Revista Janela Aberta 010

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REVI STA

J AN ELA ABERTA

artes, cultura digital e economia solidária número 01

editorial cristian cobra economia solidária conto: uma nova economia acontece wendy palo software livre software livre é uma questão de liberdade cristian cobra prosa garota bad trip jemima murad poema fluir alexandre stucchi de souza poema celeste alexandre stucchi de souza poema o rei sem reino alex tomé poema sem título marcos murad poema abstração ana amélia pisanelli

prosa maria lúcia josette monzani fora do eixo letras romance desleixo prosa quatro minutos leonardo panço tirinha osvaldo spitaletti jr tirinha murilo banner tirinha rafael monster tirinha os malvados andré dahmer janela aberta: incubadora de artistas maju martins

esta revista é uma publicação da Associação Instituto Cultural Janela Aberta


Editorial Cristian Cobra Jemima Murad Murilo Deriggi Wendy Palo Washington Pastore Ana Cris Campos

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de seus editores, mas consideradas por estes como pertinentes para o debate público. Mesmo assim, são bem vindas todas as críticas e sugestões.

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EDITORIAL Ano novo, revista nova, história antig O saudoso Jornal Janela Aberta está de volta. Talvez você nunca tenha ouvido falar desse jornal, mas ele está ai desde 2008. Com suas publicações nada periódicas, o Jornal Janela Aberta teve 1 0 edições, publicando 46 textos informativos ou literários de 28 autores, contando ainda com a participação de 7 artistas plásticos e ilustradores. Uma história singela, feita com esforço, sem recursos e com importantes parcerias. Mas muita gente apoiava e curtia a ideia daquele jornalzinho que era impresso com apoio da Gráfica Futura e entregue pela Kalaus na casa dos associados e amigos do Janela Aberta. Pessoas enviaram artigos, poemas, contos, desenhos, tirinhas, e-mails e até mesmo carta!


tiga Como algjuns já sabem, o Janela Aberta passou por grandes dificuldades no ano de 201 3 e nosso jornal não teve nenhuma edição. Mas resolvemos, apesar de todos os entraves, voltar a fazer nosso periódico de artes, cultura digital e economia solidária. A ideia é a mesma: incentivar e divulgar nossos artistas da cidade e disseminar os ideais da cultura digital, economia solidária e cultura de paz. O formato é um pouco difente. A começar pela troca de jornal por revista. Uma ideia antiga, pois o conteúdo da publicação sempre foi mais “atemporal”, ou seja, mais artístico do que informativo. E agora essas características se ampliam com nossa versão exclusivamente digital. Infelizmente não estaremos

mais sentido aquela textura, relevo e cheiro tão agradáveis do papel, mas com o formato digital também podemos ter outras vantagens. A ideia também é fazer da Revista JA um espaço de informação focado no associado, aquela pessoa que contribui com seus 1 0 reais por mês e mantém a entidade. Então o objetivo é também prestar contas do trabalho realizado pela Coordenação e a Equipe do Janela Aberta. E consequentemente, é claro, temos como intuito conquistarmos novos associados (sempre!). E o que temos em nossa edição de estréia? Gostaria de pedir ajuda da galera da equipe para essa honrosa tarefa.


Vida de ONG Atualmente muitos de nós já tivemos um envolvimento com alguma entidade filantrópica, coletivo de artistas, ONG ambiental, associação de bairro etc. Vamos chamar essas iniciativas coletivas, que vêm da vontade das pessoas de fazerem algo pela comunidade sem a iniciativa pública, de ONG (Organizações Não Governamentais). As ONGs atuam no que hoje se chama de Terceiro Setor, que não são nem iniciativas privadas que visam lucro, nem entidades governamentais, assim como o Instituto Cultural Janela Aberta, que é uma associação privada sem fins lucrativos com finalidade pública. Com a expansão do setor e o maior interesse da população por essas iniciativas coletivas, resolvemos criar aqui na revista um espaço para trocarmos ideias sobre o dia-a-dia de nossa ONG e também outras iniciativas relacionadas: inícios, dificuldades, realizações, oportunidades etc. Pois acreditamos que tais temas podem ajudar aqueles que estão começando algum projeto ou entidade, ou mesmo entidades mais experientes com problemas e questões semelhantes. E, claro, aprender também com a troca de experiências. Para começar, nada melhor do que falarmos sobre o início de um projeto. Muitas pessoas se perguntam por onde começar. Primeiro devemos ter claro o que gostaríamos de fazer, o porquê e como começar a fazer. Muitas vezes as pessoas se unem em prol de uma ideia e logo surge a vontade de institucionalizar tal grupo. O motivo geralmente é conseguir recursos financeiros para manter o projeto, porém, esse é um passo que precisa

