Seminario Ameaças Fitossanitárias - Novas pragas colocam em risco a produção de alimentos no Brasil

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APRESENTAÇÃO

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URGÊNCIA DE UMA ESTRATÉGIA DE DEFESA FITOSSANITÁRIA

os últimos meses agricultores brasileiros têm acumulado prejuízos milionários devido à chegada ao país da lagarta Helicoverpa armigera, que ataca plantações de soja, milho e algodão. De acordo com a Sociedade Brasileira de Defesa Agropecuária (SBDA), existem ao menos outros 150 invasores com potencial de ataque aos cultivos em algum ponto do país, podendo trazer prejuízos de até R$ 40 bilhões ao agronegócio nacional. Para debater sobre os riscos e buscar saídas ao risco que as novas pragas representam para o Brasil, pesquisadores, acadêmicos, lideranças do agronegócio brasileiro e da indústria fabricante de defensivos agrícolas reuniram-se no dia 23 de maio de 2013. Ao todo, cerca de 300 pessoas participaram do Seminário Ameaças Fitossanitárias, realizado pela SBDA, em São Paulo. Os trabalhos do Seminário foram conduzidos em dois períodos. Na parte da manhã, os palestrantes expuseram o tema sob uma visão ampla, com aspectos como o conceito de invasão biológica, os impactos que as novas pragas causam ao país e como é o procedimento para registro de defensivos agrícolas no Ministério da Agricultura. No período da tarde, ocorreu a apresentação de alguns casos de sucesso de combate à novas pragas, feitas por pesquisadores que trabalharam nos respectivos projetos. Um dos pontos marcantes do evento foi a apresentação sobre os estragos que a Helicoverpa armigera vem causando no Estado da Bahia. Ao final das apresentações, especialistas e participantes debateram sobre a importância das ações de prevenção à entrada de pragas exóticas em território brasileiro, e sugeriram uma série de propostas indicando a necessidade urgente de o País desenvolver uma ampla política de defesa fitossanitária. Sociedade Brasileira de Defesa Agropecuária Junho de 2013

Expediente Seminário Ameaças Fitossanitárias Organizador: Evaldo Ferreira Vilela (Presidente da SBDA) Coordenadora Geral: Regina Lúcia Sugayama (SDBA) Mediador dos debates: Angelo Pallini (UFV) Assessoria Geral: Joenilma Nogueira Leite Assessoria de Imprensa: Nathália Nogueira (Lítula Comunicação)

inovadefesa.ning.com/group/sbda sbda.contato.sbda@gmail.com

Equipe de Produção dos Anais do Seminário: Edição de Conteúdo e Revisão: Angela Ferreira Projeto Gráfico e Diagramação: Anistela Noronha Fotos: Alf Ribeiro e imagens de arquivo dos autores Gráfica: Criasett * Esta publicação tem circulação gratuita e foi produzida como anais do Seminário Ameaças Fitossanitárias, realizado pela Sociedade Brasileira de Defesa Agropecuária, em maio de 2013.

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SUMÁRIO Apresentação...................................................................................................................................... 5 Urgência de uma estratégia de defesa fitossanitária Depoimentos .......................................................................................................................................9 Ciência e a corrida contra o tempo Sobre a Sociedade Brasileira de Defesa Agropecuária ................................................................. 11 Evaldo Ferreira Vilela Biologia do processo de invasão......................................................................................................13 Denise Návia Pragas quarentenárias para o Brasil ............................................................................................... 21 Marcelo Lopes da Silva Registro emergencial de agrotóxicos............................................................................................... 27 Luís Eduardo Pacifici Rangel Mosca-de-carambola e greening:...................................................................................................... 33 análise de benefício-custo dos programas de erradicação Silvia Helena Galvão de Miranda Cydia pomonella: qual seria o cenário da fruticultura ....................................................................37 temperada no Brasil na ausência de erradicação? Jair Virgínio Ferrugem asiática da soja - impacto da entrada da praga no Brasil ............................................ 41 Rafael Moreira Soares Impacto da Helicoverpa armigera sobre a agricultura brasileira................................................... 45 Suely Xavier de Brito Organização de sistemas de defesa sanitária vegetal em outros países...................................... 49 Aldo Malavasi Debates e propostas........................................................................................................................... 54 Em defesa da competitividade agropecuária Considerações finais .......................................................................................................................... 61 7


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DEPOIMENTOS

CIÊNCIA E A CORRIDA CONTRA O TEMPO

EVALDO FERREIRA VILELA Sociedade Brasileira de Defesa Agropecuária

É muito importante que consigamos nos organizar enquanto sociedade civil, articulando universidades, empresas, institutos de pesquisas e órgãos de governo, no sentido de aperfeiçoar o funcionamento da defesa agropecuária no Brasil. Há uma necessidade muito grande de melhorar a atuação da vigilância sanitária, animal e vegetal, sem a preocupação em identificar culpados, ou deficiências do passado, mas mirar na construção de uma realidade futura mais adequada ao País. É difícil a construção do novo, mas é preciso e possível, a partir da união de princípios e forças para atender a demanda de um mundo em grande transformação. Por isso, o apelo da Sociedade Brasileira de Defesa Agropecuária para constituirmos uma comunidade atuante no campo da defesa agropecuária no País.

EDUARDO DAHER Diretor-executivo da Andef O marco regulatório precisa ser aperfeiçoado, a fim de conferir maior agilidade aos órgãos governamentais encarregados de analisar e aprovar as novas tecnologias demandadas pelos agricultores, bem como oferecer um horizonte de maior previsibilidade às empresas para definirem seus planos de investimentos. O que temos visto, porém, são alguns órgãos regulatórios encarregados de analisar os pedidos de registros de novos ingredientes ativos e melhorias nas formulações existentes, entre outras demandas, continuarem a trabalhar numa morosidade totalmente incompatível com a dinâmica que o mundo exige quando o assunto é a produção de grãos, fibras e energias renováveis.

ANITA GUTIERREZ CEAGESP Os produtores enfrentam situações extremamente burocráticas e complicadas que têm prejudicado muito sua atividade. O produtor de hortaliças, por exemplo, precisa contar com os serviços de um Engenheiro Agrônomo responsável pelo manejo fitossanitário e um certificado fitossanitário de origem, quando chega à CEASA, pagar a outro Agrônomo o certificado fitossanitário de origem e, depois, ainda buscar uma permissão de trânsito vegetal nas Defesas Estaduais, que funcionam em horários bastante restritos. Ou seja, os produtos com certificado de origem, que já foram verificados, rotulados e embalados, mas que não foram reembalados novamente, devem passar por todo o processo burocrático novamente. Diante dessas dificuldades, muitos atacadistas deixaram de vender para outros Estados. Portanto, para impulsionar a hortifruticultura, fica clara a urgência de resolver a falta de registro de agrotóxicos e simplificar a Defesa Fitossanitária.

NELSON LEITE Diretor de Defesa Vegetal da Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Pará O Pará é um estado onde tudo é grandioso. São 1,2 milhão km². Igualmente grandioso, é o potencial agropecuário da região. Hoje, o estado é o quarto maior produtor de rebanho bovino do Brasil, o segundo maior produtor de cacau, o primeiro em abacaxi, pimenta-do-reino e açaí e o sétimo em citros. Brevemente, estará também entre os dez maiores produtores de soja do país, o que reforça a preocupação dos produtores locais com a presença e o combate à Helicoverpa armigera. 9


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SOBRE A SOCIEDADE BRASILEIRA DE DEFESA AGROPECUÁRIA EVALDO FERREIRA VILELA Sociedade Brasileira de Defesa Agropecuária

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esde 2008, está em andamento o Projeto “Ino- presas e do MAPA. No entanto, é preciso aproveitar vação para a Defesa Agropecuária - INOVA- as vantagens competitivas do Brasil para que, até DEFSA”, sob a Coordenação da Universidade 2022, quando será completado mais um centenário Federal de Viçosa, interior do Estado de Minas Gerais. de independência, seja possível melhorar o País do O Programa mineiro, que termina este ano, foi a inspi- ponto de vista de negócios, de renda e de emprego ração para a criação da SBDA, em 2010, com a mis- associados ao agronegócio. são de promover maior articulação entre a pesquisa, o A questão de pragas exóticas é hoje um ensino, o setor privado e os órgãos dos mais graves problemas para regulatórios envolvidos com a Deas cadeias de produção de alifesa Agropecuária em todo o terrimentos, fibras e biocombustíveis, tório nacional. Recomendado pelo causando perdas diretas no camentão Ministro Roberto Rodrigues po e redução de acesso a merca“A questão de pragas e o ex-Ministro Alysson Paolinelli, a dos, prejudicando a competitiviexóticas é hoje um dos iniciativa tratou de organizar a sodade da economia nacional. Para mais graves problemas ciedade civil na construção de socontribuir com o avanço do tema, luções sustentáveis para as quesestá sendo produzido o livro “Prapara as cadeias de tões da Sanidade Vegetal e Animal gas introduzidas no Brasil: inseprodução de alimentos, no Brasil, construindo um futuro tos e ácaros”, em parceria com fibras e biocombustíveis, mais seguro para todos os brasileia Fundação de Estudos Agrários causando perdas diretas ros no que diz respeito às pragas e Luiz de Queiroz (FEALQ), que reúno campo e redução de as doenças das plantas e animais. ne estudos de 136 pesquisadores Entre as ações da Soem mais de 800 páginas. Essa é a acesso a mercados” ciedade Brasileira de Defesa segunda edição da obra que relaAgropecuária estão o estimulo à ta os casos de introdução de nocapacitação de profissionais, a vas pragas no País, suas causas facilitação da Inovação Tecnológie impactos. No lançamento, tamca, a agregação de massa crítica e indução de uma bém será disponibilizada uma segunda obra chamavisão mais estratégica para a Defesa Agropecuária. da “Fundamentos da Defesa Agropecuária”, que reSua atuação e ações podem servir como exemplo úne outros autores discorrendo sobre o tema. Essa ao Governo Federal de como vencer a burocracia será a primeira obra a dar condições aos estudantes inerente a todos os processos. O funcionamento de graduação das áreas de agronomia, veterinária e dos procedimentos na área da defesa agropecuária biologia conhecerem mais de perto o que é a Defesa nos estados e no País como um todo só não está Agropecuária, disciplina inexistente no currículo das pior porque há muitas fortalezas do lado das em- universidades brasileiras. 11


A globalização, além do maior trânsito de pragas, trouxe também a conectividade, que permite somar conhecimentos independentemente de idade, credo, raça ou profissão. E o processo de inovação ensina muitas questões como, por exemplo, que o que mais impede uma comunidade de avançar é a questão do preconceito, de achar que uma visão está presa ao passado. Hoje, com o advento da internet e a velocidade com que os acontecimentos ocorrem, o conhecimento do passado, a experiência, não são garantias para o sucesso. E o Brasil está longe de tomar consciência de que as experiências anteriores não se prestam tanto mais

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para solucionar os novos problemas. Temos que acompanhar a velocidade dos acontecimentos com uma visão mais esperançosa do futuro. Para contribuir com a disseminação dos novos conceitos e estudos, a SBDA disponibiliza a Rede Inovação Tecnológica para a Defesa Agropecuária - RITDA (www.inovadefesa.ning.com), com cerca de 8 mil usuários cadastrados. Esse mundo de compartilhamento de informação que surgiu com as redes sociais, não é passatempo, mas uma das mais importantes armas de um mundo globalizado. Por isso, é preciso valorizar mais a informação e trabalhar de forma mais efetiva a inovação.


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BIOLOGIA DO PROCESSO DE INVASÃO DENISE NÁVIA Embrapa Recursos Genéticos

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primeira vez que se falou em espécies exóticas a outra, proposital ou acidentalmente, ocasionando preinvasoras (EEI) foi durante a Convenção de Di- juízos ambientais, econômicos, sociais e culturais. Como versidade Biológica, em 1992. Essas espécies resultado da atividade humana moderna, barreiras geoexóticas são aquelas cuja introdução ou dispersão gráficas que impediriam os organismos de se deslocaameaça a diversidade biológica. Porém, no sentido rem, são eliminadas. Nos agroecossistemas isso tem prático, quando se fala nessas invasoras, atualmente, levado ao que os pesquisadores chamam de “bioglobatrata-se de organismos exóticos que, quando intro- lização de pragas”. Assim, a biologia clássica trata dos duzidos em novas áreas passam organismos em sua área de distribuia causar impacto econômico e/ou ção natural; e a biologia das invasões ecológico. Para isso a espécie deve estuda os organismos introduzidos se disseminar nas áreas invadidas em novos ambientes. As EEI têm O impacto ecológico é mais difícil causado graves problemas para a “Hoje, as espécies de ser detectado e mensurado. conservação dos ambientes naturais, invasoras exóticas têm Organismos dos mais direcursos hídricos, agricultura e pecucausado graves versos grupos podem se tornar EEI. ária. Como impacto na agricultura, problemas para a Algumas EEI são simpáticas ou muipor exemplo, basta observar que conservação dos to bonitas. Um exemplo disso são a maioria das pragas agrícolas são algumas plantas ornamentais. Muitas exóticas. Como resultado, há tamambientes naturais, plantas introduzidas propositadabém sérios impactos na alimentação, recursos hídricos, mente como ornamentais tornam-se nutrição e saúde humana. Por isso, agricultura e invasoras. Por isso atualmente há fortem sido tema relevante nos mais dipecuária.” tes campanhas para a utilização de versos fóruns. As EEI que afetam os plantas ornamentais nativas, e não vegetais estão também no escopo exóticas. Além disso, temos como da Convenção Internacional de ProEEI mamíferos, anfíbios, moluscos, teção dos Vegetais, junto à FAO, e da ácaros, fungos, vírus, bactérias. EsOrganização Mundial do Comércio. pécies de qualquer grupo podem se tornar invasoras em As invasões biológicas representam um grannovos ambientes, quando encontram condições climáti- de desafio global para os sistemas econômicos e para cas favoráveis ao desenvolvimento e ausência de inimigos a conservação dos ambientes. Estão entre as mudanças naturais eficientes. As invasões podem ocorrer nos mais globais, ocasionadas pela atividade humana. As bioinvadiversos ambientes - aquáticos ou terrestres - incluindo sões são um dos problemas menos reversíveis, assim os agroecossistemas. como as mudanças climáticas, e são consideradas a se Basicamente, invasão biológica consiste no gunda principal causa da perda da biodiversidade, após deslocamento dos organismos vivos, de uma região a ocupação de áreas pelo homem. Mas, o tema das 13


invasões não é novo. Em 1958, o inglês Charles Elton, fundador da biologia das invasões, percebeu e antecedeu os problemas que têm sido intensificados nos últimos anos, em um livro chamado “Biological Invasions”. Este livro é considerado a base para essa área do conhecimento. Elton menciona que as invasões passariam a ser tão frequentes que seriam necessários compreender seus padrões e processos; prever

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suas ocorrências e consequências; e definir estratégias para minimizar seus impactos. Dessa forma, além da compreensão desse fenômeno que vem ocorrendo em todo o planeta, a biologia das invasões tem como objetivo aplicado prever, prevenir, controlar o fluxo e minimizar o impacto ecológico e econômico das EEIs. Em poucos séculos, a civilização passou de uma realidade onde havia pouquíssimas rotas marítimas,


