Revista Livro Zero numero 3 - Forum do Campo Lacaniano SP

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deste trabalho, qual seja: para que se faça um novo laço, será necessário um terceiro passo, que implica aquilo que cada um fará desta solidão em que um ato se sustenta. Dessa forma entendo aquilo que Lacan afirma no Discurso à EFP: “Minha solidão foi justamente aquilo a que renunciei ao fundar a Escola, e que tem ela a ver com aquela em que se sustenta o ato psicanalítico senão poder dispor de sua relação com esse ato?” (1970/2003, p. 267). Dispor da relação com o ato, a meu ver, articula-se justamente ao que Lacan proporá como invenção. Como diz D. Rabinovich: [...] no nível desse conjunto aberto que é alíngua, o inconsciente, surge algo que não se conhece, que não se cria, não se produz, porque o que se produz é objeto a, mas se inventa. Portanto, o que se inventa do lado do não-todo são sempre pedacinhos de saber sobre o real [...]. // São pedacinhos de saber que se desprenderam, por um lado, da própria análise e, por outro, de seu próprio ensino. A estes fragmentos de saber só resta inventar sob a forma de bem-dizer [...] (2000, p. 166).

Aqui nos encaminhamos para o final deste trabalho. Em 75, no Seminário 23, Lacan dirá que a psicanálise, ao ser bem-sucedida, prova que podemos prescindir do Nome-do-pai. Podemos, sobretudo, prescindir com a condição de nos servirmos dele (p. 132). Ora, de que maneira podemos então articular este terceiro passo do trabalho, que procura responder a respeito dessa “solidão não sem” alguns outros? Até aqui vimos que esta solidão é o que se escreve por excelência. Isto que se escreve ao longo de uma análise precipita fragmentos de saber, pedaços de real que têm um efeito feminizante, justamente por levarem o sujeito ao encontro com o Outro sexo, o Outro gozo, diante do qual, se inventa algo. Uma invenção que é da ordem da letra/carta de a-muro com a qual seguimos dispondo da relação com nosso ato de saída de uma análise. Assim entendo o que seria servir-se do nome do pai, ou saber-fazer com seu sinthoma. Se o amor é um dizer enquanto acontecimento, dizer entendido como ato, então me parece que a única via pela qual esse laço seja possível, é a da transmissão. Aí sim, podemos sustentar a solidão do fim não sem alguns outros. Pois de alguns outros precisamos para fazer passar aquilo que pudemos inventar, enquanto fragmentos de saber sobre o real. É só a partir daí que uma marca se faz, algo singular que permite encontrar uma

A solidão do fim. Não sem alguns outros

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