Livro: Antologia da Vida Corporativa

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ANTOLOGIA DA VIDA CORPORATIVA Histórias, reflexões, lendas e anedotas sobre o mundo empresarial

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Presidente do Sistema Fecomércio Sesc Senac PR Darci Piana Diretor Superintendente da Fecomércio PR Eduardo Luiz Gabardo Martins Coordenador Geral do Núcleo de Comunicação e Marketing Cesar Luiz Gonçalves Assessora de Comunicação do Sesc PR Rosane Guarise Projeto gráfico e capa Kristiane Foltran Revisão Sônia do Amaral Fecomércio PR Rua Visconde do Rio Branco, 931 – 6º andar CEP 80410-001 – Telefone: (41) 3883-4500 www.fecomerciopr.com.br

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DARCI PIANA E RUBENS FAVA

ANTOLOGIA DA VIDA CORPORATIVA Histórias, reflexões, lendas e anedotas sobre o mundo empresarial

1ª edição

CURITIBA 2022 5


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A meta é ser melhor que ontem, não melhor que ninguém!

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SUMÁRIO

Prefácio: O poder das histórias – Allan Costa

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01 – João Bomsenso 19 02 – Sou seu cliente

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03 – Bushidô – O caminho do guerreiro

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04 – Cenoura, ovo e café

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05 – É coisa de mulher

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06 – A tirania dos pontos fracos

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07 – O espetáculo dos monges

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08 – Vou mostrar quem manda

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09 – Lições da Disney

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10 – O gestor e o maestro

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11 – O conselho de Dona Coruja

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12 – As três cartas e a mudança

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13 – Alemanha – Um problema de gestão

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14 – Sucesso – A lição do velho burro

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15 – Papo virtual 73 16 – Código de conduta ética

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17 – As aparências enganam

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18 – A simplicidade do desejo do cliente

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19 – Ursos, onças e morangos

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20 – A lenda das três árvores

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21 – A arca de Noé da Silva

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22 – Jogos Olímpicos e os verdadeiros valores 97 23 – Parábola do conhecimento

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24 – Superando as expectativas

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25 – Sua empresa é assim?

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26 – Quanto vale uma vitória

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27 – O segredo de Joe

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28 – O fotógrafo 114 29 – Visão futura – A lição do menininho

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30 – A lição de Mané Tibiriçá

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31 – O exemplo do pianista

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32 – Onde está o seu talento?

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33 – Uma questão de escolha

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34 – Nada de novo 131 35 – O que Konosuke Matsushita nos ensina

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36 – O bolero de Ravel e a Administração

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37 – O diamante 145 38 – As pulgas 147 39 – Uma questão de reconhecimento

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40 – Uma questão de justiça

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41 – O caminho do bezerro

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42 – Otimista & Pessimista

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43 – Por favor, a chave

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44 – Papagaio decoreba 163 45 – Mais forte que o fracasso

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46 – Para onde ir? 169 47 – Não confie cegamente

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48 – O fim da gestão

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49 – Quanta informação? 178 50 – Dê um tempo para você

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51 – A difícil arte das novas ideias

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52 – Empresas e gestores Matrix

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53 – Falar e dizer 189 54 – Ah! Se eu fosse uma empresa

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55 – A ciência da gestão disruptiva

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56 – De quem é a culpa?

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57 – Índice de felicidade nas empresas

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58 – Clientes ou colaboradores?

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59 – A difícil arte de tomar decisões

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60 – Procura-se a motivação

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61 – As coisas nem sempre são o que parecem

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62 – A natureza e os negócios

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63 – É possível ser feliz no trabalho?

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64 – Tudo passará 231 65 – Diferenciar ou morrer

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66 – Cultura organizacional

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67 – A difícil arte do poder

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68 – Boas ideias – Como conseguir?

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69 – Competição: Ufa! Que dureza

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70 – A fantástica Mary Parker Follett

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71 – A eterna batalha pelo cliente

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72 – Desvendando a produtividade

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73 – Produtividade dando sentido à vida

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74 – Síndrome do super-herói vitimado

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75 – Líderes são mais eficazes que chefes

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76 – Equipe! Não Euquipe ou Nosquipe

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77 – Um tributo a Peter Drucker

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78 – A síndrome do poder

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79 – Consultoria eficiente

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80 – A evolução da Revolução

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81 – Os generais e a administração

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82 – Objetivo comum 330 83 – Inteligência artificial e o futuro do trabalho

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84 – Síndrome do Maséke

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Bibliografia 346



Darci Piana e Rubens Fava

O PODER DAS HISTÓRIAS Desde a mais tenra idade, as histórias (ou estórias, dependendo de sua origem e da criatividade de quem as conta) são, talvez, a principal conexão entre pais e filhos, principalmente na sagrada hora das crianças irem para a cama. Aliás, desde a mais tenra idade da própria humanidade, as histórias desempenham um papel determinante da nossa evolução como espécie. A origem das histórias tem sido há muito estudada, mas, de uma forma geral, é possível afirmar que sua fonte natural é a necessidade de explicar fatos e fenômenos da natureza que despertavam a atenção e o interesse dos nossos antepassados. Assim, a necessidade de transmitir impressões, crenças, dúvidas, comportamentos, costumes e a vida cotidiana fez com que o ser humano se tornasse o contador de história, por definição, permitindo, através da oralidade, o repasse de suas lendas, mitos e tradições, de geração em geração. Entretanto, o mundo evoluiu e, por breves espaços de tempo, o homem pareceu se distanciar das suas próprias origens e referências, inebriado pela magia das telas e do mundo virtual. Subitamente, parecia que a transmissão do conhecimento da humanidade passaria a ocorrer exclusivamente através das mídias digitais, apresentadas em telas interativas, coloridas, que fragmentam a informação em pequenos pedaços, mais adequados aos tempos de hiperdigitalização, hiperconexão e hiperestímulo da era da Internet. Felizmente, o poder das histórias mostra, a cada dia, o quanto nós, humanos, ainda precisamos – e continuaremos

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precisando – de bons contadores de histórias. Nada substitui a sabedoria das parábolas de um “causo” bem contado. Não há melhor forma de refletir sobre nossa mundana realidade do que as analogias construídas de maneira simples e genial em histórias, lendas e anedotas de todos os tipos. Não por acaso, vivemos o resgate da “contação de histórias” com palavras bonitas do jargão corporativo como o, agora na moda, Storytelling. Porque não há nada como uma boa história! E é exatamente isso que você, leitor, tem em mãos neste momento: um imprescindível livro de histórias! A Antologia do Mundo Corporativo, trazida a público por Darci Piana e Rubens Fava, é um autêntico manual de sobrevivência do mundo empresarial contemporâneo, baseado em deliciosas histórias, contos e lendas da vida corporativa. Descrevê-lo como de leitura obrigatória seria reduzir sua importância e relevância. Mais do que ser lida, essa é uma obra para ser consumida sempre e repetidamente. A cada uma das histórias, estórias, parábolas e fábulas, presentes em cada capítulo, o leitor é convidado a refletir sobre questões essenciais para qualquer gestor, de qualquer tipo de empresa, de qualquer porte. Temas como liderança, gestão de mudança, estratégia, gestão de times, planejamento e outros tantos desfilam pelas páginas deste livro com rara fluidez e simplicidade. Um manual de referência para buscar a palavra necessária para a próxima reunião com o time, para a conversa de feedback com o liderado, para inspirar a palestra de lançamento do novo produto. Enfim, o guia essencial de consulta para aquela ideia que não estamos encontrando e que estará lá, em meio a essa antologia, escondida entre uma história e outra aguardando para ser descoberta.

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Tenho argumentado com alguma frequência que o excesso de estímulo e conexão do mundo contemporâneo, não raro, nos torna cegos para o essencial. Perdemos com o tempo a capacidade de silenciar e refletir. Vivemos à velocidade da luz como se o que importa fosse sempre a próxima informação, a próxima notícia, a próxima manchete. Isso nos tem tornado, muitas vezes, cegos ao essencial, e essa é uma constatação extremamente preocupante. Precisamos recuperar a capacidade de silenciar. E, se nos faltassem razões para isso, você, caro leitor, tem em mãos neste momento um motivo mais do que perfeito para se permitir esse silenciar de reconexão: a oportunidade de mergulhar em um reencontro com histórias seculares que ensinam entretendo, que nos engrandecem enquanto nos divertem. Dizem as melhores histórias que se conselhos fossem bons seriam vendidos. Mas, mesmo contrariando a sabedoria popular, vou aqui me arriscar a te deixar um conselho: permitase silenciar apenas por alguns instantes e mergulhe no que você encontrará pela frente. Eu garanto que, de história em história, esse retorno à nossa essência humana trará dividendos, e, ao final, você provavelmente terá um largo sorriso em sua face e uma sensação de grata plenitude, apenas possível quando experienciamos momentos de silenciosa e introspectiva sabedoria. Foi exatamente assim que cheguei ao final deste livro. E eu tenho certeza de que acontecerá o mesmo com você.

Allan Costa é consultor, palestrante e especialista em inovação e disrupção empresarial.

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1 João Bomsenso

Em 1976, Gustavo Cirigliano publicou, na obra Juicio a la Escuela, uma história da qual podemos tirar lições interessantes. Conta ele que, certa vez, aconteceu um incêndio num bosque onde se encontravam alguns porcos, que foram assados pelo incêndio. Os homens, acostumados a comer carne crua, experimentaram os porcos assados e acharam deliciosos. Logo, toda vez que queriam carne assada incendiavam a floresta. O sistema foi desenvolvido e aperfeiçoado. Mas nem sempre as coisas iam bem: às vezes os animais ficavam queimados ou parcialmente crus; em outras, queimados de tal maneira que era impossível comê-los. Em razão das deficiências, aumentavam as queixas. Já era um clamor geral a necessidade de se reformar profundamente o sistema. Tanto assim que, todos os anos, realizavam-se congressos, seminários, conferências e jornadas para achar a solução. Mas parece que não acertavam o melhoramento do mecanismo, porque no ano seguinte 19


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repetiam-se os congressos, os seminários, as conferências e as jornadas. As causas do fracasso do sistema, segundo os especialistas, podiam ser atribuídas ou à indisciplina dos porcos, que não permaneciam onde deviam — no meio da floresta —, à inconstante natureza do fogo, difícil de controlar, a árvores excessivamente verdes, à umidade da terra ou ao serviço de informações meteorológicas, que não acertava o lugar, o momento e a quantidade de chuva. Ou... Como se vê, as causas eram difíceis de determinar porque, na verdade, o sistema para assar os porcos era muito complexo. As soluções que os congressos sugeriam eram, por exemplo, aplicar triangularmente o fogo de acordo com a velocidade do vento sul, soltar os porcos 15 minutos antes que o fogo alcançasse a floresta toda; outros diziam que era necessário instalar grandes ventiladores, que serviriam para orientar a direção do fogo e assim por diante. Poucos especialistas estavam de acordo entre si e cada um tinha investigações e dados para provar suas afirmações. Um dia, um investigador da categoria baixa, chamado João Bonsenso, falou que o problema era muito fácil de resolver. Tudo consistia, segundo ele, primeiro, em matar o porco escolhido, limpando e cortando adequadamente o animal e colocando-o, posteriormente, numa jaula metálica ou armação sobre brasas, até que o efeito do calor e não das 20


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chamas, o assasse ao ponto. Ciente, o diretor geral de Assamento mandou chamálo e perguntou que coisa esquisita ele andava falando por ali. Depois de ouvi-lo, disse-lhe: “O que o senhor fala faz sentido, mas apenas na teoria. Não vai dar certo na prática. Pior ainda, é impraticável. O que o senhor faria com os anemotécnicos, com os acendedores, com os especialistas, com a Comissão Redatora de Programas de Assados?”. João Bomsenso, perplexo, apenas respondeu: “não sei”. Diante disso o diretor geral continuou: “temos que melhorar o que temos e não mudar. Ao senhor falta sensatez, senso comum, bom senso; pare de ficar dando sugestão sobre um assunto que não lhe diz respeito, pois o senhor poderá trazer problemas para si. Eu falo pelo seu próprio bem, porque eu o compreendo, entendo seu posicionamento, mas o senhor sabe que pode encontrar outro superior menos compreensivo”. João Bonsenso, coitado, não falou um “A”. Sem despedir-se, meio assustado e atordoado, com a sensação de estar caminhando de cabeça para baixo, saiu e nunca mais ninguém o viu. Não se sabe para onde foi. Por isso é que, até hoje, é costume dizer que, na tarefa de reforma e melhoria do sistema, falta o bom senso.

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Se fizermos a seguinte pergunta “Qual é a qualidade que poucos possuem, mas que todos julgam possuir?”, a resposta mais óbvia será: bom senso. Faça uma pesquisa. Essa é uma das poucas questões da vida em que há unanimidade nas respostas. Mas, afinal, o que é um gestor de bom senso? É aquela pessoa que, ao necessitar tomar uma decisão em relação à determinada questão, sabe ponderar; isto é, tem habilidade para segmentá-la e atribuir pesos adequados a cada parte da questão em análise. Na avaliação de um problema, o gestor de bom senso enxerga a sua frente uma pizza fatiada. Cada fatia representa um ângulo do problema a ser analisado. E, assim, ele valoriza cada um dos ângulos e toma a decisão mais conveniente. O gestor de bom senso também tem consciência de que, uma vez tomada determinada decisão, terá que “trabalhar” os descontentes, pois, caso isso não seja feito, eles poderão influir negativamente no resultado da ação a ser executada. Utilizar o bom senso é uma das principais maneiras de tornar possível o impossível. Mas, às vezes, é necessário despedir e não utilizar o bom senso. Pode parecer paradoxal fazer tal afirmação. Acontece que não vivemos mais em um mundo em que as ocorrências seguem uma lógica linear. Conviver com paradoxos, agir muitas vezes de forma não lógica devem ser características básicas do gestor atual. 22


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O gestor que sempre segue a corrente simplesmente faz o que todos fazem. E, quando uma empresa faz o que todas fazem, ela não inova. E quem não inova não consegue tornar possível o impossível. Perceba que não escrevemos “não ter bom senso” e sim “não utilizar o bom senso” o que é diferente. A pessoa de bom senso precisa ter consciência de que, assim como em muitos momentos basta utilizar o bom senso, também existirão momentos em que não utilizá-lo é a melhor saída. É quando somos obrigados a nos desprender das normas, ignorá-las; enfim, é o momento em que se deve contrariar o bom senso. São situações de exceção, que confirmam a regra. Por exemplo: tornar possível o impossível é consequência da inovação. E a inovação é fruto da criatividade que, por sua vez, manifesta-se mais facilmente quando utilizamos certa irreverência, isto é, quando nos libertamos de normas e regras. Por isso é importante deixar o bom senso de lado se quisermos criar um ambiente de certa irreverência, se quisermos tornar possível o impossível. Atenção, embora possamos reprimir o bom senso para que a criatividade tenha espaço para aflorar e tornar possível o impossível, sempre devemos solicitá-lo quando precisamos colocar em ação as ideias inovadoras que nos ocorrem.

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2 Sou seu cliente

— Você é o... o... o... — Não, não, eu sou o seu cliente. Aquele que um dia você convenceu de que seu serviço era o melhor. Você disse até que eu, como cliente, era a pessoa mais importante no seu negócio. Parafraseando Sam Walton, garantiu que eu era tão poderoso que poderia demitir todos na sua empresa. Pois é! Fui demitido. Fui demitido por um tal de “péssimo atendimento” e por um cara chamado “desrespeito ao cliente”. Eles trabalham com você, não sei há quanto tempo, mas trabalham. Fui demitido quando vocês me deixaram mais de uma hora, isso mesmo, mais de uma hora esperando na linha. Como eu sou insistente e já que para vocês meu tempo não vale nada mesmo, esperei. Mas, vocês se superaram, foram muito além, simplesmente desligaram. Eu insisti, liguei de novo e mais uma vez esperei, esperei até o “senhor desrespeito” me atender e me dizer que 24


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a culpa não era minha, era do financeiro que não percebeu que minha fatura era de débito em conta e não constatou que o pagamento havia sido efetuado normalmente. Logo eu que durante mais de cinco anos como cliente não atrasei um dia sequer meu compromisso com vocês. O “senhor desrespeito” me disse que, apesar de tudo, o serviço seria desativado por uma semana, até que fosse constatado que realmente o pagamento havia sido feito. Pois é, meu amigo, eu sou insistente mesmo, atravessei a cidade e fui fazer uma visitinha a vocês. Fui recebido pelo senhor “mau atendimento”. Como ele consegue ser tão ineficiente e tão incompetente? Acho que vocês devem investir muito em capacitação e treinamento sobre como não atender um cliente. Até disse a ele que hoje estamos vivenciando a era das emoções, do olho no olho, do encantar o cliente, do ter, mais do que foco no cliente, ter foco no foco do cliente. Surpreso, ele me pediu que explicasse melhor. Quando eu disse que encantar o cliente nada mais é do que cumprir com suas obrigações e entregar o serviço acordado, ele me disse que o negócio dele não era encantar, mas surpreender. Perguntei a ele o que significava surpreender e ele no alto de sua arrogância me explicou: — É simples, é investir em um novo cliente para que 25


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ele venha e subestimar o velho cliente para que ele não venha. — Não venha? repeti assustado. É isso, estes caras acabam ficando exigentes demais ou bonzinhos demais. — O que você quer dizer com bonzinho demais? — É o cara que não reclama, paga em dia, nos obrigando a não cumprir o prometido, a cobrar por serviços antes não cobrados, aumentar o preço sem aviso prévio, transgredir a qualidade, fazer pouco caso de suas indagações e não se importar quando ele reclama de seus direitos. — Pode não reclamar, mas vai embora, argumentei. — Gostamos de viver perigosamente, afinal, sabemos como oferecer vantagens especiais para “roubar” os clientes de nossos parceiros, argumentou. Disse a ele que aprendi que você tem que investir no atendimento do seu atual cliente para mantê-lo e no novo para tê-lo, justificando que é muito mais caro conquistar um novo cliente do que manter o velho e que cada cliente insatisfeito custa o equivalente ao lucro dado por clientes satisfeitos. Ele me surpreendeu dizendo: — Cara, conheço bem minha empresa, nosso maior objetivo é o lucro, esse negócio de encantar cliente é coisa de marqueteiro. — Você não pode visar ao lucro, deve procurar atender 26


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as necessidades e desejos dos clientes e se possível superar suas expectativas, assim o lucro vem como consequência, argumentei mais uma vez. — Olha! Você não me convenceu o suficiente para conquistar minha confiança — disse ele. — Hei! Você inverteu tudo — reclamei. Quem tem que conquistar minha confiança é você. — Não vou mais perder tempo ouvindo seus argumentos. Não ofenda minha inteligência, se você errou peça desculpas — esbravejou ele. — Eu errei? — indaguei não acreditando — o cliente sou eu. — Desculpe, ex-cliente — disse ele. Saí raciocinando que erros acontecem e são compreensíveis em certas circunstâncias. Entendo que pode ser complexa a operação de atendimento ao cliente de uma empresa; no entanto, a concorrência está sempre batendo à minha porta e como cliente a decisão sempre será minha. Você pensa que me despediu quando na verdade você é que foi demitido, pois fui conquistado por um sujeito chamado “concorrente”.

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3 Bushidô: O caminho do guerreiro

Durante longos anos o Japão se enclausurou, fechando as portas para o mundo. Entre os anos de 1640 e 1792 nenhum japonês saiu do país e nenhum estrangeiro entrou. O confucionismo se tornou a religião oficial, da qual os shoguns tiravam os preceitos básicos para controlar o país. Esse isolamento perdurou até que, em 1853, com a invasão americana através da baía de Uraga, o Japão se viu forçado a abrir o comércio com outras nações. Foi um período de extrema turbulência, culminando com uma guerra civil e confrontos com países vizinhos, que só terminaram com a chamada Revolução Meiji, que mais do que restaurar o império e unificar o país, deu início ao processo de modernização do Japão. O sistema feudalista e dos samurais foram extintos, porém os valores da sociedade permaneceram. A filosofia da época era “espírito japonês, tecnologia ocidental”. Esse espírito japonês é um reflexo do espírito samurai. 28


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Na sociedade japonesa, esses guerreiros eram temidos pelo seu poder e destreza com a espada. Mas, apesar da violência associada a eles, ser um samurai exigia muito mais do que ter habilidade para decepar cabeças. Era preciso ter espírito puro para servir. Com um estilo de vida que combinava conduta irrepreensível, treinamento árduo e aperfeiçoamento constante, os samurais foram os unificadores do Japão e marcaram para sempre o modo de ver o mundo da sociedade nipônica. Para se tornar um grande samurai, espírito guerreiro e força de vontade eram valores essenciais, porém, somente isso não era suficiente. Era preciso seguir o bushidô, o código de conduta dos samurais. No início o bushidô era ensinado oralmente, de geração em geração, de mestre para discípulo. Segundo o bushidô, viver é mais do que estar preparado para a morte, é saber morrer. A virtude suprema do bushidô era a lealdade, levada a um nível supremo pelos samurais que dariam a própria vida pelo seu senhor. Esse ideal não caiu por terra e seu espírito faz parte ainda hoje da sociedade japonesa. O orgulho e as atitudes são muito importantes para os japoneses e, nas empresas, virtudes como lealdade são apreciadas e valorizadas. Bushidô tem sua origem em BUSHI que significa guerreiro e DO que significa caminho. O ideograma para 29


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Caminho, “DO” em japonês, exprime o conceito filosófico de “absoluto” que traz a ideia de origem, princípio e/ou essência de todas as coisas; logo, bushidô significa, literalmente, “caminho do guerreiro”. Trata-se de um código de honra não escrito, um modo de vida, uma espécie de bússola que fornecia a esses guerreiros o norte para viver e morrer com honra. Seus valores são atemporais, trazem uma clara noção entre certo e errado, acrescentando mais importância e ideal à vida das pessoas. Seguir o bushidô é dar ênfase aos sete princípios de: Coragem — um samurai deve possuir uma coragem heroica, que para eles não é cega: é inteligente e forte. Honra — um verdadeiro samurai só tem ouvidos para um único juiz e esse juiz é sua consciência. Lealdade — o samurai deve ser extremamente leal àqueles que estão sob os seus cuidados. Compaixão — um verdadeiro samurai ajuda os homens em qualquer oportunidade. Justiça — para o samurai não existem meios-tons nas questões que envolvem honestidade e justiça, só existe o certo ou o errado. Sabedoria — um guerreiro corajoso e sem estratégia falhará imediatamente, por isso deve manter a espada sempre afiada. Razão — um verdadeiro samurai não tem de “dar sua 30


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palavra”, ele tem de “prometer”. Para ele, falar e fazer são a mesma coisa. O bushidô tem sua origem nos conceitos do Budismo, do qual herdou o destemor pelo perigo e pela morte; do Xintoísmo, através do respeito e reverência aos antepassados; dos valores de lealdade e patriotismo e, por fim, na ética do Confucionismo. O bushidô serviu de base para todas as relações humanas durante anos. Dois séculos após o fim dos samurais como classe social, o bushidô ainda permanece vivo na cultura japonesa, levando o país a se especializar em superar tragédias, tanto as causadas pelo próprio homem, a exemplo do desastre da Segunda Guerra Mundial, os terremotos de Kobe, em janeiro de 1995, e o terremoto seguido de tsunami de Sendai, em março de 2011. Ainda hoje o bushidô faz parte do cotidiano da elite empresarial japonesa como código de ética para empresários e empregados japoneses. Enquanto isso, honra, lealdade e comprometimento entre empresas e empregados parecem fazer cada vez menos parte do léxico empresarial no Ocidente; o foco maior está na rentabilidade e no lucro e a máxima de que o fim justifica os meios parece imperar em muitas empresas. Os valores do bushidô podem servir de inspiração na busca pelo desapego aos vícios humanos e como referência para o mundo empresarial onde, embora a batalha do dia a dia 31


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pela sobrevivência tenha exigido cada vez mais das empresas e dos empregados, são meios importantes para construir uma visão diferente do mundo, das pessoas e do universo corporativo.

4 Cenoura, ovo e café?

Um jovem gerente foi se queixar ao velho diretor sobre sua vida e de como as coisas estavam tão difíceis para ele. Apesar de seu esforço parecia que as coisas não aconteciam e os objetivos se mostravam cada vez mais difíceis de serem alcançados. Ele já não sabia mais o que fazer e queria desistir. Estava cansado de lutar e combater. Tinha a impressão de que assim que um problema estava resolvido outro surgia. O velho diretor o convidou para ir até a cozinha do restaurante da empresa; lá chegando, encheu três panelas com água e colocou cada uma delas em fogo alto. 32


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Em uma, ele colocou cenouras, em outra, ovos e, na última, pó de café. Deixou que tudo fervesse, sem dizer uma palavra. O gerente deu um suspiro e esperou impacientemente, imaginando o que viria depois. Cerca de 20 minutos mais tarde, ele apagou as bocas de gás. Pescou as cenouras e as colocou em uma tigela. Retirou os ovos e os colocou em um prato. Então, pegou o café com uma concha e o colocou em uma jarra. Virando-se para o jovem gerente, perguntou: — O que você está vendo? — Cenouras, ovos e café — respondeu ele. O velho diretor tocou no braço do gerente, trazendo-o para mais perto e pediu para que ele experimentasse as cenouras. Ele obedeceu e notou que as cenouras estavam macias. O velho diretor, então, pediu que pegasse um ovo e o quebrasse. O jovem gerente obedeceu e depois de retirar a casca verificou que o ovo endurecera com a fervura. Finalmente, o velho diretor pediu que tomasse um gole do café. O gerente sorriu ao provar seu aroma delicioso. 33


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— O que isto significa? — indagou o jovem gerente. O velho diretor sorriu e explicou: — Tanto as cenouras, quanto os ovos e o café enfrentaram a mesma adversidade, a água fervendo, mas cada um reagiu de maneira diferente. Pegando uma cenoura disse: — A cenoura, que entrou forte, firme e inflexível, depois de ter sido submetida à água fervendo, amoleceu e se tornou frágil. Tomando um ovo na mão, continuou dizendo: — Os ovos, que se mostravam frágeis, com sua casca fina protegendo o líquido, depois de terem sido fervidos na água, seu interior se tornou rijo. Dirigindo seu olhar para o recipiente de café, disse: — O pó de café, contudo, é incomparável, depois de ter sido colocado na água fervente, o que ele fez? Ele mudou a água. Silenciou-se por um instante, esperando algum comentário de seu gerente, que não veio, então indagou: — Qual deles é você como gestor? Quando a adversidade bate a sua porta, como você responde? Você é como a cenoura que parece forte, mas, com os problemas e as adversidades murcha, torna-se frágil e perde sua força? O jovem gerente nada disse, apenas acompanhava 34


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as indagações do velho diretor que, apontando para os ovos, continuou: — Você, por acaso, é como o ovo, que começa com um coração maleável, mas, depois de algumas decepções por um resultado que não veio de acordo com o que planejou, se torna duro, intolerante, ríspido com seus colegas apesar de a casca parecer a mesma? O velho diretor aproximou-se da jarra tentando sentir o aroma do café, depois indagou: — Ou você é como o pó de café, capaz de transformar os problemas e as adversidades em oportunidades de buscar resultados melhores? Todos nós, gestores, somos responsáveis por nossa postura e por nossas ações diante dos inúmeros desafios corporativos. Agir como cenoura, ovo ou café, isso só depende de você.

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5 É coisa de mulher

As mulheres operárias de uma fábrica de tecidos de Nova York tinham uma jornada de 16 horas de trabalho árduo em condições sub-humanas. Apesar de executarem o mesmo tipo de trabalho dos homens, chegavam a receber apenas um terço do salário. Essas mulheres, mais do que operárias, foram ousadas demais ao reivindicarem melhores condições de trabalho. Pagaram caro pela ousadia. Foram trancadas e queimadas de forma desumana, transformando o dia 8 de março de 1857 num marco na luta pela dignidade e pelos justos direitos de serem tratadas com respeito e dignidade. É certo que muitos anos se passaram e as mulheres continuaram a não ter grande participação no quadro de funcionários das empresas. 36


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Hoje esse quadro mudou, mas, apesar de elas já terem conquistado bastante espaço no mundo corporativo, nós, homens, temos que admitir que ainda estamos longe do ideal. Infelizmente, em muitas empresas e para muitas mulheres qualquer pretensão de construir uma carreira acaba sendo totalmente aniquilada pelas atitudes machistas de alguns gestores. O fato é que as mulheres têm muito a dizer e têm muito a dar também, basta lhes dar oportunidade. O que as mulheres querem é tão importante quanto o que fazem. Não querem e não gostam de fazer negócio com quem seja condescendente com elas apenas pelo fato de serem do sexo oposto. Isso as incomoda, as faz discutir ou se defender. No mundo corporativo, as mulheres têm nos dado grandes lições de comportamento, atitude e competência. Por exemplo, é coisa de mulher sonhar em encontrar um jeito que possa ser aprendido e aplicado pelas pessoas e organizações com intuito de transformar o trabalho numa experiência que transcenda as ações diárias, no qual a motivação e o entusiasmo venham de dentro para fora naturalmente. Algo que gere comprometimento nas pessoas com a missão da empresa e, principalmente, com o bem-estar de seus pares.

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É coisa de mulher insistir que o homem comece a aumentar seu interesse pela ética e pelos valores humanos, entendendo que o indivíduo, assim como a organização, só é feliz quando tem suas dimensões corporal, racional, emocional e espiritual alimentadas. É coisa de mulher entender que sucesso se traduz em levar a felicidade aos outros, estar em paz, usufruir de conforto, ser querido, ser interessante, conhecer, experimentar e viver de forma ampla, vivendo em harmonia com valores que estão acima do simples ganho financeiro. É coisa de mulher buscar construir um novo tipo de profissional, que saiba aprender a aprender para se beneficiar das oportunidades oferecidas. Um profissional que saiba aprender a fazer para estar apto para enfrentar situações de mudança e agir sobre o meio; que saiba aprender a ser para desenvolver sua personalidade e responsabilidade social; que saiba aprender a viver junto para desenvolver a compreensão do outro e a percepção das interdependências. Um profissional que saiba aprender a desaprender para poder evoluir. É coisa de mulher acreditar que para se reencontrar o homem precisa repensar e desenvolver novas crenças, novas conexões e novas competências. É coisa de mulher estar em mil lugares de uma só vez e fazer mil papéis ao mesmo tempo. 38


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É coisa de mulher rever o significado da vida e rever o significado da vida na empresa. Enfim, contam os indianos que o deus Vishnu queria criar um ser diferente e complementar ao homem, então, tomou do junco a flexibilidade, das flores a beleza, do fogo o calor, do sol a alegria e das nuvens as lágrimas e assim criou a mulher, esse ser tão especial que os chineses sabiamente chamam de “a outra meta do céu”.

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6 A tirania dos pontos fracos

Cuidado com a crença de que o bom é o oposto do mau. O homem tem insistido há séculos em focar na culpa e no fracasso. Os médicos estudam as doenças para aprender sobre a saúde. Os psicólogos investigam a tristeza para aprender sobre a alegria. Os administradores têm encorajado suas empresas a identificar os fracassos para se tornarem fortes. É claro que culpas e fracassos merecem atenção e estudo, mas eles não nos direcionam e pouco revelam sobre os nossos pontos fortes. Devemos estar atentos sim e nunca jogar para debaixo do tapete nossos pontos fracos, mas para vencer temos que nos tornar peritos em localizar, descrever, praticar e refinar nossos pontos fortes. Nós somos biologicamente únicos e emocionalmente muitos. Isso significa que não existe nenhum ser humano igual ao outro e o mais importante disso é que todos têm talento. Existem quase oito bilhões de pessoas no mundo, logo, são quase oito bilhões de talentos, cada um com seus pontos fortes e pontos fracos. As empresas devem não somente 40


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se ajustar ao fato de que cada colaborador é diferente, mas também tirar proveito dessas diferenças. Devem ficar atentas às pistas dos talentos de cada colaborador e tratar cada pessoa de modo que seus talentos sejam transformados em genuínos pontos fortes. Como? Alterando o modo como seleciona, avalia, desenvolve e canaliza as carreiras de seu pessoal. O Gallup fez uma pesquisa para descobrir por que a maioria das empresas continua sendo ineficiente quando se trata de tirar proveito dos pontos fortes de seus colaboradores. A resposta foi: só 20% das pessoas que trabalham nas grandes organizações acham que usam seus pontos fortes todos os dias. A pesquisa detectou ainda que quanto mais tempo um colaborador permanece numa empresa, e quanto maior o seu cargo, mais acredita que seus pontos fortes não são valorizados suficientemente. O fato é que se dá pouca atenção aos pontos fortes dos colaboradores. Porém, as empresas empenham-se em minimizar seus pontos fracos. Denominam as áreas em que seus colaboradores são fracos de “lacunas de competências” ou “áreas de oportunidade” e os despacham para cursos e treinamentos a fim de que suas fraquezas sejam corrigidas. Em certas ocasiões essa abordagem é necessária. 41


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Por exemplo, se algum funcionário sempre hostiliza quem está a sua volta, algum treinamento de sensibilidade pode ajudar ou um curso de comunicação pode beneficiar quem seja competente, mas pouco articulado — no entanto, como ensina Marcus Buckingham e Donald Clifton, isso não é desenvolvimento, é controle de danos — e essa é uma estratégia muito pobre para elevar pessoas e organizações a um desempenho superior. Isso acontece porque as organizações se apoiam em duas premissas equivocadas: — Uma pessoa pode aprender a ser competente em quase tudo. Não é verdade, os talentos de cada pessoa são permanentes e únicos. — A maior oportunidade e o potencial de crescimento de cada pessoa estão nas áreas onde ela tem seu ponto mais fraco. Pelo contrário, o maior potencial de crescimento está nas áreas onde ela tem seu ponto mais forte. As empresas precisam entender que para mudar o foco dos pontos fracos para os pontos fortes é preciso mudar suas suposições sobre as pessoas, pois tudo deriva delas. Os gestores precisam procurar pelo talento em cada função, avaliar o desempenho de seus colaboradores em termos de resultados e não lhes impor estilos pré-determinados. 42


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Parafraseando Kirk Christiansen, o fundador da Lego, somente o melhor é suficientemente bom, e o melhor de cada pessoa não está em tentar melhorar seus pontos fracos e sim naquilo que ele sabe e pode fazer de melhor.

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7 O espetáculo dos monges

A física e filósofa Danah Zohar, em seu livro Capital Espiritual, conta um sonho que teve em uma de suas visitas ao Nepal. No sonho assistia a uma peça dividida em três atos. No primeiro ato, um grupo de monges cantava suas orações e seguia os rituais do budismo tibetano. A cena era extremamente organizada e transmitia paz e beleza, favorecendo a elevação do espírito. De repente, o teto começou a ruir, matando muitos monges. No segundo ato, os monges continuavam seguindo os mesmos rituais, mas eram homens velhos, cínicos e amargurados. Realizavam as cerimônias movidos pelo hábito e pelas aparências, e se comportavam de maneira cruel, até sádica, com os noviços que os auxiliavam. Esse ato não tinha vida e transmitia grande energia negativa. No terceiro ato, um grupo de monges muito jovens se preparava para empreender uma longa viagem. Alguns partiam a pé, outros cavalgavam iaques. Esses monges eram inocentes, até ingênuos, e não tinham muita certeza sobre a meta que pretendiam atingir, mas 44


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sabiam que era seu destino viajar e descobrir novos rituais para a sua ordem. Estavam se dirigindo para o nascer do sol, cheios de esperança e sentimento de aventura. Na verdade, o sonho era uma metáfora. Os monges pacíficos do primeiro ato, que realizavam seus rituais de maneira organizada, representavam uma época mais tradicional, uma época de crenças e valores bem específicos. Os monges cínicos do segundo ato representavam a era moderna, dominada pelo materialismo e pelos áridos princípios da mecânica newtoniana. Um mundo de amarguras, egocentrismo e até perversão. Os monges do terceiro ato representavam aqueles que estão empreendendo alguma jornada em busca de práticas e filosofias de vida capazes de acelerar nossa busca por um futuro mais significativo e sustentável. Para o sucesso dessa viagem no mundo real é mais do que necessária uma liderança diferenciada, alicerçada na riqueza, não na riqueza material, mas na riqueza de caráter, de talento ou riqueza no sentido de boa sorte. Uma liderança com base em uma riqueza com a qual podemos viver e que enriquece os mais profundos aspectos da vida. Uma riqueza que extraímos de nossos mais profundos 45


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valores e princípios. Como afirma Steve Farber, a liderança é sempre palpável e efêmera. Ela é intensamente pessoal e intrinsecamente assustadora, e exige que vivenciemos integralmente os ideais que abraçamos todos os dias de nossa vida, até e além do ponto do medo. Uma liderança que vive a angústia de passar pelo “Momento Ai Meu Deus”. “Momento Ai Meu Deus” é um indicador natural e intrínseco de que você está fazendo ou está prestes a fazer algo realmente significante, e está, com toda razão, morrendo de medo. Essa liderança necessita enfatizar quatro ações, como propõe Steve Farber e que ele chamou de LEAP: — Cultivar o amor (Love) por um causa, por um princípio, por seus clientes, pelos seus colaboradores, pelo futuro que vocês podem criar juntos, pela empresa. — Gerar energia (Energy), afinal, o líder é uma força propulsora para a ação de alguém que acredita nas pessoas e na capacidade de elas realizarem algo especial. — Inspirar ousadia (Audacity), para servir ao bem comum e não ao próprio ego. — Fornecer provas (Proof), demonstrando compromisso por meio da coerência entre as palavras e suas 46


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ações. Você deve estar pensando que amor e energia não são práticas de negócios “reais” e podem soar um tanto meloso. Você tem razão, porém, ao focar no seu trabalho, vai sentir o quanto ele é gratificante — dá para ter uma ideia consistente do que é o amor e a energia. A nossa proposta é que façamos parte do elenco dos monges do terceiro ato, nos aliarmos nessa busca por um futuro mais significativo e mais sustentável. Para isso precisamos começar a modificar a nós mesmos para, a partir daí, começarmos a mudar o mundo.

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8 Vou mostrar quem manda

Certa vez em uma empresa qualquer, em uma cidade qualquer, um novo diretor assumiu em substituição ao antigo, que havia implantado um modelo de gestão compartilhada, transparente e deixando a empresa em uma situação privilegiada em relação a seus concorrentes diretos. O novo administrador estava disposto a mostrar e impor um novo estilo de gestão. Certo dia, ao passar por um lugar qualquer dentro da empresa, deparou-se com um jovem trabalhador sentado no canto de uma parede, próximo a um grupo de trabalhadores que continuava fazendo seu trabalho. Era o local e o momento perfeito para demonstrar sua autoridade. Diante da curiosidade de todos, se aproximou do trabalhador que continuava sentado e indagou: — Quanto você recebe por mês, meu caro? O trabalhador sem se levantar apenas respondeu na maior tranquilidade. — Não sei por que essa pergunta, afinal de contas, 48


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esse é problema meu. O novo diretor ficou roxo de raiva e disse asperamente. — Não tenho que te dar satisfação e nem estou interessado em suas explicações, se atenha a responder apenas o que eu te perguntei. O jovem trabalhador sorriu e disse: — Tudo certo, eu ganho míseros 1.400 reais por mês. O diretor, percebendo que todos o olhavam com curiosidade e expectativa, sacou o talão de cheques e após preenchê-lo entregou ao jovem trabalhador dizendo: — Aqui está o seu salário do mês, agora caia fora. O jovem trabalhador sorriu e levantando-se disse: — Valeu, estou indo agora mesmo sacar essa grana no banco aqui ao lado. Quando o jovem trabalhador saiu, o novo diretor, voltando-se para o grupo de curiosos, disse em voz bem alta para que todos pudessem ouvi-lo: — Comigo será assim, quem manda nesta merda sou eu. Depois se aproximando de um dos curiosos indagou: — Pode me dizer o setor e a função daquele folgadinho? O jovem constrangido e diante do sorriso maroto de todos respondeu: 49


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— Na verdade, senhor, aquele jovem não trabalha aqui, ele apenas estava esperando o troco da pizza que ele entregou para nosso gerente. Conclusão: para se sobressair nos negócios é necessário ser notado por todos, mas pelos motivos certos. Stephen Covey ensina em seu quinto hábito que o líder tem que procurar primeiro compreender, depois ser compreendido. Ser um bom ouvinte é uma habilidade em qualquer relacionamento, principalmente para aqueles que estão assumindo uma nova função na empresa. O autocontrole e a autodisciplina são os fundamentos do bom relacionamento com as pessoas. A primeira grande tarefa de quem assume uma nova gestão é fazer o máximo para criar uma sinergia. Quando as pessoas se juntam, o todo é maior do que a soma das partes e grandes insights e resultados que não foram analisados anteriormente são alcançados. Todos os relacionamentos crescem quando há compreensão, confiança e cooperação. Valorizar as pessoas é o segredo do sucesso para qualquer líder. Max De Pree diz que a arte da liderança consiste em liberar as pessoas para fazerem o que se exige delas, da forma mais efetiva e humana possível. 50


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Para De Pree, quando pensamos em líderes e na variedade de dons que as pessoas trazem para as empresas, constatamos que a arte da liderança consiste em polir, liberar e possibilitar esses dons. Logo, a primeira responsabilidade de um líder é definir a realidade, a última é dizer muito obrigado. Entre as duas, o líder deve tornar-se um servo e um devedor e não um ditador de regras e defensor da autoridade hierárquica. É certo que as pessoas são induzidas pelas sugestões das outras pessoas que a cercam, aliás, Robert Cialdini chama isso de confirmação social e nosso personagem fictício da história acima parece comprovar essa afirmação. Lembrando Peter Drucker, um homem jamais deve ser indicado para um cargo de gerência se sua visão se concentra nas fraquezas das pessoas, e não em suas forças; portanto, valorize as pessoas e trate todos com dignidade, somente assim você terá sucesso em sua nova empreitada.

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9 As lições da Disney

Quando vamos a Orlando, nos EUA, por mais que não seja o foco, não tem como não adentrar o palco de luzes brilhantes do show business onde, de repente, você se vê na primeira fila para assistir a poderosas performances de uma empresa que é exemplo de competência. O sucesso da Disney é incontestável. Anualmente 93 milhões de pessoas de diversos países visitam os seis parques temáticos da Disneyworld, na Flórida, sempre satisfeitos com a organização e o atendimento. O resultado é que mais de 70% dos visitantes retornam. Os bastidores da Disney revelam estratégias que fazem dela uma das empresas mais poderosas e rentáveis do mundo. Muito temos a aprender com ela, ensinamentos simples e aparentemente óbvios, mas que fazem a diferença. Aprendemos com a Disney que toda vez que um cliente entra em contato ela pode criar valor. Aprendemos que um concorrente não é somente o banco do outro lado da cidade, a distribuidora de veículos na mesma rua ou no município vizinho; ele é qualquer um 52


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com quem o cliente trave contato e tente comparar com a sua empresa, mesmo que seja o pipoqueiro do outro lado da esquina. Somos seres humanos fazendo negócios de trocas com outros seres humanos; nesse sentido, a tecnologia existente não nos pode afastar do objetivo final deste jogo: “apoderar-se da mente e do bolso do cliente”. Talvez isso soe um tanto medíocre, mas, em última análise, essa é a realidade de um mercado competitivo. Como fazer isso? Com percepção para realizar o que emociona o cliente. A tecnologia agrega e facilita, mas não substitui a necessidade fundamental do ser humano de se sentir amado e prestigiado. Apenas facilitar a vida do cliente não gera fidelidade. A fidelidade está diretamente ligada à segurança, à confiança, ao fato de sentir-se especial, condições adquiridas por meio do relacionamento emocional, pessoas lidando com pessoas, otimizando tempo e esforços em trocas de necessidade e valores. O resultado é o que uma organização precisa gerar para assegurar a manutenção no seu ambiente. Uma empresa necessita gerar valores superiores aos insumos que utiliza, agregando tecnologia através de seus processos. Valor é um conceito relativo que só tem sentido num contexto de clientes, porque quem julga se uma empresa gera valor é o ambiente, o mercado, onde estão todos seus clientes. 53


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Quando falamos em cliente estamos considerando o conceito amplo, isto é, todos os consumidores, empregados, investidores, aqueles que de alguma maneira relacionam-se com a organização. Sabemos que o valor de uma empresa está cada vez mais condicionado a bens intangíveis, como o relacionamento com as pessoas, uma vez que os bens tangíveis estão cada vez mais parecidos entre si. Um produto tem metade tangível e a outra metade intangível; a maior decisão de compra está na metade intangível; logo, todo o empenho do marketing deve ir muito além dos 4P’s, produto, preço, ponto e promoção. Ele deve envolver a auréola da percepção, ou seja, adquirir conhecimento sobre seus clientes, descobrir suas necessidades e valores e, principalmente, tratá-los como gente. Não basta posicionar o produto, deve prestar atenção em todos os contatos da marca, administrados através dos bens intangíveis: eles são imperceptíveis como atos isolados, mas extremamente nítidos quando avaliados através dos cinco sentidos de cada consumidor. Os clientes sempre esperam que a empresa gerencie o relacionamento com eles. Sabem que geram um volume enorme de informações e esperam que essas informações sejam efetivamente usadas para melhorar o atendimento. Para todos os apaixonados e conhecedores dos heróis Disney e para aqueles, grandes e pequenos, que adoram o 54


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Mickey e seus amigos, e se divertem com suas aventuras, prestar atenção no que eles fazem para manter-se entre as empresas mais lucrativas do mundo também é uma maneira de aprender se divertindo.