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e viajava-se em caravelas, para uma extrema intensifica- essas invasões representam um grande desafio para a ção das rotas marítimas e aéreas. Além da facilidade de economia dos países. transporte entre as mais distantes regiões do planeta, a Existem algumas características gerais dos globalização da economia têm ocasionado um grande organismos que favorecem para que se tornem invaaumento dos problemas de invasões biológicas. Nos sores. Normalmente as EEI são organismos associaEstados Unidos, por exemplo, em ambientes aquáticos, dos às atividades humanas, que apresentam eficieno número de introduções de peixes aumentou em três tes estratégias de dispersão, alta fecundidade, alta vezes, nas últimas décadas; e as taxas de invasão conti- taxa de crescimento populacional, alta tolerância a nuam aumentando. Até 1960, uma nova espécie exótica condições físicas extremas, maturidade sexual precoera introduzida a cada 55 semanas; ce, reprodução assexuada, como atualmente esse número é de uma partenogênese. Normalmente são nova espécie a cada 14 semanas. espécies que têm plasticidade fe É importante comprenotípica, suficiente variabilidade ender os fatores que influenciam genética e, normalmente, são polícada uma das etapas do procesfagas, em se falando de herbívoros. so de invasão para planejar ações Essas características não são dis“É importante que reduzam a probabilidade de criminantes, ou seja, não é preciso compreender o que seu sucesso. A primeira etapa é que o organismo invasor tenha toinfluencia cada etapa o transporte dos organismos exódas essas características. Porém, de introdução para ticos para novas áreas, pois eles quanto mais dessas características têm que sobreviver às condições tiver, maior a probabilidade de que planejar as ações.” de transporte e serem liberados se torne um invasor. no novo ambiente em boas condi O estabelecimento das esções fisiológicas. A etapa seguinte pécies exóticas é o segundo passo é o estabelecimento; ao chegarem no processo de invasão biológica. ao novo ambiente os organismos Um ponto fundamental para endevem começar a se reproduzir. tender esse processo é a pressão Depois de já estabelecida uma podo propágulo, que é o conjunto pulação, é preciso que estas aumentem em número e de indivíduos de uma espécie que são liberados no se dispersem, passando a ocupar áreas mais exten- novo ambiente. Quanto mais numeroso o propágulo, sas. E, por fim, chega-se à etapa final, quando são maior a probabilidade de seu estabelecimento. Além percebidos os impactos ecológicos e econômicos. disso, o número de introduções repetidas em uma deEstima-se que entre todas as espécies exóticas que terminada área, e em localidades próximas, aumenta são introduzidas em novas áreas, apenas uma mé- muito a probabilidade de que uma espécie se torne india de 10% tornam-se invasoras, essa porcentagem vasora. Para ter sucesso no estabelecimento, os propode variar entre 5% e 20%. Nos Estados Unidos, por págulos precisam chegar saudáveis e vigorosos nas exemplo, dos 1500 artrópodos introduzidos nas últi- novas áreas. As condições bióticas e abióticas das mas décadas, apenas 50 se estabeleceram e estão áreas “doadoras”, isto é, área de origem do propágucausando sérios impactos; mesmo sendo uma baixa lo, influenciam o estado fisiológico dos propágulos. Se porcentagem de processos de invasões com sucesso, ocorrerem várias introduções seguidas de uma mes15


ma espécie exótica, as diferentes populações podem biológicas em ilhas têm tido consequências devastase hibridizar, favorecendo seu “fitness” e, em consequ- doras. Por exemplo, em Galápagos, o laboratório vivo ência, levando a explosões populacionais e expansão de Charles Darwin, o número de plantas exóticas é, geográfica. Portanto, muitas vezes, não é apenas com atualmente, maior do que o número de espécies natiuma única introdução que uma espécie se estabelece vas: são 40 espécies de plantas exóticas que já invae passe a causar impactos. diram a vegetação nativa, ameaçando os ambientes Além de reconhecer os fatores que influen- naturais, e 60 espécies vegetais nativas estão ameaciam o sucesso dessas invasões, é importante reco- çadas de extinção. nhecer as características dos am Outros ambientes extremabientes que os tornam susceptíveis mente susceptíveis às invasões às invasões biológicas. Um fator biológicas são os ambientes urimportante é a questão da resistênbanos. Um exemplo bastante cia biótica. Há muita discussão em interessante é o da mariposa grupos de pesquisa sobre o tema Paysandisia archon, originária da “Sem dúvida alguma, e há alguns consensos. Por exemArgentina e Uruguai. Esta maripoos ambientes mais plo, em ambientes naturais, quanto sa foi acidentalmente introduzida alterados, como os mais preservado é o ambiente, mais através do comércio de palmeiras agroecossistemas, o mesmo é resistente às espécies inornamentais na região do Mesão extremamente vasoras. Assim, os ambientes mais diterrâneo - Espanha, França e equilibrados, com comunidades Itália - e tornou-se um sério prosusceptíveis às estruturadas e diversificadas, têm blema local, matando palmeiras invasões biológicas.” maior resistência biótica às invasões. extremamente valiosas para as E, sem dúvida alguma, os ambientes áreas urbanas, como as tamareimais alterados, como os agroecosras. Enquanto não se encontram sistemas, são extremamente susmétodos de controle eficientes, a ceptíveis às invasões biológicas. estratégia que vem sendo usada Outra característica da área é a total cobertura da copa das receptora que a torna susceptível às invasões é sua palmeiras com telas, evitando a oviposição nas gemas disponibilidade de recursos. Esse é um ponto de dis- apicais e, consequentemente, a morte das árvores. cordância entre os pesquisadores. Alguns acreditam Este procedimento é de elevado custo e tem alterado que os ambientes com fartura de recursos são real- a paisagem das cidades afetadas. mente mais suscetíveis às invasões biológicas; outros Entre os ambientes extremamente suscepdefendem que a falta de recursos, que causa períodos tíveis às invasões estão os agroecossistemas. Prode estresse no ambiente, é que o torna mais suscetí- vavelmente as áreas agrícolas ou florestais de mevel, devido à desestruturação das comunidades. nor diversidade, como as extensas monoculturas, A susceptibilidade das ilhas às invasões tem constituem os sistemas mais vulneráveis às EEIs. É sido muito estudada. As ilhas são extremamente sus- preciso estar ciente disso para prevenir e enfrentar ceptíveis às EEI, devido ao isolamento de influências as invasões nos ambientes agrícolas. externas; elevado endemismo; e pela estreita evolução Depois que uma espécie exótica é introduzidas espécies que ocorrem no ambiente. As invasões da em uma nova área, é possível que leve muito tempo 16


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para que ela venha a causar impactos ecológicos e econômicos. É muito difícil prever o período de tempo entre a introdução e o momento em que é possível observar suas explosões populacionais e a expansão de sua área de ocorrência. Em inglês esse período de tempo é conhecido como “lag effect”. Algumas espécies exóticas podem permanecer em baixíssimas populações ou não percebidas por muitas décadas até que os impactos econômicos sejam evidentes. Isso pode ser influenciado por fatores climáticos e bióticos. Pode ocorrer que ambientes antes desfavoráveis passem a ser favoráveis às espécies exóticas introduzidas. Alguns pesquisadores defendem ainda que as espécies exóticas passam a ser mais agressivas, devido às mudanças genéticas. Deve-se considerar

também a ocorrência do efeito de atraso aparente, quando as espécies exóticas já estavam causando impactos, mas ainda não haviam sido detectadas ou estavam sendo erroneamente identificadas.

Impactos ecológicos e econômicos das espécies exóticas invasoras As EEI podem causar impactos em todos os níveis da organização ecológica - desde ao indivíduo até a comunidade e ecossistema. Entre os impactos podemos citar: transformação da estrutura e composição das espécies dos ecossistemas, herbivoria, competição, repressão ou exclusão de espécies nativas, predação, parasitismo ou infecção dos organis-

AÇÕES APROPRIADAS EM CADA ESTÁGIO DE INVASÃO

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mos nativos, e modificações químicas ou físicas do país, até que foi introduzido um novo genótipo que, em ambiente. poucos anos, tornou-se dominante e tem levado à redu Um fenômeno bastante interessante é a rá- ção da diversidade das espécies nativas de formigas em pida adaptação das EEIs aos novos ambientes. Por 70% nos estados do sul, sudeste e na Califórnia. Ou seja, exemplo, um estudo de Raymond B. Huey, chama- um genótipo exótico de uma espécie já existente vem exdo “Rapid Evolution of a Geographic Cline in Size in cluindo as espécies nativas, e passou a ser um dos piores an Introduced Fly”, publicado na invasores naquela área. Um problema revista Science, aborda a rápida para a agricultura e para a saúde huadaptação de uma Drosophila mana. nas regiões neotropicais, com Outro impacto ecológico é a “Uma das grandes mudanças fenotípicas. Outro mudança total da estrutura das comuvantagens que as espécies nidades. Ao invés de eliminarem comexemplo bastante interessante é o do ácaro vermelho das palmeipletamente as espécies nativas, as EEI exóticas têm em relação ras, Raoiella indica. No Hemisfério passam a dominar as comunidades. O às que já estão no Oriental esses ácaros fitófagos exemplo que ilustra esse caso é o ácaambiente é que, apresentavam quatro palmeiras ro vermelho do tomateiro, Tetranychus normalmente, não hospedeiras. Após sua introevansi, de origem sul-americana, inencontram inimigos dução nas Américas, em 2004, vasor na África e na região do Mediem menos de dez anos já foram terrâneo. Ferragut e colaboradores naturais eficientes nas registradas mais de 90 plantas realizaram levantamento dos ácaros novas áreas de hospedeiras. Além de palmeiras fitófagos e predadores em hortaliças ocorrências.” (Aecaceae), R. indica tem infesna Espanha antes e dez anos depois tado também plantas das famílias da introdução de T. evansi. Os resultaMusaceae (incluindo a banana), dos mostraram que a composição da Heliconiaceae, Strelitziaceae, Zinacarofauna não foi modificada, mas a giberaceae, entre outras monocotiledôneas. Dessa abundância relativa mudou completamente. Isso contesforma o ácaro representa uma ameaça não apenas ta um pouco a crença de alguns pesquisadores de que aos agroecossistemas, mas também a áreas naturais um tempo após a invasão os sistemas podem voltar a ter onde são abundantes hospedeiras nativas. equilíbrio. O que se observa muitas vezes é uma alteração Outro impacto ecológico das espécies invaso- completa e permanente das comunidades. ras exóticas é a exclusão competitiva. Com a chegada O deslocamento de nichos é outro impacto ecode uma espécie exótica, inicia-se uma competição com lógico. Por exemplo, um esquilo de origem norte-amerias espécies nativas, ou anteriormente naturalizadas. E, cana, foi introduzido na Grã-Bretanha e deslocou a espéuma das grandes vantagens que as espécies exóticas cie nativa de esquilo dos bosques para áreas urbanas. têm em relação às que já estão no ambiente é que, nor- A hibridização também é um fenômeno possímalmente, não encontram inimigos naturais eficientes nas vel. Se há uma espécie exótica invasora muito próxima novas áreas de ocorrências. Um exemplo desse caso é a (por exemplo, do mesmo gênero) a de uma nativa, elas formiga de fogo, Solenopsis invicta, nos Estados Unidos, podem se hibridizar. Como resultados, podem haver perconsiderada uma das piores espécies invasoras em todo da de fitness das espécies nativas e mesmo ameaça de o mundo. Já existiam alguns genótipos dessa formiga no extinção, infertilidade de híbridos, perda de integridade 18


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genética das espécies nativas. Uma planta invasora de um 1:100. Na medida em que o fenômeno de na Flórida, no estado norte-americano da Califórnia, invasão vai avançando, o custo passa para 1:25, na chamada Spartina alterniflora, hibridizou-se com uma erradicação; 1:10 na contenção; e para 1:1-5 para espécie nativa de ambientes aquáticos. Por produzir a definição e utilização de medidas de controle. Ou mais pólen e ter melhor desempenho do que a planta seja, quanto mais cedo forem adotadas medidas, nativa, a espécie invasora adaptou-se e passou a ocu- mais estas serão compensadoras. par todos os ambientes onde antes Um estudo na China reforça a ocorria a espécie nativa. ideia de que o desenvolvimento eco As perdas ocasionadas nômico está diretamente relacionado pelas EEIs nos agroecossistemas com a questão das invasões biológipodem ser diretas, pela redução cas. O trabalho relaciona a produção na produção, ou indiretas, devido bruta de cada uma das províncias da aos custos de contenção e conChina com o número de espécies “Apesar de ser uma trole. Estima-se que, apenas nos invasoras e o que é gasto no seu medida de alto Estados Unidos, há um gasto anual controle. Os autores buscam comcusto, é possível para controle de plantas infestanprovar que os investimentos prevenerradicar uma praga tes exóticas de US$ 26 bilhões. tivos para minimizar o impacto das Para pragas agrícolas, esse valor é espécies invasoras exóticas devem se sua área de de US$ 14 bilhões. O volume total aumentar e acompanhar o desenvolocorrência ainda de investimentos de contenção de vimento econômico do país. é restrita. ” EEIs chega a US$ 136 bilhões por Mas, até que ponto é posano, naquele país. sível prever os problemas de inva É possível agir em cada são biológica? É verdade que cada uma das etapas do processo de invasão é um processo único. Eninvasão biológica, tentando minimitretanto, observa-se que existem zar os impactos econômicos e ecológicos das EEI. Até alguns padrões similares entre as invasões biológicas. a etapa de transporte das espécies exóticas é possível Esses padrões devem ser observados e podem ajudar adotar medidas de prevenção. Quando as populações a prevenir outras invasões. Podem também ajudar a da espécie exótica invasora ainda estão baixas, é pos- manejar as EEIs. Neste sentido, a biologia das invasível a erradicação. Apesar de ser uma medida de alto sões tenta ajudar a responder a algumas perguntas: o custo, é possível erradicar uma praga se sua área de quais são as espécies exóticas que podem, realmente, ocorrência ainda é restrita. Para tanto, monitoramento causar um impacto ecológico e econômico significaticonstante e detecção precoce é fundamental. Quando vo? Quando, onde e em quanto tempo essas espéa EEI já se encontra amplamente disseminada, a única cies exóticas se tornaram invasoras? Qual é o impacto ação possível é o controle, visando à manutenção das dessas invasões? A partir de informações históricas populações abaixo do nível de dano econômico. dos processos de invasão já é possível responder a Um gráfico feito pelo Departamento de algumas dessas questões. A pesquisa é fundamenAgricultura da Austrália mostra a relação benefício- tal para a compreensão dos processos de invasões custo das ações nos diferentes estágios do proces- biológicas, bem como para definição de medidas que so de invasão. O custo-benefício da prevenção é venham a minimizar seus impactos. 19


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PRAGAS QUARENTENÁRIAS PARA O BRASIL MARCELO LOPES DA SILVA Embrapa Recursos Genéticos

