Boletim BMJ nº 9 - Agosto 2016

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N° 9 - AGOSTO 2016

BOLETIM BMJ COMÉRCIO INTERNACIONAL

UNCLE SAM WANTS YOU OUT! Como os discursos protecionistas de Trump e Hillary podem afetar o comércio global

PROTECIONISMO

PRÉ-SAL

COMÉRCIO EM FOCO

Por que ainda apostar na OMC?

Entenda o projeto de lei que promete tonificar a produção

Principais indicadores de interesse sobre a África do Sul

UBER Inovação e tecnologia disruptiva no Brasil


ÍNDICE

expediente

ÍN DI CE

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Opinião: por que ainda apostar na OMC? Inovação tecnológica e regulação: o que a revolução industrial e o Uber têm em comum? Entrevista BMJ: Mauricio Santoro analisa os discursos dos candidatos presidenciais norte-americanos Infográfico: Como funcionam as eleições nos EUA Comércio em Foco: África do Sul O Pré-Sal precisa da Petrobras? O que aconteceu na OMC

Um produto da Barral M Jorge Consultores Associados Diretoria Barral M Jorge Miguel Jorge Welber Barral Editora Andrezza Fontoura Camilla Azeredo

Jornalista Responsável Camilla Azeredo

• Boletim BMJ

Colaboradores Edgard Vieira Jorge Sotto Mayor Matheus Andrade Mauricio Santoro Monica Rodriguez Renata Amaral Victor Brandão Diagramação Caroline Castelani


EDITORIAL

editorial Camilla Azeredo

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m uma época de desconforto político em boa parte do mundo, a edição de agosto do Boletim BMJ traz em sua capa os candidatos às eleições dos Estados Unidos, que ocorrerão em novembro deste ano, e como seus pleitos eleitorais protecionistas podem afetar o comércio global. As informações foram fruto da entrevista especial feita pela Consultora em Comércio Exterior Monica Rodriguez com Mauricio Santoro, doutor em Ciência Política e professor de Relações Internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Para abrir a 9ª edição da nossa revista de Comércio Internacional, Renata Vargas, Coordenadora de Comércio Internacional da BMJ, nos presenteia com o artigo de opinião “Por que ainda apostar na OMC?”, no qual apresenta reflexões, em consonância com a entrevista de capa, sobre os diferentes desafios enfrentados para liberalizar o comércio em um mundo cada vez mais protecionista. Em seguida, em “Inovação tecnológica e regulação: o que a Revolução Industrial e o Uber têm em comum?”, Jorge Sotto Mayor apresenta o embate de opinião entre o setor industrial e a população

consumidora de bens e serviços no que diz respeito à regulamentação de tecnologias inovadoras. Além disso, Victor Hugo Brandão dialoga sobre o Projeto de Lei 4567 de 2016 que põe fim à obrigatoriedade de atuação da Petrobras como operadora única das áreas do Pré-Sal. O artigo explica os benefícios e o impacto produtivo para o Brasil da aprovação do Projeto em tramitação no Congresso Nacional. Ainda nesta edição: divulgamos dados comerciais relativos à África do Sul e também os acontecimentos do último mês na OMC em relação a negociações e disputas comerciais.

Boa leitura!

Camilla Azeredo Coordenadora de Comunicação

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COMÉRCIO INTERNACIONAL

POR QUE AINDA APOSTAR NA OMC? Renata Vargas Amaral

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m meio a muita balbúrdia a respeito da relevância (ou não) do sistema multilateral de comércio hoje representado pela Organização Mundial do Comércio (OMC), valem a pena algumas reflexões sobre os diferentes desafios enfrentados para liberalizar o comércio em um mundo cada vez mais protecionista. A OMC é, há pouco mais de duas décadas, uma história de sucesso. São muitas as vitórias contabilizadas pelo sistema, muitos os louros em diferentes áreas administradas pela Organização, e muitas as vantagens para os, hoje, 164 Membros. Para além do extremamente bem-sucedido sistema de solução de controvérsias construído

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no âmbito da Organização – com profissionais altamente qualificados, disputas comerciais sofisticadas e uma inigualável capacidade de influenciar a criação de uma jurisprudência de alcance internacional –, a OMC contabiliza ganhos em outras áreas individuais ao longo dos anos. Exemplo recente disso são o Acordo de Facilitação em Comércio firmado da Conferência Ministerial de Bali, e a proibição de subsídios à exportação de produtos agrícolas e o disciplinamento de medidas equivalentes, como créditos oficiais favorecidos, ajuda alimentar distorcida e uso inadequado de empresas estatais, alcançados durante a Conferência Ministerial de Nairóbi em dezembro passado. E esses são os exemplos mais recentes, apenas.

