Artes & Leilões 32

Page 1



ÍNdicE

Docs, Joana Vasconcelos - Pág.30

Artes Plásticas, João Leonardo Pág.06 Capa, Arte Erótica - Pág.28 Bienal de Veneza, Christian Boltanski - Pág.22

ARTES & LEILÕES N.32 juLho/AgoSTo 2011 05 06 08 10 12 14 16 18 20 22 26 28 30 32 34 36 38 42

Crónica: Uma porta, uma ilusão por Ana Marques Gastão Artes Plásticas Design: Experimentadesign'11 Moda por Maria José Sacchetti Música: Festivais de Verão por Alexandra Ho Cinema: Vila das curtas por Ricardo Nabais Teatro: Cenas de Varão por Raquel Carrilho Livros Art Mix: Glen Ligon - Eu sinto a minha cor por Jorge dos Reis Viagem: Bienal de Veneza – Faça-se a Luz Artista: Entrevista com Rui Chafes Capa: Arte Erótica - Uma colecção que é um desejo Docs: A arte de filmar a arte por Elsa Garcia Joalharia: Prémio Origomu - Os anéis (i)mortais Projecto: Cortiça, matéria de imaginação Exposições Destaques de agenda Opinião: O cinema português não é francês por Pedro Portugal Capa: Esther Horchner para a Het Paradijs (Holanda) Conjunto de bule e chávena de chá, 2011, porcelana com transfers, 10 x 6 cm (chávena) e 15 x 16 cm (bule). Foto de Joana de Moura.

Moda, Balenciaga - Pág.10

Cinema, Vila das Curtas - Pág.14

Artista, Rui Chafes - Pág.26

Música, Foo Fighters - Pág.12


Edito rial

ARTES & LEILÕES NúMERO 32 – JULHO/AGOSTO 2011 Director José Pedro Paço d’Arcos jpdarcos@arteseleiloes.com

Todo Cambia “Cambia lo superficial Cambia también lo profundo Cambia el modo de pensar Cambia todo en este mundo” Encontramos nas palavras da cantora argentina Mercedes Sosa o mote para o movimento que neste momento ocupa a equipa da Artes & Leilões. Como o leitor pode já comprovar nesta edição, há novidades que transformam a revista, já de si uma publicação que ao longo de vinte anos conheceu vários formatos e filosofias em constante mutação. Reflexo dos tempos que correm? Inquietação de um grupo de indivíduos em permanente dinâmica? O que importa é que todas estas motivações façam chegar até si uma revista cada vez mais abrangente. Mantendo a tónica nas artes visuais, a Artes &Leilões inaugura nesta edição as novas secções de Música e Teatro. Com um leque mais alargado de sugestões culturais, pretende-se criar um guia seleccionado, com uma agenda criteriosamente escolhida, para além das habituais reflexões, críticas e entrevistas que são o coração do conteúdo editorial. Seguindo a lógica da mudança e evolução, anunciamos que os próximos números da Artes & Leilões, agora em colaboração estreita com o semanário Sol, terão como garantia o factor surpresa. Mas, precisamente por isso, não revelamos já o que por aí vem no futuro. Para já, entramos em merecidas férias e para isso pensámos o conteúdo desta revista como válido em temas e sugestões culturais de que pode usufruir até Setembro, altura em que regressamos, acompanhando, aliás, o movimento da maioria dos leitores. Assim, sugerimos que nos leve consigo para a praia, para o campo, a cidade ou mesmo em casa. Em Portugal ou no estrangeiro. E mesmo que resolva fazer férias totais e entregar-se ao dolce fare niente, siga por escrito o que no mundo das artes se vai passando nestes dois meses em nossa companhia. Desejamos, assim, boa leitura e bons banhos (de água ou de sol). Regresse preparado para as boas e para as más mudanças que possam vir depois da preguiça de um longo Verão. “Cambia todo cambia Cambia todo cambia Cambia todo cambia Cambia todo cambia Pero no cambia mi amor...” Miguel Matos P.S.: Para quem não está de férias, há uma lista enorme de acontecimentos para exercitar ou descansar o cérebro e o corpo, conforme a sua preferência. Muitos deles estão nestas páginas!

Editor de Arte Contemporânea Miguel Matos migueldematos@gmail.com Redacção Ana Albuquerque info@arteseleiloes.com Teresa Pearce de Azevedo teresapearceazevedo@arteseleiloes.com Colaboradores: Alexandra Ho Ana Marques Gastão Elsa Garcia Jorge dos Reis Maria José Sacchetti Pedro Portugal Raquel Carrilho Ricardo Nabais Produção Editorial Maria Correia mariacorreia@arteseleiloes.com Director de Arte Pedro Mascarenhas atelier@pedromascarenhasdesign.com Fotografia Ana Paula Carvalho anacarvalho@anacarvalhophoto.com Revisão de Conteúdos Raquel Dionísio info@arteseleiloes.com Comunicação, Marketing e Publicidade Alexandre Lopes alexandrelopes@arteseleiloes.com Tel 217 225 040 - Fax 217 225 049 Assinaturas JMToscano Rua Rodrigues Sampaio, 5 2795-175 Linda-a-Velha Tel.: 214 142 909 – Fax: 214 142 951 assinaturas@jmtoscano.com Administração José Pedro Paço d’Arcos Diogo Madre Deus Propriedade José Pedro Correia da Silva Sede Rua Artilharia 1, nº 67 – 1º dto. 1250-038 Lisboa Tel.: 217 225 040 – Fax: 217 225 049 Impressão e Acabamento Sogapal Estrada das Palmeiras - Queluz de Baixo 2745-578 Barcarena Periodicidade Mensal Tiragem 35.000 exemplares Registada com o Nº ISSN 1646-8139 É proibida a reprodução da revista, em qualquer língua, no todo ou em parte, sem a prévia autorização escrita de Artes& Leilões. Todas as opiniões expressas são da inteira responsabilidade do autor. Website www.arteseleiloes.com Desenvolvido com o apoio de Mediacode


cróN ica / AnA MArques GAsTão Uma porta, uma ilusão. Am Gaisberg de Anna Oswaldo Cruz Na fotografia da artista de origem austríaca e brasileira (n.1965), residente em Barcelona, acolhem-se três estações do mundo, enquanto ser vivo, como lhe chamou Platão noTimeu: a afeição, a melancolia e a memória. Nela, o que importa é a noção de tempo.

↑ Anna Oswaldo Cruz, Am Gaisberg, 2007, da série Transitar. Fine Art Print, 66 x 100 cm

A fotografia traz consigo a terra que se move e, com ela, outros elementos: ar, fogo, água. O que não se vê é vento luminoso e, por isso, invisível como a ideia. A ideia é invisível. Nela repousa esta fotografia que cinematograficamente se move. Anna Oswaldo Cruz (n. 1965), artista de origem austríaca e bra-

transformou-se numa porta circular que, embora participe de uma velada perfeição, não deixa de ser invisível à História. Em Am Gaisberg, o que importa não é a paisagem, nem mesmo a viagem, mas a noção de tempo – imagem móvel de uma presença incessante. Essa esfericidade do que brande trespassa a imagem perplexa de Anna sileira, residente em Barcelona, não fixa imagens, reduz o tempo à sua – como num gotejante filme de Tarkovsky – perante a caminhada da instantaneidade, captando um vasto-mínimo quando entra no ritmo de vida que, de tão veloz, se imobiliza em seu transporte espinhoso, tão belo uma cosmogonia a que poderíamos chamar totalidade do momento. E quanto terrível. Anna tenta, sem “truques digitais”, segurar “o que não onde se detém o olhar em Am Gaisberg (2007), pertencente à série Tran- passa” e a que eventualmente poderíamos chamar sublime, memória sitar? Talvez no dourado de círio entrelaçado com a aparência racional amorosa: é possível imaginar os reflexos de troncos e ramos por entre dos fragmentos de árvores que nos recordam o quanto postes e sistemas de resistência à intempérie. O gesto da ANNA oSwALdo CRuz somos seres de ilusão. fotógrafa gera, na sua ousadia, a suspensão do olhar; na Na imagem acolhem-se a afeição, a melancolia e a me- Não fIxA ImAgENS, descontinuidade da focagem, a linguagem aproxima-se mória, três estações do mundo enquanto ser vivo, como REduz o TEmpo à SuA da palavra-lente. lhe chamou Platão no Timeu, como se este tivesse alma INSTANTANEIdAdE. A fotografia de Anna Oswaldo Cruz faz brilhar, em ture ela residisse em toda a parte. Não que a imagem consvação, o que não se vê mas está. Parece haver gente por titua um rectangular discurso do amor, embora sejam detrás da imagem; só o oculto silêncio transfigura, poseis (número ambíguo consagrado na Antiguidade a rém, essa possibilidade em seiva e manto no esplendor Venús-Afrodite) as portas quase-metálicas, acinzadas. da água-imaginação que a espelha. Perante o seu próAtravessa-as, porém, uma certa contemplação saturniprio reflexo na paisagem líquida, Fedro recuou, Anna na, fantasmática, embora não edénica, a nostalgia de algo que sendo já não tem, todavia, medo, parece desaparecer no que já partiu, mas o seu não é. Porta dir-se-ia o que permite a passagem (a aproximação, a meta- aparente retroceder é tão-só a respiração que se contém, desviandomorfose); o que liga, abre ou fecha, relaciona ou afasta. Paro diante delas. -se, para se dar a conhecer, resgatada. As portas simbolizam sarcófagos Posso avançar ou recuar – indicam-me uma dinâmica de movimento viventes escavados na pedra, cavernas ou grutas em sobreposição que (janus inferni, janua coeli), misteriosa síntese. Escolhendo transpô-las, constituem uma escrita simbólica gravada na cal da parede. Na fotogratomo consciência da iminência do acesso a algo, seja de ordem psicoló- fia, a ordem de sucessões imagéticas, que o olhar procura, despe-se da gica ou escatológica. Penso: a fotografia confirma a deterioração da aura técnica para que o visível seja invisível. Talvez seja isso que a arte faz, a que se referiu Benjamin, mas, sem essa perda, Orfeu jamais cantaria. depende do corpo, para não mais o reter, ele também uma porta-templo Poderia ter morrido de entrega sacrificial, mas preferiu a ferocidade do desconhecido, do mistério que se deixa habitar, numa improvável sidos infernos onde deixou Eurídice. Esta, por não ter olhado para trás, multaneidade, pelo que de mais humano tem o que não é nosso. ¶


artes plás ticas

João Leonardo, Untitled (Head #4), 2010.

/ miguel matos

Fernando Lanhas, Tapeçaria do AltarMor da Igreja de Santo Ovídeo, no Porto, 1985

João Louro no BES Arte e Finança “In God we trust” é o lema nacional dos Estados Unidos da América e é também o título da exposição que João Louro apresenta no BES Arte & Finança até 15 de Julho. O conjunto das obras documenta a passagem do artista por duas cidades: San Diego (EUA) e Tijuana (México). A viagem foi acompanhada por figuras locais e o resultado são momentos e fragmentos inusitados dessa experiência. Homenagem tecida em Portalegre A Manufactura de Tapeçarias de Portalegre apresenta, até 31 de Julho, na Sociedade Nacional de Belas-Artes, obras representativas de quatro pintores da mesma geração, incontornáveis no panorama artístico português. Estarão expostas tapeçarias de Cruzeiro Seixas, Fernando Lanhas, Júlio Resende e Nadir Afonso. Esta exposição, ao integrar linguagens artísticas desde o surrealismo à expressão puramente geométrica, passando pelo abstraccionismo e pelo figurativismo, comprova a capacidade de interpretação da tapeçaria de Portalegre. Pedro Cabrita Reis em retrospectiva É um dos nomes cimeiros da arte contemporânea portuguesa e um dos mais internacionais. “One After Another, A Few Silent Steps” reúne esculturas, pinturas, fotos e instalações que testemunham o percurso do artista ao longo da sua carreira desde os anos 80. Após o sucesso alcançado na sua apresentação na Kunsthalle de Hamburgo (Alemanha), no museu Carré d’Art de Nîmes (França) e no museu M de Lovaina (Bélgica), a mostra encerra a sua itinerância europeia na capital portuguesa, cidade onde Pedro Cabrita Reis reside e trabalha. De 4 de Julho a 2 de Outubro no Museu Colecção Berardo.

xxxxxxxxxxxxxxxxxxx

João Louro, Yonkee #03

Samsung cria Movimento SIM A Samsung resolveu investir nas artes e nas indústrias criativas em geral, criando para tal o Movimento SIM. Sabe-se que a negatividade é a marca destes tempos e a afirmação de uma identidade criativa é condição essencial para se marcar a diferença. Assim, além de uma agenda de exposições, debates, conferências e workshops, o SIM é também um prémio destinado a projectos nas seguintes áreas: Arquitectura, Artes Performativas, Artes Visuais e Design, Marketing e Publicidade, Cinema, Televisão e Rádio, Moda, Música, Novas Tecnologias e Aplicações Digitais. As candidaturas estão abertas até 31 de Agosto e o prémio é de 25 000 euros. Mais informações em www.movimentosim.com.

Pedro Cabrita Reis. O percurso do artista desde os anos 80 chega ao Museu Colecção Berardo.


Novos Artistas na EDP Já estão seleccionados os finalistas do Prémio EDP Novos Artistas. Os talentos promissores em exposição no Museu da Electricidade são: Ana Manso, André Trindade, Carla Filipe, Catarina Botelho, Catarina Dias, João Serra, Nuno da Luz, Priscila Fernandes e Vasco Barata. Uma selecção mais ecléctica do que é habitual, que levará a um vencedor no final do evento. A exposição decorre até 18 de Setembro. Fazer zoom com Paula Rego A Casa das Histórias Paula Rego acaba de criar, com a parceria da Microsoft Portugal, um site em que cada obra patente na exposição “Anos 70 – Contos Populares e outras Histórias” se encontra fotografada, digitalizada e trabalhada em alta definição com recurso à tecnologia Deep Zoom e Silverlight. O objectivo é perpetuar a exposição, colocando-a online gratuitamente no MSN. Permite ver a colecção escondida e também vai permitir à Casa das Histórias ficar com o registo dos detalhes ínfimos de cada quadro, para o caso de precisar de restaurar algum. Esta tecnologia cria memória futura e constitui um arquivo digital para os conservadores e restauradores. www.casadashistoriaspaularego.com

Finança, o Museu Nacional de Arte Antiga, o Museu do Chiado e o Museu Nacional de História Natural, foi composto um extenso programa, para além do prémio que todos os anos distingue o melhor vídeo do Open Call aberto aos artistas. Toda a programação do evento, que vai já na sua terceira edição, em www. fusovideoarte.com. Prémio Velázquez para Artur Barrio O artista português radicado no Brasil Artur Barrio (Porto, 1945) foi galardoado com o Prémio Velázquez das Artes Plásticas 2011, no valor de 180 000 dólares (cerca de 125 000 euros). A partir do final dos anos 60, Barrio apostou na criação de instalações conceptuais e performances e de obras em matérias efémeras como o sal, sangue, café, pão, carne ou papel higiénico. Ao mesmo tempo que o artista recebe a distinção, a livraria Fernando Machado edita uma monografia retrospectiva que acompanha e testemunha a sua exposição na Bienal de Veneza.

