Lagoa da Conceição - entre praça e praia

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LAGOA DA CONCEIÇÃO ENCONTRO ENTRE PRAÇA E PRAIA



LAGOA DA CONCEIÇÃO ENCONTRO ENTRE PRAÇA E PRAIA

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA E URBANISMO

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO ACADÊMICA

ANA LUÍZA AMATO ZABOTTI ORIENTADORES

Profa. Dra. MARINA TONELI SIQUEIRA Prof. Dr. SAMUEL STEINER DOS SANTOS MARÇO DE 2017



Imagem de acervo pessoal

SUMÁRIO 2...........................................................................SOBRE O TEMA

4.........................................A LAGOA DA CONCEIÇÃO 4..................................................................Contextualização 5.............................................................História e ocupação 6............................................................................Usos do solo 8.......................................................Preservação ambiental 9...........................................RECORTES TEMÁTICOS ESPAÇOS PÚBLICOS 9.....................................................................O lazer na lagoa 10...................................................Subutilização do espaço MOBILIDADE 11......................................................Um bairro interrompido 12......................................................Natureza de passagem 13........................................................Transporte ineficiente 14...............................................DIRECIONAMENTOS 14..........................................................Propostas Existentes 15................................................................................Diretrizes 16..............................................................O PROJETO 18..........................................Intervenções na macroescala 22.......................................A ESCALA DO PEDESTRE 32...........................................RECORTES ESPACIAIS 32............................Primeiro recorte - praça de chegada 36..................Segundo recorte - posto de combustíveis 40..............................................Terceiro recorte - trapiches 45.......................................................CONSIDERAÇÕES FINAIS 46.......................................................BIBLIOGRAFIA


SOBRE O TEMA Introdução à Lagoa O presente Trabalho de Conclusão de Curso trata dos espaços públicos do bairro Lagoa da Conceição, localizado em Florianópolis. Fiz um estudo da evolução histórica e dos vários aspectos da ocupação atual do bairro para entender a importância desses espaços dentro da comunidade e as necessidades dessa população. Este processo foi fundamental para perceber quais são as problemáticas atuais dos espaços públicos da Lagoa e então propor soluções que visem a melhoria da qualidade de vida de seus frequentadores. A escolha pela Lagoa da Conceição deu-se, além da ligação pessoal que possuo com o bairro, pelas suas características únicas dentro do contexto florianopolitano. O bairro une a beleza da paisagem natural, ao conforto da infraestrutura urbana e a proximidade do distrito sede. A presença da lagoa permite que seus espaços públicos tenham uma atmosfera única, abrigando atividades tanto do cotidiano dos moradores quanto dos momentos de lazer e descanso. Esta particularidade é o que caracteriza os espaços da Lagoa como uma mistura entre praça e praia urbana, proporcionando um tipo de vivência única com relação à cidade. O convívio social tem importância particular para a comunidade nativa da Lagoa da Conceição, que em sua origem conseguia a subsistência através do trabalho familiar e se baseava num sistema de mutirões e trocas de serviços para as atividades como a pesca de arrasto. Essas ocasiões acabavam por se tornar grandes momentos de encontro e fomento da cultura local, quando se criava a identidade daquela população através do exercício das atividades tradicionais. Pretendo com este trabalho requalificar os espaços públicos da Lagoa da Conceição e suas conexões, proporcionando locais de encontro e de reconstrução da identidade da população local, que

atualmente está em vias de perder-se. Muitos dos espaços de lazer da Lagoa não tiveram nenhum tipo de planejamento e foram apropriados pela população devido à qualidade de sua paisagem, apesar da falta de infraestrutura adequada. A comunidade reinvindica há muitos anos a regularização desta situação, bem como a ampliação do sistema de espaços públicos, incluindo a ele terrenos com grande potencial que hoje são alvo de especulação imobiliária. A mobilidade também é uma questão séria na Lagoa hoje, pois devido a sua característica de bairro de passagem é frequente a presença de trânsito intenso e longos engarrafamentos nas principais vias do bairro, o que traz insegurança para os pedestres. Diretrizes Inicialmente faz-se necessária uma reformulação do sistema viário, com o objetivo de minimizar os conflitos entre carros e pedestres e aumentar a segurança de ambos. Algumas das propostas da comunidade da Lagoa, que foram incorporadas ao trabalho, incluem bolsões de estacionamentos nas bordas do Centrinho e ampliação do sistema de transporte lacustre - hoje este encontra-se restrito à ligação com a Costa da Lagoa. Outra solução, proposta pelo IPUF no plano diretor, é a criação de uma nova ponte para a ligação com a avenida das Rendeiras, partindo de um eixo anterior à região do Centrinho da Lagoa; desta forma seria possível desviar o fluxo de carros de onde existe a maior concentração de pedestres, repensar o encontro entre a avenida das Rendeiras e a rua Vereador Osni Ortiga - um ponto de sérias complicações no trânsito atualmente - e ainda minimizar o problema da falta de renovação das águas na porção sul da Lagoa da Conceição, que ocorre devido a estreita passagem sob a ponte que existe atualmente. Uma vez lançadas as diretrizes de mobilidade,

Vista do pôr do sol na Lagoa a partir do fim da Avenida das Rendeiras Fonte das imagens: acervo pessoal.

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A “Pracinha” é o principal espaço de convivência do bairro atualmente. Além das brincadeiras de crianças...

...abriga eventos como a feira de domingo e os ensaios de carnaval da escola de samba da Lagoa da Conceição. Fonte das imagens: acervo pessoal.

visando criar um espaço mais seguro e confortável para a circulação de pedestres, é possível imaginar um sistema de espaços públicos associado à rede de transportes da Lagoa, incentivando o uso dos transportes coletivos e da vivência peatonal do bairro. A intenção é conectar os espaços de lazer existentes e criar novos, permeando todo o centrinho, desde a descida do morro até a avenida das Rendeiras. Esta medida privilegiaria toda a comunidade da Lagoa da Conceição, que hoje é composta por uma grande população migrante de artistas, escritores, estudantes e amantes da natureza. Método O desenvolvimento do trabalho baseou-se em leituras tanto de autores locais, como Ariane Kuhnen, Almir Francisco Reis e o grupo CECCA, quanto de clássicos como Jane Jacobs e Jan Gehl. Também fizeram parte da pesquisa cartilhas informativas como as do Instituto Pólis e do PlanMob para o Ministério das Cidades; de Espaços Públicos elaborada por Simone Gatti; e os cadernos do IPUF que contém os estudos e as propostas para o novo Plano Diretor de Florianópolis. Além disso a retomada do contato com a Lagoa da Conceição sob a ótica de moradora foi uma experiência enriquecedora. Morei na Lagoa durante toda a minha infância e

adolescência mas me mudei antes mesmo de ingressar na Faculdade de Arquitetura. Durante a elaboração deste trabalho de conclusão de curso tive a oportunidade de voltar a viver no bairro e enxergar a rotina e os lugares, que eu julgava conhecer tão bem, com novos olhos. Participei da audiência pública distrital da Lagoa da Conceição, promovida pelo IPUF como parte do processo participativo para a elaboração do Plano Diretor, e pude entrar em contato com esta população e com seus projetos para o bairro, todos coerentes, bem justificados e com altíssima adesão popular. Acredito que este processo de aproximação e convívio com os moradores da Lagoa, sendo eu um deles, só teve a acrescentar para o meu trabalho. Este trabalho, assim, está estruturado em quatro partes. Inicio com uma análise da ocupação histórica e da situação atual da Lagoa da Conceição, buscando entender melhor a população local, o bairro e levantar as principais problemáticas. Na seqüência faço dois recortes temáticos mais direcionados, baseados em leituras e conceituações: primeiro, dos espaços públicos existentes hoje na Lagoa da Conceição e, segundo, de mobilidade urbana e funcionamento do transporte coletivo no bairro. A seguir desenvolvo uma análise das propostas existentes para o bairro, e por fim apresento as minhas propostas para a transformação urbana no bairro da Lagoa da Conceição.

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A LAGOA DA CONCEIÇÃO

Localização geográfica do bairro Lagoa da Conceição Mapa elaborado pela autora sobre base do Google Earth.