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ser dado no momento certo e com planejamento adequado. Na prática a institucionalização se trata de obter um Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ), sem o qual não é possível a participação em alguns editais e o recebimento de verbas públicas. Para isso é preciso avaliar as demandas e objetivo do grupo, se é realmente necessário a institucionalização e se a melhor forma é uma associação ou uma cooperativa (que possui fins lucrativos). Afinal, não basta obter um CNPJ para conseguir verbas, que dependerão de muitos outros fatores (para conveniamento público, por exemplo, é preciso ter dois anos de CNPJ). Além do mais, obter e manter um CNPJ tem custos e pode ser um tiro no pé. Mas vamos deixar para falar sobre a sustentabilidade financeira de uma ONG em nossas próximas edições, por ser um tema muito amplo e fundamental. Veja como o SEBRAE distingue cooperativa de associação: "A diferença essencial entre associações e cooperativas está na natureza dos dois processos: as associações têm por finalidade a promoção de assistência social, educacional, cultural, representação política, defesa de interesses de classe, filantropia. Já as cooperativas têm finalidade essencialmente econômica e seu principal objetivo é viabilizar o negócio produtivo dos associados junto ao mercado. A compreensão dessa diferença é o que determina a adequação a um ou a outro modelo. Enquanto a associação é adequada para levar adiante uma atividade social, a cooperativa é mais adequada para desenvolver uma atividade comercial em


média ou grande escala de forma coletiva". Então é preciso entender bem a proposta da sua iniciativa. Nossa experiência com o Janela Aberta também careceu de planejamento e demos alguns passos errados que, hoje, aconteceriam de forma diferente. A Associação Instituto Cultural Janela Aberta surgiu a partir de uma boa ideia em 2007 com o nome Casa do Artista. O grupo de Teatro S.P.A.L- Sociedade dos Artistas e Poetas Lúdicos, existente desde 2005, já estava em uma jornada de trabalho intenso quando começaram a sentir a necessidade de um espaço para poderem criar seus espetáculos, ensaiar e conviver com outros artistas de diferentes segmentos. Foi assim que os integrantes do grupo, Wendy Palo e Boni, resolveram criar a Casa do Artista, na esquina das Ruas São Joaquim e Treze de Maio em São Carlos - SP. Esse espaço viria ao encontro das necessidades e sonhos da S.P.A.L. e de outros artistas com a mesmas condições naquele momento, a interdisciplinaridade deste espaço criaria um movimento cultural na cidade e ajudaria a manter o espaço. Para isso a S.P.A.L contava com o patrocínio de algumas empresas e a filiação de alguns artistas para que a ideia se mantivesse viva, além de reverter todo o soldo dos trabalhos do grupo para manter esse sonho. A Casa do Artista realizou diversos projetos em sua trajetória, entre os mais citados, Barganha Book, o Tenda Movel de Teatro e vários concursos de poesia infanto-juvenil. O objetivo era a realização de um sonho, porém, a falta de um bom planejamento, de empreendedorismo e de engajamento na causa, fizeram o sonho enfraquecer e perder suas energias. Mas a ideia não morreu aí, então continue acompanhando nossa coluna para saber como a Casa do Artista se tornou o Instituto Cultural Janela Aberta e os desafios e soluções encontrados durante essa jornada.