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10 O gestor e o maestro

Na abertura de um evento de gestão foi usada como modelo uma orquestra, fazendo-se analogias entre o papel do gestor e o do maestro da orquestra. Um indivíduo da plateia foi chamado ao palco para dirigir a orquestra; depois de seu desempenho exemplar, perguntaram a ele como se sentiu. A resposta foi simples e verdadeira: “dirigir uma orquestra é fácil, dirigir inúmeras orquestras ao mesmo tempo no dia a dia de uma empresa é muito mais difícil”. Alguns dias depois desse evento, tivemos acesso a uma entrevista de um dos mais importantes pensadores da atualidade, Henry Mintzberg. Para nossa surpresa, ele fazia uma provocação, dizendo que um dos mitos do mundo da gestão é a metáfora que compara o gestor a um maestro. Para Mintzberg, comparar a ação de um maestro de uma orquestra — que indica com um movimento de sua mão a entrada de diferentes músicos — com o gestor, achando que basta fazer um gesto para que o departamento de marketing 56


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realize suas campanhas ou o departamento financeiro faça sua parte e todos trabalhem em harmonia, é um mito, pois a realidade no mundo corporativo é outra. Assim como na gestão, os músicos são contratados pela capacidade técnica e pela competência com que dominam seus instrumentos. Diferente da gestão, o músico não é avaliado e/ ou demitido por seu comportamento. O que pode levá-lo a ser demitido da orquestra é sua baixa capacidade técnica, incompatível com as exigências musicais. Logo, se visão de negócio, espírito de equipe, construção de relacionamentos e inteligência emocional são pontos essenciais na avaliação de um colaborador, por que muitas empresas se preocupam mais com a capacidade técnica no momento da contratação? Por que a educação de um indivíduo é voltada para o desenvolvimento de competências técnicas e na maioria das vezes ela deixa de lado as competências comportamentais? E por que, no mundo corporativo, as pessoas são contratadas por sua competência técnica e demitidas pelo seu comportamento? Não estamos afirmando que não é importante a capacidade técnica de um profissional, estamos dizendo que o segredo do sucesso de um gestor é a capacidade de equilibrar competência técnica com a competência comportamental de seus colaboradores. 57


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Estamos dizendo que o gestor moderno deve ter capacidade técnica apurada em sua área de atuação, mas também é necessário que tenha capacidade de se relacionar, capacidade de iniciativa, de resolver conflitos, capacidade de evangelizar posturas, criando discípulos e práticas sociais, capacidade de motivar equipes para que consigam se desenvolver e colocar toda sua qualificação em busca do bem comum e na concretização da visão da empresa. Como afirma Henry Mintzberg, o gestor deve ser comparado ao maestro durante os ensaios em que os músicos não tocam, os ajudantes fazem barulho e quase tudo dá errado. Sabemos que tanto a música quanto a administração são compostos por elementos e esses elementos são a parte mínima de cada um. Na música esses elementos são as notas musicais que, quando combinadas, dão origem à melodia. Na administração, os elementos estão nas diversas variáveis que integram e formam um modelo de gestão. Na música os elementos não se alteram: qualquer músico irá executar sempre a mesma melodia; logo, o foco do maestro está na técnica e não no comportamento de seus músicos. Na administração não: o gestor tem que ter a competência de integrar cada um desses elementos da administração a sua própria melodia.

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Na orquestra não há improvisação, existe uma partitura, um roteiro a ser seguido, que se repete exatamente da mesma forma a cada apresentação. Na administração existem procedimentos e regras que tão somente servem de orientação, como uma bússola e, na maioria das vezes, interpretados de formas diferentes pelos colaboradores, muitos dos quais sequer são de seu conhecimento. A orquestra com um conjunto relativamente grande de instrumentos não é, em absoluto, um agrupamento ao acaso dos elementos disponíveis; tem seu layout definido e sempre igual. Trata-se de uma unidade altamente organizada e equilibrada, composta por quatro naipes ou famílias de instrumentos. Na frente está seu líder, o maestro; depois estão os instrumentos de cordas; logo atrás, os instrumentos de madeira; em seguida, os metais e, por último, a percussão, que se localiza no fundo da orquestra. Em uma empresa o gestor deve montar suas equipes de acordo com as necessidades e exigências do mercado e fazer com que cada departamento, cada seção, cada grupo, cada indivíduo agregue valor ao produto e/ou serviço até que ele chegue ao mercado. Para isso o gestor deve buscar harmonia, integração e sinergia entre as diversas áreas que, diferente da orquestra, 59


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não é uma coisa natural. No mundo corporativo não existem melodias prédefinidas, não existem respostas fabricadas; assim, o gestor tem o desafio de dia a dia criar e recriar uma obra que não é infinita. Como diz Mintzberg, infelizmente os gestores preferem a imagem pomposa de um maestro dirigindo a orquestra em um teatro lotado — o que não passa de uma ilusão, um mito.

11 O conselho de Dona Coruja

Os animais da floresta haviam sido convocados para construir uma ponte que facilitasse atravessar o rio. Após dias de trabalho pesado a ponte ficou pronta para a alegria de todos. Muito tempo se passou até que veio uma chuva forte, o rio transbordou e a ponte não aguentou a força das águas: arrebentou e desapareceu rio abaixo. 60


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Os animais, então, começaram a brigar para saber quem seria o responsável por aquele desastre — e a discussão ficou cada vez pior. Para resolver o problema um deles sugeriu perguntar para a coruja, que residia na árvore mais antiga do bosque, visto ser considerada por todos como o mais sábio dos animais. Dona Coruja se sentiu lisonjeada e aceitou a incumbência de ser a mediadora do conflito. Convocou a bicharada e do alto de sua árvore contou a seguinte estória: — Um elefante e uma formiguinha estavam tentando atravessar uma ponte de madeira e cordas, mas o elefante estava com muito medo por ser pesado; então, a formiga disse que atravessaria e esperaria do outro lado da ponte. Foi o que ela fez e, para encorajar o elefante, ficava gritando para que o amigo conseguisse atravessar a ponte. A cada passo que o elefante dava ia quebrando as madeiras da ponte. Quando chegou ao outro lado, a ponte estava semidestruída. A formiguinha então disse para seu amigo elefante: — Meu Deus, você viu o que nós fizemos com a ponte? Nesse ponto, alguns animais reclamaram: — Faça-me o favor, Dona Coruja, essa estória é bem manjada, né? Dona Coruja não se abalou e fez com que os animais entendessem que ninguém em especial era culpado pela 61


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destruição da ponte, mas que todos juntos faziam parte daquele acontecimento e que somente juntos poderiam estudar uma maneira de construir uma ponte mais segura. É muito comum nas empresas alguém procurar culpados e vilões para jogar a responsabilidade por algo que não deu certo. Muitas vezes o gestor procura criticar colaboradores para aliviar suas próprias deficiências.

seus

Antes de ficar buscando culpados, o ideal é compreender o que está ocorrendo, não apenas superficialmente, mas de forma profunda. Para isso é preciso examinar a situação, os bastidores, o contexto e tentar entender o que efetivamente está acontecendo. O gestor deve deixar claro para o grupo que a situação somente será resolvida se todos falarem abertamente e honestamente sobre o problema. Sabemos que é mais fácil eleger culpados do que refletir honestamente sobre as causas levaram algo a não dar certo. Dona Coruja tem razão, todos têm que assumir a responsabilidade das ações do grupo, sejam elas positivas ou não.

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12 As três cartas e a mudança

A empresa vinha apresentando uma solidez econômica invejável. Conseguira uma posição privilegiada no mercado e, como consequência, os lucros obtidos faziam do diretor um líder respeitado perante todos os stakeholders. E esse era, sem dúvida, mérito seu. Empenhara-se profundamente em suas funções, implantando um modelo de gestão que dava pleno incentivo à efetiva participação dos colaboradores, seja na escolha como no manuseio das diversas ferramentas que viessem a contribuir para o sucesso da instituição. Apesar dos bons resultados obtidos pela empresa, o que a colocava como sinônimo de força e poder frente a seus concorrentes próximos, Francisco (Seu Chico, como o chamavam carinhosamente os colaboradores) foi convocado para uma reunião com o Conselho da organização e comunicado que já não precisavam mais de seu trabalho. Para muitos esse comunicado poderia significar o fim, mas, para o velho Chico, acostumado aos caprichos da vida, não. 63


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Acatou a decisão da empresa com tranquilidade. Retornou para seu escritório, juntou seus objetos particulares e colocou em uma caixa. Antes de sair pegou um bloco de papel e escreveu três cartas, colocou-as em um envelope, tomando o cuidado de enumerar cada um dos envelopes com os números 1, 2 e 3. Depois colocou as cartas na primeira gaveta, com uma pequena instrução para o gestor que assumiria o seu lugar. Passaram-se alguns dias. O novo gestor assumiu seu posto e, abrindo a primeira gaveta, deparou-se com as três cartas. Curioso começou a ler as instruções que diziam: “Estas três cartas foram deixadas por mim, seu antecessor. Faço votos que os conselhos nelas contidos possam ser-lhes úteis. A primeira carta você deve abrir ao enfrentar a primeira grande crise e no momento que estiver em dúvida sobre o que fazer. Nela você encontrará uma instrução de como proceder. A segunda carta: abra-a na segunda crise. E a terceira, na crise seguinte. Observação; só abra as cartas quando julgar que realmente está com um problema muito sério”. O tempo passou e finalmente veio a primeira crise. A empresa estava com sérios problemas para honrar seus compromissos e havia uma enxurrada de fornecedores inconformados por não receber os pagamentos devidos. 64


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O jovem gestor lembrou-se então das cartas do velho Chico. Retornou a sua sala, fechou a porta, abriu a gaveta e retirou o primeiro envelope. Abriu-o com cuidado, retirando um pequeno papel que estava dentro. Estava escrito: “Critique a gestão anterior”. O jovem gestor sorriu e retornou à sala de reuniões, onde se encontravam os credores, e seguindo o conselho do velho mestre colocou toda a culpa da situação em seu antecessor. Conseguiu acalmá-los e assim retornou à rotina. Após três anos de calmaria, eis que se viu diante de nova crise. Desta vez eram os colaboradores que se mostravam descontentes com a forma de tratamento a que estavam sendo submetidos. O jovem gestor abriu diálogo com o grupo, mas, apesar de todos os seus argumentos, os ânimos não serenaram. Era hora de abrir o segundo envelope. Foi ao seu escritório, tomou o segundo envelope e abriu. Nele estava escrito: “Mude o organograma”. O diretor seguiu o conselho e começou a fazer mudanças. Logo percebeu que o foco havia mudado. Agora todos estavam interessados em não perder suas posições no organograma e as reclamações desapareceram. Muitos anos se passaram e o gestor agora já não era tão jovem. Apesar dos anos da rotina e dos anos de 65


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experiência, não conseguia encontrar soluções para a terceira crise. Chegara o momento de abrir a terceira carta. Com cuidado tomou o envelope nas mãos e abriu. Nele estava escrito: “Escreva três cartas iguais a essas, junte suas coisas e vá embora”. É muito comum uma nova gestão, para se eximir da responsabilidade em não atender aos anseios dos stakeholders de uma organização, ter como justificativa a gestão anterior. Por outro lado, ao assumir uma empresa é normal que o novo gestor procure se cercar de pessoas de sua confiança; o que não é normal é mudar constantemente o organograma, tirando e colocando pessoas como se fossem objetos simplesmente para abafar problemas que não consegue resolver, sem planejamento e sem qualquer critério técnico. Essa é uma prática que, se não é comum, acontece em muitas empresas.

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13 Alemanha — Um problema de gestão

Na entediada manhã de 13 de agosto de 1961, ainda numa luta feroz com o sono, Klaus, que morava próximo à linha que separava a cidade de Berlim em duas partes, foi despertado por barulhos estranhos e exagerados. Ao abrir a janela, qual não foi sua surpresa ao se deparar com um inusitado movimento. Era incrivelmente grande o número de Vopos, como eram denominados os milicianos da antiga República Democrática da Alemanha — RDA, com seus tradicionais uniformes verdes. Com rapidez estendiam, de um poste a outro, intermináveis rolos de arame farpado. Estavam acompanhados por soldados com semblantes nada amigáveis e com seus fuzis prontos para serem usados a qualquer momento. Klaus percebeu que centenas de trabalhadores desembarcavam dos caminhões. Uns descarregavam tijolos, sacos de cimento, areia e cal, outros espancavam o solo indefeso com picaretas, enxadões e britadeiras enquanto outros preparavam a argamassa que iria ser usada para 67


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levantar o pavoroso e vergonhoso muro da vergonha ou Berliner Mauer, como denominavam os berlinenses. Nos meses que se seguiram, Klaus pôde constatar o intuito de todo aquele movimento: a divisão de sua linda cidade por um muro que se estendeu por 37 quilômetros, separando a cidade, dividindo famílias, destruindo esperanças e semeando discórdia. Berlim, uma das mais belas cidades do mundo, estava dividida, suas estradas fechadas e seus trens proibidos de circular. Era a máquina soviética tentando impor o terror. Em nível de gestão, a Alemanha Oriental implantou uma economia nacionalizada e planificada, segundo o modelo socialista. Numa economia assim supõe-se que o trabalhador tenha um papel importante no planejamento e direcionamento das ações governamentais. Na Alemanha Oriental essa hipótese não valia, não havia nada de comunismo na verdadeira concepção da palavra; havia, sim, uma pequena burocracia ditatorial a executar um plano que lhes permitisse manter os próprios privilégios; a troca privada e a posse de terras eram proibidas. As pessoas, cujo bem-estar seria, em tese, o foco principal do Estado, eram forçadas a trabalhar em fazendas do governo, com sérias privações de comida e de mantimentos. O que Klaus estava presenciando naquela manhã de 13 de agosto era resultado de uma tentativa maluca de Nikita Kruschev, o premier soviético, de conter a evasão e fuga 68


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das pessoas em direção a Berlim Ocidental, administrada em princípios democráticos: mais de 160 mil atravessaram a linha divisória em busca de uma vida melhor no outro lado da bela Berlim. Nosso objetivo não é falar de política e sim de gestão, com o que cabe uma indagação. Por que dois países que tinham a mesma cultura, o mesmo idioma, com habitantes dividindo a mesma composição étnica, têm comportamentos tão diferentes? De um lado, uma Alemanha moderna, voltada às tecnologias de ponta e oferecendo qualidade de vida digna para seus cidadãos, e do outro uma Alemanha Oriental com baixíssimo nível de produtividade da indústria, fábricas obsoletas com equipamentos ultrapassados, problemas de matéria-prima e oferta limitada de produtos, muitas vezes racionados. A resposta é aparentemente simples: trata-se de um claro problema de gestão. Não estamos falando de modelo político. Independente de qual seja, a correta gestão dos recursos é que leva uma empresa ou um país a ser bem-sucedido. Quando a gestão visa a benefícios próprios, sem levar o bem comum em consideração, o resultado é o fracasso. Logo, as diferenças entre as duas Alemanhas iam muito além do modelo político implantado, estava na forma 69


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como eram geridas. Felizmente, 28 anos mais tarde, no dia 9 de novembro de 1989, o muro caiu, deixando marcas que jamais serão apagadas. Quando você passeia por Berlim, é recomendável sempre olhar para baixo, pois as cicatrizes estão marcadas no chão. Embora, discretas e às vezes imperceptíveis, as marcas estão lá para que todos os Klaus do mundo nunca se esqueçam do que significa o egoísmo e a ganância. E, principalmente, entendam quais são as consequências de uma gestão egoísta e de péssima qualidade.

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14 Sucesso — A lição do velho burro

Conta a lenda que um velho burro estava pastando num campo. Sem prestar atenção onde pisava, de repente caiu num poço fundo. Desesperado, zurrou alto até que o fazendeiro ouviu. O animal olhou tristemente para o homem como se quisesse dizer: “Por favor, tire-me daqui, deixe-me voltar para minha casa”. O fazendeiro não disse uma palavra... virou as costas e foi embora. O burro ficou agonizando no poço por três dias. No quarto dia, o fazendeiro voltou com seus três filhos. Todos eles olharam para o burro e riram dele. Então, o fazendeiro falou: “O poço está abandonado, não há mais água e o burro está tão velho que não vai valer a pena salvá-lo”. E, mãos à obra, começaram a jogar terra no poço, procurando enterrar o burro lá dentro. À medida que as pazadas se sucediam e a terra era jogada sobre o burro, esse se sacudia para tirar aquilo do lombo, até que suas patas começaram a ficar cobertas de terra que caía no solo. Para não afundar, o burro começou a pisotear o chão, livrando as patas da terra que caia. E assim 71


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foi; a terra era jogada, o burro sacudia e pisava em cima; a terra caía e o burro amassava. Não demorou muito para que todos vissem espantados que o poço estava quase fechado e o burro saindo para a liberdade. Liberto do poço, ao chegar em casa ainda meio assustado, o seu neto, um burrico ainda jovem, perguntou-lhe como só as crianças sabem fazê-lo: — Vô, o que é que eu tenho que fazer para quando crescer tornar-me um burro de sucesso assim como o senhor? O burro velho respondeu: — É fácil, meu neto, para ser bem-sucedido tudo o que você tem de fazer é “sacudir a terra do lombo e pisar em cima”. Tirem suas conclusões.

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15 Papo virtual

A noite avançava quando por acaso encontrei um amigo em uma sala de bate-papo. Após uma conversa sobre informalidades, disse a ele que estava revendo alguns documentos e organizando a papelada em meu escritório, quando fui surpreendido por um discurso a um só fôlego: — Eu não tenho sala de trabalho, aliás, nem quero, meu escritório são as salas de visitas de meus clientes aqui, ali e acolá. Este é um mundo de oportunidades raras, ainda que lotado de concorrentes, onde quem vence não são necessariamente os grandes, mas os mais rápidos. Um mundo de reuniões virtuais e decisões instantâneas; logo, a palavra-chave é velocidade — e para isso você não pode ficar sentado na poltrona de um escritório vislumbrando pela janela os vultos das oportunidades que passam sem sequer fazer um aceno. Infelizmente as empresas ainda têm que conviver com dois tipos de pessoas: as que sugam energia da empresa, burocratas autoritários que tentam impor suas decisões e 73


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controlar os outros por meio de regras burocráticas e hierarquia autoritária de comando, e as que dão energia à empresa, conseguindo perceber que vivemos em um mundo onde os compromissos são assumidos apenas quando existe crença na visão e na missão daquela organização, ou seja, desde que ela tenha suas ações embasadas em valores compartilhados. É como ensina a fantástica futurista Hazel Henderson de 88 anos: “Já começamos a perceber que dinheiro não é riqueza, mas um sistema de valores. Ele apenas acompanha a riqueza real. E o que é riqueza real? Pessoas criativas, admiráveis, energéticas, trabalhando com a natureza, tirando sua subsistência de recursos ecológicos reais”. Estamos vivendo uma crise de percepção e de mudanças, em que muitos gestores da velha guarda não conseguem vislumbrar. Não entendem que estamos no início de uma grande oportunidade de nos reeducarmos sobre a força real dos recursos de pessoas comuns, em que prevalecem virtudes como simplicidade, gratidão, união, amor, prudência, fraternidade, confiança, sabedoria, solidariedade, diálogo, disciplina, humildade, perseverança e tantas outras. Eles não entendem que o capital intelectual das empresas é as pessoas e que todas deveriam ter um único cargo hierárquico: o de “sócio”. Como “sócios” todos estarão unidos em uma aliança para alcançar um objetivo comum, que é o desenvolvimento e 74


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crescimento de seu negócio. Estarão preocupadas em descobrir e buscar o dinheiro novo, os chamados fresh money, atentas para entender o que poderá destruir os produtos e serviços de sua organização, e articular em conjunto com os demais sócios estratégias de como deixar a concorrência o mais irrelevante possível. Assim, por trás desse apelo igualitário não existem mais espaços para funcionários, colaboradores e gestores que apenas cumprem regras e procedimentos, que ficam sentadas em suas confortáveis cadeiras de suas salas climatizadas sem perceber que lá fora o mundo caminha a passos largos para uma nova forma de agir, de trabalhar e de gerir pessoas e empresas. Depois desse discurso do meu amigo não tive alternativa a não ser desligar o computador e refletir sobre suas palavras. Mas, antes de sair da sala, outra pessoa indagou: — Qual é o nome desse seu amigo? — O nome dele? Esqueci de perguntar, só sei que ele mora em Bangalore — Bangalore? — Sim, na Índia.

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16 Código de conduta ética

Estamos vivendo tempos exponenciais, em que não basta a empresa ter sua missão, visão e código de valores expostos no rol de entrada. A gestão empresarial não pode ficar limitada somente a um bom planejamento estratégico, excelentes processos, boa estrutura, utilização de modernos softwares de controles, incentivos e benefícios para a produtividade e foco na eficiência e eficácia da organização. Ter conhecimento e um bom produto não significa que a empresa tenha poder, pois é preciso ter postura, atitude; enfim, sabedoria. Daí a necessidade de a empresa desenvolver e criar uma Gestão de Conduta eficaz e ética — ou seja, compliance, como é denominado hoje. Problemas de relacionamento e dificuldades em obter cooperação, falta de motivação e de compromisso têm como consequência a ausência de coleguismo, estresse e a competição desenfreada na qual o fim justifica os meios. O conhecimento técnico e a qualidade dos produtos contam muito no processo de alcance dos objetivos 76


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traçados, mas nenhum deles substitui o valor de virtudes tais como: discernimento, inspiração, confiança, serenidade, introspecção, gentileza, solidariedade, cortesia, harmonia, sabedoria. E qual seria a condição para que tais virtudes possam se transformar no diferencial dos profissionais de uma empresa? Uma consciente gestão de conduta ética e políticas de compliance. Conduta é uma manifestação de comportamento do indivíduo, que pode ser tanto para o bem quanto para o mal. Gestão de conduta é um conceito que pode ser ensinado, aprendido e aplicado pelas pessoas e organizações com o intuito de transformar o trabalho numa experiência que transcenda as ações diárias, em que a cooperação, o respeito, a motivação e o entusiasmo venham de dentro para fora, naturalmente. Uma boa gestão de conduta é o que cria as reais condições de um relacionamento harmônico entre as pessoas. Uma coerente gestão de conduta nos leva à ousadia de não maquiar a verdade, não dar asas à vaidade e à presunção de nos acharmos melhor que os outros. O bom êxito em qualquer empreendimento humano torna-se possível quando sustentado por atitudes simples, precedidas de discernimento. Pessoas imbuídas de valores e 77


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da virtude do discernimento marcam a história, universalizam o lugar onde nasceram, têm compromissos cívicos, atraem a admiração de todos; enfim, não cairão no esquecimento. A natureza é sem dúvida uma enciclopédia repleta de ensinamentos. A psiquiatra suíça Elisabeth Kübler-Ross trouxe essa lição, ao contar que “a águia gosta de pairar nas alturas, acima do mundo, não para ver as pessoas de cima, mas para estimulá-las a olhar para cima”. Ela compara, ainda, o ser humano a um precioso vitral, quando diz: “As pessoas são como vitrais coloridos: cintilam e brilham quando o sol está do lado de fora, mas quando a escuridão chega, sua verdadeira beleza é revelada apenas se existir luz no interior”. De tanto ver, já não vê, de tanto acostumar-se a agir de forma competitiva, as pessoas estão perdendo a capacidade de manter uma conduta embasada em valores e no respeito aos demais, e passam a não confiar em ninguém, a fazer julgamentos precipitados e torcer pelo insucesso de seus colegas. Gestão de conduta ética e políticas de compliance servem para induzir e conduzir os colaboradores ao exercício dos valores essenciais no ambiente de trabalho. É permitir que vivam em harmonia com suas crenças mais profundas, fazê-los reconhecer que o trabalho transcende os aspectos materiais e reconhecer que em um ambiente harmônico se é feliz e se trabalha melhor. É fazê-los compreender que a 78


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competitividade pode conviver em harmonia com as relações pessoais e com a ética, sem esquecer que disciplina vem da mesma raiz de discípulo — o que significa ensinar, treinar e não punir. Para implantar uma gestão de conduta ética e políticas de compliance, talvez São Bento possa servir de exemplo. São Bento nos deixou um código completo, em que aborda a organização, atribuições e distribuição dos cargos, o emprego do tempo, o exercício das virtudes e a repressão das faltas. Ele nos deixou como legado os 12 passos progressivos na escada do aprendizado da humildade. Em termos modernos são estes: Passo 1 — Respeite as regras simples, não corra, pare no sinal vermelho, honre seus prazos. Passo 2 — Respeite seus desejos pessoais, não coma quando estiver sem fome, não compre por impulso. Passo 3 — Obedeça aos outros, de bom grado obedeça aos seus superiores. Passo 4 — Aguente a aflição, tenha a consciência de que é preciso dar a outra face. Passo 5 — Admita sua fraqueza, reconheça-a regularmente, mesmo que seja só para si mesmo. Passo 6 — Pratique satisfação, tente ficar satisfeito 79


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com seu trabalho, com a situação, com o carro velho. Passo 7 — Aprenda a repreender, faça um esforço para se enxergar humilde e afortunadamente pelos seus bens. Passo 8 — Obedeça à regra comum, obedeça a todas as regras organizacionais na prática e no espírito. Passo 9 — Entenda que o silêncio é precioso, tente escutar mais do que falar, evite, sempre que possível, dar ordens. Passo 10 — Reflita sobre a humildade, medite sobre a seriedade e deixe que ela tome conta de sua vida. Passo 11 — Aja com simplicidade, converse em voz baixa, fale com delicadeza e com gentileza a todos. Passo 12 — Seja humilde na aparência e no coração, não valorize muito uma roupa cara e os gastos exagerados. Não é por acaso que São Bento coloca “as aparências” no décimo segundo passo, talvez, prevendo que esse seria o norte de conduta para muitas pessoas. O modo de vida moderno e a luta pela sobrevivência neste mundo tão competitivo nos deixa habituados a assistir às dificuldades, limitando-nos à crítica, ao comodismo, às coisas feitas. Não somos o que deveríamos ser, ou, somos mais ou menos. Uma coerente gestão de conduta ética e política de 80


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compliance nos levam além do que somos, nos leva ao que deveríamos ser.

17 As aparências enganam

Há alguns dias fomos surpreendidos por uma atitude que nos fez refletir. A história abaixo, extraída da revista Seleções do Reader’s Digest, reflete muito bem o que aconteceu e as lições que tiramos do fato. Num orfanato havia uma pobre órfã de oito anos de idade. Era uma criança lamentavelmente sem encantos, de maneiras desagradáveis, evitada pelas outras e malquista pelos professores. Por essa razão a pobrezinha vivia no maior isolamento. Ninguém para brincar, ninguém para conversar. Sem carinho, sem afeto, sem esperança... Sua única companheira era a solidão. 81


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O diretor do orfanato aguardava ansioso por uma boa desculpa para livrar-se dela. E um dia, aparentemente, a tal desculpa se apresentou. A companheira de quarto da menina informou que ela estava mantendo correspondência com alguém de fora do orfanato, o que era terminantemente proibido. Agora mesmo — disse a informante — ela escondeu um papel numa árvore. O diretor mal pode esconder a satisfação com a notícia. Junto com seu assistente, pediu para que a testemunha do delito lhes mostrasse a prova do crime. Dirigiram-se então à árvore em que havia sido escondida a mensagem. De fato, lá estava um papel delicadamente colocado entre os ramos. O diretor abriu, ansioso, o bilhete, esperando encontrar ali a prova de que necessitava para livrar-se daquela criança tão desagradável aos seus olhos. Todavia, para seu desapontamento e remorso, no pedaço de papel um tanto amassado, pôde ler a seguinte mensagem: “Para qualquer pessoa que encontrar este papel: — Eu gosto de você.” Os três investigadores ficaram tão surpresos quanto decepcionados com o que leram. Surpresos porque perceberam que ela era melhor do que eles próprios. Decepcionados porque perderam a oportunidade de livrar-se da menina indesejável. O ambiente empresarial é tão competitivo que muitas vezes nos leva a fazer julgamentos sem conhecer efetivamente 82


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as pessoas com quem convivemos. Julgamos as pessoas pela aparência, embora saibamos que essas são enganadoras. O pior é que, se as aparências não nos agradam, marcamos a pessoa e nos prevenimos contra ela e suas atitudes. Uma antiga e sábia oração dos índios Sioux roga auxílio a Deus para nunca julgar o próximo antes de ter andado sete dias com suas sandálias. Antes de criticar, julgar e condenar uma pessoa, devemos nos colocar no seu lugar e entender seus sentimentos. Ninguém é essencialmente mau. Isso porque todos nós temos, na intimidade, a centelha divina que é o amor em gérmen.

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18 A simplicidade do desejo do cliente

Um homem estava dirigindo há horas e, cansado da estrada, resolveu procurar um hotel ou uma pousada para descansar. Em poucos minutos, avistou um letreiro luminoso com o nome: Hotel Venetia. Quando chegou à recepção, o hall do hotel estava iluminado com luz suave. Atrás do balcão, uma moça de rosto alegre o saudou amavelmente: — Bem-vindo ao Venetia! Três minutos após essa saudação, o hóspede já se encontrava confortavelmente instalado no seu quarto e impressionado com os procedimentos: tudo muito rápido e prático. No quarto, uma discreta opulência; uma cama, impecavelmente limpa, uma lareira e um fósforo de tamanho apropriado, alinhado sobre a lareira, pronto para ser riscado. Era demais! 84


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Aquele homem que queria um quarto apenas para passar a noite, começou a pensar que estava com sorte. Mudou de roupa para o jantar (a moça da recepção já havia acionado o restaurante do próprio hotel no momento do registro). A refeição foi deliciosa, como tudo o que tinha até então experimentado naquele local. Assinou a conta e retornou para quarto. Fazia frio e ele estava ansioso pelo fogo da lareira. Qual não foi a sua surpresa! Alguém havia se antecipado a ele, pois havia um lindo fogo crepitante na lareira. A cama estava preparada, os travesseiros arrumados e uma bala de menta sobre cada um. Que noite agradável aquela! Na manhã seguinte, o hóspede acordou com um estranho borbulhar, vindo do banheiro. Saiu da cama para investigar. Simplesmente uma cafeteira ligada por um timer automático, estava preparando o seu café e, junto um cartão que dizia: sua marca predileta de café, bom apetite! Era mesmo! Como eles podiam saber desse detalhe? De repente, lembrou-se: no jantar perguntaram qual a sua marca preferida de café. Em seguida, ele ouve um leve toque na porta. Ao abrir, havia um jornal. — Mas, como pode? É o meu jornal! Como eles adivinharam? Mais uma vez, lembrou-se de que, quando fez o 85


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check-in, a recepcionista havia perguntado qual o jornal de sua preferência. O cliente deixou o hotel encantando, feliz pela sorte de ter ficado num lugar tão acolhedor. Mas, o que o Venetia fizera de especial? Apenas ofereceu um fósforo, uma bala de menta, uma xícara de café e um jornal. Nunca se falou tanto na relação cliente-empresa e/ ou empresa-cliente como nos dias de hoje. Historicamente, nos anos 1960 a orientação era para o produto; mas, em consequência da significativa desaceleração do crescimento, o foco mudou para o mercado, duas décadas mais tarde. Hoje podemos constatar que milhões são gastos em planos mirabolantes de marketing e, no entanto, o cliente continua insatisfeito, sempre desconfiado. Neste novo milênio as empresas terão necessariamente que se concentrar não somente em exceder as expectativas de seus clientes, mas principalmente em surpreendê-lo a cada instante. Para isso deverão desenvolver estratégias que criem valor para o cliente e, principalmente, proposições para que ele possa perceber claramente o conjunto de benefícios que irá receber. Mudar o layout das lojas, pintar as prateleiras, trocar as embalagens, criar excelentes portais e sites na internet, de nada adiantará se o foco principal não estiver nas pessoas.

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É preciso lembrar a cada instante que o valor das pequenas coisas conta. Muitas vezes, um fósforo, uma bala de menta, uma xícara de café e um jornal são tudo que ele deseja. O grande desafio está em descobrir a simplicidade do desejo do cliente.

19 Ursos, onças e morangos

Um sujeito tropeçou e estava caindo em um barranco quando, em desespero, se agarrou às raízes de uma árvore. Em cima do barranco havia um urso imenso e faminto. Aquele homem era uma ótima oportunidade de saciar a sua fome. O urso rosnava, mostrava os dentes, babava de ansiedade pelo prato que tinha à frente. A pobre vítima olhou para baixo procurando encontrar alguma possibilidade de se safar. Para sua desagradável surpresa, lá estavam seis onças, prontas para engoli-lo caso caísse. 87


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Ele erguia a cabeça, via o urso rosnando, abaixava e se deparava com as onças. Quando o urso dava uma folga, ouvia o urro das onças, próximas de seus pés. Que situação! Em determinado momento, ele olhou para o lado e viu um morango vermelho, com suas escamas douradas refletindo o sol. Em um esforço supremo, apoiou o corpo, sustentado apenas pela mão direita, e com a esquerda pegou o morango. Quando pode olhá-lo melhor, ficou inebriado com sua beleza. Então, levou o morango à boca e se deliciou com o sabor doce e a suculência. Foi um prazer supremo comer aquele morango tão gostoso. Talvez você nos pergunte: — Mas, e o urso? Nós respondemos: — Dane-se o urso e coma os morangos! E você insiste: — E as onças? — Azar das onças, coma os morangos! Há dois anos vivemos sob os violentos efeitos da pandemia, incluindo um caos econômico que afeta nosso cotidiano, pessoal e profissional. Sabe-se que nos momentos de crise é que as oportunidades aparecem, já que crise também pode significar ousadia e visão de futuro. 88


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Em momentos difíceis, a maioria das empresas, na ânsia de reduzir custos, demite executivos ou profissionais qualificados, reduz as verbas de comunicação, cancela programas de treinamento e, o que é ainda pior, perde o foco de planejamento estratégico do negócio, sem antes avaliar as verdadeiras consequências. Não estamos afirmando que é errado tomar esse tipo de decisão; o que estamos dizendo é que é recomendável avaliar e analisar os fatos antes de partir para o simples e tradicional corte de gastos. A tradicional prática “vamos nos segurar até passar”, enquanto ficamos olhando para o urso e atento às onças sem tentar colher o morango, deve ser substituída pela postura inovadora de “como crescer na crise”, uma vez que não dá para confiar sempre em uma raiz salvadora. Não existe receita, mas, antes de tudo, é preciso concentrar forças no próprio negócio, o que significa ter foco no cliente — porém, em tempos de crise, é preciso mais: é necessário ter “foco no foco do cliente”. Para melhor explicar o que significa foco no foco do cliente, nada melhor do que um exemplo prático. Há alguns dias Juca entrou em uma agência bancária e se deparou com o gerente colocando uma placa com uma informação curiosa: — O máximo de tempo na fila é de cinco minutos.

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O gerente olhou para Juca com ar de triunfo e disse: — Pois é, estamos melhorando a cada dia. Esse exemplo é típico de um gestor que não tem foco no foco do cliente. O que o cliente deseja é que não tenha fila, não está interessado em estatística burra que não atende suas expectativas. O gerente deveria estar preocupado em acabar com a fila, que é realmente o verdadeiro desejo do cliente, e não diminuir o tempo de permanência na fila. É imprescindível também valorizar e preservar seu capital intelectual, seus colaboradores, motivando-os através de uma administração transparente. Caso contrário, a empresa pode não só perder seus “low performers” como seus “top performers” e, caso isso aconteça, só restará esperar o galho quebrar e a empresa ficar à mercê das onças famintas. Nesse momento o melhor é comer morango, pois assim você ficará forte para se segurar. Não demorará muito e o urso vai se cansar de esperar e as onças irão embora. Sempre existirão ursos, onças e morangos: a decisão é sua.

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20 A lenda das três árvores

Seguindo o rastro do vento, subindo colinas, cruzando planícies e montanhas, lá no Vale das Oliveiras havia três pequenas árvores que sonhavam com o que seriam depois de grandes. A primeira, olhando as estrelas, disse: — Eu quero ser o baú mais precioso do mundo, cheio de tesouros. A segunda, olhando o riacho, suspirou: — Eu quero ser um navio grande para transportar reis e rainhas. A terceira olhou para o vale e disse: — Quero ficar aqui no alto da montanha e crescer tanto que as pessoas, ao olharem para mim, levantem os olhos e pensem em Deus. Muitos anos se passaram e certo dia três lenhadores cortaram as árvores que estavam ansiosas em ser transformadas naquilo que sonhavam.

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Mas os lenhadores não costumavam ouvir ou entender de sonhos de árvores. Que pena! A primeira árvore acabou sendo transformada em um cocho de animais coberto de feno. A segunda virou um simples barco de pesca, carregando pessoas e peixes todos os dias. A terceira foi cortada em grossas vigas e colocada de lado num depósito de madeiras. Então, desiludidas e tristes, as três se perguntaram: — Por quê? Ocorre que, numa bela noite cheia de luz e estrelas, uma jovem mulher deu à luz, e era tão pobre que não tendo para onde ir dividia com seu marido José as instalações dos animais. Não tendo um berço acomodou seu bebê recémnascido naquele cocho. E de repente, a primeira árvore percebeu que continha o maior tesouro do mundo. A segunda árvore estava transportando um homem que acabara por dormir no barco em que se transformara. Eis que o tempo mudou de repente e um vento forte, acompanhado de uma chuva torrencial que mais parecia uma tempestade, quase afundou o barco. O homem levantou-se e percebendo o perigo que corria, simplesmente levantou os braços e exclamou: — PAZ! Imediatamente a tempestade foi embora e, num 92


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relance, a segunda árvore entendeu que estava transportando o rei do céu e da terra! Tempos mais tarde, numa sexta-feira agitada, a terceira árvore espantou-se quando dois marceneiros se aproximaram sorrateiramente e após um pequeno diálogo e algumas medições uniram duas vigas em forma de cruz. Depois a transportaram para um lugar onde um jovem de 33 anos era agredido. Após muitos espancamentos, foi colocada uma coroa de espinho em sua cabeça. Depois o pregaram na cruz. E a terceira árvore se sentiu muito mal ao fazer parte daquela crueldade. No entanto, logo percebeu que na cruz em que havia se transformado fora pregado um homem destinado à salvação da humanidade e que as pessoas sempre se lembrariam de Deus e de seu Filho ao olharem para ela. As árvores haviam tido sonhos e desejos, mas sua realização foi mil vezes maior do que haviam imaginado. Estamos vivendo um momento de crise sem precedentes e isso poderá fazer você viver ansioso, irritado, com medo. Porém, não se esqueça que sua vida é a maior, melhor e mais importante empresa do mundo — e somente você pode evitar que ela vá à falência. Os tempos ruins estão se despedindo, levando em sua bagagem frustrações, decepções, sonhos que não se realizaram e amores que se foram. Novos tempos chegam com excesso de bagagem. 93


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Nelas estão contidos sentimentos idênticos, sonhos repetidos e esperanças renovadas. Chegam ensinando que sonhar é preciso e que sonhar não é limitar-se, não é direcionar o pensamento apenas ao possível: é tornar real também o impossível. A solução é inusitada: entregar ao coração as rédeas da razão. Assim como as árvores, não importa o tamanho do seu sonho; acreditando nele sua vida ficará mais bonita e muito melhor de ser vivida.

21 A arca de Noé da Silva

Certo dia o Senhor chamou Noé da Silva e ordenoulhe: — Dentro de seis meses farei chover ininterruptamente durante 40 dias e 40 noites, até que todo o Brasil seja coberto pelas águas. Os maus serão destruídos, mas quero salvar os justos e um casal de cada espécie animal. 94


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E ordena, como na passagem bíblica, a construção de uma arca de madeira. No tempo aprazado, os trovões deram o aviso e os relâmpagos cruzaram o céu. Noé da Silva chorava ajoelhado no quintal quando ouviu a voz do Senhor soar furiosa entre as nuvens. — Onde está a arca, Noé? — Perdoe-me, Senhor — suplicou o homem. Fiz o que pude, mas encontrei dificuldades imensas. Teria primeiro que obter uma licença da prefeitura e pagar altas taxas para obter o alvará. — Que alvará? — questionou Deus. — É que para eu construir a arca fui obrigado a abrir uma empresa. — Hum! — resmungou Deus. — Depois me pediram cópia autenticada de CPF e RG e comprovante de endereço dos sócios. — Dos sócios? — questionou Deus furioso — eu não disse que era para você construir a arca sozinho? — Disse, mas não deixaram. — E o que mais pediram? — perguntou Deus. — Comprovante do endereço comercial, exigiram que no contrato social fossem colocados dados e o visto de um advogado. Pediram para incluir o objetivo da empresa, que era segredo. 95


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Então disseram que iriam me ajudar. Para tanto, pediram uma contribuição para a campanha do prefeito à reeleição. Precisando de dinheiro, fui aos bancos e não consegui empréstimos, mesmo aceitando taxas de juros exorbitantes; afinal, nem teriam mesmo como me cobrar depois do dilúvio. O Corpo de Bombeiros exigiu um sistema de prevenção de incêndio, mas consegui convencer um funcionário a liberar. Começaram então os problemas com o Ibama para a extração da madeira. Eu disse que eram ordens suas, mas eles só queriam saber se o projeto fazia parte do PPA. Tentei falar com o relator, mas eles estavam brigando pelo cargo no Congresso. O Ibama descobriu também uns casais de animais no meu quintal e me aplicou uma pesada multa. Quando resolvi começar a obra na raça, apareceu o sindicato exigindo que eu contratasse seus marceneiros com garantia de emprego por um ano. Veio em seguida a Receita Federal, falou em sinais exteriores de riqueza, quiseram me prender, mas consegui transformar o mandado de prisão em multa, que paguei à vista. A Secretaria de Meio Ambiente pediu o Relatório de Impacto Ambiental sobre a zona a ser inundada. Quando mostrei o mapa do Brasil, chamaram o serviço psiquiátrico! Noé terminou o relato em lágrimas, quando notou que o céu clareava.

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— Senhor, então não irás mais destruir o Brasil? — Não! — respondeu a voz entre as nuvens — Alguém já se encarregou de fazer isso! Para abrir um negócio não basta construir um bom plano de negócio, ser expert na área, ter vontade de empreender, autoconfiança, aceitar correr riscos, não temer fracasso. Sempre será fundamental a persistência para vencer as dificuldades.

22 Jogos olímpicos e os verdadeiros valores

O britânico Derek Redmond chegou aos jogos de Barcelona em 1992 como um dos favoritos ao pódio nos 400 metros rasos. Durante a semifinal sofreu uma ruptura muscular na coxa e caiu na pista. Ele gritava e chorava de dor, mas, ao ver todo o estádio o aplaudindo e incentivando, superou o que sentia e, mancando, começou a caminhar para a chegada. Seu pai, vendo a cena, saiu da arquibancada, invadiu a pista e, desviando dos seguranças, foi amparar Derek até a linha de chegada. O episódio é um dos momentos mais marcantes da história das Olimpíadas. 97


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Os Jogos Olímpicos têm o poder de nos fazer repensar sobre a razão de existir e estar aqui. Lembram-nos que vivemos em um mundo com mais de 40 mil quilômetros de circunferência, cinco continentes, 195 países, sete mil idiomas, sete bilhões e oitocentos milhões de pessoas de diferentes raças, cores e culturas. Cada um dos habitantes do planeta tem sonhos e o objetivo da imensa maioria é viver em paz e ser feliz. Para isso os seres humanos precisam buscar um estilo de vida mais simples, o que não significa uma sociedade culturalmente mais pobre. Os gregos viviam de forma simples, mas sua cultura foi uma das mais ricas da história. Como ensina Ken O’Donnell, os seres humanos precisam rever seus princípios, prioridades e sua maneira de ser, uma vez que os valores chamados de mecanicismoreducionismo, que funcionaram até hoje, já se encontram esgotados. O pragmatismo de Francis Bacon rompeu com o pensamento medieval e tirou o divino da natureza. No modelo puramente matemático do mundo de Descartes não havia lugar para a realidade caótica dos seus cidadãos e suas vidas. A definição materialista e mecanicista das forças da natureza de Newton; no seu livro A Riqueza das Nações, Smith deu ênfase à política de laissez-faire (deixar fazer ou acontecer). De Smith veio a ideia de que se os indivíduos buscassem progredir monetariamente, toda a sociedade se beneficiaria. Darwin entrou na jogada com a ideia de que somos descendentes 98


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de primatas. Freud sugere que somos corpos movidos pelas sensações. Marx chega para nos lembrar que todos temos direitos iguais. Esses pensadores não tinham ideia das consequências catastróficas de suas ideias. Não há dúvida de que os benefícios foram muitos, especialmente a derrota da fé cega da Idade Média, embora, em seu lugar, tenha sido edificado um paradigma intransigente e fechado, que serviu e serve de base para um falso “progresso”. O paradigma mecanicista/ reducionista ignorou o espírito, tirou o sagrado e os valores éticos do nosso relacionamento com o mundo. Estar diretor, gerente ou outros entes passou a ser o foco e a mais importante busca. Isso criou um vazio e uma inversão de valores em que o “estar” se sobrepôs ao “ser”. Logo, se a vida não estiver funcionando bem no nível do ser, a outra parte também não poderá gerar satisfação. Pode haver sucesso em termos de números, mas o verdadeiro conceito de sucesso inclui a exigência de estar bem consigo mesmo, com seus entes queridos e com sua espiritualidade. Esse conceito de que progresso significa apenas converter todos os recursos naturais, materiais, financeiros em produtos para oferecê-los ao mercado e com isso ganhar dinheiro, sem levar em consideração o desenvolvimento espiritual ou pessoal dos indivíduos, está cansando o homem. Como instituições, empresas e indivíduos, precisamos 99


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de coragem e de uma nova avaliação dos valores para enfrentar as dificuldades. As empresas, em seu papel de grande força motriz da sociedade, podem mostrar o caminho para a simplicidade que se busca. Para isso, os gestores precisam estar sintonizados com os anseios individuais de seus colaboradores que, mais do que progresso material, buscam sua valorização como seres humanos, bem-estar e felicidade. Os gestores devem ter consciência de que o líder do futuro não será aquele que consegue a maior rentabilidade, o maior lucro, o maior desenvolvimento econômico para sua empresa — objetivos vitais, mas não suficientes. O líder do futuro será aquele que inspira confiança, que aceita, que respeita, que busca a fraternidade, o amor ao próximo, a solidariedade e a justiça.