PEDRO CABRITA REIS ©PAOLO PELLION

Vídeo arte ao ar livre De 26 a 30 de Julho volta aos jardins da capital o FUSO – Festival Anual de Vídeo Arte Internacional de Lisboa. Percorrendo o BES Arte &

João Leonardo na Galeria 111 João Leonardo ocupa a Galeria 111, até ao final de Julho, com uma exposição que fala do seu vício e que transforma o lixo em experiência visual, seja pictórica ou escultórica. As beatas dos cigarros que o artista fuma ou que encontra no chão são metáforas da vida, do prazer e da fatalidade. “One Hundred and Six Columns, Four Heads and One Table” é uma exposição que, entre um lado pop e um lado minimal, deixa o espectador perplexo ao descobrir o seu retrato feito a partir dos seus vícios e consequentes sujidades.

Azulejo de Rachel Korman “Metasutra” é a exposição apresentada (até 16 de Setembro) pela Galeria Ratton e que testemunha a primeira incursão de Rachel Korman na técnica do azulejo. A mostra aborda temas habituais no percurso da artista, tais como a identidade de género, o corpo e a sexualidade, assim como a ambiguidade destes aspectos da vida. São desenhos de sombras e contornos que sugerem mas não explicitam um olhar sobre o corpo e o acto carnal. Para além de azulejos, Korman mostra também cinco desenhos de grande formato, em diálogo com as cerâmicas.¶

↑ Prémio EDP Novos Artistas no Museu da Eléctricidade. → Veja as Ilustrações de Paula Rego na internet. Ao lado, Príncipe Azul, 1973. ↓ Artur Barrio vence o Prémio Velázquez das Artes Plásticas 2011. Em baixo, Livro de Carne, 1978-1979.


DESigN

eXPosiÇÕes – “Sidelines: colecções pessoais em instituições inesperadas” – “This is outside” – “Useless? Yes.” Três exposições que se debruçam sobre o valor dos objectos/obras na construção de colecções privadas, a vivência entre ambiente/ espaço natural e habitat urbano e o exercício da arquitectura paisagista, e, por fim, a controvérsia gerada pela reprodutibilidade da obra e as potencialidades da criação autoral.

inTerVenÇÕes urBAnAs – “Look once or twice again” – “Lounging Space” Seis estúdios de design gráfico intervêm criativamente na cidade em site-specific, ao abrigo do tema da bienal, enquanto o “Lounging Space” atrai os visitantes a edifícios ou espaços de interesse patrimonial, arquitectónico ou histórico.

ConFerÊnCiAs, DeBATes e CineMA – “Conferências de Lisboa” 28, 29, 30 de setembro e 1 de outubro – “Open Talks” 29, 30 de setembro e 1 de outubro – “Ciclo de Cinema” A vinda de especialistas internacionais em áreas como a arquitectura e o design, com novas referências do pensamento contemporâneo, ocorrerá simultaneamente com um Ciclo de Cinema dedicado a produções independentes.

ExperimentaDesign’11: Useless?

Na sua sexta edição, a bienal internacional promovida pela ExperimentaDesign (EXD) mantém os objectivos fundadores: promover a cultura contemporânea por meio do debate, reflexão e experimentação. A partir de 28 de Setembro, “Useless” será a palavra-cha-

ve em vários pontos de Lisboa. Design, arquitectura, criatividade são as áreas em que a plataforma se inscreve, acreditando que é na inovação e na criação de projectos que estão os pilares do desenvolvimento sustentável. “’Useless’ questiona acima de tudo a ideia do uso e do sem uso, do útil e do inútil, abrindo portas a novas leituras sobre o que produzimos e o que consumimos, porque o fazemos e como”, explicou Guta Moura Guedes, directora da EXD, na apresentação à imprensa, em Maio. Moura Guedes considera ainda que “aquilo que aparenta ser (ou estar) sem uso” e as “interrupções, paragens, tempos considerados inúteis” são importantes no contexto da criatividade e da inovação. Ainda longe da Semana Inaugural (entre 28 de Setembro e 2 de Outubro), adiantam-se novidades: “Platform”; as exposições monográficas sobre designers portugueses em “Don’t Look Back”, integradas na programação do Palácio Quintela; a edição de dois livros, um dedicado ao tema desta bienal e outro à edição anterior e, ainda, novos projectos nascidos de recentes protocolos. Grande parte das propostas da Bienal EXD’11 concentrar-se-á na Baixa-Chiado, para que se possa percorrer a pé a zona e apreciar aquilo que a torna carismática, sejam elementos estéticos, culturais ou sociais. ¶ Ana Albuquerque

experimentaDesign’11 28 seT > 27 noV www.experimentadesign.pt

ProJeCTos esPeCiAis – “Don’t Look Back” Apresenta o trabalho de designers portugueses renomados, com Fernando Brízio na exposição inaugural. – “Platform: As novas fronteiras do design” Um trabalho de pesquisa que pretende divulgar e valorizar dinâmicas inovadoras envolvendo universidades, galerias, empresas e criadores. – “Retro-Future” e “Para além dos ditames da função” Resultam de protocolos de colaboração assinados este ano entre a ExperimentaDesign, a Moda Lisboa e o MUDE, e concretizar-se-ão em exposições. – “Action for Age: Intergeracionalidade” Um laboratório criativo com bases em Lisboa e Londres que visa aliar o design à melhoria da qualidade de vida, neste caso, de idosos.

PuBliCAÇÕes – It’s About Time A condensação em livro da EXD’09. – Useless Reader Colectânia de ensaios de reflexão sobre o tema lançado pela Bienal de 2011.

serViÇo eDuCATiVo A par dos Eventos Tangenciais – plataforma que acolhe e divulga projectos independentes inovadores –, a EXD promove um Serviço Educativo, desejando formar e “despertar apetências e interesses”, no campo do design, num público vasto e diferenciado (em idade, formação académica ou área de actividade profissional).


Segunda a Sábado, das 13 às 22 h Encerrado de 16 a 31 de Agosto Rua Mouzinho da Silveira, 2 (esq. c/ Barata Salgueiro) PT-1250-167 LISBOA Marcações +351 213 141 279 +351 936 443 673 gad@antiksdesign.com www.antiksdesign.com


moDa

← Fato criado para Elton John

/ MAriA José sACCheTTi

Vogue, Setembro 1967

Harper's Bazaar, Setembro 1967

Museu Balenciaga inAuGurA eM esPAnhA Um novo museu em homenagem a Cristóbal Balenciaga abriu as suas portas no mês de Junho em Getaria, cidade natal do estilista, com uma exposição intitulada “The approach ofthegenius,themaster’stechnique”. Cristóbal Balenciaga é inequivocamente um dos maiores costureiros do século XX. Um perfeccionista obsessivo, explorou com grande mestria formas arquitecturais e técnicas de alta-costura que foram, no seu surgimento, não só inovadoras como resultaram num legado de seguidores e admiradores. Embora de moldes complexos, as suas peças foram evoluindo ao encontro de uma simplicidade e pureza formais que ficaram para sempre associadas a uma estética que lhe é inerente. A sua inspiração traduziu-se em designs volumosos e expressivos, de grande beleza formal e respeito pelas matérias-primas ricas e depuradas. Com grande sucesso internacional, muito respeitado pelos colegas e mentor de outros costureiros como André Courrèges, Balencia-

ga retirou-se por vontade própria quando a alta costura conheceu a sua primeira crise com o surgimento do pós-modernismo e o sucesso do ready-to-wear do final dos anos 60. Esta primeira exposição aspira a mostrar algum do seu melhor trabalho, focando-se em aspectos que ajudam a entender o sucesso de Balenciaga e que honram a sua contribuição para a história da moda internacional. Através do percurso pelas diversas galerias podemos apreciar uma rigorosa selecção de 72 peças organizadas cronologicamente, desde os primórdios da sua carreira até aos últimos anos da década de 1960. O museu tem por objectivo renovar em cada seis meses a exposição, mantendo a mostra do trabalho de Balenciaga dinâmica e interessante. ¶ “Cristóbal Balenciaga: The approach of the genius, the master’s technique” 10 Jun > 31 DeZ Cristóbal Balenciaga Museoa Aldamar Parkea, 6 20808 Getaria Tel.: +34 943008840 http://cristobalbalenciagamuseoa.com

Quando a loja Nutters abriu em 1969 em Saville Row, o estado do tradicional mundo da alta alfaiataria londrina iniciou uma nova era. Tommy Nutter, associado ao seu master cutter Edward Sexton, passou a oferecer um estilo que combinava com grande sucesso as técnicas da alfaiataria clássica com as tendências de moda que emergiram no final dos anos 60 em pleno swinging london. A nova loja, financiada por Cilla Black, James Vallance White e Peter Brown, que era igualmente o executivo dos Beatles, criou uma imagem que foi largamente consumida e divulgada como uma marca de alfaiataria dirigida a estrelas de rock, artistas e aristocratas, desejosos das novas linhas lançadas por Nutter. Esta exposição no Fashion and Textile Museum não só apresenta o trabalho de Nutter como oferece uma análise do seu contributo para o desenvolvimento de uma imagem de marca na Saville Row. Uma criteriosa escolha de fatos é colocada no adequado contexto social e histórico dos últimos anos da década de 1960 até à década de 1990. ¶ “Tommy Nutter: Rebel on the Row” 20 MAi > 22 ouT Fashion and Textile Museum 83 Bermondsey street londres Tel.: + 44 (0)20774078664 www.ftmlondon.org Ringo Star vestido por Nutter

MACQUEEN © THE METROPOLITAN MUSEUM OF ART - MUDE © LUISA FERREIRA

“Tommy Nutter: Rebel on the Row” no FAshion AnD TeXTile MuseuM De lonDres


Exposição "Tommy Nutter: Rebel on the Row”, em Londres

LUIS GERALDES

← Campanha fato de Homem

BALENCIAGA / VOGUE © IRVING PENN - FASHION AND TExTILE MUSEUM DE LONDRES © KIRSTIN SINCLAIR

Hussein Chalayan eXPÕe eM PAris Les Arts Décoratifs deu carte blanche a um dos designers mais criativos e inovadores desta geração: Hussein Chalayan. Durante os últimos 18 anos, desde a sua saída da escola inglesa Central Saint Martins School of Art and Design, em 1993, este designer tem vindo a desenvolver objectos que têm propositadamente transcendido e explorado outras áreas além do vestuário, como a arquitectura e o design de produto, na maior parte dos casos com tecnologia aplicada. Não é a primeira vez que Chalayan é objecto de estudos e exposições onde a sua participação e envolvimento são sempre notados. A sua obra caracteriza-se por um rigor intelectual e uma busca pela obtenção de uma perfeição no plano tecnológico, que foge aos cânones da moda. Chalayan

destacou-se, desde o início da sua carreira, pelo alto grau de criatividade e carácter explorativo do seu trabalho, que passou pela escultura, mobiliário, vídeo e efeitos especiais, usados e apresentados geralmente durante os seus desfiles. A inspiração para as colecções pulsa directamente das realidades política, social e económica que envolvem a vida do designer e a sua era. Esta exposição mostranos quão rico e interessante é o universo de Chalayan, no qual vestuário, instalações, desfiles, projecções, tecnologia e pesquisa convergem em trabalhos complexos que ilustram o processo criativo do artista. ¶ “hussein Chalayan: Récits de mode” 5 Jul > 13 noV les Arts Décoratifs 107, rue de rivoli 75001 Paris Tel.: +33 01 44555750 www.lesartsdecorarifs.fr

THE BEGINNINGS OF INFINITY, 2010 Óleo sobre tela, 152x122cm

PRÓXIMO LEILÃO Sotheby's, Londres Outubro 2011

Último Leilão Christie's, Londres

Abril 2011 Valor atingido: €10,500

Colecção “Before Minus Now”, Primavera/ /Verão 2000

AN ANGEL OUT THERE, 2003 Óleo sobre tela, 152x122cm

AUSTRÁLIA +61 411 401 738 835, JUMBUK ROAD YINNAR SOUTH VIC 3869, AUSTRÁLIA

PORTUGAL +351 914 543 842 RUA DOS FAISÕES, 3, 5 ESQ BELAS CLUBE DE CAMPO 2605-200 BELAS

lgeraldes@gmail.com www.geraldes.com


mÚsica / Alexandra Ho Jarvis Cocker Festival Paredes de Coura 18 › 19 Agosto

Anna Calvi Optimus Alive Lisboa, Oeiras 6 › 9 Julho

Arcada Fire Super Bock Super Rock Meco 14 › 16 Julho Le Trio Joubran Festival Músicas do Mundo Sines, 22 › 30 Julho

Djavan Delta Tejo Lisboa, Monsanto 1 › 3 Julho

Música para todos Diversidade é a palavra de ordem no que diz respeito a festivais de música no Verão. Desde os mais populares Optimus Alive e Super Bock Super Rock, há propostas para todos os gostos, como a electrónica, o jazz ou a world music. Aqui ficam algumas pistas para aproveitar a época estival que agora começa. Jazz e Clássica Lisboa Jazz: O Jazz em Agosto, na Gulbenkian, é já uma tradição para quem gosta de passar o Verão na capital. Este ano, o certame celebra a sua 28ª edição durante a primeira quinzena de Agosto, com seis concertos principais no habitual Anfiteatro ao Ar Livre. O pianista Cecil Taylor é o primeiro a apresentar-se ao vivo, numa rara aparição a solo. Destaque ainda para o trompetista Wadada Leo Smith, para o saxofonista Peter Brötzmann, para o baterista John Hollenbeck e para os ExGuitars meet Paal Nillsen-Love/ Vandermark Duo, que cozinham uma mistura de rock radical e improvisação jazz. Lisboa Clássica: Durante Julho também há o Festival ao Largo, no São Carlos, em Lisboa. A aposta aqui recai para a música clássica, Deolinda Festival do Crato Alentejo 24 › 27 Agosto

com apresentações da Orquestra da Gulbenkian, da Orquestra Sinfónica Portuguesa e da Orquestra Metropolitana de Lisboa. Cascais: O Cool Jazz Fest, em Cascais, volta já este mês e repete a aposta em nomes fora do universo do jazz. Jamie Cullum e Madeleine Deyroux são os destaques, mas no universo mais pop também vem Seal e Aloe Blacc. Porto: No mesmo espírito do Jazz em Agosto, realiza-se o Jazz no Parque, em Serralves, com quatro concertos entre os dias 10 e 30 de Julho. Madeira: Durante os dias 7 e 9, decorre o Funchal Jazz Festival, onde Cassandra Wilson, Branford Marsalis, Danilo Perez e John Scofield são donos do palco. Caldas da Rainha: Outra proposta fora dos grandes centros urbanos é o Festival MusiCaldas, nas Caldas da Rainha. O evento decorre entre os dias 9 e 23 de Julho e será o palco de grandes nomes da música erudita e jazz. Pop e Rock Optimus Alive: Um dos festivais mais populares do Verão arranca logo na primeira semana de Julho e traz a Oeiras grandes nomes do universo pop/rock internacional. Os Coldplay são a principal atracção no arranque do Optimus Alive, no dia 6, mas os estreantes James Blake e Anna Calvi também prometem surpreender. Até domingo, dia 9, o palco do Alive recebe ainda, entre outros, Foo Fighters, ChemiM Dettman Neopop, Viana do Castelo 28 › 30 Julho

cal Brothers, Grinderman, de Nick Cave, Fleet Foxes e Primal Scream. Super Bock Super Rock : Uma semana depois chega a vez de rumar até ao Meco, para o Super Bock Super Rock, que se realiza entre os dias 14 e 16. Com um programação bastante ambiciosa, Arcade Fire, Arctic Monkeys e The Strokes são as estrelas do cartaz, que apresenta ainda bandas como Beirut e Portishead. Sudoeste: Mais a Sul, o Sudoeste, na Zambujeira do Mar, ainda não tem o programa fechado, mas já exibe dois nomes de peso no cartaz: Kanye West, a 5 de Agosto, e David Guetta, a 6. Paredes de Coura: No dia 18 de Agosto assiste-se ao reencontro, depois de nove anos de interregno, da banda britânica Pulp. O regresso da formação de Jarvis Cocker já é motivo mais do que suficiente para a deslocação até Paredes de Coura, mas até ao dia 19 há ainda concertos de Deerhunter, Mogwai e Twin Shadow, no festival com o line up mais independente do Verão. World Music Sines: Quando se fala em world music em Portugal, não há melhor montra do que o Festival Músicas do Mundo, em Sines. Com uma programação bastante ecléctica, o FMM reúne, durante uma semana, consagrados e novas apostas no que de melhor se produz pelo mundo inteiro a nível musical. Com o castelo de Sines como palco principal, a edição deste ano, entre 22 e 30 de Julho, recebe, entre muitos outros, os Secret Chiefs, formação norte-americana que mistura rock progressivo com influências do Médio Oriente, Cheikh Lô, do Senegal, cantor e guitarrista que incorpora na sua música ritmos cubanos, reggae e música popular brasileira, o Le Trio Joubran, da Palestina, que