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maior desafio para uma boa defesa vegetal agricultura são: as adversidades do clima, a nutrição é a falta de informações. As informações inadequada do solo e as pragas. O problema com sobre pragas que ocorrem em outros países pragas pode ser de dois tipos: o primeiro é o previrepresentam uma pequena parte em relação ao nú- sível, ou seja, quando a praga já é bem conhecida; mero real de ocorrências. A definie o segundo é o imprevisível, que ção de áreas onde a praga ocorre acontece, muitas vezes, com a iné essencial para caracterizar uma trodução de uma nova praga. praga como quarentenária. O conceito de praga está “No Brasil, é evidente No Brasil, é evidente que relacionado com qualquer eso setor agropecuário tem um peso pécie, raça ou biótipo de planta, que o setor agropecuário fundamental na economia e, talanimal ou agente patogênico, notem um peso vez, entre os países emergentes, civas às plantas ou aos produtos fundamental na economia. vegetais. A definição transpassa o é o país que mais depende da Mesmo assim, talvez produção rural para sua econoconceito de espécie porque há a o Brasil não tenha uma mia. Mesmo assim, talvez o Brasil possibilidade de uma espécie ter não tenha uma defesa vegetal à parte de sua população identificadefesa vegetal à altura altura do que a agricultura repreda como praga e parte não. Isso do que a agricultura senta em temos de produção de estará diretamente relacionado representa em temos de riquezas. Há um cenário promiscom o efeito do dano causado por produção de riquezas.” sor porque o País vai ampliar ainparte da população da espécie. da mais o setor, mesmo já sendo De qualquer forma, a definição a maior fronteira agrícola do munde espécie de praga é uma das do. No entanto, no momento em grandes dificuldades, pois, muitas que a atividade agrícola é ampliada, há também um vezes, os problemas avançam mais rápido do que a aumento da vulnerabilidade. Por este motivo, o pro- capacidade da Ciência em defini-los. cesso deve ser acompanhado com bastante cuida- A quarentena vegetal, por definição, é toda do, pois, ao expandir as áreas agrícolas, igualmen- atividade destinada a prevenir a introdução e/ou diste crescerá a exposição a problemas biológicos. A seminação de pragas quarentenárias ou assegurar mesma preocupação deve ocorrer com o aumento seu controle oficial. Esse é um importante exercício do comércio internacional e com os grandes eventos frente ao enorme desafio que é entrar no cenário de que o país receberá nos próximos anos. bioglobalização, pois, o aumento do comércio mun Sendo assim, a grande questão em relação dial de produtos agrícolas está diretamente atrelado às pragas quarentenárias é saber quais são os ris- ao aumento de risco de introdução de pragas. Boa cos a serem enfrentados. Os grandes problemas da parte das pragas que começaram a ser introduzidas 21


a partir do final do século passado tem origem asiá- causa foi a introdução de um fungo. No entanto, a tica. São cerca de 60% ou 70% das pragas, devido, praga que desencadeou os atos de quarentena de principalmente, ao crescimento da economia da Chi- plantas foi uma espécie de pulgão chamado filoxera, na no cenário comércio mundial. introduzido na França e oriundo da América. A praga Para transportar plantas e produtos existem passou para as castas nobres de vinhos e começou normas que tentam minimizar a introdução, às vezes a destruir as videiras viníferas francesas. acidental, de pragas. Mas, de forma geral, os turistas Em 1878, a Alemanha proibiu a importação não têm noção do perigo de levar de mudas de videiras dos Estados plantas nativas de um país para Unidos e teve início o protecionismo, outro e esta é uma das razões baseado, nesse caso, em uma ação para a grande preocupação que justificada. Dois anos depois, os paíronda a movimentação de planses afetados fizeram a primeira Con“Os turistas não têm tas. Os prejuízos econômicos, sovenção Internacional da Filoxera em noção do perigo de levar ciais e ambientais já registrados Berna, na Suíça, embrião da atual durante a história recente, levam Comissão Internacional de Proteção plantas nativas de um a um quadro que justifica as ativiVegetal (IPPC), criada em 1951. Em país para outro e esta dades de quarentena. 1902, foi registrada a primeira inspeé uma das razões para a A primeira vez que a ção quarentenária nos Estados Unigrande preocupação que palavra ‘quarentena’ apareceu dos. No Brasil, a primeira legislação ronda a movimentação foi na cidade de Dubrovnik, na ampla sobre quarentena é de 1934 Croácia, que no Século XIII era (Decreto 24.114), válido até hoje. de plantas.” chamada de Ragusa. Ali, as pes A IPPC estabelece diversoas que chegavam por via masos critérios técnicos para definição rítima, durante o surto da peste desses problemas. É um acordo negra na Europa, ficavam 40 multilateral, com cerca de 160 padias presas e isoladas no interior íses signatários (entre os quais está dos navios. Esse processo recebeu o nome de “qua- Brasil), em que há o estabelecimento de padrões rantana” ou “quaranta giorni” - o procedimento de com o objetivo de prevenir a introdução e disperconfinar pessoas. são de pragas. O acordo deve promover o comércio Com a descoberta da América, houve tam- justo e seguro, evitando que os países criem barreibém um grande intercâmbio de espécies vegetais. ras frente aos problemas fitossanitários de vizinhos. Vale destacar que muitas das pragas existentes hoje Também assegura a proteção dos ecossistemas. no Brasil resultaram da situação em que a praga já Em 1995, os países membros da Comissão asexistia e a planta foi trazida ou, a planta já existia e sinaram o Acordo Sanitário e Fitossanitário, cuja sigla, em a praga chegou com outra espécie vegetal. Assim, inglês, é SPS. Os termos do Acordo atestam que todo a partir das grandes navegações, iniciou-se um pro- país tem o direito de exigir medidas consideradas necescesso de disseminação livre de pragas no mundo. sárias para proteger a saúde humana, animal ou vegetal, Esse processo resultou em uma tragédia: na Irlanda, de outro país. Por isso, o Acordo acabou chegando à por volta de 1840, a produção de batata foi dizima- Organização Mundial de Comércio (OMC) e teve, então, da e um milhão de pessoas morreram de fome. A início a relação do problema de pragas com o comércio 22


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internacional. O acordo SPS garante que as medidas fitossanitárias não devem constituir em restrições disfarçadas ao comércio e que sejam aplicadas somente quando necessário para obter a proteção, sempre com base em princípios científicos. O papel dos governos nacionais frente à proteção fitossanitária é levantar a sua lista de pragas quarentenárias, realizarem análises de risco para estabelecer quais pragas serão consideradas quarentenárias e ter uma legislação que minimize o risco de entradas dessas pragas. Segundo definição da FAO (Food and Agriculture Organization, United Nations), praga quarentenária é uma praga de importância econômica potencial para a área em perigo, onde ainda não está presente, ou, quando presente, não se encontre amplamente distribuída e está sob controle oficial. Ou seja, é preciso o reconhecimento do país sobre a importância da praga para que haja uma política de controle.

Os meios de introdução de pragas são: por produto importado; dispersão natural, um dos aspectos muito pouco estudados; por introdução intencional, que pode ser um ato de terrorismo; e associação com movimentação de pessoas, de modo involuntário. O risco da introdução é baseado na Análise de Risco de Pragas (ARP), um procedimento internacional padrão que define se uma praga é quarentenária ou não. Esse procedimento é uma avaliação biológica ou outra evidência científica e econômica para determinar se um organismo é uma praga, se ela deve ser regulamentada, e a intensidade de quaisquer medidas fitossanitárias a serem adotadas contra ela. Muito se fala em risco, perigo e dano, mas é preciso conhecer esses conceitos para avaliar os riscos com as pragas. De acordo com o European Safety and Health at Work, dano é prejuízo a vida humana (o conceito pode ser estendido à vida animal ou vegetal). Perigo é o agente que provoca o dano e

DISTRIBUIÇÃO DE STRIGA

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risco é a probabilidade de acontecer o dano provocado bactéria Candidatus liberibacter e que é transmitida pela exposição ao perigo. Por exemplo, o Brasil é um por um inseto (Diaphorina citri), constituindo-se em país com grandes fronteiras e uma agricultura pujante, uma ameaça a citricultura mundial. Recentemente, e, em algum lugar do mundo, há uma praga. Se essa foi constatada Helicoverpa armigera no Brasil. Esta praga se associa a uma planta que irá para dentro do é uma praga de alto impacto e que representa um território brasileiro, existirá uma exposição. A partir de perigo para a agricultura brasileira. A mosca da caentão, será realizada a análise de rambola (Bactrocera carambolae), risco para se decidir se a praga redetectada em 1996, é uma praga presenta ou não um perigo. Trata-se sob controle oficial que está restride um exercício científico baseado ta ao estado do Amapá, havendo “O problema, no em alguns critérios da ciência da alguns focos em outros Estados. caso do Brasil, é que Análise de Risco. O problema, no A mosca da carambola foi introcaso do Brasil, é que toda a legisduzida do Sudeste Asiático para toda a legislação lação e os fundamentos do sistema a América do Sul, em um procese os fundamentos de defesa são baseados apenas no so visivelmente associado com o do sistema de defesa são questionamento em relação à expotransporte de frutos. baseados apenas no sição a pragas do material vegetal A região Norte do Brasil é questionamento em importado. bastante vulnerável a pragas. Além Existem exemplos de inda mosca da carambola, também relação à exposição a troduções de pragas, muitas veforam introduzidas nesta região pragas do material zes, intencionais. Por exemplo, o pragas como a Sigatoka-negra, em vegetal importado.” capim-annoni, cujo nome científi1998; a mosca-negra do citrus, em co é Eragrostis plana, foi introduzi2001; o ácaro vermelho das palmeido nos anos 1950, junto com uma ras, em 2009; o ácaro-hindu, em forrageira africana. Esta planta foi 2010; e a cochonilha rosada, em multiplicada por um fazendeiro chamado Ernesto 2011. Entre as pragas de alto impacto para o Brasil, e Annoni, segundo registros históricos. O capim-an- ainda não introduzidas, estão também o ácaro do arroz noni ataca pastagens nos estados do Rio Grande do (Steneotarsonemus spinki) e a mosca das frutas do CariSul, Santa Catarina, Paraná e Minas Gerais. Outro be (Anastrepha suspensa). Ainda não se sabe qual o real exemplo é o fungo da vassoura da bruxa, Crinipellis impacto de entrar outra praga do mesmo gênero exótica perniciosa. Essa praga é um fungo do cacau que no sistema de produção. Existem pragas que, sabidadestrói a produção do fruto e há suspeita de sua mente, já estão em iminência de entrar em território naintrodução ter sido um agroterrorismo na Bahia. cional como o Impatiens Necrotic Spot Virus, que afeta A ferrugem asiática (Phakospora pachyrizi) mais de 600 culturas; o Plum pox virus, que é um dos da soja é a praga que causou o maior prejuízo à agri- maiores problemas fitossanitários para as plantações de cultura brasileira e ainda hoje é um grande proble- pêssego e já está na Argentina; a Moniliophtora roreri, ma para a produção de soja. Outros exemplos de que afeta o cacau e também já está muito próxima das pragas introduzidas no Brasil nos últimos anos são nossas fronteiras; o Tomato Ringspot Virus; o Xanthoo bicudo-do-algodoeiro; a cochonilha do carmim monas oryzae pv. Oryza, que provoca perdas elevadas (Dactylopius opuntiae); o greening, provocada pela na produção de arroz; entre outros. 24


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Emergências fitossanitárias

Bioterrorismo

Uma das grandes ameaças da triticultura mundial é a Puccinia tritici, linhagem Uganda 99. Surgiu da mutação da ferrugem, cujo problema parecia ter sido resolvido com a incorporação de um gene de resistência no trigo plantado no mundo. Essa linhagem mutante resistente marchou em duas direções: para o Sul da África e para a península da Arábia, e, possivelmente, espalhando-se do Iraque e Irã para o restante da Ásia e a Europa. Em 2006, a Embrapa Trigo verificou que variedades brasileiras são muito suscetíveis à ferrugem do trigo raça Ug99. Com o crescimento de sua fronteira agrícola, a África pode ser um grande indutor de novas pragas no comércio internacional. Uma doença vegetal detectada no Quênia, por exemplo, dizimou entre 50% e 80% do milho no país e é chamada de necrose letal do milho. Ela ocorreu junto com outra virose, mas por enquanto está confinada naquela região. Existem ainda duas brocas da soja, cuja distribuição mundial é muito ampla, que induz grandes preocupações para sojicultores no Brasil: a Melanagromyza sojae e a Ophimyia phaseoli.

Essa é uma grande preocupação dos Estados Unidos e da Europa. Na União Europeia existiu um programa chamado Crop Bioterror, que coloca alguns pontos muito interessantes que podem servir de base para uma política fitossanitária. Entre as medidas do programa estão: preparação de uma lista de patógenos que são de alto risco e uma lista de culturas que são mais vulneráveis a esses patógenos; padronização de protocolos de avaliação de risco e medidas de quarentena e de emergência fitossanitária; priorização de campos para investigação e identificação áreas de pesquisa e direcionamento de investimentos e aumentar o conhecimento público sobre as ameaças à agricultura (agroterrorismo). Ou seja, os perigos devem ser conhecidos e os riscos devem ser avaliados para que, então, as ações possam ser tomadas sem receios. Olavo Bilac escreveu em 1916: “a Defesa Nacional, como a queremos compreender, ainda não está organizada. Está claro que, se há intenção de organizá-la desde já não é porque vejamos sobre o nosso País perigos imediatos. Mas a boa defesa deve ser preventiva”.

