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JORNAL EXPERIMENTAL DO CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL DA UNISC - SANTA CRUZ DO SUL VOLUME 16 - nº 4 /DEZEMBRO 2011


EDITORIAL

CRÔNICA

Um jornal compromissado

A dor do outro CRISTIANE LAUTERT SOARES

Quando o assunto é formação em jornalismo, poucas etapas são tão importantes, a quem aprende e a quem ensina, que a experiência-laboratório; que o fazer jornalístico ainda durante a instância de formação. São muitos os motivos para que isso seja dessa forma. Vejamos cinco deles. (Há mais, mas estes já se prestam a nossos propósitos). 1 À medida que o estudante pode aplicar, na prática, os conhecimentos que adquire ao longo de sua formação, aula após aula, ele não apenas exercita conhecimentos adquiridos como amplia as possibilidades destes mesmos conhecimentos se realizarem com mais propriedade. 2 Quando as possibilidades de aplicação do conhecimento adquirido são amplas, iniciando-se na pauta, passando pela produção e culminando na distribuição do jornal já impresso, os jovens aprendizes chegarão ao mercado de trabalho com uma visão no mínimo diferenciada quando o assunto é conhecer o processo em que estarão inseridos em breve. 3 Fazer jornal-laboratório implica, para além dos aspectos de circulação e de produção, questões de natureza organizacional. Ou seja, aprender a trabalhar, de um lado, em equipe, de forma colaborativa, enquanto que, de outro, por meio de

funções delegadas (repórter, editor, subeditor, editor de fotografia etc.). Exatamente da forma que ocorre em uma redação de jornal, por exemplo. 4 Há de se considerar, ainda, a possibilidade de se exercitar, desde a instância formação, a capacidade de se escrever das mais diversas formas, dentro do horizonte técnico do jornalismo, claro, e não apenas por meio de formatos canônicos, presos a este ou aquele padrão em vigência no momento. Por meio de gêneros da categoria diversional, por exemplo, e não apesar os de matiz informativo ou opinativo, para citarmos alguns. 5 O quinto e último item é de natureza ética. Ou seja, ligado aos valores e cuidados que se deve observar para que a prática de jornalismo-laboratório sirva também para que os jovens jornalistas exercitem desde cedo os preceitos éticos e morais que norteiam a profissão, incitando-os a refletir desde já sobre respeito humano, por exemplo. É por essas e outras que afirmamos, com muita convicção, que o Unicom representa, a quem ensina e a quem aprende, muito mais que um jornal-laboratório: trata-se de um jornal extremamente compromissado com formação ética e de qualidade, objetivo final de todos nós. Uma boa leitura a todos.

O sol visitava, envergonhado, a manhã da Capital Nacional do Chimarrão. Era um dia gelado. Os que se atreviam ou precisavam sair à rua – meu caso – estavam tão intimidados pelo frio quanto o sol. Só a dor parecia não se importar com as condições climáticas. A dor não respeita o frio. A dor não escolhe a quem atinge. E foi nesse dia que a dor visitou um desconhecido - desses, que estão perto de mim todos os dias -, e que não conheço por indiferença disfarçada de falta de tempo. Enquanto esperava pelo horário do próximo compromisso – e eis a ironia da “falta de tempo” -, em vez de procurar refúgio ao sol, visitei a Igreja Matriz São Sebastião Mártir, em Venâncio Aires. Não frequento igrejas católicas, mas gosto - sempre que tenho a oportunidade - de observar a riqueza arquitetônica, os vitrais, os afrescos. Fico atenta ao silêncio ou às rezas repetidas em sussurros. O templo estava vazio. Sentei-me. Observei. Silêncio. Ouvi passos. Ouvi choro. Um pranto doído. Partilhei a dor em silêncio. Para a mulher que chorava, o calor daquele dia frio resumia-se às lágrimas quentes que deslizavam pelo rosto, ou ao calor da fé. Não sei dizer. Entrei em conflito: um abraço ajudaria? E se ela estiver rezando? Talvez eu fosse atrapalhar. Talvez um abraço fosse exatamente o que ela esperava. Contrariando a falta de tempo na qual sempre me apoio, esperei. Ondas de choro ecoavam baixinho pela catedral. Doía em mim e eu ao menos sabia a razão pela qual me importava tanto. Ver alguém chorar sem conhecer o motivo sempre faz com que eu levante várias hipóteses. Mais do que isso: deixa-me impotente.

Eu não sei da dor do outro. Sei da minha. E a minha dor doía com a dor do outro. Às vezes, a dor alheia é mais nossa do que imaginamos. Os minutos se arrastavam e eu não conseguia dar cabo ao conflito interno. Ela saiu, devagar. Remoí algum tempo sobre o que havia acontecido. Resolvi sair ao sol e tocar em frente os planos para o dia - faria uma entrevista com um médico, em poucos minutos. Ela ainda chorava, sentada à escadaria da igreja. Passei por ela e caminhei mais alguns passos. Senti o ar frio da manhã invadir os pulmões. Senti o aperto na garganta e segurei com força – como se resolvesse - a agenda que estava em minhas mãos. Se a primeira oportunidade de fazer o que gostaria que me fizessem havia passado, eu estava a ponto de colocar a segunda no lixo. Mas o impulso, assim como a dor, também não pede licença. Quando dei por mim, caminhava na direção da moça. Engraçado como o abraço não tem medo do frio. Nem da dor. É espantoso como um abraço prevê outro abraço, sem que seja preciso anunciá-lo. Abracei. Percebi que chorava e que as palavras eram desnecessárias. Fiquei ali, calei. Às vezes, a dor alheia é mais nossa do que imaginamos. Despedi-me. - Fique firme. Deus pode mudar qualquer quadro – disse. Ela balançou a cabeça. - Muito obrigada pelo teu abraço. Significou muito - disse, entre lágrimas, a mulher cujo nome e motivo da dor desconheço, mas que, indubitavelmente, faz parte da minha história. Sentir compaixão é indício de que se está vivo por dentro.

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Como desenvolvemos a nova logomarca do Unicom A partir da proposta surgida em aula de criarmos uma nova logomarca para representar o Unicom, conduzimos nosso raciocínio a partir de “palavras-chave” como notícia, interação, comunicação, criação, seriedade, Santa Cruz do Sul, entre outras. A intenção foi desenvolver uma marca que transmitisse o conceito de seriedade, porém sem ser monótono. 1 - Primeiramente esta possuia o globo, porém lembrava outras identidades do mesmo seguimento, perdendo desta maneira sua essência. 2 - Então, entre rabiscos e rabiscos, desenvolvemos uma segunda opção para tentar melhorar a primeira, mas ainda não era o bastante... Surge a idéia de nos utilizarmos do quero-quero na marca, à medida que este pássaro é muito comum na Unisc. Sendo assim, ele se torna parte de tudo. 3 - Mais rabiscos e idéias surgiram até que encontramos uma solução adequada e desenvolvemos, enfim, a logomarca do Unicom.

ALESSANDRA ANGONESE EDITORA GRÁFICA

DUDU PEITER SUBEDITOR GRÁFICO

EXPEDIENTE UNISC – Universidade de Santa Cruz do Sul Av. Independência, 2293 - Bairro Universitário Santa Cruz do Sul – RS CEP 96815-900

Grafocem

Curso de Comunicação Social - Jornalismo Bloco 15 – Sala 1506 Telefone: 51 3717-7383

Charge Pedro Dreyer

Coordenadora do curso Fabiana Piccinin Tiragem 500 exemplares Impressão

DISTRIBUIÇÃO GRATUITA Capa Alessandra Angonese e Dudu Peiter

Crônica Cristiane Lautert Soares Editor-chefe Demétrio Soster Editora Jaqueline Gomes

Sub-editora Marília Gehrke Editora multimídia Michelli Julich Editora de vídeo Maiara Halmenschlager Sub-editor de vídeo Lucas Baumhardt Editora de fotografia Lisane Marques Diagramação Alessandra Angonese Dudu Peiter

Repórteres Cristiane Inocêncio Daiane Kalsing Deka Bueno Danielle Rubim Geferson Kern Jeniffer Gularte Joana Scherer Raisa Machado Vanessa Behling Este Jornal foi produzido na disciplina de Produção em Mídia Impressa, ministrada pelo professor Demétrio Soster. Colaboração de alunos de outras disciplinas na produção de crônica e charge.

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Em busca do sucesso e da glória no futebol Categorias de base se tornam porta de entrada do mundo sonhado por muitos meninos do interior do Estado

VANESSA BEHLING PRODUTORA E REPÓRTER REPORTAGEM E FOTOGRAFIA

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A maioria dos garotos que desejam jogar futebol passam por dificuldades ao longo de sua jornada em busca do grande sonho: o de ser um jogador reconhecido. Porém, muitos meninos que certamente seriam excelentes profissionais desistem no meio do caminho. Todo ano os maiores clubes do estado, Grêmio e Internacional de Porto Alegre e Juventude de Caxias são procurados por centenas de pais ou responsáveis, por professores de escolinhas de categorias de base do interior, em busca de uma chance para o filho ou aluno. Antes disso, já passaram ou estão nas chamadas categorias de base de clubes menores ou mesmo em simples escolinhas - os centros de formação de atletas que cobram mensalidades e prometem desenvolver a aptidão da criança. Em Venâncio Aires, o Centro de Formação de Atletas Noca, instalada no Bairro Aviação, conta atualmente com 123 meninos divididos em seis categorias que vem se consolidando na região como uma porta para o futuro. Instalada há 16 anos no município, já levou meninos da cidade para os sonhados Grêmio

e Inter e até para fora do Estado. Os trabalhos com os meninos iniciam cedo. Para o coordenador técnico do Noca, Fabiano Martins dos Santos, o trabalho com os meninos precisa ser gradativo. “No início, trabalhamos dos cinco aos nove anos. É a chamada categoria de iniciação, que é aquela que não se tem muita cobrança, até pra não frustrá-los, porque sempre tem aquele que joga mais, aquele com mais postura física, aquele que vai correr uma hora de treino e o outro aos 15 minutos já pede pra tomar água. Então sempre precisamos do meio termo e precisa-se saber dosar isso”, enfatiza. O esporte passa a ser utilizado, em alguns casos, para atender as ambições de técnico, bem como as ansiedades de pais, que submetem crianças a terríveis pressões. Grande parte dos pais, ainda que bem intencionados colocam os filhos no esporte e fomentam o sonho de que sejam os atletas que eles nunca foram ou coisa parecida. Alguns acham que o filho tem mesmo um dom, crêem que isso os diferencia dos outros e esperam que os levem ao esporte profissional,

como salienta o coordenador técnico do Noca: “temos bastante seriedade com os meninos, nunca escondemos nada deles, alguns chegam e acham que vão aprender a jogar futebol sem ter nenhuma habilidade, mas somos realistas, claro, tomando todo cuidado para não frustrá-lo. Então nós aqui trabalhamos os meninos. Muitas vezes tem pais que vem aqui e cobram resultados da noite pro dia, mas não é assim que funciona”, destaca. Atualmente, as categorias de base e os próprios centros de formação de atletas tomam cuidado ao lidar com o sonho da criança, para não frustrá-la. Em avaliações técnicas, o Grêmio, por exemplo, adotou a fórmula de evitar dizer na frente de todos quem foi aprovado e quem foi reprovado no teste. O coordenador de avaliação, Renato Schmidt, salienta que da maneira que era feita antes, era uma falta de respeito com a criança. “Quando cheguei no Grêmio foi a primeira coisa que eu proibi: o termo reprovado, pois antes funcionava assim, faziam avaliação de uma semana e depois cerca de 50 meninos sentados na tua frente e se dizia


Joãozinho e Luizinho estão aprovados e demais estão dispensados, boa sorte, futebol é assim e acabou. Eu já passei por isso, já fui dispensado assim e já estive ao lado de alguém com tremenda falta de educação dizer que o fulano está dispensado, então parece que o atleta não serve pra nada, isso o Grêmio não faz mais, pois é uma falta de respeito com a pessoa”, argumenta Schmidt. Para entrar no mercado da bola, atualmente, o famoso QI (quem indica) tem seu valor. O QI é frequente em todas as profissões, porém, no futebol há um exagero: as pessoas mais influentes do mercado futebolístico são as que mais encaminham jovens para grandes clubes, mesmo que eles não sejam tão bons quanto os meninos que não têm condições de bancar um empresário. Muitas crianças também são submetidas a “peneiras” para a seleção da equipe e a seções de treinamento. No Esporte Clube Guarani de Venâncio Aires, o gerente de futebol das categorias de base, Éderson Schwingel, comenta estas formas de ingresso no clube. “É feito uma peneira geral onde participam todos os inscritos. Passa essa etapa,

aí é feito um pré-plantel, no meio deste tem também os indicados de pessoas de conhecimento do futebol de vários lugares do país. Depois, de três a quatro dias ficam em avaliação no clube”, explica Schwingel. Em clubes maiores, como no Grêmio, por exemplo, outras formas são adotadas, como ressalta o coordenador de avaliação do Tricolor. “O Grêmio está aperfeiçoando o trabalho de avaliação. Hoje ela está classificada em três tipos: uma é a captação, que se baseia em algum contato com centros de formação quando então o avaliador fica, durante dois a três dias, acompanhando a desenvoltura dos atletas e observa para fazer a captação. O segundo é o indicado, que é feito por alguém que já trabalha com indicações, conhecedores do que o Grêmio precisa. E a terceira situação são os testes feitos no próprio Grêmio, onde o atleta se inscreve, faz os testes durante uma semana, depois pode ainda ficar num grupo por mais uma semana para uma avaliação mais rígida e depois ficam em observação, na categoria encaminhada, pelo próprio treinador. Se for aprovado já poderá assinar contrato com o clube”, diz Renato Schmidt.