CONTEXTUALIZAÇÃO A Lagoa da Conceição é uma laguna localizada a leste da Ilha de Santa Catarina, em Florianópolis, capital do estado. Está situada entre uma cadeia de montanhas a oeste e um cordão arenoso a leste, que a isola do mar. Consiste no maior corpo d’água da Ilha, com 17,6km² de extensão divididos em duas partes: a “lagoa de dentro”, porção menor ao sul, e a “lagoa de fora” (CECCA,1997). Sua classificação de laguna dá-se devido a ligação com o mar, feita através do canal que conecta a lagoa de fora à praia da Barra da Lagoa. O seu extenso perímetro passa pelas comunidades do Centrinho da Lagoa, Canto dos Araçás, Costa da Lagoa, Rio Vermelho, Barra da Lagoa, Retiro da Lagoa, Porto da Lagoa e Canto da Lagoa. O Centrinho da Lagoa tem um forte caráter de centralidade local, é a principal porta de entrada para muitas destas outras localidades e abriga o núcleo fundacional do distrito. Tem cerca de 2,5km² de área e uma população de 5.654 habitantes, segundo dados do IBGE de 2010. Essa centralidade é o objeto deste estudo. A localização privilegiada do bairro, aliada à tranquilidade devido a sua população relativamente pequena e às belezas naturais do entorno, faz com que seus moradores sejam um grupo diversificado. A ocupação

ainda se constitui majoritariamente por casas unifamiliares de dois pavimentos, mas a tendência de crescimento do bairro é visível na quantidade de prédios multifamiliares de até quatro pavimentos que vem sendo construídos nos últimos anos. “Hoje a Lagoa apresenta uma grande diferenciação social; os antigos moradores contrastam com os novos moradores e com suas formas de habitar e de empreender o crescimento da localidade. São diferentes agentes que atuam na expansão urbana do local, seja através da construção de condomínios murados e controlados; seja nas áreas de autoconstrução, como pequenos aglomerados familiares, que retratam a diferenciação sócio-espacial comum em sociedades de países em desenvolvimento. “ (CABRAL, 2008: 71)

A partir dos dados do IBGE de 2010 é possível traçar o perfil desses novos moradores da Lagoa. Brancos, alfabetizados, a maior parte deles morando em casas próprias, com ocupação de uma a três pessoas. Quanto a idade, encontra-se em quantidades similares: crianças e adolescentes em idade escolar; jovens universitários ou recém formados; e famílias com filhos.

Vista a partir do topo do Morro da Lagoa, um dos cartões postais da cidade. Fonte das imagens: acervo pessoal.

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Cenas da Lagoa da Conceição na década de 1960. Fonte das imagens: Casa da Memória de Florianópolis

EXPANSÃO DA MANCHA URBANA 1955-2015

Mapa elaborado pela autora a partir de imagens históricas do Geoprocessamento.

HISTÓRIA E OCUPAÇÃO O distrito da Lagoa da Conceição é um dos mais antigos da cidade. Sua fundação data de meados do século XVIII, juntamente com os distritos de Santo Antônio e Ribeirão da Ilha. O núcleo inicial do bairro desenvolveuse no entorno da Igreja de Nossa Senhora da Imaculada Conceição da Lagoa e até meados da década de 1950 seu crescimento restringiu-se ao surgimento de uma pequena ocupação no entorno do Casarão Bento Silvério, construído no início do século XX para abrigar a sede da Estação Rádio Telegráfica. Grande parte da área que hoje é conhecida como Centrinho da Lagoa era ocupada por plantio. A maior diferença entre a pequena comunidade do distrito da Lagoa em relação aos seus contemporâneos de outras localidades da Ilha era a falta de ligação com o mar, pois originalmente o canal da Barra da Lagoa fechavase por períodos indefinidos e as obras para a garantia do fluxo contínuo entre a lagoa e o mar só foram feitas na década de 1980. Sendo o transporte marítimo, à época, o principal meio de comunicação e de troca entre as diversas áreas de ocupação, principalmente com o distrito central, a comunidade da Lagoa teve as atividades comerciais prejudicadas. No entanto, este isolamento colaborou para uma maior conservação das tradições e costumes, que ainda hoje podem ser observados em localidades do seu entorno

como o Canto ou a Costa da Lagoa, bem como em outras comunidades de pescadores, e vivenciados através da culinária, do artesanato local e de celebrações como a festa de Nossa Senhora dos Navegantes. A Ilha de Santa Catarina passou por grandes transformações na década de 1960, com a implantação de instituições como a Universidade Federal de Santa Catarina e a Eletrosul. Estas trouxeram trabalhadores de grandes cidades, acelerando o processo de modernização e a popularização de Florianópolis como destino turístico. A pavimentação das estradas de acesso às praias, visando impulsionar o turismo e o crescimento da cidade, facilitou o acesso aos recantos mais ermos da Ilha e acarretou na degradação de uma parte significativa de sua paisagem natural e culturas tradicionais. Nesta mesma época instalaram-se os primeiros postes de luz na Lagoa da Conceição, trazendo energia elétrica e estimulando a procura por moradia no bairro pelos recém chegados na Ilha. O impacto deste salto de modernidade na ocupação territorial de Florianópolis pode ser melhor percebido no mapa, através do grande aumento da mancha urbana entre os anos de 1955 e 1975. Estima-se que nestes vinte anos a área urbanizada do bairro tenha se multiplicado mais de dez vezes em relação a ocupação inicial (VAZ, 2008).

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USOS DO SOLO A Ilha de Santa Catarina foi ocupada de forma descentralizada desde a sua colonização, quando os imigrantes recém chegados foram instruídos a distribuírem-se em diversos núcleos no interior da Ilha, independentes entre si (CECCA, 1997). Com o tempo esta característica reforçou-se cada vez mais e hoje até os bairros mais afastados possuem uma certa autonomia. Aqueles pequenos núcleos iniciais tornaram-se os centros dos bairros - onde localizam-se os principais comércios e serviços - e suas estradas mais antigas são atualmente os principais acessos. As vias Afonso Delambert Neto e Henrique Veras do Nascimento são a principal porta de entrada para a Lagoa da Conceição desde o início de sua ocupação, tendo em sua continuidade a Avenida das Rendeiras, que liga o bairro a praias muito populares da Ilha. Ao analisar-se o mapa de usos do solo fica clara a importância deste conjunto de vias também para a circulação interna ao bairro. Estas configuram-se como estruturadoras do trânsito e principal acesso não só de vias locais, com ocupação residencial,

mas também da maioria dos estabelecimentos comerciais. Estes dois tipos de uso do principal conjunto de vias do bairro, igualmente importantes e necessários, denunciam o conflito que ocorre durante os dias de férias e finais de semana. O trânsito intenso para as praias ocupa o coração do bairro, impossibilitando os moradores de chegarem ou saírem de suas casas e de executarem outras tarefas simples do dia a dia. A convivência com os engarrafamentos constantes também traz insegurança e stress para todos. A borda dessas vias também concentra os principais espaços de lazer do bairro. Grande parte do comércio no entorno dessas vias é direcionado a estes momentos de passeio, com pequenas lojas, bares e cafés, trazendo um grande fluxo de pedestres e elevando a importância das calçadas dentro deste sistema de espaços públicos. Tal fato, infelizmente, não contribui para que exista um maior cuidado do poder público com estes espaços, pois estes passeios são estreitos, mal cuidados e cheios de obstáculos, como tantos outros na cidade.

MAPA DE USOS DO SOLO NO CENTRINHO DA LAGOA

Mapa elaborado pela autora sobre base do IPUF

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Trânsito parado na rua Henrique Veras do Nascimento , a caminho das praias

A mesma via em um momento de menos trânsito. As calçadas estreitas são insuficientes para o tipo de uso exigido delas. Fonte das imagens: acervo pessoal.