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Tecnologia Aberta

Ferramentas abertas, mentes abertas Desde um dos primeiros passos do Janela Aberta, a criação do Jornal Janela Aberta, já decidimos por utilizar o Scribus, um software livre para diagramação de textos. Junto com a utilização dos sistemas operacionais Linux em nossos computadores. Essa escolha de softwares foi também uma escolha ideológica. Desde então as tecnologias livres ajudaram o Janela a diagramar seu jornal, editar suas imagens e documentos, publicar conteúdos e construir seu site. Mas além disso, as tecnologias livres nos ajudam a pensar cada dia mais em atitudes de compartilhamento, colaboração, transparência e aprendizado. Nada mais justo termos em nossa revista um espaço voltado para os softwares livres, a Licença Criativa e outros temas que orbitam a Cultura Digital. O intuito é duplo: compartilhar o que estamos (sempre) aprendendo, mas também abrir espaço para outras ideias e debates.

O Arch Linux é o sistema operacional que usamos no Janela Aberta. Ele é uma distribuição para usuários avançados, pois pretendemos extrair o máximo de um sistema GNU/Linux.


Podemos dizer que o GNU/Linux é o cérebro do sistema operacional. Como ele é livre, pessoas ou empresas utilizam esse núcleo e agregam outros programas de sua autoria ou programas de terceiros (como Firefox e OpenOffice) e adaptam segundo necessidades específicas. A estes "pacotes" damos o nome de distribuições (ou distros). O Ubuntu, por exemplo, é uma distribuição que traz consigo uma grande gama de programas instalados para atender a maioria das demandas do usuário comum e com muitas configurações prédefinidas; já o Arch Linux é uma distribuição) leve e enxuta que deixa ao encargo do usuário escolher apenas aquilo que deseja dando ampla liberdade de personalização do sistema.

Caso alguém queria contribuir, uma boa maneira de saber por onde começar é nosso blogue, desenvolvido com Wordpress e nossa rede Buddypress. É um projeto inicial com o qual aprendemos um pouco mais a cada dia enquanto nosso site vai progredindo. Lá também colocamos soluções (pequenos artigos e dicas) para os problemas que encontramos diariamente, como instalar uma impressora de tal modelo, alterar idioma do sistema, configurar teclados, instalar programas etc. Mas vamos deixar para falar mais um pouco sobre Wordpress e outros programas que fazem parte da rotina do Janela Aberta nas próximas edições, como o sistema operacional Arch Linux, Scribus, Gimp, Libre/OpenOffice, Firefox, Inkscape, Thunderbird e outros tantos programas, buscando agradar pinguins mais avançados mas sem se esquecer da galera que tem curiosidade ou está nos primeiros passos. É isso ai, bora acompanhar e compartilhar!

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Esse espaço de nossa revista destina-se a divulgar nossas publicações da Editora Janela Aberta, que existe desde 201 1 , quando publicou seu primeiro livro: Impressões Marcas Artísticas em São Carlos. Desde lá a Editora tem contribuído de formas específicas com outros trabalhos, projetos e artistas que precisam de auxílio em algum processo da produção de um livro. A Editora não dedica-se a financiar livros e custear publicações. O papel da Editora é auxiliar o escritor/autor empreendedor que precisa de algum auxílio específico, que vai desde assegurar assessoria editorial gratuita para os associados colaboradores do Instituto Cultural Janela ou por meio de permuta; providenciar o registro de obras literárias para obtençao de ISBN; estabelecer possíveis parcerias entre artistas e organizações;disponibilizar livros para venda no site da Editora, e divulgação de artistas, blogues e lançamentos. Todos os projetos realizados pela Editora Janela Aberta utilizam Softwares Livres para diagramação (Scribus), edição de imagens (GIMP) e demais serviços e programas, como LibreOffice. Abaixo, títulos já lançados pela Editora Janela Aberta: ISBN TÍTULO 978-85-64728-00-4 Impressões: marcas artísticas em São Carlos 978-85-64728-01 -1 Versos da terra 978-85-64728-02-8 Paiáguá: Donos do rio 978-85-64728-03-5 Tecer a rede: relato e análise sobre políticas públicas para as mulheres no município de São Carlos-SP 978-85-64728-04-2 Versos ao céu