Quem consegue uma chance num clube maior também precisa fazer escolhas, como deixar a família. Foi o que aconteceu com o adolescente venâncio-airense Murilo Xavier, de 15 anos, atualmente meia-armador do Infantil do Criciúma. Ele saiu das categorias de base do Noca, depois foi para o Esporte Clube Guarani, pelo o qual foi indicado em março de 2011 para o Criciúma, onde fez um teste e onde está até hoje se destacando pela habilidade. O jovem está com um pré-contrato assinado com o clube e o sonho cada vez mais perto de se tornar realidade, como enfatiza o próprio pai, Pedro Xavier. “Hoje ele está na categoria infantil, mas no próximo ano já passa para o juvenil. Ele é o batedor oficial do clube, um menino que saiu daqui e está dando certo. Nós, pais, nos preparamos para quando chegasse esse momento dar apoio a ele, pois ele joga desde os seis anos de idade,” conta o pai. Pedro, assim como os demais, vive o sonho do filho, dando base e estrutura àquele que arrancou lágrimas ao deixar cedo o aconchego dos pais. Resta a eles visitá-lo quando possível, torcer por ele dentro de campo e mundo afora.

Nomes que prometem:

Rafael Bittencourt, Endrigo Schlosser, Marcus Vinicius Konzen, Fernando Kauffmann, Douglas Boehn, Lucas Severo.

O Centro de Formação de Atletas NOCA de Venâncio Aires recebe meninos para treinamentos em turno oposto das aulas, onde são divididos em seis categorias de acordo com a idade

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A rainha de uma festa que nunca aconteceu Ela foi eleita soberana da 2ª Festa Estadual do Mel (Femel), em Candelária

MARÍLIA GEHRKE SUBEDITORA E REPÓRTER REPORTAGEM

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O ano de 1994 dificilmente irá sair da memória de Cristina Eliza Butzge por pelo menos três motivos. Ela foi eleita rainha da 2ª Festa Estadual do Mel (Femel), em Candelária, e conheceu todo o Estado ao divulgar o evento juntamente com as princesas Cleidi Mohr e Michelle Oliveira. O detalhe é que a festividade nunca foi realizada. Por isso, Cristina continua soberana há 17 anos. E é lembrada como tal até hoje. Portanto, a condição de rainha da Femel não tem prazo de validade para acabar. Quando Cristina foi coroada, aos 16 anos, conquistar um título de beleza não era exatamente uma novidade. Antes de ser eleita soberana da Femel, ela já havia ganhado o Broto e a Mais Bela Estudante de Candelária, além de Mais Bela Estudante Simpatia RS. Cristina é uma rainha diferente: não tem trono nem castelo. Sua carruagem é a bicicleta de marchas que recebeu como premia-

ção no concurso da Femel. Veículo que, diga-se de passagem, ela guarda até hoje. Além, é claro, dos trajes, das coroas e das faixas que recebeu ao longo de sua trajetória. Hoje com 33 anos, a rainha Cristina ainda se lembra dos detalhes daquela noite que a consagrou soberana da Femel, no ginásio do Colégio Medianeira: a passarela, a decoração com abelhas e o corpo de jurados. Oito candidatas participaram do concurso. Oito almas que desejavam carregar a doçura de ser soberanas do mel, da Festa do Mel. Oito pessoas que jamais previram a não-realização do evento, fato que permanece confuso, porém vivo, na memória de Cristina. “A gente (trio de soberanas) participava de muita coisa na expectativa da nossa festa, que nunca aconteceu. Houve troca de lideranças e a festa foi ficando de lado. Até hoje, muita gente me fala da Femel com tristeza pelo evento não ter saído”, explica a eterna rainha.

O que a conforta é a própria conquista. “Fico triste pela não realização da festa, depois de tanto empenho, mas, ao mesmo tempo, ainda sou lembrada como soberana”, destaca. A festa seria realizada em maio ou junho de 1996. O secretário de Educação, Desporto, Cultura e Turismo da época, Elídio Heinen, explica que a 2ª Femel não chegou a ser realizada devido à falta de verbas da administração municipal e das associações envolvidas na organização do evento. Hoje, a Expocande é responsável por divulgar as potencialidades do município. A liderança na corte da Femel fez com que Cristina pudesse representar Candelária em outras festividades, difundindo a cultura local. A rainha recorda, com carinho, o ritual de colocar o vestido de soberana e fazer o cabelo e a maquiagem para essas visitas. Os trajes das soberanas da Femel, aliás, foram muito comentados na região. Os vestidos tinham


características peculiares que remetiam ao carro-chefe do evento, o mel, e às grandes produtoras, as abelhas. As peças em tons de marrom, mel e bege nos tecidos de veludo e voal foram desenhadas pelo estilista Roberto Raiffone, de Porto Alegre. Renita Dalke, de Santa Cruz do Sul, costurou. A artista Lisete Gewehr, de Candelária, foi a responsável pelas pinturas com flores, abelhas e o brasão do município. A mãe de Cristina, Daguimar Evanir Butzge, bordou os vestidos e os detalhes dos favos de mel. Muitas mãos foram responsáveis pelos trajes, que se destacaram pela sua originalidade. Ao invés de afastá-

-la das passarelas, o título de rainha da festa imaginária abriu novas portas e fez com que Cristina participasse de outros concursos. E vencesse novamente. E fosse conhecida em nível internacional. Papéis, conquistas e perspectivas Cristina interpretou todos os papéis que a vida lhe propôs. Ela conquistou dezenas de títulos de beleza e distinções. Em 1999, foi eleita Musa do Turismo de Candelária, Miss Turismo RS e Miss Turismo Brasil. Na fase internacional – Miss Tourism Of the Planet –, disputada na Grécia, Cristina ficou

entre as cinco finalistas, conquistando o título de Miss Bahias. Ela e sua mãe, que a acompanhou, ficaram no país europeu por 30 dias. “O lugar é lindo. Foi memorável conhecer o berço da Democracia, visitar as ilhas, os templos, Atenas e Esparta”, enfatiza a soberana. Em relação às diversas distinções conquistadas, pelo menos duas têm relação direta com sua cidade natal. Cristina recebeu os troféus Comenda do Botucaraí e Mulher Varonil, como homenagem de Candelária. Não é só de beleza que vive uma rainha. Em 2001, Cristina se formou em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos)

e hoje possui pós-graduação em Direito Civil pela mesma universidade e em Direito, Economia e Ciências Políticas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs). Atualmente, trabalha e reside em Porto Alegre com o filho de 9 meses, Antônio José, e com o companheiro Emerson. Cristina já foi modelo fotográfica e atriz – inclusive protagonista – em curtas gaúchos. Para o futuro, pretende retomar esse trabalho e continuar vivendo bem em família. Também não está descartada a possibilidade de a rainha da 2ª Femel e a família voltarem a Candelária, onde toda a história da eterna soberana começou a ser escrita.

Acervo pessoal/Rute Arcari Fotografias

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O gaúcho e o gaudério No trabalho, o profissional usa calça, camisa e sapato. Fora dele, o homem usa lenço, bombacha e bota

CRISTIANE INOCÊNCIO REPÓRTER REPORTAGEM E FOTOGRAFIA

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Uma conversa marcada por descontração, um bom chimarrão e papos entusiasmados sobre a cultura gaúcha de nosso Estado. Bem sentado no sofá da sala, com as mãos firmes ao apoiar a cuia, Carlos contava histórias sobre o que mais gosta: carrega nos olhos e nas roupas o orgulho pelo tradicionalismo. Carlos Roberto Behm, tem 41 anos, trabalha como vigilante e sempre gostou das tradições gaúchas.O passar dos anos só serviu para amadurecer ainda mais o gaúcho que, quando não está com seu uniforme de trabalho, é um típico homem do Rio Grande do Sul. O orgulho que sente da terra onde nasceu ele carrega nas roupas: “Ser gaúcho é um estado de espírito”, diz, logo de cara. “Eu gosto de demonstrar o orgulho através das vestimentas, acho bonito. Mas ser gaúcho vai além de sair nas ruas vestido, ou usar as roupas na semana farroupilha. “Ser gaúcho vem de dentro”. O homem que, sorridente, entrevisto, chama a atenção para eu não chamá-lo como a maioria dos

meios popularmente se referem aos gaúchos: “Gaudério não é o gaúcho batalhador e de respeito, gaudério é justamente o mau exemplo de gaúcho, aquele que estraga o rodeio quando puxa a faca pra brigar, que não respeita as damas, a ovelha negra entre os demais”, conta ele, mostrando preocupação com o entendimento da imagem do gaúcho. Entre um chimarrão e outro, histórias como a origem do mate, as lutas dos antepassados, os diferentes tipo de lenços e as regras de um rodeio também fazem parte da conversa desse homem que se mostrou conhecedor das tradições gaúchas, juntamente com a esposa que, igualmente, aprecia as histórias e sente orgulho pelo Estado. É ela quem conta que o marido está pilchado até dentro de casa. Sair na rua dessa forma é normal. Foi por meio do rádio, quando criança, que Carlos se tornou apreciador de gostos musicais vindos de ídolos como Os Bertussi, Porca Véia, Os Serranos e Paixão Cortes. Carlos diz respeitar os vários estilos que

tocam atualmente, mas confessa não gostar muito das misturas do “Tchê music” em ambientes gaúchos: “Não pode misturar. Cada um no seu lugar e no seu ambiente. São gaúchos iguais, talvez até mais que muitos de bombacha, mas não podem se dizer representantes”. Destaca que o gosto pela cultura do Estado vem já da infância e diz ser esse o segredo para passar a tradição às futuras gerações. “Tem que ter incentivo da família, mostrar através dos CTG’s, acompanhando as atividades ligadas ao tradicionalismo, como um rodeio, fandangos, lida campeira, não pode deixar a história morrer”, diz. Assim como a cuia do chimarrão que passa de mão em mão fortalecendo os laços de amizade, companheirismo e respeito, a entrevista se estendeu noite adentro. Nessa noite o vigilante de uma empresa de tabaco não precisou trabalhar, quem toma o espaço na sala é o gaúcho, e esse não tira folga. Carlos mostra não só se sentir bem usando as roupas típicas do Rio Grande, como se sente alegre em contar sobre a terra que mais ama.