Não há dúvidas sobre os ganhos sistêmicos para os Membros que aderiram à OMC, e não à toa o número de acessões não parou de crescer ao longo dos anos. No entanto, parece haver um entendimento equivocado, ao menos no Brasil, de que em razão de não se conseguir um consenso dos Membros com relação a totalidade dos temas da Rodada Doha, então a OMC não funciona. Isso não é verdade. A Rodada Doha lançada em 2001 reflete um enorme pacote de ambições que contempla diferentes interesses dos Membros. Deste pacote, vários avanços foram feitos em diferentes áreas ao longo dos anos – como agricultura, transparência, tecnologia da informação e facilitação de comércio –, em que pese ainda haver discordância em


COMÉRCIO INTERNACIONAL

muitos outros temas. Desqualificar essas vitórias (grandes vitórias!) em razão da não conclusão de todos os temas propostas na Rodada é um enorme engano. É também um equívoco o entendimento de que se tem que priorizar acordos bilaterais, regionais, ou os famosos “megaacordos” em detrimento das negociações na OMC. Não há necessidade de escolher entre uma frente e outra, quando se pode fazer tudo paralelamente. Com efeito, já se demonstrou em diversas oportunidades que decisões tomadas em acordos de menor escala facilitam, em muito, as decisões a serem tomadas na OMC pelos seus Membros, que já chegam alinhados em discussões de temas que são tratados no âmbito da Organização. Contudo, negociar em várias frentes alavanca o poder de barganha dos países negociadores, de forma que não há desvantagem. Vale lembrar, ademais, que a OMC

é ainda o único foro de comércio multilateral capaz de emanar regras e decisões horizontais para praticamente todos os players do mundo em comércio internacional. Some-se a isso ao fato de que a conclusão de “mega-acordos” que, para alguns, estariam ameaçando a relevância da OMC, não é tão simples quanto parece. Exemplo disso são as recentes declarações dos candidatos à presidência dos EUA, Hillary Clinton e Donald Trump, sobre a enormemente proclamada Parceria Transpacífico (TPP), que corre o risco de não ser ratificada por pressão interna de diferentes setores da economia norte-americana. Num mundo cada vez mais protecionista, um dos grandes desafios da OMC parece ser ajustar as dificuldades da realidade de um cenário muito menos otimista do que aquele da década de 1990 e começo dos anos 2000 às expectativas e anseios atuais dos seus Membros. A importância da manutenção do sistema é inquestionável, mas a fim de mantê-lo e assegurar sua

relevância para os próximos anos, é necessário que os Membros estejam dispostos a uma profunda reflexão sobre alternativas mais flexíveis e criativas, sobretudo no que diz respeito às tomadas de decisões que afetem a todos horizontalmente.

(...) a OMC é ainda o único foro de comércio multilateral capaz de emanar regras e decisões horizontais para praticamente todos os players do mundo em comércio internacional.

Renata Amaral Coordenadora de Comércio Internacional da BMJ Doutora em Direito do Comércio Internacional

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INOVAÇÃO TECNOLÓGICA

INOVAÇÃO TECNOLÓGICA E REGULAÇÃO: O QUE A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL E O UBER TÊM EM COMUM? Jorge Sotto Mayor Fernandes Neto

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ão é novidade que a Uber gera alvoroço em qualquer cidade em que inicia suas operações. Outras empresas disruptivas também enfrentam os problemas semelhantes: telecomunicações gratuitas, produtos audiovisuais on demand, carros cada vez mais autônomos,

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drones e a lista só aumenta. São chamadas de inseguras, prejudiciais aos consumidores e, até mesmo, de ilegais. ​ O que talvez seja novidade é que essa história já se repetiu ao longo da história das economias de mercado. ​Reino Unido, 1698: Thomas

Savery cria a primeira máquina a converter vapor em energia mecânica com eficiência suficiente para ser comercializada. Esse, dentre outros, foi um dos principais eventos que iniciaram as Revoluções Industriais que surgiriam nos próximos séculos. ​ Richard Arkwright cria a spinning


