma risada que não tinha muita alegria, mas que soava bem, como se ele estivesse acostumado a rir muito em sua vida – Isso é bobagem, é só um registro, eu gosto de lembrar as coisas que eu faço, as pessoas que eu conheço, para viver de novo quando eu sentir falta. – Então daqui a alguns meses você vai estar no seu computador pensando “Como era mesmo aquele garoto que eu encontrei na Avenida Montenegro?”, e aí vai apanhar seus vídeos, procurar um que vai ter meu nome e rever toda essa conversa, só porque você gosta de relembrar. Cristóvão falou tudo com muito abuso nos lábios. Até pensou que tinha sido mal educado e grosseiro com um homem que nunca lhe fez nada


de ruim. Sentiu-se mal logo em seguida; porém, quando o estranho riu outra vez, ele tornou a achar que o homem merecia aquilo. – Eu juro que é só por isso. – ele sorria, ainda sem alegria, de um modo que parecia como se estivesse zombando de sua cara – Achou estranho? – Muito. Continuou andando, com o tal homem ao seu lado, e aquela câmera esquisita grudada em seu rosto. Cristóvão tinha certeza de que não estava fazendo uma expressão de muitos amigos, mas o estranho não parecia disposto a parar de filmá-lo. – Mas você ainda não me disse. – o homem insistiu – Qual é seu nome? – Cris. – não gostava de se apresentar como Cristóvão. – Qual é o seu? – Me chamam de Júnior. Aquilo lhe deixou muito irritado. – Júnior? Eu conheço outros duzentos com o mesmo nome. O tal que dizia se chamar Júnior riu outra vez. Ele realmente gostava de rir e via graça em tudo que acontecia diante dele. Isso também não lhe agradava muito, ninguém tem motivos para rir tanto na vida, apenas os loucos. – Me fala Cris, o que você faz aqui pela cidade? Se não tentasse ser simpático, o estranho entenderia seu desagrado e iria embora. Isso se o homem tivesse bom senso e não estivesse fazendo aquilo para lhe irritar. Aliás, seria aquilo uma brincadeira? Haveria alguém por ali vendo tudo aquilo e rindo muito de seu comportamento? Decidiu falar sobre sua entediante vida, com a intenção de espantá-lo para longe de si. Não havia nada em sua vida que pudesse comprometê-lo. – Ando pelas ruas, estudo na Negromonte, cozinho quando tenho vontade, senão saio e procuro alguma coisa interessante para comer. E


você, Júnior, o que faz além de andar pelas ruas com uma câmera na cara de estranhos? – Eu sou muito chato. Acho que o que mais faço é isso. Cristóvão sentiu o gosto da mentira ao ouvir aquelas palavras. Só não conseguia entender o que o tal estranho estava tentando esconder. Afinal, quem era aquele homem? O que ele estava fazendo em Altos dos Salgueiros? A cidade não era conhecida por suas qualidades turísticas ou por sua arquitetura ou por suas belezas naturais. A melhor coisa para se ver na cidade eram os salgueiros. Enormes, com cascatas verdes que pendiam de seus galhos e quase beijavam as águas dos lagos que os cercavam. O tal Júnior não parecia o tipo de gente que visitaria uma cidade como aquela apenas para ver salgueiros. – Devem haver poucos estranhos na sua vida então. – Cristóvão respondeu, sem humor, mas isso não impediu o homem de rir mais um vez. – Cris, me fala, você já viu um daqueles programas em que as pessoas fazem coisas malucas para ganhar dinheiro? Como, nadar em gelatina ou responder um monte de perguntas íntimas? – Já devo ter visto. – estavam chegando ao meio daquele quarteirão, do outro lado da rua ele via a padaria Pão de Amor, o restaurante Nakayama, de comida japonesa e a pizzaria Giovanni. Sua mãe vendia bolos e tortas para todos eles, mas na maioria das vezes eram os próprios funcionários quem comiam tudo. Ele adoraria uma das tortas de sua mãe agora. – Não gosto muito. O estranho não mostrou nem um pouco de desânimo com aquilo. – Então – ele disse, passando para a frente de Cristóvão e agora andando de costas. Ele teria rido muito se o homem caísse para trás em algum instante – você parece um cara legal, eu quero te fazer uma oferta. Você faz alguma coisa que eu te pedir e eu te dou dinheiro por isso. – Não, obrigado. – queria que aquilo acabasse logo.