100 anos é muito pouco para dona Erna Para muitos, a falta de visão e o fato de não andar são grandes obstáculos. Para Erna Auler Hendges, são desafios já superados

DAIANE KALSING SUBEDITORA DE FOTOGRAFIA REPORTAGEM E FOTOGRAFIA

Otimismo. Creio que essa seja a palavra ideal para definir a tataravó Erna Auler Hendges. As palavras e a alegria de viver parecem não combinar com as condições físicas e tampouco com a sua idade. Aos 100 anos, a vida de Erna não foi fácil. Porém, os obstáculos não fizeram com que ela baixasse a cabeça. A rotina de Erna inicia cedo. O primeiro compromisso do dia é tomar chimarrão com a filha. “Ela adora um chimarrão e, dificilmente diz um não”, confessa Glaci. Depois vem o café da manhã e Erna não dispensa uma deliciosa xícara de café com leite. Os poucos momentos em que fica sozinha ocorrem quando a filha executa as tarefas de casa como cortar o pasto, tirar o leite e capinar. Durante esse período, a simpática tataravó escuta músicas, que a faz recordar muitas histórias. “Já dancei muito. Adorava dançar. Agora me contento em ouvir as músicas de bandinha”. A oração serve como forma de proteção para a família, afinal, são sete filhos (três já falecidos), 19 netos, 26 bisnetos e sete tataranetos. Moradora de Arroio Grande, uma

pequena localidade de Arroio do Meio, Erna reside com a filha Glaci, de 60 anos, a qual não mede esforços para cuidar da mãe. Aos 19 anos, a senhora de cabelos brancos e olhos azuis casou-se com Alfredo Hendges e criou os sete filhos em um tempo em que não havia luz elétrica ou água encanada. Há 30 anos perdeu o seu companheiro. Em seguida, dois filhos. Durante esse período também aprendeu a conviver com dificuldades de locomoção, decorrente de uma queda que a levou à cadeira de rodas e, com a cegueira, causadas pela catarata e o glaucoma. A filha explica que a mãe já enxergava pouco, mas depois da cirurgia a situação se agravou e ela teve perda total da visão. Apesar da impossibilidade de andar e enxergar, a vontade de viver ultrapassou esses obstáculos. “Uma das minhas vontades era de poder enxergar minha filha, de poder trabalhar e fazer as coisas que gosto. No início me bateu um desanimo, mas aos poucos fui aprendendo a conviver com a situação”. Apesar das limitações, Erna conti-

nua ajudando em algumas tarefas da cozinha como secar a louça e a descascar batatas. E, apesar da idade, o que surpreende é a sua lucidez. Ela está ciente de tudo que acontece a sua volta. “Deus pode levar tudo de mim, a única coisa que gostaria é que me deixasse lúcida e com boa memória”, enfatiza. Para ela, o segredo para se chegar até essa idade é muito simples: “Basta a gente pensar em coisas boas e viver de forma saudável”. A alegria é marca registrada no semblante de Erna. Sua história de vida certamente é exemplo para muitas pessoas da pequena comunidade de Arroio Grande. Ela é tão querida por todos que frequentemente recebe visitas dos vizinhos e amigos. Prova disso é que uma grande festa de aniversário, organizada pela comunidade, foi realizada no dia 30 de outubro para comemorar o centenário da tataravó. No total, mais de 600 pessoas participaram da comemoração. “Nunca pensei que fosse chegar até nessa idade. É uma alegria muito grande. Tenho vontade de viver muito tempo ainda, para poder fazer companhia para a minha filha”.

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Uma forma ligeiramente diferente de ser Ela tem 18 anos, não sonha com príncipe encantado e leva a vida de uma maneira diferente de muitas meninas da mesma idade. Nicole Boss é garota de programa por escolha e vocação

MAIARA HALMENSCHLAGER EDITORA DE VÍDEO E REPÓRTER REPORTAGEM E FOTOGRAFIA

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Ao invés de esperar pelo “eu te amo” dos homens que não fazem parte da família, ela prefere dar tudo de si, literalmente, para ouvir um gemido de prazer. No lugar do “estou apaixonado por você”, ela se esforça todos os dias para ouvir ao pé do ouvido elogios ao corpo, pelo qual tem imenso carinho e cuidado. Ela prefere substituir de forma muito natural um “eu não vivo sem você” pela frase que resume um pouco da rotina: “dinheiro na mão, calcinha no chão”. Nicolle Boss, como escolheu ser chamada pelo significado que o nome carrega - Nicolle é variável de Nicolau, que significa vitorioso, e Boss serve para que Nicolle possa ser identificada pelos adeptos às práticas “BDSM”, uma expressão sexual que envolve Bondage, Dominação e Submissão, Sadismo e Masoquismo - não sonha, nem se esforça para encontrar o príncipe encantado. Aliás, o que ela espera de um homem na verdade pouco tem a ver com cavalos brancos, castelos e princesas. Nicolle busca despertar em quem a procura os desejos mais reprimidos, as fantasias guardadas no fundo da alma e muita excitação, para que na companhia dela seja possível alcançar todo o prazer que possa resultar de uma relação sexual. A menina que foi convidada a se retirar do Jardim de Infância de uma escola quando tinha cinco anos de idade por dizer em alto e bom som aos colegas que cegonha não existia e que bebês nasciam quando o papai “colocava o pintinho dentro da mamãe” cresceu, completou dezoito anos e se mudou para Santa Cruz do Sul a menos de dois anos por causa da universidade.

Natural de Balneário Camboriú, em Santa Catarina, Nicolle é filha de pai gaúcho e de uma mãe catarinense. Caçula de quatro filhos, os outros três são homens, é a princesinha do papai. No entanto, ao bater lentamente na porta do apartamento no último andar de um prédio, ouço o barulho que o salto do sapato alto faz do lado de dentro. Quando a porta se abre, o que visualizo mostra que apenas aos olhos do pai Nicolle continua sendo uma princesinha. Para os outros, o que se mostra é uma mulher com um rosto de traços fortes e expressivos, que transborda malícia ao mesmo tempo em que esbanja simpatia, um corpo preparado para dar e receber prazer a qualquer momento, modelado dentro de um macacão de ginástica escuro. Os cabelos longos e castanhos estavam soltos. Com um sorriso mais do que receptivo a menina que acabara de chegar da academia depois de horas e horas de esforço e suor, aceitou abrir a sua intimidade e me deixar emergir na sua atmosfera de vida e de trabalho. Nicolle é um exemplo que atua no caminho inverso de onde estão muitas meninas. Ao contrário dela, muitas garotas de programa oferecem o seu corpo em troca de dinheiro para o seu sustento e sonham em sair “desta vida”. Nicolle não só assume o que faz, como diz amar a sua função e ter se preparado muito para exercê-la. Hoje a universitária é garota de programa, concilia duas graduações ao mesmo tempo em que recebe e dá muito prazer aos seus namoradinhos, como decidiu chamar seus clientes sempre que os encontros são marcados

com antecedência. Quando não está trabalhando, está malhando, viajando ou estudando. Apesar de já ter se apaixonado algumas vezes, sem ser correspondida - os amores eram todos platônicos - hoje ela vive para dar carinho e prazer aqueles que lhe querem por perto e que pagam para isso. Ela começou a descobrir a vocação para utilizar seu corpo em nome do prazer que desejava sentir ainda quando era criança. A menina expulsa do Jardim de Infância não se intimidou com o preconceito em relação ao sexo. Como o assunto sempre foi tratado de forma natural dentro de casa, resolveu deixar um pouco de lado os lápis de cor e mergulhar nos livros que falassem sobre o que tanto mexia com a imaginação. Então passou a roubar os livros da biblioteca do pai e a ler páginas e páginas sobre a forma como a Cabala, uma sabedoria que investiga a natureza divina, tratava o sexo e a prostituição. Encantada pelos ensinamentos das palavras, ela decidiu se inteirar ainda mais sobre o que era a profissão milenar. O tempo foi passando e durante a pré-adolescência poucos foram os meninos que despertaram sua atenção. Resolveu então seguir com a teoria, até que encontrasse alguém que pudesse guiá-la no caminho do prazer para que todas as maravilhas descobertas nas páginas dos livros se tornassem realidade. Aos 14 anos, leu sete livros de garotas de programas e de ex-garotas de programas, da literatura nacional e internacional, além de muitos estudos da profissão, matérias, entrevistas e artigos disponíveis.


Com 15 anos de idade, com toda teoria na ponta da língua, queria colocar as lições aprendidas em prática. Decidida a perder a virgindade, que ela enxergava como uma barreira que a impedia de ser feliz, com 15 anos começou a publicar anúncios na internet à procura de algum homem que estivesse disposto a pagar pelo primeiro programa e que conseguisse explicar o porquê de querer ser o primeiro. O melhor cachê e a melhor resposta levariam o prêmio. Porém, por ter apenas 15 anos, o pai descobriu os anúncios da filha e resolveu orientá-la para que tudo fosse feito de forma segura. Ficou decidido que quando ela chegasse aos 18 anos poderia viver fazendo o que mais lhe dava prazer: programas. Enquanto a idade estipulada pelos pais não chegava, a menina continuou próxima dos livros e do assunto que tanto despertava sua atenção. Até uma consultoria com uma ex-garota de programa para entender mais sobre o exercício da profissão o pai pagou para saciar um pouco a curiosidade da filha. Os 18 anos chegaram e, junto com eles, a possibilidade de realizar o grande sonho e também a responsabilidade de decidir para qual curso prestaria vestibular e em que universidade do Brasil concluiria a graduação, afinal estudar é o outro prazer de Nicolle. Por causa da infraestrutura da universidade escolhida, ela se mudou para Santa Cruz do Sul, mas foi no Vale do Taquari, mais especificamente na cidade de Estrela, que Nicolle deu seus primeiros passos na carreira de garota de programa e nunca mais parou. O primeiro a romper o lacre, como ela se diverte ao contar, é cliente assíduo até hoje. Bastou o primeiro programa para que Nicolle Boss tivesse certeza que já tinha escolhido uma das profissões que pretende seguir pelo resto da vida. As outras duas – em graduações que ela prefere não comentar quais são – ela ainda se prepara para seguir no futuro, mas garante que quando se formar vai continuar exercendo as três profissões. Nicolle acredita que as pessoas não nascem com apenas uma vocação. Porém, apesar do apoio dos pais e toda a realização que a profissão traz, Nicolle ainda fica triste com a mentalidade da sociedade, de quem não conhece a história da prostituição e de quem não respeita a ela e as suas colegas. Ela conta que nunca sofreu preconceito de forma agressiva, apenas uma vez um cliente mencionou algumas palavras que a desagradaram. Cliente que ela nunca mais viu.