INOVAÇÃO TECNOLÓGICA

jenny e os avanços que a seguiram revolucionam a indústria têxtil. James Watt desenvolve uma máquina de vapor de alta pressão, tornando possível que o vapor se torne a força motriz da Revolução Industrial do Século XVIII. ​ No entanto, assim como nos dias de hoje, a Revolução Industrial também enfrentou resistência. Historiadores econômicos, como Joel Mokyr, descrevem como os grupos que lucraram no passado com tecnologias menos eficientes buscaram impedir o avanço das novas tecnologias. ​ Primeiro, pressionaram os governos e os legisladores a implementar leis e regulações que proibissem a operação das novas máquinas, ou que, pelo menos, lhes retirasse o potencial comercial. Sem sucesso, esses grupos passaram à força bruta e a incêndios e sabotagens nas fábricas. Novamente, as tentativas falharam, já que o governo incentivava o desenvolvimento e a implementação de novas tecnologias. ​ Em razão dos avanços – como a criação de um comércio verdadeiramente global com rapidez nunca antes vista – as sociedades se organizaram em economias de mercado que incentivam o desenvolvimento de tecnologias inovadoras por meio de normas de propriedade intelectual.

​ Posteriormente, a organização institucional favorece preços mais baixos e qualidade superior para essas tecnologias mediante a promoção de competitividade nos mercados. ​ Esses objetivos foram alcançados e não deveria ser uma surpresa que as novas empresas, cada vez mais, tornem obsoletas as tecnologias que hoje usamos, ou por solucionarem problemas antigos ou por reduzirem o fardo de soluções menos eficientes a esses problemas. ​ Por exemplo, no caso do transporte individual, criou-se um sistema extremamente regulado, com limite de licenças para que se conheçam todos os provedores do serviço em prol da segurança. Ao se fixar a quantidade da oferta do serviço, o preço se torna um problema, por ausência de competitividade a tendência é que ele aumente. Então cria-se um controle tarifário, que, ainda assim, não corrige o alto custo. ​ A questão principal nesse mercado é que a ausência de competitividade, além de gerar preços mais altos, desestimula avanços na qualidade

dos serviços, e é difícil imaginar uma norma jurídica que possa corrigir esse problema. Nesse contexto, as novas empresas de transporte individual encontraram formas mais eficientes de prover um serviço de qualidade, com custo baixo e com nível de segurança adequado. ​ Enfim, o mercado de transporte individual oferece um ótimo exemplo de como atingimos o objetivo de desenvolver soluções inovadoras que melhorem o bem-estar da sociedade. Agora, não podemos impedir o desenvolvimento e a implementação dessas tecnologias, mediante a criação normas que venham a impedir a comercialização dos novos serviços e produtos frutos das constantes inovações para as quais alinhamos nossas instituições. ​ Seria uma tremenda hipocrisia institucional, lesando os consumidores e a sociedade.

Jorge Sotto Mayor Assistente de Investimentos

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ENTREVISTA BMJ

COMO OS DISCURSOS PROTECIONISTAS DE TRUMP E HILLARY PODEM AFETAR O COMÉRCIO GLOBAL

ENTREVISTA BMJ Por Monica Rodriguez

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esta edição, quem nos concede entrevista é Mauricio Santoro, Doutor em Ciência Política pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj) e professor do Departamento de Relações Internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Foi pesquisador-visitante na The New School University (Nova York) e na Universidade Torcuato Di Tella (Buenos Aires). É autor do livro “Ditaduras Contemporâneas” (FGV Editora) e de cerca de 30 artigos publicados em revistas e coletâneas acadêmicas. Mauricio comenta sobre as eleições norte-americanas, em especial no que diz respeito à imigração e às relações comerciais. Mauricio Santoro, Doutor em Ciência Política pelo Iuperj e professor na UERJ.