– Tem certeza? Eu não estou mentindo. Quer ver? O homem puxou do bolso direito de sua calça um bolo espesso de dinheiro. As cédulas tinham várias cores, ele podia ver. Dourado claro, rosado escuro, e o belo azul, todas rígidas e ainda com aquele cheiro de novas. Em toda sua vida, Cristóvão nunca tinha visto tanto dinheiro na sua frente. Sentiu um calafrio estranho passear por sua coluna e voltou a olhar para o homem, ainda fingindo que a câmera não estava em sua mão. – Acredita em mim? – ele sorria, intensamente. Aquele sorriso largo naquele rosto que parecia tão simpático. Era só a risada que era irritante nele, em geral, ele só devia ser um homem normal com um hábito duvidoso de filmar pessoas que ele não conhece – Posso te dar mil se você atender um pedido meu. – Acho melhor não, obrigado. – manteve sua opinião. – Tem certeza? – o estranho disse, mais alto ainda – Eu não desisto fácil assim. Cristóvão olhou outra vez para o bolo de dinheiro diante dele. Era enorme. Não conseguia entender como um homem daquele tinha conseguido juntar tanto na vida e agora estava simplesmente querendo lhe oferecer, com tão pouco esforço. Tinha algo de estranho naquilo, mas tanto dinheiro assim não aparece na sua frente todos os dias. – O que você quer? – precisava saber, se não estava recusando uma oferta perfeitamente razoável de ganhar dinheiro. O homem riu, como se tudo aquilo fosse uma piada muito divertida e só Cristóvão estivesse se recusando a entendê-la. – Quero comprar sua cueca. Aquilo fez Cris rir como um menino. – Minha cueca, por mil? – sentia o ar frio entrando por sua boca enquanto ele fingia não notar a câmera em seu rosto – Está mentindo. – Não, eu não estou. É verdade, quero só comprar sua cueca.


– Você sabe que ela está usada, não sabe? – continuou, se divertindo. – Sim, e eu quero ela assim mesmo. Cristóvão parou de andar enfim. Observou como pôde o rosto daquele homem. Ele era mais velho, com certeza, mas tinha o porte atlético e não falava como se fosse um qualquer. Por um instante, Cristóvão pensou que ele devia ter estudado em algum lugar, tirado boas notas, escolhido alguma profissão em que ele era muito bom e agora estava tão bem sucedido que podia comprar cuecas usadas de rapazes estranhos no meio da rua. Olhou outra vez para o monte de dinheiro. Se tivesse má índole, poderia pegar aquilo e sair correndo. Mas fazia tempo que ele não corria, e agora estava um pouco enferrujado; era possível que o tal Júnior lhe alcançasse. Mil por uma cueca. Porque não? – Eu não estou vendo nenhum lugar aberto aqui, mas tem um banheiro no posto de gasolina, eu vou passar lá... – Não, não, não, por favor. Quero que tire aqui, quero filmar e guardar entre as minhas lembranças. – No meio da rua? – não entendeu. – Sim, por favor. – o homem sorria muito, ele realmente queria aquilo. – Por mil. – Quer que eu abaixe minhas calças no meio da rua? – Eu não estou vendo ninguém aqui, você está? – Mas eu vou ficar pelado na sua frente. – deixou claro seu protesto. – Vai ser só por uns segundinhos. – ele falava como se tivesse sede, fome ou desespero – Vamos, Cris, eu só quero comprar sua cueca. Você já tirou sua cueca várias vezes antes, não deve ser difícil. O homem era algum pervertido com muito dinheiro. Pervertidos fazem qualquer coisa para conseguir o que precisam, ele sempre ouvira falar isso. O estranho estava se agitando, nervoso. Ele sabia que tinha o que queria ao seu alcance, mas ainda não em suas mãos.