23 Parábola do conhecimento

Um milionário excêntrico que queria ser sábio resolveu fazer uma viagem à Índia para contatar um guru. Lá chegando, foi até um castelo nas montanhas, onde encontrou um sábio. Aproximou-se e disse: 100


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— Sr. guru, eu quero ser sábio! O homem sorriu diante da solicitação direta do milionário e com a voz pausada disse: — Pois não, isso não tem nada de difícil; aliás, o senhor chegou em um momento muito importante, pois estamos exatamente na hora do chá. E tomando do bule, indagou: — O senhor aceitaria uma xícara de chá? O milionário prontamente aceitou e o guru começou a servi-lo. Foi derramando na xícara até que ela encheu e o chá começou a transbordar. Mesmo assim o homem sábio continuou servindo o chá. O milionário, sem entender, disse, apontando para a xícara: — Sr. Guru, está transbordando! O sábio, sem cessar de colocar o chá na xícara, respondeu: — Eu sei, esta xícara está exatamente como sua cabeça: enquanto não tirar o que tem dentro, nada de novo conseguirá colocar nela. Qualquer pessoa — ou organização — que suponha que aquilo que a levou a ter sucesso no passado deverá continuar a ser aplicado para garantir sucesso no futuro está 101


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fadada ao fracasso. Quando um paradigma muda, tudo volta à estaca zero. Seu conhecimento e seu passado não garantem nada no mundo se as regras mudarem. Assim, este é o maior desafio de nossos tempos: o de aprender a desaprender para, só depois, aprender a aprender algo novo. Aliás, desde que Peter Senge lançou seu livro A Quinta Disciplina que se fala muito em aprender a aprender. Aprender não é só uma questão de se inscrever em um curso e ser alimentado de informações à força. O verdadeiro aprendizado vem da curiosidade constante sobre o mundo, para aproveitar as oportunidades que surgem. Exige leitura e questionamento constantes; afinal, o segredo para uma vida satisfatória é o conhecimento. Infelizmente, a quantidade mínima de conhecimento aceitável aumenta constantemente — e o conhecimento em si muda como a regularidade de uma queda d’água. Só aprendendo a aprender é que vamos nos realizar como seres humanos, sobreviver com dignidade e nos manter interessados no desenvolvimento das pessoas e das instituições.

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24 Superando as expectativas

Um açougueiro estava em sua loja e ficou surpreso quando um cachorrinho entrou. Ele espantou o cãozinho, mas ele logo voltou. Então o açougueiro viu que o pequeno animal trazia um bilhete na boca. Ele pegou e leu: — Pode mandar 12 salsichas e uma perna de carneiro, por favor. O açougueiro notou que dentro da boca do cachorrinho havia uma nota de 50 reais. Pegou o dinheiro, separou as salsichas e a perna de carneiro, colocou numa embalagem plástica, junto com o troco, e pôs na boca do cachorrinho. O açougueiro ficou impressionado e, como já era mesmo hora de fechar o açougue, ele decidiu seguir o animal. 103


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O cachorro desceu a rua. Quando chegou ao cruzamento, deixou a bolsa no chão, pulou e apertou o botão para fechar o sinal. Esperou pacientemente até que o sinal fechasse e ele pudesse atravessar em segurança. Seguido pelo açougueiro, o cãozinho foi caminhando pela rua, até parar em uma casa. Depois de depositar as compras na calçada, correu e se atirou contra a porta. Tornou a fazer isso algumas vezes. Ninguém respondeu. Então circundou a casa, pulou um muro baixo, foi até a janela e começou a bater com a cabeça no vidro. Foi quando alguém abriu a porta e começou a bater no cachorrinho. O açougueiro impediu a pessoa de continuar batendo no pobre animal, dizendo: — Por Deus do céu, o que você está fazendo? O seu cãozinho é um gênio! O homem, mal-humorado, respondeu: — Um gênio? Esta já é a segunda vez esta semana que este estúpido esquece a chave! Quem enfrenta no dia a dia a pressão por resultados e as cobranças cada vez maiores atualmente, sabe que fazer o combinado já é algo bastante difícil e desgastante — quanto mais superar os limites, cada vez mais difíceis de serem alcançados. 104


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No mundo corporativo de cobranças rápidas e cada vez mais enérgicas, na maioria das vezes você pode continuar excedendo às expectativas, mas, para os olhos de alguns, estará sempre abaixo do esperado. O fato é que criamos expectativas e, quando as coisas não acontecem de acordo com elas, sofremos demais. Muitas vezes demonstramos pouca capacidade em renunciar aos nossos planos para recomeçar. Consideramos ser uma confissão de fraqueza reconhecer-se em situação de aparente insucesso. Passamos a maior parte de nossos dias esquecidos disso, achamonos donos da vida, da natureza e até donos dos nossos semelhantes. Tanto que somos capazes de levar as pessoas a nos servir, a girar em torno do nosso próprio umbigo e de nossos interesses egoístas. Se alguém não atende as nossas expectativas, apressadamente emitimos um parecer maldoso sobre elas, como fez o homem com o cão. Não podemos ficar reféns de nosso ego. As grandes oportunidades de nos motivar estão em gerar e acreditar nos feitos dos demais, o que também irá significar o nosso próprio sucesso.

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25 Sua empresa é assim?

Um bebê foi encontrado na porta de uma empresa. Ao tomar conhecimento do fato, o diretor emitiu a seguinte comunicação interna: “De: Diretor Para: Recursos Humanos Assunto: Bebê Acusamos o recebimento de um recém-nascido de origem desconhecida. Formem uma comissão para investigar. Sugiro que a investigação atenha-se a dois pontos básicos: A – Se o recém-nascido é produto doméstico da empresa. B – Se algum funcionário está envolvido com o assunto.” Depois de um mês de investigações, a comissão enviou ao diretor a seguinte mensagem: “De: Comissão de Investigação Para: Diretor 106


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Assunto: Bebê Concluímos que o citado objeto desta C. I. não pode ser produto desta empresa, pelos seguintes motivos: A – Na nossa empresa nada é feito com prazer ou amor. B – Entre nós, nunca duas pessoas colaboraram tão intimamente entre si. C – Jamais produzimos algo que ficasse pronto em nove meses.” As empresas não podem cair na armadilha de se preocupar apenas em conquistar clientes e esquecer que a satisfação desses está condicionada, antes de qualquer coisa, em conquistar as pessoas que cuidam deles. Se os colaboradores são importantes, automaticamente, eles colocarão o cliente em primeiro lugar. É uma questão de causa e efeito. Muitas empresas criam canais de comunicação com seus clientes externos, mas esquecem de fazer o mesmo com relação aos seus clientes internos. Infelizmente, em muitas delas as pessoas nem sempre são respeitadas em sua individualidade. Muitos gestores esquecem que eles não têm subordinados, têm pessoas cuja única diferença em relação a eles está no tamanho das obrigações. Esquecem que hierarquia não se faz em cima de privilégios e sim por graus 107


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de responsabilidade. Esquecem que o fato de ser gestor não significa que seja melhor ou pior do que qualquer de seus colaboradores. A pergunta a ser feita é: as pessoas estão satisfeitas e trabalham com prazer em nossa empresa? Perguntinha difícil de responder e mais difícil ainda de fazer. A fuga a essa questão pode se transformar em uma verdadeira tragédia, pois a resposta poderá contrariar tudo aquilo que se imaginava a respeito de como anda o ambiente de trabalho na empresa. Logo, cuide bem dos colaboradores para que eles possam trabalhar com prazer e amor pelo que fazem e possam cooperar uns com os outros na busca para atingir os objetivos de todos.

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26 Quanto vale uma vitória?

Há alguns anos, em uma olimpíada para pessoas especiais em Seattle, nove participantes, todos com deficiência mental ou física, alinharam-se para a largada da corrida dos 100 metros rasos. Ao sinal, todos partiram. Não exatamente em disparada, mas com vontade de dar o melhor de si. E, se possível, ganhar. Com exceção de um garotinho que tropeçou no asfalto, caiu e começou a chorar. Os outros oito ouviram o choro, diminuíram o passo e olharam para trás. Então, voltaram. Uma das meninas, com síndrome de Down, ajoelhou-se, deu um beijo no garoto e disse: — Pronto, agora vai sarar. E todos os nove competidores deram-se os braços e andaram juntos até a linha de chegada. O estádio inteiro levantou e os aplausos duraram muitos minutos. Muita gente, entre os que estavam no estádio e outros 109


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que souberam da história, não se esquecem do episódio e o mencionam sempre. Neste mundo moderno, de padrões dúbios, deparar-se com um gesto como esse nos faz refletir sobre os verdadeiros valores, sentimentos e virtudes que, mais do que bem-estar, podem nos transformar e gerar profundas realizações. Aqueles atletas talvez tivessem deficiências mentais, mas com certeza não eram deficientes da sensibilidade, porque eles, mais do que nós, que somos considerados normais, sabem que o mundo é para ser compartilhado e não disputado palmo a palmo. Sabem que o que importa na vida não é ganhar sozinho e sim ajudar os outros a vencer, mesmo que isso signifique diminuir o passo e mudar de curso. O fato é que atitudes assim só são possíveis se nos respeitarmos uns aos outros, caminharmos juntos, dizendo sempre a verdade, com desprendimento e procurando conhecer o lado bom dos outros. Só se consegue chegar a esse patamar se nos propusermos a combater o individualismo em favor das ações em grupo, focando na honestidade, integridade e respeito às pessoas. É fundamental acreditar na importância do amor, promover a confiança, a abertura, o trabalho em equipe, o espírito profissional e, principalmente, o desejo de dar o melhor de si em tudo que se faz. Esses são valores que devem determinar os princípios 110


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de uma empresa, aplicáveis em todas as ações, além, é claro, de prescrever o comportamento que se espera de cada colaborador na condução de suas atividades e não aspirar apenas dividendos financeiros, progressos materiais que agregam apenas algum status social. O bom êxito em qualquer empreendimento humano torna-se possível quando sustentado por atitudes simples, como nos ensinaram os atletas de Seattle. Eles, os heróis das Olimpíadas Especiais, nos ensinam que, quando imaginamos já ter aprendido tudo na vida, não podemos esquecer ainda há muito a aprender.

27 O segredo de Joe

Esta história sempre foi tratada como anedota, mas guarda lições interessantes. Joe tem uma carreira de sucesso, mas é torturado por uma dor de cabeça que aumenta a cada ano. Quando sua saúde mental e sua vida amorosa começaram a ficar ameaçadas, ele procurou auxílio médico. Depois de perambular de um especialista para outro, finalmente descobriu um médico que resolveu o problema. 111


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— A boa notícia é que eu posso curar sua dor de cabeça. A má notícia é que isso requer sua castração. Você tem uma condição muito rara que causa o esmagamento de seus testículos contra a base da espinha. A pressão causa uma dor de cabeça insuportável — a única maneira de diminuir a pressão é removendo os testículos. Joe ficou chocado e deprimido. Questionou se havia algum motivo para continuar vivendo, até conformar-se com a situação. Algum tempo depois decidiu entrar na faca. Quando deixou o hospital, sua cabeça estava límpida, ao mesmo tempo em que sentia que algo importante do seu corpo havia desaparecido. Andando pela rua, percebeu que podia recomeçar, viver uma nova vida. — Eu preciso é de um terno novo. Entrou em uma loja de roupas masculinas e pediu a roupa. O vendedor o examinou de cima a baixo: — Sim, tamanho 52. Joe sorriu: — Você está certo? Como você conseguiu? — É minha profissão — disse o vendedor. O terno serviu como uma luva. Enquanto Joe se olhava no espelho, o vendedor 112


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perguntou: — E que tal uma camisa nova? Vejamos... colarinho 42. Joe experimentou a camisa e ficou perfeita. — E que tal um par de sapatos novos? O vendedor olhou para os pés do Joe: — 41. Joe experimentou os sapatos e eles encaixaram como chinelos. O vendedor aproveitou para vender-lhe um agasalho e uma camiseta, sempre acertando o tamanho. Por fim, ofereceu uma cueca nova. — Tamanho 3. Joe deu uma risada: — Agora você errou. Eu sempre usei tamanho 2. O vendedor balançou a cabeça: — O senhor não pode usar tamanho 2. Ela vai ficar muito apertada, pressionar seus testículos contra a espinha e lhe dar uma desgraçada de uma dor de cabeça. Os segredos de um bom vendedor são inúmeros. Nesse exemplo podemos ver que um bom vendedor é alguém bem-informado, sabe tudo sobre o produto que vende e não é surpreendido por qualquer pergunta do cliente. 113


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Ele sabe cativar o cliente das mais variadas maneiras, e assim formar um capital social em torno da profissão que exerce. O grande vendedor é conhecido pelos clientes como um profissional competente, solícito e, sobretudo, ético. Descobre as necessidades do cliente para saber qual produto oferecer. E, principalmente, apresenta soluções e sabe defendê-las com bons argumentos, muitas vezes cativando e deslumbrando o comprador.

28 O fotógrafo

Num determinado país, de ditadura socialista, havia uma lei obrigando os casais a ter filhos, para que no futuro aquelas crianças servissem como mão de obra para a manutenção do governo. A lei previa uma tolerância de cinco anos para a gravidez. Caso algum casal completasse cinco anos de casamento sem filhos, o governo destacaria um agente para auxiliar o casal.

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Assim tivemos o seguinte fato, em que marido e mulher dialogam: — Querido, hoje completamos o 5º aniversário de casamento. — É... infelizmente não tivemos um herdeiro. — Será que eles vão enviar o tal agente? E se ele vier? — Bem, não temos nada a fazer. Minutos mais tarde, batem à porta. Era um fotógrafo distraído que se enganara de endereço: — Bom dia, eu sou o... — Ah! Já sei... Pode entrar... — Seu marido está em casa? — Não, ele foi trabalhar. — Presumo que ele está a par... — Sim. — Ótimo, então vamos começar? — Mas já?... Assim tão rá-rápido?... — Preciso ser breve, pois ainda tenho seis casais para visitar. — Puxa, o senhor aguenta? — Gosto muito do meu trabalho, ele me dá muito 115


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prazer. O fotógrafo examina os ambientes antes de decidir: — Permita-me sugerir, uma no quarto, duas no tapete, duas no sofá, uma no corredor, duas na cozinha e a última no banheiro. — Nossa, nã-não é muito? — Na primeira tentativa pode não dar certo, temos que garantir um trabalho perfeito. — O senhor já visitou alguma casa neste bairro? — Não, mas tenho aqui comigo algumas amostras dos meus últimos trabalhos. Ele mostra um álbum de fotos de crianças. — Não são lindas? — Muito. O senhor mesmo os fez? — Sim, veja este aqui. E mostra uma foto na porta de um supermercado. — Nossa!... Não lhe pareceu um tanto público? — A mãe era artista de cinema e queria publicidade. — Eu não teria coragem de fazer isto... — Esta aqui foi em cima de um ônibus... — Que horror! — Um dos serviços mais duros que eu já fiz. Já esta 116


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foi num parque de diversões em pleno inverno. — Como o senhor conseguiu? — Não foi fácil: não bastasse a neve caindo, tinha uma multidão em cima de nós, quase que não consegui acabar. — Menos mal que sou discreta, não quero que ninguém nos veja. — Ótimo, também prefiro assim. Agora, se me der licença, vou armar o tripé. — TRIPÉÉÉÉ? Pra quê? — Madame, meu aparelho, além de pesado, depois de pronto para funcionar, mede mais de um metro. A mulher desmaiou. No mundo moderno aprendemos a correr contra o tempo, mas não a esperar com paciência. Construímos mais computadores para armazenar cada vez mais informações, mas temos menos comunicação. A comunicação é um exercício de identidade A marca representa a instituição — e o segredo para o sucesso se resume em uma palavra: comunicação. Ela é a alma da empresa, precisa fluir em todas as direções. Comunicar é o ato de tornar comum, fazer com que aquele produto ou serviço se torne necessidade pessoal. Isso desencadeia a interação social, além da comunicação ser instrumento formador de cultura e, modelador do 117


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comportamento das pessoas. A comunicação para ser eficaz é necessária que seja feita de maneira plena. Se ela é feita pela metade, quando o receptor não deixa o emissor terminar sua fala, pode levar a mal entendidos. Com sérios prejuízos à marca e a todos os envolvidos, como ocorreu com a pobre mulher e o fotógrafo.

29 Visão futura — A lição do menininho

A pracinha estava deserta quando José sentou-se à sombra de um velho carvalho para ler um livro. Tinha boas razões para chorar, pois acreditava piamente que o mundo estava tentando afundá-lo. E se não bastasse ter razões suficientes para arruinar o dia, um garoto todo ofegante chegou, cansado de brincar, parou a sua frente e com voz inocente disse: — Veja o que encontrei! Em sua mão, uma flor. E que visão lamentável! As pétalas estavam caídas e murchas, provavelmente pela pouca exposição à luz ou pela falta d’água. 118


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Querendo se livrar do garoto, José fingiu um pálido sorriso retornando seu olhar para o livro. Porém, em vez de ir embora, o garoto sentou-se ao lado, levou a flor ao nariz e declarou com estranha surpresa: — O cheiro é ótimo. Por isso trouxe para você. A flor estava morta ou morrendo, mas José sabia que tinha que aceitar o presente — ou o garoto jamais sairia de lá. Estendeu a mão para pegá-la e respondeu: — Estava precisando de uma flor para animar meu dia. Para espanto de José, o menininho ficou segurando a flor, sem entregá-la. Nessa hora, o homem notou que o garotinho era cego. José perdeu a voz, mal conseguiu balbuciar: — Obrigado por você ter escolhido a flor mais bonita daquele jardim. — De nada — disse o menino. Então levantou e voltou a brincar, sem perceber o impacto que havia causado. José se pôs a pensar como o garoto cego conseguiu enxergar um homem sentado sob um velho carvalho? Como ele sabia do seu sofrimento autoindulgente? Talvez seu coração tenha sido abençoado com a verdadeira visão: aprendera a enxergar o que não está visível. 119


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José levou aquela feia flor ao nariz e sentiu sua fragrância. Sorrindo, viu o garoto com outra flor nas mãos, prestes a mudar a vida de um insuspeito senhor de idade em outro canto da pracinha. Empresas inovam, evoluem e têm sucesso. Mas depois de algum tempo muitas se estragam, declinam e até morrem, não obstante o fato de terem como gestores pessoas inteligentes, experientes e de bom nível. Poderíamos afirmar que é por falta de visão. Ficam estagnadas e presas às rotinas sem conseguir enxergar ou tentar construir uma visão futura. A maioria dos planos organizacionais fala em melhorar o presente em lugar de criar o futuro. As empresas precisam estabelecer e manter um equilíbrio saudável entre continuidade e inovação — e essa passa, necessariamente, por uma boa visão. Diante do desafio de planejar em ambiente cada vez mais complexo e competitivo, a visão passou a ter importância fundamental na construção do futuro. Afinal, não se pode criar o futuro, lucrar com o futuro sem antes imaginá-lo, como ensinava Peter Drucker. Uma visão bem definida energiza a empresa e cria o ambiente propício a novas ideias. Como sabemos, nenhuma matéria-prima é mais relevante para a empresa, seja qual for seu ramo de atuação, do que as ideias. 120


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Há mais de dois mil anos, Sun Tzu ensinava que “não é preciso ter olhos para ver o sol, nem é preciso ter os ouvidos afiados para ouvir o trovão. Para ser vitorioso você precisa ver o que não está visível”. Aquele garoto conhecia esse princípio. E sabia como aplicá-lo.

30 A lição de Mané Tibiriça

De maneira geral, no ambiente da roça prevalece a música de viola. A moda de viola tem uma característica interessante: sempre conta uma história, na maioria das vezes de dor de cotovelo. Outras trazem até uma lição de vida, como esta de Mané Tibiriçá. O enredo era mais ou menos assim. Era um agricultor muito pobre, de um lugar próximo a um riacho, onde tinha sua rocinha de milho. Todos os dias os passarinhos atacavam sua plantação. Para afugentá-los, ele fez um espantalho. Esse lavrador tinha um filho, menininho de oito anos, que não tendo com quem brincar, passou a usar o espantalho como seu parceiro de aventuras — e tratou de chamá-lo de Mané Tibiriçá. 121


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Todos os dias o menino ia ao milharal brincar com seu amigo Mané. Certo dia houve uma chuva forte, provocando uma enchente. Para desespero do menino, a força das águas levou o Mané embora. O garoto ficou tão triste que perdeu totalmente a voz. O pai fez de tudo para curá-lo. Em sua carroça levou-o à cidade, consultou vários médicos e nada do menino recuperar a voz. Tempos depois, quilômetros rio abaixo, um velho pescador fisgou o espantalho. Na sua pureza, pensou que era um santo. Construiu uma igrejinha e colocou o Mané no altar. Todos os dias o povo ia rezar, e o Mané, como se diz no interior, danou a fazer milagres, ficando famoso na região. O agricultor ouviu a história de um santo milagreiro a um dia de viagem de carroça. Não teve dúvida: bem cedo pegou o filho e partiu para a igrejinha. Ao chegarem, o pequeno santuário estava lotado. O garoto e seu pai caminharam em direção ao altar. Quando avistou o santo, o menino não se conteve. Apontando para o santo, gritou: — Vocês pensam que me enganam, este santo não é santo, ele é o Mané Tibiriçá. Mais um milagre do Mané. Em um ambiente repleto de ameaças, ambiguidades e coações que exigem decisões rápidas, porque tudo muda 122


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a toda hora, o gestor tem que buscar melhorias em todos os processos, para cada vez mais criar valor aos clientes. Para isso é preciso acreditar sempre. Acreditar que você pode ser um “agente transformador” de você mesmo e do mundo ao seu redor. E então agir. Acreditar e agir nos encaminha ao porto seguro chamado autoconfiança, um dos grandes pilares de nossas conquistas. Porém, acreditar, agir e construir autoconfiança também não é suficiente, tendo em vista que muitas vezes, ao tentarmos construir um mundo novo ao nosso redor, nos falta uma palavrinha: humildade. Falta humildade em querer aprender com quem sabe, humildade em transferir ensinamentos, humildade em ter vergonha de assumir determinados fatos, humildade em se doar. A humildade é uma preciosidade na evolução humana. Com ela nos tornamos seres humanos melhores, fazendo um grande bem para toda a coletividade, mas principalmente para nós mesmos. É importante que façamos um pacto à humildade em nossos corações. Só assim poderemos vislumbrar, sob outro ângulo, a beleza das pessoas e do mundo corporativo onde passamos a maior parte de nossos dias. Se até o Mané Tibiriçá, que é um espantalho, pode, por que nós não podemos? É só acreditar.

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31 O exemplo do pianista

Desejando encorajar o progresso de seu jovem filho ao piano, uma mãe levou-o ao concerto de Paderewski. Depois de se sentarem, a mãe viu uma amiga na plateia e foi até ela para saudá-la. O menino não perdeu a oportunidade de explorar as maravilhas do teatro, se levantou e eventualmente suas explorações o levaram a uma porta onde estava escrito: PROIBIDA A ENTRADA. Quando as luzes abaixaram e o concerto estava prestes a começar, a mãe retornou ao seu lugar e descobriu que seu filho não estava lá. As cortinas se abriram e as luzes caíram sobre um impressionante piano Steinway no centro do palco. Horrorizada, a mãe viu seu filho sentado ao teclado, inocentemente catando as notas de “Cai, cai, balão”. Naquele momento, o grande mestre de piano fez sua entrada, rapidamente foi ao piano, e sussurrou no ouvido do menino: 124


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— Não pare, continue tocando. Então, debruçando, Paderewski estendeu sua mão esquerda e começou a preencher a parte do baixo. Logo, colocou sua mão direita ao redor do menino e acrescentou um belo acompanhamento de melodia. Juntos, o velho mestre e o jovem noviço transformaram uma situação embaraçosa em uma experiência maravilhosamente criativa. O público estava perplexo. O que podemos conseguir sozinho mal vale mencionar. Fazemos o melhor possível, mas os resultados não são exatamente como uma música graciosamente fluida. Assim, como o verdadeiro líder não pode ter receio de ensinar, o colaborador não pode temer a ousar. Não existe mais espaço para gestores que não sejam instrutores de seus próprios colaboradores e não há mais espaço para colaboradores que não estejam dispostos e abertos a novos ensinamentos. O gestor deve ser capaz de perceber em segundos, como fez Paderewski, as habilidades naturais de cada componente de sua equipe. Deve ter a capacidade de fazer com que as pessoas se apaixonem por desafios e os colaboradores devem ter coragem para ousar.

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Ele deve ser capaz de fazer com que seus colaboradores acreditem que possam fazer até mesmo o que para eles parecia ser impossível, inspirando-se no exemplo do pequeno pianista. O gestor deve ser capaz de transformar cada tarefa em um objetivo comum, encorajar seus colaboradores a assumir riscos e vencer desafios, ensinando-os a conviver com as adversidades, encorajando-os a superar dificuldades.

32 Onde está o seu talento?

Uma antiga lenda grega conta que os deuses do Olimpo se reuniram para discutir a evolução do homem que os estava preocupando. Os mortais estavam se desenvolvendo tão rapidamente que, em breve, alcançariam os dons até então exclusivos dos seres divinos. Era preciso esconder do homem o seu talento, essa qualidade tão especial que permite que ele alcance os céus, como os pássaros, e cruze os mares, como os peixes. Pensaram em esconder o talento no fundo do mar, 126


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nos abismos inalcançáveis, no topo das montanhas, onde só existe a neve eterna. Mas não chegaram a uma solução, pois o homem, com seu potencial criativo e a sua inteligência, arranjaria mil maneiras de encontrar o talento escondido. Depois de muita conversa, concordaram que só havia um único lugar seguro para esconder do homem o seu próprio potencial. Um lugar para onde ninguém jamais olharia na busca por seu próprio valor. E esse esconderijo só poderia ser no interior do próprio homem, justamente onde ele jamais procuraria o seu talento escondido. O ser humano é constituído de um esplêndido conjunto de dimensões, dons e talentos. O mais excepcional valor de uma pessoa é sua índole em perene gestão e aprimoramento. Na encruzilhada da vida fazemos nossas escolhas pessoais, que em sua maioria acompanham as tendências da moda que nos serve de imediato referencial. Nossos valores internos ficam lá adormecidos uma vez que não damos a eles importância alguma, pois não condizem com a realidade do mundo exterior. Existe hoje uma forte tendência de se valorizar os bens materiais, de se valorizar o impermanente em detrimento do que é permanente. Muitas das nossas angústias resultam do inglório 127


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esforço que fazemos para que a matéria, impermanente, permaneça indefinidamente. Em vão: a vida é impermanente. Apesar disso, insistimos em querer manter e conservar. Insistimos em permanecer ligados àquele amor que passou, ao corpo que era mais jovem e nos esquecemos de aprender e de viver o que é relevante. Vivendo no passado e presos a valores materiais, vaise morrendo um pouco a cada dia. Deixamos de cultivar virtudes que são facilmente relativizadas, no meio da confusão. A humildade, a simplicidade, a justiça, o amor, são virtudes e sentimentos que têm a capacidade de nos tributar sobrevivência e jovialidade ao longo do tempo. É um exercício, esse de saber diferenciar o que é permanente do impermanente. O bom êxito em qualquer empreendimento humano torna-se possível quando sustentado por atitudes simples, precedidas de discernimento. Buscar os verdadeiros valores não é algo concreto, tão palpável como um objeto material, consiste num aprendizado constante mediante as adversidades e as diferenças entre as pessoas. Um processo que sempre visa ao benefício de todos os envolvidos no processo organizacional, assim, o que 128


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prevalece não é a lei do ganha, é a lei do dividir para somar. Que possamos olhar para dentro de nós mesmos e buscar o que verdadeiramente importa.

33 Uma questão de escolha

A vida é uma questão de escolha, principalmente quando, ante a irracionalidade, optamos pela nobreza de espírito, ante a malícia, preferimos a pureza de coração, ante a dubiedade, amamos a transparência de caráter. É viver não do que já está definido, do que já está dito, entendido e conhecido, mas a partir do que vai se manifestando enquanto possibilidades e, assim, nenhum dia é igual a outro. Ninguém é hoje como era ontem. A meta, ser melhor que ontem, mas não melhor que ninguém. Todas as pessoas e criaturas são, a cada instante, a visibilidade da novidade que ocorre dentro delas, dos seus sonhos, das alegrias que vão colhendo pelo caminho, dos ganhos obtidos pelos obstáculos enfrentados. Só pessoas com essas opções são capazes de mudar a maneira de pensar de toda uma geração. 129


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Porque só elas olham para o passado e dele procuram aprender. Só elas olham para o presente no intuito de traduzir em ‘realização’ os sonhos que acalentam. Tais pessoas sabem da preciosidade do tempo e do quanto ele ‘foge’ de suas mãos. Ah!... se todos os dias fôssemos capazes de silenciar e considerar o que também pode saciar nossa sede de paz, de alegria, de plenitude e de sentido a tudo o que fazemos! Vivemos imersos no contexto das falácias, da pressa, da velocidade, do barulho. Nem sempre é o amor, mas sim a pressa que rege nossa vida. Por todo lado encontramos pessoas falando, fazendo isso ou aquilo, mas nem sempre imbuídas da fala daquilo que constitui a inspiração de uma vida construída com base em valores éticos, morais e espirituais.

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34 Nada de novo

Edwin Land passeava em Santa Fé — Novo México, fotografando a paisagem, acompanhado de sua filha de três anos, quando a menina lhe perguntou por que não podia ver naquele momento as fotos que o pai fazia. A partir daí, Land pensou em uma máquina de revelação instantânea, tempos depois descrita a um representante da Polaroid. Cinco anos mais tarde a Polaroid passou a produzir as câmaras de fotos instantâneas, com espetacular sucesso. Peter Gikdnark estava ouvindo um disco do Pianista Vladimir Horowitz, tocando Brahms, quando se aborreceu porque a música era interrompida para a mudança de lado do disco, à época, com 78 rotações por minuto. Goldmark revolucionou o mercado da música inventando o long play: discos de 33 1/3 rotações por minuto, com tempo muito maior de execução das músicas. Josephine Cochrane possuía um restaurante. Irritada com o fato de seus empregados quebrarem pratos aos laválos, inventou a máquina de lavar pratos. Frank Macnamara estava em companhia de amigos 131


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num restaurante em Nova York quando, na hora de pagar a conta, descobriu embaraçado que tinha perdido sua carteira e o dinheiro. Descontente com a situação, teve a ideia de criar um cartão de crédito: o Diners Club. Lee Gerstenzang ficou aborrecido ao ver sua esposa tentando limpar as orelhas de seu bebê com palitos de dente enrolados em algodão. Nasciam aí os cotonetes. George de Mestral fazia um passeio próximo a Genebra, na Suíça, quando notou carrapichos na sua roupa. Curioso, utilizou um microscópio e descobriu que os carrapichos possuíam minúsculos ganchos que fixavam em qualquer superfície porosa. Idealizou o velcro usando o mesmo princípio — minúsculos ganchinhos e presilhas — invenção considerada uma das maiores do século XX. Dois fatores moveram essas pessoas para suas criações: 1 – A insatisfação com alguma coisa. 2 – A observação do que se passa a sua volta. Muitos líderes estão, há muito tempo, sem criar nada nas suas empresas, acomodados com a situação. A insatisfação externada não é forte o suficiente para mudar as coisas, buscar soluções, encontrar ideias. E pior: a maioria deles não consegue enxergar mais nada. Todos nós podemos ser criativos — entretanto, é preciso saber o que significa ser uma pessoa criativa. 132


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É aquela que possui habilidade para gerar ideias, não somente originais, mas principalmente originais e úteis. Pessoas assim conseguem ver o que não está visível. Quer dizer, elas olham para as mesmas coisas que os outros olham, mas veem e pensam de forma diferente. Certo dia Joseph Montgolfier estava próximo ao forno onde sua esposa havia colocado uma camisola para secar. Para sua surpresa percebeu que a camisola começou a levitar. Joseph viu muito mais do que uma camisola flutuando. Procurou seu irmão Etienne e juntos tiveram a ideia de construir um grande invólucro em forma de pera, feito com papel e seda, e uma abertura na base para fosse inflado com fumaça de palha queimada. Nasceu assim o balão de ar quente. Podemos concluir que Joseph e Etienne eram pessoas criativas e inovadoras. Como todos os demais protagonistas aqui selecionados. O que eles fizeram não é um privilégio de poucas pessoas. Basta enxergar o que não está visível para criar soluções, e até gerar revoluções que impactam a vida da sociedade.

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35 O que Konosuke Matsushita nos ensina

Em novembro de 1894, numa pequena aldeia perto de Wakayama, ao sul de Osaka, nasceu um dos maiores nomes da história da indústria, Konosuke Matsushita — sinônimo de empreendedorismo, competência e realização. Ele começou a trabalhar muito cedo como aprendiz em uma loja hibachi e, devido aos seus afazeres na loja, não sobrava muito tempo para estudar. Assim conseguiu estudar somente até o quarto ano do primário. Na adolescência, conseguiu um emprego de inspetor na Osake Electric Light, como assistente técnico de cabos. Como se tratava de um garoto muito experto e de aprendizado rápido, foi promovido em várias ocasiões. Konosuke tinha uma relação muito estreita com seu pai. Foi ele que o incentivou a abrir seu próprio negócio, mostrando-lhe as vantagens de ser um empresário e dono de seu próprio negócio. Em 15 de junho de 1917 o jovem Konosuke abandou a segurança de um emprego bem-remunerado e fundou sua própria empresa de manufatura de acessórios elétricos, dando134


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lhe o nome de Matsushita Electric Devices Manufacturing Works. O primeiro produto da empresa foi um adaptador de tomadas, lançado em 1918. Ele trabalhava em sua própria casa, em companhia da esposa e de um cunhado. A tomada permitia conectar uma lâmpada e um aquecedor elétrico ao mesmo tempo. Tecnologia avançada para a época, porém, foi um fracasso total. Ninguém comprou. Mas, Matsushita não se apavorou: foi em busca de novas alternativas e começou a comercializar placas isoladoras, cujos diferenciais em relação a seus concorrentes eram a qualidade elevada e, principalmente, entregas no prazo. Assim, conseguiu ganhar algum dinheiro e, em 1923, inventou um novo tipo de lâmpada para faróis de bicicleta. O negócio deu tão certo que cinco anos depois ele foi obrigado a construir uma nova fábrica. Em 1929 o nome da empresa foi alterado para Matsushita Electric Manufacturing Works, definindo também a filosofia básica da administração, seus sete princípios e o lema corporativo que serviriam de base para o crescimento da companhia. Nessa época, o fundador adoeceu e ficou afastado da empresa. Em 20 de dezembro daquele ano, Toshio Iue e Itsuro Takeshisa, gerentes da empresa, foram levar-lhe uma triste notícia: as vendas haviam se reduzido a menos da metade, 135


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acumulando produtos no estoque. Eles estavam convencidos de que era necessário demitir pelo menos 50% dos funcionários para tentar salvar a empresa. Surpreendentemente, Matsushita os fez levantaremse da prostração e encontrar forças, ordenando-lhes que reduzissem a produção e a jornada de trabalho pela metade. Solicitou que todos os funcionários se preocupassem em vender o excesso de estoque da empresa, com o que não seria reduzido o salário de ninguém; também não autorizou a demissão de qualquer funcionário. Foi uma decisão surpreendente, uma vez que a filosofia de não demitir foi adotada por outros empresários japoneses somente depois da 2ª Guerra Mundial. Também não era comum pedir para que um operário do setor de produção se dedicasse a vendas. Ações como estas faziam de Konosuke Matsushita um empresário especial, distante daqueles que tomavam decisões convencionais. Nenhuma empresa no Japão da época mantinha uma orientação tão clara dirigida para o cliente, que tivesse os custos tão baixos, e mantivesse relações de trabalho e políticas de marketing audaciosas. Nem mesmo a crise de 1929 conseguiu abalar as estratégias da Matsushita. Em1932, Konosuke já empregava mais de mil pessoas, tinha 10 fábricas e 280 patentes, produzia seiscentos diferentes tipos de produtos, ampliando 136


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suas vendas para os mercados internacionais. E em 1942, a Matsushita se tornou a primeira fabricante de rádios do Japão. Apesar do grande crescimento da empresa, seu criador fazia questão de manter presente os princípios que o guiavam, colocando as necessidades de clientes e colaboradores em primeiro lugar. Na 2ª Guerra Mundial fabricou navios e aviões. Em princípios da década de 1950, iniciou a produção de lavadoras elétricas e televisores, na esteira da crescente popularidade dos aparelhos elétricos. Em 1960 passou a produzir TVs coloridos. A Matsushita Electric Co. é, sem dúvida, uma das maiores e mais bem-sucedidas companhias do mundo, detentora de marcas como Panasonic, National, Technics, JPC. Cresceu de apenas três para 290 mil funcionários — com um faturamento de mais de 50 bilhões de dólares. Continua seguindo a filosofia de seu fundador, derrubando barreiras tecnológicas, dando enfoque à eficiência e qualidade da produção. Konosuke Matsushita era um homem do mundo que pensava no mundo. Já em 1932 pregava a seus funcionários que a missão do dono de uma manufatura é contornar a pobreza, para aliviar a sociedade desse flagelo e trazer-lhe riqueza. Os negócios e a produção não foram destinados a enriquecer apenas as lojas e as fábricas, mas também as 137


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pessoas. Dava conselhos ainda hoje válidos: Em primeiro lugar, a prosperidade nos negócios depende de quanta compreensão se recebe das pessoas com as quais se negocia. Outro: o serviço pós-venda é mais importante do que a assistência pré-venda. Com esse tipo de serviço são conquistados clientes permanentes. E ainda: não venda produtos para os quais os clientes se sintam atraídos, vendalhes aqueles que lhes trarão benefícios. Qualquer desperdício, mesmo de uma folha de papel, aumentará o preço do produto na mesma proporção. Falta de estoque é desleixo — se isso acontecer, peça desculpas ao cliente, anote seu endereço e diga-lhe que você entregará o produto imediatamente. A experiência de Konosuke Matsushita pode ser uma lição para as lideranças de hoje, já que as situações se mostram tão desafiantes e a economia tão competitiva quanto foi para ele.

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36 O Bolero de Ravel e a Administração

Maurice Ravel nasceu em Ciboure no dia 7 de março de 1875. Ele deve a seu pai sua iniciação no universo musical. Entrou no conservatório de Paris em 1889. Dois anos depois conseguiu o segundo prêmio de um concurso em Roma, com sua cantata Myrrha. Construiu uma carreira de sucesso, embora seu humor, cuja agressividade mascarava uma profunda ternura, nem sempre fosse entendido pelo público. No início da 1ª Guerra Mundial engajou-se como motorista, mas sua saúde frágil obrigou-o a desmobilizar-se em 1917, mesmo contra a vontade. Em 1919 retomou um antigo projeto, um poema coreográfico que denominou de La Valse. Um ano mais tarde optou pelo isolamento, instalando-se num lugarejo chamado Montfort-I Amaury — a casa em que morou foi, posteriormente, transformada em museu. Naquele mesmo ano suas composições, em especial a Sonata para violino e violoncelo, começavam a revelar ao mundo um compositor despojado, mais austero e mais aberto 139


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ao encanto harmônico, segundo sua própria definição. Ravel compôs o seu bolero em 1928; com ele deu a volta ao mundo atuando como regente em concertos nos EUA e em toda a Europa. Suas apresentações sempre lhe traziam com uma acolhida triunfal. A criação da obra merece ser descrita. A dançarina Ida Rubinstein estava preparando um novo espetáculo e pediu a Ravel que orquestrasse algumas páginas do compositor Albeniz. Ela fizera esse mesmo pedido a outro músico. Ocorre que Ravel decidiu compor uma obra nova e escolheu o bolero, fundamentado pelo ritmo repetitivo e sua simplicidade melódica. A peça é uma sutil mistura de folclore, desenvolvido por meio de uma genial inspiração. A obra consiste em 18 compassos ao longo de uma melodia espanhola em ritmo de bolero, ininterruptamente repetida. A instrumentação em contínua repetição se torna cada vez mais vigorosa, mais concentrada, aumentando o volume da execução. A obra leva a cabo um incrível, persistente e crescente suspense, que próximo ao fim descarrega-se por intermédio de uma repentina, e de forma idêntica, mudança de tonalidade, antes do clímax gerado pelo vivo final. É um teste de habilidade para o regente, que precisa manter com a orquestra uma poderosa e uniforme linha sem interrupção durante toda a extensão da obra. 140


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Ravel foi bastante ousado. Tanto que na sua primeira apresentação os próprios frequentadores da Ópera também ficaram surpreendidos. Eram 17 minutos de um longo e progressivo crescendo, a ponto de alguém da plateia exclamar: “É um louco!” Segundo Ravel, essa era a prova de que, pelo menos essa pessoa, havia compreendido sua obra. Era a noite de 22 de novembro de 1928 e aquele público assistira ao nascimento de uma das páginas mais célebres da literatura orquestral do século XX, uma obra em que nem mesmo Ravel acreditara. Você deve estar pensando, o que tem a ver o Bolero de Ravel com administração. Vamos aos fatos. A música e a administração são compostas por elementos — na música esses elementos são as notas musicais que quando combinadas em diversos instrumentos que dão origem a uma melodia. Já na administração os elementos são as diversas variáveis que, integradas, formam um modelo, uma forma de gestão. Na música, ficamos parados e os elementos (a melodia) passam pelos ouvintes. Já na administração, a pessoa precisa sair em busca dos elementos, trabalhando cada um para formar um modelo de gestão. Significa que na música os elementos não se alteram — qualquer músico irá executar sempre a mesma melodia; na administração, não: cada um compõe sua própria melodia, integrando cada um dos elementos da administração. 141


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É por isso que não existe uma maneira certa de administrar, como dizia Joan Woodward, tudo depende. Imagine-se sentado em uma sala de concerto, com a orquestra distribuída a sua frente. Esse conjunto razoavelmente grande de instrumentos não é, em absoluto, um agrupamento ao acaso dos elementos disponíveis. Como em uma empresa, a orquestra também tem seu layout. Trata-se de uma unidade altamente organizada e equilibrada, composta de quatro naipes ou famílias de instrumentos. Normalmente na frente está o regente, depois vêm os instrumentos de cordas, logo atrás os instrumentos de madeira, em seguida os metais e por último os instrumentos de percussão, que se localizam no fundo da orquestra. Os instrumentos de cada naipe compartilham certas características comuns à família. Como na empresa, onde cada departamento é dividido de acordo com as tarefas comuns e similares. A localização dos naipes da orquestra na plataforma de concerto obedece a uma razão prática. Por causa das características comuns a cada família, os instrumentos de cada naipe são dispostos lado a lado ou um atrás dos outros formando grupos. A plataforma é construída em planos sucessivamente elevados; os naipes são dispostos de forma a proporcionar equilíbrio e combinação entre os variados sons e timbres instrumentais. 142


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Em uma linha de montagem ou em qualquer departamento de uma empresa, os layouts também não são definidos de forma aleatória. Ao contrário, são produtos de estudos que irão posicioná-los a fim de oferecer melhores condições no ambiente de trabalho e, consequentemente, proporcionar maior produtividade. Gandhi costumava dizer que líder não é quem vai à frente, mas quem vai atrás apontando os caminhos. A visão de liderança tem mudado muito nas empresas, que hoje trabalham com equipes menores e mais especializadas, relativizando as ordens em benefício de maior delegação de tarefas e inter-relações humanas. A orquestra trabalha da mesma forma. Se você prestar atenção no Bolero de Ravel, irá perceber que ele começa exatamente com os tambores que estão localizados na cozinha da orquestra. Durante todo o desenvolvimento da melodia eles vão ditando o ritmo e a cadência para todos os instrumentos, que vão se somando à música. Outra analogia que podemos fazer com o Bolero é que ele tem uma sequência e uma melodia que se repete ao longo de todo o seu desenvolvimento. À medida que vai se desenvolvendo, vai agregando instrumentos, começando pelos de madeira, as flautas, clarinetas e fagotes. Logo em seguida juntam-se os instrumentos de metais, trompa, trompetes, oboés e saxofones, para terminar em uma apoteose com 143


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todos os instrumentos repetindo a melodia ao mesmo tempo. Em uma empresa não é diferente. Cada departamento, cada seção, cada grupo, cada indivíduo vai agregando valores até chegar a um produto/ou serviço final oferecido ao mercado. Para isso é necessário buscar constantemente harmonia, integração e sinergia entre as diversas áreas. Assim como na empresa, se na orquestra as equipes não estiverem integradas, o som não é o mesmo: o feedback deve ser simultâneo e o treinamento constante permite que o produto final seja o melhor. Perceba que, apesar de o Bolero ter uma harmonia que se repete, cada instrumento que se insere o faz de forma harmônica, agregando valor e tornando a melodia mais forte e mais consistente. Como administrador você terá o desafio de construir o seu bolero. É por isso que a Administração é uma ciência fascinante. Não existem fórmulas pré-definidas, não existem respostas fabricadas: você se obriga a construir a melodia a cada dia em parceria com sua orquestra — ou seja, cada um de seus colaboradores. Uma obra-prima que não é finita. Como no Bolero de Ravel, é necessário acrescentar mais e mais elementos a cada jornada. É o que vai garantir a qualidade do seu trabalho. 144


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37 O diamante

Russell H. Conwell conta que havia, nas proximidades do rio Indo, um persa chamado Ali Hafed. Possuía uma vasta fazenda com jardins, plantações de trigo, animais domésticos e tudo o mais. Tinha dinheiro aplicado. Era um homem rico e satisfeito. Um dia visitou-o um monge budista. Após o jantar, começou a contar-lhe como este mundo é feito. Entre outras coisas, falou-lhe de diamantes, que seriam a luz do sol congelada. Se ele possuísse um diamante do tamanho do dedo polegar, poderia comprar o condado; e se possuísse uma mina de diamantes, poderia instalar seus filhos nos tronos do mundo. Ali Hafed ouviu tudo isso e foi para a cama como um homem pobre. Não tinha perdido nada, mas tornara-se pobre porque se tornara insatisfeito. No dia seguinte, procurou o monge e perguntou-lhe onde poderia encontrar diamantes. — Bem — respondeu o monge —, se você encontrar um rio correndo sobre areia branca, lá encontrará diamantes. Ali Hafed vendeu sua fazenda, juntou o dinheiro que 145


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pôde, entregou a família aos cuidados de um vizinho e partiu à procura de diamantes. Percorreu países do Oriente e do Ocidente, parando em todos os rios que corriam sobre areia branca. Mas nunca encontrou um diamante. Um dia, com a roupa em farrapos, infeliz, esfomeado, desesperado, jogou-se ao mar na costa de Portugal, para nunca mais reaparecer. Já o homem que comprara a fazenda de Ali Hafed, cavando um dia num dos córregos da fazenda, notou um curioso raio de luz. Apanhou a pedra que emitia a luz e colocou-a sobre uma mesa em sua casa. Certo tempo depois, visitou-o aquele monge e, vendo a pedra, gritou: — Diamante! Ali Hafed voltou? — Não — respondeu o fazendeiro — e isso não é diamante, é uma pedra que encontrei no rio. — Mas eu reconheço um verdadeiro diamante! Pois ali foi descoberta a maior mina de diamantes de todos os tempos, a Golconda. Se Ali Hafed tivesse ficado em casa cavando seu próprio jardim, teria encontrado a pedra preciosa. Porém, quantos de nós ainda não percebemos o potencial que existe debaixo de nossos pés? Se você é dos que duvida de sua capacidade, aproveite esta história para refletir; afinal, você é a primeira pessoa que 146


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deve acreditar em si próprio. Automaticamente as pessoas ao redor passarão a também acreditar em você. É claro que existem muitas razões para ter medo de tentar, outras razões para falhar, muitas para desistir. Mas acreditar é fundamental.