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ENTREVISTA BMJ

Monica: Sobre os impactos das eleições americanas no comércio internacional: tanto Donald Trump quanto Hillary Clinton já se manifestaram contra a Parceria Transpacífico (TPP). Independentemente do resultado das eleições, quais são possíveis riscos nas negociações de acordos comerciais? Mauricio: O principal efeito é aumentar a incerteza política quanto à ratificação do TPP pelos Estados Unidos, e por tabela, também a situação de outros

acordos multilaterais de comércio envolvendo o País, em particular o Nafta. E tudo isso em um contexto global de temores de aumento do protecionismo e dos receios provocados pela decisão britânica de deixar a União Europeia. Contudo, é preciso lembrar que uma coisa é o que os candidatos dizem durante a campanha, e outra, é o que fazem quando eleitos. Em 1992, Bill Clinton concorreu à presidência opondose ao Nafta, com argumentos semelhantes aos que são usados contra o TPP, mas uma vez na

Casa Branca, se empenhou para a negociação bem-sucedida do acordo e por sua ratificação pelo Congresso. Essas contradições também estão marcadas na trajetória de Hillary Clinton, que havia se declarado favorável ao TPP para depois mudar de opinião ao longo da campanha presidencial. Naturalmente, essas oscilações causam preocupações, sobretudo entre aqueles que gostariam de ver uma defesa sólida de acordos desse tipo diante da ameaça de uma onda eleitoral baseada na

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ENTREVISTA BMJ

voltar às políticas de beggar-thyneighboor 1 adotadas durante a Monica: Trump declarou Grande Depressão, como a tarifa recentemente que a Organização Smoot-Hawley 2. Um protecionismo Mundial do Comércio (OMC) é extremado que agravou bastante “um desastre” e, desconsiderando os aquela situação já trágica. preceitos da Organização, pretende As declarações de Trump são impor tarifas de importação entre tão extremas que passam longe 15 e 35% sobre produtos fabricados das políticas implementadas por por empresas americanas qualquer presidente, republicano que transfiram suas linhas de ou democrata, desde Truman. montagem para o exterior. Ele Monica: E se forem colocadas em ainda declarou que se não for possível negociar, vai retirar os EUA prática? da OMC, caso se torne presidente. Mauricio: Se forem postas em Quais as suas impressões sobre tal declaração? rejeição ao livre comércio.

Mauricio: Nos anos 40, o projeto inicial de criar algo semelhante à OMC nasceu nas negociações do fim da Segunda Guerra Mundial, mas não foi consolidado por conta de reações protecionistas nos Estados Unidos, sobretudo do setor agrícola. O Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT) foi o resultado possível desses conflitos, mas cumpriu um papel de relevo na progressiva liberalização comercial das décadas seguintes. As declarações de Trump rompem com um longo período histórico no qual os Estados Unidos foram um dos pilares da integração econômica global. Para encontrar propostas parecidas com as que ele defende, seria necessário

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prática, significariam a reviravolta da estratégia de inserção internacional americana após a Segunda Guerra Mundial. Contudo, mesmo se imaginarmos a implementação de apenas uma parcela das medidas protecionistas advogadas por Trump, o resultado seria uma queda acentuada do comércio global, uma vez que os Estados Unidos são os maiores importadores do mundo. As consequências seriam muito negativas para uma economia internacional que ainda não recuperou suas taxas de

O termo beggar-thy-neighbor é utilizado quando políticas implementadas em um país empobrecem a economia de outro país parceiro comercial.

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A lei Smoot-Hawley, a mais protecionista da história dos Estados Unidos, praticamente fechou as fronteiras a bens estrangeiros e desencadeou uma perversa guerra comercial internacional.

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ENTREVISTA BMJ

(...) se imaginarmos a implementação de apenas uma parcela das medidas protecionistas advogadas por Trump, o resultado seria uma queda acentuada do comércio global, uma vez que os Estados Unidos são os maiores importadores do mundo. crescimento anteriores à crise de 2007-2008. Monica: Mais uma de Trump: ele prometeu recuperar a base industrial dos Estados Unidos rejeitando a Parceria Transpacífico (TPP), saindo do Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta) e denunciando a China como manipulador da moeda. Nesse contexto, o que você acha da proposta de Trump de renegociar o Nafta?

três nações e provavelmente iria gerar interrupção de investimentos, aumentos nos custos de produção e nos preços dos produtos e problemas logísticos de todo o tipo. É difícil imaginar o que de fato aconteceria por conta da quase ausência de precedentes. A última vez em que os Estados Unidos saíram de um acordo comercial foi em 1866, curiosamente com o Canadá. Mas é claro que naquela época a integração econômica era só uma fração do que é atualmente.