que ela estipulou para as horas de prazer que passa com os clientes também são surpreendentes. O cachê que será pago pelo serviço, por exemplo, que varia de R$ 200,00 (1 hora) a R$ 1200 (viagem), deve ser depositado antes do programa na lingerie que ela estará vestindo. Dentro desses valores pode rolar beijo na boca, oral com camisinha, vaginal em todas as posições, anal com camisinha e massagem relaxante e tailandesa, inversão (strapon) e biotok. São atendidos homens, mulheres e casais. Com o dinheiro que recebe ela paga as duas faculdades, o aluguel, se mantém em Santa Cruz e consegue levar uma vida confortável. Valores não são negociados. Durante o tempo pelo qual pagou, o cliente pode atingir o orgasmo quantas vezes conseguir. Para controlar o tempo dos programas com os “namoradinhos”, Nicolle desenvolveu uma estratégia sonora e agradável. Ela possui três aparelhos de MP4 que ficam dentro do quarto. Um deles tem uma hora e dez minutos de gravações musicais, o outro, uma hora e vinte minutos e o terceiro, três horas de duração. Esses são os tempos de duração mais freqüentes dos programas. Truque que já era utilizado por Bruna Surfistinha, figura pela qual Nicolle mantém grande admiração, até pelo fato de ter lido todos os livros da ex-garota de programa antes de começar a trabalhar e ter se inspirado muito na colega de profissão. No entanto, ela não gosta de ser comparada, prefere que seja reconhecida pelas lembranças boas que deixa na memória dos clientes. Em menos de um ano que faz programa em Santa Cruz, ela já atendeu cerca de 50 homens. Nicolle não considera esse um número ideal, mas lembra que apesar de parecer pouco o número de clientes, o de programas é bem maior. Isso porque muitos

aconteceram com os mesmos clientes, o que ela chama de “repeteco”. Durante os programas, Nicolle e os clientes conversam sobre tudo, desde carreira profissional até coisas banais do dia a dia. Ela só não gosta de explicar de que forma começou a exercer a profissão, por ser um assunto clichê na prostituição. Nem os cursos que resolveu freqüentar, pois gosta de realizar seus estudos com privacidade. Quando esse tipo de assunto entra na pauta do dia, ela diz tascar um beijo na boca dos acompanhantes para que fiquem ocupados. Se você não estiver disposto a pagar pelas horas de prazer, nem adianta tentar. Nicolle não sai para bate-papos, nem voltinhas. Mas, ao contrário, se você se tornar cliente, não se preocupe ao encontrá-la em um passeio pelas ruas da cidade: ela vai cumprimentá-lo sem problemas, aliás, fato que ela garante ter acontecido várias vezes. Apesar de exalar sexualidade e realização, Nicolle ainda tem outros sonhos a perseguir. Ela pretende ler tudo que conseguir sobre os mais variados assuntos, quer fundar uma biblioteca pública ou uma livraria e fazer todas as graduações que conseguir, claro, sem deixar de lado a função que lhe dá mais prazer, literalmente. Quando perguntada sobre romances, paixões e namoros da forma tradicional, Nicolle abre um sorriso e afirma: no momento não se preocupa com isso, não tem vontade que acon-

teça. Em meio à conversa, apenas deixou escapar que adora Vinicius de Moraes, e que se ele fosse vivo... “Esse é o cara com quem eu casaria”. Sendo assim, se você é homem, ficou interessado e está pensando em exclusividade com a garota, por enquanto nem tente se candidatar a príncipe encantado. Nicolle faz questão de deixar claro que prazer é algo singular e saber potencializá-lo é uma arte. Dessa maneira, ela já pode ser considerada uma artista, não só pelo desempenho no programa, mas também por assumir de forma tão natural e sincera a função que lhe dá mais prazer na vida. Ah, e para os abusados que pensam em tratar de forma desrespeitosa uma garota de programa, Nicolle é amparada com advogado contratado para representá-la e protegê-la de quaisquer eventualidades desgostosas, perturbações desnecessárias. Tudo seguindo suas condições pré-estabelecidas com o público adulto de acordo com a Constituição Federal e o Código Penal Brasileiro. O melhor mesmo no caso de Nicolle e de todas as outras garotas de programa é respeitar, relaxar e gozar.

Deliciosas horas de prazer O apartamento onde mora, local em que também atende a maioria dos clientes, é bem localizado, possui uma boa infraestrutura e revela muito de Nicolle. Durante as quase seis horas em que passei na presença dela para fazer essa reportagem (cheguei ao apartamento às 23h06min e sai às 05h35min), ela aceitou revelar alguns detalhes dos programas que realiza. Assim como a história de vida de Nicolle, algumas regrinhas básicas

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Precisa fazer tempestade num copo d’água? Filósofos, como o alemão Manfred Geier, argumentam que o humor nada mais é do que uma ferramenta do pensamento crítco. E, se crítica tem hora, o humor também tem?

JOANA SCHERER PRODUTORA E REPÓRTER REPORTAGEM E FOTOGRAFIA

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Fatos recentes no meio humorístico levantam certas questões importantíssimas sobre os limites do humor. Há pouco tempo o humorista Rafinha Bastos (ex-bancada do programa de humor CQC) soltou no ar: “comeria ela e o bebê”, referindo-se ao bebê que a cantora Wanessa Camargo espera. Episódio, esse, que levou a piada inclusive a virar motivo de processo judicial. Outras manifestações do humorista já receberam sua dose de repúdio do público, como quando brincou em um show de stand-up comedy dizendo: “toda mulher que eu vejo na rua reclamando que foi estuprada é feia pra c... Tá reclamando do quê? Deveria dar graças a Deus”. E foi além, dizendo que o homem “que cometeu o ato merecia um abraço, e não cadeia”. Fatos assim nos fazem cogitar, afinal, qual o limite do humor. Piada não é apenas para rir. Muitas vezes serve também para promover uma conscientização a respeito de problemas sociais, políticos, educacionais e daí por diante. Mas muitas pessoas não conseguem perceber a linha tênue que separa o humor da ofensa. Segundo a psicóloga santa-cruzense Jane Leonir Adamy, a piada deve ser medida de acordo com a afinidade que se tem com determinado grupo, do modo como se reconhecem e conhecem suas crenças, valores e culturas pessoais. Da mesma forma como brincar com temas como morte e doenças com um grupo de amigos pode quebrar tabus, fazê-las na frente de desconhecidos pode ofendê-los. De acordo com a Constituição, no inciso IX, do artigo 5º, o direito de alguém manifestar-se com qualquer tipo de pensamento e expressão artística é livre de censura. Porém, muitas vezes, este direito não se aplica quando o humor se traduz em agressão gratuita. Piadas ofensivas sobre minorias ou grupos com culturas diferentes podem, sim, ser considerado preconceito: “Dependendo do momento e do grupo, claro que a pessoa pode conversar e brincar sobre diversos assuntos sem maiores dificuldades. É preciso ter cuidado como você usa essa liberdade de expressão para não emitir opiniões que agravem o preconceito”, explica Jane. É natural do ser humano pos-

suir afinidades e características diferenciadas uns dos outros, e o modo como se lida com humor, ironia e crítica não seria diferente. Todos têm seus limites de aceitação, e esses mesmos limites têm de ser levados em conta quando se faz uma brincadeira dirigida a outra pessoa. Humor, e outras formas de expressão, não têm que ter censura, mas sim bom senso e, isso, vem muito mais do pensamento crítico do que o humor. O respeito ao outro sempre esteve implícito nas relações humanas, e a piada, por mais simples que possa ser, precisa ter esse entendimento. Grandes humoristas como Cha-

plin, por exemplo, nunca usavam as minorias ou o fraco para fazer piadas. Pelo contrário, sempre voltou-se para o político corrupto. Um caso totalmente diferente do que ironizar sobre a opção sexual de alguém, por exemplo. É trocar a ofensa gratuita pelo politicamente correto. Casos parecidos ocorrem com a autodepreciação, quando a pessoa vale-se de experiências próprias para fazer piadas: “É uma forma mais inteligente e saudável de humor. Pois, se eu estou bem comigo mesma, posso brincar comigo mesma e passar isso para as pessoas com maior leveza, sem parecer ofensivo”, completa Jane.


A delícia de não fazer absolutamente nada Tirar 20 minutos no meio da rotina para esvaziar a cabeça de pensamentos ganhou um nome: nadismo. E tem até clube com carteirinha para associação

RAISA MACHADO PRODUTORA E REPÓRTER REPORTAGEM

Tem momentos em que nada adianta. O texto não flui, a monografia não rende, e no trabalho a coisa também não deslancha. Os prazos começam a estourar. É preciso eleger prioridades, as horas de sono diminuem. O corpo começa a dar os primeiros sinais de que algo não está bem: surgem as olheiras, a dor de cabeça, as dores nas costas. Bom, eu poderia resumir tudo isso como síndrome de final de semestre. E se é esse o seu caso, até vai, sabemos que é algo temporário. O problema é quando o estresse se torna constante. E não há paracetamol que resolva. Como fazer para tomar as rédeas da situação e ficar numa boa? Na verdade, a resposta para essa pergunta pode estar na primeira frase desse texto. Pelo menos é no que acredita Marcelo Bohrer, inventor do nadismo. Como o próprio nome sugere, a palavra vem de nada. E significa fazer nada, mas nada mesmo: momentos de lazer não valem, ver TV também não, muito menos pensar em algo que possa ser deixado pAra depois. Você pode até pensar que a ideia

é invenção de quem não tinha mais o que fazer. Porém, tudo começou após Marcelo sofrer um colapso físico e mental, por conta do elevado nível de estresse em que se encontrava. Em 2005, durante uma estada em Londres, o designer e consultor criativo notou que as pessoas de lá também tinham um ritmo acelerado durante o dia a dia. Foi então que decidiu escrever em uma placa a frase: “Você está com muita pressa, muito ocupado, estressado? Aprenda a fazer nada!”. E foi até uma estação de metrô observar a reação das pessoas. Depois de constatar que a maioria concordava com a frase e ainda assim não parava, pensou que seria preciso inventar uma boa desculpa para que as pessoas aderissem à ideia, sem culpa. E assim surgiu o Clube do Nadismo, hoje com quase 7 mil associados espalhados em diferentes países e estados do Brasil. Para Marcelo, o nadismo pode ser praticado da seguinte forma: “se você tem um compromisso que termina às 15 horas, sabe que precisa de 30 minutos para chegar ao próxi-

mo então, ao invés de marcá-lo para as 15h30min, marque para as 16 horas. Chegue às 15h30min e aproveite essa meia hora para sentar em num gramado e olhar as nuvens por meia hora”. O ato de praticar o nada, também pode ser realizado de maneira coletiva e para isso, Marcelo seleciona embaixadores em diferentes cidades para organizar o evento. Em 2008 foram realizados encontros em Londres e Munique e em 2009, em outras cidades alemãs. A meta de Bohrer é promover a ideia em todo o mundo para garantir o bem-estar e o aumento na qualidade de vida das pessoas. Basta criar intervalos de tempos vazios entre um compromisso e outro. Para aqueles, porém, que encontram dificuldades em desligar-se das tarefas do dia, o inventor do nadismo também criou quatro diretrizes para auxiliar na realização de nada. A primeira é stopnjoy - “desfrute o fazer nada sem pressa”; depois entregue-se e “ esqueça qualquer objetivo”; sossegue e “privilegie o silêncio e a imobilidade” e, por fim, observe e “deixe a mente vagar como as nuvens”.

divulgação

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Meu namorado é minha melhor amiga A musa inspiradora de Fabrício Carpinejar revela as peculiaridades que se escondem entre ela e o texto de um dos poetas mais excêntricos da atualidade

JENIFFER GULARTE REPÓRTER REPORTAGEM

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Há mais ou menos três anos, Cinthya Verri acorda ao lado de uma das figuras mais excêntricas da atualidade. Ela é psicanalista, discreta e não gosta de discutir a relação. Ele é poeta, artista e vive em um eterno debate amoroso. Ser namorada do Frabrício Carpinejar exige ginga. Enquanto ela discute formas de matá-lo na internet, ele não cansa de exaltar a amada em textos que balançam até os mais turrões. Ele é de 1972, ela de 1980. Ela esconde o ciúmes que sente das leitoras mais afoitas, enquanto ele brinca com a irritação dela. Primeiro Cinthya se apaixonou pelo escritor, foi

o livro o Canalha! que arrebatou o coração da médica, depois foi o homem que deu o pontapé no namoro. Na verdade, o casal se conheceu por culpa de uma camiseta. Por conselho de uma amiga, ela mandou por e-mail a foto de uma blusa que deu de presente para um paciente. Ele, esperto, retornou a mensagem com um telefonema para a clínica no dia seguinte. Carpinejar, definitivamente, havia encontrado uma musa para os seus textos. As conversas iniciaram por e-mail, até que ela aceitou dar o número do celular para o poeta. No primeiro torpedo, ele disse que estava em um bar com um amigo. Ela

deu sinal verde. Ali nascia o amor mais romântico de Cinthya. A medida então abria caminho para transformar as suas particularidades em fonte para do excêntrico Carpinejar. Agora, chegou a vez da inspiração falar sobre aquilo que o poeta esconde do leitor. A relação da musa do Carpinejar com a obra do namorado não é só feita de impressões doces. O embalo de uma relação de amor, neologismos e paciência incluem momentos em que ela não tem papas para revelar que ele já usou crônicas para dizer calúnias ao seu respeito. Sobre essa mistura de paixão, surpresas e raiva, Cinthya falou ao Unicom:


Especialmente no livro Borralheiro, Fabrício Carpinejar expõe bastante a rotina de vocês como casal para os leitores. Dá detalhes da rotina, de momentos bem particulares. Essa exposição nunca incomodou? Cinthya Verri - Incomoda ainda. Eu tenho a profissão mais discreta - médica. Ele, a mais extravagante - artista. Já viu, né? Muitas das crônicas dele falam sobre o teu jeito, teus costumes e manias. A tua personalidade é descrita nos textos. Já teve algum aborrecimento? Cinthya - Sim, claro. Em especial aquele que ele mente dizendo que mexo nas coisas dele e que ele me explicaria com toda paciência o extrato do cartão de crédito dele... Saiu na Zero hora. É calúnia total. Você costuma ver um texto feito por ele a seu respeito antes de ser publicado, seja em livro ou jornal? Ou é “pega de surpresa”? Cinthya - Costumo ver, sim. Faço a revisão algumas ve-

zes. ses

Principalmente depois deseventos que falei antes.