– Se é assim, quero os mil agora. – afirmou, ciente de estar no controle daquela situação. – Sem problemas – o homem disse, passando o polegar entre as cédulas e contando. Cem, cem, cem, cem, cem, cem, cem, cinquenta, cinquenta, cinquenta, cinquenta, cinquenta, cinquenta. Dobrou o bolo com o resto dos dedos e ofereceu o dinheiro a Cristóvão, como se não fosse nada, como se ele tivesse acabado de comprar uma torta de maçã de sua mãe. Cristóvão apanhou o dinheiro e guardou no bolso de sua calça cargo. A noite estava fria e nublada. Os ventos que passavam por seu rosto estavam gelados e pareciam estar interessados no que acontecia naquela calçada. No meio da Avenida Montenegro, entre a Rua do Comércio e a Rua Sul, estavam Cristóvão e um homem que ele não se lembrava de ter visto antes em sua vida. O botão da calça se soltou fácil, assim como o zíper que desceu mais rápido do que nunca em suas mãos. Ele sentiu suas coxas se arrepiarem de frio quando a calça desceu dois dedos e então tremeram um pouco quando seus joelhos estavam descobertos. Tinha se esquecido de tirar os tênis e se atrapalhou um pouco para passar a calça por eles. Aquilo sim estava demorando, se alguém aparecesse, se alguém o visse ali, o que pensariam? As pessoas o conheciam naquela cidade, sabiam quem eram seus pais e a história de como ele veio ao mundo. As calças passaram pela primeira perna tirando boa parte de seu equilíbrio. – Isso, mais devagar, mais devagar. – dizia o homem que supostamente se chamava Júnior, um nome que tão comum quanto os salgueiros de Altos dos Salgueiros – Vamos, Cris. A segunda perna passou com mais rigidez ainda, e ele precisou se apoiar na parede da loja de roupas antigas de Tia Luísa. Teve medo que a gentil senhora aparecesse na janela de sua casa, no andar de cima da loja.


Os mais velhos tem sono leve e pouco sono. Não era difícil que ela se despertasse se ouvisse algum barulho. Achou-se mais ridículo que nunca quando viu que estava segurando uma calça cáqui nas mãos e usando uma blusa de lã fina com mangas longas, um par de meias brancas, um tênis de corrida e uma cueca colorida, com personagens de jogos de sua adolescência. Aquilo era horrível, mas por mil, valeria a pena. No dia seguinte ele nem se lembraria do rosto do homem e poderia comprar uma passagem de ônibus para visitar seus pais na capital, ou pediria na internet algum novo jogo de computador; já tinha zerado todos os seus. Talvez convidasse os meninos da turma para comemorar o aniversário de Toni por sua conta, ou então iria à loja de roupas de Negromonte para comprar cuecas novas. Ele teria uma a menos dentro de alguns instantes. Lembrou-se de tirar os sapatos, mas quase se arrependeu porque as meias não contiveram o frio do concreto quando ele pôs os pés outra vez no chão. Olhou para todos os lados. A névoa tinha se tornado um pouco mais densa e ele um pouco mais gelado, por dentro e por fora. Não teve coragem de olhar para a câmera, mas sentia as mãos de Júnior direcionando o aparelho em sua direção. Abaixou a cueca o mais rápido que pode. Manteve-se abaixado para voltar a passar as calças pelos pés e então as subiu quase de uma só vez. – Ah, mas você nem me deixou ver direito. – protestou o tal Júnior, com mais sarcasmo do que frustração em suas palavras. – Acho que nem tive tempo de pegar a imagem. – Mil pela cueca – Cristóvão respondeu, perfeitamente esclarecido – Aqui está a cueca. Júnior apanhou a peça de roupa e por um instante Cris pensou que ele fosse cheirá-la. Se tivesse feito, ele teria saído correndo para o outro lado, mesmo que tivesse que descer a estrada a pé até o dia seguinte. Mas ao


invés disso, ele apenas a guardou em seu outro bolso, o que não estava cheio de dinheiro novo e perfumado. – Está bem, está bem. Agora, me fala: o que você está disposto a fazer por três mil?

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Os dedos percorriam as teclas do teclado como nadadores experientes percorrem uma piscina. Não era necessário olhar para lugar algum, apenas guiar-se pelos instintos que a prática tinha lhe garantido. O vídeo novo tinha demorado bastante para carregar, mas a história que o acompanhava já estava quase pronta. Tinha sido um conto até divertido de escrever, apesar de não tê-lo vivido. “E descubra até onde vai sua teimosia”, escreveu, sentindo os nós de seus dedos começando a doer. Tinha que se lembrar de ver um médico sobre aquilo, mas nunca tinha tempo para sair de casa. Publicar postagem. Esperou alguns segundos e viu a miniatura de vídeo que surgiu na página principal de seu site. Era a imagem de um rapaz alto e esguio, com cabelos escuros andando na Praça da Serra, no centro da cidade Firmamento, alguns quilômetros montanha acima. Um homem de cerca de quarenta anos e seu cachorro passeavam ao fundo enquanto duas mulheres vinham no sentido oposto com sacolas de compras. Diggo preferia essas imagens, assim seus assinantes saberiam que tudo começava mesmo em um lugar público. Isso aumentava a curiosidade de todos eles.