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COLUNA

Página Aberta

A mulher de papel Daniela Soledade Uma mulher sai porta afora. Não tem dinheiro nem roupas, nem grandes ambições. Como é feita de papel teme a chuva, o vento e a tinta. Move-se com graça, quase flutua. Seu rosto é copiado de uma cartilha; seu corpo é colorido com aquarela e seus cabelos são de origami. Os órgãos da página 3 estão rasgados ou rasurados, por isso ela vai sem pressa. Não voltará jamais. Ignora que mulheres de papel são feitas para não ter destino algum. Sorte a sua. Apud Ópera de Pano, Blues literário escrito por um menino de gelo A boa educação dita que não devo mencionar certos assuntos. Escatologias, sexo, genocídios e bichos gosmentos seriam portanto proibidos. Sobretudo na hora do almoço. A boa educação dita que não devo ser gregária, devo andar em bando, de preferência constituir família com alguém do sexo oposto a quem devotarei minha vida até que a morte ou uma tragédia de outra sorte nos separe por toda a eternidade e mais uns dias. A etiqueta versa acerca de como devo me vestir e me portar em determinados ambientes. Como devo me dirigir a pessoas que tenham autoridade em assuntos que ignoro, ou que simplesmente tenham uma força maior que a minha. Daí eu uso o cinto de segurança, utilizo o corrimão, cedo meu lugar, reciclo o lixo, economizo água, vou de bicicleta, sorrio para a foto, escovo os dentes antes de dormir e rezo, oro, medito, tento evitar cigarro e álcool e açúcar em excesso, pratico atividades físicas, mantenho minhas notas acima da média, minhas roupas e unhas limpas, pratico caridade, tenho compaixão por outros seres vivos, não mantenho armas em casa, olho antes de atravessar na faixa de pedestres, procuro ser gentil, pago o que devo, evito o cartão de crédito, mantenho-me conectada às redes sociais sem expor minha vida íntima, procuro ler bastante, desenvolvo minhas habilidades manuais, mantenho meus exames médicos em dia e doo sangue, evito embalagens descartáveis, não jogo lixo no chão, pechincho e economizo dinheiro, procuro ser pontual, como verduras e legumes de maneira equilibrada, respeito idosos e crianças, ofereço flores, evito vícios de toda ordem, uso o fio dental, sento-me no assento que corresponde à minha passagem, uso o condicionador adequado ao meu tipo de cabelo, evito tanto quanto posso a inveja, a gula e a preguiça, sou fiel em meus relacionamentos e cultivo as boas amizades e companhias, levo o guardachuva, evito palavras ásperas, confiro o troco, costuro as roupas rotas, evito gordura, tenho zelo e ética no meu trabalho, lavo o banheiro com capricho, desligo o celular em espetáculos públicos, uso filtro solar, não piso na grama, rego as plantas, felicito os aniversariantes e vencedores, esqueço as mágoas, me comovo com as tragédias, sei a hora de falar e de ouvir, durmo e como o suficiente, sou precavida com a luxúria, os jogos de azar e videogame, não entro sem ser convidada, desconfio de alguns jornais e alguns programas de TV, tenho o suficiente para viver, planto o livro, escrevo o filho e faço a árvore, aceito os presentes, tenho alguma sorte, evito o orgulho, o rancor e os transtornos psicossomáticos, contemplo o nascer da lua e o desabrochar das flores, colho os frutos no tempo e não uso defensivos agressivos ao ambiente, tenho fé no milagre das ciências e na lógica das religiões. Mas tudo que eu queria era ser uma mulher de papel. De um papel delicado desenhado com uma grafia caprichosa, num alfabeto primitivo e morto. Um papel colorido com o qual a criança pobre pudesse fazer seu pipa que acabaria preso no galho mais alto da árvore velha. Daí a minha profissão e incumbência

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única seria deixar-me dobrar e rasgar e recortar com a tesoura. Tudo que eu gostaria de ser era a mulher de papel. Então minha obrigação seria virar folha de rascunho e recados. Ir parar dentro de um livro de receitas meio sujo de farinha e manteiga. Deixar-me estar lá esquecida e sem nenhuma importância. Ser a mulher de papel onde se anota o telefone ou o bilhete que é preciso queimar. O lenço contaminado num hospital. O livro antigo sem capa. Sem gozo, nem futuro, nem família. Ignorar por completo a solidão e a liberdade. Por isso, se hoje eu encontrar o gênio da lâmpada, meu único pedido será: quero ser a mulher de papel, nua e vulnerável a qualquer mão, qualquer líquido, qualquer cesto de papeis.

