Liberdade e responsabilidade

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Disciplina: Filosofia – 10ºAno Liberdade e Responsabilidade «A consequência essencial das nossas observações anteriores é que o homem, estando condenado a ser livre, carrega todo o peso do mundo sobre os ombros: é responsável pelo mundo e por si mesmo enquanto maneira de ser. Tomamos a palavra responsabilidade no seu sentido de ‘consciência de ser o autor incontestável de um evento. (…) Não há acidentes numa vida; um acontecimento social que rebenta subitamente e me arrasta não vem de fora; se sou mobilizado para uma guerra, esta guerra é a minha guerra, ela é a minha imagem e eu mereço-a. Mereço-a, em primeiro lugar, porque dispunha sempre da possibilidade de a ela me subtrair pelo suicídio ou a deserção: estes possíveis últimos são aqueles que devem estar-nos sempre presentes quando se trata de encarar uma situação. Na falta de a ela me ter subtraído, escolhi-a; pode ser por moleza, por cobardia perante a opinião pública, porque prefiro certos valores ao da própria recusa de fazer a guerra (a estima dos mais íntimos, a honra da minha família, etc.). De qualquer modo, trata-se de uma escolha. Esta escolha será posteriormente reiterada de uma forma contínua até ao fim da guerra; devemos então subscrever o dito de Jules Romains* : ‘Não há vitimas inocentes na guerra.’ Sendo assim, se eu preferir a guerra à morte ou à desonra, tudo se passa como se arcasse com a inteira responsabilidade desta guerra. É claro que foram outros a declará-la e talvez me veja tentado a considerar-me como simples cúmplice. Mas esta noção de cumplicidade só tem um sentido jurídico; ela não é aqui válida, pois dependeu de mim que, para mim e por mim esta guerra não existisse e eu decidi que ela existisse. (…) Mas, nesta guerra que escolhi, escolhi-me dia a dia, e faço-a minha fazendo-me. (…) Enfim, (…) cada pessoa é uma escolha absoluta de si a partir de um mundo de conhecimentos e de técnicas que esta escolha assume e elucida ao mesmo tempo.» Jean Paul Sartre, O ser e o Nada

«Responsabilidade é saber que cada um dos meus atos me vai construindo, me vai definindo, me vai inventando. Ao escolher aquilo que quero vou-me transformando pouco a pouco. Todas as minhas decisões deixam a sua marca em mim antes de a deixarem no mundo que me rodeia. E, evidentemente, depois de aplicada a minha liberdade em ir-me construindo um rosto, já não posso queixar-me ou assustar-me com o que vejo no espelho quando me olho… Se ajo bem ser-me-á cada vez mais difícil agir mal (e inversamente, por infelicidade); assim, o ideal é irmos apanhando o vício… de viver bem.» Fernando Savater, Ética para um Jovem ___________________________________________________________________________________ * Jules Romains (1885-1972) – Romancista, dramaturgo, poeta e ensaísta, concebia o mundo como um todo formado por grandes conjuntos coletivos providos de uma alma que englobava as almas individuais de cada um dos elementos que os compunham, daí a sua grande preocupação ser relativamente aos dirigentes e àqueles que manipulam as forças coletivas irracionais.


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