Assim que a postagem estava na web, seu celular vibrou e tocou sinos, avisando sobre uma nova postagem em seu domínio. Em algum lugar do país, seu amigo Sam tinha recebido o mesmo aviso e em breve estaria muito orgulhoso de saber que ele estava sendo visto no ar outra vez. Sam gostava muito de se ver na câmera, mas Diggo não o culpava por isso. O homem era mesmo digno de ser um pouco narcisista. Até hoje, ele não conheceu a criatura viva que fosse capaz de lhe negar alguma coisa, por mais estúpida ou arriscada que fosse. Olhou ao seu redor. O apartamento estava um belo caos. Todos os seis pratos que ele tinha estavam na pia, esperando por mãos que os lavassem, ou pelo menos água que amolecesse as crostas de comida. As tigelas de cereal e os copos de café também estavam por ali, aguardando um tratamento apropriado. Quatro caixas de pizza estavam empilhadas ao lado do lixo da cozinha. Duas delas foram dessa semana, uma da semana passada e a última, ele não fazia ideia de como tinha chegado ali. Oito embalagens artesanalmente industrializadas do restaurante Nakayama também descansavam ao seu lado, mas ele tinha que limpá-las e empilhá-las no armário. Elas eram boas demais para jogar fora. Em seu quarto, metade de seu guarda-roupa estava jogado no cesto de roupas sujas enquanto a outra metade parecia estar distribuída entre a cama e a poltrona. Ele sinceramente não se lembrava de ter colocado nada daquilo por ali, mas se era seu quarto, ele devia ter feito. A sala era o lugar menos caótico. Ele quase não visitava o sofá, que permanecia perfeitamente organizado com suas mantas quentes e as almofadas costuradas com retalhos pelas mãos da senhora Tânia da Rua dos Sorrisos. Ao lado dele estava o piano; uma peça antiga que ele nunca se atrevera a encostar. Titi era quem se sentava ali para tocá-lo algumas vezes. Agora ele estava abandonado como uma relíquia empoeirada. A televisão permanecia encostada na parede porque ninguém nunca se importava em


ligá-la, a não ser que quisessem recriar o clima de um cinema caro da capital. As portas corrediças que davam acesso à larga varanda estavam cheias de marcas de dedo. Todos eram dedos dele, mas ele não sabia por que teria aberto aquelas portas se não gostava tanto da varanda. Diggo se entendia bem em tudo aquilo, mas quando Titi regressasse de viagem ele teria que aguentar muito falatório sobre sua bagunça e sua capacidade de viver em chiqueiros. Sua colega de quarto viajara três semanas antes para tirar fotos das paisagens e dos visitantes de Firmamento. Depois que tivesse esgotado sua inspiração do mês, ela voltaria para casa e para sua sala vermelha no andar de cima. Com as imagens prontas e impressas, ela venderia as mais “idiotas” para qualquer agência que pudesse se interessar. As que ela realmente gostasse, seguiriam para a Galeria Mar, um estabelecimento artístico de grande renome na capital e todas as cidades que a cercavam. Altos dos Salgueiros era uma cidade intermediária entre a efervescência da capital e a calmaria paradisíaca de Firmamento. Nenhum turista subia a montanha com o intuito de ficar em Altos dos Salgueiros por vontade própria. Quem andava por ali eram os naturais da cidade e os poucos que ficavam presos quando os ônibus tinham algum problema mecânico. Ao todo, a cidade tinha dezenove mil, duzentos e oitenta e cinco habitantes. Era até uma população alta, considerando a fraqueza de atrativos do lugar. Titi tinha família na cidade, assim como ele tivera, muito tempo antes. Mas ela foi uma filha caçula rebelde que fugiu de casa e foi viver a vida da capital. Já era uma estranha no ninho quando pensou em voltar para a cidade, por isso nunca tentou se reaproximar de ninguém, mas falava sempre coisas boas de sua mãe e coisas irritadas de seu irmão mais velho. Diggo decidiu organizar um pouco tudo aquilo. Amontoou as roupas que pareciam mais limpas, todas em cima da poltrona. Pensou em dobrá-