Cecil Taylor Jazz em Agosto, Lisboa, Gulbenkian 1 › 15 dAgosto


Foo Fighters, Optimus Alive Lisboa, Oeiras - 6 › 9 Julho

domina a arte de tocar alaúde. Destaque ainda para as cantoras Mercedes Peón, da Galiza, Manou Gallo, da Costa do Marfim, e Nomfusi, da África do Sul. Porto: A Casa da Música recebe o Festival Ollie Kan, nos dias 22, 23 e 24 de Julho. Da programação, destaque para Sur Le Niger (projecto do tocador de kora Madou Sidki Diabaté, do Mali, e do cabo-verdiano Bilan), Sofiane Hamma, da Argélia, Chicco Trujillo, do Chile, e Diom de Kossa, da Costa do Marfim. Viana do Castelo: Este Verão há ainda o Festival Música Celta, em Viana do Castelo, de 2 a 17 de Julho, que, tal como o nome indica, privilegia os sons tradicionais de países como Irlanda, Escócia, Galiza, País de Gales e Bretanha.

Nelly Furtado, Delta Tejo Lisboa, Monsanto - 1 › 3 Julho

Chemical Brothers Optimus Alive Lisboa, Oeiras 6 › 9 Julho

Lisboa, recebe o Delta Tejo, nos três primeiros dias de Julho. Mais uma vez, o evento tem uma forte presença de músicos brasileiros, entre eles, Maria Gadú e Djvan. Nelly Furtado é a convidada principal. Alentejo: Em Agosto, entre os dias 24 a 27, o Festival do Crato, no Alto Alentejo, está de volta e este ano aposta em nomes como o brasileiro Gabriel O Pensador, Expensive Soul, Clã e Deolinda.

Reggae Carcavelos: O Festival Musa, em Carcavelos, já conta com 12 ediLusofonia ções e, este ano, tem como cabeças Lisboa: Pelo quinto ano consecuti- de cartaz os aclamados jamaicanos vo o Pólo Universitário da Ajuda, em John Holt e Andrew Tosh. A praia

de Carcavelos vai receber ainda, nos dias 1 e 2 de Julho, outros ritmos das Caraí-bas como Barrington Levy e a dupla Romain Virgo e Gappy Ranks. Sagres: Em Agosto, nos dias 11 e 12, será a vez do Super Bock Surf Fest, em Sagres, 11 e 12 de Agosto, aplaudir a energética Ayo e a conhecida banda de reggae Gentleman.

Gentleman, Super Bock Surf Fest Algarve, Sagres - 11 › 12 Agosto

Electrónica Viana do Castelo: No final de Julho, entre os dias 28 e 30, o Neopop, em Viana do Castelo, apresenta uma programação de fazer inveja a qualquer festival internacional nesta área. Marcel Dettman, Dubfire, Marco Carola e Modeselektor são os nomes principais do evento, mas as actuações de DJ Harvey, Magazino, Expander e DJ Ride também são muito aguardadas. Elvas: Em Agosto, entre os dias 10 e 15, Elvas é palco do Freedom Festival, um encontro internacional de música transe. Tal como o Boom Festival, que este ano não acontece por ser bienal, não há um line up definido, mas o ambiente psicadélico e cósmico é prometido. ¶

Formação Avançada em Gestão e Empreendorismo Cultural Mestrado em Gestão Cultural

Colaboração docente do Prof. François Colbert (HEC de Montreal) e do Prof. Arjo Klamer (Erasmus University Rotterdam) Duração 2 anos. 120 ECTS

Mestrado em Gestão de Mercados de Arte

Inclui duas semanas de aulas no Sotheby’s Institute of Art (Londres) e no Institute d’Etudes Supérieures des Arts (Paris) Em colaboração com a Faculdade de Letras (UL) Duração 2 anos. 120 ECTS

Pós-Graduação em Gestão e Empreendorismo Cultural e Criativo Duração 1 ano. 60 ECTS

Pós-Graduação em Património e Projectos Culturais Duração 1 ano. 60 ECTS Mais informações

www.iscte-iul.pt


cinema

duções de vários países. Além de Scenes from the Suburbs, de Jonze, e de Umshini Wam, de Korine, serão apresentadas produções de realizadores menos sonantes aos holofotes dos media, como Edmund Yeo ou Dennis Tupikoff, num périplo feito dos EUA à Austrália, passando por cinematografias tão distantes quanto a do Quirguistão. No panorama nacional, 19 curtas juntam nomes tão sólidos como o de Pedro Costa (O Nosso Homem, de 2010) aos de emergentes, como o artista plástico/cineasta Gabriel Abrantes, que assina, com Alexandre Melo, Fratelli. Sem esquecer a animação, com Ginjas EP03: Linha Curva, de Zepe. Na secção competitiva experimental, o festival dá a oportunidade de

/ ricardo nabais

A Este de Bucareste, de Corneliu Porumboiu, Roménia (em baixo)

Vila das curtas

Ainda imune a crises e troikas, o 19.º Festival Internacional de Curtas de Vila do Conde arranca a 9 de Julho.

É o costume: filmes inéditos em Portugal ou que têm aqui primeira exibição mundial, presença de cineastas consagrados, competição, música, exposições… Falar de culto é pouco. Spike Jonze celebrizou-se no mundo dos videoclipes, dos filmes alternativos de culto no cinema norte-americano e pela sua ligação de cinco anos com a realizadora Sofia Coppola, a mais recente consagrada do clã iniciado por Francis Ford. Harmony Korine anda pelos mesmos circuitos deste seu compatriota, mas foi reconhecido, primeiro, pelo argumento de Kids, de Larry Clark, espécie de caixa de Pandora aberta sem aviso no mundo dos adolescentes de Nova Iorque. Em comum, ambos têm ainda a presença na edição deste ano do festival Internacional de Curtas de Vila do Conde. São dois cabeças de cartaz que vão apresentar também os seus filmes no festival, que nos

Sombras de Nuno Dias, Portugal, 2010

Ginjas - Linha Curva (ep. 03) de Zepe e Humberto Santana, Portugal, 2011

últimos anos se conseguiu intrometer e afirmar no panorama internacional das produções de curta duração. Sucedem a nomes como Gus Van Sant, Peter Greenaway, Manoel de Oliveira (há anos amigo do festival) ou Fernando Lopes, só para mencionar alguns. Dario Oliveira, um dos programadores e directores artísticos, define sem rodeios: “Vila do Conde é ponto de partida destas curtas-metragens, com público fiel e profissionais que descobrem o que há de novo na produção nacional”. E na internacional, acrescente-se. Em competição vão estar 34 pro-

Killing the Chickens to Scare the Monkeys de Jens Assur, Suécia, 2011

ver narrativas de grande liberdade formal, algo raro no nosso país. De resto, nem as convenções narrativas convencem ainda produtores e distribuidores presos às grilhetas do “mercado”: “Uma curta portuguesa quase nunca é distribuída nas salas”, explica Dario Oliveira. E o negócio está montado de tal forma que, sempre que ela consegue quebrar essa barreira e chegar às salas, acompanha uma longa-metragem, sem que “o produtor e o realizador ganhem nada com isso”. Podemos objectar que o formato não é familiar ao público. Mas Oliveira não concorda. As curtas de animação, por exemplo, são mais vistas que as longas e os festivais de circuito alternativo, Vila do Conde incluído, estão à pinha. Os organizadores deste festival conseguem ter essa percepção. “Seguimos o percurso de cada filme. Há produções portuguesas com mais de 30 prémios internacionais, só que estão sempre em malas para circular.” Em circulação por Vila do Conde estará também o romeno Corneliu Porumboiu, um “filho de Cannes”, como define o site do festival. Revelado pelo


certame francês em 2003, Porumboiu, de apenas 36 anos, tem feito residências artísticas na cidade-rainha do cinema europeu e recebido alguns prémios. É um dos realizadores na rubrica In Focus, que todos os anos dedica retrospectivas a vários cineastas. Outras rubricas do festival prometem alguns encontros insólitos, como a de músicos com realizadores em filmes-concerto. Em paralelo com a exposição “Stereo”, vai ser possível ouvir The Legendary Tigerman e Rita Redshoes musicarem Estrada de Palha, um western português de Rodrigo Areias, ou Arto Lindsay a dar o mesmo destino aos filmes de Pierre Clementi, entre outros encontros deste género. “Culto” é a palavra mais repetida por Dario Oliveira no decurso da conversa. Não é por menos. Se não for um festival deste género, os portugueses podem nunca ter a oportunidade de ver filmes que

Estrada de Palha de Rodrigo Areias com música de Rita Redshoes

saiam do binómio blockbuster/ entretenimento que as salas portuguesas apresentam ano após ano. Oliveira dá um exemplo próximo de Vila do Conde: “O Grande Porto tem 97 salas de cinema, mas não tem 97 filmes diferentes.” E quando se fala em crise financeira, o que esperar de 2012, ano da simbólica 20.ª edição do festival? “Não consigo prever, aliás, preferia nem pensar nisso”, conclui Dario Oliveira. ¶ 19.º Festival Internacional de Curtas de Vila do Conde 9 › 17 de Julho http://www.curtasmetragens.pt/festival/

Scenes From the Suburbs de Spike Jonze, EUA/Canadá, 2011,

Pair Of de Volker Schreiner, Alemanha, 2011


tEatro

Macbeth de Shakespeare pela Companhia do Teatro Oficina Centro Cultural Vila Flor 6 a 10 de Julho

/ rAquel CArrilho

Cenas de Verão

Embora o veludo das salas de teatro não apeteça tanto no Verão, a verdade é que quase todas as companhias fazem itinerância e é uma boa altura para aproveitar as noites longas das férias para ver as peças e a dança que se perdeu por medo de enfrentar a chuva. Há excelentes teatros de Norte a Sul que oferecem aos migrantes uma programação de luxo. Sugerimos uns quantos:

Cornucópia Até 24 de Julho, o Teatro da Cornucópia vai estar em cena no palco da sua sede, o Teatro do Bairro Alto, em Lisboa, com a peça ela, de Jean Genet. Numa tradução e encenação de Luís Miguel Cintra, conta com Ricardo Aibéo, Luís Lima Barreto, Dinis Gomes e o próprio Luis Miguel Cintra no elenco. Obra póstuma em um acto, foi escrita paralelamente à Varanda, e aborda também a temática da imagem e da distância entre ela e o eu. “Ela” é Sua Santidade o Papa e, na peça, um fotógrafo vem fazer uma fotografia oficial ao Papa. O encontro, no entanto, revela-se longe das expectativas mais formais.

Ela Tradução e encenação de Luís Miguel Cintra Teatro da Cornucópia até 24 de Julho

dor Rogério de Carvalho, numa paisagem cénica minimalista e abstracta, apreciando a “pulsão homicida” das personagens criadas por Molière, conduzidas pelo Harpagão de Jorge Pinto, motor do riso da peça. Teatro Nacional D. Maria II No mesmo mês em que o espectáculo se uma Janela se Abrisse visita São Paulo e recebe, na Sala Garrett, a parceria com o Festival de Almada (4 a 17 Julho), o Nacional tem em cena o espectáculo nacional – Material, Paisagem Com Argonautas (7 a 24 Julho) na Sala Estúdio. Inserido no Ciclo Emergentes e numa co-produção entre o Nacional e o Teatro Meia Volta e Depois à Esquerda Quando eu

Nacional – Material, Paisagem Com Argonautas Teatro Nacional D. Maria II de 7 a 24 Julho

Teatro Nacional São João Numa exibição única, o Teatro Nacional São João recebe, a 13 de Julho, o Festival de Almada, com ritratti di Commedia dell’Arte, um elogio a este género. Teatro Carlos Alberto Na última quinzena de Julho, sobe à cena a peça o Avarento, de Molière, numa tradução de Alexandra Moreira da Silva e encenação de Rogério de Carvalho. Aquele que foi eleito Espectáculo de Honra 2011 pelo público do Festival de Almada de 2010 está de regresso à estrada, primeiro em Almada e depois no Porto, onde se estreou em finais de 2009, neste mesmo palco. Durante duas horas assiste-se à colaboração entre o Ensemble e o encena-

FolkFaro 2001 Teatro das Figuras de 20 a 29 de Agosto

15 Anos – 15 Imagens Exposição dos 15 anos da companhia Paulo Ribeiro Teatro Viriato a partir de 31 de Julho


Disser, equaciona-se a relação entre o Teatro Nacional D. Maria II – a instituição, a prática e o público – e as realidades tangentes – esse melting pot que respira heterogeneidade entre o Rossio, o Largo de São Domingos e as Portas de Santo Antão, em Lisboa. Centro Cultural Vila Flor O mês de Julho no CCVF, em Guimarães, começa com a visita da Companhia Nacional de Bailado e a obra Uma Coisa Em Forma De Assim. Entre os dias 6 e 10 é Macbeth que ocupará os jardins do centro, com a companhia do Teatro Oficina. Esta versão do clássico de Shakespeare concentra o drama da ambição e do homicídio no trabalho de 12 actores e cruza-se com a nossa cultura actual. A Escola de Artes Performativas Asas de Palco inspirou-se no conto de Alice Vieira, A Arca do Tesouro, para, com música de Eurico Carrapatoso, criar o espectáculo A Caixa de Tampa Azul, uma caixa onde se escondem todos os segredos e que convida a sentir. Nas propostas internacionais há estreias absolutas para Portugal. Os espanhóis El Guincho (15 Julho) partem do que se cria em Espanha para realidades globais. Já os Rainbow Arabia (16 Julho) trazem de Los Angeles as raízes dos anos 80. O quarteto Red Orkestra (22 Julho) traz o folk do Canadá e do Brasil chegam os Do Amor (23 Julho), o grupo que reúne músicos da banda que acompanha Caetano Veloso e também Los Hermanos, considerados os Talking Heads de Belém do Pará. Teatro das Figuras O mês de Julho arranca com a comemoração do 6º aniversário deste teatro de Faro. Para assinalar a data, a direcção do teatro decidiu homenagear as raízes algarvias sem, no en-

O Avarento de Molière com encenação de Rogério de Carvalho Teatro Carlos Alberto última quinzena de Julho

tanto, esquecer o que é novo e contemporâneo. São dois dias de festa que arrancam com o espectáculo dos Danças Ocultas, no dia 1. O colectivo de concertinas que, em 2010, encerrou o WOMEX, um dos mais prestigiados certames internacionais dedicado à world music, em Copenhaga, apresenta aqui o seu mais recente álbum, Alento. Sonoridades de alma portuguesa onde se sente ainda o Oriente e África. O dia 2 é realmente dia de festa. No espectáculo Les Etoiles, da companhia Les Colporteurs, uma escultura-estrutura autosustentável, feita de tubos de aço e de cabos esticados, serve de suporte para toda a representação. No mês de férias dos portugueses, Agosto, o Teatro das Figuras tem agendada a Gala de Abertura do FolkFaro 2011, no dia 20. É o arranque da grande festa das músicas e danças do mundo que durará nove dias, envolvendo mais de 300 participantes, que, um pouco por todo o Algarve, vão elogiar as tradições populares. Teatro Viriato Em Julho, a casa da companhia do coreógrafo Paulo Ribeiro, o Teatro Viriato, em Viseu, arranca o Verão com a oficina A Loja Extraordinária da Rua Direita. Coordenada por Marina Palácio, esta oficina pretende proporcionar aos mais jovens o contacto com a natureza e com os materiais naturais, e assim despertar a necessidade de preservar o meio ambiente. De seguida, o teatro apresenta, em estreia absoluta, e no âmbito dos Projectos Com Comunidade, o espectáculo Lav’Alma N40º3W7º5 (entre 6 e 9 de Julho) que dará a conhecer as experiências vividas num mundo imaginário, onde a discórdia, a revolta e a paixão comungam lado a lado e onde a acção reflecte sobre o funcionamento da comunidade. No último dia de Julho, o foyer do teatro recebe a exposição “15 Anos – 15 Imagens”, onde se revisitam os 15 anos da companhia Paulo Ribeiro – criada em 1995 – através de 15 obras. Da obra de estreia, Sábado 2, ao trabalho mais recente, de 2010, Paisagens… “onde o negro é cor”. ¶


Exposição do Mundo Português, 1940.