A ocupação no entorno da área central é composta majoritariamente por residências que inserem-se em uma malha viária mal conectada, com longos quarteirões contínuos. Esta configuração dificulta o estabelecimento dos pequenos comércio de vizinhança, tornando o deslocamento até as vias principais obrigatório. Por sua vez, a expansão do bairro trouxe um movimento constante de carros, trazendo insegurança e desconforto para os pedestres e ciclistas que precisam circular no entorno de vias arteriais para acessar os principais serviços do bairro. Entre os anos de 1980 e 2000 a população residente na bacia da Lagoa apresentou um índice de crescimento populacional superior ao da Ilha como um todo. “A partir deste período [década de 70] a Lagoa passou a absorver uma maior procura por moradia de migrantes oriundos de outros estados, e surgiram na sua paisagem os loteamentos [...] e diversas residências que representaram o início da expansão urbana em direção à planície e à orla.”

(VAZ, 2008, p. 68) Entre 2000 e 2010 o volume de migrantes de outros estados e imigrantes de outros países, com destino a Santa Catarina, teve um aumento de 33%. A capital foi o destino mais procurado, com o maior número de migrações vindo do Rio Grande do Sul, Paraná e São Paulo. Florianópolis também recebeu o maior número de imigrantes do exterior entre as cidades catarinenses. Segundo apontou o último Censo, em 2010 residiam na capital 3.566 pessoas de outros países, representando quase 1,5% da população da Ilha. Pode-se observar neste processo a lenta expulsão dos moradores nativos das áreas mais nobres, como as bordas da Lagoa, e a substituição de suas moradias simples por casas cada vez maiores e, mais recentemente, prédios. Este crescimento acelerado torna-se perigoso do ponto de vista ambiental, por tratar-se de uma área com grande diversidade de ecossistemas.

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Construções em APP e estacionamentos junto a orla do Centrinho da Lagoa. Fonte das imagens: acervo pessoal.

PRESERVAÇÃO AMBIENTAL A degradação ambiental em Florianópolis esteve presente desde o início do processo de ocupação da Ilha, com desmatamento da mata nativa não só para a construção de casas e barcos, mas para exportação intensiva. Posteriormente a canalização de córregos, abertura de estradas e especialmente o surgimento dos aterros à beira mar alteraram em muito as condições ambientais da Ilha. Segundo Kuhnen (2002, p. 27) “Apesar da natureza insular de parte da cidade impor uma série de particularidades e limites ao crescimento, o desenvolvimento se deu a um custo ambiental e das relações humanas. O entendimento equivocado de progresso vem desdobrando-se num crescimento visivelmente desordenado, com muitas deficiências nos tradicionais suprimentos urbanos como eletricidade, abastecimento de água, transporte, saneamento, coleta de lixo, moradia, etc.” Os poucos exemplos restantes na ilha de ambiente tradicional com cultura rural ou pesqueira são cobiçados por novos moradores por unirem os benefícios da urbanização à presença de uma natureza exuberante. No entanto, esta forte atratividade acaba por ameaçar a maior riqueza destes espaços. Kuhnen (2002) atenta para o fato de que a Lagoa já era destino de passeios dominicais e abrigo para casas de veraneio antes da massiva invasão turística de Florianópolis. Fato comprovado pelo poeta Zininho no “Rancho de Amor à Ilha”, hino cuja composição

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data da década de 1960: “...tua lagoa formosa, ternura de rosa, poema ao luar” homenageava a Lagoa que já nessa época era conhecida e admirada por toda a Ilha. Os recursos naturais da Lagoa da Conceição ainda hoje são fundamentais para seus moradores, seja pela paisagem natural, pela oportunidade profissional que o turismo oferece ou pela subsistência através da pesca. Infelizmente, o impacto negativo da ocupação humana e do mal aproveitamento dos recursos naturais já são visíveis. Em 2003 o Ministério Público Federal determinou o respeito à faixa de proteção ambiental, que visa a preservação de todos os terrenos distantes até 30 metros da borda d’água. Estima-se que no Centrinho da Lagoa mais de 20 edificações corram o risco de serem demolidas. A proximidade das construções à borda d’água apresenta grande risco ambiental, pois devido à insuficiência na rede de saneamento da cidade muitas edificações possuem ligações de esgoto irregulares, que poluem as águas. Além disso a presença destas edificações restringe o acesso à borda d’água, tornando a área privada. Ou seja, além do risco ambiental esta prática rouba da comunidade local um importante espaço de convivência e lazer, de contato com a natureza e resgate da sua cultura. As poucas áreas livres de orla hoje são muito apropriadas e atraem pessoas de diversas partes da cidade, indicando o grande potencial que tem.


RECORTES TEMÁTICOS ESPAÇOS PÚBLICOS O LAZER NA LAGOA A cidade de Florianópolis, no geral, é carente de espaços de lazer adequados no meio urbano. Devido à grande quantidade de praias, trilhas e opções de lazer junto à natureza, por muito tempo essa carência não foi notada, mas com o crescimento populacional da Ilha esta falha fica cada vez mais evidente. As praças são escassas e só existem três parques urbanos em toda a cidade. Nos bairros das extremidades da Ilha, junto às praias, a situação mostra-se ainda mais grave. Apesar de a paisagem natural ser o maior atrativo de Florianópolis, as praias e trilhas não possuem infraestrutura de apoio adequada. Não existem lixeiras, banheiros ou uma sinalização clara que garanta a segurança dos usuários. O bairro da Lagoa da Conceição é um meio termo entre espaço natural e urbanizado, e isto nota-se também no tratamento de suas áreas públicas. Oficialmente apenas dois espaços no bairro são classificados como AVL - área verde de lazer - o que significaria, na prática, que possuem estruturas direcionadas para lazer, como bancos, lixeiras e parques infantis. A comunidade da lagoa reinvindica, há muitos anos, que todos os espaços apropriados para lazer no bairro, sejam classificados como AVL no plano diretor. Esta medida aumenta a visibilidade destes espaços e a

probabilidade de que eles recebam projetos de melhoria na sua infraestrutura. O terreno que abrigava o antigo “vassourão” é uma das maiores lutas da comunidade. Seu bosque foi devastado em 2010 para dar lugar a um loteamento, o qual ainda não foi implantado devido à resistência popular. Apesar de ser muito utilizado pela população durante toda a semana, o Parque da Lagoa ainda não é uma área pública. A realidade dos demais espaços públicos do bairro é visível nas fotos. Mesmo nos lugares em que é previsto o uso de estar e lazer, como a Praça Bento Silvério, a infraestrutura é precária e não atende às necessidades da população, o que se notou recentemente quando se fez uma reformulação desta praça que desagradou a maior parte de seus frequentadores. Nos demais espaços apropriados para lazer, todos nas margens da lagoa, fica claro que o poder público baseia-se na paisagem como atrativo e ignora as demais necessidades do local. Espaços como a Ponta do Pitoco e a orla da Rua Henrique Veras do Nascimento são amplamente utilizados em finais de semana e feriados, ocupados por piqueniques e grupos de amigos que sequer encontram bancos e lixeiras adequados.

Orla da Rua Henrique Veras do Nascimento e seu mobiliário degradado e insuficiente.

O antigo Vassourão, hoje em vias de tornar-se um loteamento, é usado pela comunidade para práticas esportivas. Fonte das imagens: acervo pessoal.