las, mas quando tentou arrumar a primeira camiseta notou que seus dedos não estavam preparados para aquilo. Preferiu deixar para depois. Colocou as roupas sujas na máquina de lavar, com o cuidado de deixar separadas a calça jeans de azul mais escuro que ele tinha e a blusa branca de lã que o cobria até os punhos. Precisava usá-las com suas safras. Juntou os sacos de lixo do banheiro, da cozinha e do quarto, e empilhou todos em cima das caixas de pizza. Olhou para a louça e pensou em lavá-la, mas logo percebeu que estava sentindo fome. Não havia sentido em lavar nada se ele sujaria mais daqui a pouco. Foi então tomar banho. Não se lembrava de qual tinha sido a última vez que ele saíra de casa, ou a última vez que tinha entrado embaixo de um chuveiro. A água caiu quente sobre seus ombros e ele notou o quanto eles estavam tensos. Titi faria uma massagem neles, caso ela estivesse por ali. A idade começava a afetá-lo e ele não estava acostumado com isso ainda. Não só seus ombros e seus dedos, mas sua coluna, seus joelhos e sua memória não eram mais como eles costumavam ser. Não faltava muito para que ele pudesse ser chamado de “coroa”. Sua barba que antigamente era um emaranhado de pêlos castanhos estava começando a ser invadida por fios prateados, mesmo quando estava curta. Preferia manter o rosto sempre barbeado agora, para esconder seus anos. Ainda queria preservar sua idade por mais algum tempo, até que fosse inevitável. Sem ninguém em casa para vê-lo, saiu do chuveiro como veio ao mundo, imerso apenas na fumaça da água quente e revigorante. Altos dos Salgueiros tinha várias faltas e defeitos, mas a internet e a água eram impecáveis. Demorou para que encontrasse alguma toalha, porque a maioria delas estava na máquina de lavar. Teve que ir ao quarto de Titi. Diggo não gostava de fazer isso porque ela sempre sabia quando alguém tinha estado ali, mesmo que fosse um


passarinho. Apanhou uma tolha felpuda e vermelha, tão confortável que ele quase saiu na rua enrolado apenas com ela. Vestiu as roupas menos amassadas que conseguiu apanhar. Voltou ao computador, verificou seus emails. Sam tinha lhe mandado uma mensagem dizendo que o vídeo tinha ficado muito bom e lhe agradecendo. Uma agência de turismo mandara mensagens promocionais e uma loja de roupas estava lhe alertando sobre um desconto especial no seu mês de aniversário. Olhou o relógio no canto da tela no mesmo instante. 13h49. 14/06. Tenho trinta e quatro anos há dez minutos. Apanhou a carteira e verificou seus documentos e cartões. Pegou a mochila preta e desceu as escadas do prédio sem grandes empolgações. Ele e Titi moravam na Vila Meridião, quase nos limites da parte urbanizada da cidade. Em perfeito acordo, eles habitavam o quarto andar de um prédio com cinco níveis e cada um tinha uma parte do quinto andar para atividades em que o outro não podia ou devia se intrometer. Lá ela tinha seu estúdio com sala vermelha e ele tinha um quarto muito mais confortável que o seu, com frigobar, uma mesa pequena de madeira, um aparelho de som cujas luzes alternavam de acordo com a música e uma larga varanda voltada para a vista da serra. Vila Meridião era uma espécie de conjunto habitacional reservado. Ao todo, doze ruas se cruzavam formando os quarteirões silenciosos, cheios de casas, mas com apenas quatro prédios. Havia uma praça no centro de tudo, com alguns brinquedos e uma quadra aberta, mas não moravam muitas crianças por ali e quase ninguém a usava. Os moradores não se falavam, não se conheciam e sequer se viam nas ruas. Não havia lugar mais calmo em meio aquela cidade tranquila. O único estorvo dali era o preço abusivo, mas Diggo deixara de se importar com isso muito tempo atrás. O seu prédio era o Austral, o último de todos, ao extremo de tudo. Mais perfeito impossível.