↓ Inferno, autor desconhecido, c. 1510-20

Arte Portuguesa História Essencial PAulo PereirA Temas e Debates Círculo de leitores 872 páginas 27,50 euros É um pesado calhamaço. Uma palavra gasta, mas nenhuma outra seria mais precisa na descrição da primeira impressão que se tem deste livro de Paulo Pereira. Historiador de Arte, conferencista e comissário, Paulo Pereira coordenou outros volumes como o Dicionário de Arte Barroca em Portugal, história da Arte Portuguesa e lugares Mágicos de Portugal. Este título, recentemente lançado, é honesto logo na sua designação de “História Essencial”. Trata-se, de facto, de uma espécie de resumo cronológico e geográfico da arte em Portugal. Nada de muito analítico, o que o faz acessível a diferentes camadas de público. No fundo, é um livro de consulta rápida, uma edição capaz de apoiar os estudantes de História de Arte. Talvez pouco interessante para um leitor mais especializado, mas ainda assim capaz de resolver dúvidas de ocasião ou servir de introdução a um tema menos familiar. Das suas 872 páginas (que começam na pré-história e terminam nos dias de hoje) talvez haja a registar um fraco interesse do autor pela arte moderma e contemporânea. Dedica a esta temática umas parcas 30 páginas, onde ainda consegue encaixar temas de arquitectura e um resumido e eficaz texto sobre a Exposição do Mundo Português. Ocupando um espaço igual ao capítulo sobre a modernidade e a contemporaneidade está uma bibliografia que, mais uma vez, consiste num importante apoio ao investigador ou ao estudante. ¶ Miguel Matos

Francis Bacon Lógica da Sensação Gilles DeleuZe orfeu negro 280 páginas 15 euros A carne, o tempo, o movimento, a histeria e a tinta: palavras-chave da pintura de Francis Bacon. O que Gilles Deleuze fez com estas palavras e muitas mais, dirigidas à obra de Bacon, foi criar uma visão (que não deixa de ser pessoal) de um filósofo sobre um pintor. Mas não se fica por isto, pois o leitor mais atento poderá descortinar com este exemplo, a estrutura do pensamento de Deleuze sobre a pintura em geral e sobre a pintura que move o seu espírito. Ao longo deste livro, que teve a sua origem num texto publicado em 1981, há ligações entre a pintura, a literatura, a música, a psicologia e a filosofia. Cada tema ou capítulo diz respeito a obras específicas de Francis Bacon e é na ligação a estes exemplos que o livro peca. Ao não incluir as imagens dos quadros referidos pelo autor, torna-se muito difícil entender o que Deleuze quis salientar. É necessário ter ao lado um computador com Internet ou um catálogo da obra de Francis Bacon, pois Deleuze aproxima-se da pintura à distância do milímetro. E, a partir deste registo de pormenores, torna-se crucial ver o que o filósofo analisa. Ainda assim, é impressionante a capacidade de discurso que o autor tem sobre a visceralidade do pintor, sobre o corpo sem órgãos e sobre um “rosto humano que não encontrou ainda a sua face”. É de destacar também o excelente prefácio de José Miranda Justo, tradutor do texto de Gilles Deleuze. ¶ Miguel Matos Francis Bacon, Study After Velazquez's Prortait of Pope Innocent X, 1953

xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx

livroS


A Visão em Apneia Delfim Sardo Athena 456 páginas 19 euros

Literacia Visual Isabel Capeloa Gil Edições 70 320 páginas 16 euros

Eis um novo livro, daquele tipo de livros que fazem muita falta no panorama editorial português relacionado com a arte contemporânea. Uma colectânea de textos sobre artistas escritos por Delfim Sardo, conhecido e renomado pro- fessor universitário, ensaísta e cura- dor. Dada a escassa literatura e a parca memória dos portugueses em relação aos artistas e à sua obra, é essencial que se compilem as reflexões que se vão fazendo aquando das exposições, normalmente editadas em catálogos de reduzida tiragem e facilmente esgotados. Antes de Delfim Sardo, outros autores como José Gil, Maria Filomena Molder e Manuel Castro Caldas publicaram nos últimos anos volumes análogos, com coincidências numerosas de artistas abordados, situados num gosto vigente instituído. Nesta edição de design cuidado e elegante, Delfim Sardo começa por explicar a sua visão acerca de como deve ser a crítica de arte e exemplifica com este elucidativo excerto: “É esta a ambição de qualquer pessoa que escreva sobre arte: encontrar numa obra aquela transfiguração física, a mudança orgânica que acompanha a intuição de um reconhecimento vago, daquilo que em catadupa aflora.” Para exemplificar este espanto do fruidor da obra de arte, Sardo relembra uma experiência tida por si numa sala de cinema, na companhia da sua filha, assistindo ao filme Ratatouille. Como? Cabe ao leitor descobrir logo nas primeiras páginas deste livro… . ¶ Miguel Matos

Literacia é um conceito habitualmente usado em relação à linguagem verbal, mas, à semelhança de outros autores, Isabel Capeloa Gil propõe uma reflexão sobre a literacia visual no 97º volume da icónica colecção Arte & Comunicação, das Edições 70. Como a própria admite, “Literacia visual parece ao leitor comum uma designação enigmática, algo perturbadora e incongruente, até.” Por isso inicia este livro composto por vários textos, aludindo à metáfora da imagem de um coelho-pato. Serve este animal duplo para referir o facto de cada pessoa interpretar a imagem segundo os seus próprios parâmetros. Existe uma ambivalência da percepção do sujeito neste exemplo. O objecto e a percepção do objecto podem ser ambivalentes. Se uma pessoa vê um coelho e outra um pato, isso significa que a imagem tem uma potencialidade dupla que é activada de formas diferentes consoante o substrato de cada indivíduo. A partir deste tema, a autora define o tom geral deste livro denso e demasiadamente rico em referências (num caso agudo de name dropping). As reflexões passam por outras temáticas como a estética noir em Edgar Allan Poe, o fetichismo visual de Baudelaire a Walter Benjamin, o olhar nómada de J.M. Coetzee, para além de diversas questões relacionadas com o cinema e a imagem em movimento. ¶ Miguel Matos

exposição. 18 Jun – 18 Set 2011 Vila do Conde. Centro de Memória w w w.es ta le i ro.cu r tas . p t

PCR_FCC_Artes&Leiloes_final.qxp:anuncio

6/16/11

3:46 PM

Pedro Cabrita Reis

Inauguração: 30 de Junho de 2011, às 22h00 Exposição: de 1 de Julho até 8 de Outubro de 2011 Horário: de quarta-feira a sábado, das 15h00 às 20h00

fundação carmona e costa edifício soeiro pereira gomes ( antigo edifício da bolsa nova de lisboa ) rua soeiro pereira gomes, lte 1- 6.ºd, 1600-196 lisboa (bairro do rego / bairro santos) tel. 217 803 003 / 4 metro: sete rios praça de espanha cidade universitária autocarro: 31 www.fundacaocarmonaecosta.pt

Page


ARt miX / jorge dos reis

“i feel most colored when i am thrown against a sharp white background” ou “i do not feel colored”, Ligon revela a pressão contínua que ainda hoje é exercida sobre certas comunidades negras nos Estados Unidos da América. Tendo em conta os aspectos enunciados, a obra de Ligon é por vezes classificada como “Post-Black”, um termo que, segundo Richard Meyer, foi inventado por Thelma Golden no contexto de Freestyle. O Glenn Ligon termo “Post-Black” tinha uma duEu sinto a minha cor pla face fabulosa tendo em conta que se referia a artistas que eram Glenn Ligon é um artista que mais inflexíveis sobre o facto de não nasce no início da segunda serem classificados como artistas metade do século XX e vai vi- negros, apesar de o seu trabalho esver para Nova Iorque, atraído tar profundamente interessado na pela cena artística dessa cida- redefinição de noções complexas de, durante os anos 1980. O relacionadas com a cor da pele. seu trabalho inclui a pintura, Ligon utiliza a tipografia como obo vídeo, a fotografia ou o mul- jecto não-estético que funciona timédia como na obra Anno- como mensagem anónima da setations, onde utiliza o forma- gregação social. Como uma voz dato Internet. queles que não têm voz. Ligon reveA sua sólida relação com a literatu- la a opressão social através de frases ra, desenvolvida contundentes desde a infância, ocultadas com irá conduzi-lo a óleo, para assim uma reflexão ficar expressa sobre questões a forma como de ordem soa linguagem é cial, política e reprimida e code identidade, mo os grupos que informam sociais minoriagora muito do tários são segreseu trabalho gados e silencom a tipograciados. fia reforçando o Ligon trabalha poder visual da com o stencil escrita. para marcar os Ligon é um artextos na tela tista que utiliza numa mediação a tipografia nas entre legibilisuas telas para dade e absoluta marcar a posiilegibilidade, ção dos afroatravés de um Untitled (Two White Two Black) 1998 americanos na tratamento pasAmérica de hoje. Sendo negro e toso da superfície de leitura. O texto homossexual, o seu trabalho convo- começa a desaparecer à medida que ca questões raciais e sexuais. A sua progride, linha a linha, de cima para abordagem do tema da cor da pele baixo na superfície da tela. Esta mafaz-se em torno do conceito de raça, nipulação gráfica evoca a diferença estruturado pelo contexto. Utiliza entre ver e ler, pondo em cheque a textos de autores como Jean Genet, confiança que normalmente coloMary Shelley, Zora Neale Hurston, camos na leitura e na visão. Ralph Ellison ou James Baldwin, O trabalho de Ligon utiliza grandes autores negros, na sua maioria, que suportes de representação para corconstituem no seu conteúdo um romper o próprio stencil enquanto manifesto das culturas marginais, forma de imitação e limitação espacontra o mainstream heterosse- cial do desenho tipográfico. O tipo xual de classe alta que determinou de letra, que convoca uma unifore legitimou os padrões sociais das midade comercial e mecânica grasociedades urbanas. Quando lemos ças ao negativo perfurado da cha-

← Prisoner Of Love #1


pa, é corrompido por Ligon ao ler até certo momento “we are usurpar as áreas limitadas pelo the ink that gives the whipróprio metal de que é consti- te page a meaning”. Tendo tuído. Forma então manchas de em conta a repetição da frase, tinta, quase displicentes, onde percebemos o que está escrito conseguimos ainda perceber o mesmo quando a tipografia está tipo de letra que constitui o for- profundamente empastelada. mato em negativo do stencil. Esta leitura repetida e infinita Estamos já no campo da ilegi- lembra uma leitura em círculo, bilidade, tendo em conta que uma leitura sem fim. em algumas zonas das pinturas Por outro lado, verificamos de Ligon não somos capazes de uma alusão directa à tipografazer uma leitura mas consegui- fia enquanto arte negra, no seu mos ainda contraponto descodificar com a cor a utilização da pele. A da tipografia tipografia, e das letras represenenquanto tada pela entidades marcação a autónomas tinta preta da comunisobre o pacaçãoescrita. pel branco, Gera-se, nesconsiste na te caso, uma materialidabarreira ante de do signio observador ficado. Conque percebe tudo, a sua que o texto dimensão e existe, mas verticalidavê goradas de tendem a as suas evenanular a aluUntitled (Two White Two Black) 1992 tuais tentatisão à página vas de leitura, tendo em conta a impressa, afastando-se neste interferência de elementos for- sentido do conceito livresco de mais parasitários. Gutenberg. A dimensão de ilegibilidade é As duas obras seguintes, Two cuidadosamente organizada White Two Black (1992) e Two por Ligon que planeia não só White Two Black (1998), são este impedimento mas também reveladoras do tema da cor da a relação entre a legibilidade e pele, recorrente em Ligon. Ao a ilegibilidade. Assim sendo, as citar “i feel most colored suas telas são constituídas por when i am thrown against zonas onde é possível também a sharp white background” realizar uma leitura relativa- e “i do not always feel comente confortável dos conte- lored”, Ligon coloca a sua údos. Gera-se um contraponto reflexão em torno do conceito entre aquilo que é visível e aqui- de raça e não em torno de uma lo que está manchado e oculto descrição efectiva de racismo. pela tinta. Isto indica que temos A subtileza do texto convoca zonas de leitura que funcionam com grande eficácia o facto de como chave para outras zonas o preto não ser cor, mas sim onde não é possível descodifi- a ausência de cor. Por outro car a tipografia. O modo como lado, transporta um conceito se concretiza este processo é em de designação de “cor” na raça Ligon muito particular pois a ti- negra, facto geralmente evocapografia vai sendo, como temos do pela própria raça branca. A referido, corroída gradualmen- expressão “indivíduo de cor”, te de cima para baixo. normalmente utilizada para Tendo em conta os princípios designar a raça negra, é sintoenunciados, seleccionámos mática. Neste sentido, Ligon três obras que consideramos rejeita liminarmente a noção fundamentais e que permitem de cor que é aplicada aos afroverificar a estratégia formal de americanos. Assim, Ligon é Ligon. A primeira destas obras é uma voz tipográfica, uma voz Prisoner of Love #1 onde se pode de intervenção social. ¶


biENal DE vENEza faça-SE f faç a-SE a luz

CHRISTIAN BOLTANSKI © DIDIER PLOWy

viagem


França, Christian Boltanski, Chance, 2011

É sob o signo auspicioso da luz e das iluminações que a 54a edição da Bienal de Veneza congrega obras-primas do mestre Tintoretto com outras contemporâneas de novos mestres da luz como James Turrell. Surgem assim mundos virtuais em que a presença feminina é assumidamente marcante. Ou não fosse Bice Curiger, a directora artística da bienal, uma mulher.