ESTAMOS EM LUTO Sérgio Silva Numa cidade chamada Eternidade, curiosamente, há mais de dez anos não falecia ninguém. A falta de defuntos e até mesmo candidatos a tal, trouxe enormes prejuízos para os negócios de Vivaldo, o dono da funerária Só Falta Você. O proprietário, que por sinal era muito mesquinho, repleto de pendengas com os seus credores, vivia agourando os doentes, incitando brigas e desavenças pelos bares, rodeando os possíveis moribundos e rezando pela rápida passagem de um próximo freguês. O fato é que por ali o tempo passava, mas não a morte. No auge do seu desespero, Vivaldo teve o disparate de procurar o prefeito e propor a descabida ideia de se limitar, por meio de um macabro decreto, o prazo de vida dos munícipes, o qual não deveria ultrapassar 70 anos, sob o pretexto de se economizar assim, verbas da saúde e de demais setores da administração municipal. Ciente dos danos político-eleitorais, que a antipática medida traria, caso fosse implantada, o prefeito foi mais vivo e não quis saber de morte em seus despachos. Mas, tamanha era a obsessão de Vivaldo por um cadáver, que sua ânsia o consumia. Ao final de cada expediente, sem ninguém para enterrar, o homem foi se afundando em tristeza. Vivaldo foi definhando, definhando, definhando. Primeiro o sorriso lhe sumiu do rosto, a voz da garganta, a força das pernas e a lucidez da mente. Não houve outro jeito a não ser internar Vivaldo. Pouco tempo, após o seu ingresso no hospital da cidade, morria o fúnebre agente daquela cidade. Por ironia do destino, a morte encerrou os mórbidos negócios do mais recente defunto. De funerarista a cliente: eis o fim de Vivaldo. Com o enterro do próprio proprietário, morreu também a falida funerária e Eternidade seguiu fazendo jus ao seu curioso nome.

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Cultura Cidadã Cultura Cidadã é um espaço reservado para compartilhar ações culturais e fomentar a

cidadania, pois parte do trabalho de incentivo e auxílio ao artista realizado pelo Instituto é fomentar e disseminar a arte e cultura de forma democrática e acessível. Aqui, então, serão relatadas ações realizadas com êxito, no sentido de não apenas torná-las públicas, mas de forma que traga reflexão quanto ao sentido do que é arte, cultura e cidadania. Dentro desta linha realizamos dois projetos recentes que misturam arte e cidadania. O Tenda Cultural: Janela Aberta para a Arte e a Ciência e a Cidadania é um projeto sociocultural que estabelece territórios culturais itinerantes em três bairros de São Carlos (SP). Foi realizado graças a parceria com a UFSCar e ao patrocínio do Banco do Brasil somados ao apoio do deputado estadual Newton Lima. Geralmente as atividades estão centralizadas em espaços e equipamentos do centro da cidade, por isso a Tenda leva às comunidades periféricas a oportunidade de convivência com as diversas produções artístico-culturais bem como experimentos e vivências com a ciência. Tudo isso pautado pela cultura cidadã promovendo assim a troca de experiências e de relações.

Foram realizadas três edições nos meses de maio, junho e julho nos bairros São Carlos 8, Santa Angelina e Antenor Garcia, onde foram oferecidas cerca de 80 atividades gratuitas (espetáculos teatrais, oficinas, shows musicais, etc) com público aproximado de 2.500 pessoas. O segundo projeto, chamado Janelas Abertas para a Arte, a Cultura e a Cidadania, foi executado através de emenda parlamentar do deputado estadual João Paulo Rillo. O projeto é dividido em três frentes: "Iniciação ao Mundo das Artes", com o objetivo de levar às crianças e jovens do bairro Jardim Zavaglia, que estão à margem do consumo de bens culturais, a oportunidade de vivência e aprendizado de três diferentes linguagens artísticas – teatro, dança e circo. A segunda frente, "Cultura Cidadã" tem por objetivo compartilhar com os moradores do bairro, pais dos jovens atendidos pelo projeto, a cultura da cidadania e da inclusão para que as pessoas tenham acesso, não somente aos bens de consumo, mas também acesso ao debate político. Para isso projetamos quatro ações de formação cidadã refletindo sobre a vida em


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comunidade e a cidadania. E por fim, a terceira frente, Artistas em Formação, tem como público alvo os artistas locais de toda a cidade e ofereceu onze workshops de diferentes áreas e linguagens artísticas.