Em geral, ele preferia sair a pé, mas hoje não queria se demorar muito então foi de carro. Na garagem encontrou o seu veículo. Era um modelo do mesmo ano, com um design arrojado, aros em formato de estrela que brilhavam quase tanto quanto o sol, teto solar, direção hidráulica, bancos de couro, farol e painel de lead. Não era um carro qualquer, mas apesar de agora ter meios para isso, Diggo nunca teria gastado tanto em um meio de transporte. Sam tinha lhe dado o carro de presente alguns meses atrás; o site tinha atingido a marca de dois milhões de assinantes e isso era algo para ser celebrado. Se dependesse de sua vontade, teria tirado férias em alguma ilha, onde ele não visse nada além de mar, areia e água de coco. Mas Sam pensava mais à frente e lhe deu o carro para facilitar a credibilidade com as próximas safras. Pessoas podem ser muito desconfiadas em cidades pequenas, especialmente se elas nunca lhe viram antes. Um carro como aqueles garantia algum nível de encantamento sem esforço. Justamente por isso, Diggo não sairia com ele agora. Titi não gostava de dirigir até a capital e seu carro velho estava bem abastecido na vaga ao lado. Aquele carro devia ter doze anos ou mais, mas ainda andava com uma competência que muitos playboys invejariam. Não tinha muito a ver com a dona, mas Diggo já tinha se acostumado a vê-la dentro dele. Em pouco tempo estava na Rua Sul, uma rua tranquila que era calcada de pedras cinza e cercada por salgueiros que pareciam conversar lentamente enquanto o vento batia em seus galhos e nos ramos que pendiam deles. Em alguns minutos já estava dobrando na esquina com a Avenida Montenegro e estacionando à frente da Pão de Amor. Quando Titi estava em casa, ele sempre acordava com o cheiro de pão fresco à mesa. Quando ela partia, ele só sentia o aroma dos pães do Padeiro Jorge quando passava por ali. Era o cheiro que mais lhe dava fome em toda a vida.


Pegou a mochila, correu para Nakayama e fez o seu convencional pedido. Duas porções de sushi tradicional e um temaki de salmão com cream-cheese. Tudo que o cheiro do pão despertava em seu estômago, a culinária japonesa saciava sem deixar vestígios. Comeu tudo ali mesmo, porque não tinha mais espaço algum para as embalagens do restaurante em sua casa. Enquanto engolia algum dos sushis, pensou que podia ter lavado a louça afinal de contas. Quando pagou e olhou em sua carteira, notou que precisaria tirar dinheiro do banco. Hoje era um ótimo dia para uma safra e ele estava devendo três para o site. Sam agia com muito mais velocidade do que ele, de um modo até incomodante. Mas Sam vivia de capital em capital, sempre em um lugar novo, sempre dizendo que estava de férias, sempre aproveitando um pouco mais a vida. Diggo não queria fazer tudo isso e nem saberia como. A economia oscilante de Altos dos Salgueiros era seu porto-seguro, era com ela que ele contava quando estava com uma câmera na mão e os bolsos cheios de dinheiro vivo. Quando encontrasse outra cidade com pessoas tão necessitadas de dinheiro, se mudaria para lá. Até esse dia, continuaria lutando por seu lugar ao sol ali mesmo. Deixou o carro onde estava e subiu a Avenida. Havia certo movimento de carros, indo e vindo pela rua, o que não era muito normal quando ele estava fora de casa. Olhou para cima. O relógio da torre da igreja indicava 14h35. Agora fazia sentido. Todos os dias, às quatorze horas as crianças e adolescentes que estudavam serra acima eram liberadas de seus deveres escolares. Se ele se esforçasse, conseguia ver dentro dos carros alguns dos estudantes usando suas fardas em preto e azul. Negromonte é um complexo de construções, tão ostentoso quanto opulento, construído na região mais alta da cidade. Sua extensão era quatro vezes o tamanho de Vila Meridião ou talvez mais que isso. Lá funcionam: um centro de ensino que acompanha os alunos desde a pré-escola até o