38 As pulgas

Em um dia qualquer, duas amigas pulgas estavam conversando: — Sabe qual é o nosso problema? Nós não voamos, só sabemos saltar. — E daí? — questionou a amiga. — Daí que a nossa chance de sobrevivência quando somos percebidas é zero. É por isso que existem muito mais moscas do que pulgas no mundo: moscas voam. Depois de muito divagarem, tendo os cachorros como alvos, tomaram a decisão de aprender a voar. A primeira ação foi contratar uma mosca como consultora; a conselho dela entraram em um programa intensivo; pouco tempo depois 147


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saíram voando. Passado algum tempo, a primeira pulga falou para a outra: — Sabe, voar não é o suficiente, porque ficamos grudadas ao corpo do cachorro. Portanto, o nosso tempo de reação é menor do que a velocidade da coçada dele. Temos que aprender a fazer como as abelhas, que sugam e levantam voo rapidamente. Mais uma vez recorreram a uma consultoria e contrataram o serviço de uma abelha, que lhes ensinou a técnica do chega-suga-voa. Funcionou, mas não resolveu. Porque, como a primeira pulga explicou: — Nossa bolsa para armazenar sangue é muito pequena, por isso temos que ficar sugando por muito tempo. Escapar, a gente até escapa, mas não estamos nos alimentando adequadamente. Temos que aprender com os pernilongos como eles conseguem se alimentar com maior rapidez. Um pernilongo que se dizia o máximo foi contratado para incrementar o tamanho do abdômen. As duas pulgas ficaram felizes. Mas a felicidade durou uns poucos minutos. Como tinham ficado muito maiores, sua aproximação era facilmente percebida pelo cachorro. E elas começaram a ser espantadas antes mesmo de conseguir pousar. Foi aí que 148


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encontraram uma saltitante pulguinha dos velhos tempos: — Ué, o que aconteceu com vocês? Vocês estão enormes! — Pois é, agora somos pulgas adaptadas aos grandes desafios do século XXI. Voamos em vez de saltar, picamos rapidamente e podemos armazenar muito mais alimento. — E por que é que vocês estão com essa cara de subnutridas? — Isso é temporário, já estamos consultando um morcego, que vai nos ensinar a técnica do radar. E você? — Ah, eu vou bem, obrigada, forte e sacudida. Era verdade. A pulguinha estava viçosa e bem alimentada. Mas as duas pulgonas não quiseram dar a pata a torcer: — Você não está preocupada com o futuro? Não pensou em uma consultoria? — E quem disse que eu não tenho uma? Contratei uma lesma como consultora. — O que lesmas têm a ver com pulgas? — Tudo. Eu tinha o mesmo problema de vocês. Mas em vez de dizer para a lesma o que eu queria, deixei que ela avaliasse bem a situação e me sugerisse a melhor solução. Ela ficou ali três dias, quietinha, observando o cachorro, tomando notas e pensando. E então a lesma me deu o diagnóstico: 149


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— Você não precisa fazer nada radical para ser mais eficiente. Muitas vezes, uma grande mudança é apenas uma simples questão de reposicionamento. — E isso quer dizer o quê? — questionaram ambas. — Vocês querem saber o que a lesma me sugeriu fazer? — Isso, responderam com interesse. — Simples — disse a pulguinha com convicção — ela me aconselhou a sentar no cocuruto do cachorro. É o único lugar onde ele não consegue alcançar com a pata. O crescimento da concorrência, a valorização do conhecimento como arma de competitividade, o ritmo frenético das inovações tecnológicas que aproximaram o relacionamento cliente-empresa, criaram mudança de valores: organizações flexíveis são indispensáveis aos tempos atuais, a renovação contínua tornou-se matéria de sobrevivência. Diante desse cenário, fala-se muito na necessidade de mudança, em quebra de paradigmas, em reconstrução e reengenharia. Pode ser bom, mas pode ser uma armadilha. Concluindo: sobreviver, desabrochar, inovar, mostrar excelência e liderança nessa nova realidade nos exigirão ir além da eficácia, o que não significa passar a borracha e começar tudo de novo.

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39 Uma questão de reconhecimento

O homem por de trás do balcão olhava a rua de forma distraída. Uma garotinha se aproximou da loja e amassou o narizinho contra o vidro da vitrine. Os olhos da cor do céu brilharam quando viu determinado objeto. Entrou na loja e pediu para ver o colar de turquesa azul. — É para minha irmã, pode fazer um pacote bem bonito? O dono da loja olhou desconfiado para a garotinha: — Quanto dinheiro você tem? Sem hesitar, ela tirou do bolso da saia um lenço todo amarradinho e foi desfazendo os nós. Colocou-o sobre o balcão: — Isso dá? Eram apenas algumas moedas o que ela exibia orgulhosa. — Sabe, quero dar esse presente para minha irmã mais velha. Desde que morreu nossa mãe ela cuida de mim e não tem tempo para ela. Como é seu aniversário, tenho 151


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certeza de que ficará feliz, porque o colar é da cor de seus olhos. O homem foi para o interior da loja, colocou o colar em um estojo, embrulhou com um vistoso papel vermelho e fez um laço caprichado com uma fita verde. — Tome — disse para a garotinha — leve com cuidado. Ela saiu feliz saltitando rua abaixo. Ainda não acabara o dia quando uma jovem de cabelos louros e olhos azuis adentrou a loja. Colocou sobre o balcão o embrulho agora desfeito e indagou: — Este colar foi comprado aqui? — Sim, senhora. — Quanto custou? — Ah! — falou o dono da loja — o preço de qualquer produto da minha loja é sempre um assunto confidencial. A moça continuou: — Mas minha irmã tinha somente algumas moedinhas. O colar é verdadeiro, não é? — Sim — respondeu o dono da loja. — Então, ela não teria dinheiro para pagá-lo. O homem tomou o estojo, refez o embrulho com extremo carinho, colocou a fita e o devolveu à jovem dizendo: — Ela pagou o preço mais alto que qualquer pessoa 152


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pode pagar, ela deu tudo o que tinha. O silêncio encheu a pequena loja e as lágrimas rolaram pela face emocionada da jovem, enquanto suas mãos tomavam o pequeno embrulho. Reconhecimento e gratidão não aquecem apenas quem recebe, mas principalmente quem oferece. O que esta história tem a ver com gestão? Muito. A perspectiva de ganhar mais, manter as contas em dia e garantir a realização dos sonhos é, inegavelmente, a meta da grande maioria dos mortais. Porém, quem vivencia o ambiente corporativo sabe que a rotina não é fácil: você acumula tarefas, sofre pressões de toda ordem, e muitas vezes se vê obrigado a suportar um ambiente de trabalho desfavorável. Costumamos dizer que tapinhas nas costas valem mais que um aumento de salário. Talvez a afirmação soe um tanto exagerada; no entanto, trabalhar em uma organização onde até se tem bom salário, mas inexiste reconhecimento, não resolve. Cedo ou tarde o profissional pode optar por outra empresa em que o salário seja menor, porém haja respeito e valorização. O reconhecimento é uma das necessidades humanas vitais para a motivação no ambiente de trabalho. O salário é como a água: se você não ganhar, morre rapidinho. Já o reconhecimento é como a comida: demora um pouco mais, 153


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ainda que você vá morrer do mesmo jeito. Diante disso, afirmar que tapinha nas costas vale mais que um aumento de salário não se mostra tão exagerado. É claro que o ideal é manter o equilíbrio entre a remuneração e o reconhecimento, o que significa ter o trabalho valorizado tanto no aspecto moral quanto no financeiro. O descompasso entre ambos poderá gerar um ambiente psicologicamente ruim.

40 Uma questão de justiça

Um empresário que sabia harmonizar seus desenvolvimentos intelectual, material e espiritual tinha a fama, entre colaboradores e parceiros comerciais, de ser uma pessoa honesta e justa. Um membro de sua equipe, sentindo-se injustiçado porque um dos colegas ganhava mais do que ele, apesar de exercerem a mesma função, resolveu procurar o patrão para que lhe reparasse a injustiça. 154


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Argumentou: — Ao senhor, que é justo, peço que repare a injustiça que está sendo cometida comigo. Com ar de surpresa disse o patrão: — Por favor, qual é a injustiça? — Eu trabalho aqui há mais de cinco anos; meu colega de setor tem menos tempo de casa, temos a mesma função e ele recebe um salário maior. O patrão prometeu estudar o caso com carinho e voltaria a chamar o colaborador. No dia seguinte, o patrão o convocou: — Por favor, vá até a banquinha e compre meia dúzia de laranjas. Mais que depressa, momentos depois ele estava de volta com as laranjas do patrão. O patrão agradeceu: — Muito obrigado! Agora, quero conversar com você sobre sua reivindicação: aguarde só um tempinho, antes preciso resolver um problema. Em seguida, chamou o que ganhava mais e lhe deu a mesma tarefa dada ao que se sentia injustiçado. O segundo colaborador demorou um pouco mais; quando chegou, disse: — Patrão, desculpe pela demora. Fui até a banquinha 155


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e não gostei das laranjas, estavam murchas e achei caras. Lembrei-me de outra banca, mais adiante, e fui até lá. As laranjas estavam um pouco melhores e mais baratas, mas resolvi ir à próxima frutaria. Encontrei lá laranjas recémcolhidas e mais baratas. Mais uma vez me desculpe, sei que o senhor gosta de laranjas, deveria comprar mais, pois laranjas têm vitamina C que faz bem à saúde. O patrão agradeceu e disse que iria pensar sobre a orientação. Após o colaborador ter saído, o patrão voltou-se para o que se considerava injustiçado, dizendo: — Bem, agora acho que podemos conversar. O colaborador levantou-se envergonhado e dirigiu-se à porta de saída: — Deixa pra lá, já entendi... Fazer mais do que esperam de nós é uma forma inteligente de crescermos, sermos respeitados e reconhecidos como competentes. Ir além, pensar na frente e ter iniciativa são qualidades que as empresas buscam e esperam encontrar em seus colaboradores.

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41 O caminho do bezerro

O bezerro precisou atravessar a floresta para encontrar um novo pasto. Sendo animal irracional, abriu uma trilha tortuosa, cheia de curvas, subindo e descendo colinas. No dia seguinte, um burro que passava por ali usou essa mesma trilha para atravessar a floresta. Depois foi a vez de um carneiro, líder do rebanho, fazer seus companheiros seguirem a trilha torta. Mais tarde, os homens começaram a usar o caminho: entravam e saíam, viravam à direita, à esquerda, abaixandose, desviando-se de obstáculos, reclamando e praguejando; até com razão, ainda que não fizessem nada para mudar a situação. Com o tempo o caminho virou uma estradinha, em que os animais se esgotavam levando cargas pesadas, obrigados a percorrer em três horas uma distância que poderia ser vencida em uma, caso a trilha não tivesse sido aberta por um bezerro. Muitos anos se passaram. A estradinha tornou-se a rua principal de um vilarejo e, posteriormente, a avenida principal 157


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de uma cidade. Logo, a avenida transformou-se na via central de uma grande metrópole. Por ela passaram a transitar diariamente milhares de pessoas, seguindo a mesma trilha torta feita pelo bezerro, décadas antes. Esta pequena história reforça nossa tendência de seguir como cegos pelas trilhas de bezerros, como se fossem caminhos únicos, sem nos atrevermos a mudá-los. A vida é repleta de contradições e surpresas em função das inúmeras mudanças que acontecem a cada momento; porém, temos que ter consciência que a chave do progresso e até mesmo da sobrevivência no trabalho é ter consciência de que as contradições podem coexistir. Sabemos que conforme o mundo se torna mais complexo e interdependente, a mudança é cada vez mais não linear, descontínua e imprevisível. Captar e compreender as grandes tendências que estão se delineando é um exercício e um desafio, que devem se tornar rotina na vida de todos nós, uma vez que a gestão desatrelada da realidade pode tropeçar em obstáculos imediatos e, inclusive, comprometer a sobrevivência da organização. Autores como Peter F. Drucker, Jay Galbraith, Michal E. Porter, Ton Tapscott, Alvin Toffler e outros enfocaram mudanças fundamentais na economia mundial, afetando a natureza das organizações, o que exige de cada gestor uma 158


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abordagem inovadora na maneira de pensar e compreender as novas realidades.

42 Otimista & Pessimista

Já era quase meia-noite, por isso só dois passageiros estavam no convés quando o Titanic abalroou aquele iceberg. Não houve nenhum baque, apenas um ruído típico de abridor de latas e uma rajada de granizo — foi o suficiente para um daqueles passageiros do convés abrir os braços e lamentar: — Pronto! Já pensou se esta droga afunda agora e não tem barco salva-vidas para todo mundo? Ao seu lado, o outro passageiro, confiante na impossibilidade do navio afundar, comemorou aquele golpe de sorte: — Opa, gelo fresquinho! Garçom, traz um uísque. O navio foi a pique. O otimista foi ao fundo e, mesmo com a água salgada 159


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invadindo seu copo de uísque, ele ainda perguntava aos que berravam a seu lado: — Socorro por quê? Qual o problema? Já o pessimista agarrou meia dúzia de coletes salvavidas, pulou no mar e no dia seguinte foi resgatado pelo Capathia. Só que, naquele clima de todo mundo agradecendo, se abraçando e chorando, o pessimista reclamava: — Não sei o porquê de tanta festa, nós pagamos passagens de primeira classe e agora vamos ser obrigados a fazer a metade da viagem num porão. Bem, o importante que cada um defina de que lado está, posicionando-se em relação às alternativas existentes: a) Qualquer problema tem solução. b) Qualquer solução tem problema. O pessimista tem a tendência de transferir as causas dos seus problemas: ele se julga o efeito das coisas, não as causas. Entende que uma boa ação depende de ações de terceiros, enxerga pelo prisma da incompetência (que existe, sempre existiu e existirá). Busca nos outros as soluções para os problemas da empresa, do seu setor ou departamento. O otimista, ao contrário, busca dentro de si as alternativas para os problemas da empresa, de seu setor ou departamento. Entende que sua gestão é a causa e não o efeito, que é consequência de suas boas decisões. 160


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O otimista procura construir relações saudáveis, novas parcerias, novas oportunidades. Por outro lado, não concordamos que alguém possa ser taxado de pessimista ou otimista, até porque, somos ambos, em diferentes momentos ou situações. O segredo está em ser realista, depois de analisar as vertentes otimistas e pessimistas. Realistas é como são as pessoas que fizeram e fazem ações importantes pelo desenvolvimento de suas empresas e países.

43 Por favor, a chave...

Por muitos anos a cidade se acostumara com a música do velho e talentoso organista, mas aquele era um dia especial. O pôr do sol brilhava através dos lindos vitrais da igreja, dando ao velho organista uma aparência angelical. Mas havia um problema: as músicas que tocava soavam tristes e melancólicas. Infelizmente, era seu último recital como organista 161


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oficial, antes de substituído por um jovem organista. Ao fim da audição, o substituto entrou pela porta dos fundos da catedral um tanto bruscamente. O velho percebeu, retirou a chave do órgão, colocou-a no bolso e, lentamente, dirigiu-se para a saída. Quando seus caminhos se cruzaram, o jovem estendeu a mão. — Por favor, a chave. Muito a contragosto, o velho tirou a chave do bolso e a entregou. Apressadamente o jovem dirigiu-se até o órgão. Depois de apreciar o majestoso instrumento, sentou-se no banco, colocou a chave e começou a tocar. O velho tinha tocado lindamente e com talento, mas aquele novo organista tocava como um gênio absoluto. Os fiéis jamais ouviram sair daquele órgão uma obra tão monumental, capaz de arrebatar a catedral, a cidade e, até mesmo, a região. Foi a primeira vez que o mundo ouviu a música de Johann Sebastian Bach. Com lágrimas escorrendo pelas faces, o velho disse para si mesmo: — Imagine se eu não tivesse dado a chave ao jovem mestre! Então, raciocinemos: quantos líderes escondem a chave dos seus subordinados? Quantos deixam de transmitir suas experiências, vivências, dicas e macetes aos que precisam e estão 162


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abaixo deles? A chave que cada um de nós guarda consigo é para os outros. Não vivemos sozinhos e sim num mundo interdependente. No entanto, existem líderes que permanecem aterrorizados, com medo de perder a posição e o prestígio que conquistaram, deixando de ser os astros do jogo. Em contrapartida, há muitos jovens de grande potencial, abafados e limitados por executivos superiores que lhes sonegam informações importantes, capazes ajudá-los a desenvolver rapidamente o talento que possuem. Tudo seria melhor se a chave fosse entregue sem dramas, de maneira natural, com a certeza de que, quanto mais se transmite aos outros, mais se guarda para si.

44 Papagaio decoreba

Aquele vendedor, cansado pela rotina de visitas, ia passando por uma rua tranquila de uma pequena cidade do interior. Com sede, parou para descansar à frente de uma casa, cuja porta estava entreaberta — vindo de dentro, ouviu uma voz amistosa: 163


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— Vai entrando, meu rapaz. A voz atiçou a curiosidade do vendedor, pouco acostumado à hospitalidade alheia. Não resistindo à tentação, e temeroso, meio tímido, foi, devagarinho, entrando na casa. Já na sala, ouve a mesma voz atrás de outra porta: — Vai entrando, meu rapaz... Sentindo-se mais seguro, o vendedor chegou à outra sala, onde ouviu novamente a voz vinda de outro cômodo: — Vai entrando, meu rapaz. Finalmente, ele chegou à cozinha. Ali, numa gaiola pendurada bem no alto, um papagaio falante lhe dá as boasvindas: — Vai entrando, meu rapaz. Ainda surpreso, ao baixar os olhos, o vendedor vê-se de frente a um enorme cão dobermann, rosnando e pronto para atacá-lo. — Vai entrando, meu rapaz, repete o papagaio, seguro em seu poleiro. O vendedor, tremendo, volta-se para o papagaio e pergunta com voz desesperada: — Você, seu papagaio desgraçado que me colocou nesta arapuca, só sabe repetir isso? Ao que o papagaio, mais que depressa, começa a gritar em resposta: 164


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— Pega, pega, pega. . . Se o nosso vendedor saiu vivo dessa história não sabemos. Mas essa divertida piadinha serve para refletirmos sobre o nosso dia a dia à frente das equipes que dirigimos. Muitos líderes são extremamente parecidos com o sacana do papagaio: repetem, a todo instante, a mesma conversa, os mesmos conceitos, as mesmas regras, as mesmas ideias vigentes há anos. Inovar, tentar sempre algo original, criar formas adaptadas a cada desafio, é o que nos faz diferentes de um papagaio repetitivo. É o que se espera de um gestor nesse ambiente em que as soluções para os problemas de hoje não servem para a realidade e os problemas de amanhã. Os gestores vencedores têm como atributo básico, que os separa dos que não dão certo, a atenção às mudanças, a liderança dinâmica, eficiente e flexível. Cuidado para não fazer o papel do papagaio, cuja falsa hospitalidade esconde uma grande ameaça. O gestor deve estar consciente do seu comportamento, característica essencial para os demais acreditarem nele.

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45 Mais forte que o fracasso

Anthony Robbins, em seu artigo Awaken the Giant Within, conta que um jovem e talentoso cavalheiro cheio de esperança investiu tudo que tinha para montar um pequeno negócio. Com muito entusiasmo o jovem cavalheiro trabalhava dia e noite e até dormia em sua própria oficina. Mesmo assim as coisas não andavam como sonhara. Para não fechar as portas e já não tendo mais de onde tirar dinheiro para continuar o negócio, se vê obrigado a empenhar as joias de sua esposa. Após árduo esforço, finalmente, consegue apresentar o resultado de seu trabalho a uma grande empresa — porém, é comunicado que seu produto não atende ao padrão de qualidade exigido. O jovem não desistiu. Voltou à escola, onde foi recebido pelos colegas e professores como um maluco sonhador, um visionário fracassado, e lá ficou por mais dois anos. 166


Após esse tempo, a grande empresa enfim aprova seu produto e fecha contrato com ele. Mas, ousado que era, resolveu montar uma fábrica. Como o tempo era de guerra, o governo lhe nega o concreto necessário para a obra. O rapaz reclama, mas não desiste. Inventa um processo para fabricar o concreto de que necessitava. Depois de ter sua fábrica bombardeada duas vezes pelas tropas norte-americanas. O jovem cavalheiro desiste? Pelo contrário: convoca algumas pessoas para trabalhar com ele e juntos recolhem bujões extras de gasolina descartados pelos aviões, pois ali estava uma matéria-prima vital para o seu negócio. Depois de sobreviver a tudo isso, um terremoto arrasa a fábrica. Era a gota d’água. O jovem cavalheiro vai desistir? Nem assim. Vende o saldo de sua produção para uma grande corporação. Após a guerra segue-se uma grande escassez de gasolina. O empreendedor não consegue sair nem para comprar comida para sua família. No entanto, não entra em pânico nem se desespera. Fazendo uso da criatividade, adapta um motor a sua bicicleta e sai às ruas. Os vizinhos ficam maravilhados: todos querem as bicicletas motorizadas; assim a demanda de motores aumenta e logo ele fica sem matéria-prima.


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Decide montar uma fábrica para sua novíssima invenção, mas não tem capital. Então resolve pedir ajuda para as mais de 15 mil lojas de bicicletas espalhadas pelo país. Escreve a cada uma delas uma carta personalizada, solicitando apoio para a empreitada. Como a ideia é boa, consegue o apoio de mais ou menos cinco mil lojas, que lhe adiantam o capital necessário para montar a indústria. Encurtando a história, hoje a Honda Corporation é um dos maiores impérios da indústria automobilística japonesa, conhecida e respeitada no mundo inteiro. Tudo porque o jovem cavalheiro Soishiro Honda não se deixou abater pelos terríveis obstáculos que encontrou pela frente. A vida é assim, muitas são as dificuldades, muitos serão os obstáculos pelos caminhos. Porém, se você sabe aonde quer chegar, não haverá nenhum empecilho que possa comprometer sua caminhada. Temos tendência de supervalorizar os problemas, e, na maioria das vezes, muito mais do que verdadeiramente são. A ousadia e a persistência devem ser consideradas indispensáveis para todas as conquistas. A criatividade deve se constituir em condição essencial para o aperfeiçoamento permanente dos produtos e serviços oferecidos.

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46 Para onde ir?

Era uma vez um cavalo-marinho insatisfeito com sua vida pacata e rotineira. Resolveu que partiria em busca de fortuna e vitórias, juntou suas economias e, nadando e cavalgando, foi em frente. Após um dia de viagem já fora de seu habitat ouviu uma voz. Era um coelho: — Bom dia, amigo. Para onde você está indo? — Só sei que estou em busca da fortuna — respondeu o cavalo-marinho. — Maravilhoso, você está no seu dia de sorte — comentou o coelho. — Estou disposto a lhe vender as minhas botas especiais, que permitirão grande velocidade na sua corrida em busca da fortuna. O cavalo-marinho pagou metade do que possuía, calçou as botas e saiu em desabalada corrida até encontrar uma águia pela frente. — Boa tarde, meu amigo. Para onde está correndo 169


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com tanta pressa? — Em busca da fortuna — respondeu ofegante. — Mas que sorte a sua — exclamou a águia. — Pelo dinheiro que você carrega na bolsa, me desfaço das asas e permito que você voe em direção à fortuna. — É garantido? — perguntou o cavalo-marinho, já consciente de que não lhe restaria um vintém. — Com toda certeza. Se algo não funcionar, devolvolhe o dinheiro. — Está certo — respondeu o cavalo-marinho, já pagando à águia, descalçando as botas do coelho e prendendo ao lombo as asas de águia. Ele voou e chegou a uma praia deserta. Estava meditando sobre o espaço que se abrira à frente, quando surgiu um tubarão. — Para onde você está indo, companheiro, nessa estranha fantasia de cavalo-marinho com asas de águia? Procurando a fortuna — respondeu o pobre cavalomarinho. — Puxa! Mas é mesmo o seu dia de sorte! Se tomar este atalho — explicou ele apontando para a própria toca — vai economizar muito nado, muita cavalgada e muito voo em direção ao que está procurando. — Sou-lhe imensamente agradecido, respondeu, já 170


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lançando-se na toca e, no ato, sendo engolido pelo tubarão. Empresas inovam, evoluem e têm sucesso, mas, depois de algum tempo, muitas declinam e até morrem. Por quê? Com certeza é pela falta de visão futura, a perda da visão global e falta de sensibilidade para perceber as mudanças tecnológicas e ambientais e a falta de compromisso por parte de seus colaboradores. A visão precisa moldar a atuação do presente e os acontecimentos do presente precisam moldar a visão do futuro. Afinal, não se pode criar o futuro sem antes imaginá-lo. Os exemplos da importância de se ter uma visão são inúmeros. Um austríaco encarcerado nos campos de concentração nazistas nos deixou uma lição quando escreveu nas paredes sujas de sua cela: “Suporto qualquer o quê porque tenho uma visão”. O grande Martin Luther King celebrizou sua frase, eu tenho um sonho. Em outras palavras, eu tenho uma visão. Ele não disse tenho algumas ideias, podemos formar um comitê, estudá-las e ver o resultado. A visão poderia ser definida como um macroobjetivo, não quantificável, de longo prazo. É a maneira de identificar onde e como a organização espera estar no futuro. Em outras palavras, é uma projeção das oportunidades 171


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futuras do negócio da organização e uma concentração de esforços na sua busca. Como dizia o grande mestre Peter Drucker diante do desafio de planejar em ambientes cada vez mais complexos e competitivos, a visão passou a ter importância fundamental na construção do futuro de pessoas, organizações, cidades e países. Mais do que nunca, ter uma visão voltada para o futuro é a diferença entre o sucesso e o fracasso. Essa visão tem um componente racional, produto de análise e um componente emocional, produto da imaginação, intuição e de princípios e valores; ela somente funciona quando consegue criar compromisso nas mentes e nos corações de todos da corporação. Uma empresa sem visão, sem saber para onde quer ir é como um avião sem plano de voo ou como uma folha seca levada pelo vento. Como diz o gato para Alice no País das Maravilhas: “Se você não sabe para onde ir, qualquer lugar serve” Porém, estará sujeito a se deparar com tubarões famintos ao longo de sua jornada.

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47 Não confie cegamente

Era uma vez um caçador que contratou um feiticeiro para ajudá-lo a conseguir alguma coisa que pudesse lhe facilitar o trabalho nas caçadas. Depois de alguns dias, o feiticeiro lhe entregou uma flauta mágica que enfeitiçava os animais, fazendo-os dançar. Desse modo, o caçador teria facilitada sua ação. Entusiasmado com o instrumento, o caçador organizou uma caravana, convidando dois amigos caçadores. Logo no primeiro dia de caçada, o grupo se deparou com um tigre. De imediato, o caçador pôs-se a tocar a flauta e, milagrosamente, o tigre começou a dançar e foi fuzilado. Horas depois, um sobressalto. A caravana foi atacada por um leopardo que saltara de uma árvore. Ao som da flauta, o animal perdeu a agressividade e dançou. Os caçadores não hesitaram: mataram-no com vários tiros. E foi assim: flauta soprada, animais ferozes dançando, caçadores matando. Ao final do dia, o grupo encontrou, pela frente, um leão 173


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faminto. A flauta soou, mas o leão não dançou. Ao contrário, atacou um dos amigos do caçador, devorando-o, logo depois, devorou o segundo. O flautista fazia soar as notas desesperadamente, mas sem resultado: o leão não dançava. E assim foi devorado. Dois macacos, em uma árvore próxima, a tudo assistiam. Um deles observou: — Eu sabia que eles iam se dar mal quando encontrassem o leão surdo. Não confie cegamente nos métodos que sempre deram certo: um dia podem não dar. Seja criativo, tenha sempre planos de contingências: prepare alternativas para as situações imprevistas. Preveja o que pode dar errado. E prepare-se.

48 O fim da gestão

Em seu livro O Futuro da Administração, Gary Hamel e Bill Breen fazem uma provocação: — Quem está no comando da sua empresa? Se a equipe de executivos ou todos os colaboradores 174


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respondessem o CEO, a resposta estaria certa, mas não completa. Por quê? Segundo eles, porque as empresas estão sendo administradas por um pequeno grupo de teóricos como Frederick W. Taylor, Henry Ford, Henri Fayol, Alfred Sloan, Douglas McGregor, Abraham Maslow, Elton Mayo, Amitai Etzioni, Mac Weber e pela fantástica Mary Parker Follett e outros. De certa forma Gary e Bill têm razão: as gestões das empresas são semelhantes, variam pouco. Os produtos e serviços se desenvolvem em uma velocidade alucinante. Vejamos este pequeno exemplo: Nos primeiros meses de 1945, no auge da ofensiva aliada na Segunda Guerra Mundial, os americanos John P. Eckert e John W. Mauchly apresentavam ao mundo a fantástica e moderna máquina de processamento de dados, o Eniac — Eletronic — Numerical Integrator and Calculator. Um computador capaz de realizar cinco mil somas e 360 multiplicações por segundo. Pesava 32 toneladas, media 30 metros e tinha 17.468 válvulas, cuja vida útil era de três mil horas: ou seja, a cada 10 minutos era necessário a troca de uma delas. No fim da tarde do dia 3 de abril de 2010, 65 anos depois, outro americano genial, Steve Jobs, criava uma alvoroço nas lojas especializadas com o lançamento de seu 175


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mais novo produto: uma prancheta eletrônica batizada de iPad com espessura de 1,3 centímetros e peso de 680 gramas: ou seja, 31 mil, 999 quilos e 32 gramas mais leve do que o primeiro computador. Agora tente lembrar uma mudança notável na prática de gestão? Difícil, não? Pois é, somos obrigados a concordar com Gary e Bill. A gestão está ultrapassada, o que faz com que as empresas “mais admiradas” do mundo não sejam tão adaptáveis quanto precisam, tão inovadoras como poderiam ou tão divertidas para se trabalhar como deveriam. Por quê? Porque o que restringe o desempenho de uma organização não é o seu modelo de negócios, não é o seu modelo operacional, mas o seu modelo de gestão — que foi criado por aqueles poltergeists que habitavam a máquina bolorenta de antigamente. Era perfeita para funcionar em ambientes de relativa estabilidade e sujeitos a poucas mudanças, porém, não é adequada para os tempos atuais, com imensa quantidade de variáveis complexas, mudanças abruptas, janelas de oportunidades reduzidas, avanço da tecnologia, aumento do poder do consumidor, dinheiro e produtos circulando sem fronteiras pelo mundo. O ambiente que as empresas do século XXI enfrentam é mais volátil do que nunca. A internet está transferindo o 176


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poder de barganha dos fabricantes para os consumidores com grande rapidez. Os ciclos das estratégias estão diminuindo. Os custos de comunicação encontram-se em queda livre e a globalização está abrindo os setores para um grande número de novos concorrentes, que praticam preços ultrabaixos. As empresas estão se vendo progressivamente envolvidas em “redes de valor” e “ecossistemas” sobre os quais têm apenas controle parcial. À medida que o ritmo das mudanças se acelera, cada vez mais as empresas encontramse na contramão da curva da mudança. Essas novas realidades exigem novos recursos e novas competências gerenciais e empresariais: Para prosperar as empresas terão de ser tão estrategicamente adaptáveis como são operacionalmente eficientes. Se quiserem ser mais inovadoras e inteligentes do que uma multidão crescente de startups, devem aprender a inspirar seus colaboradores para que deem o melhor de si todos os dias. Para proteger suas margens, devem tornar-se entusiastas de inovações transgressoras. Como administradores, somos prisioneiros de um paradigma que nos desafia a reinventar a gestão acima de qualquer outro objetivo. Como seres humanos, somos definidos pelas causas a que servimos. Portanto, para inventar o futuro da gestão precisamos mais do que fé intelectual no valor da inovação. Precisamos de paixão por desafios muito específicos e muito nobres.

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Precisamos pensar diferente para agir diferente, antes que as inovações tecnológicas e de costumes decretem o fim da gestão.

49 Quanta informação?

Em seu livro A estrada do futuro, Bill Gates narra a seguinte história. Conta que o rei Shirham, da Índia, ficou tão satisfeito quando um de seus ministros inventou o jogo de xadrez, que disse a ele: — Estou tão encantado com sua invenção que você pode pedir o que quiser que eu lhe darei. O ministro saudou o rei e disse: — Majestade, peço-lhe apenas que me dê um grão de trigo para a primeira casa do tabuleiro de xadrez, dois grãos para a segunda casa, quatro grãos para a terceira e assim por diante, sempre dobrando o número de grãos, até que se completem as 64 casas.” O rei comoveu-se com a modéstia do pedido e mandou que trouxessem um saco de trigo. Depois pediu que fossem 178


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dispostos os prometidos grãos sobre o tabuleiro. Na primeira casa da primeira fila colocaram um pequeno grão. Na segunda, dois. Na terceira, quatro; depois oito, 16, 32, 64, 128. Na casa oito no final da primeira fila, o mestre das provisões do rei Shirham contara um total de 256 grãos. O rei, que acompanhava atentamente a contagem, não mostrou grandes preocupações. Talvez houvesse um pouquinho mais de trigo sobre o tabuleiro do que imaginara, mas nada que provocasse surpresa. Considerando-se que levava um segundo para contar cada grão, a contagem até ali consumira cerca de quatro minutos. Se uma fileira de casas fora completada em quatro minutos, tente adivinhar quanto tempo levaria para contar os grãos de trigo em todas as 64 casas do tabuleiro. Quatro horas? Quatro dias? Quatro anos? Quando o mestre das provisões terminou a segunda fila, percebeu que trabalhara cerca de 18 horas para contar os 65.535 grãos. Ao final da terceira das oito filas, haviam se passado 194 dias na contagem dos 16,8 milhões de grãos responsáveis por 24 casas. E ainda restavam 44 casas vazias. O rei logo foi informado que a última casa teria que ter 18.446.744.073.709.551.615 grãos de trigo, o que exigiria 584 bilhões de anos para serem contados.

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Somente para fazer um paralelo, as estimativas atuais para a idade da terra ficam em torno de 4,5 bilhões de anos. Segundo a maioria das versões dessa lenda, o rei Shirham percebeu que fora enganado e mandou decapitar seu esperto ministro. Vivemos em uma sociedade em que a informação assume cada vez mais uma importância crescente. Assim, a gestão de sistemas de informação e a sua inserção na estratégia empresarial é um fator chave para o desenvolvimento empresarial. Se por um lado, essas técnicas ajudam a detectar novas oportunidades e a criar vantagens competitivas, por outro ajudam a empresa a se defender de ameaças provenientes da concorrência. Nenhuma experiência em nosso cotidiano nos prepara para as implicações de um número que dobra muitas vezes. O crescimento exponencial, mesmo quando explicado, parece um truque. Assim, é a lei da informação. Porém, será que estamos preparados para enfrentar o que Bill Gates chama de A Estrada do Futuro? O volume de informação que recebemos em nosso dia a dia é quase proporcional à história do rei. Cabe-nos mapear as que interessam e usá-las de forma adequada. Esse pode ser o segredo do sucesso de muitas empresas.

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50 Dê um tempo pra você

Conta-se que um dia um pai, ao retornar do trabalho, estressado pela correria do dia a dia, vê seu filho perguntar com voz tímida e os olhos cheios de admiração: — Papai, quanto você ganha por hora? O pai, espantado e irritado diante da ousadia do filho, num gesto severo responde: — Escuta aqui, seu pirralho, isso nem sua mãe sabe. Não amole, estou cansado. Mas o filho em sua inocência insiste: — Mas pai, por favor, diga, quanto o senhor ganha por hora? Diante da insistência do menino e querendo se ver livre, respondeu: — Três reais por hora. O garoto sorriu: — Então, papai, poderia me emprestar um real? O pai ficou fora de controle e tratando o filho com 181


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brutalidade, respondeu: — Ah! Essa era a razão de querer saber quanto eu ganho, não é? E empurrando o menino em direção ao quarto, ordenou: — Não me amole mais, pirralho aproveitador. Já era tarde, mas o pai ainda não conseguira dormir, pensando na postura que tivera diante do filho: — Poxa! Talvez, ele precise comprar algo. Querendo aliviar sua consciência, dirigiu-se até o quarto do filho e, em voz baixa, perguntou: — Filhinho, está dormindo? — Não, papai — respondeu o menino sem se mexer. — Olha, aqui está o dinheiro que você me pediu, um real. Muito obrigado papai — disse o filho levantando-se. E retirando mais dois reais de uma caixinha que estava sob a cama, disse: — Agora já completei, papai. Tenho três reais, poderia me vender uma hora do seu tempo? O mundo moderno e a competição desenfreada tem transformado o homem em uma máquina de trabalho, sem tempo para as verdadeiras e belas coisas da vida. Parece que são tantos os problemas na empresa que as 24 horas do dia são poucas para desatar a infinidade de 182


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nós, não deixando tempo para assuntos não profissionais. O tempo é um recurso não renovável e perecível. Não pode ser estocado para ser usado no futuro. Apesar disso, pode ser distribuído de forma equitativa. Um amigo encontrou uma forma de se fazer presente. Trabalhando o dia todo desatando os nós de seu cotidiano profissional, quando retornava a sua casa encontrava o filho dormindo — e quando saia ele ainda não havia acordado. Então fizeram um pacto. Todos os dias, ao chegar, iria até o quarto do filho dar um nó no lençol. Quando o filho acordasse pela manhã, desataria o nó. Aqueles dois atos seriam o elo que os uniria. Não era a melhor solução, mas pelo menos servia como um paliativo, demonstrando que a ausência era apenas física, emocionalmente estavam unidos. Se você deseja um trabalho de melhor nível de qualidade do que aquele que é capaz de produzir, talvez, esteja na hora de repensar e redistribuir melhor o seu tempo. Dê um tempo para pensar, brincar, rir; um tempo para o lar, um para amar, sonhar, um tempo para rezar e, principalmente, para seus entes queridos. Este pode ser o segredo do sucesso de sua vida profissional, que não pode ser construída apenas com o pilar chamado trabalho. Um dia ele pode ruir e você não terá outros em que se apoiar.

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O mundo corporativo nos ensina que ser eficaz é fazer as coisas certas, o que significa fazer aquilo que consideramos importante e prioritário. Atos importantes e prioritários transcendem as fronteiras da empresa. Por isso a arte de lidar com as pessoas, com a família, tem influência na construção de uma carreira vitoriosa, beneficiando a própria saúde, pois o sucesso não depende apenas de sua capacidade técnica. Depende de outros valores, outros pilares que irão sustentar sua carreira e sua vida.

51 A difícil arte das novas ideias

Há muitos anos um esquimó da Groenlândia trabalhou numa expedição exploratória ao Pólo Norte. Como recompensa pelo excelente serviço prestado, o esquimó foi levado a conhecer Nova Iorque. O nativo deslumbrou-se. Para quem nunca saíra de sua aldeia gelada, aquele espetáculo de luzes, arranha-céus, sons, deixou-o fascinado.

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Alguns dias depois, ao voltar para casa, tentou descrever a exuberância do que viu. Pontes imensas, veículos sem tração, luzes coloridas, prédios que se perdiam no céu. O pessoal da aldeia ouvia a história, mas mantinha olhar frio, ar de incredulidade. Não acreditavam em uma só palavra dita pelo companheiro. Por isso, ele passou a ser conhecido por “sadluk” — que significa mentiroso. Ninguém mais o chamou pelo nome. O apelido o acompanhou até a morte. Quando o cientista e explorador Knud Rasmussen fez, anos depois, sua famosa viagem da Groelândia até o Alasca, acompanhava-o um esquimó chamado Mitek (Pato Selvagem). Depois da jornada, Mitek foi convidado a conhecer as cidades de Copenhague e Nova Iorque. Encantou-se, também, pelo que viu. Ao voltar para sua aldeia, lembrou-se da tragédia de Sadluk e pensou não ser prudente descrever o que viu. Decidiu contar histórias que seu povo pudesse compreender.e acreditar. Contou que o pesquisador Rasmussem mantinha, em Nova Iorque, um caiaque às margens de um grande rio, o Hudson. Juntos saíam de manhã para caçar. Patos, gansos e lontras existiam em grandes quantidades em Nova Iorque e eles se divertiam muito. Salvando sua reputação. Mitek, aos olhos de seus conterrâneos, era um homem honesto. Seus amigos o trataramm com todo o respeito. 185


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Como é árdua a estrada daqueles que trazem novas ideias. Muitos de nós rejeitamos o novo, trancando o espírito a novas ideias. Se não procurarmos agir de forma diferente, sendo receptivo às inovações, o espírito se torna acanhado, estreito e fechado. Seguramente ficará para trás. Como sabemos, nenhuma matéria-prima é mais relevante para as empresas, seja qual for o ramo, do que as ideias. Mas, trazer novas ideias nem sempre é possível; assim, o maior problema não é como trazer ideias novas e inovadoras e, sim, como tirar as ideias velhas de lá. E de onde vêm as boas ideias novas? Elas vêm das diferenças, da criatividade que tem origem em justaposições improváveis. Uma ideia nova é boa quando é eficaz — e essa pode ser a competência mais valiosa que uma organização inovadora pode esperar ter. Quantos Sadluc trazem inovações e são tratados como mitômanos, mentirosos? E quantos Mitek existem no mundo corporativo que, mesmo tendo tido excelentes experiências as guardam para si?

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52 Empresas e gestores Matrix

Os filmes Matrix formam uma das trilogias de maior sucesso no cinema mundial, responsáveis por uma revolução na forma de fazer cinema, assim como nos leva a reflexões sobre como se constroem as realidades e o quanto somos manipulados em nossa vida cotidiana. Matrix deixou de ser filme para se tornar conceito. São inúmeros os temas que ele apresenta, entre verdade e mentira, liberdade e dominação, ética etc. Na trilogia a máquina inteligente escraviza a humanidade e a mantém em uma realidade virtual, a fim de obter a energia necessária para seu funcionamento. No mundo corporativo não é difícil nos depararmos com empresas e pessoas Matrix. Por um lado, é verdade que muitos colaboradores preferem um comportamento de passividade; por outro, é igualmente verdadeiro que muitos gestores manipulam para inibir a criatividade e a imaginação de seus colaboradores. O manipulador não hesita em usar discursos diferentes, adaptando-os conforme os interlocutores. Adotam uma postura 187


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aparente de bom caráter, fazendo uso de agrados baratos a fim de manter domínio sobre suas vítimas. Em geral não anunciam seus objetivos ou, pelo menos, os colocam em uma penumbra, não os deixando claros a ninguém — à exceção de seus próprios interesses. A manipulação tem uma relação direta com o poder: ela é mais eficaz quanto maior forem as diferenças de poderes, sejam eles econômicos ou hierárquicos. Porém, o manipulador perde toda a credibilidade à medida que seus truques se denunciam. Sabemos que a forma de gerir uma empresa está intrinsecamente relacionada à maneira comportamental de seu gestor. A forma como se comporta na gestão dos negócios é que define o perfil psicológico de sua empresa. Por trás de um gestor manipulador se esconde uma insegurança quase patética, que ele trata de esconder de todas as formas. Ele acha especial, julga-se uma fonte inesgotável de saber. Sua empresa acredita que é reconhecida no mercado pela superioridade do que produz, enquanto ele vigia os empregados o tempo todo, sempre se colocando como uma eventual vítima, passível de ser traída a qualquer momento. Para esse gestor, o concorrente é tratado sempre como um inimigo a ser aniquilado, não importando os meios. Tem intolerância às frustrações e fracassos: a responsabilidade de possíveis fracassos jamais é sua. Olhar para uma empresa é se confrontar com 188


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evidências de comportamento humano. Cabe a todos o compromisso de eliminar os Matrix que se encontram pelos caminhos do nosso cotidiano corporativo.

53 Falar e dizer

Falar sobre comunicação nas empresas parece levar sempre ao mesmo diagnóstico. As pessoas reclamam e clamam por uma melhor informação que não chega. Muito se tem alardeado sobre os diversos e modernos recursos tecnológicos à disposição dos responsáveis pela comunicação interna nas empresas. As instituições, de forma geral, estão migrando suas publicações impressas para canais virtuais, priorizando intranet e portais exclusivos como fonte de informação para os seus colaboradores. Nesse caso são inúmeras as vantagens, tais como agilidade na atualização da informação, menor custo, maior interatividade etc. Tudo isso é fantástico, porém não existe tecnologia que substitua a comunicação face a face. É o olho no olho, tratar gente como gente.

