e-metropolis #18

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artigos

ensaio

Pedro Paulo Bastos

Praça Saens Peña,

entre a urgência e a quietude

S

endo um dos subcentros mais tradicionais da cidade do Rio de Janeiro, a Praça Saens Peña é uma região pulsante. Logo nas primeiras horas após o despertar da alvorada, quando os raios solares já estão incidindo sobre os seus prédios e calçadas, um amontoado de ônibus e automóveis vai tentando se enfileirar na pista sentido Centro da rua Conde de Bonfim, a principal via comercial da Tijuca, bairro onde se localiza a Praça Saens Peña. Ou melhor dizendo: “a Praça”, como é usualmente referida pelos vaidosos moradores dali, os tijucanos. Num dia comum de labuta, em meio a tantos outros transeuntes que circulam por essa região, muitos desses tijucanos rumam afoitos à estação do metrô ou aos pontos de ônibus. Isso acontece ao mesmo tempo em que a faixa de pedestre, no primeiro indício

de um sinal vermelho, recebe uma leva de pisadelas que só cessa quando o motorista, alvoroçado ao deparar com seu sinal verde de volta, dá uma buzinada e ameaça invadir aquele espaço de tiras horizontais brancas. Numa fração de segundos, tais tiras já estarão sob aqueles pneus, sem mais pedestre algum para “atrapalhar” o tráfego dos automóveis. E quanto a esse pedestre, pode ser que ele abandone a rua e resolva adentrar a Praça. Se o fizer, certamente estará cruzando o limiar entre a urgência e a quietude – do corpo, do espírito, do espaço. Deixa de lado o posto de pedestre para transformar-se num passeador. No cenário visto a partir de então, esse passeador avistará pessoas resfolgadas em bancos verdes de madeira com um jornal ou livro sobre os palmos das

mãos. Perceberá, ainda, que tais pessoas são imperturbáveis, a não ser pelo ruído da pirueta dum certo peixinho que nada naquele lago artificial ou pelo incômodo causado diante do inconsolável mendigo que roga por esmolas. Ali, no interior da Praça Saens Peña, esse passeador descobrirá também que só quem se presta à movimentação contínua dos braços e das pernas, de modo a exercitá-los, são os ginastas da terceira idade. Ou então aquelas poucas crianças que saltam e correm ao longo do playground perante o olhar atento dos seus responsáveis. E, por fim, a alguns metros de altura, o passeador poderá contemplar os pombos que repousam sobre os postes e fiações da Praça – na verdade, singelos espectadores daquele mundo babélico que a ronda, um mundo completamente sem barreiras, absolutamente permeável.

nº 18 ▪ ano 5 | setembro de 2014 ▪ e-metropolis

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