Mauricio: O Canadá e o México são parceiros comerciais muito importantes dos Estados Unidos: seu 1º e 3º maiores mercados de exportadores e 3ª e 4ª fontes de importações, respectivamente. São países fundamentais nas estruturas transnacionais de produção e nas redes de fornecedores de várias empresas americanas. Qualquer mudança no Nafta – ou Monica: Entrando em um assunto mesmo a expectativa de que isso delicado, Hillary planeja defender possa ocorrer – teria enormes programas que promovam consequências para todas essas

integração de imigrantes e também regularizar trabalhadores ilegais que contribuam para a economia do País. Já Trump declarou que pretende construir um “muro” entre os EUA e o México e ainda, que quer expulsar os imigrantes ilegais do País. Como você vê essa questão dos imigrantes, daqueles que moram nos EUA de forma legal e também dos que trabalham por lá, mas ainda estão ilegais? É possível acreditar em uma reforma migratória? Mauricio: Os Estados Unidos são um país de imigrantes, mas também são uma nação marcada por ondas periódicas de reações contra os imigrantes, numa mistura de disputas econômicas e tensões raciais ou religiosas. O tema voltou à tona de forma bastante carregada na década de 2000. Embora as propostas de Trump sejam as mais contundentes, Obama deportou cerca de 2,5 milhões de pessoas.

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ENTREVISTA BMJ

É um número impressionante – mais do que a soma de todos os presidentes americanos no século XX. Isso mostra o atual ambiente político no país, já que Obama é um político moderado. E, ironicamente, filho de um imigrante do Quênia. Monica: Qual o volume de imigrantes em situação irregular nos EUA? Mauricio: Em geral, estima-se que os Estados Unidos tenham cerca de 12 milhões de imigrantes em situação irregular. Uma reforma migratória teria que dar uma resposta a pelo menos uma parcela dessa população, criando alternativas para legalizar a estadia daqueles que têm família no País, por exemplo. Há uma base demográfica que torna isso uma possibilidade viável – os latino-americanos já são 16% dos habitantes dos Estados Unidos, e podem chegar a 20% no início da próxima década. É um grupo de eleitores de peso, em particular na Califórnia e nos estados do Sudoeste. Mas até lá, ainda

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veremos muitas reações contrárias. Monica: Desde a crise econômica de 2009, governos mais radicais (ou conservadores) têm chegado ao poder ou recebido votos mais expressivos em diversos lugares do mundo, como Grécia e Polônia. Você acredita que esses fatores estão diretamente relacionados e que a candidatura de Trump seria também um reflexo disso? Mauricio: Sim. Na Europa e nos Estados Unidos ascendem políticos de um nacionalismo extremado, que tem por base

social a classe média baixa e os pobres, pessoas com pouca qualificação profissional e que enfrentam estagnação de sua renda, ansiedades sociais com a imigração e temem a competição mais acirrada de uma economia global mais integrada. São setores inteiros – como a indústria automobilística americana ou os mineiros britânicos – com dificuldades de lidar com os rivais dos países em desenvolvimento. Além, claro, dos receios provocados pelo


ENTREVISTA BMJ

Políticos como Trump nos Estados Unidos, Marine Le Pen na França e Nigel Farage no Reino Unido, exploram esses sentimentos de medo e oferecem espantalhos que seriam os causadores desses problemas – a globalização, os acordos comerciais, a União Europeia, os imigrantes, o multiculturalismo.

terrorismo e pela maior crise de refugiados desde a Segunda Guerra Mundial. Políticos como Trump nos Estados Unidos, Marine Le Pen na França e Nigel Farage no Reino Unido, exploram esses sentimentos de medo e oferecem espantalhos que seriam os causadores desses problemas – a globalização, os acordos comerciais, a União Europeia, os imigrantes, o multiculturalismo. A suposta solução que eles apresentam é a construção de muros, reais ou

metafóricos, e mobilizações de exaltação patriótica que soam bastante incômodas para quem tem uma perspectiva cosmopolita e vê um mundo com fronteiras menos rígidas, identificando o cenário como oportunidade, e não como ameaça. Há analogias preocupantes entre a situação atual e o fechamento da economia global no turbulento período do entre guerras (19191939), ainda que o mergulho no abismo tenha sido muito mais profundo naquela época do que

agora, inclusive pela existência atual de redes de proteção do Estado de Bem-Estar Social, que não haviam sido criadas na Grande Depressão. Entretanto, os problemas contemporâneos são graves e estão como um desafio para líderes políticos que apresentem alternativas viáveis para enfrentar as ansiedades sociais que tem afetado boa parte da população nos Estados Unidos e na Europa.