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Sabemos que quanto mais próxima a comunicação se revela, mais envolvimento existe, maior a integração e o empenho das pessoas. Fazer parte, ser valorizado e reconhecido são necessidades humanas, estudadas por nomes como Maslow, Herzberg, McGregor e outros. Mas, falar e dizer são coisas completamente diferentes. Uma antiga e muito utilizada anedota exemplifica muito bem esta diferença entre falar e dizer: Marcelo, caixa de banco no tempo em que o cheque ainda reinava, ao atender a cliente Aparecida nem imaginava que ela talvez não entendesse o idioma bancário. — Por favor, moça: seu cheque é nominal a Aparecida Neves. Precisa de endosso. Cida fez a cara de espanto de quem escutou, mas não ouviu. E pensou: “Nominal? Endosso? Isso até parece alguma coisa com açúcar. Mas, não é possível, não tem nada a ver”. Olhando para Marcelo com aquele ar de interrogação: — Desculpe, não entendi. O caixa, sem levantar os olhos, disse: — É simples, coloque sua firma aqui no verso. Ainda sem “ouvir”, Cida encarou Marcelo com um olhar de imensa dúvida. Um tanto nervosa sua mente era uma confusão total: “Verso? Firma? Antes era nominal, endosso. Agora é firma, 190


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verso. Mas eu não sou poeta para fazer verso”. Atônita, perdida, Cida achou que precisava perguntar mais uma vez. — Desculpe, continuo sem entender. Marcelo que seguia remexendo em seus papeis, teve o estalo “Fácil”, pensou. Com um sorriso irônico, virou o cheque e explicou: — Dona Aparecida — e entregou-lhe a caneta — por favor, coloque aqui seu nome exatamente como assina as cartas para seu namorado. Aparecida iluminou-se. Confiante pegou a caneta e “lascou” sua “assinatura” no verso do cheque: “Com todo o amor, um grande beijo da sua Cida”. Diante daquela sorridente Aparecida, o caixa foi apresentado à “Dona Comunicação”. Sentiu naqueles olhos brilhantes que falar nem sempre é dizer. Pessoas tentam se comunicar com pessoas. Líderes com subalternos. Empresários com gerentes, estes com colaboradores. Muitos não conseguem porque esquecem uma das regras básicas da comunicação. Falam sem dizer, ignorando que cada ouvinte corresponde a um vocabulário específico.

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54 Ah! Se eu fosse uma empresa

Pode parecer até um pouco de paranoia ou, quem sabe, esquizofrenia, mas certamente é algo instigante. Partiu de um amigo que havia lido a respeito. Depois de um óbvio “estes caras estão malucos”, começamos a pensar no assunto e tentar responder, de forma diferente à pergunta colocada: Se eu fosse uma empresa, como eu seria? Para começar seria bem moderno, mas o que é ser moderno? Digamos que seja enfrentar com galhardia um ambiente que promete aventura, poder, crescimento e transformação constante e, ao mesmo tempo, ameaça destruir o que temos, tudo o que sabemos, tudo o que somos. Os ambientes modernos cruzam todas as fronteiras da geografia e da etnicidade. Podemos dizer que a modernidade une toda a humanidade de forma paradoxal: não podemos esquecer que o mundo é formado por desigualdade, desunião. . Para enfrentar esse desafio de ser moderno não haveria organograma, já que estes emperram e fazem com que percamos a flexibilidade, condição sine qua non para 192


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acompanhar as mudanças. Teria sim um organismo sadio, com pouquíssimas camadas hierárquicas, em a comunicação pudesse fluir com rapidez em todas as direções. Daria muita atenção ao cérebro, cuidaria do coração, dos membros superiores, dos membros locomotores. Teria um visual agradável, mesmo que para isso tivesse que sujeitar a um regime alimentar, de forma a manter o peso, a estética. Desculpem, mas, mesmo correndo o risco de levar a alcunha de “Darlene”, aquela que faz qualquer negócio para ser celebridade, faria de tudo para ser reconhecido, sem permitir que alguém ousasse mudar meu jeito de ser. Estaria com olhos sempre voltados para o futuro e faria questão de escolher a dedo os colaboradores. Pois é, mas acontece que eu não sou uma empresa. O cérebro representa as pessoas — por isso, na empresa deve-se valorizar ao máximo o potencial humano, acreditando e valorizando os colaboradores como verdadeiros agentes de mudanças. Somente assim é possível construir equipes fortes, capazes, competentes e dispostas a produzir resultados em prol da empresa e da comunidade. O coração significa os recursos injetados pela ação do cérebro, como respeito, cooperação, conhecimento, iniciativas modernizantes e outros. Os membros superiores são as áreas de apoio, que devem estar inseridas em um ambiente integrado e saudável, trabalhando em harmonia, com os olhos voltados para o futuro, 193


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concentrados na eficácia. Miguel de Cervantes, disse, através de seu inesquecível personagem Don Quixote de La Mancha, que “a estrada é sempre melhor que a estalagem”. A estalagem é apenas um ponto ao longo da estrada, pois o valor da vida vem com o esforço e o desejo de nos mantermos em movimento constante, ultrapassando cada ponto. A estrada é o seguir adiante e, principalmente, estar aberto às alterações alucinantes que acontecem em todas as áreas do conhecimento humano. Diante desse cenário temos que, eventualmente, buscar uma estalagem e parar para repensar, reorganizar e prosseguir. Planejar e replanejar devem ser práticas constantes para quem quer competir. Não adianta tomar decisões depois do resultado final. Pior ainda, não saber confrontar o que pensava antes de tomar a decisão com o que realmente aconteceu. Seguindo com a analogia, as gorduras localizadas são desvios dos objetivos traçados. Desvios acontecem, porém, cada um deles deve ser analisado minuciosamente — de forma a não se correr o risco de cada decisão tornar-se uma aventura. O regime alimentar é a desburocratização, já que a 194


Darci Piana e Rubens Fava

história da burocracia é antiga. Voltemos ao Egito dos faraós. Lá se produzia mais do que se consumia. O excedente de produção era apropriado por uma minoria, o pessoal que fazia a coordenação do trabalho. Eram responsáveis pelo planejamento e contratavam mão de obra, abundante na região. A burocracia se firma justamente onde existe um sistema antagônico, em que alguns possuem os meios de produção, e outros não. Ela se caracteriza pela divisão entre trabalho manual e trabalho intelectual: a parte que pensa e a parte que executa. Sem dúvida é o sistema social mais formalizado que existe. Na sociedade burocrática, são exigidos comportamentos e condutas padronizadas, seguindo um significado lógico. A empresa é a instituição principal no processo de consolidação burocrática, pois trata de reproduzir comportamentos. A burocratização atinge todos os setores da sociedade, e leva a pessoa à perda da relação com os semelhantes e com ele próprio. O indivíduo passa a agir de acordo com formas estabelecidas, seguindo comportamentos que lhe foram passados pela organização. É o homem organizacional, hoje superado. O que impera na modernidade é a simplicidade, a flexibilidade, a capacidade de mudar, a criatividade, a sensibilidade, a intuição, a emoção, o respeito ao ser humano e, principalmente, o procurar estar sempre à frente dos

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acontecimentos. Ser moderno é ter coragem de deixar de lado os modelos que não deram certos ou que deram certos em determinada realidade para buscar o simples e o objetivo, sinônimo de desburocratização. Pode parecer até um pouco paranoico ou, quem sabe, esquizofrênico — e você pode estar pensando o óbvio: “estes caras estão malucos”, Mesmo assim, vamos arriscar a pergunta: Se você fosse o seu cliente, como você seria? Aceitamos sugestões.

55 A Ciência da gestão disruptiva

Um cachorrinho, perdido na selva, vê um tigre correndo em sua direção. Diante do perigo iminente tem que pensar rápido, caso contrário, se transformará em um belo almoço. A sua frente o cãozinho vê uns ossos no chão e se põe a mordêlos. Quando o tigre está a ponto de atacá-lo, o cachorrinho diz: — Ah! Que delícia este tigre que acabo de comer. O tigre para bruscamente e foge. No caminho vai 196


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pensando: — Que cachorro bravo! Por pouco não come a mim também! Um macaco dedo duro, que viu a cena, vai atrás do tigre e conta como ele havia sido enganado. O tigre, furioso, diz: — Cachorro maldito! Vai me pagar! Minutos depois o cachorrinho vê o tigre atrás dele de novo. Dessa vez traz o macaco montado em suas costas. — Ah, macaco traidor! — pensa o cachorrinho — o que faço agora? Em vez de sair correndo, fica roendo os ossos, como se não estivesse vendo nada. Quando o tigre está a ponto de atacá-lo, o cachorrinho diz: — Macaco preguiçoso! Faz meia hora que mandei me trazer outro tigre e ele ainda não voltou! Não é raro nos depararmos com situações parecidas com a do cachorrinho no mundo corporativo. Para julgar e tomar decisões é preciso, muitas vezes, desconfiar do que dizem e do que se apresenta como verdade. É preciso fugir de toda classe de rotina, fugir do convencional. Em determinadas ocasiões, a imaginação deve ser superior à razão. É exatamente o que deveria acontecer quando nos deparamos com o processo de inovação. Depois da 2ª Guerra Mundial, as inovações de produtos 197


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e processos ganharam espaços importantes em discussões sobre competitividade nos negócios. O que chamamos hoje de inovação é resquício dos idos de 1912, quando Schumpeter propôs os cinco tipos do que denominou novas combinações: novos produtos, novos processos, novos mercados, novas fontes de matérias-primas e novas formas de organização de uma indústria. Hoje, segundo Michael Schrage, “inovação não é apenas o que vê de novas ideias. A inovação está mais relacionada com os processos de adoção e implementação de novos conceitos”. Conforme observado por Clayton Christensen em seu bom livro O Dilema do Inovador, “a inovação tecnológica altera radicalmente os mercados, porque solapa as empresas, que são vulneráveis porque suas ofertas foram adaptadas às necessidades dos consumidores existentes”. A ideia do professor Christensen perdura também porque propõe uma saída: “ataque sua própria zona de conforto, adotando você mesmo uma tecnologia disruptiva antes que outros o façam”. Segundo Clemente Nóbrega, em seu livro A Ciência da Gestão, disruptivo “é o processo de entrar em um mercado por baixo, ir subindo, até, eventualmente, ‘matar’ os neles estabelecidos”. Para Christensen a ciência da gestão é a ciência das circunstâncias e do contexto. Para ele, “não há nenhum conceito ou modelo em gestão que possa ser válido em todas 198


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as circunstâncias”, o que quer dizer que todas as ferramentas de gestão são “boas ou ruins” depende do contexto e da circunstância. Este conceito lembra a sensacional explicação de Albert Einstein sobre a teoria da relatividade: “Quando um homem se senta com uma garota bonita por uma hora, parece um minuto. Mas é só ele se sentar em um fogão quente por um minuto e ele parece mais longo do que uma hora. Isso é relatividade”. Ou seja, até a teoria da relatividade depende do contexto e das circunstâncias. Inovar ou melhorar o que já se faz bem; expandir o leque de produtos ou manter o core business; ganhar em escala ou em margem; diversificar ou focar; crescer ou consolidar; insourcing ou outsourcing. De acordo com o modelo de “Gestão Disruptiva” de Christensen, somente empresas novas podem começar “por baixo”, oferecendo um produto ou serviço não tão elitizado, mas bom o suficiente para satisfazer um mercado que nunca teve acesso às ofertas tradicionais. Para Christensen quem entra por baixo atua de duas formas: ou foca um mercado que não consumia o produto ou serviço dos estabelecidos ou entra em uma faixa menos exigente do mercado dos estabelecidos, compostos por consumidores que podem se satisfazer com um produto ou serviço “bom o bastante” para seus fins. Segundo Christensen, as instituições tradicionais 199


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não conseguem fazer ataques disruptivos contra si mesmas, o máximo que elas conseguem é fazer melhor aquilo que já vinham fazendo. As tradicionais empresas apresentam dificuldade em competir com as disruptivas, não só porque apresentam custos maiores, mas também porque se acostumaram com margens de lucro maiores. Abrir mão dessa margem, ao mudar drasticamente sua cultura corporativa, é tarefa dificílima. Enfim, tantos as empresas tradicionais quanto as disruptivas necessitam buscar algo em comum. Em resumo: inovação com criatividade e imaginação.

56 De quem é a culpa?

Já conhecemos, no capítulo 12, o episódio das três cartas deixadas pelo executivo demitido do cargo ao seu sucessor. A última delas, para ser aberta quando uma turbulência se abatesse sobre o diretor, dizia: “Escreva três cartas, deixe em três envelopes e entregue o cargo”. 200


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É que o tempo não perdoa a falta de criatividade e a falta de coerência administrativa. O ser humano luta para diferenciar-se e distinguir-se na busca de uma identidade própria e de reconhecimento. Sofre o paradoxo de considerar que não faz parte do todo, de não ser “igual” ao colega, de não conseguir conquistar o mesmo espaço e a mesma credibilidade. Com isso, sente-se inadequado e inferior. Parece que a melhor alternativa é destruir, criticar, usar e abusar do velho chavão “a culpa é da administração anterior”. Como seres humanos, somos todos iguais. Carregamos igualmente a herança genética e psicológica, porém o que nos distingue enquanto indivíduos são as “proporções” com que expressamos essa herança, razão pela qual cada indivíduo é único. Nossa vida nada mais é do que a expressão de quem somos, do que aprendemos e do que conquistamos. Se você como gestor não consegue os resultados almejados, o melhor é verificar a sua cota de participação no fracasso, para perceber o como você se posiciona. O fato é que esse tipo de comportamento nada ético só serve para aumentar o grau de desconfiança em relação à empresa. Tal postura atua em um nível perceptível indiretamente, embora aja como uma variável poderosa. Não se desconhece o fortíssimo poder da fala, tanto para a criação, conforme aprendemos no Gênesis, quanto para a destruição. O verdadeiro gestor procura criar em sua empresa um ambiente mais puro, verdadeiro e ético, assumindo erros

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e acertos. Graças ao processo seletivo natural, as pessoas começam a perceber os tipos de postura nada éticos e se afastam, de forma que o gestor acaba isolado. O sucesso de uma empresa é a somatória, consequência natural e automática do sucesso e realizações de cada um de seus colaboradores. O segredo do sucesso de um gestor está em sua habilidade de antever situações, identificar oportunidades, ter a criatividade de planejar e desenvolver, além de liderança para motivar sua equipe a fim de implementar o processo com rapidez e eficiência, e não na capacidade de detectar possíveis culpados pelos seus possíveis fracassos. No mundo moderno a gestão de informação torna-se cada vez mais eficiente: procurar desculpas é uma tática que já não funciona mais. Para o gestor do século XXI é hora de ousar, ficar atento ao que está mudando — e não paralisado ou se lamentando diante de fatos. É preciso ter discernimento para reconhecer o insucesso, coragem para assumi-lo e sabedoria para aprender com ele. Reconhecer o insucesso é uma questão de proporção e perspectiva. É sábia a recomendação da Young President’s Organization, pela qual devemos aprender a distinguir o que é contratempo, revés e tragédia. A maioria das coisas ruins da vida são contratempos. Reveses são mais sérios, mas podem ser corrigidos. Tragédias, sim, são diferentes, não queira passar por uma. 202


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Assim como amor e ódio são vizinhos de um mesmo quintal, o insucesso e o sucesso são igualmente separados por uma linha tênue. Mas o sucesso é vaidoso — mesmo que ilusório, costuma ostentar-se publicamente. Já o fracasso é órfão e tal como o exercício do poder, solitário. Caminha por meio de subterfúgios. Poucos percebem que a liberdade de fracassar é vital se você quer ser bem-sucedido. Os empreendedores mais bem-sucedidos fracassaram repetidamente e perseveraram. Uma noção de sua força é o fato de o fracasso impulsioná-los a novas tentativas de sucesso. Cada qual é responsável pelo seu sucesso ou pelo seu próprio naufrágio. O verdadeiro gestor deve ter em mente que, às vezes, a única alternativa possível é abandonar o barco. Nesse caso, a saída purifica, é um modo elegante de desistir, tal como deitar o rei ante a derrota inevitável. Infelizmente muitos gestores preferem sacrificar a tripulação em prol de alguns pertences, sem perceber que está abrindo mão do bem mais precioso da empresa, o seu capital intelectual. O sucesso decorre da perseverança, da persistência, da obstinação. É decorrência de não sucumbir à tentação de agradar todos, do exercício da paciência. Decorre de fabricar o que vende, em lugar de vender o que se fabrica. Da contingência de se preparar para o fracasso, sendo surpreendido pelo sucesso. Da humildade em aceitar os pequenos detalhes

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como mais relevantes que grandes planos. Da sabedoria em manter a cabeça erguida, a espinha ereta e a boca fechada. Sem procurar culpados, o que sempre será enganar a si mesmo.

57 Índice de felicidade nas empresas

Fundado no século XVII por um monge tibetano e convertido em paraíso imaginário no século XX pelo escritor James Hilton, encravado na encosta da Cordilheira do Himalaia, espremido entre a China e a Índia, iremos encontrar o Butão um pequeno reino de mosteiros. Nesse intrigante pequeno país, cerca de 70% da população pertence à etnia drukpa, que tem origem tibetana e são seguidores do budismo. Seu sistema de governo é a monarquia, onde reina atualmente o rei King Jigme Namgyel Wangchuck. Cerca de 90% dos seus súditos vivem da agricultura, apesar de que somente 6% do seu território seja cultivável. 204


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A televisão acabou de desembarcar no Butão, onde o rei King Jigme sempre tentou preservar a cultura, os hábitos alimentares, a prática do esporte nacional, o tiro com arco, e a vestimenta tradicional. Você deve estar questionando, o que tem a ver o Butão com um texto de gestão? Muita coisa. O reino do Butão sempre teve um conceito especial de era moderna, a começar que nesse pequenino reino budista o conceito de desenvolvimento difere, em muito, de nossos conceitos. No Butão a preocupação maior é com o crescimento do índice que mede a felicidade individual dos cidadãos, conhecido como “FNB — Felicidade Nacional Bruta” que leva em conta fatores como desenvolvimento socioeconômico duradouro e equitativo, a preservação do ambiente, a promoção da cultura e a boa governança. Diante desse inusitado índice, os butaneses não encontraram qualquer índice que estivesse de acordo com os seus valores e aspirações, conforme afirma o economista butanês Karma Galay. Esse índice de FNB foi uma proposta do rei King Jigme Singye em 1974, quando assumiu o trono, mas que somente agora é que o assunto tem começado a encontrar eco nas academias e entre os economistas.

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Em meio a tanta pobreza e injustiça, o mundo está começando a entender que o problema não é a falta de meios para produzir riqueza, mas como essa riqueza é produzida e distribuída. Diante disso podemos concluir que o homem parece que está se cansando de concentrar-se só no material e está chegando à conclusão que o progresso material não pode satisfazer sozinho as aspirações humanas de felicidade e bem-estar. Mesmo no mundo corporativo, não podemos esquecer que o ponto de mira nessa viagem pela vida é a felicidade, pois a estrada da carreira profissional pode levar ao sucesso, mas não à felicidade. É claro que o sucesso profissional é sensacional, pois ele cria condições para a felicidade, mas essa não é a única fonte de vida. A verdadeira realização profissional e pessoal só acontece quando valorizamos a pessoa que amamos e que nos ama, quando exercemos com sinceridade nosso papel de amigos dos amigos e, principalmente, quando conseguimos ser amigo de nós mesmos. Ser amigo de nós mesmos significa ter compreensão com nossos próprios erros, é ser nosso próprio cúmplice para os desafios, é nos estimular a ultrapassar novos obstáculos e, principalmente, aproveitar ao máximo a sensação de felicidade, sem culpa, sem medo. Para isso, se você faz as coisas bem, faça-as melhor. Não seja ganancioso, mas seja audacioso, procure ser o 206


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primeiro sempre, seja diferente, mas acima de tudo seja justo com seus colaboradores, tenha respeito ao seu nome, pois tudo passa, mas ele permanecerá com você para sempre e tudo isso faça com satisfação, buscando, a cada dia, a perfeita alegria. Diante de tudo isso, será que não está na hora de, além dos índices de produtividade, de lucratividade, de rentabilidade, de crescimento, de participação no mercado e tantos outros índices, criar também um índice de felicidade dentro das empresas? Se precisar de uma fonte de inspiração talvez esse pequenino país tão distante possa ser um exemplo.

58 Clientes ou colaboradores?

Quem é mais importante para a organização, os clientes ou o corpo de colaboradores? Sabemos que os dois têm grande parcela de importância. No mundo de hoje você encontrará em 100% das empresas gestoras numa histeria total, fazendo qualquer negócio para manter seus clientes atuais e desesperados na busca de novos mercados. 207


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Sabem que encantar já não é suficiente, é preciso surpreendê-los a cada instante e que precisam pensar em ações bombásticas para tentar reaver os clientes perdidos. Existem, inclusive, profissionais que procuram desvendar os meandros da alma do cliente, para adivinhar seus desejos, anseios e necessidades. É certo que no novo cenário competitivo é preciso ter, não um, mas os dois olhos no mercado. No entanto, esse novo cenário, como tudo no ambiente corporativo, se altera a cada instante e já aponta para outra realidade. Tão importante quanto o cliente externo é o cliente interno. Em última análise todos são clientes, vitais para a existência e sobrevivência da empresa, embora muitos gestores acreditem na falácia de que o cliente interno é um mero coadjuvante, muito menos importante do que o cliente externo. As análises organizacionais e de mercado têm demonstrado o contrário. Se o cliente externo é o alvo, o cliente interno é o instrumento que faz com que o alvo seja atingido. Num ambiente em que a busca pela preferência do cliente é disputada palmo a palmo, é suicídio relegar o fator humano, um capital valioso, ao segundo plano. A pergunta é: quem é o cliente? Percebemos que tanto os conceitos de mercado como os relacionados com a qualidade total insistem que o cliente é importantíssimo. Tão essencial que a empresa deve estar totalmente orientada para esse personagem, chamado 208


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genericamente de “cliente”. Em consequência, são inúmeros, divergentes sobre o que vem a ser cliente.

genéricos

e

Vivemos na era digital, o que permite que possamos comparar o conceito de cliente utilizando um termo da informática, o cliente-servidor. Como sabemos existem computadores servidores, que servem às necessidades de outros computadores, sem nenhuma restrição ou distinção de classe. O servidor está conectado durante 24 horas ao cliente. O computador-cliente se apresenta como um ditador, que se limita a dar ordens a serem obedecidas pelo servidor, caso contrário, o sistema não irá funcionar, podendo gerar o caos. É o que acontece quando você ouve a expressão de colaboradores desesperados, “o sistema caiu”. O interessante nesse conceito de cliente-servidor é que os papéis podem se alterar a qualquer momento — ou seja, o servidor passa a ser cliente e este passa a servidor, dependendo das circunstâncias. Logo, existe uma permanente interdependência entre o servidor e os computadores-clientes, o que faz com que o sistema se mantenha e trabalhe de forma eficiente. Uma empresa é uma rede, formada por diversos elementos, todos conectados. Esses vínculos internos estão ligados aos elementos fora da empresa, os clientes externos, 209


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que podemos denominar de provedores da empresa. Na cultura funcional, resquício da Escola Clássica, muito usada ainda hoje, ter servidores ainda é uma prática. Chegar a chefe ou gerente é o objetivo de quase 100% dos trabalhadores. Muitas vezes quando alguém consegue atingir esse nível pode se tornar um ditador prepotente e desagradável. No modelo cliente-servidor os papéis de quem gera serviços pode ser considerado ambivalente. Em um momento é servidor, em outro é cliente. Uma das formas de conseguir melhorar o serviço ao cliente é fazer com que todos compreendam os conceitos de cliente-servidor e cliente- interno, o que não se consegue da noite para o dia. Trata-se de um processo permanente. Todos somos servidores e clientes, assim temos que estar plenamente dispostos a adotar estes dois papéis, dependendo da situação em que nos encontramos. É bom lembrar que o cliente não depende de nós, ao contrário, nós é que dependemos dele. Eles são sempre as pessoas mais importantes, não mera interrupção das nossas tarefas: ao contrário, o propósito do nosso trabalho atender o cliente. Enfim, temos que ter em mente que não fazemos um favor ao cliente: ele é que nos faz o favor de nos dar a oportunidade de servi-los. O cliente nos traz suas aspirações e desejos — nossa obrigação é transformar suas aspirações e desejos em realidade, com benefícios a todos. São conceitos que valem para o cliente interno e para o cliente externo. 210


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59 A difícil arte de tomar decisões

Existe um conto popular sueco muito antigo sobre uma moça chamada Ronia, conforme narrado por Jan Carlzon em seu livro A hora da verdade. Ronia gostava de um rapaz, porém suas famílias eram inimigas mortais, inviabilizando qualquer possibilidade de relacionamento. As famílias viviam próximas a um abismo tão profundo que qualquer pessoa que tentasse pulá-lo e errasse o salto teria morte certa. Certo dia o rapaz arriscou e saltou para o outro lado a fim de visitar sua amada. Para seu desespero foi descoberto pelos pais da moça, que o prenderam com a intenção de usálo como refém. Ronia, ao perceber, correu até a beira do abismo com a intenção de saltar para o outro lado, onde também seria feita refém e assim abriria a possibilidade de liberdade para seu amado — sabendo que se errasse o pulo mergulharia para a morte, deixando o rapaz à mercê do “sogro”.

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Ronia sabia que, apesar das consequências de um salto mal dado, essa era a única chance salvar seu querido. Fechou os olhos e saltou para o outro lado. Existem ocasiões em que é preciso saltar. Aqueles que escolhem o caminho mais seguro nunca conseguirão atravessar um abismo. E, assim como Ronia, todos os gestores e empresas devem ousar atravessar o abismo. Saltar significa tomar decisões, e toda decisão, por mais simples que seja, envolve riscos, que se amenizam quando a empresa constrói uma estratégia bem-definida com base em planejamento estratégico claro e coerente com o ambiente em que atua. Tomar decisões é um ato de coragem, às vezes, beirando à temeridade, combinando com grande dose de intuição. Coragem significa desafiar a segurança. Andy Grove, ex-presidente executivo da Intel, é um grande exemplo. De dois em dois anos ele investia mais de quatrocentos milhões de dólares na construção de novas fábricas. Era uma aposta no futuro das novas tecnologias Intel, liderada por alguém que procura oportunidades de mudança para a sua empresa mesmo antes das alterações ocorrerem no mercado. Grove é o exemplo de um líder capaz de tomar decisões difíceis, disposto a sacrificar a segurança em favor de um futuro melhor. Para isso é necessário coragem para ver a realidade e para atuar nela. É o que Jack Welch, o saudoso 212


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CEO da General Electric chamou de “edge”, uma complexa combinação da procura da verdade com a coragem de atuar e tomar decisões. Muitas das decisões consideradas corajosas resultam de uma avaliação clara da realidade empresarial, embora seja necessário tomar cuidado: muitas decisões são apenas atos desesperados de líderes que evitaram saltar e enfrentar a realidade, para depois procurarem, de forma rápida, superar as situações difíceis em que se veem envolvidos. Vale a pena lembrar que um líder que não passa ideias nem valores, e que não saiba que liderar é ensinar, não está preparado para tomar decisões revolucionárias. A característica que Jack Welch designa de “edge” necessita de princípios e da capacidade de levá-los adiante. Realmente, no momento em que as decisões são tomadas, nem sempre é fácil distinguir os incompetentes dos líderes dotados. Talvez, o teste final seja o líder afirmar: “Eu atuei quando deveria ter feito. Eu tive a coragem de seguir as minhas convicções”. Os bons líderes olham sempre em frente, preparam suas empresas para enfrentar e acompanhar as mudanças e ensinam seus colaboradores a serem bons líderes. O mercado exige que as empresas tenham muitas pessoas com ideias, valores, energia e, principalmente, coragem para tomar decisões difíceis, dispostas a saltar sobre o abismo, criando novas gerações de líderes e assim sucessivamente.

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Toda decisão importante tem os componentes de alto risco — serão melhores se trouxerem com ela alto nível ético e humanidade, levando a recompensas. A decisão é a energia da vida, que em certos casos pode mudar o curso de uma trajetória. É o que ocorreu com Walt Disney, que tinha decidido colocar o nome de Mortimer em seu ratinho. Por sugestão da esposa, decidiu chamá-lo de Mickey. A indústria do entretenimento nunca mais foi a mesma depois que Mickey e Minnie fizeram sua estreia em Steamboat Willie, em 1928. Os líderes não são perfeitos, mas quem disse que suas decisões devem ser sinônimos de perfeição? Trata-se de uma combinação de fatores como intuição, sorte, trabalho árduo, riscos assumidos e coragem para saltar. Como afirma Des Dearlove, autor do livro Key Management: “As decisões são a essência do gerenciamento e da liderança: esta, sem tomada de decisão, é um vácuo”.

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60 Procura-se a motivação

Joãozinho estava indo mal em matemática. Os pais tentavam de tudo: aulas particulares, brinquedos educativos, centros especializados, terapia e nada de melhorar o desempenho do filho. Um dia ouviram falar de uma escola de freiras muito eficiente e que poderia ajudar. E lá se foi o Joãozinho. No primeiro dia chegou da escola sem o semblante moleque de antes. Ao contrário, estava sério, cara de poucos amigos. Sem cumprimentar ninguém, seguiu direto para seu quarto, onde começou a estudar sem parar, para espanto de todos. Passadas algumas horas, já noite, a mãe chama-o para jantar. Ele janta rapidamente, retorna para seu quarto e continua a estudar. Ninguém acredita no que está acontecendo. O tempo passa e Joãozinho mantém a mesma rotina. Até que um dia, chega em casa com o boletim em mãos que entrega à mãe. Nota 10 em matemática. A mãe não se contém e pergunta: — Filho, o que aconteceu para você mudar tanto? 215


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Foram as freiras? Joãozinho balança a cabeça, negando. — O que foi então? Os livros, a disciplina, a estrutura de ensino, o uniforme, os colegas? Joãozinho olha para a mãe: — Mãe, no primeiro dia de aula, quando eu vi aquele cara pregado no sinal de mais, percebi que aquelas freiras não estavam para brincadeira! Se prestarmos atenção iremos verificar que motivação é a junção de duas palavras, motivos e ação. Juntas elas formam a palavra motivação, ou seja, motivos para a ação. Isso significa que precisamos de motivos para agir. Motivação é um processo, não é algo que você irá encontrar num treinamento em um hotel-fazenda regado com axé music, filminhos para fazê-lo chorar em bicas etc. Não é um evento isolado. A conversa sobre curso de motivação pessoal não existe, ninguém motiva ninguém. Estudos mostram que 80% da motivação dependem de nós mesmos; os 20% restantes se referem à empresa, à chefia, à sociedade, à família, aos amigos. Isso demonstra que tudo que nos cerca tem menor influência do que a nossa capacidade de ação, reação e força de vontade. Houve quem comparasse a motivação a um grande iceberg, que possui cerca de 80% de sua massa embaixo d’água, deixando apenas uma pequena parte visível, que 216


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representa o meio em que vivemos, trabalhamos e nos divertimos. A parte invisível significa nosso interior, onde temos e devemos buscar e construir nossa motivação. Motivação tem tudo a ver com vontade, com querer fazer, interesse, iniciativa. Motivação é consequência, não causa. Se voltarmos para dentro da empresa, descobriremos que a falta de motivação está escondida em algum cantinho. Pode estar na apatia da liderança, na estrutura organizacional, nos processos de trabalho em que as disfunções da burocracia são sempre duchas de água fria na motivação. A principal fonte de problemas e onde se encontra a principal fonte de falta de motivação de uma organização está na maneira de administrar, diretamente ligada com o modelo de gestão. O modelo tradicional tem pouca variação de uma empresa para outra, embora existam características que podem ser encontradas em todas. Vejamos: os módulos estruturais são estabelecidos por funções, normalmente orientados verticalmente. Os gestores focam, principalmente, na operacionalização, em regras e procedimentos, o que produz uma gestão incisiva, uma vez que todos se concentram nas tarefas a serem executadas e não nos resultados. A consequência é que se reúnem grupos com base no trabalho a fazer e não nos objetivos a conquistar. Há uma desatenção completa ao capital intelectual da empresa, 217


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lugar em que prevalece o conhecimento explícito e não o conhecimento tácito. Gestão é muito mais do que dizer às pessoas o que fazer e seguir inputs de observação cada vez mais distantes de onde as coisas acontecem de verdade. O caminho para vencer e se tornar grande é tratar de organizar pequeno: em outras palavras, pense grande sobre o que pode atingir e pense pequeno sobre a maneira de atingir. Isso nos leva a propor uma gestão compartilhada com foco nos resultados, não nas tarefas a serem executadas. O quadro mental de realização do trabalho e a motivação estão no trabalho da equipe, não no emprego e na tarefa de cada pessoa. É fato que ainda nos deparamos com uma cultura organizacional com forte influência no modelo funcional. Pergunte a alguém qual o papel que exerce onde trabalha e a resposta quase sempre será “eu sou”. Sou gerente, sou diretor, sou, sou, sou... Infelizmente essa é uma realidade, parece que a organização gira somente em torno de si. Esta postura lembra a postura de Atlas, um dos titãs que, segundo a mitologia grega, lutou com seus irmãos contra Zeus, o deus dos deuses, pelo controle do Olimpo. Derrotado, foi condenado a ficar sustentando o céu sobre os ombros. A imagem que temos de Atlas é sua figura com o globo terrestre nas costas, como o gestor funcional que acredita que, se não 218


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carrega o mundo, vê-se obrigado a carregar nas costas a organização. O modelo baseado na função é egocêntrico, pois o foco está na pessoa, enquanto o modelo baseado no produto da equipe é grupocêntrico, pois valoriza o trabalho de todos. Entre as grandes oportunidades a nos motivar, uma delas é quando geramos expectativas positivas em volta de nossas vontades de sucesso. A expectativa deve estar na construção dos nossos sonhos de felicidade, trabalhando em harmonia ao lado daqueles com quem compartilhamos o trabalho em favor do bem comum. Ao criar expectativas positivas para todos, abrimos um importante canal na nossa motivação interna, uma energia poderosa capaz de nos levar ao objetivo sonhado.

61 As coisas nem sempre são o que parecem

Dois anjos viajantes pararam para passar a noite na mansão de uma família muito rica, porém rude: recusaram-se a deixar os anjos ficarem no quarto de hospedes e os colocaram em um porão, frio e malcheiroso.

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Quando estavam fazendo suas camas no chão duro, o anjo mais velho viu um buraco na parede e consertou-o. Quando o anjo mais novo viu, ficou indignado: por que ele fizera isso? O anjo mais velho respondeu calmamente: “As coisas nem sempre são o que parecem ser”. Pela manhã, despertaram cedo e seguiram viagem. À noite, exaustos e com fome, encontraram um casebre rústico em meio a uma pequena plantação. Moravam ali um agricultor e sua esposa. Apesar da pobreza, foram simpáticos e hospitaleiros. Depois de dividir sua pouca comida com os visitantes, o agricultor e sua esposa ofereceram a própria cama aos anjos. Ali poderiam ter uma boa noite de sono e, refeitos, poderiam seguir viagem. Quando o sol nasceu na manhã seguinte os anjos encontraram o velho agricultor e sua esposa em lágrimas. A vaca, cujo leite tinha sido a única fonte de renda da família, amanhecera morta. O anjo mais novo ficou furioso e perguntou ao anjo mais velho: — Como você pode deixar isso acontecer? O primeiro homem tinha tudo e você o ajudou; esta família não tem nada, vive na miséria e você deixou a vaquinha morrer? O anjo mais velho abraçou o amigo e repetiu: “As coisas nem sempre são o que parecem ser”. Diante do semblante de incompreensão do jovem, o anjo mais velho continuou: 220


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— Quando nos colocaram no porão daquela mansão, eu vi que havia ouro guardado naquele buraco na parede. Como você percebeu, o proprietário da mansão era um homem obcecado por dinheiro e incapaz de dividir sua fortuna. Eu tapei o buraco para que ele não achasse o ouro. — E o que isso tem a ver com a morte da vaquinha desta pobre gente? — questionou o jovem anjo. — Esta noite, quando estávamos dormindo, o anjo da morte veio buscar a esposa do agricultor; conversei com ele e propus que levasse a vaca no lugar da esposa. Foi uma troca, ele entendeu e aceitou fazer a permuta. Percebe agora que as coisas nem sempre são o que parecem ser? Nunca estamos completamente felizes, sempre temos algo para reclamar. Por quê? Por que nunca ficamos satisfeitos? Nem todas as coisas da vida são como queremos; nem por isso temos que ser infelizes. O fato é que não adianta levar a vida como se fosse um conto de fada. A vida é uma disputa constante em que, se não soubermos jogar, perderemos. É o que acontece quando as coisas não se concretizam do jeito que deveriam. Ou melhor, do jeito que gostaríamos. Se você tiver fé, só precisa acreditar que tudo que acontece e aconteceu, independente se for algo ruim ou bom, é em seu favor Chico Xavier ensinava que a gente pode morar numa 221


ANTOLOGIA DA VIDA CORPORATIVA

casa mais ou menos, numa rua mais ou menos, numa cidade mais ou menos e até ter um governo mais ou menos. A gente pode até dormir numa cama mais ou menos, comer um feijão mais ou menos, ter transporte mais ou menos, pode olhar em volta e sentir que tudo está mais ou menos. O que a gente não pode, em hipótese alguma, é amar mais ou menos, sonhar mais ou menos, ser amigo mais ou menos, namorar mais ou menos, ser honesto e ético mais ou menos, ser feliz mais ou menos, ser sincero mais ou menos, ter fé mais ou menos e acreditar mais ou menos. Assim correremos o risco de nos tornar uma pessoa mais ou menos.

62 A natureza e os negócios

A frase do poeta inglês John Donne: “no man is an island”, nos leva a refletir que o homem não consegue viver isoladamente, precisamos uns dos outros para a nossa sobrevivência. A natureza nos ensina que essa é uma lei que vale para todos. As plantas precisam da ajuda de alguns animais para poder dispersar seu pólen e suas sementes, de forma a assegurar a sobrevivência da espécie. 222


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Para conquistar essa parceria, muitas delas precisam atrair a atenção dos seus polinizadores ou dispersores; em uma linguagem mais administrativa, de seus parceiros. Para isso, normalmente atraem a atenção desses, oferecendo a seguir o néctar que recompensa o serviço prestado. A atração não é tarefa fácil; mesmo na natureza a competição é muito grande. As plantas usam diversas estratégias, tais como as cores fortes, que se sobressaem ao verde das florestas, ou outra estratégia bastante eficiente: o cheiro. Se observarmos, iremos concluir que o problema é que esses mesmos artifícios são utilizados por inúmeras outras plantas. A questão é: Como conseguir destaque em um ambiente tão competitivo? Talvez a resposta esteja na qualidade do néctar e, principalmente, na maneira como é oferecido ao parceiro em potencial. Se pudéssemos dar um conselho a uma plantinha, poderíamos orientá-la a adicionar um pouco mais de açúcar ao néctar, para que ele tivesse um sabor agradável — isso criaria fidelidade do parceiro, que voltaria sempre. Seria bom lembrá-la de que a localização é muito importante: se estivesse em local muito exposto ao sol, a vaporização da água tornaria o néctar muito doce, o que não agradaria seu parceiro. Por outro lado, se estivesse em local muito fechado, impediria a entrada de água da chuva, levando 223


ANTOLOGIA DA VIDA CORPORATIVA

a um efeito contrário: seu néctar poderia se diluir de forma excessiva, tornando-se menos doce. Outro cuidado seria não deixar o néctar muito exposto. Se houvesse facilidade em obtê-lo, o potencial parceiro se beneficiaria dele sem oferecer, em contrapartida, o serviço de transporte do pólen, com o que sua sobrevivência ficaria comprometida. A estratégia, então, seria deixar o néctar na parte mais profunda da flor: obrigatoriamente ele teria que tocar no pólen para chegar até o néctar. John Donne está certo: não há nenhuma possibilidade de sobrevivência se não houver parceria, nenhum homem é uma ilha. No mundo dos negócios não é diferente. Vivemos numa sociedade cuja evolução tecnológica nesta era pós-industrial representa a transformação da riqueza física, baseada na terra e nos bens de produção, em ativos intangíveis. Não só a marca, mas também os domínios, os bancos de dados, os softwares, as tecnologias, as licenças e outros ganharam significado patrimonial. Nesse cenário, ocorreu uma série de mudanças comportamentais e de posturas. O ambiente de negócios se transformou, principalmente com a inversão da cadeia de produção, com um modelo de logística reversa, sem estoques, com terceirização de pessoas, processos e de operações. O marketing passou a olhar de fato para o cliente, criando interfaces de contatos, seja ele qual for: B2C — Business to Consumer, B2B — Business to Business, 224


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M-Commerce — Mobile Commerce, Home Page etc. As empresas precisam da ajuda do cliente para divulgar sua marca ou imagem, pois ambas constituem a alma da empresa e asseguram a sua sobrevivência. Muitas precisam atrair a atenção de seus clientes, criando o que podemos denominar de “clientes apóstolos”, os formadores de opinião — e assim como as plantas, precisam atrair a atenção e oferecer algum benefício, algum néctar, que recompense a preferência por seu produto, seu serviço ou sua marca. Como na natureza, no mundo dos negócios também não é uma tarefa fácil. A competição é enorme e a maioria das estratégias utilizadas para atrair o cliente em geral é similar em todas as empresas. A questão é a mesma em relação à natureza: Como conseguir destaque em ambiente tão competitivo? A resposta também não é diferente. Pode estar na qualidade do produto (néctar) e na forma como ele será oferecido. O produto ou serviço deve atender ao máximo possível as necessidades do cliente para que ele volte sempre; sabemos que o cliente não compra produto, compra benefício. A localização também é importante, pois possibilita o adequado posicionamento do produto no mercado e, consequentemente, o valor percebido pelo cliente — e até para impedir que o cliente forme uma imagem que leve em consideração apenas o produto, diluindo o valor dos serviços adicionais, desvalorizando seu valor.

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A natureza pode ser uma grande mestra, gritando alto em seu silêncio de sabedoria, na complexidade de seu conjunto de coisas tão simples. Ela espalha suas lições em cada folha, em cada árvore, na água, no mar, no colorido das flores, dos animais e dos pássaros. Ensina que a sobrevivência das espécies passa pela cooperação de umas com as outras. São lições que, sem uma percepção apurada, não se consegue captar. Assim como na natureza, nos negócios também é necessário enxergar o que não está visível. Somente assim a empresa poderá sobreviver nesse tão citado ambiente complexo e competitivo.

63 É possível ser feliz no trabalho?

A nossa resposta é sim, apesar de corrermos risco de sermos criticados e questionados. Trata-se de um risco assumido, porque nossa postura é fruto de uma tranquila, absoluta e irreversível convicção: de que é possível ser feliz, não somente nas comemorações de 226


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fim de ano, no nosso aniversário e em outros dias festivos, mas também no trabalho. No entanto, é preciso que a empresa promova, permita e produza felicidade, além de bens e serviços de qualidade e de aceitação por seus clientes e consumidores. As palavras do escritor francês André Gide nos confortam e motivam: “Todas as coisas já foram ditas, mas, como ninguém escuta, é preciso sempre recomeçar”. Não custa repetir: como há gente “surda” nas empresas. O pior é que nem cirurgia nos tímpanos adianta. Não sabemos se o problema é mais em cima ou mais embaixo. O fato é que muitas empresas precisariam implodir ou explodir para que alguns gestores “ouçam” a verdade de que a ganância, a falta de ética e a exacerbação do poder não levam a nada senão à infelicidade. E como fazer para construir uma empresa em que impere a felicidade? Acreditamos que é preciso exercitar alguns valores simples, mas vitais no cotidiano de qualquer pessoa. Não ter vergonha e ter humildade para aceitar suas fraquezas, limitações e as próprias origens. Quando Abraham Lincoln foi eleito presidente dos Estados Unidos houve forte constrangimento das classes dominantes; afinal, era filho de sapateiro e iria dirigir pessoas componentes de famílias de tradição e de origem aristocrática. 227


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Ao fazer o seu primeiro discurso no Senado, um político arrogante aproximou-se: “Antes de o senhor começar, eu gostaria de lembrá-lo de que o senhor é filho de sapateiro”. E todos riram imediatamente. No fundo, todos queriam humilhá-lo, já que derrotá-lo não havia sido possível. Mas um homem como Lincoln era difícil de ser derrubado. Ele respondeu: — Obrigado por lembrar-me de meu pai neste momento. Eu procurarei ser um presidente tão bom quanto o sapateiro que ele foi. Lembro que meu pai sempre fez os sapatos de sua família; se os seus sapatos apresentarem algum problema, pode trazê-los e eu os consertarei. Desde cedo aprendi a consertar sapatos, e agora que meu pai está morto posso cuidar dos seus. Aliás, se algum de vocês tiver um sapato feito pelo meu pai que esteja precisando de conserto, pode trazer para mim. Mas de uma coisa estejam certos: eu não sou tão bom quanto ele. E seus olhos encheram-se de lágrimas ao se lembrar do pai. Para criar um ambiente feliz na empresa, sejam quais forem as circunstâncias, é preciso que o gestor e seus colaboradores mantenham o orgulho de si mesmos, de suas origens e de suas atribuições na empresa, sejam elas quais forem. Dificuldades existem, mas são elas que moldam os campeões. Por isso, gestores e colaboradores devem saber 228


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superar os obstáculos, agradecendo a todos os que, de alguma forma, pavimentaram o caminho. Lincoln nos ensina que devemos aprender com os outros tudo o que pudermos, mas nunca devemos abandonar a nossa essência. Conhecemos muitos gestores competentes e vencedores que dirigem empresas com lucratividade e ética, sem deixar de sorrir para o porteiro, para o faxineiro, independente do nível hierárquico. Uma empresa onde todos sorriem é um bom sintoma de que ali existe um ambiente saudável. Uma empresa onde o gestor consegue fazer com que todos entendam que a hierarquia se faz em cima da responsabilidade e não de privilégio e que todos os seres humanos são iguais, sendo a única diferença o tamanho da responsabilidade, já é um passo significativo para tornar uma empresa feliz. Outro ingrediente é o elogio, vital para todos nós. Às vezes o gestor se vê obrigado a dar um puxão de orelhas, mas também precisa oferecer recompensas, uma palavra de incentivo, porque a vida com seus colaboradores pode até ser um mar de rosas, porém sem retribuição será muito espinhosa. Além dos elogios, o ser humano precisa de prestígio e responsabilidade. Todos nós temos necessidade de sentir que somos especiais, que temos valor, como nos ensinaram Maslow e Herzberg. 229


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Dar a um colaborador a oportunidade de sentir o gosto do prestígio é a maneira de eliminar o lado negativo de seu comportamento e frisar o positivo. Cada um deles precisa das palavras de afirmação e encorajamento, do elogio, da apreciação por desempenhar bem sua tarefa ou, até mesmo, por ser o que é. Importante também é que não basta pensar em elogiar, é preciso pronunciar as palavras. É difícil, utópico, criar uma empresa feliz? Talvez o conselho é lembrar da famosa frase de Jean Cocteau: “Não sabendo que era impossível, ele foi lá e fez!” Que tal começar misturando a cada dia uma porção de fé, uma porção de paciência, uma porção de coragem e uma porção maior de trabalho? Adicione uma porção de lealdade, generosidade e boa vontade entre gestores e colaboradores. Tempere tudo com pitadas de motivação, um pouco de brincadeiras e um copo cheio de bom humor. Despeje tudo numa tigela, cozinhe bem, depois deixe que cada um vá se servindo com alegria, tranquilidade e paz.

