Gaspar Roman & Gaspar Italic

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ceNtro uNiVersitário seNac milena melguiso Érico Lebedenco

Pós-graduação em tipografia Type Design 2 - textos e publicações são Paulo 2014.02



ceNtro uNiVersitário seNac milena melguiso Érico Lebedenco

Gaspar Roman Gaspar Italic Projeto de tipos desenvolvido para a disciplina type Design 2 – textos e publicações. Prof. Leopoldo Leal

são Paulo 2014.02



1. Objeto de estudo

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1.1. Proposta de trabalho 1.2. Partido adotado 1.3. Pesquisa

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1.3.1. Bíblia 1.3.2. Pesquisa tipográfica

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2. Processo

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2.1. Gaspar Roman 2.2. Gaspar Italic

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3. Tipografias em uso

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4. Referências

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1. Objeto de estudo 1.1. Proposta de trabalho Proposta Primária: Desenvolvimento em dupla de uma tipografia para composição de texto. Para esta tipografia, pode-se dar continuidade a algum projeto pessoal ou outro que tenha sido iniciado pelos participantes em disciplinas anteriores. No caso de um projeto pessoal, é possível o aprimoramento da fonte ou expansão da família. Proposta Secundária: Criar um sistema relacionando tipografias diferentes, visando o estudo da combinação de tipos, prática de composição, hierarquização e desenho de tipos para texto.

1.2 Partido adotado “Todo tipo de letra é, de certo modo, uma retomada do que já houve, mesmo quando a narrativa histórica está sendo contestada ou re-interpretada. O tipo mais antigo copiava a letra gótica, manuscrita, a escrita padrão do período medieval. Os tipos de letra subsequentes refletiam seu próprio meio específico, do tipo de metal à tela. Mesmo hoje, quando o processo digital aparentemente separou o design tipográfico do mundo físico, o passado ainda se acha presente nos formatos de letra.” (DESIGN MUSEUM,2011,p.32).

O redesign de tipos antigos e o resgate de elementos históricos são métodos de criação recorrentes para o projeto de novos tipos digitais. No início desse trabalho a dupla adotou o resgate histórico como ponto de partida para a desenvolvimento de tipos para texto. 7


Os livros e os documentos contemporâneos são em sua maioria produzidos com tipos novos, criados já no meio digital, ou com revivals de tipos clássicos. Além disso, vários desses tipos clássicos sofreram revivals anteriores por outros designers, adaptando-os para novas tecnologias. Por impossibilidade de acesso a matrizes tipográficas e muito menos desenhos originais, foi realizada uma procura por amostras impressas com tipos de metal. Desse modo se tornava possível uma consulta contínua durante todo o projeto. Os principais itens selecionados foram datados como sendo da primeira metade do século XX. Entre eles, a Bíblia Sagrada húngara, de 1914, foi eleita como base para o trabalho.

1.3 Pesquisa 1.3.1 Bíblia Antes do trabalho tipográfico propriamente dito ser iniciado, foi realizada uma pesquisa sobre esta Bíblia particular. Algumas das informações contidas foram traduzidas com auxílio de tradutores de idiomas digitais e co-relacionadas com resultados encontrados em enciclopédias eletrônicas. Acervos digitais sobre tipografias e editoras se mostraram muito úteis, não só pelas informações tipográficas, mas também para exclarecer o contexto político-cultural na qual foi produzida. A Bíblia é um livro sagrado onde estão reunidos cartas e textos importantes para os cristãos. Esta em particular foi editada com os textos da Bíblia do Rei Jaime, traduzidos para o húngaro por Gáspar Károli. Ele foi pastor calvinista e autor da primeira bíblia completa no idioma húngaro, também conhecida como Bíblia de Vizsoly (1590).

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Bíblia Sagrada húngara, 1914.