A 54.ª edição da Bienal de Veneza, entre 4 de Junho e 27 de Novembro, conta com 89 países e os respectivos pavilhões, a maioria dos quais na área dos Giardini. Alguns países são estreantes, como o Iraque, Barém, Ruan Ruanda, Bangladesh, Malásia, Andorra e Haiti. “ILLUminations” é o tema da grande exposição que está patente no Pavilhão Central dos Giardini. A di direcção coube a Bice Curiger, co-fundadora da revista Parkett e curadora da Zurich Kunsthaus, que teve como ponto de partida para a construção da mostra o condicionamento colectivo, depois de cuidadosa escolha do tema. No total, reúnem-se obras de 83 artistas internacionais como Song Dong, Monica Sosnowska, Sigmar Polke, Christian Marclay, Monica Bonvicini, Jack Glodstein e James Turrell, entre outros. O tema da luz da adarte e na arte contemporânea estende-se a obras históricas que aqui ad desquirem lugar de destaque: três telas de Tintoretto que não passarão des percebidas e que servem de referente para outras obras mais recentes. Os quatro artistas convidados, Song Dong, Monika Sosnowska, Franz West quae Oscar Tuazon, fizeram uma selecção das suas obras expostas em qua tro para-pavilhões. Curiger justifica esta opção para fugir a um “efeito de adição” e para criar momentos mais dinâmicos. Uma estratégia arriscada da parte de uma personalidade que afirma “ainda receber muita energia e inspiração do mundo da arte”.


viagem

Les Liens Invisibles, Aparição do unicórnio, Praça de São Pedro, Roma, 24 de Abril de 2011 , Domingo de Páscoa.

Pavilhão português A representação nacional é incorporada e materializada em “Scenario”, da autoria de Francisco Tropa. O artista, vencedor de prémios como o da União Latina e o Prémio da 7.ª Bienal das Caldas da Rainha, já expôs na Fundação Calouste Gulbenkian, em Serralves e em eventos internacionais como a Bienal de São Paulo ou a Manifesta de Liubliana. A curadoria é da responsabilidade do comissário Sérgio Mah e o local escolhido é a Fondaco Marcello, num edifício histórico dos séculos XVI e XVII, próximo do Palazzo Grassi, que tem servido de armazém. Escultura, imagens e fragmentos da natureza compõem “Scenario” numa clara continuação do que vem sendo o trabalho de Tropa, conjugando escultura e outros media. Sérgio Mah descreve o ambiente da exposição como “misterioso e enigmático, um lugar intemporal no qual os objectos e as imagens, para além do seu valor específico, cumprem uma função heurística, a procura de uma outra compreensão da natureza das coisas”.

Portugal, Francisco Tropa, Scenario, 2011

ALLORA & CALZADILLA © FOTO ANDREW BORDWIN - THOMAS HIRSCHHORN © FOTO FRANCESCO GALLI - LES LIENS INVISIBLES © STUDIO ONOFF E FRANCESCO CICCONARDI - ANDREI MONASTyRSKI © CORTESIA DO AUTOR E STELLA ART FOUNDATION, MOSCOVO - FRANCISCO TROPA © FOTO PEDRO TROPA

Pavilhões virtuais A Christie’s lança o guia mais completo da bienal, para o iPhone e o iPad, que pode ser descarregado gratuitamente no site da leiloeira. Com ele poderá encontrar todos os caminhos na cidade, os pavilhões ou restaurantes. No Pavilhão Invisível nove artistas criaram conteúdos virtuais, textos, objectos e vídeos. Segundo a comissária: “Não se trata de aumentar a realidade, mas sim de aumentar as informações sobre a realidade”. Esta exposição inclui o colectivo Les Liens Invisibles, que criou uma imagem virtual de um unicórnio rosa que foi projectada, na Praça de São Pedro, em Roma. Manifest.AR é outro pavilhão virtual. No seu manifesto é dito: “A arte AR é antigravidade e deve ser encontrada. É instável e inconstante. Está a ser e a tornar-se real e imaterial. Está lá e pode ser encontrada – se soubermos procurá-la.” .


Russia, Andrei Monastyrski, Collective Actions. Slogan-1977, Moscow region, 1977

EUA, Allora & Calzadilla. Algorithm, 2011

Suiça, Thomas Hirschhorn, Crystal of Resistance, 2011

Outros pavilhões em destaque — Alemanha: Um espaço pontuado pela obra de Christoph Schlingensief, artista falecido alguns meses após ter sido escolhido para representar este país. Cinema, ópera, instalação e até talk-shows são alguns dos meios que o artista escolheu para “falar” da sua condição de doente terminal, optando sempre por uma provocação. — EUA: Seguindo uma tendência para trabalhar com duplas de artistas, seleccionou o colectivo Allora & Calzadilla, de nacionalidade estado-unidense e porto-riquenha. Ironia, atitude e uma arte interventiva na vida política constituem uma premissa certa nas suas construções e performances artísticas. — França: Coube a Christian Boltanski explorar o conceito de “sorte”. Chance é uma instalação (teatral) em que se brinca com a ideia da sorte e do acaso, presentes desde o início na vida de cada um de nós. O título é aqui lido num duplo sentido e embora nos seja dito que “os dados estão lançados” ou “les jeux sont faits”, ainda há espaço para uma possível visão optimista da vida. Tal como na vida, o visitante pode participar num jogo e ganhar… (neste caso, trata-se de uma obra do próprio Boltanski). — Iraque: Num período simbólico de renovação, após 30 anos de luta e instabilidade política, reúnem-se obras de artistas da geração de 50 com as obras dos artistas que assistiram à invasão do Koweit. A guerra, a política e outras realidades menos poéticas surgem retratadas em pinturas, fotografias e instalações em que o mundo Ocidental e Oriental se cruzam. — Polónia: No caso da Polónia, surge Yael Bartana, de ascendência polaca, com larga experiência de trabalho neste país. Religião e política mesclam-se nos filmes que traz a Veneza: Mary Koszmary, Mur i Wieza e Zamach tratam de reminiscências religiosas, falando de um movimento colectivo de “renascimento” judeu. Questões antropológicas como a identidade nacional, internacional ou até colectiva são tratadas por esta artista com uma frescura semelhante a uma atitude “amadora”. — Suíça: Este pavilhão é ocupado pela obra de Thomas Hirschhorn. Num ambiente de mistério até ao início da mostra, o artista não concedeu qualquer informação sobre o que iria expor. Numa postura habitualmente defensiva e até agressiva, Hirschhorn, que cria objectos artísticos a partir de materiais do quotidiano colados uns aos outros, optou por uma instalação caótica que, como é seu hábito, “não é produzida só para um contexto”. — Rússia: Este pais quis prestar homenagem a Andrei Monastyrski, figura importante durante os anos 70, que se notabilizou na poesia, ensaio de arte, teorização e na sua própria arte. Associado a Boris Groys e ao seu movimento artístico, foi também figura central do grupo Acções Colectivas (surgido em 1976) que realizava sobretudo performances em cenários naturais como rios, florestas e espaços rurais. Uma surpresa está reservada aos visitantes: uma instalação encomendada especialmente, cuja natureza permanece ainda secreta. ¶ Teresa Pearce de Azevedo


artis ta Num percurso pensado como uma sucessão de encenações dentro de uma galeria cavernícola, as peças em dueto encaminham o visitante na exploração da palavra dita, desenhada, esculpida…

sempre esteve presente? rui chafes: Penso que sim. Esta exposição é sobre palavras – escritas, faladas… as Rui Chafes palavras dão nomes às pedras e aparecem nos desenhos, nos vídeos… Todas as peças têm títulos e aqui a Um projecto que demopalavra tem tanta rou dez anos para se ver importância como concretizado e que culmitudo o resto. A matéria na na última sala com a simdo meu trabalho é ferro e biose perfeita dos dois artistas palavra. O poder da palavra é muinuma instalação capaz de provocar um to superior ao da imagem. Uma palavra pode salestado de transe. A Artes & Leilões entrou no mundo var ou pode matar. das ideias e do ferro de Chafes. a&l: Os dois artistas já tinham trabalhado anteriora&l: Já realizou exposições com Fernando Calhau, mente. Como é que começou esta exposição que agoVera Mantero, Alberto Carneiro, Orla Barry… O que é ra vemos, de que ideia partiu e como se desenvolveu que acontece quando trabalha em colaboração com ouconceptualmente? tros artistas? O seu processo criador transforma-se? rui chafes: Isto foi uma feitiçaria… Fizemos o prirui chafes: É como ir a andar e passar ao pé de abismeiro trabalho há dez anos, na altura em que nos comos. Georg Büchner dizia que cada ser humano é um nhecemos, aquando de uma exposição na Bélgica abismo. Quando nos debruçamos sobre ele, temos que juntava poesia e artes visuais. Ficámos vertigens. Se eu vou trabalhar com um artista, interessados no trabalho e na personaestou a aproximar-me muito desse abisgem um do outro. Quando fizemos a mo. Tento sair de lá sem cair. primeira peça em conjunto, comea&l: E sai-se o mesmo após conçámos imediatamente a pensar templar o abismo? No Museu Berardo num segundo trabalho que é, no rui chafes: Nunca se sai o Rui Chafes e Orla Barry fundo, um projecto imparável. mesmo. Avanço para outras apresentam, até 21 de Agosto, a&l: Foi um trabalho sem obcoisas, abro outras portas. a exposição a quatro mãos jectivo definido, como uma Transformo-me, altero-me. “Five Rings”. relação à distância, que no Se fosse para ficar na mesma, fim, poderia ou não ter uma não valia a pena. apresentação? a&l: Há uma disrupção que rui chafes: Sim. Durante permite ao público olhar para a esses dez anos trocámos carobra de cada artista de uma outas, mails, faxes, telefonemas, entra forma… contros… e desenvolvemos muitos rui chafes: A questão dos públicos projectos, mas o essencial está aqui. A questão do é muito curiosa porque dois artistas têm dois tipos de tempo é essencial, porque há uma diferença gigantespúblico diferentes. Quanto mais afastadas forem as suas ca entre fazer uma exposição num mês ou em dez anos. áreas, mais afastados são os públicos. As experiências Durante esse período, uma série de dúvidas e cerque tenho feito dividem muito os públicos. Por tezas vão amadurecendo. Quando há dois exemplo, quando trabalhei com o Pedro Cosanos fomos convidados por Jean-François ta, havia um público do cinema e outro das Chougnet para fazer uma exposição no artes plásticas, que nunca se tocam. Com Museu Berardo, pegámos em todo o a Vera Mantero havia a divisão entre o material que tínhamos e começámos meu público e o público da dança e da a adaptá-lo às salas. Escolhemos esperformance. Poucas pessoas conseRui Chafes, Three sisters listening to the sound of the earth tas galerias porque são um espaço moving through their bodies, 2011 guem ter a elasticidade para entenclaustrofóbico, sem janelas nem luz der as ligações. Nesta exposição, natural, com um tecto baixo. Queríahá de novo um teste a essa situação mos um espaço fechado e intimista. e na sala final já não dá para separar a&l: A suas esculturas relacionamas partes, é uma obra única composse com a linguagem e função da joata pelos vários elementos e em que as lharia contemporânea, sendo que o que valências de cada artista estão condendefine esta é, acima de tudo, a relação com sadas num só resultado. um corpo ou a alusão à existência desse corpo. Isto a&l: Os seus trabalhos têm títulos que lhes acresacarreta noções de escala e aplicabilidade ou não das peças, centam significados. Nas obras de Orla Barry, a própria palapara além de características ritualísticas. O seu trabalho funvra é “objectificada” e mostrada. Isto torna mais visível aquilo que

"a matÉria do meu trabalho é ferro e palavra"


Rui Chafes, Burning in a forbidden sea, 2011

ciona também nestas dimensões. Concorda com esta associação? rui chafes: Acho que as palavras têm sempre raízes e essas raízes têm que ver com a nossa história. Há vários outros tipos de escultura, entre eles a escultura bárbara, que é a que me interessa. A escultura bárbara é nómada. É a faca que se transporta, o colar, a jóia, o ornamento. As minhas esculturas estão mais próximas dessa flexibilidade. Mesmo as obras de maior dimensão obedecem a uma lógica nómada, de leveza, de instabilidade, de transporte. As minhas esculturas são, de facto, próximas da joalharia, não pela sua utilização, mas pela família a que pertencem – a família do ornamento bárbaro. A joalharia também é nómada e também se guarda e é preciosa nos planos simbólico e material. Mas a escala e a proporção são diferentes. a&l: Acredita que a obra de arte tem um poder transformador. Não será uma ideia amplamente partilhada pela maioria dos artistas contemporâneos. Em que sentido a obra de arte ainda pode ter esse poder na vida, no pensamento e na cultura? rui chafes: Se não tiver esse poder transformador, não é arte, é outra coisa qualquer… A arte tem de ser capaz de transformar o olhar ou a vida de quem a observa. Não há arte sem transformação, é a transformação de uma coisa em outra. a&l: Por isso, não há arte que seja natural… rui chafes: Sim. Essa transformação não é magia. É a disciplina que o artista conseguiu para, com a sua experiência e o seu conhecimento, colocar os objectos que faz num plano semântico, simbólico, metafórico e metafísico, que muda alguma coisa nas pessoas. O mundo está cheio de objectos, não é preciso

haver mais. A arte que é só uma ideia gira baseada em brincadeiras e gadgets não interessa. a&l: Os seus trabalhos de escultura impõem uma presença como entes ou presságios. Os ingleses têm a palavra “omen”, que acho muito adequada… rui chafes: Eu sei que é muito difícil escrever sobre o meu trabalho porque não existe nada parecido com ele. Portanto, não há muitos referentes conhecidos para começar a construir um discurso. Os pressupostos do meu trabalho estão ancorados em muitas coisas diferentes com distâncias no tempo e no espaço. De facto, são entes ou presenças. É um trabalho que cria uma relação obscura e ambígua com as pessoas. Eu próprio às vezes não o compreendo. Há casos em que só passados anos é que compreendo porque é que fiz determinada peça. a&l: Pratica um radical afastamento do lado mais mundano da arte e considera essa distanciação essencial para a sua vida e para o seu trabalho. Porquê? rui chafes: Faço uma separação muito grande entre o que é a arte, enquanto trabalho de pesquisa, investigação e experiência, e a minha vida. Não misturo as coisas. Essa ideia de o artista estar retirado do mundo é, para mim, essencial. Não quero nem preciso de publicidade. Ao contrário de outros artistas, recuso falar para a televisão, recuso retratos, recuso todo esse tipo de promoção e sou muito criterioso nas entrevistas. Vivo uma vida reservada, longe das imagens públicas, e assim quero continuar. Para mim, a única coisa que conta é a obra, a escultura, o seu poder evocativo nas pessoas. Tudo o resto, todo o esforço de espectáculo e imposição social, é efémero e prescindo dele. É uma questão de higiene mental e emocional. ¶ Miguel Matos


artE Ero Ero tica

capa

Uma colecção que é um desejo

De Coimbra a Leiria é um saltinho. Até à Marinha Grande pouco falta, e as Caldas ficam ali tão perto... É com estes quatro pontos do centro litoral português que se traça o mapa histórico daquilo que poderá vir a ser o primeiro museu de arte erótica. São pequenas esculturas,

artesanato, pinturas a óleo, aguarelas, desenhos originais, jogos, publicidade, “brincadeiras”, mecanismos com “malandrices”, relógios, pacotes de açúcar, postais, bengalas, selos, pins, porta-chaves, cartazes de cinema, baralhos de cartas e de tarot… São cerca de 2000 peças, às quais se juntam 1500 livros sobre erotismo e sexualidade. Por detrás de tudo isto está João Proença, 50 anos, casado, pai de duas filhas, economista, mestre em Ciências Empresariais, quadro superior de uma grande empresa da região Centro: também São Ro-

