Direitos humanos e segurança pública

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DIREITOS HUMANOS E SEGURANÇA PÚBLICA Por Thiago Gomes Nascimento No momento da transição para a democracia e já no período posterior à promulgação da Constituição cidadã, de 1988, no Brasil, foi clara a divisão entre os militantes dos direitos humanos, e aqueles que clamavam por eficiência policial no combate ao crime. Os que estavam do lado oposto dos direitos humanos consideravam-no um empecilho à ação das instituições de segurança pública, sendo que alguns policiais expressavam como sendo uma forma de proteger bandidos; enquanto os militantes dos direitos humanos denunciavam suas constantes violações. Cabe então a indagação, porque este tema, tão importante para a paz social, é encarado de forma distorcida e preconceituosa, em especial por aqueles profissionais que, em primeiro lugar, deveriam ter no respeito aos Direitos Humanos sua bandeira de luta, seu objetivo maior de servir e proteger a sociedade. A polícia é vista como uma instituição ontológica, entretanto ela é composta por pessoas, policiais, que antes de tudo são cidadãos, e na cidadania devem nutrir sua razão de ser. Tornando-se iguais a todos os membros da comunidade, em direitos e deveres (Balestreli, 2003). O operador de Segurança Pública é um cidadão qualificado pelo serviço, representante, por vezes, mais visível e habitualmente encontrada pela população, haja vista o contato direto, servindo o policial de ouvidor social em uma missão por vezes não explicitada. Além disso, está autorizado no âmbito legal a utilizar a força, conferindo-lhe uma diferenciada autoridade tanto utilizada para o amadurecimento social ou para seu extermínio. É evidente a importância do tema para a construção de um Estado democrático de direito, onde as instituições públicas, em particular a polícia, exercem suas atividades com base nos princípios de respeito à dignidade humana; vislumbram-se algumas considerações sobre a falha de percepção do tema Direitos Humanos no meio policial. A primeira proposição que surge para discussão é se tal reação decorre do desconhecimento dos policiais sobre a temática dos Direitos Humanos; a segunda, se os mesmos discordam dos procedimentos práticos e legais de proteção desses direitos, adotados por instituições de defesa dos Direitos Humanos; e a terceira, se ocorre um erro conceitual acarretado pela falta de balizamento teórico sobre as dimensões ideológicas dos Direitos Humanos, seja no campo ético-filosófico, religioso ou político. A disciplina Direitos Humanos só entrou na grade curricular das diversas instituições de ensino policiais do Brasil recentemente, surgindo dá necessidade dos órgãos de segurança pública se adaptarem ao novo modelo democrático vigente. O referido tema está, ainda, sob um manto demasiadamente teórico, cercado de utopia, faltando-lhe uma metodologia para a sua aplicação prática pelos agentes de segurança pública, saindo do campo filosófico para o real. Apesar desse fato, o policial, já ouviu algo a respeito dos Direitos Humanos, mesmo não sabendo da importância que este discurso teria se incorporado a sua profissão, já que ele não enxerga o caráter pedagógico de sua profissão na construção de uma sociedade democrática, deixando de ser um profissional especializado apenas em prender bandidos. A partir da segunda hipótese apresentada, ou seja, se existe discordância entre os policiais a cerca dos procedimentos práticos e legais de proteção dos Direitos Humanos. Faz-se necessário visualizar o tema sem corporativismo ou preconceitos. Buscando explicações para os diferentes pontos de vista, mesmo alguns sendo equivocados. Helena


Singer, pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência USP, alerta que a prática conservadora da penalização faz parte do discurso da militância dos Direitos Humanos. Como ocorre nos casos de abuso de autoridade ou tortura, praticados por policiais, ou nos crimes de violência contra a mulher e nos casos de injúria por racismo. Não que esteja errado buscar um aprimoramento do estatuto penal, mas o que Helena Singer enfatiza é que a penalização se tornou o centro do debate em torno dos Direitos Humanos, e as práticas denunciativas o único instrumento de proteção. A terceira reflexão é no sentido de haver um erro conceitual na percepção dos Direitos Humanos por parte dos policiais, gerando como conseqüências disparidades e críticas a respeito das práticas de proteção desses direitos. Segundo estudiosos, Direitos Humanos é um conjunto de valores que admite interpretações e conotações diversas. Englobam uma gama ilimitada de direitos e deveres do homem para com o homem e por extensão para com a natureza, pois dela depende a humanidade para sua sobrevivência; tem na Filosofia, na História, na Sociologia, no Direito, entre outras ciências, sua fundamentação teórica. Esta visão macro quando não didaticamente dimensionada, produz um grave erro de percepção sobre as responsabilidades individuais, coletivas e institucionais de cada ente da sociedade na promoção, proteção e defesa dos Direitos Humanos. Não individualiza as responsabilidades pelas violações dos Direitos Humanos praticadas, deixando margem à dúvida sobre contra quem devemos nos proteger, ou contra o que estamos lutando para a preservação de nossos direitos como seres humanos. ________________________ Thiago Gomes Nascimento possui graduação em Segurança Pública pela Academia de Polícia Militar de Brasília - Curso de Formação de Oficiais (2005). É pós-graduado em Administração, a título de especialização, pela Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas e pela Escola de Pós-graduação em Economia - EBAPE / EPGE da Fundação Getúlio Vargas - FGV. É pós-graduando em Segurança Pública e Cidadania, a título de especialização, pela Universidade de Brasília - UnB; Bolsista da Secretaria Nacional de Segurança Pública, Ministério da Justiça SENASP / MJ. Atualmente é oficial da Polícia Militar do Distrito Federal.


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