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SUBUTILIZAÇÃO DO ESPAÇO O centrinho da Lagoa possui um grande potencial não aproveitado. A qualidade natural da sua paisagem confere uma riqueza sem igual aos seus espaços de estar e lazer, que infelizmente hoje em dia são tratados como áreas residuais em meio às construções na borda d’água. Esta situação precisa ser revertida para que estes espaços sejam vistos e cuidados da forma que merecem. Um espaço para pedestres contínuo e bem conectado, sem interrupções por vias e passagens estreitas, traz segurança e conforto aos seus usuários. É possível ver no mapa abaixo que as áreas de lazer na borda da lagoa estão todas muito próximas, com sua continuidade interrompida por vias ou pelas edificações existentes. Os números representam pontos estratégicos para o projeto proposto neste trabalho, pois permitem a conexão destas áreas de lazer e a criação de um sistema de espaços públicos que permeie todo o bairro e estimule o seu uso peatonal O terreno popularmente conhecido como “Vassourão” (1), já citado anteriormente, é a única grande área verde remanescente nos arredores do centrinho. A sua desprivatização traria para a comunidade um importante espaço para práticas esportivas e possibilitaria a continuidade das atividades dos clubes de vôo livre do bairro, que hoje utilizam a área para pouso. Além disso a sua localização estratégica junto à entrada do bairro e ao

TILAG possibilitam o uso por um número maior de pessoas. Os pontos (2) e (3) apresentam conflitos devido ao encontro de vias movimentadas e a concentração de comércios e serviços, gerando perigo para carros e pedestres. O encontro das ruas Henrique Veras do Nascimento e Manoel Severino de Oliveira (3) também possui uma concentração de edificações junto à borda d’água, que impossibilitam a ligação dos espaços verdes, e um posto de gasolina onde hoje encontra-se a maior parte dos cafés do bairro, representando um dos espaços com mais conflitos de uso. A borda da Rua Henrique Veras do Nascimento (4) apresenta alguns dos comércios mais antigos do bairro, como o Supermercado Chico e o Restaurante Oliveira, que também estão em situação irregular devido à proximidade da margem da lagoa. A Ponta da Areia (5) é requerida pela população para o uso público, pois hoje o terreno privado é usado como estacionamento. Os pontos (6) e (7) possuem conflitos devido ao impedimento do acesso público à borda da lagoa e da continuidade dos espaços públicos, como a ciclovia e o calçadão recém construídos na Osni Ortiga. Este trecho final da rua Vereador Osni Ortiga também apresenta sérios riscos para a circulação de carros e pedestres, com calçadas estreitas e vias sinuosas, além dos engarrafamentos gerados no seu encontro com a Avenida das Rendeiras.

ÁREAS DE LAZER EXISTENTES NA LAGOA

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6 Fonte das imagens: acervo pessoal.

Mapa elaborado pela autora sobre base do IPUF

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Mapa elaborado pela autora sobre base do IPUF

MOBILIDADE UM BAIRRO INTERROMPIDO As deficiências do sistema de transporte coletivo da cidade de Florianópolis acabam por estimular o uso do transporte individual privado. Como agravante, esta modalidade de transporte costuma ter uma baixa taxa de ocupação - pesquisas feitas em 2011 para a cidade de São Paulo acusaram uma ocupação média de 1,4 passageiros por veículo, ou seja, pelo menos metade dos veículos transita com apenas um passageiro. Desta forma, a opção pelo deslocamento em veículo privado está diretamente relacionada ao aumento da quantidade de engarrafamentos na cidade, visto que é dispendido um número muito alto de carros para transportar a mesma quantidade de pessoas que ocupam um ônibus. A Lagoa da Conceição possui atualmente um sério problema de mobilidade, com obstrução das principais vias do bairro. A sobrecarga das vias ocorre principalmente nos

dias de praia, finais de semana ou feriados ensolarados, mas não exclusivamente. A população do bairro e seu modo de vida atual já são suficientes para o congestionamento dos principais acessos nos horários de pico diariamente. O mapa acima mostra os possíveis acessos ao bairro, em vermelho, e os acessos às localidades que só podem ser feitos a partir do bairro, em azul. Apesar de existirem outros acessos, o mais usado é o do Morro da Lagoa, vindo do bairro Itacorubi, devido à proximidade ao Distrito Sede. Este também é o caso do acesso às praias da Joaquina, Mole e Barra da Lagoa, grandes responsáveis pela sobrecarga da Avenida das Rendeiras e outras vias do Centrinho durante o verão. Existem planos para novos eixos viários visando desviar o trânsito pesado do centro do bairro, mas qualquer solução precisa estar atrelada a melhorias no transporte coletivo para ter sucesso.

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MAPA DE HIERARQUIA DE VIAS Mapa elaborado pela autora sobre base do IPUF

NATUREZA DE PASSAGEM De acordo com o Código de Trânsito Brasileiro as vias arteriais são aquelas com limite de velocidade de 60km/h, que possuem interseções em nível, controlada por semáforo ou não, acessibilidade aos lotes lindeiros e às vias coletoras e locais, possibilitando o trânsito entre as regiões da cidade. Ou seja, são as vias principais dos bairros, que dão acesso às localidades vizinhas e costumam ser ladeadas por comércios e serviços. As vias coletoras tem a função de redistribuir o trânsito desde as vias arteriais até as vias sub coletoras ou vias locais, que recebem o trânsito local e dão acesso aos lotes particulares. Este tipo de classificação das vias é mais facilmente visualizado nas cidades que possuem o sistema viário em formato de espinha de peixe, como é o caso da malha urbana de Florianópolis. A principal característica do traçado viário associado a maior movimentação de pessoas e vitalidade nas ruas é o tamanho do quarteirão. Jacobs (2001) defendia as quadras curtas como um dos elementos geradores de diversidade urbana. Segundo ela, assim gerase alternativas de percursos e possibilita-se a distribuição dos fluxos por ruas que, de outra maneira, permaneceriam desertas. Quadras longas dificultam o acesso de pedestres à ruas vizinhas, tornando apenas algumas ruas mais movimentadas e deixando outras esvaziadas, mesmo que

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a rigor estas estivessem próximas àquelas. Quadras curtas, por outro lado, permitem acesso a várias direções dentro de limites razoáveis de distância. Em Florianópolis, e no litoral de Santa Catarina de maneira geral, o tipo de configuração espacial conhecido como espinha de peixe é muito comum. Essa forma de traçado viário é caracterizada por longas vias conectadas a apenas uma via principal, com poucas conexões entre elas. As distâncias entre as conexões na via principal costumam ser curtas, mas no outro sentido - perpendicular à via principal - estas podem chegar a mais de um quilômetro. A falta de conexão dessas longas vias entre si dificulta ou até mesmo inviabiliza os deslocamentos de pedestres entre elas. Como resultado, todos os deslocamentos são canalizados para a via principal, que em consequência tende a saturar-se devido à grande quantidade de fluxo que precisa escoar. É também devido ao caráter da malha viária que surge nas vias arteriais a concentração de uso comercial, uma vez que esta recebe os grandes fluxos que viabilizam o seu funcionamento. Esta importância conferida às vias arteriais faz com que os seus pontos de encontro ou estreitamento sejam potenciais geradores de trânsito e causadores de acidentes, devido ao acúmulo de veículos e pessoas nestes locais.


TRANSPORTE INEFICIENTE

Cenas recorrentes nas ruas do bairro: longas linhas de carros estacionados.

O Centrinho da Lagoa é um ponto importante para os usuários do transporte público devido à presença do TILAG - Terminal de Integração da Lagoa da Conceição. É nele que chegam os ônibus vindos do centro e saem os ônibus em direção aos bairros - ou o contrário. Neste ponto da viagem é possível fazer a integração - trocar de ônibus sem pagar uma nova passagem. Infelizmente o funcionamento do transporte público em Florianópolis é precário nos bairros afastados do Distrito Sede. Os ônibus que partem em direção às localidades do entorno possuem frequência baixa, dificultando a integração e o uso do transporte público. Esta precariedade resulta em um número excessivo de carros. Surge assim uma alta demanda por estacionamento e a inutilização de espaços públicos do bairro, que poderiam ser muito mais bem aproveitados. Andando pelos passeios afastados da orla é comum a sensação de um espaço apertado, inseguro ou muito movimentado, mesmo quando divide-se a calçada com poucos pedestres. Esta impressão deve-se ao grande número de carros, estacionados ou em trânsito próximo as calçadas estreitas. O mapa mostra as áreas de estacionamento no bairro, destacando tanto os grandes estacionamentos com terreno exclusivo para o fim, quanto as áreas de borda de via e frentes de comércio que possuem

Fonte das imagens: acervo pessoal.

vagas para clientes sobre as calçadas, no recuo frontal. É possível perceber grande presença de estacionamentos no entorno das vias Afonso Delambert Neto e Henrique Veras do Nascimento, as principais vias do bairro, que proporcionam acesso aos comércios e serviços e por onde grande parte dos moradores circulam diariamente. Sendo assim, ao longo destas vias a ocorrência de estacionamentos é frequente, enquanto em vias com menor fluxo de carros - destacadas em tom mais claro no mapa - só ocorre o acúmulo de carros estacionados em finais de semana e feriados, quando a Lagoa da Conceição recebe muitos visitantes em busca de lazer e tranquilidade junto às suas paisagens exuberantes. É contraditório que a presença destes visitantes também ocasione a obstrução dessas paisagens e contribua para a desqualificação dos espaços públicos. Os passeios no Centrinho da Lagoa não são largos e as linhas contínuas de estacionamento em sua borda aumentam a sensação de estreitamento e obstruem a passagem. A presença de estacionamentos sobre as calçadas, ou dos acessos a eles, faz com que o pedestre tenha que estar constantemente disputando com o carro e atento à sua segurança, mesmo quando encontra-se em um espaço que deveria ser exclusivamente peatonal, como indicam as imagens no topo da página.