O Carpinejar é excêntrico. Tem o hábito de pintar as unhas, tem um corte de cabelo bastante particular, vocês compartilham esses momentos de vaidade juntos? Ele usa os seus acessórios também? Cinthya - Sim, sou eu quem faz o cabelo dele com lâmina, eu pinto as unhas dele quando dá tempo, compartilhamos várias peças de roupas. Ele é também minha melhor amiga. Como é a tua relação com a produção literária do Carpinejar? Costuma dar palpites, sugestões? De uma certa forma, tu participa desse processo? Como? Cinthya - Participo sempre que dá. Mulher Perdigueira fui eu quem sugeriu o tema. Borralheiro fui eu quem inventou o título. Essas coisas. Mas nossos processos são muito juntos. Biafra, por exemplo, o romance que estou escrevendo: o tema foi por insistência dele.

No seu Blog você chama Carpinejar de Bitols. Por quê? Cinthya - Porque o apelido de infância dele é Bito, ele não conseguia dizer Fabrício, dizia Fabito. Então evoluiu para Bitols, Bitolinos. Etc. Neologismos de amor. No Blog Matando Carpinejar você também expõe o ciúme que tem da relação dele com as leitoras. Afirma que ele deveria ser mais “contido” no contato com as leitoras. Sobre isso: você já teve alguma crise de ciúme na frente das fãs? Já brigaram por ciúmes seu? Cinthya - Nunca. O Matando entra no lugar da DR (discutir a relação), coisa que eu odeio e ele ama. O Matando é a desforra diante dos textos que odeio. Minha saída pela esquerda com o bom humor. Como surgiu o blog Matando Carpinejar? Por que optou por este nome? O que ele costuma dizer sobre as postagens? Cinthya - Ele adora! A gen-

te ri muito depois. O Matando ia ser uma exposição dos desenhos, mas as pessoas perguntavam sempre a história por trás das imagens. Acabei fazendo os textos. Tem algum texto ou mesmo algum livro do Carpinejar que tu gosta mais por algum motivo especial? Existe um que mexe mais contigo? Por quê? Cinthya - Dona de Casa do Amor. Foi o primeiro texto que ele fez pra mim. O Carpinejar em casa, como namorado e nas atividades do cotidiano é semelhante ao Carpinejar que ele expõe nos seus textos ou há alguma diferenciação? Cinthya - É parecido, eu acho, mas não sei o que você lê a partir daquilo que ele escreve, entende? Você se apaixonou primeiro pelo escritor ou pela pessoa do Carpinejar? Cinthya - Pelo escritor. Eu trabalhava textos dele em consultório e achei Canalha! Um excelente presente de natal, dei para vários amigos.

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Uma passarela do tamanho do mundo Com uma bagagem enorme de conhecimentos, Ana Paula não quer voltar de “mãos vazias” para o Brasil e está em busca de um diploma

MICHELLI JULICH EDITORA MULTIMÍDIA REPORTAGEM E FOTOGRAFIA

Ana Paula, 27 anos, mal sabe a grandeza do seu currículo. Tem na bagagem um inglês fluente, espanhol, alemão, conhecimenato básico em hebraico e turco. Ao falar sobre os países onde já morou perde o rumo que não perdeu em 10 anos de carreira internacional. A santa-cruzense não perdeu também o sotaque gaúcho, nem mesmo o gosto pelas tradições locais. Quando aterriza na cidade, pelo menos uma vez ao ano, faz questão de tomar um bom chimarrão e saborear aquele churrasco ou o feijão de sua mãe, Ingrid Schuster. Em 2002, quando iniciou sua carreira, depois de muito convencer o pai, Ana foi para São Paulo, o primeiro rumo de 10 entre 10 modelos no Brasil. Lá, passou mais trabalho do que trabalhou, literalmente. Mas o orgulho de não precisar depender dos pais para seus gastos falava mais alto do que a fome, quando muitas vezes alimentava-se somente de bolacha água e sal ou frutas. Era o que o dinheiro repassado pela agência permitia no período. O sonho da jovem, no entanto, estava mais além da fama. Ana Paula queria mesmo conhecer o mundo. Meio ano em São Paulo, mesmo depois de receber diversos “nãos” da sua agência para trabalhar fora do Brasil, por ser mais baixa que o pa-

Ana desfrutando do lar da família em Santa Cruz com a mãe Ingrid

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drão exigido, conseguiu finalmente embarcar para o Chile. “Eu cheguei muito despreparada no exterior, fui com a cara e a coragem de aprender”. Depois do primeiro passo fora do Brasil, sem expectativas, por conta da Booker (agenciadora), para trabalhar internacionalmente, Ana decidiu voltar para casa. Optou por não voltar para São Paulo. “É uma cidade com custo de vida muito alto”, argumenta. Voltou para Santa Cruz e iniciou o curso de Educação Física, seu segundo plano de vida. Segundo mesmo, pois se passou meio ano de estudos e a jovem foi convidada novamente para ser modelo quando estava tomando sorvete. “O irmão da gerente da Elite, de Porto Alegre, indicou para que eu fosse trabalhar com eles.” Mais uma vez Ana estava embarcando na carreira. “Com a Elite eu trabalhei toda semana praticamente, e pude continuar estudando”. Sabendo do desejo da jovem pela carreira internacional, a agência convidou-a para ir para fora do Brasi. Ao contrário do que lhe falaram em São Paulo, Ana recebeu, sim, o convite de uma agência Coreana, onde seus 1,7 metros de altura foram bem aceitos. Seu desejo reacendeu aquela chama apagada pela falta de entusiasmo da agente de São Paulo. Ana sentia novamente a emoção

de estar viajando para tão longe. Mal sabia que percorreria a partir desse impulso inicial outros tantos caminhos. Orgulhosa do conhecimento, cultura e aprendizado que estaria lhe proporcionando sem a ajuda dos pais. A agência pagou a passagem, a moradia, mas, como de praxe, foram descontando seus gastos dos trabalhos que a modelo foi conquistando. Sua pele de pêssego, o nariz perfeitinho e o sorriso radiante fizeram muito sucesso na Coréia em 2003. O primeiro passo para Ana, no novo país, era se comunicar com a agente, que em inglês, sugeria os castings, quase 11 por dia. Ana foi instruída inicialmente pela colega que dividia o apartamento da agência. ”Ela falava que teria que atender sozinha aos telefonemas da agência, que indicavam os castings (testes) do dia, e ela ficava do lado para que tirasse somente as dúvidas. Para que pudesse aprender mais rápido a me comunicar”. Ana já estava se virando no inglês, mas ainda teria muitos obstáculos pela frente: adaptar-se à cultura, ao espaço físico do local para encontrar os castings e saber se portar conforme as exigências das agências do país. “O mercado é grande na Coréia; é um país muito exigente. Na verdade a Ásia é uma escola para modelos”, revela. Para melhorar sua apresentação


Foto: acervo modelo

para os testes de campanhas publicitárias, Ana teve que ser muito observadora, olhar revistas, prestar atenção no que os fotógrafos pedem. O que também ajudou muito a desenvolver as expressões foi a experiência de três anos no teatro da Escola. O fato de Ana não se comunicar bem em inglês, fez com que ela perdesse um bom dinheiro que às vezes não era repassado a jovem, que acabou se desentendendo com a agente brasileira por não lhe dar apoio. Como não queria voltar para o Brasil, depois de sentir o gostinho do trabalho no exterior, mais uma vez a modelo não desistiu. “Poxa eu tava na Ásia, dali mais uns passos eu teria oportunidade de conhecer outros países”, indigna-se. Sabendo que o mercado asiático ainda poderia lhe reservar mais conquistas, Ana, apoiada pela mesma colega que a ensinou a falar inglês, sugeriu seu booker (agenciador) internacional. Em menos de três horas, depois de enviar suas fotos e vídeos para ele, Ana foi surpreendida com um convite imediato para a China, onde trabalhou por quatro meses. Começa mais um capítulo da carreira da Ana. Depois teve a oportunidade de ir para Barcelona e de lá para Turquia, mais um desconhecido mundo para Ana. Ao chegar ao aeroporto 1 hora da madrugada, o susto, não teve notícias do motorista da agência. Normalmente a modelo é recebida no aeroporto e acompanhada até o apartamento onde irá se hospedar. Ana esperou, esperou e nada. “Até então nunca estive tão desesperada”, lembra. A

cada hora ia até o banco de informações e solicitava a chamada do nome que escrevera num papelzinho já amassado pelo nervosismo da espera de mais de 4 horas. Quando já estava convencida que voltaria para o Brasil, no primeiro voo, ouviu uma voz ecoando pelo imenso salão, já vazio, naquela hora da manhã. “I forgot you”, dizia o motorista meio atravessado. “Sorry”, pronunciava grotescamente o inglês. Apesar da primeira impressão de Ana sobre o país, foi na Turquia onde mais campanhas realizou, tanto que voltou para lá pelo menos 5 vezes. Depois de estar na Turquia pela primeira vez, foi para o México, onde se deparou com uma realidade ainda mais complicada. Nos outros países sempre era deslocada até os castings (testes). “No México recebi um mapa e um boa sorte da agente”. Ana tinha um mapa na mão e 11 castings por dia, mas a diferença é que ela teria que se achar sozinha na maior cidade do mundo. Apesar disso, e das condições precárias da cidade em relação aos grandes centros que estava acostumada a morar, Ana recebeu no México seus três cachês mais altos da carreira. Um deles era uma Campanha de Cabelo da Avon, para a América Central. Foi onde conquistou suas melhores férias da vida, na Ilha do Caribe. Mas aí foi a vez da família levar um pequeno susto. O pai da Ana telefonou para a agência a fim de saber notícias da filha, que já não dava sinal de vida há dias, quando o booker com intuito de tranquilizá-los, avisou: “Ana esta em Israel”. O choque tomou conta do pai, da mãe e do irmão André. Israel estava em plena guerra com a Síria. Sabendo da desaprovação do pai para tal viagem e da preocupação que renderia a família, Ana sem querer perder a oportunidade foi sem avisá-los e de lá só saiu depois de um ano. Foi o país em que Ana mais gostou de morar. “O lugar é lindo, a religiosidade é incrível”, afirma. A gaúcha destaca que a guerra não influenciava na vida das pessoas diretamente. “Quem estava lá nem sentia”, o mais estranho para Ana era dividir espaço num ônibus com mulheres e homens fardados carregando metralhadoras e armas de fogo variadas. A menina ainda queria mais. Foi morar na Alemanha, onde trabalha até hoje para grandes marcas esportivas. Hoje, Ana se dedica ao alemão a fim de cursar Ciências do Esporte em alguma universidade de lá. Com 27 anos, quase um recorde em manter ativa a carreira, e uma bagagem gigante de conhecimento, Ana ainda diz que não quer voltar de mãos vazias. Um diploma, nessa altura da vida lhe dará ainda mais confiança para seguir agora seu segundo plano de vida. Haja persistência!