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64 Tudo passará

Havia um rei que tinha tudo o que queria, mas sentiase carente. Desejava mesmo ter paz de espírito e equilíbrio nas suas decisões. Resolveu, então, consultar os sábios da corte. Os sábios lhe deram um anel energético com uma mensagem gravada que só poderia ser lida em momento de extrema gravidade. Se lesse só por curiosidade, o anel perderia sua energia — e a mensagem, seu significado. O rei seguiu o conselho. Um dia, o país entrou em guerra e perdeu. Houve momentos difíceis em que o rei foi tentado a ler a mensagem, mas controlou-se. O reino estava perdido. Perseguido pelos inimigos, o rei resolve exilar-se para salvaguardar sua integridade. O inimigo foi ao seu encalço, enquanto o rei cavalgava — até perder os companheiros e, por último, seu cavalo. Caminhou sozinho a partir de então. Seus pés sangravam. O inimigo se aproximava. Então o rei, exausto, chega à beira de um abismo. Os adversários estão cada vez mais próximos: 231


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“Estou vivo, talvez o inimigo mude de direção”, pensou. Olhou o abismo e viu um grupo de leões. Não existe saída. Então, o rei saca o anel e lê a mensagem salvadora: Isto também passará. Subitamente, ele relaxa. Inexplicavelmente, o inimigo muda de direção. O rei volta ao seu país, reorganiza o exército e reconquista o reinado. O povo dança nas ruas, o rei está feliz e orgulhoso. De repente lembra-se do anel e relê a mensagem. Então, tratou de refrear o orgulho e a euforia e, assim, obteve para sempre a paz de espírito e equilíbrio nas suas decisões. Todos nós deveríamos usar permanentemente um anel energético imaginário, relendo a mensagem gravada. Nas dificuldades, ela nos fará acreditar que melhores dias virão para recompensar o esforço diário e, principalmente, nos alertar, em tempos de euforia. Isso também passará se não estivermos atentos para nosso autodesenvolvimento, para o crescimento pessoal e para a responsabilidade de estar sempre inovando. Não resta dúvida de que tudo passa, embora cada uma de nossas ações deixem marcas gravadas para sempre. Por isso podemos dizer que existem pessoas estrelas e pessoas cometas. Os cometas passam, são lembrados apenas pelas datas em que passaram e pelas que vão retornar. As estrelas permanecem por milhões de anos. O sol permanece. Há muita gente cometa, passa pela vida por instantes. Gente que não prende ninguém e a ninguém se prende. 232


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Sem amigos, passando pela vida sem iluminar, aquecer, sem marcar presença. Importante é ser estrela, estar junto, ser luz, calor, vida. Amigo é estrela. Podem passar anos, surgir distâncias, mas a marca fica no coração. E o coração que não quer enamorar-se de cometas, que atraem apenas olhares passageiros. Ser cometa é ser companheiro por instantes, explorar os sentimentos humanos, ser aproveitador das pessoas e das situações, fazer-se acreditar e desacreditar ao mesmo tempo. Solidão é resultado de uma vida cometa, ninguém fica todos passam. Há necessidade de criar um mundo de estrelas. Todos os dias poder contar com elas e poder sentir sua luz e calor. Assim são os amigos, estrelas na vida da gente, são aragem nos momentos de tensão, são luz no momento de desânimo. Ser estrela neste mundo passageiro, cheio de pessoas cometas, é um desafio e, acima de tudo, uma recompensa — de ter sido luz e calor para muitos corações, haver nascido e vivido, não apenas existido. O mundo corporativo não difere muito do mundo pessoal. Apesar da frieza do capitalismo, da busca de resultados e de melhor rentabilidade, não se pode negar que a essência desse universo são as pessoas, que levam consigo sentimentos e emoções ao atravessarem as portas 233


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da empresa. É o momento em que entra em cena o conceito de poder pessoal, a afirmação do “eu posso”. O que significa o conceito de poder pessoal? É ter nas mãos as rédeas da própria vida, é autoestima elevada, estar harmonizado e em equilíbrio, é ter caráter. É sair do papel de vítima, aceitar as coisas como elas são, e não como gostaríamos que fossem. Por incrível que possa parecer é exatamente nessa última parte, o aceitar as coisas como elas são, que as pessoas discordam do conceito, porque ele pode parecer absurdo: “Como posso ter poder pessoal aceitando passivamente as coisas como elas são? Que poder é este?”. Aceitar não significa ser passivo. Quando aceitamos as coisas como elas são, resgatamos nossas forças e o poder de transformar. Aceitar não quer dizer que podemos fazer as coisas voltarem a ser como foram, não significa estar feliz com os acontecimentos, não é aprovar o ocorrido. Significa estar aberto às mudanças, estar aberto a rever os referenciais. Quando isso ocorre saímos do papel de vítimas das circunstâncias, para realizar com disposição as mudanças que precisam ocorrer. Ao não aceitar integralmente as mudanças, estamos na situação de tentar restaurar, muitas vezes em desespero, os padrões ou situações anteriores — talvez mais cômodas e mais confortáveis. James Baldwin disse: “Você não consegue consertar o que não consegue encarar”. 234


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É fundamental encarar as verdadeiras causas de nossa irritação ou de nossa depressão. Aceitar as mudanças é o primeiro e decisivo passo para tomar as decisões acertadas. Deixar de aceitar a realidade é, sem dúvida, abdicar do direito de fazer escolhas conscientes e corretas. Aceitar a realidade significa olhar para o futuro, para as transformações que precisam ser concretizadas. Somente assim, gestores, colaboradores, equipes e organizações poderão se desenvolver de forma saudável.

65 Diferenciar ou morrer

Janus é um dos mais antigos deuses romanos. Dois rostos, opostos, um para a esquerda, outro para a direita. São muitas as versões sobre ele. Uma delas conta que Janus era um estrangeiro que tinha ido viver em Roma e teria sido acolhido pelo rei Câmeses. Após a morte deste, reinara só. Ele simbolizaria as duas faces opostas, passado e futuro, interior e exterior, ser ou não ser, indivíduo e multidão, em um mesmo deus, identificado com a honestidade, abundância e paz. 235


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Outra versão era a de que Janus teria sido o inventor dos barcos e do dinheiro, do transporte e da empresa. As mais antigas moedas romanas possuíam em um dos lados a imagem de Janus e, no outro, a representação de um barco. Transformação, mutação, metamorfose. Teria sido Janus o responsável pela revolução Neolítica em alguns locais da Península Itálica? Janus está na origem do nome do mês de janeiro, o que faz sentido, uma vez que em 1º de janeiro olhamos para o passado, numa reflexão sobre o que fizemos ou deixamos de fazer no ano que se foi, refletindo ao mesmo tempo sobre o futuro, a esperança no ano que nasce. O que chama atenção nesse deus romano pouco conhecido é o fato de ser identificado como o inventor da empresa. A lição que deixa é de que a empresa, para ter sucesso, deve estar com a atenção voltada para o futuro, sem deixar de olhar para o passado, onde irá buscar lições para os novos tempos. Em síntese: olhar o passado para entender o presente e planejar o futuro. Não é uma lição simples; vivemos em um mundo de mudanças constantes, um mundo sem cantos, redondo, em que as mudanças são os únicos elementos estáveis. Em suma, o chamado mundo globalizado. Como ensina Kotler, temos que agir localmente e pensar loucamente. Agir localmente significa respeitar a cultura e os valores de cada região. São muitos os exemplos 236


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de empresas que se deram mal, por não considerar essa máxima. E como sobreviver neste mundo globalizado e sem fronteiras? As receitas são inúmeras, sempre partindo da máxima: diferenciar ou morrer. A diferenciação consiste em fazer produtos em faixas exclusivas de mercado em que não tenha similar ou com características diferentes dos produtos do concorrente. O conceito possui altíssima característica estratégica, levando também em conta que diferenciação só resolve caso possua mercado. Ser diferente supõe ser único, especial, trazendo atributos que o distinguem da concorrência. Mas é importante saber que o diferencial não precisar estar necessariamente relacionado com o produto Analisemos por outro ângulo, considerando que a verdadeira novidade nas últimas décadas está na incrível proliferação de produtos. Um supermercado médio tem cerca de 40 mil itens. Já uma família média satisfaz entre 80% a 85% de suas necessidades com 150 itens. Em resumo, 39.850 itens do supermercado são ignorados. Claro que as necessidades de cada família variam em relação a outras, mas a imensa maioria dos produtos seguirá passando em branco nas listas de compras. O seu pode ser um deles, caso não possua um 237


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diferencial. Com a grande concorrência entre as redes supermercadistas, cada uma cuida de oferecer escolhas diferenciadas. Os clientes têm tantas alternativas boas que eventuais erros na hora de escolher o que vai para a gôndola custam muito, muito caro. Portanto, tenha em mãos as suas credenciais. Caso tenha um diferencial é preciso capacidade para demonstrar a diferença, o verdadeiro passaporte para o sucesso. Não basta conhecer de tudo um pouco, é preciso conhecer de tudo muito. Assim você poderá construir um diferencial para a empresa.

66 Cultura organizacional

Certo dia um empresário viajava pelo interior de Minas. Ao ver um caipira tocando umas vacas, parou para lhe fazer algumas perguntas: — Poderia me passar algumas informações?

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— Craro, sô! — As vacas dão muito leite? — Quar que o senhor quer saber: as maiáda ou as marrom? — Pode ser as malhadas. — Dá uns 12 litro por dia! — E as marrons? — Tamém uns 12 litro por dia! O empresário pensou um pouco e logo tornou a perguntar: — Elas comem o quê? — Quar? As maiáda ou as marrom? — Sei lá, pode ser as marrons! — As marrom come pasto e sal. — Hum! E as malhadas? — Tamém come pasto e sal! O empresário, sem conseguir esconder a irritação: — Escuta aqui, meu amigo! Por que você pergunta se é das malhadas ou das marrons, se a resposta é mesma? O caipira responde: — É que as maiáda são minha!

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— E as marrons? — Tamém! O termo cultura pode ser compreendido como comportamento, tradições e conhecimentos de um grupo social, incluindo modo de vida, vestimenta e inúmeros outros aspectos. O choque de cultura ocorre quando as respectivas culturas de dois contendores são diferentes, como nessa anedota do mineirinho e do empresário. Agora vejamos o que ocorre nas empresas. Em uma conversa informal, um indivíduo levantava inúmeras indagações sobre a cultura organizacional, uma vez que tinha intenção de padronizar, de alguma forma, a gestão do negócio. Buscando inspiração e emprestando conceitos de autores consagrados como Peter Senge, Peter Drucker, Michael Maccoby e Charles Handy, outro executivo tentou argumentar que toda organização é um somatório de culturas; daí o motivo de que não podermos padronizar a gestão, um erro que a maioria dos cursos de Administração que tenta empurrar aos acadêmicos soluções padronizadas para problemas padronizados sem considerar a cultura organizacional. Culturas não são precisamente definidas, apenas reconhecidas quando encontradas e cotejadas. Dessa forma, as organizações são obrigadas a conviver com a pressão de forças contrapostas. Podemos definir “Administração” como sendo o ato de reconciliar essas forças em alguma combinação de trabalho e 240


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culturas. Não pode haver fórmula universal, pois as pressões serão mantidas diferentemente em cada organização. A categorização de culturas organizacionais é tema de vários livros e autores. Michael Maccoby produziu suas categorias usando como metáfora a natureza. Charles Handy preferiu se basear na mitologia grega. De forma diferente, ambos chegam aos mesmos conceitos, estabelecendo quatro tipos de cultura empresarial: Cultura de Clube, Cultura de Função, Cultura de Tarefa e Cultura Existencial. Historicamente a Cultura de Clube é encontrada na pequena organização; é excelente pela rapidez de decisão, apesar de que, como sabido, rapidez não garante qualidade. Nessa cultura o que conta é o controle dos recursos e o carisma pessoal do empreendedor. A empatia é ali uma virtude fundamental, pois a comunicação adquire rapidez por meio dela. Trata-se um tipo de cultura barata de gerir, pois a confiança é mais barata que os procedimentos de controle, e a empatia não custa um centavo. A partir dessas bases, a Cultura de Clube gera mudança nas pessoas, já que elas passam a ser elos entre todo o corpo de colaboradores. Se um elo fraqueja, substitua. Quando pensamos em uma organização maior, é a Cultura de Função que se sobressai. Ela baseia sua abordagem em torno da definição da função ou tarefa a ser feita, não em torno de resultado. As tarefas de uma empresa podem ser subdivididas 241


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quadro a quadro, até que se tenha um diagrama de fluxo de trabalho organizacional, com um sistema de funções prescritas (especificadas como Descrição de Função) e integradas por um conjunto de regras e procedimentos (manuais, previsões orçamentárias, sistemas de informação etc.). É o tipo de cultura ideal quando se pode assumir que amanhã será igual a ontem. O ontem pode ser examinado, desmembrado em pedaços e remontado na forma de regras e procedimentos para amanhã. Os indivíduos na Cultura de Função são, portanto, parte da máquina, as partes intercambiáveis do sonho de Henry Ford. Nela é irrelevante que o indivíduo tenha um nome: um número já serve, posto que cada um faz o serviço determinado, nem mais nem menos. Já na Cultura de Tarefa, a administração se volta para a solução contínua e bem-sucedida de problemas: definir o problema, distribuir os recursos adequados à solução, dar o sinal verde e aguardar. É uma boa cultura para se trabalhar desde que você saiba o que deve fazer. Ela funciona bem quando o produto ou serviço não é repetitivo. A variedade, não a previsibilidade, é o fermento desse tipo de administração. Passemos à Cultura Existencial. O existencialismo defende a suposição de que o mundo não é parte de um propósito maior. Assim, a Cultura do Existencialismo é a preferida pelos profissionais autônomos, que podem preservar 242


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a sua identidade e a sua liberdade sem se sentir propriedade de ninguém — no entanto, podem ser parte de uma organização. Mesmo sem reconhecer nenhum patrão, embora possam aceitar uma coordenação superior, que os dirija mantendo as conveniências do colaborador autônomo. A administração corporativa é uma tarefa enfadonha, algo que pode ser comparado às tarefas domésticas. Como a dona de casa, o administrador também tem pouco prestígio. As corporações de Culturas Existenciais são lugares esplêndidos para se trabalhar, como universidades ou hospitais. Os profissionais geralmente têm estabilidade, tabelas de remuneração, territórios ou esferas de influência atribuídas, garantias de independência. É maravilhoso para eles, mas não para os que têm a tarefa de liderá-los, organizar, ou administrar, já que não há sanções que possam ser usadas contra eles. Demissão, estímulos ou punições, estão fora da jurisdição do líder. Os profissionais não recebem ordens de boa vontade, não preenchem formulários nem aceitam compromissos, a não ser de acordo com seus próprios planos. Todo professor gosta de ser o rei da classe, sem interrupções, exatamente como o médico é rei em seu consultório e o advogado em seu escritório. Você só entra a convite, critica quando solicitado, comanda com consentimento. São todas organizações de consentimento, onde o administrador governa com os governados consentindo 243


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— e não com a autoridade delegada pelo organograma. Pode ser democrático, mas é difícil e exaustivo de lidar. A Cultura Existencial faz tremer qualquer administrador ou organizações de tipo mais comum, principalmente as que utilizam a Cultura de Função. Onde só se pode administrar por consentimento, cada indivíduo tem o direito de veto. Assim qualquer esforço coordenado se transforma em tema de negociações intermináveis. Cada uma das culturas, ou maneira de gerir as coisas, é boa para alguma coisa. Nenhuma cultura ou a combinação delas é ruim ou errada, apenas pode ser inadequada para determinadas circunstâncias organizacionais. Quando o indivíduo ou organização fica preso a uma cultura, começa a definir tarefas para que a situação se adapte as suas inclinações culturais. Os adeptos da Cultura de Clube verão problemas de desenvolvimento quando se depararem com as exceções, quando o manual de regras falhar, emergências em que o instinto e a rapidez serão melhores do que a análise lógica ou a solução criativa de problemas. Os da Cultura de Função farão tudo para se adaptar ao livro de regras, mesmo que essa seja a maneira mais complicada de fazer as coisas. Numa tentativa de minimizar custos, a Cultura de Função tenta padronizar tudo, tarefas de desenvolvimento: tenderá a sistematizar o uso do passado para predizer o futuro. 244


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Os da Cultura de Tarefa amam a criação: tendem a inventar soluções excelentes para problemas desnecessários ou engendrar respostas que, embora imaculadas, são dispendiosas de implementar. Diferenças são necessárias e boas para a saúde organizacional. O monoteísmo cultural parece ser inconveniente para a maioria das organizações. A escolha e a combinação de culturas não podem ser realizadas ao acaso. Cultura errada no lugar errado significa sofrimento e ineficiência.

67 A difícil arte do poder

O inocente cordeiro bebia água num córrego de águas límpidas e cristalinas quando apareceu um lobo esfomeado, de horrendo aspecto: — Que desaforo é esse de turvar a água que venho beber? — disse o monstro, arreganhando os dentes. Vou castigar essa ousadia. Trêmulo de medo, o cordeiro respondeu: — Como posso turvar a água que o senhor vai beber 245


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se ela corre do senhor para mim? O lobo atrapalhou-se com a resposta, mas não deu o rabo a torcer: — Além disso, inventou ele, sei que você andou falando mal de mim no ano passado. — Como poderia falar mal do senhor no ano passado, se nasci neste ano? Novamente confundido pela voz da inocência, o lobo insistiu: — Se não foi você, foi seu irmão mais velho, o que dá no mesmo. — Como poderia ser meu irmão mais velho se sou filho único? O lobo, furioso, vendo que não convencia o pobre cordeiro, veio com a lógica de lobo faminto: — Se não foi seu irmão, foi seu pai ou seu avô. E sangrou o pobre cordeiro no pescoço. Contra a força, não há argumentos. Desde o início da humanidade que existe a máxima de que o mais forte domina o mais fraco. Em um primeiro momento, a humanidade pensou que sua própria sorte dependia do acaso; da providência (caso da civilização cristã); da sustentabilidade da terra e da possibilidade de matéria-prima (sociedade industrial). A sociedade de hoje crê 246


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que o destino do homem depende, em grande parte, de sua capacidade de programação. Na sociedade industrial, o poder dependia da posse dos meios de produção (fábricas). Na sociedade pós-industrial, o poder depende dos meios de ideação (laboratórios) e da informação (comunicação de massa). Os EUA são uma potência não porque possui a Intel, a General Electric ou a Microsoft, mas porque possui universidades e laboratórios de pesquisa. A Microsoft é muito mais importante pelas pesquisas do que pela produção. Vivemos num meio social competitivo, em que os indivíduos se veem exigidos a superar obstáculos, ainda que tais problemas se refiram a outras pessoas, por acaso interpostas entre o sujeito e o objeto de seu desejo. Apesar do uso generalizado do termo poder, existe muita confusão sobre a sua definição: as tentativas de conceituar o termo “poder” não o distinguem claramente como influência e autoridade. O poder pode ser um potencial de influência a utilizarse ou não. Nesse sentido, existe uma diferença entre poder e liderança. Liderança é qualquer tentativa de alguém, qualificado ou não, influenciar as atividades de um indivíduo ou grupo para a consecução de um objetivo; poder é o seu potencial de influência. Às vezes esse poder é usado de forma individual para dominar este ou aquele colaborador. Enfim, podemos 247


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definir poder como potencial de influenciar um indivíduo ou grupo ou conseguir a sua submissão. A maioria das pessoas tem dificuldades com o poder. Lorde Acton dizia que “o poder tende a corromper, e o poder absoluto corrompe absolutamente”. Este ditado foi tão citado que se tornou clichê. Sua declaração foi feita em uma época em que reis e imperadores detinham o poder absoluto. O poder ainda corrompe e, no local do trabalho, o poder com o dinheiro sempre é um problema: quem tem o poder e o dinheiro sempre acha que tem também a força, quando a verdadeira força está no conhecimento. Poucos locais de trabalho funcionam como democracias: mesmo os que afirmam sê-lo não são tão democráticos quanto parecem. O poder se apresenta como algo de intensa energia. Por exemplo, o diretor que grita e bate com o punho na mesa para que tudo seja feito a seu modo parece estar demonstrando poder. O guarda que apita para você em meio ao trânsito agitado está demonstrando poder, o gestor que teima em manipular e controlar ações de seus colaboradores está demonstrando poder. Tudo isso pode parecer poder, mas na verdade é autoritarismo, diferente de autoridade que é conquistada através do conhecimento e do respeito às pessoas, esta sim a síntese do verdadeiro poder. Do verdadeiro poder emana uma energia em geral serena e sutil. Imagine você em uma reunião com um grupo 248


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de pessoas da mesma organização; o diretor entra e senta-se no fundo da sala. Apesar de sua discrição e de não falar nada, o sentimento de cada pessoa dentro da sala muda, pois você e todos estão diante do poder. O poder real é silencioso e o poder interior é o mais silencioso de todos, é quase invisível, mas pode mover montanhas. Existem muitos tipos de poder dentro das organizações, muitas maneiras de uma pessoa dobrar outra para fazer a sua vontade. Quando esse poder é exercido com responsabilidade, as pessoas estão dispostas a obedecê-lo; porém, quando vem acompanhado de autoritarismo, as pessoas podem até obedecer, mas por medo. O comportamento de presunção e vaidade excessiva pode criar uma aparência de sucesso, mas não atribuem ao autoritário conhecimento e competência. Qual o tipo de poder você, como gestor, exerce? O poder baseado na competência, na autoridade ou no autoritarismo? Eis a questão.

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68 Boas ideias — Como conseguir?

As boas ideias podem vir de situações inusitadas e inesperadas. Já contamos aqui a história do cientista George de Mestral, que descobriu um substituto para o zíper ou fecho de roupas, o velcro, ao observar o processo de aderência dos carrapichos em sua roupa. Uma ideia brilhante inspirada na natureza. Existe a concepção de que o bom líder deve ser a origem de todas as ideias brilhantes, o que é incorreto, até porque a fonte de ideias não é o mais importante. O que interessa é o fato de o líder apoiar e encorajar as pessoas a gerar novas ideias. Porém, a insegurança e a prepotência de muitos gestores fazem com que esses inibam e até roubem ideias dos subordinados, apresentando-as como suas. O verdadeiro líder deve entender que a melhor maneira de vencer não é apropriar-se de ideias alheias e sim, antecipar-se, chegar antes, conseguir boas ideias. Para tanto o líder deve buscar pessoas talentosas e compreender que os colaboradores não são seus: são pessoas 250


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que têm ideias. O líder atua como simples catalisador. Qualquer negócio, independentemente de seu ramo ou tamanho, requer uma transfusão maciça de talentos e ideias, mais passíveis de ser encontradas entre os não conformistas, dissidentes e rebeldes, e não no meio dos colaboradores metódicos e comportados. Não é fácil conseguir pessoas talentosas, existe concorrência acirrada nessa área, apesar de muitas empresas abrirem mão delas sem se aperceberem. Em administração a única coisa que não sai da moda é o talento, independente da época, lugar ou estilo; orientarse pelas ideias de pessoas talentosas talvez seja uma das características mais importantes para um bom líder. Essa condição, no entanto, não é suficiente para se conseguir êxito. Ken Blanchard, em seu livro Gung Ho — expressão chinesa associada aos conceitos de motivação, colaboração e interajuda, que nos EUA vulgarizou-se com a expressão go for it, que quer dizer força — afirma que “como num jogo de futebol, o líder deve entusiasmar a equipe, aplaudir, incentivando-os a marcar o gol, pois sem pontuação não há jogo”. O livro conta a história de uma gestora que tem a natureza como modelo e administra uma fábrica com base nos ensinamentos de um índio. Para ela existem três segredos para o sucesso de um empreendimento: o espírito do esquilo, o método do castor e 251


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o talento dos gansos. O espírito de esquilo dá uma visão da energia das pessoas. A principal característica do esquilo é ser trabalhador; eles nunca param, estão sempre trabalhando arduamente porque consideram que seu trabalho vale a pena. Sabem que seu trabalho faz a diferença e trabalham por um objetivo comum. O castor controla as suas ações até atingir o objetivo; para isso, é necessário respeitar, ouvir e levar em consideração os pensamentos, sentimentos, necessidades e sonhos de cada um. Quanto aos gansos, sabemos que eles voam em grupo. Quando o líder está cansado, se junta ao grupo de trás e outro assume a liderança do voo. Trata-se de uma liderança partilhada. Quando estão juntos fazem grandes algazarras, como se estivessem congratulando-se: é o principal dom do ganso, a felicitação. Para implantar esse dom na empresa é preciso que o líder faça felicitações verdadeiras, que podem ser diretas, como um elogio, um sorriso, um afago ou um aperto de mão, ou indireta, quando entrega a alguém o trabalho mais importante, dando-lhe total liberdade para a execução. Qualquer que seja a forma, elas precisam ser verdadeiras. Importante também é comemorar o progresso, como fazem os gansos. Concordamos com o que disse Blanchard, sobre ser preciso entusiasmar a equipe, incentivá252


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la a fazer o gol, uma vez que sem pontuação não há jogo, sem esquecer de comemorar os progressos, não somente os gols. Muitas empresas fazem um esforço enorme para buscar a descentralização, tarefa que requer líderes que escolhem, criam, convencem e causam. Líderes que possam tomar decisões em todas as camadas e setores da organização. São as razões que fazem com que o mito de que líder é o que está no topo da hierarquia esteja tão enraizado na sociedade. Outro aspecto é que as pessoas se referem a gestor ou a líder como se fossem sinônimos; decididamente não são. Muitas vezes quem está no topo da hierarquia não é um verdadeiro líder. Definir normas não constitui a essência do líder. Ordenar, gerir, chefiar, embora sejam atribuições importantes de um gestor, não são sinônimos de liderança. É claro que o ideal é que os gestores tenham capacidade de liderança e que os líderes tenham capacidade de gestão. Liderança é um tema que vem sendo discutido desde os mais remotos tempos, apesar de ser perigoso, porque significa desafiar as pessoas a mudar hábitos, valores, a própria vida, o que tende a gerar estresse. Infelizmente alguns gestores reagem atacando, denegrindo a imagem do líder, inventando e construindo inverdades para justificar posturas autoritárias, em razão de não conseguirem conquistar a simpatia e a admiração de seus comandados. 253


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Ser líder não mais significa apenas ter visão, reunir pessoas e montar uma equipe em torno de si; agora os desafios são detectar as mudanças e fazer com as pessoas se adaptem a essas mudanças. Este é o papel do líder: aprender e ensinar todos a lidarem com os conflitos existentes entre as crenças e a realidade a ser enfrentada. Por isso o líder deve ter força emocional para tolerar incerteza, frustração, angústia e dor, embora não precise chegar ao absurdo de levar adiante o mito pelo qual o líder é um guerreiro solitário. Ao contrário, deve lidar com os conflitos existentes entre as crenças e a realidade, desafio a ser enfrentado com sua equipe de forma coesa e harmoniosa. Como diz Luciano de Crescenzo: “Nós somos anjos com apenas uma asa e só podemos voar abraçando um ao outro”. Em resumo, o líder sozinho não é nada.

69 Competição: Ufa! Que dureza

Em conversa com um alto executivo de uma grande empresa da região, divagávamos sobre as dificuldades do mercado; uma de suas frases soou como um desafio e um 254


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obstáculo difícil de ser transposto: “A competição é dura”. Hoje as pessoas possuem informações sobre uma infinidade de produtos a escolher. Está à disposição uma série de formas de comprar, bombardeadas por mensagens publicitárias em uma quantidade enorme de veículos. A ênfase no atendimento se transformou no calcanhar de Aquiles e na vantagem competitiva das organizações. As pessoas solicitam cada vez mais produtos personalizados. E essa demanda deve ser atendida por todas as empresas. Paralelamente, os produtos estão ficando cada dia mais semelhantes entre si, transformando-se em uma espécie de commodity. Ao não notar diferenciação, o cliente pressiona as empresas por algo mais. “Se tudo parece igual, ainda que não seja, vou comprar de quem me atende melhor”. “As empresas devem conceber estratégias para diferenciar seus produtos e serviços com propostas de valor único”, diz Larry Wilson em seu livro Pare de Vender, Faça Parcerias. Mas como o valor está nos olhos e no que o consumidor percebe, é necessário trabalhar muito próximo ao cliente para poder corresponder ao que ele valoriza ou lhe parece mais adequado: é preciso atendê-lo de forma especial. O foco deve estar na qualidade do atendimento prestado. Nesse sentido as empresas precisam abandonar a ideia de que os serviços são geradores de custos. Ao contrário, são, sim, importantes geradores de receita. 255


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A Learning International, empresa de consultoria americana, fez uma pesquisa em companhias conhecidas pela excelência dos serviços prestados e pela qualidade dos produtos. O resultado mostrou que os funcionários da linha de frente de atendimento ao cliente precisam ter pelo menos 10 competências especiais, independentemente do tipo de empresa ou setor de atividade escolhido. Eis uma síntese de cada uma: 1Desenvolver a confiança e a fidelidade dos clientes. Atender as necessidades dos clientes, progressivamente, e fazer o que é mais sensato para preservar a boa vontade deles. 2Comunicar-se bem. Ser articulado e diplomático, fazer perguntas pertinentes e utilizar criteriosamente comunicados escritos. 3Dominar a tensão. Permanecer organizado, calmo e construtivo. Demonstrar tolerância e paciência e saber controlar as emoções. 4Prestar atenção. Não apenas ouvir os clientes, mas captar o significado do que dizem. 5Estar sempre alerta. Lidar com as informações rapidamente. 6Trabalhar bem em equipe. Cooperar com o outro e manter relacionamentos positivos e produtivos com colegas 256


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dos demais setores da empresa. 7Demonstrar confiança e lealdade. Desempenharse bem e de forma coerente, mantendo lealdade à empresa, com palavras e atitudes. 8Demonstrar motivação pessoal. Ser atencioso, otimista e prestativo. Mostrar interesse no autodesenvolvimento, ser autoconfiante e independente no trabalho. 9Resolver problemas. Ser capaz de resolver uma gama variada de situações, coletando e analisando informações para discutir soluções e chegar a mais adequada delas. 10- Manter o profissionalismo. Apresentar-se bem, o que inclui boa aparência na forma de se vestir e uma atitude profissional. Ao contrário do que se previa com a nova economia, anda mais difícil do que nunca prestar um bom atendimento, principalmente pelo fato de os consumidores estarem mais exigentes. Uma solução seria tornar mais fácil para o cliente realizar negócios. Tudo saindo bem, o consumidor não precisará contactar o atendimento. Para isso é preciso ajustes constantes. Perguntar com frequência para clientes quais são os principais pontos positivos e negativos do produto/serviço. Se existem pontos fracos, os próprios consumidores podem propor soluções.

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O atendimento não pode ser considerado um departamento de reclamações ou de controle de qualidade ou de satisfação do cliente. É um dever de todos na instituição atender e satisfazer seus consumidores. As empresas que atendem bem o cliente fazem disso uma prioridade em todos os níveis da organização; criam valores e estratégias consoantes. É certo também que os consumidores de hoje estão até dispostos a pagar um extra para terem suas necessidades básicas satisfeitas de forma rápida e eficiente, e ficarão agradavelmente surpresos se forem tratados com dignidade e respeito. Cliente é parceiro. As empresas que entenderam esse conceito não estão preocupadas com o livre arbítrio digital. Seus clientes-parceiros não vão deixá-las na mão. Já para empresas em que cliente bom é cliente quieto, os dias estão contados. Lembrem-se: a prestação de bons serviços nunca é um acidente.

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70 A fantástica Mary Parker Follett

Qualquer imaginação que possamos ter em relação à boa ou à má administração, seja criativa ou restritiva, eficaz ou eficiente, refere-se ao método de tomada e implementação de decisões para levar as equipes e as organizações ao seu objetivo. “Não devemos departamentalizar nosso pensamento com cada problema com que nos deparamos nas empresas. Até não creio que temos de lidar com problemas de produtividade, psicológicos, econômicos e éticos. Temos problemas humanos com aspectos psicológicos, econômicos, éticos e outros”, afirmou Mary Parker Follett.Isto significa que, se trabalharmos as pessoas, resolveremos muitos dos problemas da empresa. Essa tem sido a tônica da administração de nossos dias. Em outras palavras, para ser bem-sucedida, a administração precisa compreender as pessoas, os grupos e a comunidade. Por quê? Porque encontramos o homem somente na organização do grupo. As potencialidades do indivíduo permanecem sem uso até que elas sejam liberadas da vida do grupo. 259


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A verdade individual não pode ser a verdade do grupo: as pessoas têm direitos fora da sociedade, independente da sociedade ou contra a sociedade; portanto, a administração precisa compreender tudo que envolve as pessoas. O objetivo maior da ação administrativa é conseguir a integração das pessoas e a coordenação de suas atividades dentro da empresa; com isso, alcançar as metas e objetivos traçados pela organização. Em cada assunto há aqueles que levantam a voz, oferecem conceitos mais avançados que outros e, às vezes, adiante de seu tempo. São pessoas especiais que parecem estar em sintonia com forças maiores para remodelarem os pensamentos da sua época e transpor paradigmas. Uma dessas pessoas, no campo da administração, foi uma mulher fantástica cujo nome deveria estar entre os maiores pensadores da história, mas que por injustiça do destino, ficou relegada ao esquecimento. Trata-se da citada Mary Parker Follett, uma americana ousada nascida em Boston em 1868. A citação constante do segundo parágrafo aborda assuntos que estão sendo debatidos, discutidos e apregoados pelos diversos palestrantes em todo canto do mundo, como se fossem novidade. Na verdade, trata-se de propostas feitas por Follett na década de 1930, infelizmente na época errada. Se fosse hoje ela estaria entre os maiores pensadores de nossos tempos. Não é por acaso que Peter Drucker a intitulou de “a 260


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profeta do gerenciamento”. A ousadia de Follett era tanta que quando o gerenciamento científico e a administração autoritária estavam no auge, ela escrevia sobre trabalho em equipe. Hoje, é descrita como “uma pessoa de mente e pensamentos universais”, que visualizou a organização consciente como o grande objetivo espiritual do homem e escreveu que o mundo necessitava de novo relacionamento entre os grupos constituintes. Para ela este era um desafio fundamental perante todas as esferas da atividade humana e não somente para uma empresa: “Acredito que o fim das guerras entre as nações, e entre trabalho e capital, virá exatamente da mesma maneira, formando as nações em um só grupo...; então, perderemos a noção de antagonismo pertencente a um grupo estático e veremos que o mundo é capaz de se integrar”. Era uma sonhadora, mas o que percebemos hoje é que as nações estão se unindo em grupos; claro que muito longe do ideal, mas quem sabe Follett tivesse razão e daqui a alguns anos poderemos sonhar com um mundo só, sem diferenças nem fronteiras. Ela não descartou a necessidade da preocupação com a produção, com a eficiência e eficácia das organizações, mas acima de tudo valorizou o ser humano, apregoando que os gestores deveriam se preocupar, não somente com os membros, mas também com o coração das pessoas. 261


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Chamou a atenção para as grandes forças criativas que operam dentro de uma equipe de trabalho, bem quanto ao sentimento de realização encontrado em cada componente quando se sente parte da equipe. As pesquisas práticas posteriores e os modelos de gestão implantados atualmente parece confirmarem sua intuição feminina. Advogou ainda o processo de “integração” como a única aproximação criativa no sistema de debate coletivo, que para ela significava jogar as ideias na discussão para que da mistura de todas elas um novo pensamento pudesse evoluir — parece que, com isso, antecipou o que chamamos hoje de “brainstorming”. Para Follett, relações entre pessoas produzem respostas, não somente entre si, mas também com os arredores e entre as pessoas e o meio ambiente. Em outras palavras, o potencial na experiência cooperativa entre equipes de trabalho será sempre maior que a soma de um e outro — é o que chamamos hoje de sinergia. Desde os tempos de Follett que a maioria das pessoas foram educadas para dominar outras e se desapontam se as decisões do grupo terminam sem a “emoção da conquista”. Essa atitude foi, é e será sempre o maior obstáculo para a criação de equipes vencedoras em qualquer tipo de instituição, e foi também uma constatação da genial Follett. É uma pena que sua modéstia inata tenha evitado que ela se tornasse consciente de que havia trazido luz para a 262


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filosofia de uma administração completamente nova. Percebese que não é de hoje que as mulheres têm sido referência para os homens. Hoje as mulheres são responsáveis por 80% das decisões de compras no mundo. Pois foi uma mulher com intuição aguçada que antecipou o modelo de gestão apregoado nos dias atuais. E há mais de 90 anos.

71 A eterna batalha pelo cliente

Sabemos que o homem é um ser biologicamente único, mas emocionalmente ele é plural. Essa constatação, quando se refere ao consumidor, quer dizer que cada um é único e deve ser tratado como tal — principalmente nos dias de hoje, com o nível de concorrência existente entre os milhares de negócios disponíveis aos consumidores, em que cada empreendedor procura de forma incessante a fórmula que torne seu negócio um sucesso. A busca dessa fórmula é muitas vezes um caminho tortuoso e complicado, com erros, perdas, desencontros e até mesmo falências. Quem já não viu aqueles anúncios em portas de 263


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estabelecimentos, “sob nova direção”. Como se a palavra “nova” fosse aval para garantir postura diferente, quando em resumo está denegrindo a imagem do antigo proprietário. O problema é que, antes de mudar a cara do espaço de um comércio ou anunciar uma nova direção, outras mudanças devem ser feitas no negócio, para que uma reforma no visual ou uma nova direção sejam, de fato, símbolo de retomada do caminho do sucesso. Quem começa a pensar ou a repensar um negócio deve, antes de tudo, avaliar bem o mercado no qual está atuando. Globalização, comportamento, tendências, tecnologia, tudo isso influencia fortemente o dia a dia do comércio, por menos que se admita. Mais importante é avaliar a postura de seu cliente em potencial. Que o consumidor não é o mesmo, todo mundo já sabe. Mas ele é diferente do quê e em quê? Quais as características desse desconhecido “consumidor” que faz a diferença para o seu negócio? Em relação a sua postura como gestor e como empresa, como agir? Não temos a pretensão de sugerir fórmulas, mas vamos fazer algumas sugestões: Primeiro a atitude de agradecer sempre faz enorme diferença, principalmente num mundo de pessoas carentes de carinho e atenção. Não se trata de formalidade ou cerimônia, muito menos excesso de intimidade. Temos que agradecer sempre e sem exceção. Demonstrar afeto ao cliente é uma 264


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forma de agradecimento. A expressão “muito obrigado” é e será sempre um estímulo aos bons costumes. Criar um diferencial é importante. Todo empreendimento de sucesso tem alguma coisa que o distingue dos demais; pode ser o conforto ou a beleza das instalações, o atendimento, alguma facilidade ou serviços oferecidos; enfim, algum aspecto que possa se tornar marcante para quem o frequenta. A necessidade de impressionar o consumidor é um dos maiores desafios para os negócios, visto que pode garantir não só a conquista, mas a fidelidade. Para isso é necessário envolver o cliente. Como? Pelo estabelecimento de vínculos. Como estamos tratando de comportamento do consumidor, vamos nos ater ao comércio. Para estabelecer vínculos, questões como local (ponto comercial), logomarca, disposição de produtos e serviços à venda e outros passam a fazer parte do todo. Nesse momento é necessário fazer algumas escolhas para saber como os vínculos serão estabelecidos, considerando o ambiente e o tipo de negócio e público que se pretende atingir. Um recurso interessante utilizado em ambientes envolventes é ter um aspecto lúdico: criar um ambiente que não se revele por inteiro em um primeiro olhar, mas que seja descoberto aos poucos. Porém, o “descobrir” não pode ser sinônimo de “decifrar”, pois ninguém gosta de se sentir perdido, mas instigado. 265


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Privilegiar o aspecto lúdico em um ambiente pode assumir outras formas, como aprender com os produtos. Se o produto que você vende tem uma história interessante, ela pode ser contada em uma vitrine ou em algum livretobrinde. É um chamariz para muitos negócios e faz sucesso, principalmente, com crianças. O consumidor muitas vezes não quer olhar apenas com os olhos. Experimentar, tocar, mexer, provar, enfim, fazer com que o produto vire objeto de desejo é uma das melhores formas de envolvê-lo. Para isso deve-se criar um espaço aconchegante. Não se trata apenas de “oferecer ou dar um pedacinho”, mas de criar eventos culinários, ter espaço para um desfile de modas, brincar com bolas ou com o game de última geração. Outro recurso bastante explorado é o de criar um ambiente que agregue serviços aos clientes. Um café ou um cantinho com comes e bebes dentro do espaço pode ser uma atração em muitos segmentos. Pode ser também o toque que falta para fazer o diferencial e tornar seu ambiente de negócio um local inesquecível. Sem esquecer que o conforto nunca deve ser perdido de vista. Há que ter um ambiente surpreendente, não apenas inusitado ou exótico, mas criar um espaço que marque o cliente em diversos aspectos, incentivando-o a que retorne sempre. Ao se sentir bem em estar, vivenciar e se envolver, a pessoa pode sentir prazer — e esse é um vínculo indiscutível.

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No atual cenário o cliente é muito poderoso. Seja qual for o negócio em que você esteja inserido, sempre existem outros competidores na mesma área. Qualquer negócio está competindo pelo dinheiro do cliente em potencial, independente do nicho e do tipo de negócio em que você atue. Todos na empresa têm que estar preparados, mudar posturas e se adaptarem a essa nova realidade. O novo ambiente onde se trava uma batalha permanente pela atenção do cliente.

72 Desvendando a Produtividade

Muitos falam, mas poucos conhecem o verdadeiro sentido da produtividade. Muitos são os livros, os artigos, enfoques, conceitos que surgem com o objetivo de dar vida nova aos indivíduos, às empresas e nações. Alguns dizem que a chave para o sucesso de uma organização está na busca da excelência, outros aconselham a, pura e simplesmente, imitar a arte japonesa de administrar 267


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ou a buscar inspirações nos guerreiros antigos como o general chinês Sung-Tzu (A Arte da Guerra), no samurai Miyamoto Musachi (Um livro de cinco anéis) ou no general prussiano Karl von Clausewitz (On War). Há, ainda, quem sugira soluções instantâneas às dificuldades atuais. São tantas as sugestões que não sabemos em quem acreditar. No entanto, por mais divergentes que sejam as abordagens propostas, todas têm um ponto em comum: as organizações de hoje precisam ser mais bem administradas e o seu valor adicionado melhor distribuído, para que todos, empregados, empresas e países, sobrevivam e tenham sucesso num ambiente competitivo, selvagem e globalizado, onde as regras do jogo não são muito claras. Para os gestores atuais, o que motiva a compartilhar a experiência adquirida na introdução de mudanças de atitudes das pessoas é a crença de que somos responsáveis diretos pelo crescimento e melhoria da sociedade de que fazemos parte como cidadãos e como agentes de mudança em todas as suas dimensões, com a consciência de que o crescimento e a melhoria começam com a melhor distribuição, independente do setor, do valor adicionado, fruto da melhoria na produtividade. Definir o que vem a ser produtividade talvez não seja o mais importante, até porque ela passou a ser definida de várias maneiras ao longo da história. Foi mencionada pela primeira vez em um artigo científico assinado por François Quesnay, em 1766, uma década antes do início da Revolução Industrial.