ESTACIONAMENTOS NO CENTRINHO DA LAGOA

Mapa elaborado pela autora sobre base do IPUF a partir de levantamento em campo.

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DIRECIONAMENTOS PROPOSTAS EXISTENTES

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O bairro da Lagoa da Conceição é um espaço muito delicado da Ilha. A mistura de ecossistemas ameaçados, o crescimento urbano acelerado, a coexistência dos costumes de nativos e migrantes de diversas outras regiões, são condicionantes que fazem com que qualquer proposta para o bairro tenha de ser cuidadosamente estudada. Os últimos projetos da prefeitura para a Lagoa da Conceição, enumerados nas imagens ao lado, restringem-se às revitalizações que, apesar de serem importantes, não substituem as propostas necessárias para o planejamento do bairro a longo prazo. A ciclovia da Rua Ver. Osni Ortiga (1) e as obras da Praça Bento Silvério (2) foram concluídas, com atraso, no primeiro semestre de 2016. Os dois espaços receberam pavimentação com pavers, iluminação e mobiliários novos. Enquanto a ciclovia foi muito bem recebida, apesar da falta de ligação com a Avenida das Rendeiras e da falta de perspectiva para tal, a obra da Praça Bento Silvério vem sendo duramente criticada por ter eliminado os canteiros gramados, árvores frutíferas e o parquinho de crianças da praça. Existe também uma proposta para a Avenida das Rendeiras (3), nos mesmos moldes do que foi executado na Osni Ortiga, cujo início, previsto para dezembro de 2015, foi adiado por tempo indefinido devido ao movimento da temporada de verão. Em dezembro de 2012, perto do fim do período de posse da última gestão da Prefeitura de Florianópolis, foi divulgado um projeto para uma nova ponte na Lagoa da Conceição. A estrutura estaiada de concreto armado teria 184 metros de comprimento e 23 de largura, com quatro pistas de rolamento, ciclofaixa e passeios, e ligaria a esquina da Avenida das Rendeiras com a Osni Ortiga ao Centrinho da Lagoa, na altura do Shopping Via Lagoa (4). A proposta ainda previa a revitalização da orla do Centrinho, com mais estacionamentos, passeios, parquinho para crianças e decks para pesca. A obra estava orçada em 55 milhões, mas não foram feitos estudos de viabilidade ou impacto ambiental, cabendo à nova gestão reavaliar o projeto e sua possibilidade de implantação. A nova Prefeitura apontou falhas na proposta mas reconheceu a importância do projeto, incluindo-o ao zoneamento do plano diretor na forma de um novo eixo viário, desta vez partindo da Ponta do Pitoco

Fonte das imagens: Deolhonailha

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Fonte das imagens: Notícias do Dia Online

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Fonte das imagens: Notícias do Dia Online

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Fonte das imagens: Diário Catarinense

ZONEAMENTO PROPOSTO PELO PLANO DIRETOR DE 2014 DE FLORIANÓPOLIS

Fonte das imagens: Geoprocessamento.

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DIRETRIZES A natureza é um elemento sempre presente na Lagoa da Conceição, a todo momento podemos ver os morros ou ouvir a lagoa. Nem sempre a água, mas ouvimos os barcos, o vento nas folhas, o canto dos pássaros, o sotaque do povo. Essa sensação de relaxamento que o bairro transmite a todos que por ele passam é parte essencial de sua identidade. Um projeto para a Lagoa deve exaltar a riqueza cultural e contemplar toda a população do bairro, tanto nativos quanto migrantes, jovens ou turistas. Todas essas pessoas escolheram estar no bairro pois se identificam, em primeiro lugar, com essa sensação que ele passa. Essa característica se reflete nas suas calçadas e na vivacidade das suas ruas. As feirinhas de artesanato, os cafés e lojas abertos para a rua e os gramados a beira da lagoa tomados de gente são elementos importantes na formação desta identidade do bairro. Tão importantes quanto as crianças brincando na pracinha, os ranchos de pesca, os trapiches e os pescadores sempre presentes jogando suas redes de cima da ponte. Acredito que o reconhecimento destes

elementos é o primeiro passo para a elaboração de um projeto que respeite a identidade local e atenda às necessidades específicas deste espaço. A partir dos meus estudos, da análise do bairro, do conhecimento dos projetos existentes, da vivência do dia a dia na Lagoa e do contato com os moradores do bairro pude traçar algumas diretrizes para o projeto. Algumas delas coincidem com as reinvindicações feitas pela comunidade, outras foram colocadas por mim. Faz-se necessária, primeiramente, uma reformulação do sistema viário, com o objetivo de minimizar os conflitos entre carros e pedestres e aumentar a segurança de ambos, para que então seja possível voltar a atenção para os espaços públicos. Proponho a criação de um sistema de espaços públicos associado à rede de transportes da Lagoa, incentivando o uso dos transportes coletivos e da vivência peatonal do bairro. A intenção é conectar os espaços de lazer existentes e criar novos, permeando todo o bairro e assim melhorando a qualidade de vida de um número maior de pessoas.

Minimizar o uso de transporte individual é uma necessidade urgente na Lagoa, é importante oferecer alternativas acessíveis e também infraestrutura de apoio que torne o seu uso confortável. Tendo em vista as condições geográficas do bairro o ônibus continua sendo a melhor opção de transporte. A criação de um corredor exclusivo percorrendo as vias SC 406 e SC 405 até o túnel Antonieta de Barros é uma das propostas apresentadas INCENTIVO AO USO DO pela comunidade ao IPUF. Bolsões de estacionamento nas bordas do bairro e integrados TRANSPORTE COLETIVO ao transporte coletivo também são uma importante estratégia para incentivar o uso de outros tipos de transporte e para diminuir o trânsito junto às áreas comerciais do centrinho. Além disso a ampliação das redes de transporte lacustre e de ciclovias são possibilidades reais que contribuem tanto para a mobilidade quanto para a qualidade de vida de seus usuários. Os passeios são uma parte rica e importante do sistema de espaços públicos da Lagoa. Por isso proponho evidenciar esta vocação dando-lhes um tratamento adequado. Também faz-se necessário aumentar este sistema no bairro, o que pode ser feito através da CRIAÇÃO DE UM SISTEMA abertura pública do acesso à orla, para lazer ou pesca, e da desprivatização de terrenos DE ESPAÇOS PÚBLICOS que são requeridos pela comunidade há muitos anos, como é o caso do “vassourão”. O RICO E CONECTADO terreno, na margem da Av. Afonso Delambert Neto, já é cenário de apropriação popular nos fins de tarde e finais de semana, quando vê-se muitas pessoas aproveitando a área tranquila para andar de bicicleta e skate.

PRIORIZAÇÃO DO PEDESTRE

A criação de um novo eixo viário, com a construção de uma ponte partindo da Ponta do Pitoco, onde o Plano Diretor já prevê hoje, possibilita a criação de uma solução para o encontro entre a avenida das Rendeiras e a rua Vereador Osni Ortiga e minimiza o problema da falta de renovação das águas na porção sul da lagoa. Esta medida também desvia o fluxo de carros da área onde há a maior concentração de pedestres, possibilitando a criação de um espaço peatonal com vias compartilhadas. Assim valoriza-se o caráter de passeio do bairro, criando espaços mais agradáveis e seguros para o acesso às feiras e cafés ao ar livre.