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A paixão secreta de Pedrinho do Cavaco Ele é carioca e está na novela Malhação. É carioca e vive no Rio, porém, guarda uma paixão por Santa Cruz do Sul

DEKA BUENO REPÓRTER REPORTAGEM

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Pasme: o músico, e agora astro teen de Malhação, Pedrinho do Cavaco, tem uma paixão incomum com você: Santa Cruz do Sul. No início de 2011 ele conheceu a terra da alegria e de lá para cá já retornou duas vezes em um ano para “curtir com os amigos”. Em meio a uma rotina agitada de gravações e shows ele confessa: “Assim que tiver um tempinho quero voltar à Santa Cruz”. Aliás, não foram poucas as vezes em que Pedro do Vale Bernardo escreveu em seu twitter: “ que saudades da minha Santa Cruz do Sul”. Afinal, o que o trouxe até aqui? E o que o encantou tanto? Foi em meio a uma festa em Santa Cruz do Sul, para ser mais específica em uma quartaneja na Spirit, que eu dei de cara com um guri de pele morena, cabelos escuros e cacheados, escorado em um canto, com calça jeans e tênis, camisa pólo e um blusão sobre o ombro esquerdo, a perna direita dobrada para trás e contra a parede, os olhos estalados feito clicas verdes, antenado a tudo que o rodeava. Aquele olhar observador, o sorriso malandro e o

sotaque chiado revelavam que ele não era daqui. Quem via o guri parado, com jeito calmo e simpático, não imaginava que bem ali estava um prodígio do samba, uma personalidade ímpar que carrega um talento único e uma grande história na música que, inclusive, lhe trouxe o apelido: Pedrinho do Cavaco. Hoje, aos 22 anos de idade e com CD gravado, o afilhado de Milton Nascimento inicia uma carreira inesperada como ator, ele está no elenco da novela teen da Rede Globo, a Malhação. Você, provavelmente, deve estar se perguntando porque a história de Pedrinho do Cavaco, um carioca da gema, está nesta edição do Unicom e o que ele tem a ver com a nossa realidade? Digamos que uma paixão incomum: a cidade de Santa Cruz do Sul. Em janeiro de 2011 ele decidiu aceitar o convite de Marcelino, irmão do músico santa-cruzense Ricardinho Vogt, e veio comemorar o seu aniversário em um lugar calmo e de uma forma bem diferente: com um churrasco. Pedrinho, que havia conhecido Marcelino em ou-

tubro de 2010, durante o show de lançamento de seu primeiro CD e onde seu irmão Ricardo era convidado de Milton Nascimento, não imaginava que encontraria aqui pessoas tão amigas e carismáticas. “Fiquei surpreendido, o pessoal de Santa Cruz foi muito gente boa comigo e eu nem conhecia ninguém”. Segundo o músico, a primeira impressão que teve da cidade foi a melhor possível, o local calmo e repleto de verde encantou o carioca acostumado com a correria e o barulho da cidade grande. Em meio à entrevista, e relembrando sobre sua estadia na cidade da alegria ele declarou: “ Pô, eu queria estar aí neste momento, encontrar a galera, caminhar naquela rua onde as árvores formam um túnel, sentar na praça e tomar chimarrão! Isso é bom demais, não existe aqui”. Para Pedrinho, o que mais encantou foi o fato de os jovens daqui serem bem unidos, estarem sempre se encontrando, “nem que seja para tomar chimarrão de boa”. Quando questionado sobre a culinária da cidade e o que mais agradou


sendo ótima. É o meu primeiro trabalho como ator e já na maior emissora de televisão do país. É melhor que ganhar na mega-sena”, avalia. A nova vida de Pedrinho do Cavaco, segundo afirma, é uma correria. Como já citado, muitas coisas foram abdicadas para que conseguisse atender aos compromissos como músico e, agora, ator. Além disso, tem outra coisa que ele precisou renunciar: as vindas para Santa Cruz do Sul: “Eu já estava planejando ir até o final do ano, mas com esta loucura de gravações e show, fica meio difícil”, confessa. E bota loucura nisso, em setembro aconteceu o maior festival de Rock do mundo no Rio de Janeiro, o Rock in Rio, e adivinha? Pedrinho do Cavaco era convidado a subir ao palco ao lado de Milton Nascimento e também de Ricardinho Vogt (músico santa-

-cruzense que reside em New Jersey, Estados Unidos, e veio somente para tocar no festival). Mas, ele não encontrou tempo nem mesmo para as passagens de som, e por isso apenas assistiu ao padrinho e ao amigo Ricardinho nos palcos do Rock in Rio. E Santa Cruz então, vai ter que esperar? “Se Deus quiser eu acho uma brechinha e vou no início do ano rever o Marcelino e os amigos que eu fiz aí, como o Edinho Nascimento”. Para encerrar a entrevista, aquela pergunta que não poderia faltar: “Em meio a esta rotina de muitos compromissos e, tu já planejando vir para cá rever os amigos, sobra tempo para namorar?” Aliás, como anda o coração? Com largo sorriso no rosto, ele respondeu de imediato: “No momento eu estou solteiríssimo. E o que mais posso dizer? A procura de uma santa-cruzense”, sorri o astro jovem.

Dieguinho - Para Pedro Bernardo o seu personagem em Malhação Conectados tem muita coisa em comum com ele mesmo. Primeiro, o fato de Dieguinho ser músico, e por meio deste talento busca ajudar a mãe nas contas da casa que, segundo o ator, é um espelho da sua realidade. Depois, Dieguinho é de bem com a vida e se dá bem com todo mundo, um menino de coração aberto. E quem conhece o garoto sabe que essas são as características de Pedro Bernardo Para seguir Pedrinho no twitter: @Pedrinhocavaco Fan Page no facebook: Pedro Bernado, é só curtir.

Fotos : Acervo pessoal

ao paladar dele, Pedrinho foi enfático ao dizer: “tem aquele negócio que é bonzão, um doce, parece bolo, é cuca, não é? Nossa muito bom aquilo”. Pedrinho, atualmente assumiu o nome de Pedro Bernardo e está atuando como ator. Em maio de 2011 foi indicado pelo ator Eric Johnson e pelo músico Augusto Nogueira para o papel de Dieguinho na novela jovem da Rede Globo, Malhação Conectados. “Eu recebi a ligação do diretor musical da novela, o Rogério Vaz, que falou sobre a indicação e me convidou para fazer os testes. Foram três testes, e eu consegui o papel”. As gravações iniciaram em agosto deste ano, e de lá para cá Pedro precisou ajustar sua agenda de shows à correria da nova vida, a de ator. Ele foi obrigado a desmarcar alguns compromissos, mas não reclama: “Essa minha nova fase está

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Sal, inimigo do coração, amigo do peito Em pleno centro da capital gaúcha, uma caverna de sal é a ultima moda no tratamento de doenças respiratórias

LUCAS BAUMHARDT EDITOR DE VÍDEO E REPÓRTER REPORTAGEM E FOTOGRAFIA

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Correr, brincar, jogar futebol. Nada mais natural do que a diversão em meio a brincadeiras de pega-pega, pique-esconde ou correr atrás de uma bola na vida de uma criança. Pois é, mas, infelizmente na vida do pequeno João Daniel Winkler Haertel, de 2 anos as coisas não eram tão normais assim. Muito ativo e brincalhão, João Daniel passou a preocupar sua mãe no início do ultimo inverno quando começou a ficar desanimado e ofegante. Um problema em seu sistema respiratório levou a mãe do menino, Maristela Winkler, que é médica cardiologista, a procurar ajuda em consultórios de colegas pediatras e a fazer exames que apresentaram um quadro pré bronco-espasmo no garotinho, em bom português, algo que ajudasse o menino a respirar melhor. Muitas noites sem dormir em função da tosse e dificuldade de respiração levaram a doutora e seu filho a procurar um tratamento com base na homeopatia, que é a cura através de produtos naturais. Porém, o que ela encontrou foi uma solução até então desconhecida e um tanto distante, já que veio da Europa Oriental. Localizada no bairro Cidade Baixa, em Porto Alegre, no terceiro andar de prédio de várias clínicas médicas está uma sala aparentemente normal, com ambiente de espera, cafezinho e água fria ou gelada, revistas e um cheiro específico de consultório. Até então, tudo normal, não fosse

uma sala de aproximadamente 15m² no fim do corredor e nela distribuídas entre teto, paredes e o chão, mais de 3 toneladas de sal, isso mesmo mais de 3.000 quilos de sal. Nas paredes e no teto, fixado com uma espécie de resina que funciona como cola para que ela não caia e não quebre. No chão é como abrir um pacote de sal grosso de churrasco, só que é sal puro sem adição de Iodo deixando o sal com 99,5% de pureza. Quatro confortáveis espreguiçadeiras e um cantinho com brinquedos em uma prateleira também de sal completam o ambiente que muda até de cor. Este ambiente tem nome: Caverna de Sal, usada para o tratamento chamado de Haloterapia, apresentada para João Daniel e sua mãe Maristela como uma solução para o problema respiratório do menino. Sinusite, asma, bronquite, renite e até na qualidade do sono a Haloterapia atua como coadjuvante no tratamento e prevenção da formação do muco que ocasiona estas doenças e ainda produz limpeza e desobstrução das vias respiratórias, como explicou a doutora Carla Finocchiaro médica responsável pela clínica. O tratamento consiste em inalar durante a sessão o sal expelido por um gerador, que transforma o sal mais grosso em micropartículas muito pequenas que são jogadas por um sistema para dentro da sala e espalhadas no ar enquanto o paciente relaxa

ouvindo um som agradável, ainda se beneficiando da cromoterapia, que usa luzes coloridas com efeito relaxante e desestressante. Charles Finocchiaro, gerente da clínica explica que a recomendação mínima são 10 sessões de 50 minutos, podendo variar de acordo com a gravidade do problema de cada paciente. Para entrar na sala é preciso tirar o calçado e vestir uma proteção nos pés e também no cabelo para manter a higiene da sala, o que acabou assustando um pouco o pequeno João Daniel na primeira sessão, que logo se apegou aos brinquedos colocados de maneira estratégica em um canto da sala, para que a criança possa ver o corredor e no caso dele, a mãe. Na terceira sessão ele já não tinha mais a secreção que causava a tosse. Já se sentia melhor e voltou a frequentar a escola, que também tinha sido deixada de lado devido ao problema. Depois das dez sessões João, que chegou até a perder peso em função da doença, fez mais três sessões para manutenção e hoje corre, brinca, joga futebol sem ficar ofegante e perder a respiração e não perde um dia de escolinha. Não há nenhuma contra indicação tanto para adulto quanto para crianças, nem mesmo problemas de pressão arterial são impedimentos para a Haloterapia, a terapia do sal. Em excesso o sal é um inimigo para o coração, mas usado de forma adequada é um amigão do peito.