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REGISTRO EMERGENCIAL DE AGROTÓXICOS LUÍS EDUARDO PACIFICI RANGEL Ministério da Agricultura, Pecuária e do Abastecimento – MAPA

É

fundamental a participação do Estado Brasileiro vos considerados nocivos. É importante ressaltar que em discussões como as ameaças fitossanitárias. o único país do mundo que criou um neologismo esO Governo estimula parcerias com a academia e pecífico para defensivo agrícola é o Brasil. Não existe a iniciativa privada porque tem consciência de que o nenhum outro país que criou um neologismo equivaMinistério da Agricultura, por exemplo, não detém to- lente a “agrotóxico” para referir-se a essas substândas as competências para gerir um cias. No entanto, apesar de hoje tema tão complexo como a defesa parecer pejorativo, a intenção do da produção agropecuária. Intimalegislador foi a melhor possível e mente ligado a esse processo está seguiu o conceito de comunicação o registro de agrotóxicos, seja em do risco, ou seja, a ideia era atribuir “Só uma política casos emergenciais ou não. E, apea essa substância um nome que sar das críticas e cobranças em relevasse a preocupação sobre o seu fitossanitária bem lação ao modelo de registro desses possível perigo. clara poderá produtos no país, o que realmente Segundo a Lei, os agrotóproporcionar as percebe-se necessário é a criação xicos só poderão ser produzidos, mudanças necessárias de uma nova política fitossanitária exportados, importados, comerciapara atingir os brasileira. lizados e utilizados se previamente Para isso, é essencial a registrados em órgão federal. Vale objetivos.” participação da sociedade organidestacar que não foi a Lei que criou zada na discussão e encaminhao ato complexo de passar essa mento de propostas neste sentido, avaliação por três Ministérios – saúpois o Governo reage a essa dede, agricultura e meio ambiente, ela manda. Só uma política fitossanitácita, apenas, que tem que seguir as ria bem clara poderá proporcionar diretrizes dos três ministérios, mas as mudanças necessárias para atingir os objetivos. Já que o registro deve ser feito por um órgão federal. O que existem estruturas fantásticas no Brasil, como a Em- determinou essa atual dinâmica foram os decretos rebrapa, que hoje é talvez a empresa de maior respeita- gulamentadores, como o atual Decreto 4.074, de 2002, bilidade na área da pesquisa agropecuária do mundo quando o registro de agrotóxicos no Brasil passou a ter e, certamente, a mais importante do Hemisfério Sul. a obrigatoriedade de passar pelos três crivos, compli A definição legal de agrotóxico, de acordo cando bastante o que conceitualmente, para o legislacom a Lei 7.802, de 1989, é o produto e o agente dor, deveria ser um processo simples. de processos físicos, químicos ou biológicos (...), cuja Todo processo normativo é definido com finalidade seja alterar a composição da flora ou da fau- base em conceitos, requisitos e critérios. Até a décana, a fim de preservá-las da ação danosa de seres vi- da de 2000, ainda sob égide do Decreto anterior, era 27


comum que alguns entes privados, por conveniência, usassem o termo emergência para pular as etapas de um registro convencional e, assim, acelerar a entrada de determinada tecnologia no mercado. O oportunismo em algumas empresas não diminui um problema de origem desse processo: a lentidão e ineficiência do sistema de registro. O Governo admite as falhas de gestão neste processo e as empresas, para defender seus interesses e estratégias, procuram as brechas, como os casos de emergência, para tentar colocar seus produtos de maneira mais rápida no mercado. Apesar de não parecer muito ético, esse comportamento não era, de fato, ilegal. Por isso, a fim de disciplinar esse processo, o Governo publicou uma Normativa Conjunta. Hoje, em 2013, o Governo reconhece que cometeu um erro ao regular o tema de maneira geral e não deixar brechas para as exceções. Obviamente, a intenção foi positiva ao tentar dar controle e segurança para todos os modelos. Mas, nem sempre consegue-se ajustar as normas a todos os cenários. É preciso espaço para manobras.

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Registros emergenciais A Instrução Normativa de uso emergencial traz diversas definições do que é praga e define também o que é emergência quarentenária e emergência fitossanitária. A primeira é a situação que envolva a detecção ou interceptação de pragas de quarentena no território brasileiro ou em produtos agrícolas provenientes de importação, para cujo controle, nas condições envolvidas, não exista agrotóxico ou afim registrado ou os existentes revelem-se comprovadamente ineficazes. Já a emergência fitossanitária é a situação eventual que envolva a ocorrência de infestação, em nível de dano econômico, de organismos vivos considerados nocivos à produção agrícola, em florestas plantadas, em pastagens ou em produtos agrícolas armazenados para cujo controle, nas condições envolvidas, não exista agrotóxico registrado ou os existentes revelem-se comprovadamente ineficazes. Essas definições foram elaboradas em 2008 em uma tentativa de resgatar alguns conceitos para a própria


AMEAÇAS FITOSSANITÁRIAS: NOVAS PRAGAS COLOCAM EM RISCO ALIMENTOS NOAS BRASIL AME AÇ AS AF IPRODUÇÃO T O SS AN I TÁRDE I AS: N O VAS PR AG COLOCAM E M R I SC O A PRO D U Ç ÃO D E AL I ME N T O S N O BRA S IL

fitossanidade no Brasil. E, apesar de ter sido uma Lei mui- emergencial de que trata o art. 4º se referir a ingrediento alinhada com o entendimento internacional, o Decreto- te ativo ainda não registrado no Brasil, o CTA somente Lei 24.114, de 1934, não corresponde mais à realidade procederá à análise do pleito se o produto formulado do século XXI. Por exemplo, para o caso da Helicover- a base do ingrediente ativo em questão se enquadrar pa armigera, seria necessário interditar e destruir 800 mil como produto de baixa toxicidade e periculosidade, hectares de plantações de algodão, além de indenizar conforme norma específica. Nesse ponto, pode ter todos os agricultores locais. Ou seja, a aplicação desse havido um equívoco conceitual da norma, pois de uma maneira politicamente correta, tentou-se agregar Decreto é completamente impraticável nos dias atuais. segurança as autorizações emer Neste sentido, há uma pergenciais, mas que não funcionou, gunta a ser feita: por que no Brasil, porque se a praga se desenvolve com tantas qualidades na área de em um ciclo mais acelerado, não pesquisa e inovação, com tantos “A Sociedade Brasileira há controle biológico, ou produprofissionais brilhantes, com tanta de Defesa Agropecuária to de menor toxicidade, que seja pujança da agricultura, ainda está tem a obrigação de efetivo. Voltando ao exemplo mais ancorado em uma legislação de pressionar a administração recente, o caso da Helicoverpa 1934? A Sociedade Brasileira de armigera, a Embrapa demonstrou pública, como sociedade Defesa Agropecuária tem a obrigação de pressionar a administração civil organizada, para que que os produtos biológicos são fundamentais para o controle da pública, como sociedade civil orgahaja uma revisão nesse lagarta; no entanto, para a redução nizada, para que haja uma revisão processo e no marco da população que chegou a níveis nesse processo e no marco legal. legal.” dramáticos não dá para não recor Entre os critérios para rer às mais modernas tecnologias estabelecer-se uma situação de químicas. Portanto, apesar de poemergência, está a solicitação de liticamente correto, este artigo não uso emergencial de agrotóxicos e ajudou em absolutamente nada afins por órgãos governamentais quando tivemos, de verdade, um dos setores da agricultura, da saúde ou do meio ambiente, instituições de pesquisa ou problema fitossanitário grave no País. Há também o critério de rotina ou critério orde extensão rural, associações ou cooperativas de produtores rurais e entidades legalmente constituídas dinário. Quando mais de um ingrediente ativo for indipara a defesa dos interesses difusos relacionados à cado para uso emergencial, para a mesma finalidade, proteção do meio ambiente e dos recursos naturais somente um terá o uso concedido, sendo utilizados renováveis. Essa foi uma tentativa de evitar que em- como critérios de escolha: a eficiência, a classificação presas privadas pudessem fazer a defesa de seus toxicológica e do potencial de periculosidade ambiental, próprios produtos, em interesse próprio e específi- a avaliação de risco para a ingestão humana e o núco, ou seja, somente a sociedade civil organizada e a mero de empresas detentoras do registro dos produtos academia, rigorosamente embasadas na questão da formulados. Esse é outro critério politicamente correto emergência, podem solicitar controles emergenciais. para o processo, mas pouco eficaz diante da realidade de pragas mais agressivas e incomuns, que necessitam Foi um acerto e tem funcionado muito bem. Outro critério é quando a solicitação de uso de um Manejo Integrado com pelo menos 5 produtos. 29


O caso Helicoverpa

de organismos internacionais pertinentes, ou de da Ao receber a solicitação para uso emergen- dos bibliográficos técnico-científicos de fontes refecial de produtos para o combate à Helicoverpa ar- renciadas, além de conter proposta de Limite Máximigera, o Ministério da Agricultura avaliou diversos mo de Resíduo (LMR) acompanhada de bibliografia. produtos, incluindo um não registrado no Brasil, e Se um problema, de fato, representar uma grande aprovou cinco alternativas - três produtos químicos ameaça nacional como foi a Helicoverpa, um cone dois biológicos - para compor o manejo integra- junto de pesquisadores deverá cuidar, rapidamendo emergencial da praga. Isso não foi suficiente. Era te, de produzir documentos baseados em estudos preciso uma estratégia de contingência usando um científicos que sustentem, ao Ministério da Agriculproduto não registrado no País, o tura, os benefícios do uso de um que, infelizmente, não se enquadeterminado produto. drava no quesito “baixa toxicidade O Comitê Técnico de Ase periculosidade” que prevê a INC. sessoramento para Agrotóxicos Essa questão transcende a segu(CTA) foi criado em 2002 com “É importante deixar rança alimentar, meio ambiente o objetivo de atuar como órgão claro que a Lei dos ou saúde pública; tornou-se uma colegiado de assessoramento questão de segurança nacional. independente, que auxiliasse o Agrotóxicos foi criada A Coordenação-Geral de AgrotóGoverno Federal nos assuntos lipara regular as relações xicos do Ministério da Agricultura gados a registro de agrotóxicos. de mercado, as relações chegou a sugerir ao Ministro que No entanto, hoje o CTA é formado entre indústrias, convocasse o exército para auxipor membros do próprio setor de agricultores e engenheiros agrotóxicos do Ministério e dos liar no combate a essa lagarta a fim de proteger o agronegócio do órgãos de saúde e meio ambiente, agrônomos.” sudeste da Bahia, que tem deseno que desvirtuou completamente volvido a região de maneira nunca sua função originária. Até a puantes vista no País. blicação da Instrução Normativa Além dos critérios citaConjunta 02, de 2008, que regudos anteriormente, há também lamentou a ideia de uso emergenque se atender aos requisitos da norma de uso cial, a matéria seguia as determinações que consemergencial. A primeira é a justificativa técnica de tam no art. 95, Inciso 6 do Decreto 4.074/04, onde impacto sócio-econômico, ambiental ou na saúde confere ao CTA a responsabilidade de assessorar humana oriundo da ocorrência de organismos vivos os Ministérios na concessão do registro emergenconsiderados nocivos. Depois, é preciso um pare- cial de agrotóxicos e afins e no estabelecimento de cer, assinado por profissional legalmente habilitado, diretrizes e medidas que possam reduzir os efeitos acompanhado de teste comprobatório da eficiência danosos desses produtos sobre a saúde humana e e praticabilidade do agrotóxico, componente ou o meio ambiente. É importante deixar claro que a Lei afim, realizado em conformidade com o disposto no dos Agrotóxicos foi criada para regular as relações Art. 23, do Decreto nº 4.074/02, ou de recomenda- de mercado, as relações entre indústrias, agriculções para controle do organismo nocivo emanadas tores e engenheiros agrônomos. Em nenhum mo30


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mento, o Estado brasileiro, principalmente envolvido cional e o país não estava preparado. Levou-se em matérias de segurança nacional, deve ser en- cinco meses para tomar uma decisão por falta de quadrado como stakeholder nessa Lei. As questões preparo. Diferente de outros ataques no passado, de segurança nacional não devem estar ligadas aos em que o processo foi ágil e o combate eficiente, ditames de mercado. o caso da Helicoverpa foi totalmente atípico: mes Neste sentido, a questão da Helicoverpa foi mo com a autorização de produtos já em uso no decidida com base na pregorrativa do Governo bra- Brasil, o problema não foi resolvido, e foi preciso sileiro em preservar a agricultura nacional, por meio criar alternativas. O Ministério da Agricultura tem o da liberação emergencial de um produto que não dever de defender a produção agropecuária braserá registrado no Brasil, porque sileira e, em casos extremos, as não há interesse em registrá-lo, já medidas são tomadas com base que trata-se de um produto mais nesse princípio. tóxico do que outros já registra Mas, o que realmente dos. Essa decisão fere o princípio precisa ser amplamente discuti“O Ministério da e o espírito da legislação (infraledo no Brasil, não é a questão de Agricultura tem o gal), especialmente a INC. No enregistro de defensivos agrícolas, dever de defender a tanto, o Governo não pode deixar não é a questão da Helicoverpa produção agropecuária que as lavouras de soja e algodão ou de uma praga quarentenária, do País acabem por conta de mas uma política fitossanitária brasileira e, em casos uma praga. É dever do Estado dar nacional. É preciso definir seus extremos, as medidas alternativas e, as alternativas que modelos, estruturas e a visão de são tomadas com foram dadas, foram as possíveis futuro. Só assim a sociedade orbase nesse princípio. ” diante do cenário e da lógica do ganizada conseguirá pressionar processo. o Ministério da Agricultura para O Ministério Público parcapacitar suas equipes e utilizar ticipou dessa discussão e enteno conhecimento que o Estado já deu perfeitamente o problema detém, por meio das Universidacrítico que a agricultura estava des e os Institutos de Pesquisa. vivendo. Diferente do que estava sendo colocado, O MAPA também precisa reconhecer que também o MP não foi contrário à decisão do Governo em li- existem competências fora dos muros do Ministério, berar o uso emergencial do benzoato, pois compre- na iniciativa privada e na Academia, muitas vezes endeu que foi o modelo possível e necessário diante maiores do que em seu interior, e que não é possível da pior praga que já atacou os campos brasileiros. trabalhar sozinho. É preciso estabelecer uma parceSe existe um motivo para fiscais federais e estaduais ria entre todos as vértices da cadeia para construir existirem é proteger a agricultura de pragas como uma política fitossanitária de maior envergadura e essa. Infelizmente, a lagarta entrou em território na- proficiência no Brasil.

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MOSCA-DE-CARAMBOLA E GREENING: ANÁLISE DE BENEFÍCIO-CUSTO DOS PROGRAMAS DE ERRADICAÇÃO SILVIA HELENA GALVÃO DE MIRANDA Departamento de Economia, Administração e Sociologia - ESALQ/USP

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análise de impacto regulatório é um instrumen- Fitossanitárias e Sanitárias. É exatamente no âmbito to que os governos, principalmente dos países desse Comitê que o País é obrigado a notificar tudo mais ricos, vem usando para melhorar a quali- o que, eventualmente, vá causar um impacto comerdade regulatória. Ou seja, melhorar a participação do cial. Nesse sentido, é muito importante desenvolver e setor privado nas decisões, em temos de políticas e aprimorar as análises econômicas para que, ao notifiprogramas; melhorar a transparêncar medidas de natureza sanitária, cia para que toda a sociedade enexistam argumentos técnicos, ecotenda como as decisões são tomanômicos, sociais e ambientais que “Na área de defesa das; e, basicamente, subsidiar os justificam essas medidas. agropecuária, as análises governos em todas as instâncias Do ponto de vista de anácom dados e informações que melise dos programas de defesa de risco de pragas são lhorem, tecnicamente, a qualidade agropecuária, há uma grande prefeitas com base em de suas decisões. Isso vem sendo ocupação com o comércio internacompromissos usado e desenvolvido pelos paícional, mas há, também, preocuinternacionais de ses da OCDE. No Brasil, mais repação com a questão de decisões associa-las a estudos não centemente, a Casa Civil lançou o em relação ao orçamento do goprograma chamado PRO-REG, um só dos aspectos técnicos e verno, pois existem inúmeras praprograma que também visa a avagas, já estabelecidas ou em vias de biológicos, mas, também, liação de impactos de políticas. Inientrar nos países, e os governos econômicos, sociais e ciativas de implementar a avaliação têm de lidar com suas restrições ambientais.” de impacto regulatório já vinham orçamentárias ao tomar decisão sendo adotadas também pela Ansobre como tratar essas ameaças. visa e pelo Inmetro. Análises de impacto podem ajudar Na área de defesa agropea definição da política de um Gocuária, as análises de risco de pragas são feitas com verno de prevenir a entrada dessas pragas, ou investir base em compromissos internacionais de associa-las recursos no combate a uma outra já presente. a estudos não só dos aspectos técnicos e biológicos, Os estudos sobre os impactos econômicos mas, também, econômicos, sociais e ambientais. também são importantes para sensibilizar a comuniAdicionalmente, existe ainda uma preocupação de dade. No caso do Greening, por exemplo, as regiões analisar os impactos potenciais das políticas sanitá- produtoras já estão sensibilizadas pelos impactos que rias do País no mercado internacional, que devem ser vivenciam, seja por conta dos produtores que migracomunicada à Organização Multilateral de Comércio. ram de atividade ou pela movimentação da indústria Ainda hoje mais cedo, um dos colegas que me ante- em busca de oportunidades para estabelecer-se em cedeu comentou aqui sobre o Acordo sobre Medidas outros estados. Por isso, a informação sobre os po33


tenciais impactos é importante também para criar a sensibilidade necessária para que a sociedade privada e os agentes públicos reajam a tempo e, de preferência, de forma preventiva. Portanto, é possível aplicar esses modelos tanto para aquelas pragas que já estão causando danos e analisar, eventualmente, a sua disseminação pelo território; quanto para fazer o que é conhecido como análise “ex-ante”, ou seja, uma avaliação dos eventuais impactos que a praga causaria se entrasse no País. Recentemente, o Brasil tem sido surpreendido pela entrada de algumas pragas não esperadas, mas também de outras cuja entrada fora prevista anteriormente. Desde o final do Século XIX, estima-se que 24 espécies de pragas foram introduzidas no País e causaram prejuízos econômicos significativos. Entre

elas, destacam-se a Huanglongbing, em citros (2004); a Raoiella indica, em palmeiras (2009); e a Helicoverpa armigera, em milho, soja e algodão (2012).

