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Érica Neiva “As barragens são monitoradas por uma espécie de pronto-socorro, semelhante ao que estamos acostumados nos hospitais. Mas os profissionais que entram em ação, ao contrário de médicos e enfermeiros, são especialistas em solo, concreto e sismos”, explica o engenheiro civil da área de instrumentação de auscultação e segurança de barragens, Ruben José Ramos Cardia. Assim como a medicina passa por intensas descobertas com a evolução tecnológica, o mesmo acontece na área de segurança de barragens. No Brasil, o uso de inovações tecnológicas nessa área encontra obstáculos, sobretudo devido aos altos custos. “Tomamos conhecimento de inovações, mas nem sempre conseguimos implementá-lo devido ao custo e dificuldade de importação de equipamentos”, afirma Cardia. Entre as inovações, Cardia (abaixo), cita o uso da fibra ótica nas barragens do Rio Iguaçu para medida de temperatura e controle da segurança. As barragens fazem parte do Complexo Energético Fundão Santa Clara, consórcio da Companhia Paranaense de Energia - Copel. Um exemplo de tecnologia ainda pouco encontrada no País são os usos de dispositivos sem fios, tecnologia wi-fire, para substituir o trabalho com o piezômetro, equipamento selado no interior do subsolo para responder à variação da pressão. Em vez de carregar um cabo de 50 metros é usado um equipamento mais leve e portátil. Na fase de projeto de uma barragem há o desenvolvimento de várias tecnologias na área de metodologia de cálculos por meio da evolução de softwares e de equipamentos de hardware capazes de prever comportamentos futuros como deslocamentos, tensões e temperaturas, facilitando a construção e possibilitando

economia sem prejuízo da segurança. Outro segmento de segurança de barragens no qual acontecem inovações periódicas é a área de concreto. As melhorias envolvem, sobretudo, a composição química, a exemplo de aditivos nos cimentos que vêm melhorando a qualidade da área construtiva. Para o engenheiro civil da área de concreto, Selmo Chapira (ao lado), “nesse âmbito estão ocorrendo muitas inovações graças ao suporte dos programas de P&D que as empresas têm adotado. Infelizmente, isso só ocorre com as empresas de geração e distribuição de energia elétrica. Seria bom que o mesmo ocorresse com as empresas de abastecimento de água e irrigação, que estão sob responsabilidade da Agência Nacional de Águas – ANA”. Algumas técnicas usadas no exterior e que ficam caras quando chegam ao Brasil, são passíveis de serem reproduzidas no País, graças aos investimentos em P&D. “As técnicas são ‘tropicalizadas’, ou seja, são desenvolvidos produtos nacionais similares aos estrangeiros, mas com preços menores, além do diferencial da facilidade de técnicas de reparos por se tratar de produtos nacionais”, diz Chapira. O consultor considera importante que a Aneel fiscalize a execução dos projetos de P&D e exija o investimento em P&D não só das grandes empresas, mas dos investidores e proprietários de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs). “As empresas maiores têm um orçamento que possibilita o investimento em pesquisa. Os proprietários de PCHs muitas vezes não possuem um faturamento capaz de realizar projetos, mas podem formar consórcios que invistam em pesquisa e desenvolvimento e beneficiem a sociedade”. Em relação à sua experiência de consultoria na Eletrobras Eletronorte e sobre a evolução dos usos das tecnologias na Empresa, Chapira declara: “Participei do projeto de construção e

