Jornal Ágora n.º 17

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Suplemento do JORNAL DE NOTÍCIAS, de 26 de maio de 2012, não pode ser vendido separadamente

JORNAL UNIVERSITÁRIO LABORATÓRIO DO CURSO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO INSTITUTO SUPERIOR DA MAIA

NÚMERO 17

sábado, 26 maio 2012

A NOVA ERA DO HUMOR


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2 // O A NOVA ERA DO HUMOR

linha curva AMOR COM HUMOR... Luís Humberto Marcos

E

sta edição dedicada ao humor não poderia ser mais oportuna. Por um lado, o humor é aquilo que, mesmo em crise, ninguém nos pode tirar. Por outro lado, celebra-se, neste mês de Maio, o centenário da 1ª exposição de humoristas portugueses, realizada em Lisboa, que constituiu um marco na afirmação do riso, da sátira e do modernismo. Em terceiro lugar, porque estamos efetivamente numa nova era do humor em Portugal. Há uma plêiade de novos valores. A programação humorística entra em todas as grelhas. Não há jornal que se preze que dispense o cartoon. A publicidade inunda-se de humor. Cada vez mais gente vive dele. Este jornal mostra o que se faz e o que se pensa sobre o humor hoje. Alguns dos principais responsáveis por ele falaram aos jovens repórteres. É um jornal rico que nos ajuda a compreender melhor o lugar do humor na sociedade. A crise exercita o humor? Dá-lhe mais espaço? Potencia a criatividade? Claro que sim. Haverá pobreza maior que a falta de humor? O humor inteligente ajuda-nos a pensar. Pode ser um elixir social. E é, sobretudo, um instrumento de afirmação da liberdade. Um ‘desconstrutor’ de preconceitos. Um alimentador da energia cívica. O humor é um pulmão da liberdade. Diz-me o que fazes com o humor e… dir-te-ei quem és. Amor com humor se paga!

Crescimento explosivo de humor nos media N

Ana Lopes e Sandra Pinto

os últimos tempos temos assistido a um “boom” de humor nos meios de comunicação social. Segundo dados da Marktest, os programas de divertimento e humor são o terceiro género mais frequente nos ecrãs dos portugueses. Em termos percentuais, representam cerca de 17,2% da oferta comparativamente aos 22,1% de procura, sendo que a ficção e a informação ocupam os lugares cimeiros do estudo. Estes valores são significativamente mais elevados em relação há alguns anos atrás quando tanto a

procura como a oferta era de baixa relevância. Em termos de humor na televisão portuguesa generalista e canais por cabo podemos encontrar uma dezena de programas. O “Gosto Disto” da SIC, o “Estado de Graça da RTP1 ou o “Bolhão Rouge” do Porto Canal, são apenas alguns exemplos de programas de humor que marcam o panorama televisivo português. A aposta tem sido notável e o humor parece estar intrínseco às audiências que os canais pretendem atingir. Relativamente à rádio, apesar de a oferta ser menor, a quantidade de programas humorísticos é diversificada e tem tendência a crescer. Atualmente, as rádios portuguesas têm

à disposição dos ouvintes alguns programas de humor entre os quais “Nilton”, na RFM; os “Homens da Luta”, na Antena 3 e ainda o “Portugalex”, na Antena 1. A comemorar o seu 6º aniversário e a pensar nos públicos com necessidades auditivas especiais, o “Portugalex” passa a estar também disponível na Internet, com legendagem adaptada. O humorista Ricardo Araújo Pereira tem também uma crónica de humor na Rádio Comercial, no programa “As Manhãs da Comercial”. Na Internet, o tema “humor” é recorrente quando toca a escolher um género de sítio. Exemplos: “pararir.com” ou o “táfeio.com”. ■

HUMOR no ISMAI Entre debates

ficha técnica EDITOR: Luís Humberto Marcos (Coordenador do curso) COORDENADORES: Carla Oliveira e Sandra Mesquita REDAÇÃO: Ana Lopes, Carla Martins , Carla Oliveira, Ivo Silva, João Madureira , José Ferraz, Luís Leite, Miguel Monteiro, Óscar Belo,

António Jorge (Antena 1), Manuel Queiroz (Comentador) e Sandra Pereira (RTP)

Ricardo Pateiro (TSF)

Daniel Oliveira (SIC)

Luís Filipe Borges, Antonio Raminhos e Fernando Alvim

José Diogo Quintela (Gato Fedorento), participação por skype

João Rolo (Estilista)

Sandra Mesquita, Sandra Pinto, Sara Sena, Sónia Oliveira, Tiago Costa, Tiago Romariz GRAFISMO: Cláudio Carvalho ENDEREÇO: Instituto Superior da Maia Av. Carlos Oliveira Campos Castêlo da Maia 4475-690 Avioso S. Pedro Tel. (351) 22 982 53 19 / Fax. (351) 22 282 5319 ONLINE: www.ismai.pt - info@ismai.pt facebook.com/jornal.agora IMPRESSÃO: Naveprinter ISBN: 878-989-97147-8-6

JORNAL ÁGORA

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O Ágora agradece as fotos cedidas por: Agência Reunião, Expresso, Leya: Um Ponto Quatro (Carlos Ramos e Nuno Beja) www.facebook.com/jornal.agora


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“Fui vítima de todas as censuras, perseguições e abaixo-assinados” Estivemos à conversa com a grande figura intemporal do humor português. Irreverente, polémico, apaixonado. Assim é, “o tal”. Herman José avalia o passado e saúda a nova era do humor. Concorrência e variedade evitam a estagnação.