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Dez anos mais tarde, Adam Smith, o pai da economia moderna, admitiu a existência de um tipo de trabalho que produz valor, que deveria ser chamado de trabalho produtivo. Mais de 100 anos depois, Willian Jevons, em 1878, esboçou a primeira definição de produtividade, embora de forma inconsciente, ao afirmar que: “o grande objetivo do trabalho deve ser tornar o trabalho o mais produtivo possível, isto é, conseguir a maior quantidade de riqueza que pudermos com uma razoável quantidade de trabalho”. Em 1883, Littre definiu produtividade como sendo a “faculdade de produzir” ou “desejo de produzir”. Vamos analisar outros pontos sobre o tema. O Japão é para todos nós o maior exemplo de sucesso e de melhoria de qualidade e produtividade. Portanto, vamos dar um passeio por essa história fascinante e, ao mesmo tempo, intrigante, de competência, poder de realização e sucesso. Durante longos anos o Japão se enclausurou, fechando suas portas para o mundo. Foi a chamada Era Tokugawa, que cobriu o período de 1603 a 1868, época em que surgiram os grandes valores da sociedade japonesa. Em 1853, os americanos invadiram a baía de Uraga e forçaram o Japão a abrir o seu comércio com outras nações. Foi o estopim para um longo período de turbulência, culminando com uma guerra civil e conflitos com outros povos. A turbulência só terminou com a Revolução Meiji, restaurando o império, unificando o país e inaugurando o seu processo de

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modernização. Os sistemas feudalistas e dos samurais foram extintos, preservando-se os valores da sociedade. A filosofia instituída no Japão foi: “espírito japonês, tecnologia ocidental”. A revolução industrial japonesa durou cerca de 40 anos, tratando da defesa da nação contra o avanço dos colonizadores europeus. A indústria bélica teve um papel fundamental no processo de modernização, com amplos subsídios do governo favorecendo a formação dos chamados Zaibatsu, inspiração para Willian Ouchi intitular seu livro Teoria Z: “z” de zaibatsu, método em que as principais empresas eram organizadas em pequenos grupos. Cada grupo tinha de 20 a 30 grandes empresas, aglomeradas em torno de um banco poderoso. As empresas representavam cada um dos setores industriais estratégicos da economia, como navegação, siderurgia, seguros, comércio etc. Em torno de cada uma dessas corporações existia uma série de empresas satélites, encarregadas de submontagens ou serviços vendidos exclusivamente a um único cliente maior. É importante observar que as empresas satélites não eram consideradas membros do grupo, razão pela qual não desfrutavam de proteção financeira ou outros tipos de apoio oferecido às grandes empresas. O modelo constituía-se em monopólio bilateral: as empresas satélites tinham somente um cliente e as 270


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corporações somente um fornecedor para cada insumo. O contexto enfatizava a importância da preservação de valores como confiança, sensibilidade e sutileza, entre outros, de tal forma que o desenvolvimento industrial era o aspecto visível dos valores que permaneceram. Outro aspecto importante a ser ressaltado é que, apesar da figura formal do Imperador, com a Revolução Meiji ascenderam ao poder os ex-samurais. À falta de uma atividade militar, tornaram-se burocratas, acumulando alguma experiência administrativa, ao mesmo tempo em que levavam consigo os valores distintivos de sua classe: “compromisso com a educação, responsabilidade social, autorrespeito e devoção à tarefa a cumprir”. Perante seus vizinhos, o Japão adotou uma atitude imperialista predatória, a partir das vitórias nas guerras contra a China e Rússia, no início do século XX. Tal postura culminou na sua adesão ao Eixo na 2ª Guerra Mundial, culminando com a destruição do país. Ainda assim, os valores culturais seculares sobreviveram permeando o funcionamento da sociedade. Após a 2ª Guerra o povo japonês estava decidido a fechar as feridas e buscar a prosperidade do país. Com isso, uma nova visão de poder se instalou: não mais a expansão através do poderio militar, mas pelo poder econômico. Para a empreitada, contou com investimentos e a política intervencionista norte-americana.

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Apesar dos rigores da intervenção, particularmente nos aspectos econômicos, o Japão acabou se beneficiando da Guerra Fria entre os Estados Unidos e a União Soviética. Para manter um aliado no Oriente, os americanos afrouxaram algumas exigências, permitindo a ascensão dos keiretsu, trustes industriais japoneses, com patrocínio do Miti — Ministry of International Trade and Industry. A grande diferença é que nos moldes vigentes nos Estados Unidos as empresas deveriam se desenvolver por si mesmas, enquanto no Japão as indústrias estavam apoiadas no poder político, compromissado com a prosperidade da nação, tratando de protegê-la e fortalecê-la, a ponto de, mais tarde, superar a própria indústria americana. Em 1960, o governo japonês traçou um plano de longo prazo e estratégias para dobrar o PIB em 10 anos. Desencadeou-se, assim, um período de alto crescimento do país, tornando-o uma das nações mais avançadas do mundo. A consolidação do crescimento ressaltou o que se considera os três pilares da recuperação do país em pouco mais de duas décadas: um partido político forte consolidado no poder, paz trabalhista e unificação do povo. Outros fatores contribuíram para formar o amplo quadro de referência da sociedade japonesa: o compromisso do governo com a educação, além da valorização cultural da instrução; alta taxa de poupança interna; ampla utilização dos serviços de consultoria para o desenvolvimento empresarial; 272


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compra de tecnologia; manutenção da essência de valores culturais seculares, apesar do processo de ocidentalização do estilo de vida ocorrido a partir do início da restauração. Nesse contexto é que se desenvolveu a administração japonesa, transformando o país numa máquina econômica ambiciosa, cujos métodos tornaram-se alvo da comunidade empresarial, que buscou compreendê-la para adaptá-los e alcançar melhores condições na competição global. Na Era Meiji pela primeira vez uma palavra correspondente a “produtividade” foi usada, embora seu significado não correspondesse ao conceito atual, pois derivava da palavra “productiviness”, a significar algo como “capacidade de produção”. Durante a 2ª Guerra Mundial a palavra “produtividade” passou a ser usada comumente, porém, no sentindo de “eficiência de investimento”, conforme atestam periódicos econômicos e de negócios da época. Vimos que o desenvolvimento econômico de uma empresa e mesmo de um país estão diretamente relacionados ao crescimento da produtividade e à melhor distribuição dos ganhos gerados pelo aumento da produtividade, denominado Valor Adicionado. Sabemos que a premissa é relativamente nova. Tratase de uma questão que surgiu, coincidentemente, no mesmo período da Revolução Industrial, quando muito se falou em produtividade, mas o conceito ainda não estava claro e 273


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foi somente no início do século XX que o termo adquiriu o significado preciso e que prevalece até hoje. A partir da primeira metade do século XX, quando a febre da produção em massa já começava a mostrar sinais de cansaço, os problemas de capacidade e sistema de produção vieram à tona, a partir de obras de economistas como Marx, Schumpeter, Keynes e outros. O conceito de produtividade galgou uma posição de destaque, transformando-se em importante catalisador tanto no gerenciamento empresarial como na economia. Basicamente, o conceito tradicional de produtividade que tem prevalecido pode ser expresso pela equação: “Output” dividido por “Inputs”, onde input corresponde aos recursos empregados no processo de transformação, tais como matéria-prima, equipamentos, trabalho e outros fatores de produção, enquanto o output corresponde aos resultados obtidos na utilização desses recursos. Podemos afirmar então que: “produtividade nada mais é do que uma medida para se verificar quão bem são empregados os recursos utilizados para se criar o resultado desejado” Ao analisar esta equação podemos até aceitar que o output, ou resultado obtido, seja produtividade, mas se nos ativermos ao input ou recursos empregados, a recíproca não é necessariamente verdadeira. Estamos diante de um problema, pois como inputs 274


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consideramos itens como mão de obra, matéria-prima, capital etc. Agora: como justificar a um trabalhador que ele não passa de um recurso empregado dentro do processo produtivo? Como esse trabalhador se sentiria? Qual seria a sua motivação para procurar fazer o melhor? Questões como essas nos fazem repensar a produtividade. É bom esclarecer que produtividade não é eficiência, apesar de nela existir um componente de eficiência. Não é um conceito limitado e estritamente técnico, trata-se de um conceito muito mais amplo e que deve ser elevado ao ponto de vista social. Sob esse aspecto, podemos afirmar que, em primeiro lugar, produtividade é uma atitude mental. Significa melhorar de forma contínua o que existe; acreditar que o ser humano poderá fazer hoje coisas melhores do que ontem, e amanhã melhor do que hoje — e este sentimento de fazer o dia de amanhã melhor que hoje é comum a todo ser humano. É o conceito kaisen, verdadeira filosofia empresarial japonesa. São razões que justificam o conceito de produtividade não ficar limitado ao aspecto tecnológico, pois possui um caráter muito mais amplo do ponto de vista social: tornar a humanidade mais feliz, por meio do constante progresso. Logo, temos três conceitos fundamentais que são: humanidade, felicidade e progresso.

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73 Produtividade dando sentido à vida

O verdadeiro sentido da vida e a razão de ser das organizações, do trabalho e do progresso é tornar a humanidade mais feliz. Se o progresso tornar a humanidade infeliz, significa que, na prática, a produtividade não existiu. Por incrível que pareça, produtividade e confiança andam de mãos dadas, com o que a união de trabalhadores, empresas e instituições governamentais é fundamental. A produtividade tornou-se uma atitude, evoluiu para convicção, compromisso e, finalmente, uma filosofia, partindo de um mero cálculo usado para estimar e comparar o desenvolvimento econômico. Por isso o movimento pela produtividade é essencial para o desenvolvimento de um país. Seu propósito é, em primeiro lugar, maximizar cientificamente o uso de recursos materiais, mão de obra, equipamentos etc., com o objetivo de reduzir custos de produção, expandir mercados, aumentar o número de empregados, lutar por aumentos reais de salários e pela melhoria do padrão de vida no interesse comum do capital, do trabalho e do consumidor. É salutar lembrar que o propósito das atividades econômicas é a alocação de recursos limitados não só de 276


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maneira justa, mas apropriada, visando à melhoria do bemestar social. É um paradigma que deve ser valorizado, já que muitos empresários ainda possuem uma visão puramente capitalista, com interesse apenas no lucro e na sobrevivência sua e da empresa. É um tipo de atitude que faz dos trabalhadores apenas operários, sem motivo algum para trabalhar a não ser a necessidade de ganhar dinheiro para atender as necessidades essenciais. Essencial é implantar uma nova mentalidade, em que empresários e trabalhadores pensem juntos na felicidade de todos, tendo a consciência de que para tornar o amanhã melhor que o hoje a cooperação é necessária. Os trabalhadores têm que se conscientizar de que, para tornar o amanhã melhor para si e para os seus, são necessários o sucesso e o progresso da empresa. É a única maneira de promover uma aproximação entre a gerência administrativa e o empregado — e, por consequência, o aumento da área de interesse comum desses dois segmentos com a geração conjunta do Valor Adicionado e sua distribuição em nome da prosperidade mútua. É responsabilidade do empresário dirigir a empresa rumo ao sucesso, treinar pessoas e fazer investimentos. Cada empregado tem sua família para defender e sua vida privada a ser respeitada. A união entre empregador e empregados terá como consequência a melhoria da qualidade. Quanto maior for a interação maior será a produtividade. 277


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Talvez seja utópico acreditar na completa interação entre empregado e empregador, o que significaria a completa eliminação dos conflitos entre ambos; trata-se de um desafio que deve ser buscado constantemente. No Congresso Industrial nos Estados Unidos, realizado no fim da década de 1930, o empresário americano Clarence Francis nos ofereceu uma boa pista sobre a união empresário-empregado ao afirmar: “Pode-se comprar o tempo de um homem. Também pode-se comprar a presença física de um homem num local pré-determinado. Pode-se até comprar um número mensurado de movimentos musculares, bem treinados, por hora ou por dia. Mas não se pode comprar o entusiasmo, a iniciativa, a lealdade, a devoção do sentimento e da alma. Estas coisas devem ser conquistadas.” Vê-se que já naquela época existiam pessoas conscientes desses fatos e enfatizavam sua importância. A transformação da sociedade a partir da Revolução Industrial do século XVIII tem sido extraordinária. Passamos de uma sociedade agrária para uma sociedade dinâmica e industrial, em que educação, conhecimento, informação e tecnologia passaram a ser prioridade número um. Neste terceiro milênio, falar em mudanças já se tornou repetitivo, pois elas passaram a conviver com o nosso cotidiano. As empresas hoje têm poucos problemas técnicos que não possam resolver; contam com engenheiros e técnicos treinados; podem solucionar questões de qualidade, finanças e marketing, porque possuem pessoas capacitadas para tanto. 278


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Em tudo isso, o grande diferencial de qualquer mudança é o ser humano — somente com a sua intensa participação será possível atingir os desafios de proporcionar uma melhor qualidade de vida a todos, em que a produtividade e a justa divisão do Valor Adicionado são ferramentas essenciais para o sucesso. Temos que atuar sobre aquilo que influencia a economia. Há três áreas a ser trabalhadas todo o tempo, fatores permanentes e não apenas modismo: a qualidade, a relação entre as pessoas e a produtividade. Muitos gurus da administração acabarão criando modismos, o must da década. Nos anos 1950 foi a administração por objetivos. Nos anos 1970, o desenvolvimento pessoal. Na década de 1980, a tecnologia de computação; nos anos 1990, a qualidade. Parece-nos que o mais importante, neste momento, é a produtividade, pois só ela nos dará condições de melhorar o desequilíbrio social. Acontece que as mudanças não podem ser executadas apenas por habilidades técnicas e científicas. Exigem também habilidades sociais, porque a maioria de nossos problemas decisivos não está no mundo das coisas, mas nas pessoas. O grande fracasso do homem tem sido a incapacidade para conseguir cooperação e compreensão dos outros. É o desafio a ser vencido quando falamos em produtividade. A criatividade será uma questão central da estratégia 279


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de negócios e para o aumento da produtividade das empresas do século XXI. Compete aos líderes criar um clima de inovação, de senso de produtividade. Essa nova mentalidade traduz o reconhecimento de que a criatividade e a inovação aliada à produtividade devem tornar-se parte integrante do pensamento e da vida profissional de todos. A prosperidade e a sobrevivência das pessoas, das empresas e da nação dependem dessas premissas. A questão é que, se os empregados, as empresas e as instituições governamentais não forem criativas na inovação de seus produtos e serviços, em suas estruturas gerenciais e de produção e, principalmente, na busca da produtividade, fazendo apenas o trabalho rotineiro de hoje, amanhã estarão falidas, considerando a velocidade de transformação das dinâmicas da concorrência. No significado dos conceitos econômicos e sociais, a produtividade deve representar o “grau de consecução” de alvos primários a serem atingidos através de atividades econômicas — felicidade física e mental, bem como qualidade de vida e trabalho. É por esse motivo que sempre que analisarmos a produtividade, o bem-estar humano deve ser examinado. Apesar de alguns questionamentos, salientamos que a produtividade como conceito econômico e social não se opõe à produtividade como conceito técnico. Isso não exclui a medida da eficiência, mas, ao 280


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contrário, deve combinar o conceito restrito da mera eficiência técnica com os métodos ou referências para atingir padrões humanos mais elevados. O conceito de produtividade não deve ser restrito, exigindo uma análise estrutural. Seu significado contemporâneo deve ser considerado de maneira ampla. A melhoria da produtividade está intimamente ligada à melhoria nas relações de trabalho. Para melhor constatar essa afirmação vamos embarcar novamente na máquina do tempo e fazer e retornar ao Japão de 1946, logo após a Segunda Guerra Mundial. Lá encontraremos, mais do que um país devastado pela guerra, um país em que os cidadãos conviviam com a miséria. O salário mensal de um funcionário público japonês estava restrito ao valor equivalente a um dólar e 40 cents. Essa constatação levou os Estados Unidos a promover o “Movimento de Produtividade no Japão” no início da década de 1950 com o objetivo e o desejo de que os japoneses pobres pudessem se tornar autossustentáveis. Assim, em 1955 foi fundado o Japan Productivity Center — JPC. Aquele ano foi decisivo para a economia japonesa. Para esclarecer melhor o que aconteceu, é preciso resgatar os acontecimentos históricos daquele período. Sob os benefícios do Plano Marshall, as economias do oeste europeu estavam ressurgindo, fazendo crescer sua produtividade. Alguns dos esclarecidos líderes japoneses 281


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observavam cuidadosamente a situação europeia e se convenceram da necessidade de desenvolver atividades similares no Japão, uma vez que para um pequeno país-ilha, dotado com escassos recursos naturais, seria o único modo possível de atender à aspiração nacional de reconstrução do país, compartilhada pelo governo, indústria e sociedade, tendo como objetivo a criação de uma economia autossustentável. Depois da guerra da Coréia, no início dos anos 1950, a política americana em relação ao Japão passou de punição para o de auxílio ao desenvolvimento, considerando-o como membro dos aliados ocidentais. Em 1953, o governo americano sinalizou a disposição de estender programas de ajuda técnica ao Japão de maneira similar ao Plano Marshall. No ano seguinte, o governo japonês, mais especificamente o Miti — Ministério do Comércio Exterior e Indústria, estudou minuciosamente a questão, a fim de identificar a forma mais efetiva de aproveitar a ajuda americana. A conclusão foi estabelecer um órgão de produtividade similar ao Conselho de Produtividade Britânico, uma organização não governamental sem fins lucrativos e tripartidária, com um corpo de direção compreendendo representantes dos grupos de gestão, trabalho e acadêmico. No início de 1955 os governos do Japão e dos Estados Unidos trocaram notas oficiais sobre os programas de cooperação técnica e o JPC foi formalmente inaugurado em março daquele ano. A ajuda americana se estendeu por 282


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sete anos, até 1961. Durante esse período, o número de missões de produtividade enviadas pelo JPC aos Estados Unidos somou 395 grupos, envolvendo 4.011 pessoas, incluindo executivos, líderes sindicais, acadêmicos e profissionais. Em consequência desse investimento técnico e financeiro, o conceito de produtos “made in Japan” passou a mudar. O modelo administrativo foi melhorado por meio de esforços intensivos nos campos de treinamento e desenvolvimento de gestão, com técnicas desenvolvidas por Willian Edwards Deming, Joseph M. Juran e outros. O JPC tornou-se o mais bem-sucedido centro de produtividade nacional na Ásia e dos mais ativos no mundo. Uma questão fundamental vista pelo JPC como assunto de ordem nacional é a escolha que uma nação deve fazer entre ter um alto padrão de vida, pelo aumento de produtividade, ou conformar-se a uma baixa produtividade e, em consequência, um padrão de vida relativamente baixo. No caso japonês, desde seu início o JPC enfatizou o desenvolvimento de recursos humanos. Significava foco na produtividade, aspecto fundamental de todos os programas dos centros de produtividade nacional na Europa — o que havia impressionado Kohei Goshi, fundador do JPC, quando realizou visita às organizações voltadas ao tema na Europa Ocidental. 283


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A conclusão foi de que o desenvolvimento da produtividade dependia mais do fator humano do que do estado de produção ou da tecnologia industrial. Assim, a atenção foi voltada para as relações de capital-trabalho construtivas e gestões de produção modernas. O diferencial do JPC foi considerar que produtividade não era meramente a razão entre intput e output, mas tinha o elemento humano como fator substancial. Nem tudo foram flores. O movimento deparouse com inúmeros obstáculos, principalmente a resistência dos trabalhadores, que entendiam erroneamente que maior produtividade significava maior desemprego. Três princípios de orientação para a produtividade foram então proclamados: Princípio do Aumento de Emprego — o aumento da produtividade deve corresponder ao aumento de empregos; Princípio da Cooperação entre Gestão Empresarial e Trabalho — para a melhoria da produtividade deveria existir cooperação total e discussão das ações entre os níveis da gestão empresarial e do trabalho; e Princípio da Justa Distribuição dos Resultados — os resultados da melhoria da Produtividade deveriam ser distribuídos de forma justa entre os níveis do trabalho, gestão empresarial e consumo. A visão de que o aumento da produtividade leva ao desemprego continua a estar equivocada, ferindo diretamente o primeiro princípio. Ao contrário, o aumento da produtividade significa menor risco de falência, fazendo crescer a possibilidade 284


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de um empreendimento ser bem sucedido, com possibilidade de ampliação, com o que cresce também a oportunidade de oferecer mais empregos. Talvez o maior exemplo seja a história da Ford. Henry Ford e sua equipe de engenheiros de produção, notadamente Charles Sorensen, introduziram o princípio de fluxo, utilizando-o na linha de montagem do “Modelo T”, por meio da reorganização funcional de sua fábrica, adotando uma linha de movimento, na qual cada trabalhador montava apenas uma peça do carro, que se movia para o próximo trabalhador no passo seguinte da montagem e assim sucessivamente. O historiador de negócios David Housnshell descreveu desta maneira o sistema Ford: “...ao mover o trabalho para os homens, dogma fundamental da linha de montagem, os engenheiros da Ford descobriram um método para acelerar os trabalhadores lentos e desacelerar os trabalhadores rápidos. A linha de montagem traria a regularidade (ritmo) à fábrica da Ford, uma regularidade quase confiável quanto o nascer do sol, com a instalação da linha de montagem e a execução de seu dinamismo para todas as fases das operações da fábrica”. Em outubro de 1913, o tempo gasto na fabricação de um carro caiu de 12h8, para 2h25. Seis meses mais tarde, o “Modelo T” saía das linhas de montagem numa taxa de mil unidades por dia, com média do tempo de trabalho caindo para pouco mais de 1h30m. Esse sistema é encontrado hoje nos mais diferentes

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ramos de atividades do setor, de um Volkswagem fabricado em São Bernardo do Campo a um Renault fabricado nas proximidades de Curitiba. Importante notar que o sucesso do empreendimento Ford trouxe consequências positivas para o trabalhador e para a sociedade. Em 1914 cada trabalhador da Ford recebia um salário diário de cinco dólares, mais do dobro do salário de um operário da época. Ford não fez isso por generosidade ou compaixão; não era com o padrão de vida dos operários que se preocupava, pois sabia que se os operários ganhassem mais poderiam comprar seus próprios automóveis — com certeza um Ford. Esse é um exemplo histórico de que uma melhor distribuição do Valor Adicionado gera riqueza para o país, melhora a qualidade de vida da sociedade com geração de novos empregos. Voltemos às empresas bem-sucedidas do Japão. A Matsuchita, conhecida no mundo todo pela marca Panasonic, iniciou suas atividades com apenas três pessoas: o próprio Matsuchita, a esposa e o cunhado. A Honda, que começou como uma oficina mecânica para conserto de automóveis em um bairro de Tóquio, tornou-se uma das empresas mais conceituadas do planeta. Elas e tantas outras bem-sucedidas empresas japonesas oferecem oportunidades de emprego para milhões de pessoas em todo o mundo. Como vimos, o objetivo do aumento da produtividade 286


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é tornar melhor o amanhã de todos, empreitada que não é possível realizar apenas com a Gestão Empresarial, por melhor que seja, ou apenas pelo trabalhador — só poderá ser concretizada se atender ao segundo princípio mencionado: a cooperação entre a gestão empresarial e o trabalhador. Quando os japoneses pregavam que o resultado do aumento da produtividade é proporcionar maior valor adicionado, entendiam que não era justo que ele fosse parar inteiramente no bolso de uma só pessoa ou empresa. Para que todos sejam felizes é condition sine qua non que o fruto do aumento da produtividade seja justamente distribuído entre todos os que contribuíram para o aumento. É o terceiro princípio. Em síntese, podemos dizer que produtividade significa atingir três metas básicas. Em primeiro lugar, sob o ponto de vista social, é tornar o amanhã de todos melhor que hoje. Em segundo lugar, para que se possa tornar o amanhã de todos melhor do que hoje, é necessário que, mesmo que um prato de comida não signifique tudo, seja possível o fornecimento de um prato de comida de qualidade melhor e em quantidade maior, pois é difícil encontrar alguém feliz com o estômago vazio. Para que possamos construir um amanhã melhor é imprescindível gerar maior valor adicionado e distribuí-lo de forma justa.

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74 Síndrome do super-herói vitimado

A luta pela sobrevivência está brutalizando o ser humano: as pessoas vivem pressionadas e a palavra cooperação foi substituída por competição, o que muitas vezes significa disputa de poder. A palavrinha é tão poderosa que leva as pessoas a destruírem a si mesmas e aos outros para atingir o que para elas significa sucesso. A maneira com que “constroem” seu sucesso é agressiva; cada vitória é saboreada a sós em razão do medo que se tem do adversário. Marcelo Aguilar chama isso de “síndrome do superherói vitimado”. Síndrome é uma palavra forte, mas ajuda a definir essa doença. Trata-se de um mal terrível que acomete muitos profissionais. Tão terrível que chega a destruir uma carreira promissora. Infelizmente, sobre a doença ainda não existe estudo científico; no fundo, ela é fruto da imaginação. A verdade é que pessoas acometidas desse mal se deslumbram com as “oportunidades”, primeiro sintoma marcante para o diagnóstico, uma vez que a principal tendência de comportamento nesse estágio da doença é tomar para si 288


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responsabilidades que são de outras pessoas; a busca por acumular funções diversas permite que o profissional alardeie sua competência, tentando demonstrar a incompetência de outros, dentro de sua visão egoísta. Com um detalhe crucial: tudo sem planejar como fará para cumprir todas as atividades a que se propõe dentro das horas do expediente. Após a excitação inicial provocada pela sedução da oportunidade, inicia-se um novo estágio da doença, que pode ser denominado de verborrágico, cuja evidência marcante é a difamação aberta de seus predecessores. Agora, já investido na condição de vítima, passa a trazer fatos pontuais, na maioria das vezes fora do contexto, de acontecimentos que provariam a incompetência dos que o antecederam. Trata-se de um massacre com o intuito de provar de vez a incompetência de todos os que o antecederam, em prol de sua pseudocompetência. Podemos chamar essa fase de Pandora. Muitos devem se lembrar do mito grego. Desde que Zeus (Júpiter) e seus irmãos, da geração dos deuses olímpicos, começaram a disputar o poder com a geração dos Titãs, Prometeu era visto como inimigo e seus amigos mortais eram ameaças. Para castigar os mortais, Zeus privou o homem do fogo, simbolicamente, da luz na alma, da inteligência etc. Prometeu, “amigo dos homens”, roubou uma centelha do fogo celeste e a trouxe à terra, reanimando os homens. Ao descobrir o roubo, Zeus ordenou punição tanto ao ladrão quanto aos

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beneficiados. Prometeu foi acorrentado a uma coluna e uma águia devorava seu fígado durante o dia, o qual voltava a crescer à noite. Para castigar o homem, Zeus ordenou a Hefesto (Vulcano) que modelasse uma mulher semelhante às deusas imortais e que tivesse vários dons. Atená (Minerva) ensinoulhe a arte da tecelagem, Afrodite (Vênus) deu-lhe a beleza e o desejo indomável, Hermes (Mercúrio) encheu-lhe o coração de artimanhas, imprudência, ardis, fingimento e cinismo, as Graças embelezaram-na com lindíssimos colares de ouro. Zeus enviou Pandora como presente a Epimeteu, o qual, esquecendo-se da recomendação de Prometeu, seu irmão, de que nunca recebesse um presente de Zeus, o aceitou. Quando Pandora, por curiosidade, abriu uma caixa que trouxera do Olimpo como presente de casamento ao marido, dela fugiram todas as calamidades e desgraças que até hoje atormentam os homens. Pandora ainda tentou fechar a caixa, mas era tarde demais. Infelizmente para nós pobres mortais, a única coisa que não é libertada é a esperança que permaneceu presa à borda da caixa. Nessa analogia, podemos dizer que o doente, no estágio Pandora, liberta as desgraças e busca passar a noção de que somente ele detém a solução. Caso as coisas aconteçam como ele espera, não perde a oportunidade de estufar o peito e alardear, repetidamente, sua grande competência. 290


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Se o que acontece não é o que ele imagina, dá-se início ao próximo estado da doença, a mania de perseguição. Seu arsenal de palavras volta-se, além de seus predecessores, para colaboradores diretos e parceiros que se tornam, em sua cabeça, articuladores do mal que tem como único objetivo o desejo de derrubá-lo. Nesse momento, ele passa a se fazer de vítima, buscando “razões ocultas” que justifiquem seu insucesso, para não dizer incompetência, buscando achar um culpado. Nesse estágio, a sudorese aumenta, começam a aparecer insônia e palpitações e justificativas do tipo “ninguém me deixa fazer o que é preciso”. É um momento de verdadeiro sofrimento, embora a vítima não consiga enxergar e muito menos entender as verdadeiras razões de sua dor. E você deve estar se perguntando: existe algum remédio para esse mal tão terrível? Bem, o único remédio, indicado para atuar em qualquer fase, é uma boa dose de humildade. Infelizmente os orgulhosos preferem não tomar; afinal, humildade é um remédio amargo, de gosto horrível. O pior é que a “síndrome do super-herói vitimado” embaralha orgulho com autoestima e o doente sofre ainda mais. Como sabemos, a maneira como vemos as coisas determina nossas atitudes e comportamento. A cada momento estamos construindo nosso próprio futuro, reorganizando nossa maneira de ver e colocando o que vemos no contexto das interligações mais amplas; significa que precisamos elevar nossa visão a uma visão mais abrangente, a atitudes mais 291


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sensatas que nos ajudem a construir um futuro melhor para nós mesmos. Devemos reagir a esse tipo de disputa de poder ou de doença de acordo com os valores morais, construídos e sustentados no seio familiar e no convívio social. Quem constrói nossos valores somos nós mesmos, nos atos cotidianos, ao refletir sobre suas consequências na nossa vida e na vida dos outros. Nossa compaixão e consciência ensinam sobre a verdadeira fonte do poder. O gestor não é gestor sozinho, deve ser capaz de reunir pessoas com valores próximos aos seus, que compartilhem ideias e ideais comuns. Sabem se policiar e serem policiados, para não se deixarem corromper pelo poder. Caso você conheça alguma pessoa que esteja sofrendo da terrível síndrome de busca pelo poder, procure ajudá-la na reflexão de que ela não é um super-herói capaz de controlar o tempo, as pessoas e as coisas. Procure persuadi-la de que é vítima de sua falta de análise prévia. Ajude-a entender que a pílula da humildade não acabará com sua autoestima nem lhe fará menor que os outros e que, portanto, deve tomá-la, em benefício próprio e dos que o rodeiam. Ah, sim! Não se esqueça de verificar qual é o gosto da pílula da humildade para você.

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75 Líderes são mais eficazes que chefes

Não é difícil descobrir que líderes são mais eficazes que chefes. Talvez a frase soe um tanto estranho, mas basta comparar duas empresas. Uma, em que o gestor faz questão de ser chefe; outra, onde ele se coloca apenas como líder. Quem tem maior produtividade, maior rentabilidade, melhor qualidade, dinamismo, clima satisfatório, motivação? Sem sombra de dúvidas a segunda. Por quê? Simples. Os líderes são mais eficazes e mais eficientes que os chefes. Os atributos do líder são inúmeros: conciliador, parceiro, orientador, otimista, corajoso, equilibrado, comunicativo, participativo, formador. E os atributos do chefe? Ele tem apenas um: mandar. Seu lema preferido é o velho “manda quem pode, obedece quem tem juízo”. Algumas pessoas se dizem líderes, mas mantêm postura de chefes, administram por decreto. Numa empresa onde prevalece o modelo de chefia, o chefe existe para controlar e para ter certeza de que embaixo foi feito; assim, podemos afirmar que chefes existem para serem obedecidos 293


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e líderes para serem respeitados. São inúmeras as comparações que podemos fazer do chefe em relação ao líder. Enquanto, o chefe busca o controle, o líder facilita a mudança; o chefe olha para o dia a dia, o líder amplia o futuro. Enquanto o chefe administra para manter o sistema, o líder, em um processo participativo com seus comandados, cria o sistema. Muitas vezes percebemos que o chefe é uma cópia de seus superiores, enquanto o líder é original. Normalmente os chefes estão preocupados com estrutura, organograma, normas, regras e procedimentos: nesse sentido, quase sempre buscam e precisam de controle, enquanto o líder focaliza e valoriza as pessoas, inspirando confiança e facilitando a mudança. O líder está mais preocupado com os resultados e o alcance dos objetivos traçados pela organização; seu foco está voltado para a missão da empresa. As perguntas mais comuns para o chefe são “como” e “quando”, o líder quase sempre pergunta “por quê?” Os chefes em geral são inseguros, aceitam com facilidade o “status quo” colocando-se como verdadeiros sacerdotes pregando uma palavra que não é sua. O líder, ao contrário, desafia o “status quo” e mantém uma postura não de sacerdote, mas de profeta. O chefe está mais preocupado com as atividades braçais de seus comandados, enquanto o líder procura ensinar a seus colaboradores a manter uma atitude 294


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reflexiva e visionária para que possam ser empreendedores de seu próprio negócio. Os chefes procuram fazer de sua gestão uma gestão eficiente, ou seja, procuram fazer bem as tarefas; já o líder vai além, agrega eficácia. Os chefes veem as pessoas como objetos, mão de obra, meios para os fins. Interessam-se somente pelo que as pessoas podem fazer. Os líderes não, eles veem as pessoas como prioridade, conhecem todos e os chamam pelo nome, buscando o crescimento de cada um. Se fizéssemos uma analogia do chefe e do líder com os personagens bíblicos Caim e Abel, poderíamos dizer que o chefe representa Caim, um homem que age por conta própria, mas que faz parecer que é um homem da organização. Adora a subserviência e busca o prestígio pela realização das tarefas. Já Abel é sim um homem da organização, pensa em equipe, pensa no todo e nos objetivos do grupo, respeita seus colaboradores e aprecia a realização das tarefas não as tendo como fim, mas como processo necessário para se conquistar um resultado ou atingir um objetivo. Enquanto Caim está pensando em termos de problemas que afetam e ameaçam seu emprego, preocupado em ganhar créditos, status e aumento de salário e na busca incessante da lealdade de seus subordinados, Abel está pensando em problemas que afetam a organização e o grupo; sua lealdade é para com os colegas de trabalho e não com normas e procedimentos.

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Diferentemente de Caim, Abel se utiliza da linguagem para comunicar suas ideias, para persuadir, convencer, expressar fatos, invocar aspirações maiores, palavras que têm significado, sinceridade; principalmente, palavras que são ferramentas para construir. Já Caim é aquele que se utiliza da linguagem de forma egoísta, para chegar aonde quer, para manipular, bajular, fantasiar. É o tal que lida com emoções menores, lida com as paixões, capaz de espalhar boatos — que nunca são de ordem positiva; utiliza-se de palavras que refletem o conveniente para suas intenções pessoais, palavras que são armas para ganhar. O chefe se mostra permissivo, negligente com os valores morais e humanos. Por não conseguir conquistar a verdadeira autoridade, impõe o autoritarismo com base no medo e na ameaça. Para ser líder não é preciso estar no topo da pirâmide; muitas vezes o líder não está lá; quando está abaixo, seu segredo é liderar seus superiores, convencendo-os e persuadindo-os com projetos, ações e posturas que possam servir à totalidade da organização.

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76 Equipe! Não Euquipe ou Nosquipe

Os animais da floresta haviam sido convocados para fazerem juntos uma represa. Essa foi feita, mas os dias se passaram e ela não aguentou a forca das águas, arrebentou e destruiu a moradia de vários animais. Esses, então, começaram a brigar entre si para saber quem seria o responsável por aquele desastre e a discussão ficou cada vez pior. Para resolver o problema, um deles deu a ideia de perguntar para a coruja, que residia na árvore mais antiga dentre todas daquele país, visto ser considerada por todos o mais sábio dos animais. Ela contou a seguinte história para acabar com a discussão: “Um elefante e uma formiguinha estavam tentando atravessar uma ponte de madeira e cordas, mas o elefante estava com muito medo por ser pesado; então a formiga disse para ele que atravessaria e o esperaria do outro lado da ponte. Foi o que ela fez, e para encorajar o elefante ela ficava gritando para que seu amigo conseguisse. Cada passo que o elefante dava quebrava as madeiras da ponte; quando ele chegou do outro lado, a ponte ficou completamente destruída. 297


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A formiguinha, olhando para ela, disse para o elefante: ‘Meu Deus! Você viu o que nós fizemos com a ponte?’”. Com isso, a coruja fez com que os animais entendessem que ninguém em especial era culpado pela destruição da represa, que todos juntos faziam parte daquele acontecimento, assim a discussão acabou e eles, juntos, iriam descobrir uma forma de fazer uma represa mais segura. Muitos confundem equipe com “euquipe”. Esta serve somente para aqueles fanfarrões que, apesar de insinuarem a importância do trabalho em equipe, o fazem e usam desse artifício somente em benefício próprio. O verdadeiro trabalho em equipe é uma forma especial de organização que visa, principalmente, à ajuda mútua entre profissionais de uma mesma empresa ou departamento. Ele pode ser descrito como um conjunto ou grupo de pessoas que se dedica a realizar uma tarefa ou um determinado trabalho. O trabalho em equipe valoriza o potencial de cada indivíduo e permite que todos façam parte de uma mesma ação, além de possibilitar a troca de conhecimento, ato determinante nas relações humanas, pois motiva o grupo a buscar de forma coesa os objetivos traçados. Para Maslow, o trabalho em equipe possibilita dar e receber, por parte de cada um de seus membros, afeição, aceitação e sentimento de importância. Para ele, “isso faz com que o indivíduo cresça, tornando o trabalho determinante, pois o objetivo a ser alcançado depende exclusivamente da satisfação psicológica do indivíduo, bem como das relações 298


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humanas”. Na verdade, a necessidade de desenvolvimento do trabalho em equipe, em qualquer organização, passa necessariamente por diversos fatores de importância para a evolução profissional, tais como a definição de prioridades, o ajuste de metas, otimismo e, principalmente, o estar aberto a mudanças. Todas essas qualidades, quando acrescidas ao ser individual, podem significar sucesso nas relações pessoais, e com isso formar um círculo virtuoso, propiciando assim a possibilidade de realizar tarefas conjuntas. É importante perceber que, quando falamos em trabalho em equipe, falamos em maior volume de atividades, mais e maior responsabilidade, maior comprometimento, mais flexibilidade e tolerância para lidar com as diferenças, maior colaboração e esforço pessoal, detalhes que vão sendo descobertos com a convivência diária e à medida que o trabalho avança. Entretanto, existem inúmeros benefícios. Num grupo coeso afloram muitas características que até passam despercebidas no colega, como a criatividade, a participação, a visão de futuro, senso crítico, bom humor e outras. Trabalhar em equipe significa compartilhar uma direção e a possibilidade de realizar um propósito comum. A existência de pessoas cujos desejos podem constituir motivos para contribuir para esse propósito é fator importante para o sucesso de qualquer empreendimento.

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Para isso é vital incorporar ao vocabulário cultural da empresa palavras essenciais como felicidade, fé, amor, alegria, lazer, pois ao não querer considerar as emoções, o homem deixa de administrá-las, tornando-se escravo delas. Ao não considerar as emoções, muitas organizações acabam por criar um ambiente tumultuado pela ambição, pela inveja, pela cobiça, pelo medo, pela ira, pelo ressentimento, pela violência. A organização racional, ao moldar o trabalhador sem sentimentos, sem identidade psicológica, sem fisionomia moral, criou o protótipo do homem-instrumento, desenhado pela Revolução Industrial e pelas modernas concepções neotayloristas, que teimam em ressurgir periodicamente. Administrar emoções é, provavelmente, o maior desafio ao dirigente líder para formar equipes harmoniosas e produtivas na concretização do lucro e da felicidade grupal e empresarial. O downsizing, a terceirização, os grandes gurus, enfim, todos “entendidos” na área de management, tudo e todos nos conduzem à era do grupal, do trabalho em equipe, da sinergia etc., e tudo isso em detrimento de um processo de individualização que durante muito tempo pareceu ser uma das essências do capitalismo. Hoje, ao observarmos a vida empresarial, ainda encontramos uma enorme discrepância entre o discurso (equipe) e a ação (individualidade), e esse é um desafio para todos os gestores, “formar verdadeiramente um time”, pois somente assim poderá sobreviver nesse mercado onde se trava uma batalha a cada instante. Boa sorte!

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77 Um tributo a Peter Drucker

No mundo dos negócios, raras vezes a incerteza e a oportunidade se revelaram, simultaneamente, tão intensas quanto no início deste terceiro milênio. Fusões, aquisições, incorporações, falências e aberturas de mercado proliferam. Empresários estabelecidos formam alianças improváveis com adversários. A decadência dos sistemas financeiros diminui a disponibilidade de capital. A competição por fatias nos mercados nacional e internacional é acirrada. E o furor competitivo, que deveria se orientar por regras morais e éticas, acaba envolvendo embustes, políticas e práticas empresariais injustas, indiferenças pela defesa do meio ambiente, compondo um conjunto de lideranças corporativas com pontos de vista excessivamente egoístas. As pressões do presente parecem sempre ganhar das considerações sobre o futuro. Assim, a maioria dos planos de transformação organizacionais fala muito mais em melhorar o presente do que em criar o futuro. As empresas, hoje, precisam estabelecer e manter um equilíbrio saudável entre continuidade e inovação.

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Ser bem-sucedida financeiramente não basta para a sobrevivência de uma organização. Seguir conceitos e definir estratégias dentro de rigorosos padrões mundialmente aceitos são os desafios para empresas que buscam ser competitivas no mundo globalizado. Por tudo isso, é preciso ter um olho no presente e outro no futuro. Virar-se para o futuro exige que enxerguemos as grandes tendências da sociedade — um privilégio de poucos e, no pequeno rol de pessoas especiais, o grande gênio foi Peter Ferdinand Drucker, que nunca gostou de ser chamado de visionário. Dizia, “eu não passo de um observador”. Porém, sobre o tema “futuro” foi além: “tentar fazer o futuro acontecer é arriscado; mas é uma atividade racional. E é menos arriscado do que continuar a trajetória com a confortável convicção de que nada vai mudar... O propósito da tarefa de construir o futuro não é decidir o que deve ser feito amanhã, mas o que deve ser feito hoje, para que haja um amanhã... Impor ao futuro, que ainda não nasceu, uma nova ideia que tenda a dar uma direção e um formato ao que está por vir. Isso poderia ser chamado de fazer o futuro acontecer.” Nascido em Viena, na Áustria, em 1919, jornalista e escritor, formou-se em Direito e cursou doutorado em Direito Público e Internacional em Frankfurt, na Alemanha. Levava a vida com simplicidade, como convém aos verdadeiros grandes mestres. Em 1933, começou a trabalhar como jornalista 302


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econômico na Inglaterra e, no fim da década de 1930, mudouse definitivamente para os Estados Unidos, onde passou a maior parte da vida em sua residência na cidade de Claremont, sul da Califórnia, casa que apesar de modesta se transformou numa espécie de Meca dos executivos e acadêmicos de administração de todo o mundo. Seu modo de vida simples não limitou a capacidade de fazer as mais ousadas incursões teóricas sobre o futuro da humanidade. De seus ensinamentos surgiram conceitos badalados como governança corporativa, sociedade do conhecimento e outros. Foi ele o primeiro a constatar que, além do fator econômico, a empresa deveria exercer uma função social, hoje difundida como responsabilidade social das empresas. Foi dele também a previsão de que um dia seria possível comprar, independente do local em que se esteja, produtos de todos os cantos do planeta — que agora sabemos tratar-se de um processo comum, facilitado pelo advento da Internet. De sua casa previu que o Japão se tornaria um dos países mais industrializados do mundo. Ainda nos anos 1970 cunhou a expressão Knowledge Worker (operário do conhecimento), quando disse que a informação iria suplantar todos os ativos tradicionais para se tornar o maior capital das empresas. O fato é que, desde que apareceu nos anos 1930, 303


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Peter Drucker encanta e deixa intrigados gerentes, executivos e estudiosos por sua capacidade de antecipar tendências e destilar ideias. Que o diga Alfred Sloan, presidente da General Motors, quando ainda nos anos 1940 ousou apostar no jovem Peter, solicitando-lhe um estudo naquela que era a maior corporação do mundo, para propor sugestões que pudessem levá-la a uma administração mais eficiente. Talvez a General Motors tivesse tido melhor sorte nos anos 1970, na guerra travada com os japoneses que invadiram o mercado americano com seus automóveis de excelente qualidade e preço baixo, assim como não teria enfrentado a pior crise de desinvestimento de sua história, caso Sloan houvesse acatado as mudanças sugeridas por Drucker. Foram consideradas ousadas demais para a época. Desse período de estudos na General Motors, Druker ofereceu ao mundo um de seus livros campeões de vendas The Concept of the Corporation, publicado em 1946, no qual descrevia o processo de descentralização, a estrutura multidivisional e onde apareceram os primeiros passos da administração por objetivos, concretizados em 1954 no livro Prática da Administração de Empresas. Ali o autor linha de montagem, processo dominado em contrapartida, a 304

abordou criticamente a instituição da que considerava anacrônica por ser um pelo operário mais lento, defendendo, tese do empowerment, a delegação de


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tarefas: “Foi nessa época que descobri que a sociedade de estados industriais estava dando lugar a um novo mundo: o das grandes corporações multinacionais”, afirmou muito tempo depois, em sua autobiografia Aventuras de um Observador. Sobre o modelo de empresa, que os americanos chamam de “corporation”, ele afirmou: “Uma nova instituição social e uma comunidade devem ser geridas e estudadas como tal”. Apesar de ter descrito o principal pilar do capitalismo industrial, a grande empresa deve estar baseada na descentralização, com o menor número possível de níveis de gestão. Mais do que ter tido suas proposições rejeitadas, foi acusado por Alfred Sloan de “esquerdista”, chegando ao cúmulo de o presidente da Westinghouse proibi-lo de entrar na empresa, por considerá-lo um “bolchevista”. Drucker descobriria, com o trabalho para a GM, o filão do management contemporâneo. A partir de então, ganhou o título de pai da administração moderna. Foi um puro analista da gestão empresarial. Para ele, o assunto é uma prática que se aprende, colocando-se contrário ao mito de que a gestão é algo intuitivo, dom de alguns pequenos deuses empresariais — como ainda hoje são apresentados muitos CEOs. Para isso, inspirou-se na Sears e na IBM da época, ao afirmar em seu livro de 1954 que a gestão é uma prática susceptível de ser sistematizada e aprendida.