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O PROJETO A partir dos estudos e do diagnóstico das problemáticas do bairro foi possível delimitar um recorte espacial para as intervenções, que se trata da centralidade do bairro, conhecido como Centrinho da Lagoa. Esta escolha foi feita por tratar-se da porção do bairro onde ocorrem ou surgem grande parte da problemáticas, mas também por ser onde existe a maior circulação de pessoas. Desta forma seria possível desenvolver um projeto de maior alcance, impactando não só o bairro mas a cidade como um todo, tendo em vista que os espaços públicos da Lagoa da Conceição são hoje utilizados por moradores de toda a cidade. Estabeleceu-se como objetivos gerais de projeto, a

PRAÇA DE CHEGADA PRIMEIRO RECORTE

POSTO DE COMBUSTÍVEIS SEGUNDO RECORTE

PONTA DO PITOCO

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priorização do pedestre, o incentivo ao uso do transporte coletivo e a criação de um sistema de espaços públicos rico e conectado. O conflito entre pedestres e veículos foi o grande motivador e norteador do trabalho, que busca trazer o pedestre como o ponto de partida para o desenho das ambiências que compõem o bairro. O foco é aproveitar o grande potencial do bairro e, em vez de transformar os espaços de lazer existentes - pois estes funcionam muito bem - usá-los como ponto de partida para a ampliação deste Sistema de Espaços Públicos. Assim procuro criar uma proposta que respeite a história do lugar, as relações históricas que aqui se criaram e as formas de apropriação que surgiram naturalmente com os anos, respeitando a


A imagem abaixo mostra uma perspectiva geral do projeto para o Centrinho da Lagoa. As vias em amarelo são parte integrante do percurso criado para a conexão dos espaços públicos e receberam adaptações no seu uso procurando aproveitar ao máximo a caixa da via existente. Os locais em destaque são pontos importantes para o bairro hoje por diversos motivos. A ‘Pracinha’ (Praça Bento Silvério) e a Ponta do Pitoco são os principais espaços de encontro e lazer do bairro; o posto de combustíveis e o TILAG (junto à praça de chegada proposta) são locais com grande circulação de pessoas; e a Ponta da Areia é hoje um terreno privado que tem sua abertura pública requerida pela comunidade. Devido a esta importância inerente esses pontos foram fundamentais para o desenvolvimento de uma proposta que se integre aos espaços existentes, respeite a história do bairro e ao mesmo tempo proponha uma vivência nova.

vontade de quem realmente importa neste contexto: as pessoas. As diretrizes de intervenção tem como ponto de partida a reformulação do sistema viário, com o objetivo de minimizar os conflitos entre carros e pedestres e aumentar a segurança. Desta forma é possível a proposição de um Sistema de Espaços Públicos associados à rede de transporte da Lagoa, através da conexão entre os espaços de lazer existentes, de sua requalificação e da criação de novos espaços em áreas onde já existe naturalmente esse potencial, permeando todo o Centrinho, de modo a incentivar a apropriação do bairro por parte da comunidade local e de visitantes.

PRACINHA

PONTA DA AREIA TERCEIRO RECORTE

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INTERVENÇÕES NA MACROESCALA Através do estudo da área contatou-se a importância das vias que cortam o Centrinho, tanto como vias de passagem quanto para conexões internas do bairro, e a sua incompatibilidade com o uso das suas bordas, gerando conflito entre carros e pedestres e trazendo insegurança. Iniciou-se o projeto com o lançamento de diretrizes na macroescala, trazendo as mudanças no sistema viário e de transportes necessárias para a melhoria na qualidade dos espaços públicos. A decisão de projeto mais forte neste sentido é o desvio do fluxo de carros do centrinho da Lagoa (01). É prevista a construção de uma nova ponte na Lagoa há muitos anos, tanto por motivos de segurança quanto por questões ambientais, pois a passagem estreita sob a ponte atual prejudica a renovação das águas na parte menor da lagoa. A implantação da ponte a partir deste local é prevista no Plano Diretor e propicia o desvio do fluxo pesado de carros, com rumo às praias e outros bairros do entorno,

desafogando o transito próximo aos comércios e áreas de estar da Lagoa da Conceição. Para dar continuidade a esse fluxo propõe-se a implantação de uma faixa reversível na Avenida das Rendeiras, usando o espaço da faixa de estacionamento atual, que obstrui a visão da lagoa. Por tratar-se de uma via inserida entre dois ecossistemas frágeis - as dunas e a lagoa - buscou-se aproveitar a caixa de via e os afastamentos existentes hoje para a efetuar as mudanças na via, evitando demolições que teriam um alto custo social. O calçamento da via com blocos sextavados foi mantido pra induzir a diminuição na velocidade dos carros. Com o objetivo de reorganizar o trânsito (02) abriuse algumas novas vias, perpendiculares às vias locais de uso residencial, que oferecem rotas alternativas, encurtam distâncias e contribuem para o aumento da vitalidade e da segurança nas vias residenciais do bairro, hoje constituído por ruas muito longas e sem conexões entre si. Essas vias

MAPA DA HIERARQUIA DE VIAS PROPOSTA POSTO DE ESCOLA SAÚDE PÚBLICA

01 Mapa elaborado pela autora sobre base do IPUF

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REORGANIZAÇÃO DO TRÂNSITO propiciam a criação de um sistema binário no centrinho, assim os carros circulam apenas em um sentido, e o espaço que antes era ocupado por ele passa a ser dos pedestres. A implantação de bolsões de estacionamentos (03) nas bordas do bairro - próximos a conexões com os transportes, grandes comércios e espaços de lazer - é uma medida de reorganização do trânsito e de incentivo ao uso dos transportes coletivos. Desta forma os motoristas são convidados a tornarem-se pedestres e viver o bairro a pé, sem que isso dificulte a execução de suas tarefas cotidianas. Esta medida diminui a quantidade de carros em circulação no bairro, possibilitando a retirada dos estacionamentos ao longo das calçadas e concentrando-os em pequenos recuos pelo bairro.

02 Mapa elaborado pela autora sobre base do IPUF

BOLSÕES DE ESTACIONAMENTO

03 Mapa elaborado pela autora sobre base do IPUF

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CICLOVIAS E CICLOFAIXAS

As diretrizes de mobilidade incluem a criação de uma rede de ciclovias, a ampliação da cobertura do sistema de transporte lacustre e a implantação de um corredor de ônibus. A bairro possui hoje apenas uma ciclovia, na orla da Rua Vereador Osni Ortiga, que termina abruptamente. O alargamento desta rua, previsto no Plano Diretor, possibilita a sua continuidade. A rede de ciclovias proposta (04) conecta-se aos pontos de saída de transporte coletivo e tem pontos de aluguel de bicicletas com estruturas de apoio servidas de vestiários e cafés. A nova caixa de via também propicia a implementação de um corredor de ônibus (05), que seguiria no sentido do sul da Ilha até o bairro adjacente Rio

04 Mapa elaborado pela autora sobre base do IPUF

CORREDOR DE ÔNIBUS

05 Mapa elaborado pela autora sobre base do IPUF

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Tavares, onde já é previsto um corredor de ônibus com ligação via túnel ao Centro de Florianópolis. Através da implementação destas diretrizes é possível a proposição de um Sistema de Espaços Públicos (06) associados à rede de transporte da Lagoa, conectando os espaços de lazer existentes e os propostos. Um desses espaços propostos é o terreno popularmente conhecido como Vassourão, que consiste na última grande área verde remanescente no Centrinho hoje um terreno particular. A luta pela sua desprivatização - bem como do terreno da Ponta da Areia - é antiga na comunidade da Lagoa. Estes espaços já fazem parte do dia a dia de muitos moradores e o seu uso privado não contempla o potencial que possuem, motivos pelos quais estes foram incorporados ao Sistema de Espaços Públicos aqui proposto. A localização da nova ponte, além de ter como objetivo o desvio do fluxo, visa preservar os espaços de

lazer existentes hoje no encontro entre a orla da Rua Vereador Osni Ortiga e Avenida das Rendeiras. Também visando preservar e valorizar as relações existentes criouse uma ponte de pedestres no mesmo lugar onde hoje existe a ponte da lagoa, muito utilizada pelos pescadores e pelas crianças do bairro, que pulam na lagoa para se refrescar nos dias de calor. Além disso o mantenimento da conexão entre esta parte do Centrinho e a Avenida das Rendeiras valoriza uma das poucas conexões entre os espaços públicos que existem no bairro hoje. Os círculos no mapa destacam espaços que hoje são subutilizados e foram trabalhados para tornaremse pontos de referência e partes integrantes do percurso criado no bairro. As vias destacadas foram convertidas em vias compartilhadas com uma pista de carro de sentido único ou em vias peatonais, de acordo com a legenda do mapa. As áreas de lazer propostas são hoje terrenos privados.