Eletronorte

é ± 600 kV. “No entanto, as características da China e do Brasil são muito diferentes. Podemos trabalhar em conjunto, mas devemos ter nossas próprias soluções no tocante tanto a linhas de transmissão quanto a equipamentos para geração e para subestações”, afirma. Para Fernandez, a Amazônia poderá ensejar alternativas muito atrativas de expansão da transmissão com o emprego da tecnologia de UAT, seja em corrente alternada ou em corrente contínua. “O emprego da tecnologia de UAT é interessante sob os pontos de vista técnico, econômico e ambiental, já que a supressão da vegetação é significativamente menor que nas tecnologias de transmissão convencionais, quando considerado o transporte de uma mesma quantidade elevada de potência”, afirma. Ele avalia ainda que o Brasil pode se beneficiar de uma cooperação técnica nesse campo de conhecimento. “A China está interessada em uma cooperação técnica com o Brasil na tecnologia de transmissão não convencional chamada de “meia onda +”, uma linha de transmissão em corrente alternada com cerca de 2,5 mil km ponto a ponto, o que é impossível de se conseguir com a tecnologia convencional de transmissão em corrente alternada em extra alta tensão – até 800 kV, ou mesmo em UAT acima de 1.000 kV. No Seminário foram discutidos ainda os chamados sistemas hexafásicos, constituídos de seis fases derivadas do sistema trifásico existente, para ensejar maior possibilidade de compactação e consequente redução de custos; a aplicação de supercondutividade na transmissão de energia elétrica (não aplicável a grandes distâncias, mas para zonas de alta urbanização e de alto custo do terreno); e a transmissão em corrente contínua utilizando a tecnologia não convencional VSC (Voltage Source Converter). Embora essa última tecnologia já esteja disponível no mercado mundial, apresenta ainda custos mais elevados e maiores perdas por efeito Joule. Mas as “Alternativas Não-Convencionais para a Transmissão de Energia Elétrica em Longas Distâncias” não param por aí. Durante o Seminário também foram apresentados estudos sobre o armazenamento de energia elétrica sob a forma de gás hidrogênio, a partir de utilização de energia de vertimento do SIN em plantas de eletrólise para produção, armazenamento e transporte de gás hidrogênio, para posterior utilização em células combustíveis, produzindo novamente eletricidade. Apesar de tecnicamente viável, a tecnologia ainda tem um custo muito elevado. Foto: Jorge Coelho/Eletrobras

Em abril de 2011 a Eletrobras e a estatal chinesa State Grid assinaram memorando de entendimento para compartilhar experiências gerenciais, técnicas e comerciais em transmissão e geração de energia. A ideia é que a Eletrobras ganhe acesso à tecnologia de transmissão de ultra-alta tensão, dominada pela chinesa, e prevê a possibilidade de atrair investimentos externos para seus projetos. Para o assessor da Presidência da Eletrobras, Paulo César Fernandez (foto), o seminário “Alternativas Não-Convencionais para a Transmissão de Energia Elétrica em Longas Distâncias”, realizado em fevereiro de 2011, na Universidade de Brasília, como parte de um projeto de P&D institucional da Aneel coordenado pela Eletrobras Eletronorte, mostrou que, atualmente, a potência instalada em todo o sistema elétrico chinês é nove vezes a potência instalada no Brasil: cerca de 980 GW, contra os 115 GW brasileiros. Tal número precisaria dobrar até 2020. Isso significa colocar em funcionamento, a cada ano, uma capacidade instalada praticamente igual à capacidade total de geração existente no Sistema Interligado Nacional - SIN. O grande potencial hidrelétrico a ser explorado na China está na região sudoeste, onde ficam as cadeias de montanhas da cordilheira do Himalaia. “Em função dessas características territoriais e da necessidade de grande crescimento da capacidade instalada a taxas anuais muito elevadas, não há alternativa para a expansão do sistema de transmissão chinês a não ser a utilização das novas tecnologias de UAT em corrente alternada – acima de 1.000 kV – ou em corrente contínua – igual ou acima de 800 kV. Isso porque essas tecnologias têm uma capacidade significativamente maior para transmitir grandes blocos de potência a longas distâncias do que as alternativas convencionais de transmissão”, explica Fernandez, em artigo publicado logo após o seminário. Para Fernando Chaves Dart, pesquisador do Cepel, (ver matéria principal), a troca de experiência entre equipes é, sem dúvida, uma boa alternativa para encurtar etapas de desenvolvimento. “Hoje os nossos desafios são únicos, mas pode-se trabalhar em conjunto”. Segundo ele, a China possui quatro laboratórios de UAT em operação: um de corrente alternada, um de corrente contínua, um de ensaios mecânicos e um para avaliar o efeito de grandes altitudes no Tibet. Possuem ainda uma linha de transmissão de 1.000 kV, duas linhas de ± 800 kV em operação e planejam ainda desenvolver linhas de corrente contínua em ± 1.000 kV. No Brasil, desde a década de 1980, a maior tensão em corrente alternada em operação é 765 kV e em corrente contínua

Geração

Tecnologias modernas e tradicionais se unem para uma melhor segurança das barragens

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Transmissão a longas distâncias: os desafios da parceria Brasil - China

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