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Miguel Monteiro e João Madureira

seu humor atravessou várias gerações. É considerado por muitos o melhor humorista português de sempre. O reconhecimento é o melhor prémio que pode receber? Eu chamar-lhe-ia um brinde, mais do que um prémio. Não perco muito tempo a analisar o passado. Sou viciado no presente e tenho obsessão pelo futuro. O Herman convive agora com uma nova geração de humoristas. O que trouxeram de novo? Como retrata esta “nova era do humor”? Trazem sobretudo concorrência e variedade, ingredientes essenciais para evitar a estagnação. Sei bem o que sofri na minha fase solitária, em que fui vítima de todas as censuras, perseguições e abaixo-assinados. Também neste caso, a união faz a força. Se recuarmos até a década de 80, encontramos poucos humoristas em Portugal. Hoje, o humor português sofre de uma “overdose”? Eu diria que a fase da “overdose” já passou com o final do “Levanta-te e Ri” em que qualquer jovem a dizer meia dúzia de balelas passava por “stand up comedian”. Estamos agora na fase da depuração. Salvar-se-ão os resilientes e os trabalhadores.

desânimo e até um longo período em que deixei pura e simplesmente de escrever humor. Valeram-me alguns anos a apresentar a “Roda da Sorte” e o “Parabéns”. Foi no final dessa fase, com o “Herman Enciclopédia”, que espicacei a criação de uma equipa autoral que perdura até hoje - as Produções Fictícias-, de onde saíram grupos como os Gato Fedorento. Desde a criação dos canais privados a prioridade televisiva foca-se nas audiências. Isso, por vezes, pode limitar o trabalho dos humoristas. Limitou o seu? Arrepende-se de alguma decisão tomada em função de ganhar audiências?

“Por momentos, sou muito feliz” De muitas. Os últimos anos ao serviço da SIC, podiam ter-me sido fatais. Arrependo-me de todas as decisões tomadas em nome dos números e não em nome da coisa artística. O que ficou por fazer e o que há para fazer no humor em Portugal? Em Portugal está tudo por fazer. É uma democracia muito doente. Sem um sistema judicial saudável, não vale a pena falar em evolução do humor. Hoje em dia, há maneiras bem perversas de calar piadas incómodas senti isso na pele, mais do que uma vez. O Herman já afirmou que regressar à “casa mãe” foi muito saboroso. A RTP é especial para si. Porquê? O que falta à SIC e à TVI? A RTP é a única que ainda admite critérios subjetivos de avaliação. Os privados não se dão ao luxo de perder nas audiências, nem sequer em nome da arte.

“Em Portugal está tudo por fazer. É uma democracia muito doente”

De todas as personagens que criou, qual é a mais “inesquecível”? Eu escolheria cinco que são, até hoje, as que evoco nos meus espectáculos ao vivo: Serafim Saudade, José Esteves, Maximiana, Tony Silva e Nelo.

Viveu uma época de censura. Acha que esses limites que eram estabelecidos estimulavam, ainda mais, a sua criatividade? Numa primeira fase sim, sentia-me desafiado e estimulado. Mas... Água mole em pedra dura, tanto dá até que fura. Tive fases de grande

A personagem Serafim Saudade cantava “sei o que sou e o que sonhei”. E o Herman, sabe? Cada vez sei menos. Há uma doce inconsciência que nos alimenta os sonhos aos vinte e aos trinta anos, mas que com o tempo vai dando lugar a um cruel realismo. Hoje em dia, o meu sonho, é dar sentido ao presente.

Hoje, a quem diria “és tão boa”? À conta bancária do Cristiano Ronaldo. Voltou “à estrada”. Porquê o regresso aos palcos? Por duas razões: a primeira artística. Foi no palco que me fiz artista e perto das pessoas que desenvolvi ideias e personagens. A segunda, económica. Andar na estrada, permite-me fazer televisão por prazer e não por obrigação. A imprensa enche revistas com este tema afirmando que a sua carreira está numa fase descendente. Como reage a isto? Já dizem isso desde 1985, quando fiz o “Hermanias” a seguir ao “Tal Canal”. Quando deixarem de falar de mim, é que terei sérias razões para ficar preocupado. Imagina-se sem trabalho? Sem escrever? Sem público? Claro que sim. Estou preparado para tudo. Para a falência, para a doença, e até para a morte. Para mim, o “copo está sempre meio cheio” até prova em contrário. Deixámos para o fim a pergunta mais importante. O Herman é um homem feliz? Por momentos, sou muito feliz: quando faço amor com a pessoa que amo, quando sou chamado ao palco sete vezes depois de duas horas de espectáculo, quando abro um champanhe gelado no meu barco a caminho do alto mar...■

“Sou viciado no presente e tenho obsessão pelo futuro”

Foto: Agência Reunião


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Um dia na Produções Fictícias