Monica Rodriguez Consultora em Comércio Exterior

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Eleições EUA

ELEIÇÕES EUA: ENTENDA COMO FUNCIONA Escolha dos candidatos De fevereiro a junho, os partidos Democrata e Republicano realizaram prévias entre précandidatos em cada estado. Mesmo com várias legendas existentes, na prática são esses dois partidos que disputam a vaga para a presidência dos EUA.

cáucus, a escolha dos delegados é realizada por meio de assembleias nas quais os eleitores têm a oportunidade de debater sobre seus candidatos e temas eleitorais para, em seguida, votarem. A soma dos votos dessas assembleias é o resultado do estado.

As prévias podem ocorrer pela modalidade fechada (apenas os eleitores registrados no partido votam) ou aberta (qualquer eleitor pode votar no pré-candidato). Alguns estados adotam um sistema misto.

Já o processo nas primárias é mais simples, pois a votação segue o formato tradicional. Os eleitores votam em seu candidato por meio de cédulas e o pré-candidato que tiver mais votos na primária, ganha os delegados do partido daquele estado.

Nessas prévias, os eleitores de cada um dos 50 estados americanos e alguns territórios escolhem delegados partidários, que se comprometem em apoiar determinado pré-candidato.

No caso do Partido Democrata, existem também os superdelegados, que são parlamentares e demais membros do comitê nacional do partido. Diferentemente Vale destacar que as prévias podem dos demais delegados, os superdelegados não são ocorrer por meio de primárias ou eleitos, mas escolhidos pelo cáucus, variando de acordo com partido. Dessa forma, o partido e também com a lei de cada estado. Quando a opção é pelo eles não têm seus votos 14 • Boletim BMJ

vinculados a eleitores e, portanto, podem escolher seus candidatos livremente. Os delegados eleitos e os superdelegados escolhidos


Eleições EUA

pelo partido participam de uma convenção nacional, em julho, quando votam para oficializar quem será o candidato do partido. A Convenção Nacional dos

Republicanos ocorreu de 18 a 21 de julho e determinou a candidatura de Donald Trump. Já a eleição dos Democratas aconteceu de 25 a 28 de julho e oficializou o nome de Hillary Clinton para o pleito.

Disputa entre os candidatos Após a oficialização das candidaturas, os candidatos democrata e republicano deverão renovar esforços tanto em propaganda quanto nas campanhas pelos estados, para, em seguida, se enfrentarem em debates. Esse cenário de campanha política estará presente nos EUA até o dia 8 de novembro, quando a população vai às urnas. Vale lembrar que lá o voto não é obrigatório. Contudo, a população não elege diretamente o presidente. Em cada estado, o candidato mais votado pela população tem direito a receber todos os votos do Colégio Eleitoral daquele estado. As exceções são o Nebraska e

o Maine, que adotam distritos eleitorais. Essa dinâmica permite se tornar presidente mesmo sem ter a maioria nas urnas. Os chamados swing states, estados-pêndulos ou estados decisivos, são aqueles em que nenhum dos dois partidos possui uma maioria clara na preferência dos eleitores. Por esse motivo, eles são os maiores focos de interesse dos presidenciáveis. Para vencer a eleição, é preciso ter 270 dos 538 votos no Colégio Eleitoral. Se nenhum candidato conseguir esse número de votos, a Câmara de Representantes decide quem será o novo presidente dos EUA. A posse presidencial ocorrerá em 20 de janeiro de 2017.

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Eleições nos EUA: E

Eleições EUA

Eleições Entenda com Passo 1:

Primárias e Cáucus

Os dois principais partidos dos EUA são o Republicano e o Democrata. Porém, existem também outros partidos menores.

Os dois principais partidos definem seus candidatos a partir de prévias, nas quais vários pré-candidatos buscam a indicação oficial. O processo de escolha pode se dar por cáucus ou por primárias, dependendo do partido e do estado.

VOTE!

Passo 2:

Convenções Nacionais

Cada partido realiza uma convenção nacional para nomear o seu candidato oficial

Passo 4:

VOTE!

Em cada convenção, o candidato escolhido apresenta o seu candidato a vice-presidente

Os candidatos escolhi campanhas e se enfre

Colégio Eleitoral

No sistema de colégio eleitoral, cada estado possui um determinado número de delegados com base na sua representação no Congresso.

Cada delegado possui um voto conseguir mais da metade (270

538 votos eleitorais

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Entenda como Funciona

Eleições EUA

nos EUA: mo Funciona

.