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#TAMOJUNTO Com esta coluna quero trazer aos leitores e amig@s do Janela Aberta um pouco da nossa trajetória através das memórias (lembranças) dos encontros com nossos parceiros. E são muitos parceiros, encontros e causos… histórias que marcaram profundamente o Janela Aberta (entidade, associação? pra não ficar repetitivo). Esta coluna não será apenas um conjuntos de textos, mas também uma homenagem e uma maneira de agradecer a tod@s aqueles que fazem parte dos nossos sete anos de vida, por isso o nome #TAMOJUNTO!

Não foi fácil decidir por onde começar, afinal são muitas histórias e todas muito peculiares. Depois de muito revisitar minha memória decidi começar pelos parceiros que definiram a identidade visual do Janela Aberta… os meninos da Quiçá Design. Em 2009, estava produzindo e apresentando o programa “São Carlos Em Cena” e resolvi fazer uma matéria sobre a incubadora de empresas do ParqTec. Neste dia fui informada que haveria a graduação da incubadora de design (a primeira graduação da primeira incubadora de design do país). Com certeza era uma excelente pauta para o programa! No dia do evento eu e a equipe de filmagem chegamos antes para captar imagens do local e um dos responsáveis do evento sugeriu que eu entrevistasse a primeira empresa que estava se graduando - Quiçá Design. Então fiquei aguardando a chegada da (corta “chegada da”) tal empresa. A chegada deles foi, para mim, surpreendente,: pois chegou (corta “pois chehou”) um carro plotado com a marca da empresa e dele descem 4 ou 5 meninos uniformizados. Lembro-me que a idade deles e o uniforme me chamaram muito a atenção. Corri para entrevistá-los antes que o evento começasse. Na entrevista pude entender um pouco do que eles faziam, o lance do desenvolvimento de marcas, da animação e do 3D. Fiquei muito interessada no trabalho deles e peguei o contato para poder fazer uma visita e conhecer um pouco mais! Neste momento estávamos passando por uma grande transformação no Janela, que estava deixando de ser Casa do Artista e se tornando o Instituto Cultural Janela Aberta, e estávamos muito preocupados com nossa identidade visual, pois tínhamos a clareza que precisaríamos de uma marca simples e forte que pudesse fazer com que fôssemos reconhecidos com facilidade. E foi aí que veio o estalo “e se eu conversasse com os meninos da Quiçá Design?”. Imediatamente liguei para eles que toparam em me receber no dia seguinte, um sábado de manhã.

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A Quiçá Design desenvolveu a logomarca do Janela Aberta. Eles usaram a estética minimalista de Mondrian e as Proporções Áureas, muito utilizada, entre tantos, pelos artistas do Renascimento.

No dia seguinte eu tinha uma contação de história, então saindo do local da apresentação fui direto para o Parqtec. Cheguei na sala deles (com o figurino e a maquiagem de contadora de histórias) e fui falando sobre o Janela. Eles nem titubearam, na mesma hora toparam nos ajudar e o Antônio ficou o responsável pela parceria com o Janela Aberta. E eles se entregaram ao projeto, desenvolveram nossa logo (que a gente ama de paixão), nossa identidade visual, projetaram a pintura da fachada, arrumaram uma parceria com a B2ML (uma empresa mineira da área de tecnologia da informação) para o desenvolvimento do nosso site e e-mail, e até nos ajudaram a vender pizza para arrecadar fundos em momentos de dificuldade. Por fim, tornaram-se nossos amigos. De lá para cá se passaram 5 anos e sabemos que a parceria continua firme e forte. Hoje, se você entrar no site da Quiçá - http://www.quicadesign.com.br/ - vai ver o Janela Aberta lá, assim como outros projetos, e vai descobrir que os valores desta empresa são realmente admiráveis, pois além do comprometimento com a qualidade do trabalho ofertado aos seus clientes eles dedicam 1 0% das horas trabalhadas para retribuir, de algum modo, para a sociedade devido a formação gratuita que tiveram em universidade pública! Valeu Quiçá Design, #TAMOJUNTO!