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Carla Oliveira

ercorro o corredor e sinto o cheiro de uma agência familiar muito acolhedora. Conversa ali, conversa aqui e, num instante, sou recebida por Nuno Artur Silva, fundador da empresa. O café anima o diálogo descontraído que logo se estabelece. Apenas havia quatro colaboradores quando a PF começou a funcionar. Além da empresa contar com um “staff ” de 12 pessoas permanentes, tem à sua disposição cerca de uma centena de colaboradores. A empresa tem crescido em termos de áreas de intervenção e está estacionária em termos de faturação. São 10h e os colaboradores empenham-se a desenvolver os vários projetos. A jornada é longa. Até às 19h muito se tem a fazer. A produtora liderada por Nuno Artur Silva é responsável por vários projectos como os Gato Fedorento, Os Contemporâneos, ContraInformação, Inspetor Max, o homem que mordeu o cão, o Inimigo Público, o Eixo do Mal, o Conversa da Treta e diversos programas apresentados por Herman José. No 2.º andar encontramos o camarim do agora Herman 2012, onde é feita toda a produção do programa. A PF produz vários programas. Na RTP, com “Estado de Graça” e “Herman 2012”. Na Antena 1, com “Portugalex”. No Canal Q, são produzidos e lançados outros conteúdos. Da sede rumamos em direção aos estúdios do

Canal Q, que ficam do outro lado da rua (perto do jardim das Amoreiras). “É AQUI” – Lê-se na porta principal que nos levará a descobrir o espaço. Os cenários estão a ser preparados. A maquilhagem está feita. Os apresentadores aproveitam para ler mais uma vez o guião. No deslumbre, sentimos o cheiro. Será queijo? Será...? Numa mesa vê-se um delicioso queijo a ser cortado. Será para o lanche? Nada disso. Estão a cortar o queijo e o pão às fatias para o programa que vai para o ar. O ambiente é harmonioso. Todos trabalham. “Quando estiveres pronto, podemos começar.” É aí que olhamos com mais atenção e vemos a ser preparado o cenário do conhecido programa humorístico INFERNO, um telejornal diário que pretende satirizar a atualidade noticiosa. Sentado está o apresentador Pedro Vieira, conhecido na blogosfera graças a blogs como o «Arrastão». À saída, equipamentos no chão. A intuição confirma-se. Entre as novidades do Canal Q, destaca-se o programa «Caça ao Cómico», com Rui Unas. Os colegas estão de saída para gravar a peça “TMN Caça ao Cómico”, na sala de espetáculos, onde Rui Unas é o apresentador. Interessante, não? Um programa “TMN Caça ao Cómico”, no Canal Q, que tem como objetivo caçar mais aspirantes a cómico. Um programa que já teve Fernando Alvim e Zé Diogo Quintela como convidados. Assim termina a longa viagem aos bastidores do Canal Q, o novo “brilhozinho nos olhos” da PF. Um exemplo de como a criatividade pode vencer a crise.■

Preparação de mais um programa

Depois da visita, o ÁGORA esteve à conversa com Nuno Artur Silva, fundador da Produções Fictícias

a ditadura no século XX, o que faz com que frases como “o respeitinho é muito bonito”, tenha muita força em Portugal. Ainda temos uma sociedade muito resistente ao humor e muito seguidora desse princípio salazarista.

ual foi o projeto que lhe deu mais gozo conceber? Se pudesse fazer batota, diria que o projeto que me deu mais gozo foi as Produções Fictícias no seu conjunto. Se eu tivesse de escolher um, escolheria o último que se chama Canal Q.

Um pouco conservadora? Sim, Sim…

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O lançamento do canal Q foi uma forma de desafiar a crise ou teve outro motivo? Quando o canal Q foi lançado, a crise mal tinha começado. Portanto, não podemos dizer que o canal Q surgiu contra a crise, podemos sugerir que nasceu com a crise e que, de certa maneira, é também uma resposta à crise. Os projetos que têm avançado são aqueles que oferecem menos risco. Mas sente os efeitos da crise? Sim. Sentimos, desde logo, a retração do mercado publicitário, uma quebra de encomendas. Felizmente, não nos podemos queixar muito. Ainda estamos em atividade e temos boas perspetivas. Como é fazer o humor como profissão? Sabe que o humor acabou por acontecer, no meu caso particular, quase como um acidente. As próprias Produções Fictícias foram fundadas num âmbito mais lato do que o humor, que era fazer ficção, contar histórias. Aconteceu que o humor teve saída e, portanto, tornou-se desde o início o nosso “core business”. Fazemos outras coisas mas é o humor que tem alimentado a empresa e a atividade dos principais elementos ligados a ela.

Pedro Vieira, momentos antes de ir para o ar e Nuno Artur Silva no dia a dia de trabalho

O humor é reconhecido devidamente em Portugal? Aconteceu uma coisa em Portugal, sobretudo nos últimos 10 anos, que foi o surgimento de uma nova geração de humoristas, muitos deles vindos da área da escrita, que ganharam um grande protagonismo mediático. Contudo, Portugal tem uma história que dificulta um pouco esta ideia da comédia. Primeiro, o facto de sermos um país com tradição católica e muito moralista. Segundo,