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No mesmo livro faz uma severa crítica ao badalado “fordismo”, ao afirmar que “a linha de montagem de automóvel não é um modelo para o trabalho humano. É um modelo, de trabalho maquinal, mecânico, não humano”. Ao dar ao mais comum dos mortais a possibilidade de gestão, Drucker permitiu a afirmação progressiva dos gestores como nova camada social. Teve um saber enciclopédico que não se viu em nenhum outro estudioso de empresas. Quem lê a obra de Drucker tem uma sensação de perplexidade e de satisfação, tal a facilidade com que demonstrava sua erudição sobre os temas da administração. Conhecia bem demais as surpresas, os disfarces e as reviravoltas do meio empresarial. Tinha noção clara do verdadeiro papel do gestor. Para ele, o administrador é o elemento dinâmico e vital de toda e qualquer empresa. O calibre e a qualidade da atuação dos administradores constituem a única vantagem efetiva de uma organização no universo da economia competitiva. Foi o primeiro a perceber a transição da era industrial para algo novo, ainda no fim dos anos 1950. Em 1954, escreveu que a grande empresa era a “primeira organização em larga escala baseada no conhecimento”. Mas foi quase 40 anos depois, em 1993, que idealizou o mundo pós-moderno, detectando o surgimento do trabalhador do saber: “Na sociedade em que caminhamos, o saber é o recurso chave”. No livro A Sociedade Pós-Capitalista, afirmou com 306


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convicção que o capital estava se tornando um fator redundante, já não era mais um fator de controle. A sociedade estaria caminhando para algo cujo adjetivo não era o capitalismo: “Os grandes ganhos de produtividade, daqui para frente, advirão da melhoria da gestão do conhecimento” prenunciou. A economia do conhecimento segue uma nova lógica econômica. O conhecimento difere radicalmente de todas as outras commodities, porque não segue a teoria da escassez; ao contrário, segue a teoria da abundância. Isso significa que, se vendemos algo, um livro, por exemplo, não o possuímos mais; já com o conhecimento é diferente: quanto mais o compartilhamos, mais adquirimos; quanto mais usarmos, maior o seu valor. Segundo Peter Drucker, o grande desafio não é mais tornar produtivo o trabalho manual, mas tornar produtivo o trabalhador do conhecimento, que está se tornando o maior grupo isolado da força de trabalho do mundo. A meta é tornar produtivas as forças e o conhecimento específico de cada pessoa. Drucker foi quem verdadeiramente descobriu a gestão, o coração de uma sociedade de organizações, como diria Amitai Etzioni, um dos grandes nomes do estruturalismo. É verdade que, antes de Drucker, a gestão já existia, mas foi ele quem deu consciência aos gestores da sua profissão e criou uma disciplina que podia ser ensinada e estudada, não mais como privilégio de alguns. 307


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Para Drucker, no século XXI a chave para o sucesso de qualquer empresa estará na rapidez com que conseguir traçar estratégias e tomar decisões táticas; nesse cenário, todo colaborador deve ser um empreendedor. Em seu livro de 1985, Innovation & Entrepreneurship: Practice and Principles, reeditado em 1993, disse: “Descobrese. Antecipa-se. Aproveita-se. Lidera-se. Os tempos de transição e de oportunidade são para empreendedores não para gestores”. Peter Drucker chocou ao insistir que o empreendedor não era necessariamente a personagem mítica que a maioria pintava, dono de uma personalidade empreendedora inacessível ao comum dos mortais: “O que todos os empreendedores de sucesso revelam não é uma personalidade especial, mas um empenho pessoal numa prática sistemática de inovação. A inovação é função específica do empreendedorismo, quer seja em um negócio clássico, em uma instituição pública ou em uma empresa criada em uma garagem, em um quarto ou em uma cozinha”. Nos dias de hoje há quem ainda teime em separar empreendedorismo e gestão. Drucker já afirmava que tentar dissociar a administração de empresas de empreendedorismo seria o mesmo que dizer que “a mão do violinista que dedilha as cordas e a mão que comanda o arco são ‘adversárias’ ou ‘mutuamente exclusivas’”. O empreendedor deve saber administrar, assim como 308


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o administrador deve ser dotado de forte comportamento empreendedor. Em síntese: empreendedorismo é comportamento, não traço de personalidade; qualquer pessoa pode desenvolver atitudes e habilidades empreendedoras e, assim, auxiliar a empresa na luta por um lugar ao sol neste mundo tão competitivo. Durante toda sua vida, chamou a atenção para as mudanças fundamentais na economia mundial que afetam a natureza das organizações, o que exige de cada gestor uma abordagem inovadora na maneira de pensar e compreender as novas realidades. Peter Drucker foi acima de tudo um sonhador, como Galileu, Michelangelo, Thomas Edison, Santos Dumont ou Gandhi. Nenhum deles teria feito a diferença se não se dispusesse a trabalhar arduamente para concretizar seus sonhos. Mas Drucker foi também um realizador: pensou no futuro para realizá-lo no tempo presente, deixando seu nome gravado para sempre na história da administração. Parafraseando o grande jornalista brasileiro Armando Nogueira, se Peter Ferdinand Drucker não tivesse nascido homem teria nascido empresa.

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78 A síndrome do poder

A busca pelo poder é uma das manifestações mais antigas do ser humano. Por ela muito se matou, destruiu, reconstruiu, relacionamentos foram aniquilados, pessoas foram humilhadas, assediadas e prejudicadas. Poder, palavra pequena com cinco letras, traz conotações imprevisíveis; é um ente perigoso que nos enleia e envolve. Ao longo da história, o egoísmo e a ganância sempre foram características de quem detém o poder sobrepondo-se aos valores éticos, morais e espirituais. Muitos dos que buscam o poder são melhores para conquistá-lo a qualquer preço do que para exercê-lo, pois, na maioria das vezes, exercem-no de forma irresponsável. É inevitável pensar em poder como um apetite insaciável, em que quanto mais temos, mais queremos. O poder embriaga e inebria, transforma seus agentes em bêbados noturnos a transitar por lugares improváveis e a tomar atitudes arriscadas. A bebida entorpece os sentidos e cria um ciclo: primeiro 310


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um copo, depois dois, em seguida a garrafa e, por fim a adega inteira. Sem perceber nos tornamos escravos. Embriagados, perdemos o senso, as prioridades, a noção do que é certo. Assim é o poder que cega e embrutece. Cegos, nos tornamos inconsequentes e, muitas vezes, guiados por outros cegos, caímos em barrancos inverossímeis, sem perceber que, ao lado, estão os verdadeiramente lúcidos. O exercício do poder endurece nossa mente, nos torna onipotentes, capazes de massacrar ou engrandecer quem quisermos. Acreditamos não depender de ninguém, nem de Deus. Os valores éticos, morais e espirituais mudam de sentido; as escolhas seguem nossa estratégia “infalível”, até a vida cobrar o que lhe é devido e afundar nosso navio. Há tempos recebi uma mensagem contando que um dos césares tinha um auxiliar somente para repetir ao seu ouvido: “você não é Deus”. Ela nos ensina que estar em posição de poder não nos dá o direito de nos considerarmos autossuficientes. A autossuficiência é mãe de trigêmeos: soberba, arrogância e orgulho. São crianças mal-educadas, travessas e perigosas, covardes o suficiente para nos abandonar na primeira curva, quando já não somos tão poderosos quanto imaginamos. Elas nos deixam abatidos, desnorteados e sozinhos, descobrindo nossa humanidade impotente, fazendo ver que o poder tem limite de validade. Somos apenas atores temporais do poder; assim como 311


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nós, ele passa. Quem hoje manda, amanhã não manda mais. A única certeza sobre o poder é a mudança, mas só quando o perdemos é que nos damos conta de que não somos nada, apenas estamos. O problema do poder é que ele não passa de uma ferramenta; como uma faca, pode ser usado tanto para preparar um bom churrasco quanto para matar; ou seja, o poder tanto ajuda quanto prejudica, dependendo da forma como é empregado. Mesmo que comece como um meio para alcançar um fim, corre o risco de se tornar um fim em si mesmo. Relembrando nosso livro Liderança E, para o líder E o poder é o exercício da sabedoria, da inteligência, da criatividade, da estratégia, dos valores éticos, morais e espirituais. Tem repúdio à cobiça, ao orgulho, ao pedantismo, à vaidade e insiste na moderação, no respeito, nos relacionamentos e na contingência. Ser líder E é servir, aceitar que o reconhecimento pode ser tardio, talvez mesmo depois de sua despedida do poder; é saber que será combatido, que só terá bons colaboradores se convencê-los de que é a pessoa certa para levar as ideias adiante; somente assim poderá minar conceitos arraigados e errôneos do que é o verdadeiro poder. Lembrando Ptahhotep, que viveu por volta do ano 2500 a.C., e foi vizir de um dos faraós da V Dinastia, deixou máximas, conselhos e aforismos de sabedoria prática para a educação de seu filho. Nesses o filho é aconselhado a ser 312


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gentil, tolerante, bondoso e agradável; instiga-o a ser reto e justo, mesmo com o sacrifício de seus próprios interesses, já que, segundo Ptahhotep, o poder da retidão é o único que perdura. Mesmo hoje, para o líder E, retidão é o único poder viável.

79 Consultoria eficiente

Certo dia fomos almoçar em um restaurante. Depois de algum tempo jogando conversa fora, notamos que o garçom levava uma colher no bolso da camisa. Por um momento achamos esquisito, mas tomamos o fato como casual. No entanto, quando o encarregado da mesa trouxe água, copos e talheres, notamos que ele também tinha uma colher no bolso da camisa. Olhando em volta, percebemos que todos os garçons e atendentes também. Quando o garçom voltou para tomar o pedido, questionamos: — Por que a colher? — Bem — explicou — Os donos do restaurante 313


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contrataram uma consultoria especializada em gerenciamento e mapeamento de processos, com o objetivo de revisá-los e melhorá-los. Depois de muitos meses de análises estatísticas, a consultoria concluiu que os clientes deixavam cair a colher no chão com frequência 73% maior do que os outros talheres. Isso representava uma queda de três colheres/hora por mesa. Se o nosso pessoal ficasse preparado para cobrir essa contingência, nós poderíamos reduzir o número de viagens à cozinha e, assim, poupar mais de 1,5 hora/homem por turno. No momento em que estávamos conversando escutei um som metálico na mesa de trás. Rapidamente o garçom trocou a colher caída por aquela que ele levava no bolso e justificou: — Pegarei outra colher quando for à cozinha, assim não farei uma viagem extra para buscá-la agora. Ficamos realmente muito impressionados. Então que observamos de relance uma cordinha fininha pendurada no zíper da calça do garçom. Rapidamente percorremos com o olhar o salão para nos certificar que todos os garçons levavam a mesma cordinha pendurada no zíper da calça. Nossa curiosidade foi muito grande e indagamos: — Desculpe, mas... por que tem essa cordinha justo aí? — Oh! Sim — respondeu o garçom em tom mais baixo: — Conheço poucas pessoas tão observadoras quanto 314


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vocês. A consultoria de eficiência concluiu que também poderíamos poupar tempo na ida ao banheiro. — Como é isso? — indagamos. — Veja bem; amarrando esta cordinha na ponta do... bem, vocês entenderam — revelou o garçom todo constrangido — podemos sacá-lo para urinar sem tocá-lo e dessa forma, eliminando a necessidade de lavarmos as mãos, encurtando o tempo gasto no banheiro. — Que ótimo, faz sentido — respondemos. — Mas... se a cordinha ajuda a sacar, como é que volta a guardar? — Bem, eu não sei como fazem os outros, mas eu uso a colher. Para o gestor, uma empresa ou negócio, a velocidade das mudanças que ocorrem no ambiente externo provocam a busca incansável pela melhoria interna dos processos, de forma a poder competir de forma global. A palavra de ordem passou a ser “enxugar”, que nada mais é do que a drástica redução do número de colaboradores, dos níveis hierárquicos, reagrupamento de funções, ampliação de responsabilidades e outras. Mas tais ações não são suficientes; é necessária também uma revisão e a análise de processos de trabalho, avaliando e melhorando o fluxo de atividades de todos os setores, reduzindo os custos invisíveis e buscando a melhoria 315


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da produtividade sem prejudicar a agilidade no atendimento ao cliente. Revisar e melhorar processos requer olho clínico e espírito aguçado, além de questionamento constante sobre o porquê das atividades serem realizadas desta ou de outra forma. Tudo para determinar quais as ações que mais afetam a produtividade. Não há dúvidas sobre a importância da análise e gerenciamento de processos; porém, devem ser efetuadas com critérios e sem exageros, para não ficarem à mercê de gafes como a da história acima.

80 A evolução da Revolução

Uma fumaça negra divide a história: quem viveu antes da Revolução Industrial não poderia prever como seria o mundo no futuro, assim como mal podemos imaginar uma época sem os bens e os males de agora. A partir de 1750 até por volta de 1970, a humanidade viveu o que os especialistas denominaram de Revolução Industrial, predominando a produção em série, um novo tempo de adaptação do homem à máquina. 316


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Foi um fabricante de instrumentos matemáticos que deflagrou a mudança, ao aperfeiçoar um modelo de máquina a vapor de Newcomen, feita em 1712, com a finalidade de bombear a água que se acumulava nas minas. Mas foi a máquina a vapor, patenteada por James Watt em 1769, que expandiu os limites da Revolução. Tratava-se de uma versão que economizava até 75% em combustível, o que permitiu sua utilização em diversos setores, como tecelagem, ferrovias e navios. Com a evolução científica, que serviu de base para a Revolução Industrial, aumentou também o poder de manipulação do homem sobre a natureza. O declínio do Feudalismo fez a população rural migrar para as grandes cidades; os trabalhadores rurais transformaram-se em operários, trabalhando na produção e distribuição de bens industriais. Tal transformação deu origem à automatização do trabalho humano, com inúmeros desdobramentos a partir do fim do século XVIII. Ao mesmo tempo, a força humana foi sendo substituída por novas formas de energia, também modificando o mundo mediante um intensivo processo de industrialização. A transferência das forças para as máquinas permitiu ao homem multiplicar a quantidade de trabalho, deixando de fazer tarefas que antes fazia à mão. As máquinas trabalhavam em velocidade muito maior. Havia, porém, resistências. O inventor inglês Richard 317


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Arkwright foi acusado de ser responsável pelo agravamento dos problemas econômicos da época por conta da sua invenção, uma diabólica máquina de fiar algodão capaz de substituir um grande número de trabalhadores — a propósito, a maquininha inventada por Arkwright tornou-se muito popular e até recebeu o nome de uma mulher. Por ironia, na Inglaterra eram popularmente chamadas de Geny, mesmo nome da esposa de Karl Marx. A oposição ao invento atingiu proporções tais que foi necessário o uso de força para acalmar os 7.900 fiadores e tecelões ingleses da época. Por outro lado, os benefícios do invento, trazendo significativa melhora das condições econômicas, foram superiores até ao que Arkwright poderia imaginar. Um levantamento feito 27 anos mais tarde, pelo parlamento inglês, constatou que o número de empregados têxteis havia crescido mais de 40 vezes: de 7.900 passou para 320 mil, prova de que a máquina, assim como todos as demais invenções do período, proporcionaram mais riqueza a uma parcela maior da população. Em poucos anos o desenvolvimento da humanidade foi maior do que em mil anos de Idade Média. O homem tornou-se altamente materialista. Pouco a pouco o divino desapareceu da visão científica do mundo, deixando um vácuo espiritual que se tornou característico de nossa cultura; a base filosófica passou a ser a divisão 318


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cartesiana entre espírito e matéria. Hoje, sabemos que a visão mecanicista de Newton e seus parceiros trouxeram benefícios para o desenvolvimento da ciência e da humanidade; sem a visão matemática da natureza, é muito provável que não teríamos o desenvolvimento científico e tecnológico do presente. Mas, como tudo na vida, existem dois lados. A partir da Revolução industrial, que direcionou a atenção das pessoas para o que fosse mensurável e quantificável, o mundo foi ficando árido, incolor, sem estética, sem consciência e espírito. Podemos observar que quando há um desenvolvimento significativo nos meios de transportes e de comunicação, há em consequência uma brutal transformação no planeta. Observando a história da Renascença europeia, verificamos que antes da invenção da imprensa, no início do século XV, havia a crença de que a ciência era exclusividade da nobreza e da igreja: elas sabiam mais que todos, por serem as únicas fontes de conhecimento e sabedoria disponíveis. Com a invenção da imprensa, a ciência popularizouse. Foi possível descobrir que as instituições tradicionais eram mais frágeis do que pareciam; reis, nobres e padres passaram a ser apenas pessoas, muitas delas nada melhores do que pessoas comuns. Se, naquela época, a imprensa fazia a diferença, hoje são os meios de comunicação, como televisão, rádio, site, portais. Dispomos de uma massa de informação sobre tudo e 319


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sobre todos. Será que isso não pode nos levar a um novo Renascimento no século XXI? É uma incógnita. Aconteceu que os produtos se tornaram mais acessíveis. Com maior produção em escala, os preços baixaram e muito mais pessoas puderam adquiri-los. O desenvolvimento dos meios de transportes fez com que os mercados se ampliassem. Como explicar o fenômeno? Não parece tão difícil. Nas épocas anteriores, o comércio estava restrito a uma mesma região; não havia meios para transportá-los nem condições de distribuição, mesmo porque eles eram escassos. Com o desenvolvimento dos transportes foi possível distribuir os produtos em comunidades cada vez mais longínquas, formadas ao longo dos rios e dos trilhos das estradas de ferro. A Revolução Industrial, em sua essência, foi responsável pela criação de um novo sistema de produção. Naquele período, o artesanato encerrou historicamente seu domínio, superado pela produção em massa e seriada, surgindo daí as grandes empresas. O impacto foi tão grande que modificou também a situação político-social daquele momento histórico para frente, com a ascensão e o fortalecimento das classes então menos favorecidas, principalmente a do proletariado.

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Em 1870, sete em cada 10 cidadãos europeus se mudaram para as cidades; a maioria vivia em cortiços onde eram comuns a superlotação, trazendo más condições sanitárias e epidemias de tifo, cólera e disenteria. Siderúrgicas expeliam fumaça poluindo o ar, enquanto minas e pedreiras maltratavam a terra. O quadro da família, posterior à Revolução Industrial também mudou. Mulheres e crianças de até seis anos eram exploradas por feitores. Para as classes altas, tudo resultou em qualidade de vida ainda melhor. A prosperidade em expansão rápida, combinada com a eficiência das novas máquinas, deu a banqueiros, empresários e comerciantes riquezas sem precedentes. Uma classe média de gerentes instruiu-se mais, gozando de saúde melhor, com mais lazer e mobilidade; até os mais pobres puderam comprar coisas melhores e mais baratas. Na época não existia um modelo de administração; os que existiam eram baseados nos modelos administrativos da igreja e da organização militar. O apogeu da Revolução Industrial criou a necessidade de um novo modelo: a administração industrial. A partir daí surgem duas correntes de pensamentos. A primeira, situada entre 1880 e 1930, considera as empresas 321


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como um fenômeno econômico simples. Após a 1ª Guerra, com o desenvolvimento das ciências sociais, é formulado um novo conceito, a empresa como fenômeno social complexo — desencadeando mudanças importantes para a sociedade e para o homem. Gerou não só uma revolução tecnológica, como uma revolução de hábitos, costumes e valores humanos, levando o homem a construir e a viver em um mundo sem fronteiras e sem limites, cujo único objetivo é ganhar mais e mais dinheiro. O fato é que a Revolução Industrial fez com que o século XIX ficasse marcado pelo desenvolvimento tecnológico, indicando ao homem uma via em que não pode parar de perseguir avanços, com ousadia cada vez maior. Na atualidade, após a pandemia da covid-19 e a crise econômica, o que está em jogo não é somente a sobrevivência das empresas, mas a necessidade de rever e reconstruir o sistema. Nunca foi tão urgente e dramática a necessidade de conhecimento, de retomada de valores humanos, em especial para os que trabalham com tecnologia perecível, como serviços ou produtos que envolvem informação. A Revolução Industrial trouxe com ela a necessidade de mais e mais conhecimento; transformou o conhecimento no principal ingrediente do que produzimos, fazemos, compramos e vendemos. Administrar o conhecimento, encontrar e estimular 322


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o capital intelectual, armazená-lo, vendê-lo e compartilhá-lo, aliado à busca de valores éticos, lutar pela humanização das empresas e pelo respeito ao ser humano, tornou-se a tarefa mais importante dos gestores atuais. O sistema criado a partir da Revolução Industrial já não atende mais as necessidades e ansiedades do ser humano. É preciso reinventá-lo. Eis o nosso desafio como gestores e como administradores.

81 Os generais e a administração

Com essa frase, Al Ries e Jack Traut sacudiram o mundo do marketing em 1986, com o livro Marketing de Guerra, dando o pontapé inicial para o estudo de grandes generais da guerra. Quem leu o livro tomou contato com o general prussiano Von Clausewitz, cujo nome completo era Carl Phillip Gottlieb Von Clausewitz (1780/1831). Foi um dos grandes generais da Prússia. Diretor da Escola Militar de Berlim, escreveu o livro Von Kriege (Da 323


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Guerra). É considerado um dos grandes mestres da arte guerreira. Suas lições de tática e estratégia ultrapassaram as barreiras militares para se constituírem em profunda reflexão sobre o mundo dos negócios e seu ambiente competitivo. Também antecipou a Escola de Administração Científica de Taylor. Desde muito cedo, considerava a disciplina um requisito essencial para qualquer organização. Afirmava que administrar uma grande organização requeria planejamento cuidadoso, com decisões fundamentadas em probabilidades e não em necessidades lógicas. Sua maior contribuição para a Ciência da Administração, além do conceito de estratégia, base do livro de Al Ries e Jack Trout, foi pregar que o administrador deveria aceitar a incerteza — planejar de modo a minimizá-la, com decisões sempre científicas, não intuitivas. Pouco conhecido, mas igualmente importante é Helmut Karl Bernhard Graf von Moltke, outro general prussiano. Von Moltke pertencia a uma aristocrática, porém pobre, família de Mecklenburg. Sua privilegiada inteligência e habilidade organizacional e estratégica fez dele uma das principais figuras da história militar da Alemanha. Estudou e tornou-se cadete em Copenhagen, alistando-se logo depois na infantaria holandesa. Após uma visita a Berlim conseguiu colocação no exército prussiano, como tenente no regimento Granadier. Em 1851 tornou-se 324


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coronel, assumindo o posto de adido militar do futuro imperador da Alemanha, Friedrich Wilhelm. Von Moltke é considerado um dos principais pensadores da moderna arte da guerra. Era um gênio em assuntos de transporte, suprimentos e reforços, o que tornou possível muitas vitórias do pequeno exército prussiano sobre os principais rivais. Suas habilidades criaram as bases para o que seria conhecido como Blitzkrieg, termo alemão que significa guerrarelâmpago, tática empregada pelo exército de Hitler, quatro décadas depois de sua morte. Von Moltke, junto com Otto von Bismark e Frederico, o Grande, formou o triunvirato responsável pela unificação da Alemanha — fruto da união dos estados de língua germânica. Os estados germânicos, sob o domínio de Napoleão, constituíram uma confederação, sem chefe supremo. Cada componente tinha sua própria soberania; alguns estados eram reinos, outros eram principados, outros ducados, cada um com sua própria constituição. Apesar de não haver harmonia de conjunto, todos tinham em comum a unidade da língua. Diante desse período, muitos líderes sonhavam com a fusão dos povos germânicos, formando uma grande nação. Para a empreitada, o meio escolhido foi o uso da força militar. O movimento teve sua célula-mãe na Prússia, onde reinava Frederico Guilherme, conhecido nos livros de História como Frederico, o Grande. 325


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Bismark é, sem dúvida, o mais conhecido. Por meio dele a Prússia falava ao mundo, sendo conhecido como o “chanceler de ferro”. O exército estava sob o comando de Von Moltke, obtendo vitórias significativas contra a Dinamarca, então entre as grandes potências militares europeias, contra a Áustria, a maior nação militar da Europa, e contra a França de Napoleão, na mais famosa guerra de 1870. Conta-se que logo após Napoleão ter declarado guerra à Prússia, tarde da noite, Bismark mandou chamar Von Moltke e solicitou-lhe que tomasse as providências. Dizse que a resposta de Moltke foi imediata, argumentando não haver nenhuma providência a ser tomada: o plano já havia sido traçado de forma minuciosa, estava guardado a sete chaves em um cofre do Estado Maior. Cada soldado de Moltke sabia exatamente o local onde deveria se apresentar, e mais, ao se seu apresentar, encontrava a sua disposição farda e equipamento de acordo com o tamanho. Sua personalidade era a de quem não agia sem ter um plano perfeitamente traçado — e jamais tomava qualquer medida fora desse plano. Moltke tinha consciência de que não poderia ser eficiente em todos os assuntos, mas precisava agir com eficiência. Para tanto, criou um conselho composto de especialista em todas as áreas. Esse conselho serviu de modelo desde então. Cada regimento e cada divisão tinham seus abastecimentos 326


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previstos e preparados antecipadamente. Muitas foram as regras de estratégias traçadas por Moltke e que são perfeitamente aplicáveis à Administração. Uma delas é a de que “você deve concentrar todos os esforços em torno do objetivo que pretende atingir”, que serviu de base para um dos 14 princípios de Fayol, batizados como unidade de direção. Outra regra de Von Moltke é a de que “você deve, sempre que possível, abreviar a ação”. Na linguagem atual da administração, significa dizer que se deve evitar o desperdício. E, por último, ele dizia que “tudo que pode ser deixado a cargo de um oficial não deve ser objeto de ordens superiores”; ou seja, um superior não pode se preocupar com minúcias, que devem ser delegadas para o nível gerencial e operacional. Sob o ponto de vista de eficiência, a obra de Von Moltke serviu como base para a ciência administrativa. Vale dizer que os 12 princípios da eficiência, propostos por Harrington Emerson, tiveram como base os ensinamentos daquele genial comandante. Muito antes dele, porém, houve outro: “Se conhecemos o inimigo, ambiente externo, e a nós mesmos, ambiente interno, não precisamos temer uma centena de combates. Se nos conhecemos, mas não ao inimigo, para cada vitória sofreremos uma derrota. Se não nos conhecemos nem ao inimigo, perderemos todas as batalhas.”

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ANTOLOGIA DA VIDA CORPORATIVA

Essas sábias palavras foram ditas por um homenzinho muito antigo, cujo nome poderia ser estratégia, autor de um livro que poderia ter sido esculpido na rocha para que servisse para os séculos. Estamos falando de Sun Tzu, súdito do rei de Wu, na turbulenta época dos estados guerreiros na China, há 2.500 anos. Era um filósofo-estrategista. Grande general, sob seu comando o exército real de Wu acumulou inúmeras vitórias, derrotando exércitos inimigos e capturando seus comandantes. Não existe biografia sobre esse gênio da estratégia militar. Nem se sabe com segurança se Sun Tzu existiu ou é produto de lendas. Os únicos escritos atribuídos a ele que sobreviveram até os nossos dias foram escritos no século I a.C. pelo historiador Ssu-ma Chien, traduzidos pelo padre Joseph-Marie Amiot, astrônomo e historiador e missionário francês na China. O fato é que não existe biografia linear de Sun Tzu, com início, meio e fim. O que existe são concisas narrações de alguns fatos de sua vida. Escreveu “Os treze momentos”, mais conhecido como Arte da Guerra, livrinho diabolicamente interessante que determinou os princípios ideais para a vitória em todas as guerras. Apesar das especulações sobre a vida e a existência de Sun Tzu, sua obra é considerada um dos mais importantes escritos da história militar em todos os tempos. Segundo 328


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especialistas, somente Carl von Clausewitz pode ser comparado a Sun Tzu. A Arte da Guerra é considerado o mais antigo tratado de guerra. Atualmente parece destinado a secundar a guerra das empresas no mundo dos negócios. Seu primeiro ensinamento é que a primeira batalha a travar é contra nós mesmos. Com inteligência e argumentos racionais, Sun Tzu expôs a importância da obediência, disciplina, planejamento e motivação das tropas. Depois de 2500 anos, continuam a ser valores vitais para a sobrevivência das empresas. Em relação aos comandados, Sun Tzu tem uma ideia radical: é preciso manter disciplina rígida, ser respeitado, ter prestígio, ser temido. Para conseguir o intento, o comandante precisa agir muito rápido quando ocorrer um ato de indisciplina. Podemos afirmar que os princípios de Sun Tzu podem ser aplicados tanto por exércitos contra exércitos quanto por empresas contra seus concorrentes. Muita gente afirma que, na virada da década de 1980, quando a indústria japonesa deu um gigantesco salto e suas empresas se tornaram ameaça para outros impérios industriais, bastaria abrir a gaveta de qualquer presidente de uma empresa japonesa para encontrar lá uma cópia de A Arte da Guerra. Sun Tzu não escreveu um livro qualquer, escreveu um livro definitivo, tão permanente como se estivesse sido escrito ontem. 329


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Como é que livros escritos há mais de 2.000 anos sobre estratégia de guerra, no tempo em que elas eram lutadas com arcos, flechas e espadas, podem influenciar os modernos negócios, que usam tecnologias de ponta, inteligência artificial, técnicas modernas de produção, comercialização, internet? Pois é, essa é a mágica desses geniais comandantes militares. A partir de seus ensinamentos o mundo dos negócios nunca mais foi o mesmo.

82 Objetivo comum

Em 73 a.C. cerca de 200 escravos da escola de Batiato revoltaram-se devido aos maus-tratos que recebiam do ianista, negociante e treinador de gladiadores. Entre eles, Spartacus, garoto orgulhoso e rebelde que havia sido vendido antes de completar 13 anos de idade como escravo para trabalhar nas minas da Líbia. Lá, sob chicote, correntes e o sol, passou a juventude e a adolescência sonhando com o fim da escravidão, mais de 330


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dois mil anos antes que ela fosse extinta nos países do mundo desenvolvido. Spartacus não tinha muito com o que sonhar — fora condenado à morte por morder um guarda, mas seu destino foi mudado por outro ianista, que o comprou para ser treinado nas artes de combate e tornar-se gladiador. Um dia, dois poderosos homens chegam de Roma, um com a esposa, o outro com a noiva. As mulheres pedem para serem entretidas com dois combates até a morte. Spartacus é escolhido para enfrentar um gladiador negro. Ele vence a luta, mas se recusa a matar o opositor, atirando seu tridente contra a tribuna onde estavam os romanos. Esse nobre gesto custa a vida do gladiador negro e enfurece Spartacus de tal maneira que ele acaba liderando uma revolta de escravos que atinge metade da Itália. O diretor Stanley Kubrick transformou a história de Spartacus num monumental filme, estrelado por Kirk Douglas, Laurence Olivier e Peter Ustinov. No filme, os escravos, depois de derrotarem as legiões romanas por duas vezes após um longo cerco e uma árdua batalha, foram, finalmente, dominados pelo general Marcus Crassus, que diz aos sobreviventes do exército de Spartacus: — Vocês eram escravos e voltarão a ser escravos. Entretanto, serão poupados da pena de crucificação por 331


ANTOLOGIA DA VIDA CORPORATIVA

clemência das legiões romanas. Basta, apenas, entregaremme o escravo Spartacus, pois não sabemos quem ele é. Após longa pausa, Spartacus levanta-se e diz: — Eu sou Spartacus. Então, o homem que está a seu lado também se levanta e diz: — Eu sou Spartacus. No transcorrer de um minuto, o exército escravo todo está de pé gritando: — Eu sou Spartacus. Lenda ou não, esse episódio mostra uma profunda verdade: pondo-se de pé, todos os homens optaram pela morte. A lealdade do exército de Spartacus não era ao homem Spartacus e, sim, ao objetivo que ele inspirara, compartilhado por todos — a ideia de que podiam ser livres. O objetivo era tão forte que nenhum dos homens suportaria a ideia de abandoná-lo e voltar à escravidão. Um objetivo compartilhado, ou comum, não é uma ideia, mas uma força inculcada no coração das pessoas, uma força de poder impressionante, como ensina Peter Senge. Pode ser inspirado por uma ideia; no entanto, assim que ganha impulso, deixa de ser abstração, transformandose em algo concreto. As pessoas começam a vê-lo como se 332


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existisse. Poucas forças nas relações humanas têm o poder de um objetivo que é de todos. Em nível mais simples, um objetivo comum é a resposta à pergunta: — O que queremos criar? Assim como os objetivos pessoais são imagens que as pessoas carregam na mente ou no coração, a mesma coisa acontece com os objetivos compartilhados pelas pessoas de uma mesma organização. Eles criam um sentimento de coletividade que permeia a empresa e dá coerência às diferentes atividades. Transformar um simples objetivo em objetivo comum, a ser perseguido por todos, não é fácil; porém, qualquer sociedade, organização ou grupo de pessoas sem objetivo é um desastre. Na história de Spartacus, todos, naquele momento, tinham um único sentimento e um horizonte pouco promissor: unir-se em torno de um objetivo comum era a melhor alternativa. O exemplo mostra claramente que a união é fundamental para conseguir o que se pretende. A lealdade se materializava na ideia de liberdade, que Spartacus defendia e que passou a ser o objetivo comum, a ser alcançado por todos custasse o que custasse. Para a empresa, o objetivo comum, que todos devem perseguir, é a sobrevivência e o crescimento da organização; 333


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com ela, a sobrevivência e o sucesso de cada colaborador. Qualquer modelo de gestão só poderá sobreviver e crescer por um período longo se as pessoas que o compõem acreditarem naquilo que fazem.

83 Inteligência artificial e o futuro do trabalho

O ritmo acelerado das mudanças no ambiente empresarial reduziu a relevância dos planos de longo prazo, que, frequentemente, se limitavam a fazer projeções do passado. O fenômeno nos força a alterar o foco de atenção, descolando-se da preocupação com a definição de posições sustentáveis no mercado para um interesse na maneira de desenvolver a capacidade de uma empresa sentir e reagir de forma rápida e flexível às mutações provocadas, principalmente, pelo desenvolvimento de novas tecnologias. Com os inúmeros aplicativos, plataformas e softwares, as empresas passaram a interagir com uma nova organização econômica, que se vale de avaliações dos usuários para 334


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construir uma base de confiança entre quem oferece e quem utiliza o serviço. Essa lógica vai sendo replicada para dezenas de negócios e continuará ganhando expressividade, uma vez que, com as informações abordáveis que esses aplicativos criam, torna-se factível saber quem presta ou não um bom serviço, e todas as empresas, independente de tamanho, estão no meio desse furacão. Tudo se tornou mais ágil, por essa razão todas as empresas têm que buscar, ininterruptamente, novos padrões de produtos e serviços, conectados com a realidade tecnológica, novas formas de se relacionar com os clientes em decorrência da necessidade de inserção competitiva num mercado heterogêneo em que criatividade, inovação, qualidade e digitalidade são fatores concorrenciais. Tudo nas empresas precisa ser visto por todos sob a ótica da estratégia, tendo em conta que, para que todos se envolvam, não basta as pessoas conhecerem somente o quê, necessitam também saber o porquê, compreenderem o propósito e a razão de fazer o que fazem. O insuficiente conhecimento e compreensão dos propósitos, objetivos, metas, missão e visão pode levar a não se obter o sucesso que a empresa almeja. Desconformidades são causadas por múltiplos motivos, desde a inépcia em saber o que se deseja e aonde se quer chegar, até o receio de assumir responsabilidades são barreiras a enfrentar.

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A estratégia numa instituição se refere à própria instituição. Versa sobre ela ser única, ímpar, singular; afinal, a tecnologia digital cognitiva iguala a todos em termos de processos: é aquele algo a mais que faz o cliente escolher você e não outro. A essência de uma instituição não muda, mas a forma tem que mudar constantemente; o futuro não é sobre tecnologia, é sobre imaginação, inovação, criatividade e propósito. Todas as empresas requerem compromissos com metas comuns e valores compartilhados. Elas são compostas por pessoas com diferentes capacidades, habilidades e conhecimentos, o que torna complexa a tarefa de formação de equipes de relacionamentos vencedoras. Portanto, é essencial que se defina com clareza que resultado se está almejando. Para construir uma empresa ágil, flexível, receptiva, acessível, digitalizada, eficiente, inovadora, competitiva, com enfoque em clientes rentáveis, que seja seguida e não seguidora, a melhor maneira é redefinir não somente sua estrutura, ambientes interno e externo, perfil de seus colaboradores e tecnologias necessárias, mas também os processos existentes. Esquecer como o trabalho é realizado e decidir como realizá-lo melhor e de forma diferente se necessário. Antes de falar de gestão, vamos falar de produto. Podemos começar com a frase “todos os animais são iguais, mas alguns são mais iguais do que os outros”. Trata-se de um dos mais chocantes conceitos expostos no livro A revolução 336


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dos bichos, de George Orwell. No momento em que vivemos é factível uma variação dessa conceptualização, reescrevendo-a para o terreno dos negócios: todo nicho de mercado é igual, mas alguns são mais iguais do que os outros, significando que devemos tratá-los com a devida distinção. Sabemos que uma transformação silenciosa vem acontecendo nos últimos anos em relação à fidelização dos consumidores. As empresas devem estar cientes que seus clientes em potencial estão concebendo uma nova atitude, a de acreditar mais uns nos outros do que nas empresas; em outras palavras, a confiança existe mais em relacionamentos horizontais do que verticais. Hoje os clientes em potencial segmentam-se em grupos, geram experiências, procuram alternativas fora de suas tribos, vão atrás de personagens admiráveis que consigam diferenciar e trazer algo que os encante. São céticos, porém, ao receber a oferta de um produto ou serviço que lhes agrade, imediatamente se fidelizam e tornam-se leais. Criar um nicho de mercado onde a empresa possa ser relevante passa por descobrir efetivamente onde quer ser referência. Para isso ela deve se transformar em uma Empresa em Tempo Real, como denomina o americano Regis McKenna, aquela que diante das rápidas mutações tecnológicas apressa a concepção de novos produtos e serviços, mais flexíveis e adaptáveis.

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Com a tecnologia digital cognitiva substituindo o esforço físico, repetitivo e preditivo, o tempo deixa de ser um obstáculo e passa a ser um recurso. Trabalha-se em real-time, ou seja, quando o cliente sente a necessidade e o desejo de adquirir um produto ou serviço, a empresa tem que estar apta a oferecer. A empresa em tempo real não sabe quantos clientes desejarão seus produtos amanhã, mas tem consciência de que deve responder de imediato às exigências. No fim das contas, o que as empresas querem é competitividade. Em outras palavras, know-how, produtos e serviços diferenciados, acessíveis, atrativos, de baixo custo e qualidade percebida. Isso exige uma organização flexível, similar à energia competitiva de um jovem jogando videogame, mas não com o poder analítico de um grande mestre de xadrez. Em síntese podemos afirmar que desde o início do século XX houve acentuadas especulações sobre como seria o modus vivendi no século XXI. A evolução dos sistemas foi um processo dinâmico e gradual. A revolução agrícola estava assentada na produção de alimentos; a revolução industrial alicerçada na manufatura das coisas; a revolução tecnológica fundamentada na entrega de serviços por máquinas inteligentes munidas de inteligência artificial, que melhoraram a produtividade. Com isso, o trabalho rotineiro está sendo automatizado, reduzindo drasticamente a necessidade de intervenção humana. 338


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Estamos vivendo a quarta Revolução Industrial, denominada de indústria 4.0, marcada pela convergência de tecnologias digitais, físicas e biológicas que interferem na forma como nos relacionamos, trabalhamos e consumimos. Precedida por revoluções anteriores que também moldaram a sociedade com inovações, a nova era apresenta ao mundo a inteligência artificial, a robótica e os assistentes virtuais, cada vez mais presentes no nosso cotidiano. Quando se atira uma pedra em um lago, se obtém uma série de ondas concêntricas, que se propagam de forma contínua, pela superfície aquática. Do mesmo modo, graças ao progresso tecnológico, o nosso planeta tornou-se um lago em que cada onda atinge e envolve até os cantos mais remotos. Acabaram-se as fronteiras, o mundo passou a ser um só. Com as novas tecnologias não existe mais distância, não existe mais canto remoto: a terra, em todas as acepções, tornou-se redonda. A transfiguração causada pela tecnologia é colossal; em seu coração está um novo tipo de participação, desenvolvida como uma cultura emergente baseada na partilha. As formas de partilhar, habilitadas por hiperlinks, estão agora criando um novo tipo de pensamento, parte humana, parte máquina, nunca percebido em toda a história. Cada período histórico é marcado por uma organização sócio-político-cultural própria. Inúmeros motivos levam a crer que estamos agora em uma transição, a partir do que passaremos da Idade Contemporânea para uma Idade Pós339


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Contemporânea. As metamorfoses que vêm ocorrendo graças à tecnologia, automação e inteligência artificial estão modificando as relações econômicas entre empresas, empregados, governos, países, línguas, culturas, sociedades. Em virtude disso, as empresas deverão alterar suas filosofias, princípios, modelos mentais para preparar os trabalhadores para a transição do work to (trabalhar para), para o work with (trabalhar com), desenvolvendo criatividade, empreendedorismo, valores humanos e menor rigidez no tempo e no espaço. Com as novas e revolucionárias tecnologias aprendemos que o impossível é mais plausível do que parece. Com o advento da diferenciação entre homens e máquinas, somado à robotização, automação, substituição do esforço físico e repetitivo, e a inteligência artificial realocando o trabalho preditivo, altera-se o modelo de cadeias produtivas, de prestação de serviços e das interações comerciais. Consumidores atuam como produtores, fazendo com que milhões de ocupações da Economia Convencional sejam extintas. Esse cenário é plausível devido ao fenômeno big date, que continua a se desenvolver. Em todos os setores é possível coletar dados em quantidades ininteligíveis para os seres humanos, informações sobre todos os aspectos da performance humana. Tarefas, procedimentos e atividades 340


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provavelmente serão encapsuladas, esperando o dia em que um sagaz algoritmo principie a examinar os registros deixados por seus predecessores humanos. O resultado de tudo isso é que adquirir mais conhecimento, competências, habilidades não necessariamente assegurará a efetiva proteção contra a automação de ocupações no futuro. Ainda não se tem um consenso sobre o número de ocupações que irão desaparecer: pesquisa do DaVinci Institute, organização sem fins lucrativos em Westminster, Colorado/ EUA, projeta o desaparecimento, nos Estados Unidos, de dois milhões de postos de trabalho até 2030. O grande desafio é preparar profissionais para as novas ocupações, pois a maior parte dos trabalhadores que perderão o emprego não possuem as competências necessárias para as ocupações que irão surgir. Não há espaço para ser espectador enquanto a tecnologia avança em uma escala vertiginosa, frenética, alucinante. Se na Fase Agrícola o esforço físico foi comutado por instrumentos e ferramentas, na Revolução Industrial o trabalho físico foi substituído por máquinas mecanizadas, na Revolução Pós-industrial a ocupação repetitiva por máquinas inteligentes, agora todo trabalho preditivo está sendo substituído pela automação, robotização, realidade virtual, inteligência artificial. É o advento do trabalhismo, algo similar ao cenário 341


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da Idade Média em que os artesãos eram empreendedores que possuíam profissão, mas não tinham nexo empregatício. A inteligência artificial é um dos principais aceleradores, catalisadores e dinamizadores desse processo. Devido à high-tech, tudo o que concebemos, procriamos, engendramos está em processo de se tornar diferente. A metamorfose é inevitável: é preciso adaptar-se, civilizar e domesticar as invenções impelidas pela inteligência artificial, por meio de aceitação e adoção precavida. Estamos nos afastando dos substantivos fixos e caminhando em direção a um mundo de verbos fluidos. É verdadeiro anunciar que objetos sólidos, como o automóvel, livros, objetos de aprendizagem sejam transfigurados em verbos intangíveis, significando que produtos se tornarão serviços e/ou processos. É certo que computadores, robôs ou máquinas inteligentes estão cada vez mais substituindo trabalhadores, em vez de torná-los mais valiosos. A parcela da renda de mão de obra correspondente ao trabalho rotineiro está diminuindo drasticamente, evidenciando que a ocupação da classe média está sendo grelhada, dissipada, desvanecida. Desde a antiguidade a inteligência artificial vem auxiliando o homem a melhorar sua qualidade de vida, sua aprendizagem, seu status quo, bem como vem criando, alterando, eliminando ocupações, profissões, empregos. Eles nascem, tornam-se significativos, para em seguida serem 342


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ingeridos, devorados, dizimados, pela deusa tecnológica, a alterar ainda nosso modo de vida de forma inimaginável. Ao interagir com máquinas, criamos expectativas humanas e emocionais perante elas. Tais máquinas são estranhamente familiares porque nos imitam. Seus recursos são programados com base na nossa visão e autopercepção do mundo; tudo isso está sendo feito a uma velocidade impressionante. Embriagados pela tecnologia, chegamos ao ponto de perguntar o que é parecer e ser humano. A globalização e a aceleração das metamorfoses tecnológicas fazem com que o administrador seja obrigado a lidar com modernas técnicas de gestão, para maximizar a competitividade nas empresas e organizações.

84 Síndrome do Maséke

A reunião transcorria tranquila, o Maséke confortavelmente acomodado, em silêncio, na esperança de que não fosse solicitado a se manifestar. Eis que Paulo, dirigindo-se a Pedro, indagou:

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— Você ficou de entregar o relatório relativo ao projeto X hoje. Não teve jeito, percebeu que era hora de entrar em ação. Maséke está em todos os lugares, em todas as empresas, sempre alerta, pronto a justificar ações e tarefas não entregues. Desta vez não foi diferente. — É verdade chefe, mas é que... O que os gestores esperam de seus colaboradores é a maneira como eles se comportam em relação a obrigações e responsabilidades. Nenhum gestor aceita conviver com a síndrome do Maséke muito comum nas organizações. Segundo Warrem Bennis, a maioria de nós é formada mais por experiências negativas do que positivas, o que talvez seja uma das bases da síndrome do Maséke. As empresas precisam de pessoas que assumam riscos, quebrem regras e até assumam seus fracassos sem buscar justificativas inexistentes. David Allen foi feliz quando disse que os calendários captam somente uma fração do total de responsabilidades e de coisas a serem feitas, que muitas vezes não são feitas por falta de iniciativa e comprometimento. Para estas pessoas o “mas é que...” é um chavão perfeito para justificar suas irresponsabilidades. Mas é que: Maséque! Um indivíduo, para cumprir suas obrigações, precisa de informações — quem não tem informações não pode assumir responsabilidades. Por outro lado, um indivíduo a quem são fornecidas todas as informações necessárias para 344


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o cumprimento de suas obrigações não pode se eximir das responsabilidades, fazendo uso constante do chavão do Maséque. Muitos se utilizam dele referindo-se à síndrome do tempo. Como diz Allen, tempo não é problema. É na elaboração das ações necessárias que as pessoas falham. Talvez nada diferencie mais os executivos eficazes do que o cuidado com o tempo. Como afirmava Peter Drucker, os seres humanos têm percepção pobre do tempo, além de serem péssimos para se lembrar de como passam o tempo. Mais do que fazer as coisas da maneira certa, os colaboradores devem lutar pela eficácia ao fazer as coisas certas, em lugar de ficarem reféns da síndrome do Maséke. Como ensina Drucker; “afinal de contas, eficácia não é uma disciplina, é uma autodisciplina”, Autodisciplina e autocontrole são fundamentais para o bom relacionamento, para alcançar eficiência, eficácia e efetividade dentro das organizações. Para os adeptos do Maséque é bom relembrar de que talvez o remédio para a síndrome é entender ser preciso pensar fora da caixinha, desenhar além das linhas, desenhar a inspiração. Bem, gostaríamos de continuar escrevendo, mas é que... Opsss!

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