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Associado de Carteirinha UM REFRESCO NA MENTE Augusto Figliaggi e Elaine Guarani Há o pensamento de que fazer arte é prazeroso e, quer saber? É mesmo! Fazer arte é muito prazeroso. O problema é quando você tem tantas inquietações que resolve assumir pra si a vida de artista independente, artista que navega nas ondas contrárias às da pesada e massuda indústria cultural, pois esse é um caminho difícil. Em realidade, acho que todos estão conectados de algum modo a algum perfil dessa indústria, pois, queira ou não, quem escolhe viver de arte assume para si uma postura não só poética, mas também profissional, e, enquanto profissionais, estamos conectados em algum local dessa indústria. Mas essa indústria possui diferentes camadas, diferentes elos de correntes a qual o artista pode estabelecer sua conexão. Há, por exemplo, a face da cultura erudita, a da cultura popular e a da cultura de massa, tendo diferenças no modo de surgimento e comunicação dos signos artísticos. Os eruditos são poucos, ao menos em relação a todos os outros perfis de pessoas desse nosso mundo, e produzem seus símbolos artísticos de maneira autoral e de modo tão específico que, como regra, são fruídos apenas por outros eruditos, mas toda regra tem suas exceções. Já a cultura popular, costuma ter seus signos criados de maneira tão pluralizada que é difícil encontrar um autor; os elementos artísticos surgem no emaranhado de rendas do sutiã do seio da sociedade, e vai se alterando por todos, tendo todos como autores e todos como espectadores. Já a cultura de massa provém de poucos que têm o poder comunicacional nessa aldeia global (utilizando o termo de McLuhan), e tentam disseminar seus elementos artísticos de modo a criar comportamentos, a criar consumidores. Esse último perfil é o que, normalmente, vinculamos ao termo “indústria cultu-

ral”. Sendo assim, apesar d rem, de algum modo, cone há de um lado os que nav rendo ocupar uma vaga no cultura de massa, e os que te, com suas referências p mesmo, de massa, todas m as mais vinculadas às inq mentos artísticos e meno seguir uma tendência come Para os que se agarram n parceria que existe é releva cado querer ter uma autono ativa sem ter parceiros. Opa dizer que nunca temos um pendência verdadeira, certo dependendo de parceiros. H Pois uma coisa é ter cúmp cos, mas sem dever subme ceiros os temas e escolhas outra coisa é ter que ter o poder levar sua empreitada Sei que sim. Bom, a reflexão que gostar mente essa: Nenhum artis Donne disse sobre a human zinhos nessa teia cultural temos pares, e quando os e


ar de todos os artistas estaonectados a essa indústria, navegam com a maré, quenos disputados espaços da ue criam independentemens populares, eruditas e, até s misturadas, propondo ideiinquietudes dos questionanos relacionadas a querer mercial. nesse segundo perfil toda evantíssima. É muito complionomia e independência criOpa! Se assim é, então quer uma autonomia e uma indeerto? Pois sempre estaremos s. Hum... não é bem assim. mplices nos afazeres artístibmeter ao crivo desses parhas estéticas pretendidas; e r o aval de seu patrão para ada artística. Compreendem?

staríamos de deixar é justartista é uma ilha (tal como manidade). Não estamos soal mundial, em algum lugar os encontramos é um prazer

enorme poder produzir com esses camaradas. Assim sendo, seja parceiros em criação, direção ou produção cultural, encontre-os, e verá que tudo flui mais naturalmente. Essa é nossa relação com o Janela Aberta, uma parceria que soma e transforma. Tal como uma frase que vimos no facebook outro dia “Uma Janela Aberta pode deixar entrar o vento que bagunça os papéis sobre a mesa”, e essa algazarra na verdade é uma ventilação nos neurônios, um refresco para a mente. Augusto Figliaggi e Elaine Guarani

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VocĂŞ nĂŁo conhece o Janela Aberta?



Gostou?

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