Apesar disso, ainda é fácil fazer os portugueses rirem? Eu resisto muito à ideia de considerar os portugueses como um grupo único e identificável. Acho que o perfil sociológico de Portugal tem estado a mudar. Com ele muda também o género e o estilo do humor dominante. Qual é a parte mais difícil quando se faz humor? A necessidade de ter de produzir riso diariamente por obrigação e, portanto, transformar isso numa profissão, é um desgaste rápido como o futebol. Por isso, é normal ver, ao fim de uns anos, os humoristas a mudarem de atividade. No meu caso, por exemplo, durante dez anos escrevi diariamente como autor, depois tornei-me director criativo e evoluí para outras áreas que têm a ver hoje mais com a direção e a gestão do que propriamente com a autoria. Que conselho daria aos jovens que desejam ser humoristas? O conselho que qualquer humorista dará a outros humoristas é não seguirem conselhos de humoristas mais velhos. (Risos) O Teris Jones do Monti Pyten deu este conselho ao meu filho quando veio cá. Cada pessoa que quer ser humorista sabe muito bem o que tem de fazer. Está nos genes? Não sigam conselhos… Conhece algum caso de um político que não tenha reagido bem a uma peça? Conheço vários. Um dos exemplos mais flagrantes de político tão absolutamente vaidoso e desprovido de sentido de humor é o Manuel Maria Carrilho. É um exemplo entre vários. Há outros que fingem que têm fairplay mas não têm. ■


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“Sem Gaspares e sem Passos Coelhos eu morria à fome” Em março deste ano, Luís Pedro Nunes festejou 22 anos de carreira. Iniciou-se como estagiário no Público, na equipa inicial criada em 1989. Atualmente, tem três trabalhos de grande visibilidade: uma crónica no Expresso, o programa “Eixo do Mal” na SIC e o Inimígo Público, no qual é Diretor. Dispensa formalidades e aprecia uma boa conversa.

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o Inimigo Público, leêm o Público. Basta lerem a manchete do jornal, têm os elementos para descodificar as piadas, podendo achar ou não graça.

Carla Oliveira

ual é o trabalho que lhe dá mais prazer fazer? O “Eixo do Mal” tem momentos em que as coisas estão a correr melhor, sei lá, é mais divertido. A crónica no Expresso é uma crónica mais pessoal, só minha. Acaba por ser mais estimulante. Quando é que sentiu que tinha veia humorística e decidiu fazer dela sua profissão? Eu não acho que tenha uma veia humorística. O Inimigo Público conta com uma equipa de humoristas e eu como sou jornalista e aos 24/25 anos já era editor do Público, faço um pouco a coordenação dos humoristas na linha do jornal. Tenho alguma tendência para a “piadola”, mas não sou um humorista de base. Quais são os seus mentores de referência a nível do humor mediático? Na escrita e na maneira de encarar a realidade, na geração das pessoas que começaram a escrever profissionalmente nos anos 90, não há como o Miguel Esteves Cardoso. É uma pessoa que rompe e rasga com toda a escrita, a seca e a desinteressante que havia na altura. Que características, em sua opinião, se deve possuir para escrever um bom texto de humor? Não sei, não sei... Há uma técnica associada ao humor mas depois há também uma estratégia mental, há uma maneira de olhar. Só certas pessoas conseguem olhar para a realidade e colocá-la numa frase... Ou seja, uma palavra pode levar ao sucesso ou ao insucesso? Completamente. Às vezes, tirar um não ou colocar um não determina o sucesso ou o insucesso de uma boa piada. Se a piada tiver um não, não tem piada. Se retirar um não, tem piada. É uma coisa extraordinária. É preciso fazer preparação, entrega e “perceline”. Mas para fazer bom humor é preciso ler também jornais, não é? Quem faz um jornal que é uma cópia “perversa” de um outro jornal tem de ler jornais. Isso também nos facilita muito a vida, porque, em princípio, o humor vive do reconhecimento. Partirmos do princípio que os que leêm

Que tipo de humor preza mais? O de ironia, sarcasmo ou de zombaria? Neste momento, o meu problema é as pessoas estarem todas viradas para o mesmo tipo de humor. As pessoas como estão muito zangadas com a realidade, com a vida, efetivamente, perderam a capacidade de rir de si próprias. Depois querem liderar movimentos de indignação contra os humoristas. Acho isto uma imbecilidade e este é o momento de grande crise. Já houve algum movimento contra o Inimigo Público? Não. Mas nós reparamos nisso. No facebook cada vez há mais pessoas a dizer “vamos acabar com estes tipos”.

Passos Coelho e Gaspar. Nós já andamos atrás de primeirosministros desde o Barroso. Os políticos são o nosso ganha-pão. Poucas vezes posso dizer isto, mas eu ganho a vida à conta do Gaspar. Sem Gaspares e sem Passos Coelhos eu morria à fome. O que é uma coisa... Também utilizam muito a fotomontagem... Não. Nós só utilizamos a fotomontagem, praticamente.

Foto: EXPRESSO

“Um dos meus princípios é não conhecer nenhum político”

O seu jornal anda muito à volta dos políticos. Como é que escolhem os alvos? É fácil. O Inimigo nas últimas capas tem sido

Têm tido reações por parte dos políticos atingidos? Não... nós o que tivemos até agora foi pessoas a pedir as fotografias originais para colocarem em quadros, na casa. Os políticos coitados... Não têm grande poder de reação. As pessoas que mais reagem mal são dos pequenos poderes, ou seja, são as Juntas de Freguesia, as Associações... Agora os políticos, não têm como se defender de nada.

Têm de tratar do país? Não, não. Os políticos é que não podem reagir a nada. Eu até tenho pena deles, a sério. Não é vida que se deseje. Um dos meus princípios é não conhecer nenhum político. O que me facilita a vida.