último ano de ensino médio; uma faculdade com cerca de trinta cursos bem qualificados, frequentada por vários alunos da capital e de Firmamento, além dos naturais de Altos dos Salgueiros; um complexo desportivo, com piscina, pista de corrida e quadras cobertas; um hospital-escola; um núcleo de treinamento para policiais; uma academia de ginástica; um pequeno centro de compras; um restaurante onde os cozinheiros são estudantes de culinária e os famosos prédios habitacionais, onde famílias vivem algumas famílias mais simples que trabalham no complexo e muitos dos alunos que vêm de longe. Sem aviso, freios cantaram logo antes de um estrondo pesado. Mulheres começaram a gritar com medo e as que andavam com seus filhos correram para a primeira parede que viram. No outro extremo da Avenida, no cruzamento com a Rua Norte, um caminhão de verduras colidiu com um ônibus de turistas que estava passando. O caminhão estava com a parte frontal completamente amassada e muita fumaça saía por debaixo de seu capô. O ônibus tinha sofrido um grande impacto, mas ainda resistia e ninguém parecia ter se ferido. Só seria impossível que todos os passageiros alcançassem seu destino. A primeira pessoa que ele avistou foi o motorista do ônibus. Um homem de meia idade, com a barriga volumosa, que parecia tão irritado quanto estarrecido ao seguir em direção ao outro carro. Diggo ouvia algumas pessoas ligando para a emergência enquanto muitos outros superavam o susto e corriam rumo ao acidente, curiosos para ver o que tinha acontecido. Ele não era esse tipo de gente que se vê atraído pela tragédia. Até onde ele sabia, o motorista do caminhão já estava mais que morto ou quase lá. Teria conseguido afastar os maus acontecidos de seus pensamentos se o banco não ficasse algumas quadras acima, na esquina da Rua Sorte. Tinha que ir lá de qualquer jeito. Precisava de pelo menos dez mil para as próximas safras. Os atendentes já lhe conheciam e sabiam que seus pedidos


eram sempre elevados. Quando ele entrou, a gerente já pediu que um de seus bancários viesse lhe ajudar. Pediu para ver sua conta antes e descobriu que seu saldo estava consideravelmente maior do que o esperado. Aqueles dois milhões de assinantes estavam fazendo maravilhas para suas perspectivas de vida. Pediu por quinze mil e encaixou tudo em sua mochila preta. Sempre pensava que alguém podia querer lhe assaltar na saída, apesar disso ser raríssimo em Altos dos Salgueiros. Mas se precavia de qualquer forma. Usava muitos livros ali dentro para que a bolsa ficasse mais pesada e mais difícil de ser levada. Policiais sempre rondavam a Avenida durante as manhãs e tardes. Ele teria tempo suficiente para reaver qualquer de suas posses se isso acontecesse algum dia. Do lado de fora outra vez, avistou a banca de revistas do velho Borges. Aquele era um bom senhor, que se vestia com calças de linho, blusa social e uma boina todos os dias. O jeito com que o velho vendedor falava com todos os transeuntes, como se fossem seus filhos e netos, sempre lhe agradou. Por isso, sempre que estava por ali passava para comprar alguma coisa, fosse jornal, revista ou até um gibi de criança, com a desculpa que presentearia algum de seus sobrinhos. Atravessar a rua nunca foi tão difícil, com uma porção de carros parados de ambos os lados da Rua Norte, impedindo completamente o tráfego na Avenida Montenegro. Ninguém entrava ou saía da cidade enquanto os veículos não fossem removidos de lá. Agora Diggo já conseguia ver alguns dos passageiros do lado de fora do ônibus. Poucos deles tinham algum sinal de perturbação com aquilo tudo, mas todos tagarelavam como matracas e contavam suas versões da história para qualquer um que estivesse disposto a ouvir. Ele se sentiu fortunado por não ter sido assaltado hoje, porque todos os policiais estavam naquela quadra, meio trabalhando, meio agindo como qualquer outro curioso.