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Essa edição foi distribuída em Budapeste em 1914 pela Sociedade Bíblica Britânica, porém foi impressa em Leipzig pela Poeschel Treptenél. 1.3.2 Pesquisa tipográfica O ponto de partida para a idetificação dos tipos usados foi descobrir um pouco mais sobre onde e como o livro foi impresso. O proprietário da Poeschel Treptenél era Carl Ernst Poeschel (1874-1944), impressor, tipógrafo e editor alemão. Em 1898, ele viajou durante dois anos, os Estados Unidos, para atender a impressão e publicação local. Desde esta estadia no exterior, ele usou a grafia “Poeschel” em vez de “Pöschel”. Em 1906, se tornou co-proprietário, gerente geral e diretor de arte. Em uma viagem para a Inglaterra em 1904, ele se encontrou com Edward Johnston, Douglas Cockerell, Eric Gill e Emery Walker alguns dos mais importantes representantes das artes inglesas. Durante o período em que a Bíblia estava em produção, a Poeschel imprimiu livros para a Insel Verlag (editora Insel) com os tipos da Imprensa Cranach, de Weimar. E isto não foi por acaso. O Conde Harry Graf Kessler, ativo diplomata e patrono das artes, começou a publicar livros com belas composições e ilustrações em 1904. No início ele cooperava com a Insel Verlag para publicações de seus livros, mas em 1913 fundou a Cranach, sendo ele mesmo o diretor. O já citado Edward Johnston (mestre e amigo de Eric Gill e Jan Tschichold) desenvolveu tipos para a Cranach a partir de 1910. Hamlet Type, 1912-1927, para uma suntuosa edição de Hamlet, de Shakespeare. A Imprint Antiqua, 1913, foi outra tipografia significativa. Criada originalmente para a revista The Imprint, da Monotype inglesa, já era em si um rivival dos tipos Old Face, inspirada particularmente na Caslon. 10


Deduz-se que, pelos contatos que Poeschel teve na Inglaterra e a compra dos tipos usados pela Cranach, provavelmente algumas das tipografias encontradas na Bíblia húngara estudada podem ter sido projetados por Edward Johnston e seus assistentes.

Primeira edição da revista The Imprint (1913).

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Foi identificado uma grande variedade de estilos tipos e tamanhos nas páginas da Bíblia. Tipografias displays, capitulares slab serifs, subtítulos em itálico, texto corrido com variacão de peso e acabamento, entre muitos outros. Como opção de trabalho selecionamos os tipos mais recorrentes e os utilizados em massas de texto.

Uma das páginas selecionadas da Bíblia para estudo. 12


2. Processo O primeiro passo foi selecionar nas amostras impressas os tipos para trabalho. O romano usado no texto foi uma escolha natural de acordo com a premissa do projeto. Em adição, a dupla selecionou outra tipografia para explorar a combinação entre os estilos. O itálico dos subtítulos foi eleito como a segunda tipografia de trabalho, usando como parâmetro os primeiros níveis de combinação de tipos explorados na história da tipografia. Com esse recorte de trabalho definido, cada integrante selecionou um estilo para trabalhar. Milena Melguiso com a romana e Érico Lebedenco com a itálica. As etapas de trabalho comuns aos dois foram: digitalizar algumas páginas da Bíblia e selecionar as melhores amostras; desenvolver uma análise anatômica das letras identificando características estético-formais; com base nessas características, procurar por tipografias conhecidas na tentativa de identificar os tipos usados; se utilizar da pesquisa histórica do livro para delimitar o número de possibilidades; separar fontes digitais dos tipos identificados e type specimens para consulta durante o processo; com os originais digitalizados e as referências estéticas delimitadas, se inicia o processo de desenho das letras no computador; em seguida o desenvolvimento da fonte digital; e por fim testes de impressão e ajustes de acabamento. Como o objeto de trabalho está em húngaro, algumas letras como W e Y não foram encontradas, assim como diacríticos comuns aos idiomas de origem latina. Nesse caso as referências selecionadas servem como guia para o desenho. Em casos de divergência muito grande entre a amostra selecionda e a referência, o parâmetro adotado para o desenho foi seguir a amostra original impressa o mais fiel possível. 13


Detalhe do romano de texto.

Detalhe da itĂĄlica dos subtĂ­tulos.