Curso inovador: 6 semestres de tecnologias

O lema do suplemento do IP é “Se não aconteceu... podia ter acontecido”. Como surgiu e qual foi o propósito deste lema? Foi, rapidamente, num dia... já nem me lembro como é que foi... Foi há tantos anos. Foi uma ideia entre a equipa? Não, foi minha. O público reconhece o humor jornalístico com a mesma intensidade que reconhece o humor literário de Bocage e de Eça de Queiróz? Não, nem tem de reconhecer. O humor destes dois escritores é imortal. O nosso é um humor de jornal. Como é visto o humor em Portugal? Eu acho que é de fases. Às vezes, é excessivamente sobrevalorizado. Os humoristas são reconhecidos em Portugal? Às vezes, são excessivamente reconhecidos. Há muito humorista e pouco humor de qualidade. Qual é a marca distintiva do humor português em relação ao humor internacional? Neste momento, não há nenhuma marca distintiva. A Internet nivelou tudo isso. Parece-lhe que o humor cresce à medida que a crise também aumenta? Não sei... acho que isso depende dos povos, depende do momento, depende das circunstâncias. Os portugueses não são previsíveis. Existem já algumas mulheres a fazer humor. Como classifica o humor delas? Existem, sim. É um mistério a questão das mulheres do humor. Há N teorias sobre o assunto. (risos) São mais complexas? É uma carreira com muito palavrão, que “chafurda” muito no iconoclástico. Deve ser-se um pouco “amoral”. Se calhar uma mulher tem uma moral mais certinha, mais sólida, não sei... Tem uma outra sensibilidade? Os homens são mais incensíveis. (Risos) ■


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“Eu gosto da rádio porque dá mais valor ao texto”

Era diretor financeiro de uma empresa de engenharia quando decidiu largar tudo pela comédia. João Quadros é hoje uma das maiores referências do humor nacional. O humorista explica-nos como é fazer humor na rádio e fala-nos do projeto “Tubo de Ensaio” (TSF).

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Texto: José Ferraz - Foto: LEYA

que é que mudou na forma de fazer humor na rádio? A censura. Quando comecei a escrever, a censura começava em Fátima e ia por aí fora. Hoje a censura é financeira. Não se pode fazer piadas ao BES porque o BES emprestou dinheiro àquela empresa. Não se pode dizer mal da Popota porque a Sonae é o principal patrocinador daquela TV. Connosco não acontece porque as tentativas que houve resultaram sempre mal para quem fez as pressões e sabem que é melhor não fazer para não terem chatices. O que torna o humor na rádio tão diferente do humor que é feito na televisão? A possibilidade de fazer tudo e de poderes ser quem quiseres. Não dar a cara e dar a voz, também permite ir mais longe. Consegues imaginar a rádio sem o humor? Normalmente não oiço rádio e evito ouvir humor. Mas tenho acertes que o humor na rádio é muito importante. Acaba por fazer mais companhia do que o humor televisivo. O humor na rádio está em risco de desaparecer?

concentram-se na piada, no que está escrito.

Cada vez se ouve mais rádio, essa é que é a verdade. Desde que começamos na TSF já quadruplicámos a nossa audiência. Pelo contrário, acho que a rádio é aposta para os próximos anos porque não exige produção. Podes ter um helicóptero ou um porta-aviões num sketch porque o som não custa dinheiro. Na rádio é possível fazer o que a televisão não permite.

Como começou o projeto “Tubo de Ensaio”? Depois do espectáculo que escrevi para (e com) o Bruno Nogueira - “Sou do Tamanho do que Vejo” - a TSF convidounos. Eu já lá tinha feito vários anos de Herman.

Porque deram o nome de “Tubo de Ensaio” ao programa? Eu queria que se chamasse “Temporada Quais são as prin“Se eu interpretasse os meus de Caça” mas o Bruno cipais dificuldades textos ganhava dez vezes mais” escolheu “Tubo de enem fazer humor na saio”, partindo da ideia rádio? que aquilo era mesmo Na televisão é muito um tubo de ensaio onde experimentávamos mais complicado! Eu gosto da rádio porque dá tudo mesmo que rebentasse na nossa cara. mais valor ao texto. Sem imagens as pessoas

Nos textos que escreves, preferes não dar a voz e na televisão pouco apareces. Tens medo dos holofotes? Não. A minha “entrega” do texto não é boa como a do Bruno. E há outro motivo: Prezo a minha privacidade. Claro que se eu interpretasse os meus textos ganhava dez vezes mais. Mas, entre o aparecer e o haver, acho que não compensa. O programa é controlado? Nada controlado. Tenho carta-branca do diretor da TSF para fazer o que quero. É assim desde o primeiro dia. Se não fosse assim não teríamos aceitado o trabalho. O que te levou a seguir uma carreira na comédia? Licenciei-me em Gestão Financeira, fiz pós-graduação em Gestão de Recursos Humanos, era diretor financeiro de uma empresa de engenharia quando decidi largar tudo. Sempre gostei de escrever e achava que o meu sentido de humor era o meu ponto mais forte. Em termos profissionais, devemos sempre apostar naquilo que à partida fazemos, ou achamos que fazemos, melhor que os outros. ■

PEDRO SOARES, O rapaz das vozes Com mais de 400 mil visualizações no Youtube, ele é a mais recente promessa do humor português. Pedro Soares falou com o Ágora e promete partilhar o prémio do Euromilhões com todos os seus seguidores no Facebook, caso ganhe… e jogue.