Tipos de impactos Existem alguns impactos que a literatura tem mais facilidade de expor, assim como os economistas, fitopatologistas e entomologistas têm mais facilidade para identificar e medir. Esse, claramente, é o caso dos impactos sobre a produtividade. No entanto, os impactos econômicos vão muito além da redução da produção, ou plantel. Os impactos podem gerar choque sobre os custos de produção, também bastante relevante para o segmento produtivo; redução nas exportações ou proibição de comércio; e choques sobre preços domésticos ou internacionais.

Projeção de produção de citros nos cenários A (sem programa de defesa fitossanitária oficial para o HLB) e B (com programa) - Estado de São Paulo (em caixas de laranjas 40.8 kg) Projeção 2009-2028

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Também são observados impactos sociais, Índia e o próprio Brasil, e estimou que os prejuízos como, por exemplo, a concentração industrial. É o anuais com as pragas introduzidas chegam a US$ 250 que está acontecendo, hoje, no Estado de São Pau- bilhões nesses países. lo: os pequenos e médios citricultores migraram para Outro estudo feito no Brasil, por pesquisadoa produção de cana-de-açúcar e outras atividades, res da Esalq, em 2000, quantificou que a perda de proem decorrência da grande dificuldade de enfrentar dução no Brasil por ataque de insetos está estimada a doença do Greening. Essa migração resulta ainda em 7,1% em média (de 2 a 30% dependendo da cultuem outros impactos sobre os mercados de emprego, ra), representando cerca de US$ 2,2 bilhões ao ano. como a realocação de mão de obra e desarticulação De acordo com um terceiro trabalho, datado de das estruturas produtivas regionais, ou seja, gerando 2012, baseado também em percentual de perdas cauum modelo de desenvolvimento diferente dentro das sadas pelas pragas nas principais culturas, os insetos regiões afetadas. considerados pragas causam per Em termos de impactos das anuais de US$ 12 bilhões para ambientais podem ser observados a a economia brasileira, sendo US$ 1,6 necessidade de intensificação no uso bilhão devido a pragas exóticas. de agrotóxicos, os impactos sobre a Em termos de método de “Todos são impactos biodiversidade e a contaminação de quantificação, a análise custo-benedifíceis de mensurar, água e solo. Ainda usando como o fício, aparentemente, é um método exemplo o Greening, os produtores simples, muito usado na área de admas que precisam chegaram a recorrer a cerca de 30 ministração para avaliação de projeser levados em pulverizações de inseticidas em suas tos e, também, na área pública. Ao consideração no lavouras, gerando, indiscutivelmente, ser aplicada na área sanitária, esse momento da tomada grandes impactos ambientais. método apresenta algumas peculiaride decisão.“ Por fim, existem também dades, porque é preciso conhecer a os impactos institucionais que são praga, saber o modelo e velocidade a redução de arrecadação tributáde sua disseminação, a interferência ria e as alterações em orçamento do clima, se a idade das plantas fará ou necessidade de recursos emerdiferença nos prejuízos em termos genciais. Esse item trata da estrude produtividade, entre outros detatura necessária do serviço público lhes. São diversos componentes que para reagir às situações de crise. Todos são impactos entram em análise nesse modelo que tem sido bastante difíceis de mensurar, mas que precisam ser levados utilizado. Existem modelos econômicos mais sofisticaem consideração no momento da tomada de decisão. dos, mas com maior dificuldade de implementação. Por este motivo, considerando as limitações orçamentárias e Quantificação dos impactos operacionais das administrações públicas, a OCDE tam A FAO e a OMC têm se preocupado bastante bém dá preferência para recomendar o uso de análises com as questões da área sanitária. No Brasil, o Minis- de benefício-custo. tério do Meio Ambiente realizou um trabalho, em 2008, Para trabalhar com análise beneficio-custo baseado em um estudo internacional que envolveu os é preciso, primeiro, estabelecer cenários como, por Estados Unidos, Reino Unido, Austrália, África do sul, exemplo, se há ou não uma política de defesa fitos35


sanitária. Depois, há que se identificar os impactos para cada cenário e, em seguida, levantar o custo das políticas que estão em análise. Além disso, eventualmente, como no caso do Greening, também é necessário avaliar o custo para o setor privado. Após identificar os custos e os benefícios do controle da praga, é preciso valorar todos estes itens, usando técnicas da área de economia para identificar o real valor dos impactos e projeta-los para um horizonte temporal relevante. A etapa final é comparar o Valor Presente Líquido (VPL) de cada cenário para, por fim, tomar a decisão fitossanitária.

e a Fundecitrus a fim de manter o Greening sobre controle na região. Realizou-se uma análise considerando um cenário com e sem essa política, o que afetaria diretamente a taxa de disseminação da doença no Estado. Chegou-se, então, à conclusão que, para cada R$ 1 investido, o Governo Federal e o Fundecitrus teriam um retorno de R$ 57. Isso, apenas para evitar que o Greening continuasse se alastrando pelo estado de São Paulo. Ao somar o custo que os produtores têm para controlar a doença e que teriam ao longo de 20 anos de combate à mesma, o benefício cai para R$ “Após identificar os custos Greening e 4,06 para cada R$ 1 investido por mosca-de-carambola e os benefícios do controle governo, Fundecitrus e citricultor, Para ilustrar um estudo da praga, é preciso valorar indicando, claramente, o impacto sobre os impactos de uma prada praga no custo ao produtor. todos estes itens, usando ga, pode-se usar o exemplo da Existem outros estudos em técnicas da área de mosca-de-carambola que estimou desenvolvimento visando forneeconomia para identificar cer informações que subsidiem as os prejuízos da praga em três culturas, projetados a um período de o real valor dos impactos e ações frente aos prejuídos causadez anos. Ao final, verificou-se que dos por pragas em outras culturas projeta-los para um se os produtores estiverem cone regiões do País. Desde 2011, por horizonte temporal trolando para outras moscas de exemplo, está em andamento um relevante.” frutas, a relação benefício-custo trabalho sobre o Cancro Cítrico, em de evitar que a praga saia do esparceria com o Fundecitrus, para tado do Amapá e chegue às áreas avaliar as alternativas dos produtode exportação de frutos é de 35,7. res de São Paulo quanto ao controle Isso significa que para cada R$ 1 que o Governo Fe- ou erradicação do cancro em termos de custos de proderal investe no programa de controle de erradicação dução e de produtividade. Há também a possibilidade da mosca-de-carambola, o retorno, dentro do cenário de estudar os impactos econômicos da disseminação estudado, seria de R$ 35,7. Se for considerado que o da Raoiella indica, em uma parceria com a Embrapa. produtor da região não faz controle para outras mos- Outras ações em desenvolvimento são a aplicação da cas, o retorno para a política do Governo seria de R$ Análise de Monte Carlo para estudo do Greening e, em 92 para cada R$ 1 investido. uma parceria entre a Esalq e a Universidade de Cope No caso do Greening, são diversos estudos nhagen, a análise benefício-custo para controle biológie cenários. O mais simples deles é de 2009, quan- co do Greening e morango (Tetranychus urticae) para do estava em vigor um convênio entre o Ministério auxiliar a tomada de decisão de produtores, por meio da Agricultura, o Governo do Estado de São Paulo da comparação de sistemas de produção. 36


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CYDIA POMONELLA: QUAL SERIA O CENÁRIO DA FRUTICULTURA TEMPERADA NO BRASIL NA AUSÊNCIA DE ERRADICAÇÃO? JAIR VIRGÍNIO Moscamed Brasil

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produção de frutíferas de clima temperado Entre as ações de erradicação, a Moscaestá bem distribuída pelo Brasil. Já o foco da med fez parte de uma articulação feita entre o MiCydia pomonella está em uma região grande nistério da Agricultura, a Associação Brasileira dos produtora de maçã: os estados Produtores de Maçã (ABPM) e de Santa Catarina e Rio Grande a Agapomi, que representa os do Sul. Entre 1999 e 2009, a poprodutores gaúchos. A ação da micultura cresceu 30%. A área Moscamed nesse processo foi, “O Brasil não tinha de produção e a avaliação dos justamente, o monitoramento da nenhuma tradição na impactos neste setor, do ponto praga, também conhecida como exportação de maçã, ao de vista da exportação, também lagarta da maçã, mas que ataca contrário, era um país cresceram nos últimos anos. outros hospedeiros, exclusiva O Brasil não tinha neimportador. No entanto, a mente em área urbana nos muninhuma tradição na exportação de cípios de Caxias do Sul, Vacaria participação nacional no maçã, ao contrário, era um país e Bom Jesus, no Rio Grande do comércio mundial desses importador. No entanto, a parSul, e Lages, em Santa Catarina. frutos aumentou mais de ticipação nacional no comércio Foi muito importante dar transpa1300%, instigando muita mundial desses frutos aumentou rência à estratégia e segurança mais de 1300%, instigando muita em relação ao monitoramento, torcida pelo insucesso torcida pelo insucesso brasileiro para a manutenção do status de brasileiro”. nesse sentido, pois o país passou área livre da Cydia para os pomaa ocupar um espaço antes ocures comerciais brasileiros frente pado por outros países produtoao comércio internacional. res. Diante dessa relevância, muitas foram as ações O sistema da Moscamed é capaz de realizar de combate à Cydia pomonella. o acompanhamento de diversas culturas, com a ex Em 2007, a Instrução Normativa 48 estabe- pedição de relatórios em conformidade com a legisleceu o Programa Nacional de Erradicação da Cydia lação nacional. Para cada espécie, cada praga, existe pomonella, seus critérios e linhas principais, visando a possibilidade de fazer um acompanhamento do que a proteção fitossanitária do cultivo de pomácea e a se passa, de forma online, com um delay entre o dado erradicação da praga nas zonas urbanas. Felizmen- coletado e a sua disponibilização de, no máximo, seis te, o Brasil é livre dessa praga nos pomares comer- dias. Assim, o produtor tem uma resposta muito ágil ciais, tendo sido detectada apenas em áreas urba- e precisa permitindo que, por exemplo, ao identificar nas. Isso deu ao País um status sanitário de área um comprometimento da sua produção em função da livre de Cydia pomonella para efeito de exportação infestação, ou do aumento dela em sua área, possa de frutas. tomar as medidas urgentes necessárias para a redu37


ção daquele índice e adquirir a autorização para continuar com o seu programa de exportação. O sistema também deu a possibilidade de fazer uma avaliação sobre a distribuição das armadilhas e do processo de captura, para que se tenha certeza de que houve cobertura total da área monitorada. Indiscutivelmente, o município de Caxias do Sul foi um dos mais críticos nesse controle devido à sua dimensão, geografia e importância econômica. O programa foi finalizado e os dados gerados já foram publicados, havendo, inclusive, um evento realizado pela Embrapa e a ABPM, comemorando o primeiro ano de captura zero em todos os municípios. Esse resultado demonstra o quão eficiente foram as medi-

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das implantadas, que contaram com uma participação fundamental dos produtores: monitoramento e erradicação da praga e dos hospedeiros. Erradicar os hospedeiros dessa praga foi um dos passos mais difíceis de todo o processo. As árvores que hospedam a Cydia pomonella despertavam um valor sentimental aos seus proprietários e isso dificultava imensamente convencê-los de que era preciso derrubá-las. Por isso, o MAPA e os produtores acionaram o Ministério Público para auxiliar nesse trabalho de convencimento e de educação sanitária. Em contrapartida, quando havia a autorização dos donos das plantas hospedeiras para removê-las, a equipe agradecia, gentilmente, distribuindo mudas de espécies não hospedeiras da lagarta da maçã.