PROPOSTA DE CONEXÃO E AMPLIAÇÃO DO SISTEMA DE ESPAÇOS PÚBLICOS

06 Mapa elaborado pela autora sobre base do IPUF

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A ESCALA DO PEDESTRE O desenho da caixa das vias teve como principal objetivo a priorização do pedestre. Nas vias principais do bairro (corte A), agora com circulação de carros apenas em uma pista e de sentido único, adotou-se a faixa de veículos nivelada com os passeios. A separação entre estes espaços é feita por balizadores metálicos, desenhos de piso, mobiliários ou arborização. O piso no mesmo nível e do mesmo material - blocos intertravados de concreto - facilita o acesso aos portadores de necessidades especiais e dá a sensação de continuidade do espaço. Desta forma, tanto pedestres quanto motoristas ficam cientes da presença do

A

B

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outro, gerando uma convivência mais harmoniosa. As vias internas (corte B) tiveram o desnível das calçadas mantido pois já apresentam um movimento de veículos mais lento. Também desta forma busca-se demarcar claramente o início do percurso do Sistema de Espaços Públicos, com diferenciação de piso e mobiliários. As vias mais largas, que comportam corredores de ônibus (cortes C e D) tem as calçadas mais largas para que não haja conflitos nos locais de parada dos ônibus, onde existe um maior acúmulo de pessoas. A retirada de estacionamentos paralelos às calçadas,


que obstruem a passagem dos pedestres, foi possível devido à implantação dos bolsões de estacionamento. Também foram retirados - e proibidos - os estacionamentos sobre as calçadas, nos afastamentos frontais. Os bolsões de estacionamento preencheram a cota de 50% das vagas existentes hoje. A diminuição na quantidade de vagas para carro disponíveis é uma medida para incentivar o uso do transporte coletivo já adotada em muitas partes do mundo.

MAPA DE LOCALIZAÇÃO DOS CORTES - SEM ESCALA

C

D

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A Rua Manoel Severino de Oliveira liga as áreas de maior concentração de pedestres à Escola Municipal e ao Posto de Saúde do bairro, consistindo num importante ponto de ligação. Possui baixa circulação de carros, mas mesmo assim a maior parte do seu espaço é destinado aos veículos. O nivelamento e alargamento das calçadas tem por objetivo trazer um espaço mais confortável e seguro para os pedestres.

Vista atual do eixo da rua

VISTA DA PROPOSTA PARA A RUA MANOEL SEVERINO DE OLIVEIRA

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E

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O trecho final da Avenida Afonso Delambert Neto é conhecido pela grande quantidade de bares e restaurantes. As calçadas são insuficientes para comportar a grande quantidade de pessoas que passam por aqui todas as noites, que tem de andar pela rua e entre os carros estacionados. Então este trecho de via foi fechado para carros e tornou-se um calçadão.Desta forma os bares podem abrir-se para as ruas e estimular a vitalidade do bairro.

Vista atual do eixo da rua

VISTA DA PROPOSTA PARA O CALÇADÃO NA AVENIDA AFONSO DELAMBERT NETO

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F

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Devido às edificações existentes na borda da água, a Ponta do Pitoco hoje fica segregada dos outros espaços de lazer da Lagoa da Conceição, configurando um local escondido e por vezes perigoso. além da retirada destas edificações proponho a restrição do acesso de carros neste trecho da rua. Desta forma configura-se um calçadão integrado à orla com espaços de lazer e estar junto à borda d’água.

Vista atual do eixo da rua

VISTA DA PROPOSTA PARA O CALÇADÃO DE ACESSO À PONTA DO PITOCO

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G

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A implantação de uma faixa reversível Avenida das Rendeiras visa amenizar o problema do trânsito de ida e volta das praias que ocorre nesta viahoje, mantendo um fluxo contínuo de circulação. O calçamento em blocos sextavados foi mantido para induzir a baixa velocidade dos carros, o que, além de garantir a fluidez do trânsito, traz segurança para os pedestres e ciclistas que também fazem grande uso desta via.

Vista atual do eixo da rua

VISTA DA PROPOSTA PARA A AVENIDA DAS RENDEIRAS

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H

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RECORTES ESPACIAIS PRIMEIRO RECORTE - PRAÇA DE CHEGADA O bairro da Lagoa da Conceição recebe muitos visitantes todos os anos, e não só durante o verão. Muitos estudantes intercambistas estabelecem residência no bairro e tem nele seu primeiro contato com a cidade. O espaço do Terminal de Integração da Lagoa (TILAG) é muitas vezes o cenário deste primeiro contato, um espaço árido e sem um posto de informações apropriado para atender aos que aqui chegam pela primeira vez. O terminal é também ponto de encontro para muitos moradores do bairro, que hoje tem de esperar em pé sob o sol ou chuva se quiserem fugir do acúmulo de pessoas na parte de dentro do terminal. A área adjacente ao TILAG é hoje composta por estacionamentos paralelos às calçadas, diversas pistas para carros e um terreno vazio que tem sua fachada ocupada por outdoors. Não existe nenhuma indicação do caminho a ser seguido para os que saem dali e tem de seguir a pé até a área comercial do Centrinho da Lagoa, que fica a apenas 500m. Este recorte é fundamental para o percurso pois, além de marcar o seu início, representa a importância da integração do transporte coletivo aos espaços públicos

do bairro. Desta forma a praça de chegada proposta caracteriza-se como uma amostra do que está por vir neste percurso: um espaço seguro e confortável para pedestres, ciclistas e carros conviverem harmoniosamente. Propõe-se a diminuição do espaço ocupado pelos carros e a apropriação do terreno não utilizado adjacente para a criação desta praça de chegada para o bairro. O espaço de circulação dos carros e ônibus - para acesso ao Terminal e ao bolsão de estacionamento próximo - é demarcado com desenho de piso e balizadores, mantendo o mesmo nível e tipo de pavimentação do restante da praça. O espaço da praça é ocupado por arquibancadas de tamanhos diversos, que convidam à apropriação livre, áreas de estar à sombra, mesas e cadeiras. Criou-se uma pequena arquitetura de apoio, que abriga banheiros públicos com chuveiros, um café com posto de informações turísticas, ponto de aluguel de bicicletas e uma oficina para pequenos reparos e manutenção das bicicletas. Também são propostos pequenos comércios no entorno, que podem facilitar o cotidiano de quem passa pelo local diariamente, com serviços populares como chaveiro, sapateiro e lotérica.

VISTA GERAL DA PROPOSTA PARA O PRIMEIRO RECORTE

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Imagens da situação atual do entorno do TILAG Fonte das imagens: Google street view

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PERSPECTIVA DO PEDESTRE DA PROPOSTA PARA O PRIMEIRO RECORTE

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VISTA SUPERIOR DA PRAÇA E DISTRIBUIÇÃO INTERNA DO PONTO DE ALUGUEL DE BICICLETAS

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Imagens da situação atual do posto de combustíveis Fonte das imagens: Google street view

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SEGUNDO RECORTE - POSTO DE COMBUSTÍVEIS O encontro das ruas Henrique Veras do Nascimento e Manoel Severino de Oliveira possui uma concentração de edificações junto à borda d’água - em Área de Preservação Permanente - obstruindo a vista e o contato com a orla da lagoa. Neste ponto também existe um posto de combustíveis que abriga alguns restaurantes e no seu entorno encontra-se a maior parte dos cafés do bairro, configurando um espaço com muitos conflitos entre carros e pedestres. A intervenção aqui vem justamente para reconhecer a vocação deste local como ponto de encontro, adaptando o espaço para receber adequadamente o tipo de uso que já é exigido dele atualmente.