↑ Chavdar Chushev (EUA) Camafeu com figuras mitológicas,, 2002, prata, 3,5 x 3 cm ↓ Guido Ooms (Holanda) Dildo, 2006, porcelana e rolha de cortiça, 23 x 4 cm

↗ Autor desconhecido (Bali) Casal entretido, 2011, madeira de Kayu Suar, 30 x 10 x 19 cm


FOTOS © JOANA DE MOURA F O T O S © J o a n a d e M o u r a

fotos © Joana de Moura

FOTOS © Joana de Moura

fotos © Joana de Moura

Esther Horchner para a Het Paradijs (Holanda) Conjunto de bule e chávenas de chá, 2011, porcelana com transfers, 10 x 6 cm (chávenas) e 15 x 16 cm (bule)

sas, na blogosfera, líder d’A Funda São (www.afundasao.com). Com o seu alter ego, ego, João Proença dá vida à singular colecção que tem em casa. O gosto pela literatura erótica herdou-o do pai, que escondia a história de o, o amante de lady Chatterley ou Fanny hill h h hill.. Era às escondidas que João abria o baú destes segredos, e era em segredo que os lia. "Quando comecei a trabalhar e a ganhar o meu dinheiro, comecei a comprar estes e outros clássicos da literatura erótica", recorda. Aos clássicos juntaram-se mais tarde a banda desenhada, a poesia, a arte e, "à medida que os anos foram passando, outros tipos de livros, dentro das temáticas do erotismo e da sexualidade". Ao coleccionismo, que há muito tinha ultrapassado o voyeurismo juvenil, seguiram-se o interesse genuíno, o estudo e a defesa de causas: "O erotismo e a sexualidade são vistos pela sociedade com uma carga extremamente negativa, o que me parece nefasto para um desenvolvimento equilibrado e saudável das pessoas.” Mas os objectos surgem em Coimbra, como se disse inicialmente. Uma funcionária do quartel onde cumpria serviço militar "levou um dia uma pequena ampola de vidro, idêntica às injecções bebíveis, só que lá dentro tinha água e um casal nu e encaixadinho". O artesão da Marinha Grande, que fizera aquela peça, fazia conjuntos com mais cinco. João Proença encomendou seis ampolas para si. Uma posterior visita às Caldas proporcionou-lhe o encontro com o artesanato típico e levou mais alguns objectos para casa, onde se foram espalhando com os anos "sem qualquer ligação entre eles". Porém, as navegações na Internet e as viagens – as dele e as dos amigos – permitiram-lhe comprar peças e livros por todo o lado. "Entretanto, criei uma rede internacional de contactos com artistas e vendedores de todo o mundo", acrescenta. Já teve a experiência "bem frustrante, de competir em leilões com Miss Naomi Wilzig, uma multimilionária norte-americana que criou entretanto um museu do erotismo em Miami". Mas o que mais importa são as conquistas. Do Padre inácio iinácio,, peça encomendada à ceramista Júlia Ramalho, que levou três anos a ser convencida, mas que depois modelou também Adão e eva, ambos “com as parras caídas mas a Eva a tapar-se e o Adão sem vergonha nenhuma”, nas palavras da artista, que João Proença recorda. O pudor acaba por estar presente em grande parte das histórias desta colecção: "Há uns anos, encomendei em Lazarim uma máscara de Carnaval tradicional, em madeira. Expliquei que era para uma colecção de arte erótica e que pretendia, por isso, que ‘os cornos fossem dois sardos’. Felizmente, antes de ele começar a esculpir o tronco, telefonei-lhe e apercebemo-nos a tempo de que ele ia esculpir os cornos como sendo dois lagartos: ‘Ah! A minha mulher é que tinha razão. O senhor queria dois margalhos!’” ¶ Ana Albuquerque

← Autor desconhecido (Holanda) Anel, 2011, liga metálica, 3,5 x 2,5 cm

o muSEu mu u qu muSE quE E fALTA fALTA ERguER

Apesar de nestes últimos 20 anos encontrar e encomendar inúmeras peças que hoje fazem parte do seu espólio privado, João Proença acarinha especialmente as ofertas, tanto de amigos como de pessoas que, sem o conhecerem, lhe confiam objectos. "Tenho particular estima por tantas peças que... só apreciando-as, uma por uma", acaba por dizer. Este poderá ser um privilégio de quem o queira fazer, assim se crie em Portugal o primeiro museu do género. João Proença tem contactado a Câmara das Caldas da Rainha: "Pela sua tradição no artesanato erótico, sempre me pareceu ser o local ideal. Tenho um projecto para o espaço, as suas diversas valências, os recursos necessários e as fontes potenciais de receita. A ideia não é criar um museu, no sentido corrente do termo, de reunião e exposição de obras de arte, mas um espaço em que o espólio funcione como pólo agregador com várias valências: biblioteca, loja, exposições temporárias, organização de eventos, etc. Terá de ser um espaço intimista, assumindo que esta colecção é um paradoxo, pois trata-se de mostrar o que habitualmente se quer esconder", reconhece. Outra opção é criar uma colecção visitável, cujo lançamento exige menos burocracias. Mas a caixa de sugestões do coleccionador continua aberta. ¶ AA


DocS / elsA GArCiA A Arte de Filmar a Arte

A Midas pesquisou, investigou, inovou e deu vida a uma significativa colecção de DVD intitulada “Arte & Artistas”, da qual já fazem parte 13 títulos. Uma colecção do que de melhor se fez e faz em Portugal no mundo das artes, que se vai desenrolando em histórias curiosas sobre os artistas e a sua relação com as obras.

Imagem da capa do DVD de Ângelo de Sousa, Tudo o que sou capaz, 2006 de Jorge Silva Melo

Trata-se de um conjunto de documentários que enche as medidas a qualquer apreciador de arte, pois vai permitindo a descoberta do que ainda não se conhece e aprofunda o conhecimento de artistas que são já sobejamente conhecidos.

Comecemos por falar do filme sobre as sombras de Lourdes Castro: era uma vez um lençol onde estava projectada uma sombra que nunca mais lhe abandonou o pensamento e que se transformou na sua prática artística até aos dias de hoje. Por outro lado, há a pintura habitada de Helena Almeida e a sua relação física com a fotografia, com destaque

que mostra os primeiros passos no domínio dessa arte. Tudo começou em 1956, altura em que Manuel Torres facultou a sua garagem para instalar a primeira prensa. Muitos artistas se juntaram, com enorme entusiasmo em experimentar esta técnica. Havia uma esperança e um envolvimento no que se fazia. As mãos ficavam sujas com a água-forte e era necessário ter um grande cuidado com os materiais, passando por várias etapas que depois se concretizavam em magia. A Cooperativa Gravura tornou-se numa espécie de escola, num palco de experiências em que um rol de artistas se dedicava a esta arte com uma curiosidade inesgotável. Um documentário que fala sobre a Lisboa de uma época, mostrando zonas de confluência de artistas, principalmente o Chiado, e a grande agitação que se vivia na Brasileira. É composto por dezenas de

depoimentos que retratam a história e as consequências desta agremiação e a sua origem nos movimentos de oposição à ditadura numa improvisada garagem de Algés. É nas “Exposições Gerais de Artes Plásticas” que a gravura começa a afirmar-se e desenvolve-se através de diversas exposições em cineclubes espalhados pelo país, o que acabaria por divulgar bastante esta técnica. Nas palavras de Fernando de Azevedo: “A gravura foi uma mútua aprendizagem, pois nenhum de nós teve mestres.” Tão mágico quanto o da gravura é o documentário sobre Lourdes Castro, intitulado Pelas sombras e realizado por Catarina Mourão. Este já ganhou o Prémio do Público para Melhor Longa Metragem do Indielisboa e o Prémio Signis do Festival Temps d'Images correspondente ao Melhor Filme Português da competição Filmes sobre Arte. Tudo se passa na Madeira, na casa e jardins que rodeiam a artista. Ao longo de todo o filme, Lourdes Castro vai mostrando os seus diários, livrosobjecto repletos de histórias, referências e colagens. Autênticos relicários que nos desvendam a riqueza da sua arte e permitem a sua descodificação. Sempre sorridente e com um ar infantilmente

para o diálogo que estabelece entre as suas mãos e a obra. Um lençol de histórias que atravessa uma colecção que transmite ao espectador não só a reflexão sobre a obra do artista como o conhecimento do próprio, desprovido de pretensões e revelando o seu dia-a-dia na sua relação com o trabalho, referências, viagens e inspirações. É, no fundo, o colocar a nu a obra e a sua fonte. No meio de tantos deliciosamente bem concebidos documentários, não é fácil a escolha, pois a maior parte deles são interessantes e de difícil rejeição. Um dos DVD que o demonstra é Gravura – esta Mútua Aprendizagem, de Jorge Silva Melo, Imagem da capa do DVD de Joana Vasconcelos Coração Independente, 2008 de Joana Cunha Ferreira


← Imagem da capa do DVD de Pedro Calapez, Trabalhos do Olhar de Luís Miguel Correia

ingénuo, a artista vai descrevendo a sua atitude perante a vida e a arte, no meio da natureza e de imensos jardins que a colocam no seu paraíso ideal. Um documentário pontuado por silêncios que vão oscilando entre imagens de arquivo, entrevistas e imagens de performances que demonstram o seu fascínio pela magia das sombras. “Uma vez fiz a sombra de dois amigos, um muito irrequieto e o outro muito tranquilo, ambos estavam de pulôver e um ficou todo arredondado e o outro aos ziguezagues”, refere a artista no documentário. Sempre se recusou a trabalhar a partir de fotografias porque sempre necessitou da presença do objecto ou da pessoa que projectou a sombra, para assim sentir a verdadeira ausência dessa pessoa ou objecto. Avançando uns anos no tempo, passa-se à mediática artista Joana Vasconcelos e ao seu Coração independente, realizado por Joana Cunha Ferreira. Neste documentário, invoca-se o trabalho da artista e da sua equipa filmando a vida de uma das suas mais importantes peças, o sapato Dorothy, que foi concebido a partir de centenas de tampas de tachos e panelas. Este

Imagem da capa do DVD Gravura, Esta Mútua Aprendizagem, 2008 de Jorge Silva Melo

foca-se essencial e primordialmente na condição feminina. A artista revela o seu interesse por um passado relegado ao esquecimento com o intuito de dar-lhe uma nova roupagem, tornando-o contemporâneo. A Pintura habitada, de Helena Almeida, realizado por Joana Ascensão, é o que se pode chamar a cereja no topo do bolo nesta colecção de documentários. Retrata de forma intimista o trabalho da artista desde os anos 60 explorando os limites da auto-representação e as fronteiras dos diferentes meios que utiliza, sejam eles a pintura, o desenho, a fotografia ou o vídeo. Pintura habitada centra-se nas várias fases e elementos envolvidos no elaborado processo criativo através do qual a artista constrói os seus trabalhos, desde os primeiros estudos à exposição das obras acabadas. Uma colecção bastante completa que muito enriquece o panorama português das artes visuais em fragmentos da história e vivências dos vários artistas documentados, ampliando a dimensão do conhecimento que se tem de cada um deles. ¶

Imagem da capa do DVD de Lourdes Castro, Pelas Sombras, 2010 de Catarina Mourão

Imagem da capa do DVD de Helena Almeida, Pintura Habitada, 2006 de Joana Ascensão

CoLECção ARTE & ARTisTAs: – Pedro Calapez – Trabalhos do Olhar, de Luís Miguel Correia – Helena Almeida – Pintura Habitada, de Joana Ascensão – Bartolomeu Cid dos Santos – Por Terras Devastadas, de Jorge Silva Melo – Nikias Skapinakis – O Teatro dos Outros, de Jorge Silva Melo – Homeostética, de Bruno de Almeida – Ângelo de Sousa – Tudo o que sou Capaz, de Jorge Silva Melo – Lourdes Castro – Pelas Sombras, de Catarina Mourão – Michael Biberstein – O Meu Amigo Mike ao Trabalho, de Fernando Lopes – Joana Vasconcelos – Coração Independente, de Joana Cunha Ferreira – Francis Bacon – Na Arena de Bacon, de Adam Low – Ana Vieira E o que não é visto, de Jorge Silva Melo – António Sena – A Mão Esquiva, de Jorge Silva Melo – Gravura, Esta Mútua Aprendizagem, de Jorge Silva Melo


joalharia

xxxxxxxxxxxxx

Manuela Sousa, Necklace

Os anéis (i)mortais

O Prémio Origomu, de dimensão mundial, distinguiu duas joalheiras portuguesas. Manuela Sousa e Estefânia R. de Almeida provaram em Nova Iorque que a criatividade contemporânea portuguesa está de parabéns.

Que do lixo se faz luxo já toda a gente sabe, mas nem toda a gente está sensibilizada para os perigos do lixo nem para os materiais pobres que podem dar origem a objectos de luxo. As latas de cervejas e refrigerantes que bebemos, além da sede que matam e da satisfação que provocam, possuem elementos acessórios que causam danos à natureza e dos quais nem nos lembramos. Não é o caso das latas que podem ser recicladas.