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Para se ter ideia do avanço do programa, no Nesse país vizinho, há forte necessidade de manter um primeiro ano foram capturadas 50 e erradicadas mais sistema permanente de mitigação de risco e controle de 300 hospedeiras em áreas urbanas. O ciclo seguin- químico em mais de 83% dos pomares. Além disso, foi te já foi muito menos doloroso e, na safra 2012/2013, publicado um documento, assinado pelas autoridades não houve sequer a necessidade de realizar a distribui- argentinas, relatando as dificuldades que os produtores ção das mudas, porque já não foram mais identificados de maçã estão enfrentando para cumprir com as formahospedeiros. lidades exigidas para exportar os frutos para o Brasil. Uma grande preocupaEsse estado sanitário na Argentina ção, inclusive por parte do Minisimpõe muitas travas ao comércio e tério da Agricultura, é a continuaprodução, e aumenta consideravelção do monitoramento da Cydia mente os custos. Para se ter ideia, em pomonella. A própria Instrução 2002, o Brasil suspendeu a importaNormativa 48, em seu anexo seção da Argentina durante 45 dias, e “Em 2002, o Brasil gundo, indica que, para que se o prejuízo resultante desse embargo suspendeu a importação tenha um reconhecimento do parcial foi de US$ 6 milhões. Se, por de maçã da Argentina êxito da erradicação da lagarta, ventura, o embargo continuasse, as durante 45 dias, é necessária a comprovação de perdas para a Argentina seriam de e o prejuízo captura zero por dois anos conmais de US$ 34 milhões. secutivos. Portanto, para a safra Nesse cenário, o futuro da resultante desse 2013/2014, será fundamental pomicultura no Brasil sem o Proembargo parcial foi para o Brasil e para os produtograma Nacional de Erradicação da de US$ 6 milhões.” res obter o status de área livre do Cydia pomonella seria trágico. Logo País, manter o monitoramento. de início, haveria a suspensão das exportações brasileiras e os produtoSegurança nacional res perderiam US$ 80 milhões. Em Apesar de a OMC garanseguida, redirecionariam suas mertir que não aceita barreiras comerciais disfarçadas, a cadorias para o mercado interno, gerando o aumento da tendência é de que isso ainda venha a se estabelecer oferta e a queda de preço. Para equilibrar o mercado, porque todo mundo vai usar essa brecha como instru- provavelmente, cairia a barreira sanitária para maçã armento na competição mundial de exportação de ali- gentina, aumentando ainda mais a oferta e diminuindo, mentos. Na pomicultura, por exemplo, o que está em ainda mais, os preços. Com isso, indiscutivelmente, o jogo são mais de 150 mil empregos gerados a baixos setor perderia um imenso volume de sua receita. custos; uma produção estimada em mais de um mi- Ou seja, se a vigilância passar um único dia, um lhão de toneladas; uma área colhida de 38 mil hecta- momento, sem manter a atenção, o Brasil vai sofrer preres; e exportações que já ultrapassam US$ 80 milhões juízos. Recentemente, tomou-se a decisão de tirar os fispor ano. cais da inspeção pré-embarque feita na Argentina. Esse Para que se tenha ideia da pressão que o é um grande risco que deve ser reavaliado para dar ainda Brasil sofre com a questão da Cydia pomonella, basta mais segurança ao serviço de defesa agropecuária brarefletir sobre o que significa para a Argentina que os sileira. E fica a seguinte pergunta: qual seria o futuro da pomares comerciais brasileiros estejam livres da lagarta. pomicultura se o Brasil tivesse a Cydia pomonella? 39


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FERRUGEM ASIÁTICA DA SOJA IMPACTO DA ENTRADA DA PRAGA NO BRASIL RAFAEL MOREIRA SOARES Embrapa Soja

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Na safra de 2002/2003, o avanço da doença Phakopsora pachyrhizi, conhecida como ferrufoi impressionante e as perdas subiram para 3,4 milhões gem asiática, foi detectada pela primeira vez no de toneladas de grãos somando prejuízos de mais de Japão, em 1902, e avançou pela Ásia e África US$ 737,4 milhões. Além disso, o até chegar à América do Sul, em custo-ferrugem alcançou US$ 1,6 2001, pelo Brasil e Paraguai, pasbilhão, considerando investimentos sando para Argentina e Colômbia, no controle químico na ordem de em 2004, quando também atingiu US$ 426,6 milhões. Na safra seguinas lavouras dos Estados Unidos. te, esse custo total estimado subiu Neste último, os efeitos da praga para US$ 2,08 bilhões. Atualmente, são estudados desde a década de “Atualmente, a única a única região produtora de soja que 1970, demonstrando a grande preregião produtora de não apresenta ferrugem asiática é o ocupação do governo norte-amesoja que não apresenta estado de Roraima, porque está no ricano em defender sua produção Hemisfério Norte e, por isso, a planferrugem asiática é o agropecuária. Mas, os efeitos da tação ocorre em outra época. Nos ferrugem nos Estados Unidos não estado de Roraima.” anos de 2004 e 2005, alguns estasão tão fortes como no Brasil, já dos do Brasil sofreram uma grande que, durante o inverno, os estados seca e isso contribuição para dimimaiores produtores de milho e soja nuição dos prejuízos com a praga, ficam debaixo de neve, formando que voltou a causar grandes estrauma barreira sanitária natural congos em 2006, com perda de mais tra o fungo, que necessita da plande 2,9 milhões de toneladas do ta viva para sobreviver. No Brasil, a primeira detecção ocorreu na safra grão e custo de US$ 2,124 bilhões. Uma medida legislativa implantou a obrigatode 2000/2001, quando também houve identificação da praga no Paraguai. Nesse primeiro momento, a ferrugem riedade do vazio sanitário nos estados do Mato Grosso não chegou a causar prejuízos, pois entrou no final do e Goiás, em 2007, gerando resultados importantes para ciclo da plantação. No entanto, na safra seguinte, ela se o controle da doença nessas regiões. Mesmo assim, a alastrou como uma epidemia para os estados do Rio safra foi marcada por um período muito chuvoso, faciliGrande do Sul, Paraná, Mato Grosso do Sul, Mato Gros- tando a ação e proliferação do fungo. Nas safras seguinso e Goiás; e apresentou ocorrência também em San- tes, o vazio sanitário passou a ser implantado também ta Catarina, São Paulo, Minas Gerais, Bahia, Tocantins, nos estados do Mato Grosso do Sul, Tocantins, Minas Piauí, Maranhão e Rondônia. O despreparo dos produ- Gerais e São Paulo, mas as perdas ainda ocorreram e o tores e as aplicações tardias geraram perda de 569,2 mil custo-ferrugem continuou alto. Além disso, os produtores passaram a ter de lidar com outras doenças da soja que toneladas de grãos e prejuízos de US$ 125,5 milhões. 41


começaram a se manifestar mais fortemente, como o mofo branco (provavelmente, hoje a segunda doença mais importante na cultura da soja), podridões radiculares como fitóftora e macrofomina, mancha alvo, antracnose, entre outros. Com a diminuição das médias de aplicações e de sua representatividade no valor de mercado do grão, as perdas e o custo-ferrugem passaram a diminuir nas safras de 2008 a 2012. Os custos da safra mais recente (2012/2013) ainda não foram calculados, mas foi um período de clima neutro, com chuvas irregulares, e, notadamente, a doença teve uma evolução mais lenta. Ao analisar o histórico da doença no País, percebe-se que o custo do controle químico acompanha o custo-ferrugem e as perdas diminuiram, o que significa que o controle da doença vem obtendo certo sucesso. Mas, o cenário ideal seria diminuir ainda mais

o custo do controle químico, mesmo que ainda houvesse perdas pequenas dos grãos, chegando a um custo-benefício mais equilibrado para a cultura, pensando em uma agricultura mais sustentável, também do ponto de vista ambiental. Mesmo sabendo da imensa dificuldade do agricultor em lidar com essa doença tão agressiva, o seu papel para enxugar essa conta é fundamental. É preciso seguir critérios técnicos e usar os métodos de monitoramento para realizar o controle preventivo, que apresentam grande sucesso nas propriedades em que são executados. Nesse sentido, fica clara a necessidade de realizar um trabalho de conscientização entre os produtores. Ao longo das 11 safras estudadas após a entrada da ferrugem no Brasil, 15,5 milhões de toneladas de soja foram perdidas e o custo-ferrugem chegou a US$ 19 bilhões.

OCORRÊNCIA MUNDIAL DA FERRUGEM ASIÁTICA

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Tipos de controle

aplicação preventiva, além das condições climáticas, Entre os tipos de controle estão os manejos estádio da cultura, situação da ferrugem na região, oucultural, químico, legislativo e a resistência varietal. O tras doenças, entre outros. controle químico, basicamente, está pautado em uti São muitos os desafios e os problemas em lizar misturas comerciais de dois grupos: os triazóis e relação ao controle da ferrugem asiática. Não basta as estrobilurinas. Inicialmente, as aplicações de tria- ter um produto eficiente. As aplicações feitas de forma zóis sozinhos funcionavam; hoje, já existem casos de equivocada, como logo antes de chuva, em momenresistência do fungo caso não seja aplicado o produ- tos muito secos ou com excesso de vento, contrito com a mistura. Mesmo assim, buem para tornar ainda mais difícil esse método vem diminuindo sua esse combate. A soja voluntária na eficiência devido à resistência que entressafra é outro grande probleo fungo vem desenvolvendo ano ma. Essa é a soja que cai da coa ano. Estão em desenvolvimento lheitadeira ou caminhão durante a algumas novas misturas duplas e colheita ou transporte e que acaba triplas, com o acréscimo de carse desenvolvendo no campo. Essa “São muitos os boxamida ou troca do triazol por situação também ocorre nas beiras desafios e os problemas esta, substância com melhor conde estradas que formam os correem relação ao controle trole em relação à ferrugem. Mas, dores de escoamento da produção da ferrugem asiática. não será a salvação da lavoura. É e vai contra a determinação de vapreciso fazer o manejo integrado e zio sanitário, mesmo que não seja Não basta ter um proteger essas moléculas para que algo premeditado. produto eficiente.” não percam sua eficiência. Um dos maiores sucessos Existem recomendações na história do combate brasileiro técnicas para aplicações logo nos à ferrugem asiática é o Consórprimeiros sintomas da doença. cio Anti-Ferrugem, uma parceria No entanto, a identificação nesse inédita no Brasil promovida pelo estágio não é fácil, pois a doença Ministério da Agricultura, Pecuária começa com uma pequena lesão que, muitas vezes, e Abastecimento e coordenado pela Embrapa Soja, não é visualizada. Ocorre que a aplicação preventiva entre várias Universidades, a Associação Nacional de mostrou-se, realmente, como a melhor alternativa, Defesa Vegetal (Andef), Governos Estaduais, coopedesde que baseada em critérios técnicos e racionais. rativas e outras instituições de pesquisa e assistência O controle preventivo considera diversos fatores técni- técnica, que uniram-se para descobrir como combater cos, como os sintomas nas unidades de alerta, áreas a doença. O Consórcio disponibiliza em sua página na em que se planta antes do período normal. Hoje esse internet as ocorrências da praga em tempo real, além método não tem sido muito utilizado porque o vazio de todas as informações necessárias aos produtores. sanitário o limitou. Uma preocupação é que algumas Essa tem sido a principal ferramenta para o acompapropriedades não têm capacidade operacional para nhamento da doença no País e vem sendo acessado fazer o controle da forma que deveria ocorrer. Também por outras regiões produtoras de soja, como Estados é importante considerar esse fator ao recomendar a Unidos e Europa. 43


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IMPACTO DA HELICOVERPA ARMIGERA SOBRE A AGRICULTURA BRASILEIRA SUELY XAVIER DE BRITO Agência Estadual de Defesa Agropecuária da Bahia – ADAB

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e há ou o quanto existe de Helicoverpa armigera acional, e a ADAB coordena a parte operacional, que na Bahia a resposta é uma incógnita. A olho nu, integra consultores, pessoal técnico e associação de não há como distinguir a espécie. O manejo do produtores. Criou-se também uma grupo que foi para inseto na região oeste do Estado o campo – a “turma da infantaria”. procurou atingir alguns objetivos Não obstante a praga esteespecíficos. Primeiramente, delineja presente no estado desde fevear a paisagem agrícola através de reiro de 2012, só em janeiro deste um levantamento fitossanitário e ano fomos convidados a participar implantar de métodos de controle: do processo. O setor produtivo químico, biológico e legislativo. imaginou que sozinho daria conta. “O controle biológico O controle químico se efeInclusive, promoveu uma viagem à implica em apoio a tivaria através de solicitação do reAustrália para verificar métodos de um programa de manejo gistro emergencial e a autorização controle locais. Voltaram convicde importação, no âmbito Federal tos de que precisavam do Estado, integrado de praga para e através do Ministério de Agtriprincipalmente no tocante às ações as culturas regionais.” cultura, Pecuária e Abastecimento mandatórias. (MAPA) e a aplicação assistida do Assim, aos poucos, soinseticida Benzoato Emamectina, maram-se a ADAB, a Secretaria em nível Estadual, por intermédio Estadual da Agricultura e o Minisda Agência Estadual de Defesa tério da Agricultura, passando por Agropecuária da Bahia (ADAB). discussões técnicas, embates com O controle biológico implidiversas instituições e pesquisas. ca em apoio a um programa de manejo integrado de A equipe inicial constituía-se de dez fiscais estaduais praga para as culturas regionais. agropecuários, com apoio da Associação Baiana de O controle legislativo, de caráter mandatório, Produtores de Algodão (ABAPA) e Associação dos visa assegurar áreas de refúgio e implantar um vazio Agricultoires e Irrigantes da Bahia (AIBA) . sanitário consolidado capaz de atender a várias cultu- Mesmo com a tecnologia GPS, o oeste da ras, não somente a soja. Bahia é de acesso muito difícil – tudo é muito grande, Fomentou-se ainda a criação de um consór- muito distante. Organizaram-se núcleos estratégicos cio de manejo de Helicoverpa e um programa consis- em Luiz Eduardo Magalhães, Formosa do Rio Preto, tente de educação sanitária a partir de um diagnóstico São Desidério e Correntina. socioeducativo. No dia 2 de abril, nós já fomos a campo, de A equipe é orquestrada pelo Ministério da pois de uma reunião que harmonizou os procedimenAgricultura, através do grupo de gerenciamento situ- tos. Havia pessoal da defesa agropecuária e vários 45


outros técnicos. Trabalhamos com as três principais culturas implantadas naquele momento: soja, com praticamente 70% de sua área colhida; milho, com a colheita a meio; e algodão, ainda na fase vegetativa. Entre os dias 3 e 11, percorreremos 257 propriedades no território de nove municípios, e aplicamos 460 laudos fitossanitários. Elaboramos mapas de todas as propriedades georeferenciadas, com informações sobre cultura, quantidade, se eram convencionais ou transgênicas, regime pluviométrico etc. Foram 221 laudos aplicados na cultura da soja; 139, na cultura do algodão; 131, nos plantios de milho; e 14 em cultivos de vigna. Verificamos a existência de 612.000 hectares plantados com soja, sendo 502.000 com soja transgênica. Pouquíssimos tinham área de refúgio.

Dos 228.000 hectares de algodão, a maior parte – 137.000 hectares – é convencional. O milho está divido em partes iguais, metade convencional e metade transgênica. Vigna e feijão ainda são de cultivos convencionais. Entre as diversas ocorrências fitossanitárias elencadas pelos produtores, duas se destacaram: a Helicoverpa, citada em 345 laudos, e mosca branca, em 267. Ademais, registramos a ocorrência de Spodóptera, citada 90 vezes como praga; bicudo, em 18 vezes; e mofo branco, com apenas quatro citações . Era de se esperar poucos registros de mofo branco e de ferrugem asiática da soja. Foi um ano atípico, após dois veranicos, um em dezembro (2012) e outro em fevereiro (2013); choveu-se muito abaixo da média histórica. Isso talvez explique baixa incidência de mofo branco e de ferrugem asiática da soja.

