O Estado de SP em PDF - Sexta 30072010

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O ESTADO DE S. PAULO

SEXTA-FEIRA, 30 DE JULHO DE 2010

Direitos Autorais. Debate

ECAD REDIGE DOCUMENTO CONTRA PROJETO DE LEI Para órgão, texto do MinC é “perigoso” e dobra limitações a direito do autor ECAD/DIVULGAÇÃO

Jotabê Medeiros

Levado ao olho do furacão pelo debate em torno da nova Lei dos Direitos Autorais (LDA), o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição de Direitos Autorais (Ecad) avisa: vai enviar sua própria proposta de reformulação para o Ministério da Cultura. A revisão da LDA está em fase de consulta pública até 31 de agosto, recebendo contribuições e sugestões. A direção do Ecad informou que, em 2009, distribuiu R$ 318 milhões em direitos autorais de execuçãopúblicamusical,“beneficiando mais de 81.250 artistas, entre eles compositores, intérpretes e músicos”. O Ecad existe há 33 anos (dos quais 12 anos sob adireçãodaadvogadaGloriaBraga, formada pela Uerj e pós-graduada em Gestão de Empresas pela PUC-RJ). O escritório não alivia os críticos: o compositor Tim Rescala, por exemplo, que disse que o órgão é uma “caixapreta”, foi processado. O Estado conversou ontem com Gloria Braga, superintendente-executivadoEcad.Segundo ela, o nó do direito autoral no Brasiléo fatodemuitos usuários de música (rádios, TVs e estabelecimentos comerciais) não pagarem às entidades arrecadadoras. No ano passado, informa o Ecad, R$ 33 milhões deixaram de ser pagos por rádios. ● O anteprojeto do governo de revisão da Lei de Direitos Autorais não tem nenhum lado positivo, em sua opinião?

O projeto tem alguns pontos positivos. Por exemplo: não havia na lei o tempo de prescrição do direito autoral, o tempo para o autor reclamar seus direitos. A nova lei prevê que prescreve em 5 anos. Havia sim algumas coisas para serem sanadas, mas não era necessária uma nova legislação. Na verdade, o que está embasando essa proposta do governo são mudanças conceituais. A lei atual atende plenamente aos interesses dos compositores, apesar de estar sendo demonizada. Por exemplo: o argumento de que teria de ser modernizada para contemplar os novos usos. Mas o Ecad já possui sites que nos pagam regularmente. O que o MinC pretende, sob o pretexto de modificar a lei? ● O que o MinC pretende?

Minimizar o direito do autor, possibilitando que a população em geral possa ter acesso. Mas quem tem que possibilitar o acesso da população aos bens culturais é o Estado, com políticas públicas, e não os autores. ● A lei é abrangente, trata das diferentes áreas da cultura. Por exemplo: na literatura, a sra. deve saber que, no Brasil, raros autores recebem. Talvez uma exceção seja Paulo Coelho...

ÓRGÃO REBATE INFORMAÇÃO DE IVETE ● O Ecad rebateu ontem declara-

ção de Jesus Sangalo (Caderno 2 de sábado), agente da cantora Ivete Sangalo, de que o que ela recebe de direitos autorais é “ridículo”. Segundo o Ecad, nos últimos 5 anos, a cantora recebeu quase R$ 2 milhões em direitos de autor e conexo. No ano passado, no entanto, Ivete saiu do topo das listas – o Escritório informou que a cantora se encontra no 44º lugar no ranking em 2009. / J.M.

lanços, as auditorias, as tabelas de preços, estão disponíveis. E também é fiscalizado pela Receita Federal e pelo INSS. Acabamos de receber uma premiação, da revista IstoÉ Dinheiro, o prêmio de Responsabilidade Social. É uma entidade que paga regularmente seus impostos. ● O governo também diz que o Ecad funciona por meio da coerção, dos processos judiciais. Dizem que vocês têm um exército de 80 advogados.