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Carla Martins e Tiago Romariz

uando surgiu a tua paixão pelas imitações? Em criança eu já era conhecido como um contador de anedotas e, para conseguir ser engraçado, interpretava várias personagens. Mais tarde, comecei a imitar a papel químico sketches dos “Gato Fedorento” e do programa “Telerural” e a apresentá-los à família e aos amigos. Mas só com 14 anos é que comecei a interessar-me pela imitação da voz das pessoas. Uma vez, ao ver o Paulo Portas na televisão, comecei por imitá-lo e a imitação foi muito bem-sucedida e os meus pais adivinharam quem eu estava a imitar, mesmo sem eu, dizer. A partir daí, fui ganhando o gosto. Trata-se de um talento que nasceu contigo? Eu acho que aquilo que nasceu comigo foi a vontade de fazer rir as pessoas, porque desde pequeno que tento fazê-lo no dia-a-dia. Tens algum critério na escolha das tuas personagens? O critério passa pela tentativa de imitar pessoas mediáticas, aquelas que toda a gente conhece. Mas é um processo muito instintivo.

Quais são os mais difíceis de imitar? E os que mais gostas? O João Malheiro e o José Hermano Saraiva são aqueles que me cansam mais a voz. É difícil escolher a pessoa que mais gosto de imitar, mas geralmente a imitação do Alberto João Jardim é a que causa mais impacto. Fala-nos um pouco do teu percurso e dos aspectos que têm maior destaque. Tudo começou quando coloquei alguns vídeos de imitações minhas no Youtube. Entretanto, fui convidado para ir à Benfica TV, e a partir daí os convites para vários programas foram surgindo, entre os quais o “Caça ao Cómico” e o “5 para a Meia-noite”. Daí surgiu um convite do Luís Filipe Borges para atuar num espectáculo com ele e com o António Raminhos, em Braga. Em 2011, fui contactado pelo Miguel Bello (dono da agência Brainmusic) para ser agenciado por ele. Desde aí tem sido sempre a subir. Entrei para um projeto chamado “Loja de Comédia”, que tem como figura de destaque o mestre Herman José. Como te sentes quanto ao reconhecimento dos Portugueses? O mais gratificante é quando as pessoas me

dizem que as consigo fazer rir e que gostam das imitações. Com as dificuldades dos dias de hoje, rir é sem dúvida o melhor remédio.

O que desejas para teu futuro? O meu grande desejo para o futuro não é segredo nenhum, é ganhar o Euromilhões. O outro objectivo é conseguir trabalhar a nível profissional no

Tens novos projetos? “A idade é algo que joga Neste momento a meu favor” estou a trabalhar com o Miguel Bello e mundo da comédia. inserido na “Loja de Comédia”. Semanalmente, tenho uma pequena rubrica na rádio chamada Consideras pertencer a uma nova era de “Antena Minho”. humor em Portugal? Tento não pensar muito nisso e continuar a Achas que a tua idade constitui algum imtrabalhar e a treinar para melhorar cada vez pedimento a uma maior evolução? mais. E é claro que, no futuro, espero deixar Pelo contrário, penso que a idade é algo que de ser uma promessa e afirmar-me definitivajoga a meu favor, pois tenho mais tempo para mente no humor. ■ evoluir.


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“O verdadeiro comediante é uma prostituta

Hugo Sousa é comediante profissional desde 2004 e licenciado em Educação Física, mas nunca trabalhou na área em que se licenciou. Gosta de fazer rir e de tostas mistas em pão normal.

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Ivo Silva, Óscar Belo

referes televisão ou palco? Neste momento, uma e outra coisa estão associadas ao Bolhão Rouge porque é gravado num espectáculo ao vivo. Mas obviamente, o que gosto mais é de espectáculos ao vivo. Para quem está habituado a atuar em palco, fazer um programa num estúdio é algo mais falso, porque não há a reação instantânea do público.

Com quem gostas de partilhar o palco? No fundo, o verdadeiro comediante é uma prostituta da comédia porque nós trabalhamos seja com quem for. Em stand up comedy entra um e sai outro.

Os textos são da tua autoria? Sim, todos, à excepção das peças de teatro cómico em que escrevemos todos em conjunto.

Quando o público não reage bem ao espectáculo, o que fazes? Existem vários fatores para que o espectáculo não corra bem. Por exemplo, num teatro está tudo controlado, mas num bar, numa terreola,

podes apanhar bêbedos, idosos, pessoal que chega lá e se calhar nem sabe que vai haver um espectáculo. Por exemplo, um espectáculo no Alentejo numa altura que não o verão, onde vais apanhar putos e velhos, que não são muito o meu target. Os putos não apanham as piadas e os mais velhos não têm um cérebro muito formatado para aquilo. Mas temos sempre as piadas no saco preparadas para esses momentos. Esse é o verdadeiro trabalho de comediante. Eu faço de tudo, menos para putos! Onde vais buscar a inspiração? Vou buscar a tudo, a situações do dia-a-dia, não vou muito por atualidades. Gosto da piada de circunstância, de observação, quando vais a conduzir, quando vais a farmácia, piadas intemporais. Aquelas que podes dizer hoje e daqui a dez anos e têm sempre piada. Imagina que te esqueces do guião. O que fazes? Acontece imensas vezes. O truque é fazeres com que o público não se aperceba, ou por vezes dizeres que te esqueces também tem piada (risos). Outro truque é estares a falar desse tema e se te esqueceres avanças para outro.