Amor à primeira correspondência Dona Iracema sempre quis um príncipe. Com ajuda do destino e de algumas cartas, encontrou uma história de amor e companheirismo

LISANE MARQUES EDIT. FOTOGRAFIA E REPÓRTER REPORTAGEM E FOTOGRAFIA

Quem nunca pensou ou acreditou em paixão à primeira vista não sabe o valor de uma boa história de amor, daquelas com príncipe encantado, fada madrinha e felizes para sempre. A sensação, dizem as línguas sortudas, é única. As mãos começam a suar frio, o corpo treme e o friozinho na barriga é inevitável. Mas e quando o amor surge à primeira carta? Sem ver o amado pessoalmente tudo fica mais difícil. Hoje em dia, ao contrário, com a internet é muito mais comum. A história que segue nas próximas linhas ocorreu em 1988, por meio de correspondências. Iracema Martins Diniz, de 57 anos, descobriu por meio de cada palavra posta no papel que o amor a primeira vista é mesmo cego. Quando tinha 35 anos, Iracema resolveu encontrar seu grande amor, mas como nunca havia namorado antes ficava com receio de sair à procura de alguém. Foi quando o destino resolveu dar uma mãozinha. Enquanto fazia a leitura da re-

vista católica Rainha, chamou-lhe atenção o anúncio de um homem que também estava procurando uma namorada. “Então eu escrevi pra ele respondendo que eu também gostaria de conhecê-lo”, lembra. Natural da cidade de Santiago, Rubem Martins Diniz, na época com 50 anos, respondia as cartas que a amada lhe enviava e, desta forma, começaram um namoro por correspondência que durou um ano e meio. Durante esse tempo, os dois se encontraram apenas três vezes. No quarto encontro, após muitas cartas trocadas, os dois se casaram. “Fizemos um casamento lindo na Igreja Santo Antônio em Estrela, com festa para umas 60 pessoas, foi tudo direitinho no civil e no religioso”, explica Iracema. Os dois foram morar juntos em Canoas e a partir de então passaram a se conhecer e a respeitar um ao outro. Com o convívio foram aparecendo as diferenças e Iracema lembra que não foram poucas. Mesmo com as diferenças,

ela não se arrepende. “Foi um casamento ao contrário. Hoje em dia as pessoas convivem para depois se casarem. A gente se conheceu mesmo só depois do matrimônio”. Iracema lembra que Rubem era um ótimo esposo, gostava de ajudar nos afazeres domésticos e cozinhar, fazia um carreteiro com charque de “lamber os beiços” e dizia a todo o momento que a amava. Iracema havia ganho na loteria e agradecia todos os dias por ter encontrado seu grande amor. Mas a história de Iracema não teve um final feliz como nos contos de fadas, pois, na vida real o “para sempre” teve um fim. “Nós prometemos ficar juntos até que a morte nos separasse. Ele adoeceu e morreu”. Mesmo com a separação imposta pelo destino, Iracema fica feliz por ter tido a oportunidade de ter conhecido Rubem e ter passado 18 anos ao seu lado, pois acredita que “seu primeiro e único amor pode não ter sido um príncipe, mas com certeza era encantado”.

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Enquanto houver espaço, eles terão trabalho Antenor Kappke e Rubem Zingle conhecem de perto o problema dos cemitérios

JAQUELINE GOMES EDITORA E REPÓRTER REPORTAGEM E FOTOGRAFIA

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As dificuldades na hora da morte podem ultrapassar a dor da perda. Para quem fica e até mesmo para quem se vai. Seu Zingler e seu Kappke sabem bem do que se trata. Organizar um cemitério é tão difícil quanto cuidar de uma cidade. Exige planejamento e engenharia. E, mesmo assim, às vezes, não se tem nem onde cair morto, literalmente. Falta espaço. Esse é o problema. A superlotação dos cemitérios é uma realidade que chega a Vera Cruz. Até pouco tempo o município recebia falecidos de cidades vizinhas, como Santa Cruz do Sul, que há muito tempo já enfrenta o problema. O Guarda de Deus, em Santa Cruz, por exemplo, já ocupa parte dos 140 espaços destinados a indigentes para falecidos que, por falta de condições financeiras, não conseguem arcar com as despesas do enterro em outros cemitérios. O espaço,

no entanto, é cedido por sete anos. Depois desse período é feita a exumação e os restos mortais são levados a um ossário, dentro do cemitério, para dar lugar a outros corpos. Em Vera Cruz agora a situação também é outra. O secretário Municipal de Obras e Saneamento, Horst Schuh, admite que a capacidade do Cemitério Municipal chegou ao limite. Não se tem ideia de quantos mortos já foram sepultados na área. O fato é que o local não comporta mais sepulturas comuns, no chão. Desde o ano passado vem sendo estudada uma alternativa de ampliação do cemitério. A alternativa a que se chegou, aponta Schuh, foi a construção de gavetas mortuárias. Já foram feitos dois jogos de 32 gavetas. Ainda assim o problema não está resolvido. “Estamos estudando a compra de uma área ao lado, pelo lado direito, para aumentar

a capacidade do cemitério além das gavetas”, revela o Secretário. Resolver o problema da falta de espaço na hora da morte não é fácil. Se as autoridades buscam a solução, ainda falta quem aceite tal trabalho. Seu Kappke, Antenor Kappke, 66 anos, já construiu mais de 800 gavetas mortuárias, fora os túmulos simples, em 20 anos de profissão. O número se divide entre as localidades de Linha Henrique D’Ávila, Linha Fundinho, Sítio e Formosa. O coveiro conta que é a forma que as comunidades religiosas têm encontrado para driblar a falta de espaço. “É muito difícil conseguir uma área para cemitério”, pondera Kappke. Mesmo sem conhecer a legislação que regula a implantação dos espaços, o coveiro acompanha as dificuldades das comunidades e das famílias no dia a dia da profissão. Não era a profissão que sonhava.


Bem melhor era tocar nos bailes. Ah, sim, belas noites de ver a alegria dos desconhecidos. Mas a necessidade de conciliar mais uma atividade para reforçar a renda da família o levou para “bicos” como pedreiro. Quando se viu, já estava deixando de lado a alegria dos bailes para enterrar tristezas. A dor da perda. No início era estranho depender da morte para viver. É serviço que não tem hora, mas sempre chega, geralmente sem avisar. “Não tem domingo, nem feriado”, completa. Zingler, de nome Rubem, também é coveiro. Dos 68 anos de idade mais da metade ele viu passar dos cemitérios Católico e Evangélico, no Centro de Vera Cruz. Começou a trabalhar no ramo bem antes de Seu Kappke. Hoje são colegas. Enquanto vêem a vida passar de dentro do cemitério, também contabilizam perdas de entes queridos e de centenas de desconhe-

cidos. É por isso que conhecem bem as dificuldades que a morte revela. A morte faz parte da vida Morrer faz parte do ciclo da vida. Por mais incômodo que possa parecer, não é possível viver sem a presença desta figura travestida de preto. E se falta espaço até para cair morto, sobram despesas para garantir os sete palmos de chão. Isso sem falar no preço na hora de contratar o serviço funerário. É preciso pensar nos gastos com urna, velório e o translado para o cemitério.

No Cemitério Católico, Zingler e Kappke trabalham na construção de 38 gavetas novas. São conjuntos de quatro “andares”. As gavetas do meio são as mais nobres, por isso custam mais caro. Em média, tanto no Católico como no Evangélico, as sepulturas variam de R$ 2,1 mil a R$ 3 mil, fora a taxa de enterro. As gavetas de baixo e de cima, por serem mais difíceis de acessar, custam cerca de R$ 1,2 mil. Essas 38 novas moradas ainda não estão à venda. Mas Zingler lembra que das 304 gavetas construídas recentemente, apenas 10 ainda estão sobrando. As outras, as que já não estão ocupadas, estão reservadas. “Isso mesmo, muita gente não quer ter problema na hora de morrer ou deixar o problema para a família”, observa Zingler. Dos túmulos comuns, no chão, há pelo menos 190 vazios, todos esperando pelos donos. “E sempre que morre alguém é uma correria para fazer túmulo novo. Não dá para entender”, emenda Kappke, lembrando que a área que agora recebe as gavetas já era toda ocupada por sepulturas que foram removidas. Os restos mortais estão em sacos individuais depositados em gavetas ou junto de túmulos de entes da mesma família. No Cemitério Evangélico o espaço também é pequeno. Há apenas quatro sepulturas duplas e 25 gavetas. Segundo Zingler, apesar de as pessoas estarem optando mais pelas gavetas atualmente, em poucos anos as vagas devem acabar. Ele ex-

plica que as sepulturas mais antigas estão dando lugar a outras, mais novas. “Retiramos as ossadas e colocamos separadas em uma única sepultura, para dar mais espaço”, comenta. “Mas ainda tem muita coisa fora de ordem. Tem lugar que ao invés de duas dava para fazer seis sepulturas”, acrescenta. A expressão cansada de Zingler e Kappke, não pela idade, reforça a ideia de que está na hora de parar com o serviço. “Mas ninguém quer esse trabalho e poucos sabem fazer. Não é fácil fazer uma sepultura ou as gavetas. Não pode rachar, nem vazar”, explica, zeloso pelo serviço o coveiro Kappke. Lidar com a dor dos outros não é fácil, mas é preciso quem faça. “A gente cuida muito do que faz. Mas quem sabe como vão fechar o nosso túmulo depois?”, indaga Zingler. É uma dúvida. Os coveiros só tem certeza de que é preciso cuidar tão bem dos cemitérios, quanto da infraestrutura da cidade. É porque os cemitérios são construídos para lembrar de quem se gosta ou, se alguém preferir, para lembrar s e mp r e da morte.

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Candaces: negras, guerreiras e apaixonadas Como guerreiras modernas, venâncioairenses perpetuam pela cultura o desejo de unir o que um dia já foi motivo de exclusão: a cor da pele

DANIELLE RUBIM REPÓRTER E REVISORA REPORTAGEM E FOTOGRAFIA

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Não é mera coincidência o adjetivo que João Generoso dos Santos leva no nome. Sua generosidade agregou centenas de pessoas a uma única vontade: ter voz. Não a voz sonora, que ecoa de maneira imponente, mas a voz vestida com sinuosidade e gingado suficiente para modificar histórias de vida. No ano de 1935, ele fundou uma sociedade para os negros de Venâncio Aires, o Négo Foot Ball Club São Sebastião Mártir. Se estivesse vivo, veria o trabalho de um grupo de mulheres que perpetua seu desejo de unir o que um dia já foi motivo de exclusão: a cor da pele. São rainhas guerreiras modernas, como as candaces que na antiguidade comandavam a família protegendo seu povo e apaixonadas por sua história e cultura. Aos 3 anos de idade, Joana Deoci Sena Pinheiro pisou pela primeira vez na casa de pai Generoso, onde ficava a sede da sociedade. Ia sempre acompanhada de seus pais. Enquanto sua mãe dançava, jogava carta e conversava com outras mulheres, Joana, sentada no chão batido com outras crianças, imaginava seu futuro. Hoje, com 72 anos, a memória tenta trapacear as lembranças. “ Lembro sempre de vir ao Négo com meus pais e eles sempre dizendo a importância de estar ali para unir nossa gente.

Me desculpa, mas minha memória as vezes falha e eu não falo muito bem, tento falar do meu jeito, minha filha.” A negra de lenço nos cabelos que tem os braços enfeitados com pulseiras prata e vermelha. Braços, que muito se movimentaram na juventude na realização de um sonho. Dona Joana foi balisa da rancho de carnaval do Négo. Puxava a bateria formada por dezenas de pessoas. Um sonho que foi concretizado aos 14 anos. “Eu até disse pro meu véio que ia colocar o calção que eu usava quando dançava pra me apresentar hoje”, conta, cheia de sorrisos e um olhar perdido no passado. “Um dia, fui junto com o pessoal daqui para Santa Cruz. Eu estava ansiosa, mas viajar pela região com o bloco era comum. Pois não é que, nesse dia, eu estava toda pomposa, dançando, e o pauzinho caiu no chão. Eu vi aquela multidão de gente atrás de mim se aproximar, continuei sorrindo e inventei uma coreografia, me abaixei e juntei o bendito pauzinho. E não é que fez sucesso, ninguém percebeu e eu sai bem bela da situação!” Os olhos da doméstica aposentada tentam disfarçar a tristeza da perda de dois dos três filhos. Mas, segundo ela, essa tristeza passa um pouco quando lembra de quando era moça e dançava nos bailes do Négo.