EMERGÊNCIA SANITÁRIA DO OESTE BAIANO Propriedades visitadas e laudos fitossanitários aplicados (3 a 11 de abril de 2013)

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Segundo a declaração dos produtores rurais, Afinal, aos 6 de maio, a ADAB publicou portaas perdas médias na soja somavam 22 sacos/ hecta- ria ditando as regras de distribuição do produto, pasre; em algodão, 58 arrobas/ hectare; e no milho, 53 sando por uma avaliação técnica, não só da defesa sacos/ hectare. Os produtores atribuíam o prejuízo na sanitária, mas dos responsáveis técnicos de cada prosoja à má distribuição de chuvas nessa safra, mais in- priedade. Além de todos os cuidados que deveriam clusive do que à Helicoverpa spp. ser tomados na utilização, ademais, previu-se a devo Enquanto prosseguíamos nessa lida, em 5 de lução das embalagens vazias. abril foi publicada a IN 8, autorizando a importação do Junto com a portaria, veio o termo de soliciBenzoado de Emamectina. E já no dia seguinte, libe- tação de liberação do Benzoato de emamectina, de rou-se a importação de 100 ton para o oeste da Bahia. que consta a identificação do produtor, instrução de Conforme as responsabiliuso, área e recomendações. Crioudades atribuídas ao órgão estaduse, assim, um sistema dentro do al, ficamos incumbidos de preparar SIAPEC, para controlar o estoque o ambiente para a aplicação e cuido produto, que chegou à Bahia no dar da aplicação assistida. A exemdia 15 de maio, em Barreiras. plo do que se faz com a área ani A emergência helicoverpa mal, a vacinação assistida; na área fora determinada por vários fatores, “Além de todos os vegetal instituiríamos a vacinação alguns relacionados ao ambiente, à cuidados que deveriam assistida! Em parceria com a AIBA, paisagem agrícola e o manejo estaser tomados na utilização, belecido nos Cerrados, outros deelaboramos um folder, distribuído ademais, previu-se a na passarela da soja que acontevidos a relações interinstitucionais, ceu em meados do mês de abril. além da questão da responsabilidevolução das Ninguém deixou de estar ciente dade compartilhada. embalagens vazias.” dos problemas e das responsabili A última safra ocorreu no dades que teria pela frente. curso de uma mudança climática. A Quando pensamos que região, de São Desidério, Barreiras, quase tudo estava resolvido, surLuiz Eduardo de Magalhães, dispõe giram dificuldades com o Ministério de um regime pluviométrico que osPublico Estadual. Baseados princicila entre 1000 a 1500 milímetros, palmente num parecer da ANVISA, de 2007, que re- bem distribuídos. Ora, no período citado, houve áreas jeita o produto, os procuradores emitiram pareceres em que choveu de 400 a 800 milímetros. Sem dúvida, contrários à sua importação e aplicação. isso favoreceu a explosão populacional da praga. Debalde as tentativas de explicação de que De outro ponto de vista, 132 propriedades se tratava de uma praga nova e sem inimigos natu- mantinham lavouras em regime de sequeiro, e sofreram rais que certamente promoveria muitos danos; que a fortes impactos com a distribuição irregular das chuvas. aplicação era emergencial e que outras técnicas de Somente 25 propriedades ocupavam áreas irrigadas. controle poderiam ser associadas, ao longo do tempo; Decorrente do tipo de suprimento de água, a que seria necessário fazer uma supressão populacio- turma que tem a irrigação não aceita o vazio sanitário nal, e que, para isso, o produto químico era indispen- de 60 dias. Eles recusam ficar esse tempo todo com o sável... Não houve argumentos para os convencer. pivô parado. São terras que se estendem por 105.000 47


hectares, nos quais, de 2002 pivôs, 802 são para culturas temporárias. A relação entre o milho, a soja e o algodão é muito próxima. Nos Cerrados, a exploração intensiva de hospedeiros suscetíveis começou há décadas – permitindo que culturas vegetam todo o ano. O sucesso do controle dependeria, portanto, de uma interrupção, uma descontinuidade temporal, a fim de reduzir a população da praga. A utilização de transgênicos com proteína Bt e alguns com a tecnologia herbicida para soja e algodão, tem crescido, mas sem o estabelecimento de áreas de refúgio o uso de agrotóxicos torna-se inadequado. Observamos superdosagem, coquetéis, produtos não seletivos para inimigos naturais, e modos de ação que induzem à resistência química. Não bastasse tudo isso, o Ministério Público convocou os órgãos de saúde e de meio ambiente, para que eles estabeleceram critérios que deveríamos observar. Só para dar um exemplo: o INEMA nos solicitou amostras de solo de todas as propriedades, antes e

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depois da aplicação. Entretanto, num estado de emergência, nem sempre temos tempo para essas ações. Evidentemente, não deu tempo para realizar pulverizações regionais. Serão criadas dez áreas piloto, atendendo aos critérios da SESAB e do INEMA, e nelas se fará avaliação técnica e aplicação assistida, a fim de se extrair algumas inferências sobre a eficiência e a degradação da molécula no meio ambiente. Concluindo, se me perguntam qual o status da emergência fitossanitária, respondo que a defesa agropecuária perdeu o trem das ações... Modificouse o trajeto, e a composição - timer das ações que deveriam ter sido efetivadas, e não foram – leva passageiros órfãos. É assim que eu me sinto: meio que sozinha, lutando pela emergência. Um comunicado técnico da EMBRAPA, de 2006, alertava sobre o perigo da Helicoverpa armigera, falava de perdas do feijão guandu, mais de US$ 300 milhões. Quais as precauções que tomamos? No oeste, em março, falava-se já de perdas no valor de R$ 1,67 bilhão.


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ORGANIZAÇÃO DE SISTEMAS DE DEFESA SANITÁRIA VEGETAL EM OUTROS PAÍSES ALDO MALAVASI Moscamed Brasil

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maior parte das pessoas que já viajou para fora O cenário global atual tem contribuído para a do país e regressou via os aeroportos do Brasil ampliação do número de ameaças fitossanitárias que conseguiu constatar a triste realidade da falta tem ocorrido nos últimos anos. Isso é decorrência do de fiscalização e inspeção eficienaumento das viagens internaciotes nas barreiras de entrada do nais e comércio de produtos agroPaís. Esse negligenciamento pode pecuários; aumento da influência ser refletido nas ameaças fitossados consumidores sobre a produnitárias que intimidam o progresso ção; avanço da competição, dimida cultura agropecuária no Brasil. nuição da influência da agricultura De modo geral, o quana definição das políticas públicas “Nunca é demais dro Internacional Regulatório visa e descuido potencial no comercio lembrar que as viagens contribuir com medidas menos das decisões baseadas em ciêninternacionais são, restritivas ao comércio, proteção cia. Só em 2010, no aeroporto de da flora nativa e do comércio e Miami, interceptaram-se 18.000 realmente, as principais ambiente, bem como a prevenção pragas. Isso serve para ilustrar a responsáveis pela de potenciais pragas e plantas. situação contemporânea de ameaentrada de pragas. ” Mas, nem sempre essas medidas ças fitossanitárias. auxiliam e pragas e hospedeiros Outro ponto importante que podem se proliferar no ambiendeve ser observado é o aumento te, exigindo das autoridades meda influência dos consumidores didas de prevenção. E nunca é sobre a produção. Hoje em dia, é demais lembrar que as viagens o consumidor quem diz, na realidainternacionais são, realmente, as principais respon- de, o que ele quer. Não é mais o produtor. Quem dirige sáveis pela entrada de pragas. hoje é a área econômica: se o consumidor quer uma Quando isso ocorre, as funções tradicionais papaia pequena ou quer uma melancia sem semente, da Defesa Agropecuária procuram buscar respostas a é isso o que importa. Isso leva ao aumento da comemergências com campanhas de erradicação de do- petição e a diminuição da importância da agricultura. enças e pragas, valendo-se da quarentena. Nesse ce- A percepção das gerações atuais é de que o leite não nário, as características institucionais tradicionais em vem de vaca, o leite vem da fábrica; assim como o defesa agropecuária, que afetam a produção primária, suco não vem do fruto da árvore, vem da caixinha. são normalmente dirigidas pelo setor público identifi- Assim, a agricultura está perdendo cada vez mais a cando os problemas, capacitando grupos específicos, importância no mundo. As pessoas estão preocupamas que trabalham a um alto custo técnico para a eli- das com a inclusão digital. Ao invés de tomar leite e minação da praga/doença. comer proteína é mais necessário tuitar e disponibilizar 49


Wi-Fi grátis para todos. Observar esse cenário é importante para entender a diminuição da importância observada nas políticas públicas para a manutenção do agronegócio. Além disso, não se pode esquecer que, a segurança alimentar afeta também a saúde pública, o turismo e a competitividade, só para citar algumas áreas. Entretanto, mesmo com as adversidades, a defesa agropecuária não pode ariscar a produção doméstica. Caso faça isso, ela não está cumprido o seu papel. E, ela tem que facilitar o incremento da exportação, principalmente dos países que importam muito alimento. E, para não colocar em risco a produção doméstica e ao mesmo tempo facilitar o incremento na importação para suprir o consumo interno, a Defe-

sa Agropecuária e Segurança Alimentar devem chegar a um balanço das fragilidades nacionais e desenvolver algumas capacidades de prévia identificação das suas necessidades. Entre a lição de casa que os governos devem fazer, encontram-se: orçamento adequado; infraestrutura estável; sentido de urgência; compromisso nacional e internacional; capacitação técnica dos fiscais; programas de vigilância permanentes; estabelecimento de um sistema de informação e incentivos e progressão funcional. Nesse contexto, diferentes papéis são específicos dos Setores Público e Privado que podem auxiliar nos Sistemas de Defesa Agropecuária e Segurança Alimentar. Aos governos cabe representar o país, estabelecer a legislação, definir os estandares e assegurar o cumprimento dos regimen-

ENVIAR FOTO 177 EM ALTA

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tos. No lado do setor privado, os “donos” dos produ- uma política de defesa. Pode ser observada em alguns tos, encontra-se o financiamento de produtos e medi- países da América Latina e Caribe, em muitos países das que auxiliem no combate às pragas e as ameaças da Ásia e em praticamente toda África subsaariana mais próximas. (com exceção da África do Sul). No passado, as características do Sistema O Sistema Risco Negligenciável é definido de Defesa Agropecuária e Segurança Alimentar eram pelas condições climáticas adversas e a longa estória identificação dos problemas pelo setor público, análi- de comércio que levam a conclusão que a probabilise de produção, identificação de pragas e doenças, dade de bioinvasão é baixa. Este cenário é observado criação de grupos de capacidades no Canadá, nos países do norte da específicas para erradicação, que Europa e na Rússia. também inclui a inspeção de pro Já o sistema tradicional é dutos, tudo isso a um alto custo baseado, principalmente, em instécnico para o sistema nacional. peção e resposta às invasões e é Hoje, a preocupação deve centrarmais comum nos países que exporse também na cadeia alimentar, tam commodities (identificados pelo no manejo de risco, na articulação MAFF, no Japão; SAG, no Chile; SE“Todas as fronteiras público/público e público/privado, NASICA, no México; SENASA, na são porosas, não há que deve contar com um investiArgentina e DSV no Brasil). fronteira absolutamente mento institucional, com aborda Para o Enfoque offshore impermeável.” gem multidisciplinar para analisar são delimitados fortes programas os fatores de risco, ter sistemas de pré-liberação que ocorrem no confiáveis e fixar, aplicar normas e países exportador, portanto na sua gerenciar um sistema nacional com origem, com mitigação de risco na componentes regionais. entrada de commodities e passa Analisando as organizageiros. Um bom exemplo disto é o ções de sistemas de Defesa SaniUSDA/APHIS, dos Estados Unidos. tária Vegetal em outros países obÉ eliminar o problema antes que ele serva-se que, de modo geral, as atividades típicas e as chegue à porta. Na inspeção offshore, a análise deve atividades de exclusão são divididas em três verten- ser feita no país de origem, antes da importação do tes: prevenção de contrabando, informação pública produto. Um exemplo, é a ação dos fiscais brasileiros (que inclui folders, posters e avisos) e formulários de ao inspecionarem as maçãs antes de sua saída da imigração e agricultura (que compreendem atividades Argentina com destino ao Brasil. Essa é a primeira atitípicas como monitoramento e inspeções regulares – vidade de exclusão. A segunda é inspeção e deve ser ex. Febre aftosa, vaca louca, brucelose e moscas das realizada na chegada, ou seja, ou no porto de entrada frutas). Nesse contexto, podemos classificar os países ou no aeroporto. segundo seus sistemas de Defesa Vegetal: 1.baixa Quando se quebra a barreira de exclusão, é prioridade, 2.risco negligenciável, 3.sistema tradicio- preciso concentrar-se na detecção. Cabe aqui uma nal, 4.enfoque offshore e 5.enfoque biossegurança. observação: todas as fronteiras são porosas, não há A Baixa prioridade é entendida como o resul- fronteira absolutamente impermeável. As mais impertado da falta de recursos humanos e materiais para meáveis são: Yokohama, no Japão; Santiago do Chile 51


NEW ZEALAND

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e Auckland, na Nova Zelândia. A detecção deve ser seguida da delimitação para se fazer o controle: ou suprime, ou contem, ou erradica. Já o enfoque biossegurança está centrado na proteção das plantas (e animais) nativos e, a agricultura, com acentuada integração entre a saúde animal, vegetal e humana. São bons exemplos de enfoque offshore o DAFF, na Austrália, e o MPI, na Nova Zelândia. Justamente por isso, quando se chega aos aeroportos da Austrália ou Nova Zelândia, o inspetor verifica desde a saúde dos passageiros que entram no país, para tentar barrar a entrada de vírus indesejáveis até o conteúdo da bagagem. O enfoque biossegurança muda completamente o processo de inspeção. É por causa deste modelo que nos últimos dez anos, apenas três pragas entraram na Nova Zelândia. Os países precisam atentar-se com a biossegurança. Biossegurança é proteger a economia, o meio ambiente e a saúde das pessoas contra as pestes e doenças. Isto inclui tentar prevenir a chegada de novas pestes e doenças e ajudar no controle de ameaças que invadem o pais com respostas rápidas e robustas de combate, prevenindo pestes, doenças ou ervas daninhas, tendo sempre como meta prioritária a segurança da nação. Para tanto, há uma enorme variação entre as ONPFs ao redor do mundo quanto a estrutura, sistemas de funcionamento e eficiência. O volume da produção agrícola e seu valor e os impactos econômicos e ambientais estimados do estabelecimento de espécies invasivas são as forças que dirigem os sistemas de defesa.


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DEBATES E PROPOSTAS

EM DEFESA DA COMPETITIVIDADE AGROPECUÁRIA Túlio Oliveira Aenda Os técnicos que visitaram as lavouras da Bahia sugeriram a utilização de cinco produtos, registrados no Brasil, para o combate à Helicoverpa armigera. O Ministério da Agricultura, porém, liberou apenas o Benzoato de Emamectina. Por quê?

Luís Eduardo Pacifici Rafael MAPA O Ministério da Agricultura recebeu notificação da ADAB contendo uma lista de oito produtos, incluindo o Benzoato de Emamectina. É importante lembrar que, até aquele momento, não se sabia ao certo contra qual espécie de Helicoverpa estávamos lutando, e, sendo assim, seguiu-se a Instrução Normativa que prevê o uso emergencial. Foi feito um levantamento da classificação dos produtos por ordem de toxicologia que, inicialmente, nos levou a optar por cinco produtos – três químicos e dois biológicos – sem nenhum questionamento do CTA. A partir da publicação da decisão no Diário Oficial, procedemos aos registros emergenciais no tocante aos produtos biológicos, e às extensões referentes aos químicos. Atualmente, além do Benzoato de Emamectina, o mercado disponibiliza cinco alternativas, e a escolha foi por simples contingência. Trata-se de um produto empregado contra essa praga em outros países, com comprovada eficiência, mas não cabe ao CTA aprova-lo ou rejeita-lo; não é atribuição da Câmara que tem como natureza o assessoramento. O assessoramento opera com base na Norma e esta proíbe o produto por critérios previamente estabelecidos. Por conseguinte, o CTA declinou da decisão e remeteu o problema para a instância superior, o Ministério da Agricultura, que, por fim, aprovou a importação em caráter emergencial.

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Na realidade, o Benzoato não deve ser visto como única solução, pois ele se soma de maneira muito especial ao controle tradicional daqueles cinco produtos aprovados. Seu uso decorreu da necessidade de uma arma rápida e eficaz intervenção a fim de reduzir a população da lagarta, permitindo, posteriormente, o manejo por meio dos demais produtos.