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Vale ressaltar que o processo de impressão por tipos de metal causa deformidades no papel, que no caso da Bíblia é fino com baixa gramatura, além de uma grande variação de contorno nas letras, devido ao espalhamento de tinta, acúmulo nas junções ou falha de entintamento. Tradicionalmente o desenho original dos caracteres é feito levando-se em conta essas deformidades no resultado final do impresso. No caso em questão se percebe uma variação grande dos contornos por causa dessas imperfeições. Foi uma escolha da dupla descartar a estética do ruído, as falha e irregulardades reconhecidas, para tentar alcançar o desenho limpo das letras. Por falta de material e informações não é possível dizer que esse projeto é um revival completamente fiel aos tipos usados na Bíblia. Durante o processo de desenho foram identificadas carcaterísticas muito particulares que não batiam com as referências selecionadas. Os motivos para isso podem ser vários: equívoco ou falta de informacão para identificar perfeitamente os tipos usados, variações estilísticas existentes nos tipos de metal não foram transpostos para as fontes digitais, substituição por letras de outra família durante a montagem da página, entre muitos outros. Além disso, é necessário informar que durante o processo de trabalho foi confirmado as suspeitas de que o romano e o itálico usados no livro não pertencem a mesma família tipográfica. Por isso, foi feito um esforço para aproximar um pouco as características dos desenhos de ambos. O resultado permite a combinação das duas tipografias de maneira satisfatória. Mesmo assim ainda é necessário trabalhar mais a harmonia de suas formas.

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2.1 Gaspar Roman As imagens digitalizadas foram comparadas e as letras selecionandas pela sequência facilitadora de construção. Para cada letra eram selecionados em torno de 3 a 5 formas impressas para se achar um meio termo comum a todas. Algo que representasse melhor a relação entre o metal e o impresso. Em seguida se iniciou o trabalho de vetorização

Muitas letras indicavam uma racionalização das formas e forte contraste, porém em letras como “a”, “o”, “r” e “g” era identificado um eixo inclinado. Essa romana carregava um conjunto de elementos que a classificavam como uma transicional. Das pesquisa realizadas, de fato a Imprint de Edward Johnston se mostrou a tipografia mais próxima da qual foi usada na Bíblia. Porém detalhes da estrutura de algumas letras e acabamento continuavam não batendo. No primeiro teste de comparação com a italica, não se formava um conjunto, e foi necessário que decidir um caminho, duas tipografias cada uma com um peso ou a

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equalização das formas para que formassem uma familia só. A escolha foi feita visando a união em uma mesma família e o rocesso de criação da Gáspar se fortaleceu. Com algumas das principais letras ajustadas e combinando mais seu peso regular com a itálica, o trabalho de vetorização continuou no Illustrator e os ajustes finos de proporções e metricas no FontLab. Nos testes seguintes alguns ajustes se fizeram necessários, como a padronização de tamanhos das serifas e aumento dos traços verticais. As adaptações de letras não existentes no original foram supridas com a comparação da Imprint e uso de conhecimentos básicos para desenho de letras. Chegou-se a um alfabeto latino de minusculas, parte das maiusculas e numerais. Formando o conjunto que se precisava para reproduzir um trecho selecionado do livro.

2.2 Gaspar Italic Como as letras itálicas aparecem em menor quantidade, a digitalização foi feita em partes buscando a maior recorrência possível. Em alguns casos era possível identificar uma letra (maiúscula, principalmente) apenas uma vez. Para facilitar o controle foi feito uma tabela indicativa de quais letras foram encontradas e quais não foram. Esta tabela foi preenchida com a localização de cada letra selecionada. No caso, as letras como W, X e Q não são usadas no idioma hungaro e foram desenhadas com base nas referências.

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A pesquisa do histórico do livro não auxiliou o suficiente em relação aos tipos itálicos usados. As letras se mostram muito modeladas e verdadeiramente racionais, com eixo vertical e contraste exagerado nos traços. As características transicionais existentes na Imprint, herdadas da Caslon, foram descartadas em relação a itálica. Neste caso a análise anatômica se mostrou mais eficiente. A similaridade com os tipos projetados por Giambattista Bodoni eram muito grandes. Consultando o Manuale Tipografico contendo specimens de suas tipografias, é possível constatar várias similaridades com os tipos indicados como Canoncino Rovigo e Sinigaglia.