Temos agentes credenciados em todo o Brasil. O número é menor que 50 escritórios contratados. Nós estamos aqui defendendo os interesses dos compositores, dos músicos. Se alguém viola o seu direito, nós advertimos. Se mesmo assim continua infringindo, nós vamos à Justiça. É isso que os compositores esperam da gente. Hoje temos mais de 400 mil usuários de música cadastrados e somente 1% desse universo tem cobrança judicial. A nossa cobrança é amigável. Mas, quando não tem solução... O Estado publicou um artigo excelente do músico Marlos Nobre que ressalta esse trabalho sério. ● Mas ele também fala que o projeto prevê a extinção do Ecad. E não tem nada disso na lei.

Gloria Braga, 12 anos à frente do Ecad. “É um retrocesso” O nó fundamental é o desrespeito ao direito do autor, e o maior problema é a inadimplência. Se o governo quer ajudar, que resolva o problema. Temos associações e estruturas políticas para tratar de nosso direito de autores. Intervir nisso é um retrocesso histórico. ● Qual será então a proposta do Ecad?

A nossa análise é uma análise global, atenta para as questões conceituais da legislação. As mudanças propostas são muito perigosas para toda a sociedade. Toda lei já possui limitações ao direito do autor, mas esse anteprojeto aumenta, quase dobra, cria outras situações de limitação, abre um precedente muito grande. As licenças nãovoluntárias, por exemplo. Eles

dizem que não se aplicam à música, mas isso não está na redação. E mesmo para outras áreas é absurda. Se você é um autor de livros, o presidente da República vai poder dispor da sua obra. Abre brecha para tudo. ● Os críticos do Ecad apontam para uma gestão pouco transparente do órgão. Por exemplo: recebi cópia de um contrato do Ecad com a TV Globo que recomenda que os termos do contrato não sejam tornados públicos...

Isso é uma figura jurídica que existe nos contratos, para proteger aquele que está pagando os direitos. É comum acontecer isso, mas nas associações há cópias, tem como se informar. O Ecad é fiscalizado por qualquer pessoa que entrar no nosso site, todas as informações, os ba-

Mas os artistas estão sentindo isso pela forma como está proposto. O texto fala em obrigação de se criar suas próprias associações. Além do mais, essas associações musicais e as das obras audiovisuais devem se apresentar juntas, não podem aparecer sozinhas. E que, se a gente não resolver isso em seis meses, o ministério decidirá. Isso é intervenção. O direito autoral no Brasil é uma conquista progressiva dos autores e compositores de mais de 70 anos, e o Ecad só existe há 33 anos. Está ali, trabalhando como uma empresa qualquer, e de repente sofre uma demonização. Mas nós vamos participar (da consulta pública do anteprojeto de lei), não há porque não fazer isso. Nossa posição não foi levada a sério nos eventos que o MinC fez nos últimos 2, 3 anos. Mas vamos enviar um documento maior. Queremos que o MinC veja com tranquilidade nossa posição e nossa discordância.

PARA ENTENDER 1. Reforma ‘vaza’ Em novembro do ano passado, o Estado antecipou o texto do anteprojeto do governo. A notícia repercutiu ruidosamente no 3.º Congresso de Direito de Autor e Interesse Público – projeto previa a criação de um órgão público, o Instituto Brasileiro do Direito Auto-

ral (IBDA) para fiscalizar as associações arrecadadoras;

da Copa do Mundo.

3. 2. Demora na redação Em março, o governo anunciava para abril o início da consulta pública do novo projeto de lei que modificava o direito do autor. Mas o texto só chegou a público pouco antes do início

Aperfeiçoamento Reunidos em congresso no Itaú Cultural, artistas declaram apoio ao projeto do MinC, mas sugeriram pequenas modificações: entre elas, a supressão do artigo que prevê licenças não-voluntárias.

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