No CÁUCUS, membros do partido escolhem o candidato a partir de uma série de discussões e votos

!

?

?

Nas PRIMÁRIAS, os membros do partido votam no candidato que vai representá-los na eleição geral

...

Passo 3:

idos seguem, então, com suas entam em debates.

na eleição geral e o candidato que 0) dos 538 votos, ganha.

Eleição Geral

Nos EUA, o voto não é obrigatório. A parcela da população de cada estado que se dispõe a votar, escolhe delegados que farão parte de um colégio eleitoral.

O presidente e seu vice tomam posse da Casa Branca em janeiro.

270 votos

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COMÉRCIO EM FOCO

DADOS GERAIS (Dados do Banco Mundial)

População: 54,9 milhões PIB (2015): US$ 312,8 bilhões PIB per capita (2015): US$ 5.691 PIB por setor: Agricultura: 2,5% Indústria: 29,5% Serviços: 68,1% Taxa Média de Crescimento (2011-2015): 2,08% Taxa de Crescimento (2015): 1,3% Projeção de Crescimento (2016): 0,7%

DEFESA COMERCIAL (Dados do International Trade Administration Commission of South Africa - ITAC)

BALANÇA COMERCIAL (2015) (Dados do Comtrade)

Exportações: US$ 69,3 bilhões Importações: US$ 79,6 bilhões Saldo: US$ - 10,3 bilhões Corrente: US$ 148,9 bilhões

Medidas Antidumping em vigor: 33 Outras medidas de defesa comercial em vigor: 1 Investigações de antidumping em andamento: 2

OMC (Data da acessão: 01/01/1995)

Total de casos como demandante: 0 Total de casos como demandado: 5 Total de casos como 3ª parte: 7

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COMÉRCIO ÁFRICA


COMÉRCIO EM FOCO

ACORDOS REGIONAIS Acordos regionais que é signatário: 7 Acordos em negociação ou ainda sem vigência: 2 Principais acordos em vigor: SACU – Mercosul e SACU – EFTA. Principais acordos em negociação ou ainda sem vigência: SACU – Índia e SADC-EAC-COMESA.

O EM FOCO: DO SUL

PRINCIPAIS PRODUTOS EXPORTADOS (2015): Carvão, platina, petróleo, automóveis, ferrocromo, ouro, ferro, caminhões, paládio e filtros de gases.

INVESTIMENTO ESTRANGEIRO DIRETO (Dados do UNCTAD)

Atração de IED (2015): US$ 1,77 bilhão Posição no Ranking de IED da UNCTAD: 70º

PRINCIPAIS PRODUTOS IMPORTADOS (2015): Petróleo, celulares, automóveis, medicamentos, computadores, locomotivas, aeronaves, caminhões, peças de computadores e misturas para uso em alimentos e/ou bebidas.

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PRÉ-SAL

O PRÉ-SAL PRECISA DA PETROBRAS? PROJETO DE LEI EM ANÁLISE NO PLENÁRIO DA CÂMARA VAI TONIFICAR PRODUÇÃO NACIONAL Victor Brandão

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Plenário da Câmara deve votar – e aprovar - o fim da obrigatoriedade de atuação da Petrobras como operadora única de todos os blocos contratados pelo regime de partilha de produção em áreas do Pré-Sal. O Projeto de Lei 4567/2016 já foi aprovado pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados, bem como pelo Senado Ferderal. Se aprovado pelo Congresso Nacional, o que deve ocorrer em agosto deste ano, vai para sanção presidencial. O regime de partilha como está posto fere a Constituição Federal,

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especialmente os artigos 173, 174, 176 e 177, que vedam eventuais benefícios para a Petrobras, tais como o engessamento da livre concorrência, bem como a flagrante ilegalidade de reservar, obrigatoriamente, determinada participação do recurso a uma empresa que não pagou pela exploração e produção deste ativo. A medida é encarada como um sinal de esperança para a Petrobras, que terá tempo para se recuperar da crise financeira, já que ela não será mais obrigada a lidar com os elevados aportes de capital para a exploração de todos

os blocos licitados no Pré-Sal. Após registrar prejuízo líquido de R$ 34,8 bilhões em 2015, a estatal anunciou neste ano uma redução de 24,5% nos investimentos previstos para o período de 2015 a 2019. A Petrobras, como operadora ou não, permanecerá participando dos leilões de forma competitiva. Entretanto, com a alteração, a Petrobras terá a opção de escolher em quais blocos tem interesse de participar da licitação, após sua avaliação e com base no conhecimento que tem da área.