O problema está nos resíduos plásticos. Trata-se de um pequeno elemento do qual nem damos conta mas que mata todos os anos milhões de peixes e aves marítimas: os anéis de plástico que seguram os packs de latas, chamados de six pack rings. São anéis mortais, esses círculos de plástico que foram o foco de atenção do movimento Origomu, sediado em Nova Iorque, que luta pela consciencialização da poluição causada por estes detritos. “Origomu” é uma palavra japonesa que significa “dobrar borracha” e é o nome de um prémio de joalharia contemporânea baseado na reciclagem e transformação de um produto nocivo em adorno. O uso da arte e do design é convocado, através da expressão criativa, para atingir o objectivo de retirar do mar os anéis em plástico e colocá-los no corpo de seres humanos de forma estética, ecológica e filosófica. O concurso Origomu é da responsabiidade da empresa nova-iorquina LAIO, criada pela designer activista Tatiana Pagés. Foi aberto a joalheiros e designers de todo o mundo e basea-do na experiência de design que Tatiana realiza há dez anos com este material. O movimento Origomu tem desenvolvido workshops de técnicas e de sensibilização no New York City Department of Education e no Pratt Ins-

Annebelle Colon, Vertebrae

titute, entre outros. Além disso, possui uma colecção de peças que já foi exposta no Museum at FIT, em Nova Iorque. Recentemente, o movimento Origomu criou um prémio para peças de joalharia que usem os six pack rings. De Portugal surgiram candidaturas em grande número, o que demonstra a enorme vitalidade e dinâmica desta área artística no nosso país. Duas destas propostas foram directamente escolhidas como vencedoras. Assim, Manuela Sousa venceu o primeiro prémio (5.000 euros) com a peça Necklace e posicionada em terceiro lugar (1.000 euros) ficou Estefânia R. de Almeida com o colar Ebb and Flow. As melhores 500 peças serão publicadas no livro Origomu: Change The Word With Your Own Hands, editado pela Taschen. O colar de Manuela Sousa é uma peça muito simples na sua construção e na compreensão que o observador faz visualmente. Trata-se de uma espécie de malha feita a partir dos anéis de plástico e com um fio vermelho que segura a estrutura, encerrada num fecho de prata. Por seu lado, Estefânia R. de Almeida tomou como base do seu trabalho a estrutura pré-existente do six pack ring. Nele introduziu elementos como as missangas e o vidro fosco dos fragmentos de vidros deixados para trás e areados pelas correntes das águas do mar. Para Estefânia, estes vidros, montados em rebites de nylon, “visualmente parecem-se com as planícies de corais, com os rochedos de conchas, os depósitos de ovas nas profundezas marinhas... Por fim, o murmúrio da areia num fim de tarde de fim de Verão...” A organização Origomu continua a produzir pensamento e objectos com base na arte e na sustentabilidade e propõe anéis de plástico como matéria-prima. Para saber mais, informe-se em www.origomu.com. ¶ Miguel Matos


Estefânia R. de Almeida, Ebb and Flow

Catarina Dias eXPÕe “CerA PerDiDA” É a primeira exposição individual de Catarina Dias, uma importante criadora de joalharia contemporânea da nova geração. O projecto “Cera Perdida” é exposto na Galeria Reverso, até 12 de Agosto, e explora as possibilidades da técnica da fundição, alargando a sua aplicação aos materiais sintéticos que melhor se conjugam com a sua opção estética e a sua visão da joalharia. A cópia de uma peça e o seu possível valor estético ou monetário são questões centrais destas obras. ¶ mm


A indústria corticeira é hoje mais do que rolhas, pavimentos ou isolamentos. A versatilidade e a sustentabilidade da cortiça tornaram-na apetecível para outras aplicações. Leve, impermeável, resistente, hipoalergénica, dá corpo a objectos quotidianos. A Materia Cork by Amorim pretende fazer dela uma das matérias-primas com que o século XXI se identifique. Combinando a estética e os estímulos sensoriais – as mãos que se tornam olhos – com o utilitarismo e a funcionalidade dos instrumentos, conseguem-se peças únicas. A colecção Materia da Corticeira Amorim prima pelo protagonismo da cortiça em objectos pensados para se adaptarem a estilos de vida, rotinas e necessidades diárias. Práticos, mas atraentes e sofisticados, são dirigidos a um público de classe média/alta, embora se pretenda que sejam acessíveis a todos. A colecção é composta por 22 objectos originais e foi desenhada por seis designers e estúdios portugueses (Daniel Caramelo, Fernando Brízio, Filipe Alarcão, Marco Sousa Santos, Miguel Vieira Baptista e Pedrita) e quatro estrangeiros (Big-Game – Suíça, Inga Sempé – França, Nendo – Japão e Raw Edges – Israel e Reino Unido). Comissariada pela ExperimentaDesign, Materia foi apresentada no Fuori Salone de Milão em 13 de Abril, “integrada naquele que é considerado o mais prestigiado evento internacional design o Salone del Mobile”, refere a organização. E comercial de design, ainda com presença no Spazio San MarMar co, uma galeria situada no bairro de Brera, “centro nevrálgico do design e da moda em Milão”. Estiveram em exibição 12 peças comcom postas sobretudo de aglomerado de corticorti ça, harmonizadas com pormenores metálicos, lápis de cor, madeimadei ra, plástico reciclável, MDF, vidro e até mesmes mo ímanes e pioneses. Materia seguiu depois para Portugal para fazer a sua estreia nacional em 5 de Maio, no Palácio Quintela, em Lisboa. ¶ Ana Albuquerque Daniel Caramelo, Pino, 2011

Fernando Brízio, Senta, 2011

FOTOS © L LUíS SILVA CAMPOS

Cortiça, matéria de imaginação MATeriA CorK BY AMoriM


Marco sousa santos, Lasca, 2011

Do sobreiro para o mundo

A Corticeira Amorim firma um compromisso entre design, “funcionalidade, pertinência e valor estético”. Ambiciona assim, com esta colecção, “conquistar novos territórios de utilização para a cortiça, revelando a sua versatilidade e mais-valias técnicas e estéticas”. A marca que se apresenta tem como objectivo chegar às lojas de museus, de design, de decoração, de mobiliário e de equipamentos para casas portuguesas, seguindo ainda, numa fase inicial, para o mercado europeu, EUA e Japão. AA

Filipe Alarcão, Gelo, 2011

Nendo, Par, 2011


EXpoSiçõES

Pierre Huyghe, I do not own, sem data

Exposição “Porta Aberta”

Aya-phone, sem data

Noosfera, sem data

Olho O côncavo azul, sem data

Alcoitão ELLIPSE FOUNDATION Colectiva “The Last First Decade” 30 Abr > 18 Nov Alameda das Fisgas, 79 Tel.: 214 691 806 6ª a Dom. das 11h às 18h

Lisboa CENTRO PORTUGUêS DE SERIGRAFIA “Porta Aberta: Viagem Pelo Processo Criativo” 11 Mai > 31 Ago Rua dos Industriais, 6 Tel.: 213 933 260 2ª a 6ª das 9h30 às 19h30. Sáb. das 13h às 19h

Lisboa GABINETE DA POLITÉCNICA Pedro Portugal “O Importantário Estetoscópio” 18 Mai > 18 Dez Rua da Escola Politécnica, 56 Tel.: 213 921 808 2ª a 6ª das 10h às 17h Sáb. das 11h às 18h

Lisboa GALERIA ANTIKS DESIGN Carlos Heinrich “Noosfera” 28 Jun > 17 Set Rua Mouzinho da Silveira, 2 Tel.: 213 141 279 / 936 443 673 2ª a Sáb. das 11h às 20h Encerra em Agosto

Lisboa GALERIA SãO BENTO João Murillo “… é preciso dizer os dias, em vez de dizer os anos…” 18 Jun > 31 Jul Rua do Machadinho, 1 Tel. 966 821 830 3ª a 6ª das 10h30 às 13h e das 15h às 19h30 Sáb. das 15h às 19h30

Mães e filhas, 1995

Almack’s #1, 2011

Mikel Telleria, Sem título, sem data

Sem título (toalha), 2010

Viagem, 2010

Cascais CASA DAS HISTóRIAS PAULA REGO Paula Rego “O Corpo Tem Mais Cotovelos” 7 Jul > 31 Dez Avenida da República, 300 Tel.. 214 826 970 Todos os dias das 10h às 19h

Lisboa ERMIDA Nª SRª DA CONCEIçãO Ana Fonseca “Almack’s #1” 21 Mai > 24 Jul Travessa do Marta Pinto, 21 Tel.: 213 637 700 3ª a 6ª das 11h às 13h e das 14h às 17h Sáb. e Dom. das 14h às 18h

Lisboa GALERIA 3+1 Colectiva “Summer Calling” 17 Jun > 17 Set Rua António Maria Cardoso, 31 Tel.: 210 170 765 3ª a Sáb. das 14h às 20h

Lisboa GALERIA ARTE CONTEMPO Catarina Botelho “Propriedade Horizontal” 16 Jun > 23 Jul Rua dos Navegantes, 46-A Tel.: 213958006 5ª a Sáb. das 14h30 às 19h30

Lisboa GALERIA SãO MAMEDE Nélio Saltão “Festa da Cor” 30 Jun > 10 Ago Rua da Escola Politécnica, 167 Tel.: 213 973 255 2ª a 6ª das 10h às 20h Sáb. das 11h às 19h

Empero (vídeo), sem data

Desenho 256, 1990

Francisco Carvalho, Sem título, 2010

Cláudio Garrudo, Sem título, sem data

LandEscape, 2011

Lisboa CARPE DIEM ARTE E PESQUISA Vasco Araújo “Império” 18 Jun > 24 Set Rua de O Século, 79 Tel.: 210 966 274 4ª a Sáb. das 14h à 20h

Lisboa FUNDAçãO CARMONA E COSTA Pedro Cabrita Reis “The Whispering Paper” 30 Jun > 8 Out Rua Soeiro Pereira Gomes, Lote 1, 6º A e D Tel.: 217 803 003/4, 217 803 000 4ª a Sáb. das 15h às 20h

Lisboa GALERIA ALECRIM 50 Colectiva “Repouso na Acção” 30 Jun > 30 Jul Rua do Alecrim, 48-50 Tel.: 213 465 258 2ª a 6ª das 11h às 19h Sáb. das 11h às 18h

Lisboa GALERIA DAS SALGADEIRAS Colectiva “Galerista por Um Dia… Gonçalo M. Tavares” 1 Jul > 17 Set Rua das Salgadeiras, 24 Tel.: 213 460 881 4ª a 6ª das 17h às 22h. Sáb. das 16h às 22h Encerra em Agosto

Lisboa GALERIA SOPRO Ricardo Pistola “LandEscape” 22 Jun > 30 Jul Rua das Fontainhas, 40 Tel.: 213 618 756 3ª a 6ª das 15h às 19h30 Sáb. das 10h às 14h

FOTOS © GENTILMENTE CEDIDAS PELAS GALERIAS E MUSEUS E FUNDAçÕES - TODAS AS IMAGENS DESTAS PáGINAS MONSTRAM APENAS UM PORMENOR DA OBRA

AGenDA Julho e AGosTo


Sem título, 2011

Estudo para O Jardim de Crivelli, 1990

Laurie Simmons, Walking Camera II, 1987

Lisboa Lx FACTORy Filipe Felizardo “Red Bull House of Art” 14 > 30 Jul Rua Rodrigues Faria, 103 Edifício Torreão 3ª a Sáb. das 14h às 19h

Porto ESPAçO FUNDAçãO EDP Paula Rego “A Caçadora Furtiva” 15 Jul > 23 Out Rua Ofélia Diogo da Costa, 39 3ª a Dom. das 12h às 19h

Porto MUSEU DE SERRALVES Colectiva “Off The Wall” 21 Mai > 2 Out Rua D. João de Castro, 210 Tel.: 808 200 543 3ª a 6ª das 10h às 17h Sáb, Dom. e Fer. das 10h às 20h

Artistas Portugueses no Mundo DAniEL BLAufukS Rio de Janeiro (Brasil) “Hoje é Sempre Ontem” MAM – Museu de Arte Moderna 5 MAI › 21 AGO

A Hundred Times Nguyen, 1994

Vista da exposição

Auto-retrato em fundo escuro, 2011

Lisboa MUSEU BERARDO Alfredo Jaar “Cem Vezes Nguyen” 27 Mai > 28 Ago Praça do Império Tel: 213612878 Todos os dias das 10h às 22h

Porto GALERIA FERNANDO SANTOS Rui Sanches “Obra Recente” 4 Jun > 30 Jul Rua Miguel Bombarda, 526 Tel.: 226 061 090 3ª a 6ª das 10h às 12h30 e das 15h às 19h30 Seg. e Sáb. das 15h às 19h30

Santo Tirso CASA DA GALERIA Ricardo Leite “Pele” 14 Mai > 23 Jul Rua Prof. Dr. Joaquim Augusto Pires de Lima, 33-37 Tel.: 252 856 298 3ª a Sáb. das 15h às 19h

Lourenço Marques, 1975 Lisboa PLATAFORMA REVóLVER Colectiva “Quinze Ensaios” 30 Jun > 30 Jul Rua da Boavista, 84, 3º Tel.: 213 433 259 2ª a Sáb. das 14h às 19h30

E só quer mais uma canção de amor, sem data

A máscara nos caiu, sem data

Porto GALERIA NUNO CENTENO Pedro Magalhães “E só quer mais uma canção de amor” 4 Jun > 18 Jul Rua Miguel Bombarda, 531 Tel.: 93 686 64 92 3ª a Sáb. das 15h às 20h

Tomar MUSEU MUNICIPAL JOãO DE CASTILHO Fernando Lemos “Ex-Fotos” 17 Jul > 30 Set Praça da República Tel.: 249 329 814 3ª a Dom. das 11h às 13h e das 14h às 18h

LEOnOR AntunES Madrid (Espanha) “Camina por ahí / Mira por aqui” Museo Nacional Centro de Arte Reina Sofia 10 JUN › 5 SET HELEnA ALMEiDA Bristol (Reino Unido) “Magical Consciousness” (colectiva) Arnolfini 12 MAI › 3 JUL JuLiãO SARMEntO Palma (Espanha) “2000-2010” Es Baluard – Museu d’Art Modern i Contemporani de Palma 22 JUN › 25 SET JOAnA VASCOnCELOS Veneza (Itália) “The World Belongs to You” Palazzo Grassi 12 JUN › 31 DEZ DuARtE AMARAL nEttO Londres (Reino Unido) “Do que nos lembramos quando nos lembramos de nós” Mews Project Space 18 JUN › 3 JUL


DeStaqueS DAs eXPosiÇÕes De Julho e AGosTo

KADER ATTIA © GALERIE CHRISTIAN NAGEL

Kader Attia (Argélia-França), Rochers Carrés, 2009, Bamako 2009

Próximo Futuro - Fronteiras Veio do Mali e chegou à Gulbenkian a exposição “Fronteiras”: um conjunto de 180 obras em fotografia e vídeo de 53 artistas africanos e afro-americanos que estiveram representados na última edição dos Encontros de Bamako, produzida em 2009. Segundo António Pinto Ribeiro, comissário do Programa Gulbenkian Próximo Futuro, trata-se da “maior exposição de fotografia africana alguma vez mostrada em Portugal”. E é também uma exposição que nos mostra uma África multifacetada em questões sociais e políticas ou étnicas. O tema da exposição aborda um território cuja história é feita de fronteiras impostas, acarretando rupturas e conflitos (grande parte das fronteiras dos Estados africanos resulta das decisões imperialistas europeias, decretadas na Conferência de Berlim, em 1884). A relação de África com o resto do mundo é, assim, feita de preconceitos e incompreensões mútuas, mas, mesmo dentro do próprio continente, as condições de vida obedecem a situações difíceis que transformam a vivência numa prova de obstáculos. No fundo, é aqui feita a pergunta “O que é uma fronteira?”, seja ela em sentido literal, territorial e físico, ou psicológico. Sendo que a fronteira é um limite ao ser humano, impedimento de passagem e barreira, é curioso ver que estas fotografias e vídeos são habitados na sua maioria por pessoas com as suas histórias do dia-a-dia. Como exemplo da diversidade patente, há que assinalar, entre outros, Ismaïl Bahri, da Tunísia, que apresenta o vídeo ressonâncias (2008), cuja ambiência poética se traduz em imagens lentas e hipnóti-

cas, com apontamentos caligráficos dentro e sobre a água de uma banheira. Como retratos parciais de um continente, saliente-se a excelente composição das fotografias de Ali Mohamed Osman que mostram o porto do Sudão e imagens dos seus recursos aquíferos, assim como as fotografias que Armel Louzala fez em 2008 da destruição operada na República do Congo. Uche Okpa-Iroha, da Nigéria, faz o registo de como se vive debaixo de uma ponte e Mohamed Bourouissa (Argélia-França) mostra-nos cenas de tensão na comunidade africana dos subúrbios de Paris. Nos Blocos quadrados (2009) de cimento numa praia em Argel, Kader Attia fotografou meninos cujo olhar segue os barcos que fazem a ligação entre a Europa e a África, sonhando com a fuga para uma vida melhor. No geral, esta exposição é tudo menos simples, tudo menos pacífica e as problemáticas levantadas estão longe de se verem resolvidas. Basta referir a abordagem de elementos fracturantes da sociedade como os tabus da homossexualidade ou os mitos associados aos gémeos e aos albinos, causadores de segregação. É marcante a selecção de obras, a sua diversidade, qualidade e pertinência de discurso. Entre a geografia e as questões sociopolíticas de todo um continente, a exposição “Fronteiras” poderá representar um momento de charneira na visão que podemos ter acerca da fotografia africana e da arte contemporânea africana em geral, ao mesmo tempo que promove o debate sobre um enorme conjunto de temáticas, quase sempre sensíveis e multidimensionais. ¶ Miguel Matos