“Eu quando casei me mudei pra Porto Alegre, porque meu véio é do mundo, sabe? O trabalho dele era viajar e eu acabei vivendo isso também. Mas sempre que tinha baile aqui, a gente fazia questão de vir correndo. Os primeiros a chegar e os últimos a sair.” Agora, morando de novo na Capital do Chimarrão, ela e seu marido, que antes traziam os filhos a tiracolo, mesmo com a idade e as dores da velhice castigando o corpo, usam apenas um remédio: a alegria. Dinastia de rainhas No Egito, antes da era cristã, existiu uma dinastia de rainhas negras guerreiras. Elas detinham o poder e comandavam suas famílias protegendo ‘os seus’. Lutavam com espadas, unhas e dentes para resguardar a vida dos filhos, lutar por territórios e espaço na sociedade. Eram chamadas de candaces. A história de dona Joana, é familiar com mais de 20 mulheres que integram o Négo. São candaces do século XXI. Porém, hoje, as armas utilizadas não ferem: usam amor e carinho. Elas cozinham, contam histórias para as crianças, explicam os direitos dos negros, ensinam que a etnia não significa nada além de uma questão cultural que


muitos encaram como racismo. Acima de tudo, são chamadas de guerreiras, porque têm a missão de unir, educar e amar seus próximos. O Négo, é como uma segunda casa. Nos finais de semana as famílias se reúnem, todas guiadas pelas mãos carinhosas das candaces. Dançam, cantam e, ao invés de se lamentarem pelo passado que por muitas vezes foi injusto, pensam no futuro e moldam ele com serenidade que a experiência as presenteou. Embora o preconceito e racismo existam, não é motivo de revolta, mas serve como impulso, assim como foi há 76 anos quando foi fundado o Négo. Essas mulheres foram ensinadas pelos pais a importância de manter os filhos sempre por perto e transformar muitas vezes a tristeza em felicidade. Professora de História e Ensino Religioso, Lionor Pinheiro de Sá Lopes, 63 anos, é amiga de longa data de Joana. As lembranças, um pouco mais frescas, remetem ao tempo em que era criança e resolveu conhecer para entender a cultura afrodescendente. “ Na escola não ensinavam nada sobre nossa cultura. Mostravam os livros apenas com negros nos troncos, amarrados por correntes. Eu tive medo por ser negra e como era criança eu pensava que talvez fosse passar por isso. Resolvi estudar para entender.” Foi quando pisou pela primeira vez no ‘quilombo’ – como chama carinhosamente a sociedade - , que começou a entender que não estava sozinha e que naquele momento a separação dos negros do resto da sociedade parecia conveniente, já que eram proibidos de frequentar os clubes. Foi quando o pai Generoso, com a ajuda de amigos - e entre esses, um branco -, criaram o Négo. Ali, em seu próprio espaço, eles encontrariam um local para celebrar a cultura. Para a professora, os “brancos” ficaram felizes com a fundação da casa, porque assim não teriam que esbarrar com um negro em suas festas. “Como eles não permitiam nossa entrada, por muito tempo não permitimos a entrada dos brancos aqui, mas hoje isso não existe mais, não de nossa parte. Nosso presidente é branco. A cor da pele não mostra caráter nem pode ser barreira para nada nessa vida”, conta, segura de sua realidade e indiferente com a indiferença alheia. Joana e Lionor são duas das dezenas de candaces de Venâncio Aires. Número pequeno com o peso de anos de uma vida de sabores doces como a canjica que adoram preparar para os pequenos que sempre estão em volta, e amargo, como o da ignorância dos que tratam a cor da pele como uma casca, que separa o que é bom, do que é ruim. Para elas, nada mais é do que a falta de consciência que só a vida pode ensinar àqueles separam as vidas conforme o grau de melanina.

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Uma vida entre a bola, a sala de aula e a lei Geraldo Andrade, 50 anos, é o que podemos considerar um homem versátil, ou seja, para ele, exercer apenas uma profissão é pouco

GEFERSON KERN REPÓRTER REPORTAGEM E FOTOGRAFIA

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É possível que uma prova escolar seja aplicada por um professor substituto, já que o mestre terá de narrar importante jogo de futebol fora do país? Ou então que uma consulta com seu advogado de confiança seja adiada, pois o horário do Conselho de Classe no colégio foi antecipado de última hora? Pode ser meio inverossímil, mas é verdadeiro. Pelo menos quando a história envolve um jovem senhor de 50 anos de idade, que consegue ser, ao mesmo tempo, professor, advogado e narrador de futebol no rádio. Vindo lá das bandas do Alegrete, Geraldo Leal Andrade é um cidadão pacato. Filho único, escolheu não ter herdeiros. Vive hoje em São Leopoldo com a esposa, Rosane, contemporânea dele, e o pai, seu Romeu, de 87. Mas, pelo número e diversidade de empregos que tem, ele não consegue ficar muito tempo em casa. Até hoje, Geraldo se ausenta pelos mais diversos períodos, seja para transmitir futebol direto do México ou comparecer a uma audiência no fórum de Pelotas. Mas ele não

se abala. “Deixo sempre uma foto minha sobre a geladeira”, brinca. A medida, porém, nem sempre funciona: “Já cheguei a voltar pra casa de viagem e o cachorro me estranhou e começou a latir”, diverte-se. Das três profissões, foi o magistério quem entrou mais cedo na vida do futuro homem do microfone. Foi em 82, quando ele concluiu a faculdade de educação física, fruto da paixão pelo esporte nos tempos de escola. A narração veio mais tarde, em 89, quando ele ainda vivia na campanha gaúcha. “Comecei porque, como em toda a rádio do interior, tinha time, rádio, e não tinha narrador”, lembra. “Naquele mesmo ano, eu havia sido âncora de transmissão de carnaval, e transmiti como se estivesse narrando um jogo”. E não parou mais. Desde lá, já são 22 anos de locução, com direito a passagens por grandes emissoras gaúchas, como a Guaíba e a Bandeirantes. Foi o rádio quem incentivou Geraldo a partir para sua terceira profissão: o Direito. O gosto pela a área

surgiu a partir da necessidade de elucidar dúvidas, surgidas quando o alegretense era apresentador de um programa de entrevista. Mas, apesar da formação, o também mestre e locutor não investe tanto tempo na advocacia quanto nas outras profissões. “Tenho escritório com meu cunhado, mas, como temos outras atividades, deixamos a maior parte do trabalho para meu sobrinho e um colega dele, que acabaram de completar a faculdade e estão com todo o gás”, afirma. Com afazeres e atividades tamanhos e tão distintos, o professor, advogado e narrador é um legítimo representante da espécie dos versáteis – aqueles que, na linguagem dos boleiros, desempenham várias funções sem deixar a peteca cair. Tentando misturar alguns dos termos característicos de cada área com a qual o senhor Andrade se envolve, alguém poderia muito bem dizer a ele: “Professor, vossa excelência é fera, mesmo”. Motivos para justificar o elogio, os ouvintes, alunos e clientes sabem que ele tem.


Um país onde um cão é mais cão que outro No primeiro mundo, caso dos EUA, os cães têm tratamento de primeira ualidade, literalmente

DEKA BUENO REPÓRTER REPORTAGEM E FOTOGRAFIA

Se o Brasil é conhecido como o país do futebol e do carnaval, então, analisados alguns fatos, os Estados Unidos da América pode ser considerado o país dos “cãezinhos”. Isto mesmo, você nao leu errado, a situação é a seguinte: nos Estados Unidos os animais podem tudo o que eles quiserem, são tratados com as honras da casa por onde passam. Ao visitar Nova Iorque e/ou São Francisco (duas cidades turísticas) fica fácil perceber o fenômeno canino. A fila de check-in, nos aeroportos, pode ser um dos primeiros locais em que a presença dos animais será percebida. Para serem levados junto com seus donos no avião, os “pequeninos” (ou não) pagam meia passagem. Caso contrário são colocados no bagageiro e, sendo desta forma, normalmente vão dentro de suas confortáveis casinhas. Ao desembarcar em alguma cidade norte-americana, a cena certamente irá se repetir e os cães vão ser vistos por todos os cantos: sempre com coleiras passeando pelos mais diversos locais. Porém, as rígidas leis do país também valem para os animais. Ao redor do Central Park, por exemplo, as placas são claras: multa de 100 dólares para aquele dono que deixar as necessidades dos seus bichinhos pelas ruas ou gramados. Tanto na famosa Nova Iorque quanto em São Francisco, Richmond, Los Angeles e, certamen-

te, em qualquer cidade dos Estados Unidos, ao lado das lixeiras de rua ficam saquinhos plásticos que podem ser retirados a qualquer momento e sem custos, para justamente não haver complicações caso o “melhor amigo” do cidadão resolver utilizar o banheiro durante o passeio. Falando em passeios, nos Estados Unidos os cães estão autorizados a acompanhar seus donos nos restaurantes e até podem se sentar ao pé da mesa durante o almoço ou o jantar. É difícil o restaurante que não permita a entrada de animais, tudo para que os pequeninos possam estar presentes em todos os momentos de sua “família”. Aliás, em qualquer lugar que o dono decida ir ele pode levar seu cão sem grandes preocupações: lojas de eletrônicos, roupas, perfumes, salão de beleza. O supermercado, porém, continua sendo um local de acesso restrito aos animais. Para garantir o conforto dos cachorros, pelas calçadas ficam espalhados potes com água fresca e máquinas com ração: basta o cidadão colocar uma moedinha de 25 centavos, girar a alavanca e alguns biscoitinhos caninos irão cair em suas mãos. Artigos de luxo Aqueles cãezinhos que têm um bom comportamento ou que estiverem de aniversário podem ser presenteados pelos seus donos com alguns mimos

como: champagne para cachorro, ração festiva, bolo de aniversário, book fotográfico. Se você está se perguntando se tudo isso realmente existe, então vale a pena acessar o site da boutique para cachorros, a Moulin Pooch, localizada na Union Street, em São Francisco: www.moulinpooch.com, tem muita coisa legal! Nanny canina - No caso de o dono do animal ser bastante atarefado e não ter tempo de sair para uma voltinha com seu fiel amigo existem as “nannyes” de cachorro, uma espécie de babá que vai passar o dia cuidando do bichinho de estimação. As nannyes caninas têm a obrigação de brincar e passear com o animal quanto tempo for necessário. O valor para esse serviço é cobrado por hora que, normalmente, custa de 8 a 15 dólares. Honras póstumas - Para quem pensou que após a morte os fieis companheiros são esquecidos pelos seus donos, aqui vai uma importante informação: em São Francisco existe um cemitério para cachorros em um local cercado por verde em uma área tranquila da cidade. Tudo para garantir que os cãezinhos descansem em paz. O cemitério ainda dispõe de serviços de funeral. A única questão que fica em aberto é quanto ao valor do terreno por metro quadrado e quanto é cobrado por estes serviços, pois a empresa responsável não divulgou o valor.

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Assim nasce um símbolo Demétrio de Azeredo Soster e Pedro Dreyer (ilustração) O mundo estava em paz até o dia em que alguém, em plena aula, ainda no início do semestre, disparou à queima-roupa: “E se a gente criasse um mascote para o jornal; um símbolo que represente o Unicom e que possa ser usado em faixas, cartazes e banners?” Claro que todos comemoraram – afinal, o jornal-laboratório nunca havia tido um mascote – e claro que todos se lançaram à tão árdua quanto prazerosa tarefa de escolher um nome e uma forma para o tal mascote. “Um grilo!”, “Uma pessoa!”, “Um cachorro!”; “Um cusco pernudo!”, “Um cusco pernudo e cheio de sarna!”; “Um ...!” O debate cresceu, tomou ares de batalha campal, encheu-se de silêncios mornos e sufocantes, próprios das tempestades que se avizinham, até finalmente tomar corpo: o símbolo do Unicom seria um quero-quero. Por que um quero-quero? Basicamente porque a Unisc é atulhada de queros-quero, mas também porque a moçada estava de saco cheio daquela discussão e queria ir logo para casa. Até aqui, tudo certo. Os problemas se iniciaram quando chegamos à conclusão a) que o bicho deveria ter um nome e b) que de nada adianta um bicho e um nome se ele não tem forma e nem cor. A questão do nome foi facilmente resolvida: abriu-se a votação e ela permanece aberta até agora. Até porque as duas únicas propostas que surgiram – “Tero” e “Bipe” – não são, digamos, nomes lá muito dignos de um símbolo. O problema foi dar forma ao bípede; desenhar o dito. Dizem as más línguas que a vítima escolhida para tal demorou algo em torno de 180 dias para dar conta da tarefa portentosa, haja vista sua complexidade. Como nem tudo é perfeito, e este é um espaço de criação, a gente acha que pode, sim, se permitir; driblar a regra, fazer diferente, mesmo quando isso não é, digamos assim, planejado. Ainda bem. O resultado, vamos combinar, ficou muito legal.


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