PRÉ-SAL

Potencial O Brasil deve apresentar, em 2017, o maior crescimento na produção de petróleo entre as nações que estão fora da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep). Segundo relatório divulgado pela entidade em julho, serão 3,37 milhões de barris por dia no fim do próximo ano.

COP 21

níveis pré-industriais. Para chegar a esse número, cerca de 50% a 80% das reservas conhecidas já não poderiam ser exploradas após 2050, de acordo com a COP 21. Deste modo, a exploração deste ativo que o país tem é imperativa e o governo deve facilitar as operações, para que os royalties possam beneficiar a população brasileira, que espera ansiosa por melhorias sociais.

O novo contexto energético demanda uma maior agilidade na extração do petróleo. A Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas, ocorrida em Paris em 2015, compactuou que praticamente todos os países do mundo devem chegar a um acordo para reduzir as emissões de gases causadores do efeito O País ainda responderá por metade estufa, tentando limitar em 2ºC de toda a expansão da América o aquecimento da atmosfera até Latina. Gasolina e óleo diesel estão 2100 em comparação com os entre os itens com maior potencial de produção, e a expectativa da Victor Brandão Opep é de que esse aumento seja usado para abastecer a indústria e Consultor em Relações Governamentais segmentos ligados ao transporte.

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OMC

O QUE ACONTECEU NA OMC Acompanhe as atividades da Organização no mês de julho

NEGOCIAÇÕES ◆ No mês de julho, Arábia Saudita, El Salvador, Honduras, México e Peru ratificaram o Acordo de Facilitação de Comércio. ◆ Após finalizarem os seus processos de acessão em julho, o Afeganistão e a Libéria são os mais novos Membros da OMC.

DISPUTAS Em 13 de juLho, Os Estados Unidos notificaram o Secretariado da OMC que iniciariam disputa comercial contra a China em relação ao imposto de exportação aplicado a certos elementos de terras raras.

Em 19 de julho, Os Estados Unidos pediram autorização para suspender as obrigações relacionadas à disputa com a Índia em relação à carne de frango.

Em 19 de julho, Os Estados Unidos notificaram o secretariado da OMC que solicitaram consultas com a China em relação ao imposto de exportação aplicado a certos elementos de terras raras.

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OMC

OUTROS ◆ Durante os dias 13 a 15 de julho, aconteceu a 3ª revisão da Política Comercial da Tunísia.

processo seletivo para substituir o antigo árbitro do OSC, Seung Wha Chang.

◆ Em 18 de julho, o Vietnã notificou o Comitê de Salvaguardas da OMC que iniciou uma investigação de salvaguardas sobre chapas e tiras de aço galvanizadas e prépintadas.

◆ Em 22 de julho, a Jordânia notificou o Comitê de Salvaguardas da OMC que iniciou uma investigação de salvaguardas sobre barras, hastes e perfis de alumínio.

◆ Entre os dias 20 a 22 de julho, foi realizada a 6ª revisão da Política Comercial da China.

◆ Durante encontro do Órgão de Solução de Controvérsias (OSC) em 21 de julho, os Membros da OMC decidiram iniciar um

◆ Durante os dias 26 a 28 de julho, aconteceu a 7ª revisão da Política Comercial de Cingapura.

◆ Em 27 de julho, a Argentina e o Uruguai se candidataram para receber a próxima Conferência Ministerial da Organização, que acontecerá no final de 2017.

Boletim BMJ • 23


OMC

CALENDÁRIO

04/07 Comitê sobre Comércio e Desenvolvimento

11/07 Sessão especial do Comitê de Comércio e Desenvolvimento

13 a 15/07

24 • Boletim BMJ

Órgão de Solução de Controvérsias

08/07 Encontro informal do Comitê sobre Aspectos do Comércio relacionado à Propriedade Intelectual

12/07 Trade Policy Review – Tunísia


OMC

Conselho sobre Comércio de Bens

18/07 Órgão de Solução de Controvérsias

20 a 22/07 Trade Policy Review – Cingapura

27/07

14/07 Órgão de Revisão de Política Comercial

19 a 21/07 Trade Policy Review – China

26 a 28/07 Conselho Geral

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