A remoção das edificações na borda da lagoa possibilita a reconexão deste espaço com a orla e também entre as áreas verdes já existentes hoje na borda d’água, criando um espaço de lazer e estar contínuo. A intervenção manteve a estrutura existente da cobertura do posto, o que além de ser barato e ecológico é uma forma de contar a história do bairro. O espaço sob a cobertura abriga mesas, cadeiras e sofás para criar um espaço de estar e alimentação informal e democrático um contraponto ao uso atual do espaço, que contempla apenas uma pequena parcela da população que por aqui circula.

VISTA GERAL DA PROPOSTA PARA O SEGUNDO RECORTE

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Comparação entre a vista aérea atual (esquerda) e vista aérea da proposta (direita) no segundo recorte Fonte da imagem de satélite: Google earth

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PERSPECTIVA DO PEDESTRE DA PROPOSTA PARA O SEGUNDO RECORTE

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TERCEIRO RECORTE - TRAPICHES A borda da rua Henrique Veras, no trecho próximo à Praça Bento Silvério, apresenta alguns comércios em situação irregular devido à proximidade da margem da lagoa. Este trecho também apresenta uma grande quantidade de estacionamentos - na frente dos referidos comércios ou nas margens da lagoa - e uma grande quantidade de carros que aqui circulam em uma velocidade mais alta devido à proximidade do acesso à ponte. Somando-se à grande quantidade de carros, este é o trecho onde há a maior circulação de pedestres de todo o percurso. A Pracinha é uma referência no bairro justamente por consistir no seu principal espaço de lazer. É cenário para encontros, jogos de futebol das crianças do

entorno e feiras semanais. A criação de novas ruas internas ao bairro propiciou a restrição da circulação de carros neste trecho, o que aumenta a segurança e permite que a praça se estenda até a orla, ampliando a sua superfície. Também restringiu-se a circulação de carros na Rua Senador Ivo Daquino, que dá acesso aos trapiches de onde saem os barcos para a Costa da Lagoa. O ponto de saída dos barcos foi realocado e ampliado para abrigar também um café e banheiros públicos. A implantação da edificação na Ponta da Areia visa atender uma luta histórica da comunidade pela abertura do terreno - hoje usado como estacionamento privado - para uso público.

VISTA GERAL DA PROPOSTA PARA O TERCEIRO RECORTE

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Vista aĂŠrea atual do terceiro recorte Fonte da imagem de satĂŠlite: Google earth

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PERSPECTIVA DO PEDESTRE DA PROPOSTA PARA O TERCEIRO RECORTE

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VISTA SUPERIOR DA ORLA E DISTRIBUIÇÃO INTERNA DO PONTO DE SAÍDA DOS BARCOS

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O processo de desenvolvimento deste trabalho foi enriquecedor não só profissional, mas também pessoalmente. Morei nas proximidades da Lagoa da Conceição até os 18 anos e depois disso, apesar das visitas constantes ao bairro, não tinha tido a oportunidade de olhar para este bocado tão especial da Ilha - e da minha vida - com o olhar amadurecido pelo aprendizado adquirido na faculdade. Toda a pesquisa e as leituras feitas para este trabalho foram motivadas pelo enorme carinho que tenho por este espaço e pelo desejo ardente em vê-lo exatamente assim como represento na imagem das minhas propostas: vibrante, com seu potencial evidente e bem aproveitado. As idéias aqui propostas representam ideais nos quais eu realmente acredito e a visão de um mundo que eu tenho esperança de ter um dia. Um mundo com cidades mais democráticas, respeitosas e acolhedoras. Onde seja possível o convívio harmonioso e a história dos lugares seja respeitada e celebrada, bem como seus ecossitemas e paisagens naturais. Tenho consciência de que este é um discurso - assim como o meu trabalho

- um pouco utópico, tendo em vista o panorama que os dias de hoje nos apresentam, mas acredito que o espaço da faculdade é importante justamente por nos permitir imaginar essas cidades de sonho. A prática da profissão naturalmente nos ensina a realidade do mercado e acredito que enquanto tivermos em vista a esperança da existência dessas cidades ideais teremos a motivação para seguir em frente. Busquei soluções que exaltassem a apropriação do espaço pelas pessoas, que reforçassem o que naturalmente acontece e estimulassem a sua continuidade. A natureza do bairro e a atmosfera existente nele são incríveis por si só, de modo que o meu trabalho aqui resume-se a dar suporte para que esta vivência aconteça da melhor forma possível. Acredito que o trabalho de um Arquiteto e Urbanista deve respeitar a vocação natural dos lugares e estimular a apropriação do espaço para que se reforce a identidade local, assim criando uma noção de pertencimento e despertando nas pessoas a vontade de preservar a história das suas cidades.

Imagem de acervo pessoal

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BIBLIOGRAFIA BRASIL. MINISTÉRIO DAS CIDADES. Política nacional de mobilidade urbana. Brasília, 2013. 37 p. BRASIL. MINISTÉRIO DAS CIDADES. PlanMob – Caderno de referência para elaboração de plano de mobilidade urbana. Brasília, 2015. 238 p. CECCA, Centro de Estudos Cultura e Cidadania. Uma Cidade numa Ilha. 4. ed. Florianópolis: Insular, 1997. 248 p. CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA. Retratos da sociedade brasileira: locomoção urbana. Brasília, 2011. 51 p. Disponível em: <http://www4.ibope.com.br/download/locomocao_urbana.pdf>. Acesso em: 07 jul. 2016. GEHL, Jan. Cidades para Pessoas. 1. ed. São Paulo: Perspectiva, 2013. 262 p. IBGE. (2010) Perfil dos Municípios Brasileiros, Brasília INSTITUTO PÓLIS. Mobilidade urbana é desenvolvimento urbano. Brasília: Ministério das Cidades, 2005. 39 p. IPUF, Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis. Ajustes, implementos e complementações do Plano Diretor. Florianópolis, 2015. 144 p. IPUF, Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis. Bases para o planejamento urbano integrado de Florianópolis. Florianópolis, 2014. 216 p. IPUF, Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis. Nova modernidade para Florianópolis. Florianópolis, 2012. 84 p. JACOBS, Jane. Morte e Vida das Grandes Cidades. 1 ed. São Paulo: Wmf M. Fontes, 2001. 510 p. KUHNEN, Ariane. Lagoa da Conceição: Meio ambiente e modos de vida em transformação. Florianópolis: Cidade Futura, 2002. LERNER, Jaime. Prólogo. In: GEHL, Jan. Cidades Para Pessoas. São Paulo: Perspectiva, 2013. 262 p. PLAMUS, Plano de Mobilidade Urbana Sustentável da Grande Florianópolis. Relatório final: consolidação das propostas e plano de implementação. Florianópolis, 2015. 261 p. Disponível em: <http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/export/sites/default/bndes_pt/Galerias/Arquivos/produtos/download/aep_fep/PLAMUS_Produto_19_Relatorio_Final_Volume_Principal.pdf>. Acesso em: 28 jan. 2016. PROGRAMA SOLUÇÕES PARA CIDADES (São Paulo). Espaços públicos: diagnóstico e metodologia de projeto. São Paulo: ABCP, 2013. 91 p. REIS, Almir Francisco. Ilha de Santa Catarina: Permanências e Transformações. Florianópolis: UFSC, 2013. SOUZA, Jéssica Pinto de. O Plano Diretor de 1952 - 1955 e as repercussões na estruturação urbana de Florianópolis. 2010. 133 f. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós Graduação em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2010. Disponível em: <https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/94156/282002.pdf>. Acesso em: 20 jun. 2016. VAZ, Marcelo Cabral. Lagoa da Conceição: a metamorfose de uma paisagem. 2008. 157 f. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós Graduação em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2008. Disponível em: <http://livros01.livrosgratis.com.br/cp093699.pdf>. Acesso em: 10 out. 2015.

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