Revista Jurídica da FA7 5ª Edição

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António Santos Justo

Não surpreende, portanto, que o Código Civil brasileiro de 1916 seja uma obra notável que CORDEIRO ALVAREZ sintetizou eloquentemente, escrevendo: “C’est la plus haute expression du droit civil americain, et une des ouvres legislatives les plus remarquables du monde”141. E se à auctoritas de CORDEIRO ALVAREZ juntarmos a douta opinião de MOREIRA ALVES para quem, no Tratado de ENNECCERUS, KIPP e WOLFF, o Código Civil brasileiro é considerado “a mais independente das codificações latino-americanas” porque “se funda em ideias dos juristas brasileiros e recolhe o direito consuetudinário”142, ficaremos tranquilamente desobrigados de outras considerações e do risco duma apreciação provavelmente deficitária. No entanto, importa esclarecer que há, no Código Civil brasileiro, influências francesas, alemãs e argentinas. Como simples exemplos das primeiras, destacamos os deveres conjugais143 e a fixação proporcional de alimentos de acordo com as necessidades do alimentando e os recursos da pessoa obrigada144; das segundas, a relevância do erro sobre as qualidades pessoais na anulação do casamento145 e a extensão do direito de propriedade só à altura ou profundidade que interessem ao proprietário146; e das últimas, o âmbito da indemnização no caso de homicídio147. Porém, não ofuscam as influências da tradição jurídica luso-brasileira que reflectem a preocupação da doutrina brasileira, na linha de TEIXEIRA DE FREITAS. Referimos tão-só alguns aspectos: - o regime supletivo da comunhão geral de bens148; - a compra e venda que, só por si, não transfere a propriedade149; - a regra de que o comprador de coisa locada pode despedir o locatário se o contrário não tiver sido convencionado150. No entanto, sempre que se julgou necessário, aquela tradição foi afastada. Constituem inovações, v.g.:

Vide E. CORDEIRO ALVAREZ, Amérique latine em Travaux de la semaine internatonale de droit (Paris, 1954) 744. 142 Vide José Carlos MOREIRA ALVES, A contribuição do antigo direito português no código civil brasileiro em Estudos de direito civil brasileiro e português (I Jornadas Luso-Brasileiras de Direito Civil) (São Paulo, s/d) 38. 143 Cf. arts. 231º. e 203º. e 212º., respectivamente, do Código Civil brasileiro e do Code Civil francês. 144 Cf. arts. 400º. e 208º., respectivamente, do Código Civil brasileiro e do Code Civil francês. 145 Cf. artº. 219º. I do Código Civil brasileiro. 146 Cf. art. 526º. do Código Civil brasileiro. 147 Cf. arts. 1537º. e 1084º., respectivamente, do Código Civil brasileiro e do Código Civil argentino. 148 Cf. art. 258º. 149 Cf. art. 1122º. 150 Cf. art. 1197º. 141

RevJurFA7, Fortaleza, v. V, n. 1, p. 197-242, abr. 2008

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