da comédia” Nunca trabalhaste na tua área? Nunca trabalhei, nada, zero. Só dei aulas no estágio. (risos)

Isso acontece-me tantas vezes. Quando percebeste que tinhas um dom para a comédia? Desde puto que me fascina a arte de fazer rir. Surgiu a oportunidade de começar com anedotas em 1999, num bar em Miragaia e até achei piada. Quando percebi isso, decidi começar a escrever as minhas próprias piadas. Quando tive material suficiente para fazer um espectáculo sem anedotas, abandonei-as por completo. Foi aí que deixaste de lado o teu curso de Educação Física? Por acaso coincidiu. Havia um tempo em que fazia comédia enquanto estudava. Foi no último ano de faculdade e já andava nesta vida, de um lado para o outro a fazer stand up. Depois acabei o curso e nunca fiz nada.

A tua disposição matinal influencia os espetáculos? Normalmente acordo mal disposto. Gosto de dormir e custa-me como o caraças acordar. Mas se perguntares se estou num dia menos bom e tenho de fazer um espectáculo, oh pá, não interessa, tenho de chegar ao palco e abstrair-me de tudo. O humor ensina-se ou nasce connosco? Nasce mas também se ensina. 90% da piada que um comediante tem vai do trabalho de casa, não vai da inspiração. A inspiração pode vir do momento. Depois de preparares o texto guardas as piadas boas, tiras as más e corriges as médias. O stand up é o teu trabalho a full time? Sim, desde 2004. Só se um dia em que a crise atinja um ponto em que seja impossível fazer isto. Tenho feito teatro de improviso, comédia de improviso. Algo que adorava era apresentar um “talk show”, porque tem muito em comum com a comédia. ■

“Tenho mais piada do que muita gente da [TV] generalista” Salvador Martinha é uma das grandes promessas do mundo da comédia em Portugal. Como co-autor e colaborador, já se envolveu em diversos projectos e é agora no Canal Q, com o programa “Nada de Especial”, que se dá a conhecer aos telespectadores. Sónia Oliveira, Sara Sena, Tiago Costa

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uem se esconde por detrás de todas as piadas? Como te defines Salvador? Um pessoa que procura fazer peças excelentes e que ainda não fez nenhuma. Mas vai fazer. Não acabaste o curso de Publicidade. Pretendes terminá-lo? Acho que não, para quê? Devia era tirar um curso de Filosofia que é bem mais perto daquilo que faço. O mundo da comédia é um mundo complicado? É uma guerra. A minha guerra é pelos meios. Quero mais meios para fazer melhor, em televisão não dependemos só de nós para sermos excelentes. Qual foi a tua primeira aparição? Teatro São Luiz, 31 de maio de 2003. Foi bizarro. Consideras ser um artista procurado pelos portugueses? Mais ou menos. Na rua e nas redes sociais, sou sempre abordado com carinho. Mas tenho poucos views. Devia ter mais…

Alguma vez te passou pela cabeça ser algo que não comediante? Ser rico, mas não seria feliz. Preferes stand-up comedy ou televisão? Gosto muito das duas. Gosto de ir variando. Mas em palco toda a gente é mais feliz. Porque lá as coisas são verdade. Estás neste momento no canal Q a fazer o programa “Nada de Especial”. Que mensagem deixarias aos portugueses para que assistam ao teu programa? Muito obrigado por assistirem. E não pensem que um programa num canal pequeno tem menos qualidade do que um programa da televisão generalista. Tenho mais piada do que muita gente da generalista, não tenho uma dúvida disso. “Em televisão

não dependemos só de nós para sermos excelentes”

Achas que neste momento estamos perante uma “nova era do humor”, onde o mundo da comédia está diferente de há uns anos atrás? Há muita mais gente a fazer e muito mais gente com o desejo de fazer. A Internet vai mudar isto tudo. Toda a gente pode fazer humor. Toda a gente. ■


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última // A NOVA ERA DO HUMOR

“Em tempos de crise rir é uma das poucas coisas que, por enquanto, não paga imposto”

JORNAL ÁGORA

SÁBADO 26/05/12

Bolhão Rouge é comédia de início ao fim! Sónia Oliveira, Tiago Costa, Sara Sena

Já conta com mais de 50 anos de carreira. Colaborou com várias publicações, foi perseguido pela censura e atualmente desenha o Cartoon da Semana do Semanário Sol. Augusto Cid falou ao Àgora da sua carreira, do humor e da evolução do cartoon nos últimos anos.

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Sandra Mesquita

uando surgiu o gosto pelo desenho humorístico? Sempre desenhei cartoons sociais para várias revistas mas foi apenas quando fui bolseiro nos Estados Unidos, na Califórnia, que dei conta de que era possível criticar e ridicularizar os políticos e não sofrer consequências.

Como é ser cartoonista? Ser cartoonista é sofrer na pele a incompreensão de muita gente que desconhece a verdadeira função de um cartoonista. É ser constantemente acusado de ter ódios de estimação e de ter uma fixação pessoal em determinados políticos, quando afinal a nossa função é incomodar.

Se pudesse descrever a sua profissão numa palavra, qual seria? A única palavra que me ocorre é «chato».

Qual é o perfil de um bom cartoonista? Basta saber desenhar para ser um bom profissional da área? Um bom cartoonista tem que ser um bom observador acima de tudo. É evidente que convém que saiba desenhar tal como alguém que vai entrar numa competição de natação convém que saiba nadar.