"Fronteiras – encontros de Fotografia de Barnako" Até 28 AGo Fundação Calouste Gulbenkin Avenida de Berna 45-A, lisboa - Tel.: 217 823 000 3ª a Dom das 10h às 18h


Rui Effe, Ponte, 2011, madeiro, vidro, feltro, dimensões variáveis

Rui Effe - Quase Nada Existem lugares vazios onde se sentem vestígios de uma vivência. Por outro lado, existe também o seu contrário: lugares cheios de coisas onde não se sente vida. São como simulacros de algo que não chegou a acontecer, espaços a que pode dar-se o nome de “não-lugares”, pegando na referência do antropólogo francês Marc Augé. A ideia de “não-lugar” deriva de preocupações sociológicas e urbanísticas, e tem sido desde os anos 70 mote para reflexões que chegam à filosofia e à arte contemporânea. No fundo, é uma oposição à noção sociológica de lugar e à ideia de um espaço relacionado com o tempo e com a história. As cidades estão repletas de espaços assim e exemplos destes são os aeroportos, os terrenos após uma demolição, as obras embargadas, os supermercados e zonas de passagem. De acordo com teorias recentes, os não-lugares não estão totalmente desprovidos de propósito ou memória. No fundo, o espaço transforma-se e assume a acumulação de outros significados sociais. Entre a perda do espírito inicial e a aquisição de novas funções económicas, sociais ou culturais, fica um espaço de leitura complexa, a que se junta a percepção alterada pelo tempo. É neste limbo que Rui Effe situa a sua exposição “Quase Nada”. Pode um museu ser um não-lugar? A CasaMuseu Marta Ortigão Sampaio de casa pouco teve pois nunca chegou a ser habitada. Não foi cenário de tristezas nem alegrias. No entanto, está cheia até ao tecto com obras de arte, móveis, jóias e objectos de uso quotidiano pertencentes a alguém que nunca aí viveu. Em “Quase Nada”, Rui Effe plan-

ta interrogações ao visitante e impossibilita o acesso às respostas. As suas esculturas, vídeos e instalações são afirmações de uma presença, mas neste caso é a presença de uma impossibilidade. Como portais que levam a lado nenhum. Na instalação site-specific o eco, com que Rui Effe intervencionou o lago do jardim, vemos a marca daquilo que já foi mas já não é: um tronco de uma árvore morta, cujo corte espelha as folhas das árvores vivas. Nos espaços interiores e exteriores da Casa-Museu Marta Ortigão Sampaio, pelas suas paredes e recantos, as obras de Rui Effe ora chocam ora dialogam com as obras de pintura naturalista de Aurélia de Souza e Sofia de Sousa. Evocam a suspensão do tempo em sacos negros e a noite escura dentro de uma candeia, frente a pinturas quase esquecidas. As esculturas são presságios, objectos velados de negro como o segredo: uma santa de madeira e açúcar coberta com um véu de nylon preto. Alusão aos mistérios da fé e entidade de abstractas premonições. O acesso negado à verdade é ainda abordado em o Mistério, uma estrutura arquitectónica exposta numa das varandas e que lembra um confessionário. Numa parede paira a Viúva: uma pá de cavar coberta por um véu de luto. É como um percurso iniciático que pode fazer-se de dentro para fora ou de fora para dentro. Enquanto numa enorme vitrina se mostra uma cidade queimada com formas construtivistas, no jardim corta-se o acesso a caminhos de carvão e criam-se percursos que não levam a lado algum nesta viagem às cegas. ¶ Miguel Matos

rui effe, “quase nada” Até 31 Jul Casa-Museu Marta ortigão sampaio rua nossa senhora de Fátima, 291-299, Porto Tel.: 226 066 568 3ª a sáb. das 10h às 12h30 e das 14h às 17h30 Dom. das 14h às 17h


DeStaqueS DAs eXPosiÇÕes De Julho e AGosTo

ExPOSIçãO STEREO CORTESIA CURTAS METRAGENS, CRL

Exposição "Stereo"

Estaleiro em Stereo Vila do Conde abriu as portas do Estaleiro ao cruzamento de artes: o cinema e o vídeo são anfitriões, mas é com a música, as artes visuais e as artes de palco que se completam. Assim se define o Cinema Expandido – um dos três programas que o projecto Estaleiro (organizado pela Curtas Metragens, CRL, com duração até 2012) propõe a um público diversificado. Desde 17 de Junho

que se pode assistir à exposição “Stereo”, onde a cultura pop e a vanguarda da arte contemporânea e do cinema estão representadas por seis duplas de criadores portugueses: The Legendary Tiger Man e Rodrigo Areias; Manuel João Vieira e Bruno de Almeida; Black Bombaim e Sandro Aguilar; Adolfo Luxúria Canibal e João Onofre; Nelson Gomes e Pedro Gomes (Gala Drop) com

"stereo" 17 Jun > 18 seT solar – Galeria de Arte Cinemática e Centro de Memória rua do lidador, Vila do Conde Tel.: 252 646 516 3.ª a 6.ª das 14h30 às 18h, sáb. e Dom. das 10h às 12h30 e das 14h30 às 18h

Gabriel Abrantes; Norberto Lobo e João Salaviza. “Trata-se de parcerias inéditas para a criação de uma instalação audiovisual nas diversas salas da Solar”, explica a organização do evento. Lado a lado estarão seis compositores e intérpretes, ícones da música pop/rock portuguesa, e seis realizadores e artistas que se têm destacado no campo das artes visuais. ¶ Ana Albuquerque

Centro de Memória de Vila do Conde largo de são sebastião Tel.: 252 617 506 3.ª a Dom. das 10h às 18h encerra 2.ª estaleiro@curtas.pt, solar@curtas.pt www.estaleiro.curtas.pt


La Passion de Jeanne d'Arc, 1928, um filme de Carl Dreyer que será exibido no dia 21 de Julho, acompanhado por música ao vivo de Bernardo Sassetti.

Joana Rosa, Are You Gonna Drop the Bomb or Not, 1999, grafite sobre papel de arquitecto, 151 x 183 cm

Paixões no Festival de Coimbra

Joana Rosa – My Own Army

A Fundação Inês de Castro decidiu fazer uma incursão artística pela cidade de Coimbra. Assim, entre 14 e 31 de Julho, cerca de 40 eventos irão dominar a cidade a nível cultural através de um cardápio que envolve música, cinema, artes do palco, gastronomia, artes plásticas e conferências. “Paixões” foi o tema escolhido para este segundo festival e para fazer jus ao nome será apresentada, a 29 e 30 de Julho, a peça Do Amor, de Lars Noren, encenada por Solveig Nordlund, numa co-produção com a Companhia de Teatro de Almada. A continuar a mesma temática está a exposição "A Pulsão do Amor", da colecção Millennium bcp, que conta com 20 artistas portugueses e estrangeiros. No domínio da música a noite de 15 de Julho ficará na memória com um espectáculo da cantora lírica sueca Iréne Theorin acompanhada pela Orquestra Gulbenkian, dirigida por Joana Carneiro. Segue-se um cartaz musical imperdível para qualquer melómano, com a actuação do pianista Dang Thai Son, a 22 de Julho, e as presenças das Orquestras Gulbenkian e Metropolitana e de Maria Schneider com a Orquestra Jazz de Matosinhos. “Nunca como este ano acontecem tantos eventos espalhados pela cidade. Apesar das dificuldades, com uma redução de cerca de 50 por cento dos apoios, estamos claramente ao nível, senão melhor, do festival do ano passado”, afirma José Miguel Júdice, presidente da direcção do festival. Durante 19 dias Coimbra estará mergulhada num mar de eventos que irão internacionalizar a cidade no universo das artes. ¶ elsa Garcia

Está patente na galeria António Prates a exposição individual da artista Joana Rosa intitulada “My Own Army”. Uma mostra composta por 30 obras que consiste num conjunto de trabalhos sobre papel resultantes da pesquisa que a artista tem vindo a fazer nos últimos anos. Esta centra-se no seu principal campo de acção, os scribbles, que são, por exemplo, rabiscos que desenhamos enquanto falamos ao telefone e que revelam uma espécie de estruturas sem sentido que surgem de forma irracional. Têm origem no subconsciente e aparecem sem aviso em desenhos em que a mão se torna dona de si própria e vai agindo num automatismo profícuo em criatividade. Ganham vida e revelam medos, fantasias, num imenso desejo de permanecerem fora de controlo, materializando-se num relevante conjunto de trabalhos em papel vegetal, que a artista usa pela sua transparência e pela possibilidade de sobreposição dos desenhos. Neles convivem mundos antagónicos como a beleza do corpo de uma bailarina, a simplicidade das suas sapatilhas, em contraponto com o violento e maquinal mundo das armas de fogo. Uma dança de imagens em que as miras focam sapatilhas de ballet ao passo que estas anseiam por não serem atingidas pelas armas de guerra. ¶ elsa Garcia

2º Festival das Artes de Coimbra 16 Jul > 1 AGo Fundação inês de Castro quinta das lágrimas, Coimbra Tel.: 918 107 893 / 239 802 380 www.festivaldasartes.com

“My own Army” ATé 16 Jul Galeria António Prates rua Alexandre herculano, 39A Tel.: 213 571 167 2ª a 6ª feira das 11h às 20h sábados das 15h às 20h www.galeriaantonioprates.com


opiNião / PeDro PorTuGAl Imagem do filme A Religiosa Portuguesa, de Eugéne Green, 2008

O CINEMA PORTUGUêS (I) O cinema português não é francês

Só subsistem duas profissões despóticas no mundo: a de realizador e a de arquitecto. Porquê? Porque são as últimas profissões no Ocidente em que se pode exercer o desenho absoluto de todos os pormenores. Sem que tenha que ver direc-

tamente com esta correlação, é notório e aceite que o cinema e a arquitectura são as maiores invenções culturais portuguesas. Aliás, do ponto de vista estético, o cinema português é praticado dentro da arquitectura portuguesa e a arquitectura portuguesa é uma estrutura cinematográfica. A contramoldagem é benéfica e importante. Têm repercussões na imagem do país e são importantes estandartes políticos. Esta extraordinária conquista para o cinema e para a arquitectura portuguesa deve-se justamente ao esforço tirânico dos realizadores e arquitectos na defesa dos territórios de duas espécies de espécies que são continuamente atacadas por ferozes predadores culturais, pela erosão da crítica e pela generalizada rejeição e escárnio público. Em qualquer dos casos, o povo não tem razão – gostando ou não, o cinema e a arquitectura servem a propaganda dos Estados e fazem-no corporativamente a partir da segunda metade do século XX. Mas porque é que o assunto "cinema português" inflama tanta gente? Quem tem medo do “cinema português”? E porque é que os franceses protegem o "cinema português"? Porque é que os actores portugueses falam daquela forma tão particular? Porque é que os realizadores portugueses usam um panamá Montecristi?… O povo diz: – O “cinema português” é um tema para a national Geographic. – O “cinema português” é um soufflé. – O “cinema português” falece na escrita. – O “cinema português” produz uma imagem do mundo à parte do objecto da representação. – O “cinema português” é um acontecimento rizomático a-centrado. – O “cinema português” tem actores que não representam porque são prisioneiros do filme. – O texto é o sexo do “cinema português”. – Fazer “cinema português” é dar de comer a um milhão de portugueses. – Fazer um filme português é pôr a câmara a filmar e ir almoçar. Nos últimos 50 anos, foi construída em Portugal (com a ajuda da França) a ideia de que existe uma maneira única e diferente de fazer cinema: o “cinema português”. O que faz do “cinema português” um terroir inimitável? É que só pode ser feito em Portugal, por realizadores, actores, produtores e técnicos portugueses. A adulação do “cinema português” pelos

franceses tem origem na desmedida autocelebração da França como império cultural. Os franceses pensam que as filmografias dos países que invadem e colonizam são expressão directa do efeito que a exposição ao génio francês produz. Um francês foi treinado a pensar que o “cinema português” é o resultado da leitura pelos portugueses do conjunto do pensamento e cultura francesa — porque a França é a superpotência possuidora do arsenal civilizacional mais importante da humanidade: a cultura. (1) Só por isso é que é possível que ao "cinema português" seja perdoado e depois celebrado o aparecimento de uma perche numa cena de grande produção. A perche actriz é “cinema realité” em estado etno-franco-puro – o cinema está dentro do cinema e o cinema é aquilo que toda a gente sabe que é o cinema. Mas o equívoco proporcionado pela aparente boa vontade francesa em admitir uma grave falha técnica como genuína intencionalidade autoral não é mais do que um pretenciosismo xenófobo e neocolonialista humilhante para Portugal. Sobretudo porque o "cinema português" é visto como uma realização da mensagem e do brilho da intelligentsia francesa e apreciado apenas pela curiosa degenerescência antropológica e técnica do non savoir-faire. (2) Este oxímero é o grande segredo há décadas guardado com bravura por realizadores, produtores, equipas técnicas, actores e sobretudo pelo Estado, que, através de um semi-automático financiamento burocrático do "cinema português", mantém administrativamente um género e uma maneira de fazer que garante o appraise internacional. (3) ¶ (1) o desvario imperialista francês deu origem aos gloriosos fracassos da indústria automóvel como o Vel satis (Velocité-satisfaction) e o Avantime. são o produto de uma ambição de conquista e preponderância sem equivalência com o balanço de poder no mundo e que faz esta nação manter ainda operacional um porta-aviões nuclear. (2) o filme A religiosa Portuguesa, de eugéne Green, 2008, é um exemplo patético múltiplo da distorção de interpretação do que é fazer “cinema português”. (3) A embaixada de Joaquim de Almeida e soraia Chaves a Cannes em 2008, numa réplica de caravela paga pelo Allgarve, foi um enorme embaraço para todos os jornalistas presentes (os portugueses esconderam-se onde puderam e não foi publicada uma linha sobre esta aventura). Desde Junot que Portugal não se prostava tão subservientemente à França.

A RELIGIOSA PORTUGUESA © O SOM E A FúRIA

Há uma exaltação primária de sobrevivência de uma classe que se formou a partir dos anos 1960 quando se toca numa coisa que é tabu na cultura portuguesa. A classe é a dos realizadores e a coisa é o "cinema português".


REABRIU O SKYBAR NO TIVOLI LISBOA Reencontre-se com o Verão, as estrelas e o horizonte de Lisboa, em finais de tarde descontraídos e relaxantes que preparam as noites memoráveis. Das 19h00 à 1h00 Actuação de DJ ao vivo de 3ª a Sábado. Tel. 21 319 88 32 skybar@tivolihotels.com Tivoli Lisboa Av. da Liberdade 185 1269-050 Lisboa tivolilisboa.com


Quinta das Lágrimas, Coimbra 14 a 31 de Julho 2011

Festival das

ARTES

© Fotografia António Sachetti

P A I X Õ E S

www.festivaldasartes.com

Mecenas das Artes

Mecenas do Festival

Patrocinadores

Apoios

Parceiros Media


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.