Páginas selecionadas do Manuale Tipografico, de Bodoni. 18


Infelizmente os specimens de Bodoni são incompletos, exibindo apenas algumas combinações de letras, fazendo com que não se tenha 100% de certeza na identificação dos tipos usados. Das versões digitais encontradas, as variações Bauer Bodoni são as mais próximas. Contudo, mesmo elas possuem divergências signifcativas quanto ao acabamento e os traços de transição (iniciais e terminais que remetem ao movimento da ferramente de escrita cursiva). Isso é facilmente identificável no “i”.

Letras “i”, da esquerda para a direita, retirada das amostras, retirada do Manuale e captura de tela da Bauer Bodoni Italic da Linotype.

As primeiras letras desenhadas foram os caracteres de controle “n” e “o” para as minúsculas, e “H” e “O”para as maiúsculas. As amostras digitalizadas foram importadas para o software TypeTool, uma versão mais econômica do software de edição de fontes FontLab, e vetorizadas diretamente nele.

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Para um melhor aproveitamento de tempo no processo de criação da fonte digital, o espaçamento era ajustado a cada letra nova desenhada. De tempos em tempos a realização de testes impressos com impressora digital de tonner e inkjet serviam principalmente para identificar desequilíbrios de contraste e excesso de “cor” nas junções dos traços. As letras foram desenvolvidas basicamente com análises comparativas entre o redesenho das amostras impressas, os specimens do Manuale e as formas itálicas de fontes digitais. Sendo que as amostras impressas eram prioridade em relação a construção principal da letra.

Teste de métricas com pangrama.

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3. Tipografias em uso Após o processo de redesenho e ajustes das formas novas, foi reconstruída uma amostra da Bíblia utilizando os tipos desenvolvidos. Percebe-se que nos originais as letras têm maior peso visual por causa da deformação causada pela expansão da tinta no papel, devido ao processo de impressão com tipos de metal. O acúmulo de tinta nas incisões fortalesse esse ganho de área em várias letras. Nos tipos novos, ao contrário do identificado na amostra original, as letras maiúsculas se apresentam em harmonia com as minúsculas e o ritmo de leitura é mais confortável.

Trecho selecionado para teste e reconstrução com os tipos novos.

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4. Referências BRINGHURST, R. Elementos do estilo tipográfico. Tradução André Stolarski. São Paulo: Cosac Naify, 2005. Henestrosa, Cristóbal.,MESEGUER, Laura., SCAGLIONE, José., Cómo crear tipografías. Madrid: Tipo e Editorial, 2012. BUGGY. O MECOtipo: Método de ensino de desenho coletivo de caracteres tipográficos. Recife: Buggy, 2007. FRUTIGER, Adrian. Sinais e símbolos: desenho, projeto e significado. Tradução Karina Jannini. São Paulo:1999 BODONI, Giambatista. Manuale Tipografico. <http://bibliotecabodoni.net/libro/manuale-tipografico-1> Como criar em Tipografia/Design Museum. Tradução Elisa Nazarian. Belo Horizonte: Editora Gutenberg, 2011. Poeschel Treptenél (oficina tipográfica) - Leipzig <http://de.wikipedia.org/wiki/Carl_Ernst_Poeschel> Conde Harry Graf Kessler < http://en.wikipedia.org/wiki/Harry_Graf_Kessler> Tipografia Imprint <http://en.wikipedia.org/wiki/Imprint_%28typeface%29> Consulta de fontes digitais MyFonts <http://www.myfonts.com/fonts/mti/imprint> Edward Johnston <http://fr.wikipedia.org/wiki/Edward_Johnston> The Imprint Magazine < http://www.mccunecollection.org/pdf/The%20Imprint%201%20%28Jan%201913%29.pdf>

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