“Não aconselho a que sigam os meus passos porque eles muitas vezes vão dar aos tribunais”

Quais são as principais dificuldades que um cartoonista enfrenta atualmente? Apesar de já vivermos, há cerca de 38 anos, numa espécie de democracia que é muito jovem, esta profissão continua a ser mal compreendida e tratada com alguma injustiça. Hoje em dia, as tecnologias permitem pegar numa fotografia e transformá-la numa caricatura, às vezes muito bem conseguida, mas sem que o seu autor saiba minimamente desenhar.

E quando não tem ideias, o que faz? O criativo, que é o caso do cartoonista, nunca deve chegar à situação de não ter ideias. Ideias existem sempre, podem é não ser as melhores. Como caracteriza cada desenho seu? Eu prefiro que sejam outros a avaliar os meus trabalhos, de qualquer maneira um cartoonista quando acaba um desenho esquece-o de imediato e a sua preocupação recai sobre o próximo desenho. Em toda a sua carreira, qual foi o cartoon que gostou mais de desenhar? O cartoon que gostei mais de fazer é sempre o último cartoon que fiz. Isto é, eu ponho todo o meu esforço e empenho nos desenhos que faço e o último é sempre o mais importante. Quais são as principais diferenças entre a arte do cartoon há uns anos atrás e agora? Digamos que o cartoon político evoluiu bastante nos últimos 50 anos. É mais incisivo, podemos dizer que é mais cruel. Procura mais o sentido do ridículo e economiza mais em texto.

Em tempos de crise, rir é o melhor remédio? Claro que em tempos de crise rir é uma das poucas coisas que, por enquanto, não paga imposto. Mas se será um remédio eficaz também tenho as minhas dúvidas…

O povo português tem sentido de humor? É evidente que o povo português, como qualquer outro povo, tem o seu sentido de humor muito próprio. Infelizmente, o português tem mais queda para o humor brejeiro e menos educado. Isto porque o humor também se educa e felizmente há sinais no horizonte de que há alguma evolução na qualidade do humor em Portugal.

Que conselho daria a um jovem que queira seguir os seus passos? Não aconselho a que sigam os meus passos porque eles muitas vezes vão dar aos tribunais. Podem tentar ser deputados mas aí vão fatalmente cair nos passos perdidos. Resta seguirem os passos do coelho porque o pior que vos pode acontecer é um dia serem primeiros-ministros. ■

V Congresso Estudantil de Comunicação: Conta-me como vai ser RESISTO! – foi esta a resposta de Manuel Tavares, diretor do JN, à pergunta de um jovem sobre a forma como lida com as pressões do poder político e económico. Manuel Tavares participou, na passada 4ª feira, na abertura do painel sobre Jornalismo do V Congresso Estudantil de Comunicação, que decorre no ISMAI até ao dia 29. Na sua intervenção, o diretor do JN falou sobre o panorama mundial dos media e mostrou dados positivos sobre o impacto da internet. No final, fez um apelo: “Tragam ideias novas”.

Às 23h de domingo, todas as semanas sem excepção, começa a emissão em direto do programa. Tudo está a postos. Os comediantes descansam antes da emissão e dão uma palavrinha bem-humorada aos que se deslocam aos estúdios do Porto Canal, na Senhora da Hora, no Porto, para assistir ao programa. Muitas são as caras habituais, como se fizessem parte da mobília do programa. O àvontade é imenso. Entramos no estúdio e o espaço é reduzido. Duas bancadas para o público assistir, um cenário real com tamanho não proporcional àquilo a que a televisão nos habitua. Vai começar o espectáculo: 5 .. 4 .. 3 .. 2 .. 1 .. E “Está no Ar” o programa! O profissionalismo das três caras do programa é notável. Embora com uma equipa de produção e realização pequena, tudo é preparado meticulosamente para que seja um verdadeiro sucesso. Sr. Limpinho, sketches, momentos de stand-up comedy, música e alguns convidados especiais, são parte do alinhamento do programa com acréscimo de um público animado e dinâmico. “A nível de Stand-up comedy, não há nada na televisão, excepto o nosso programa, que às vezes passamos sketches”, declarou Miguel 7 Estacas no final da emissão. Os três comediantes do programa sublinham também a falta de espaço para comédia na televisão por cabo portuguesa. Stand-up comedy é a área mais aliciante para os três mosqueteiros do Porto Canal. Segundo Hugo Sousa, João Seabra e Miguel 7 Estacas, “em directo é o que sair”. O clima pós-emissão é relaxado. Arrumamse as “tralhas” e já após a meia-noite é hora de abandonar o estúdio. Mas antes não pode falhar uma palavrinha com aqueles que assistiram à emissão dentro do estúdio dando voz às gargalhadas que os três comediantes proporcionaram. Os “tolinhos” ou “cromos”, como são apelidados na rua, confidenciaram acreditar na existência de uma “nova era do humor” iniciada pelo programa “Levanta-te e Ri”, no qual participaram, e acreditam que uma “nova era do humor” “Há e vai haver sempre! […] A Internet e o YouTube dão acesso a outro tipo de humor que vai sendo criado e aprofundado”. Os portões começam a ser fechados, um pézinho fora dos limites dos estúdios e uma vontade imensa de voltar para dentro e assistir a mais uma hora de gargalhada garantida.


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