Chegou por trás da banca e cumprimentou o velho Borges, que estava tão imerso na tragédia quanto qualquer outro dos seres humanos que estavam naquela rua. O senhor não chegou a lhe ver ou ouvir, então Diggo já estava dando meia volta quando se viu finalmente paralisado. Seus ombros falavam poesias enquanto se agitavam e seus quadris cantavam melodias que nem os anjos saberiam reproduzir. Aquelas pernas longas estavam calçadas em um sapato verde, surrado como uma boneca de pano. Seus joelhos, pequenos montes de esmero tinham algumas cicatrizes, prova de que ela era real e não uma ilusão de seus olhos cansados. Ela tinha cabelos castanho-avermelhados, que vibraram no ar quando o vento da cidade decidiu acompanhá-la. Usava um sutiã preto que a blusa branca estampada não escondia muito. O tecido estava cortado de modo que a parte mais baixa de sua barriga aparecia sobre o short roxo, mas toda a lateral de seu corpo estava coberta por quedas leves do pano claro. As alças negras do sutiã se intercalavam com as tiras que prendiam a blusa ao seu corpo. Quando ela desacelerou o passo, seus dedos compridos dançaram nas teclas de seu celular, como os dedos de Diggo atravessavam as letras de seu teclado. – Olá, senhor. – ela disse ao velho Borges – Eu precisava de um isqueiro. O vendedor então afastou os olhos de cima da confusão na esquina. Como ele não teria notado uma mulher tão bela caminhando em sua direção? Quem conseguiria se fazer de cego para ela? Borges entrou na banca e apanhou um conjunto de isqueiros ainda embalados para que a moça pudesse fazer sua escolha. Diggo ficou ali parado ainda, tentando decifrá-la. – Vai querer alguma coisa, Rodrigo?


Já fazia tanto tempo que ele não usava seu nome verdadeiro que demorou para prestar atenção ao senhor à sua frente. Ainda estava enfeitiçado quando voltou os olhos para Borges outra vez. – Um jornal de hoje, por favor. – ele respondeu, distraído. A moça escolheu um isqueiro transparente, que deixava o fluido bailando dentro de seu recipiente. – Quanto é? – ela quis saber, com candura na voz. – Trinta centavos. Ela abriu a carteira, estampada com imagens de personagens de algum videogame da década de noventa. Remexeu entre cédulas de dois, cinco, dez, vinte. Procurou entre seus bolsos, até nos menores que tinha em seu short roxo. Não achou moeda alguma. Diggo ofereceu uma cédula de dois para pagar por seu jornal que custava um e cinquenta. – Pode pagar o isqueiro da moça também. – assegurou-se de que ela ouvisse. – Não precisa. – ela disse, seus olhos eram do azul mais belo. – Eu tenho aqui. – Não vai me fazer falta alguma. O velho Borges entregou-lhe o jornal e o troco em suas mãos e começou a destacar o isqueiro transparente de seu encaixe. – Foi muito gentil de sua parte. Muito obrigada, senhor. Diggo fingiu uma dor no peito. – Ai! Senhor?! Acho que meu coração vai parar. A moça achou divertido. – Tem algum problema com ser respeitado? – Tenho problema em ficar velho. – admitiu sem saber por quê. – Então salte logo da ponte no meio da estrada. – ela riu, inadvertidamente, lhe conquistando sem sequer saber – Todos nós estamos


ficando velhos. Todos nós caminhamos rumo ao fim. Se quer manter sua idade, morra jovem. Amou cada palavra de sua boca. – Não vai levar cigarros? – não sabia mais o que falar; o isqueiro era a única coisa que eles tinham em comum. E Diggo sequer gostava de fumantes. – Isso não é para mim. Eu odeio a fumaça. – ela disse, com uma careta divertida – É minha mãe quem está pedindo. Ficamos presas do outro lado da Rua Norte e agora não temos como voltar para casa até que os guardas comecem a liberar o trânsito. Ela fica muito nervosa em situações assim. Ela nem fuma direito, só inspira e sopra, mas o cigarro lhe ajuda a ficar calma. – Diga para ela fazer círculos com o dedão na palma da mão. O movimento relaxa muito também e assim você não precisa se incomodar com a fumaça. Ela sorriu e o encantou mais uma vez. – Dedão esquerdo na mão direita? – ela uniu as mãos e começou a massagear o centro da palma direita. – Pode fazer círculos menores – ele ousou tocar de leve em seus dedos. – Tem razão. – ela estava imersa dentro de si – É mesmo reconfortante. – VALENTINA! – soou uma voz feminina e estrondosa em algum lugar não muito distante. A moça tomou-se de espanto e olhou para longe. – Tenho que ir. – ela anunciou, guardando o isqueiro no bolso dos shorts curtos. – Valentina? – Diggo perguntou – É seu nome? – Desde que eu nasci. – era uma moça bem-humorada. – É lindo. – sentia-se envergonhado – Combina com você.


– VALENTINA! – a voz feminina gritou outra vez.


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