Da Letra de Mao à Letra de Forma

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Fig. 1 - Construção da mancha de texto segundo o traçado de Villard de Honnecourt. Os números indicam a ordem pela qual devem ser traçadas as diagonais.

tarefas até chegar ao resultado final do volume ou códice manuscrito, cópia fiel de uma matriz, o exemplar. A cópia era fundamentalmente um acto repetitivo em que a letra era norma fixa na fidelidade ao texto princeps, à pontuação, às regras das linhas ou ao estilo no desenho da letra. A intuição ocorreria em certas passagens obscuras de difícil interpretação, no desenvolvimento ou utilização das abreviaturas no texto, em certas inovações estilísticas a nível caligráfico. A imaginação intervinha mais no nível meramente artístico e criador, na decoração das iniciais capitulares historiadas ou floreadas, na ilustração da iluminura. A tarefa mais humilde era preparar o suporte da escrita, o pergaminho ou o velino, para além do papel, cuja utilização foi aumentando com a sua vulgarização e disponibilidade, pela dispersão, no século XV, de fábricas de papel por toda a Europa: nessa época, o pergaminho era comercializado (dependendo da sua qualidade e acabamento), cerca de 12 a 15 vezes mais caro do que o papel. O papel, mais frágil e efémero, beneficiava do factor da desconfiança num meio tecnicamente pouco inovador, conservador pela disciplina dos métodos, avesso à precaridade ou à funcionalidade que o papel representava, nos actos do quotidiano, como a simples carta ou missiva para além do registo contabilístico. A preparação do suporte consistia após o corte em folhas de for- mato previamente definido, obtendo-se o folio ó, em fazer o risco da folha, isto é o seu riscado (as linhas em intervalos regulares) e o seu pautado (as margens) em esquadria, calculando e definindo a proporção das margens com a mancha do texto (sua justificação) a preencher. Essa proporção, o mais das vezes feito insuspeitadamente com o apoio da geometria, estabelecia a largura e o comprimento do rectângulo de texto com a maior ou menor proporção da largura das margens, criando, por assim dizer, o regime dos brancos e a perfeita harmonia das respectivas superfícies, isto é, o espaço ocupado pelo negro ou sépia das letras ou o colorido dos motivos iluminados. Pela oposição entre os brancos das margens e entrelinhas com a superfície manuscrita (ou impressa, como se verá), resultava o equilíbrio da arquitectura e da economia da página, a ponto de permitir a conclusão de que a maior proporção de espaços em branco determina a riqueza e sumptuosidade da obra final. Essa arquitectura da empaginação foi desde logo observada


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