Geraldo Papa UNESP Ainda na safra anterior, as diamidas falharam. Segundos após a detecção da lagarta, já não se obtinha controle. Havia a noção de que os cinco produtos disponíveis não seriam suficientes e, paralelamente, o conhecimento de experiências muito bem sucedidas em outros países com o Benzoato de Emamectina. A orientação para que a moléculo fosse aprovada foi dada pelo grupo de trabalho responsável por isso.

Christian Scherb Nufarm Anos de experiência resultaram na convicção de que a quantidade de ativos necessários é bem maior do que a disponibilizada; dois ou três não resolverão nunca. O tempo para registrar um produto é longo e não adianta liberar um só para uso emergencial, porque ele será aplicado várias vezes seguidas, perdendo-se em meia safra. As pressões políticas são fortíssimas, é fato, mas se o Brasil quer ser o primeiro produtor mundial de alimentos precisa começar a se mexer. Não adianta desenvolver ativos na Argentina e nos contentarmos com a resistência dos produtos. Colocamos entraves à defesa fitossanitária, enquanto no mundo inteiro os produtos que funcionam são registrado simples e rapidamente. Aceitamos todos os níveis de controle que se queira estabelecer, desde que se imprima maior celeridade ao registro. Caso contrário, uma hora a agricultura do país quebra.


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Controle da Cydia pomonella Mário Menezes Biocontrole Os resultados do programa de combate a Cydia pomonella encheram-me de orgulho. Apenas fiquei com dúvida em relação à continuidade, a meu ver essencial. Participei do combate à mosca-da-carambola, mas, atualmente, não sei como o problema evoluiu. Houve êxito no Pará, mas surgiu outro foco em Roraima, sem perspectiva de erradicação em curto prazo. Seria possível estabelecer um paralelo entre as duas experiências?

Jair Virgínio Moscamed Brasil O Ministério da Agricultura regulamenta todo o Programa Nacional de Erradicação da Cydia pomonella e a Instrução Normativa 48 define que o monitoramento precisa ser realizado entre os meses de setembro a março. Ou seja, o ciclo 2012/2013 encerrou-se em março e, infelizmente, o DSV não deu resposta a tempo de uma preparação. Na incerteza, ninguém consegue manter-se mobilizado, em campo, recebendo salário, mês a mês, até o início de setembro, quando deveria ser iniciado o segundo ciclo. O setor produtivo tem manifestado forte preocupação, especialmente a Associação Brasileira de Produtores de Maçã, que desempenhou papel fundamental em tudo que diz respeito às ações de controle de erradicação de Cydia pomonella. A Instrução Normativa diz ainda que somente após dois anos de captura zero a área dos quatro municípios estará livre da praga. O monitoramento deverá ser repetido, inclusive, para que o Brasil obtenha reconhecimento internacional de que teve êxito também na erradicação urbana. Os pomares comerciais estão desembaraçados. A batalha foi vencida, mas a guerra não terminou. Cabe ao Ministério da Agricultura definir

a estratégia para o ciclo 2013/2014 e quanto a isso, ainda estamos nos escuro.

Aldo Malavasi Moscamed Brasil O Ministério da Agricultura tem dado apoio a este que é um dos programas de maior sucesso no Brasil. Conteve, de fato, a praga no Estado do Amapá. O custo tem sido altíssimo, algo em torno de R$ 1,5 milhão a R$ 2 milhões. Então, qual seria o problema? É que apesar de investir muito dinheiro, o Ministério só consegue contratar profissionais terceirizados, o que resulta em dificuldades operacionais enormes. Ninguém cogita encerrar o projeto. Existem lideranças e fiscais seriamente comprometidos com a sua execução. Mas, infelizmente, há também desinteresse.

Política Fitossanitária Ângelo Pallini UFV Durante sua apresentação, o representante do MAPA falou que a política fitossanitária está para ser criada. O que é e como se aplicaria essa política?

Luis Eduardo Pacifici Rangel MAPA Ao falar de política fitossanitária, incluo questões acessórias, tais como os defensivos agrícolas, o treinamento, a educação sanitária, entre outros. Vários colegas, embora não trabalhem especificamente na área de agrotóxicos, sabem que toda a discussão sobre o produto e a sua aplicação acaba focando aspectos fitossanitários. Claro, o produto só existe para controlar a praga, mas eu gostaria de inverter essa história, parar de discutir produto por produto, e discutir, por exemplo, uma política fitossanitária para soja, no Brasil. 55


Qual o risco principal da soja? Qual mercado queremos atingir? Quem é o nosso principal concorrente? Quais produtos concorrem para essa fitossanidade? Com a saída de produtos importantes do mercado, o que é mais grave: a ferrugem ou o percevejo? A entomologia vive uma crise atrás da outra. Cabe ao governo fixar prioridades na área de defensivos e, a partir daí, caberá à indústria responder questões como os tipos de armas que dispomos para o maneja das pragas. Critica-se severamente a inépcia governamental, mas a quem interessa um Ministério da Agricultura sem estrutura, com pouca verba, sem condição de efetuar ações eficazes, nem de cumprir a legislação? Interessa a algum dos senhores? Certamente, não. Pois, então, pressionem. Digam que discordam do modelo atual. E reflitam: a quem interessa a sua execução? O negócio de defensivos agrícolas movimenta US$ 10 bilhões/ano e o número de técnicos é cada vez menor. Além disso, um registro de produto demora quase 12 anos. Como comparativo, o EPA, a agência reguladora dos Estados Unidos, abriga cerca de 1.000 pessoas, em um único prédio para tratar desse assunto. E o mercado deles é menor que o nosso. Não se trata de defender um inchaço governamental, essa não deve ser a estratégia. Mas, precisamos agir com inteligência. A sociedade tem idênticos objetivos e pode nos ajudar a encontrar soluções mais eficientes e menos dispendiosas. Nesse sentido, eu perguntaria aos pesquisadores o que estaria ao seu alcance para aprimorar o modelo, torná-lo mais razoável, e os convidaria a exercer mais pressão. Juntem-se à indústria para que as coisas aconteçam.

Geraldo Papa UNESP Ao longo dos quase 30 anos durante os quais tenho atuado na agricultura, o Brasil saltou de menos de 50 milhões de toneladas de grãos para 56

185 milhões de toneladas. É, portanto, um país abençoado, porque plantios sucessivos e concomitantes, só mesmo graças à benção divina. Por outro lado, isso também assegura a proliferação e a sobrevivência das pragas. Na esperança de que os defensivos sejam a solução para tudo, vão sendo deixados de lado os princípios de manejo. Resultado: os inseticidas, os fungicidas, os herbicidas estão sucumbindo. Moléculas e grupos químicos fantásticos perdem suas eficiências toxicológicas. A legislação deveria prever o vazio sanitário. Em alguns setores, os irrigantes resistem, mas dá para planejar os plantios com 60 dias de intervalo e assegurar a continuidade de todos os cultivos. Atualmente, as pragas já não se comportam como antes; a lagarta da maçã e do algodão resolveu comer soja. No estado de Iowa, nos Estados Unidos, a neve cria um vazio sanitário natural. Nos Trópicos, não tem jeito: o vazio sanitário precisa ser imposto por Lei, assim como o refúgio com as sementes BTs. Essas práticas diluem a resistência e permitem manter eficiência da tecnologia por mais tempo. Mas, sem Lei, nunca vai dar certo.

Eduardo Daher Andef Essa discussão deveria ser feita de forma mais ampla, com a participação dos três vértices do sistema regulatório brasileiro, isto é, MAPA, Ibama e Anvisa. Porém, neste auditório temos a presença apenas do MAPA, apesar do convite, os outros dois pilares não compareceram. Neste sentido, a minha proposta é fazer mais encontros para debater o tema. A indústria vem sugerindo a algum tempo que essa discussão torne-se pública, porque as ameaças fitossanitárias não fazem parte, sequer, do imaginário da população urbana. Mas, as consequências da invasão de novas pragas certamente chegarão às suas mesas.


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Não há uma batalha entre a administração pública e privada, entre produtores e pesquisa, entre valores econômicos de cada cultura. A proposta é muito mais simples do que isso: é darmos mais transparência, é transmitirmos pela televisão, é levarmos para o público em geral que existem ameaças, sim, e que elas são reais e preocupantes.

Jair Virgínio Moscamed Brasil A experiência que tive no serviço de defesa agropecuária me permitiu um contato com o ex-ministro Roberto Rodrigues, que num rasgo de lucidez, priorizou três grandes fóruns nacionais: o fórum dos secretários de Agricultura; o fórum de entidades de sanidade agropecuária; e o fórum dos delegados de Agricultura. Isso mobilizou todo o país. Permitiu, por outro lado, um acúmulo de informações que muitas vezes não chegam ao topo das cadeias de decisão. Assim, na época da ditadura, na Argentina, o Clarín enviava à Casa Rosada uma edição particular, destinada ao general presidente, contendo apenas notícias agradáveis, para que ele não se frustrasse. No Brasil atual, tem-se a impressão de que alguns dirigentes vêm recebendo versões semelhantes dos jornais, posto que não se dão conta do que acontece sequer nas estruturas vinculadas às suas pastas. Por exemplo, até hoje não temos um sistema de informatização integrado. Cada unidade da Federação criou um serviço que armazena dados da produção, produtores e propriedades. Na Adagro, em Pernambuco, tivemos a felicidade de dar início a uma ferramenta que já está rodando em nove Estados. O Brasil precisa de uma base de dados para que qualquer produtor, esteja onde estiver, possa inscrever um produto qualquer vegetal ou animal e essa informação chegar a todas as unidades da Federação, estabelecendo-se um diálogo entre elas. Precisamos rever e harmonizar as legislações estaduais, urgentemente.

No Vale do Rio São Francisco, onde a fruticultura gera mais de 250 mil empregos, vivenciamos uma experiência interessante, que se realiza em dois lados da fronteira, entre Pernambuco e Bahia. O produtor que cruzar a ponte deixa para trás regras vigentes em um estado e passa a obedecer às regras do outro. A produção agrícola não é considerada e cada Estado elabora uma legislação diferente. Por mais difícil que seja levantar uma questão dessa natureza no Congresso, a realidade se impõe, e não pode ser equacionado por meio de portarias ou Instruções Normativas.

Entraves e Propostas Ângelo Pallini UFV Foram apontados muitos gargalos do sistema, mas apenas uma proposta: rever especificidades do sistema de produção para garantir aumento da produção agrícola.

Nelson Leite ADEPARÁ Com o programa da ADEPARÁ, erradicamos a mosca-da-carambola duas vezes, juntando trabalho organizado e vontade. Foi o suficiente, muito embora na divisa do Amapá haja um rio com margem de 200 metros e o inseto voe até cinco quilômetros para depositar seus mil ovos. Erradicamos, porém, a mosca voltou. A expulsamos de novo e ela voou para Roraima. Uma equipe foi enviada ao local e a capturou. Somos referência no combate à mosca-da-carambola. Temos aproximadamente 1.100 armadilhas e, em todo o Pará, fizemos 23.500 monitoramentos. Nunca faltou apoio do Ministério da Agricultura e a expectativa é que o convênio plurianual, celebrado de 2011 a 2015, continue. Sem dinheiro, só com boa vontade, não se faz nada. 57


Aldo Malavasi Moscamed Brasil Equipe é fundamental. A praga saiu do Suriname, migrou para a Guiana e chegou até a divisa com o Brasil. Bastaram 24 horas para que a moscada-carambola fosse detectada, no Jari, e de pronto já havia funcionários da ADEPARÁ no local, com residência fixada até o foco ser totalmente controlado. É muito complicado erradicar hospedeiros, mas os profissionais assumiram a tarefa. O Ministério da Agricultura suportou os custos e, assim, temos evitado que a praga saia do Pará e entre, por exemplo, na Bahia ou no Vale do São Francisco. A Agência Estadual de Defesa Agropecuária da Bahia é outra referência de atuação notável, pois superou um dos mais graves problemas do país: o loteamento de cargos em função de apoio político. Contra isso, valeu mais a continuidade. A política fitossanitária com que sonhamos só sairá do papel quando a presidente Dilma Rousseff a adotar, como adotou a MP dos Portos. Neste sentido, não vejo outro caminho que não seja ir direto ao encontro da presidência.

Suely Xavier de Brito ADAB Em tempos de Helicoverpa, eu me indago: que fim levou a nossa soberania nacional? O advento de uma praga exótica, ausente das Américas, com impacto potencial devastador, mais do que justifica, tecnicamente, que se decretasse um estado de emergência, e, no entanto, não conseguimos sequer dar início ao processo de supressão!

Luís Eduardo Pacifici Rangel MAPA É uma questão de soberania, sim. Porém, mais de segurança, porque a agricultura nacional está sendo desafiada. No entanto, acredito que crises aca58

bam virando oportunidades. O caso Helicoverpa rompeu amarras que há 10 anos nos atam à burocracia. Após os anos de ditadura, somos um país de democracia frágil, recente, submetidos a uma burocracia feroz, um estamento que não consegue imaginar a sociedade sem a tutela do Estado, sem o apadrinhamento do Estado patriarcal. Precisamos mudar isso. Não através do Estado mínimo, mas por meio de um Estado minimalista, que permita ao setor privado fazer o seu trabalho. Claro, devemos valorizar o Ministério da Agricultura, mas sem colocar todas as fichas nele. Se o governo é quem faz e desfaz, lá se vai a nossa soberania e a nossa segurança. Atualmente, a agricultura é o maior patrimônio do Brasil. Difícil de manter porque custa desde o suor do agricultor, até o trabalho de transportar e vender os frutos da terra. Exige, portanto, um esforço colossal. E sendo o patrimônio maior, é uma questão de segurança nacional. É isso que precisa ser trabalhado: a relação custo-benefício. Quanto fatura a indústria do agrotóxico? Qual o prejuízo de quem não usa agrotóxico? Dados sobre intoxicação são escondidos, ninguém consegue apurar. Será que existem? Sim, eles existem. Dizem que não são confiáveis. Pois, então, vamos ao que interessa: o que está sendo feito para melhorar a confiabilidade dos dados? Dados da agricultura, nós os temos. Anualmente, produzimos diagnósticos baseados nos receituários agronômicos emitidos e o trabalho de mitigação dos riscos dos produtos prossegue. Certamente, precisamos de mais indicadores. O plano que os debates vêm suscitando, em minha opinião, é isso: somar competências dispersas e coloca-las dentro de um grande pacote a ser oferecido à Presidente Dilma. Para proteger o maior patrimônio que esse país tem. Essa é a minha ideia de plano.


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Ameaças à Hortifruticultura Anita Gutierrez CEAGESP Eu sugiro que o Brasil adote uma estrutura semelhante à que existe nos Estados Unidos e que os produtores e seus primeiros compradores participassem das decisões. Cheguei a pesquisar o valor de produção das frutas e hortaliças, que então era semelhante ao dos grãos. Pesam sérias ameaças fitossanitárias sobre as frutas e hortaliças, mas ninguém abordou essa questão. Nossas culturas são, em grande parte, migratórias. O abacaxi atravessa o Brasil inteiro. O maracujá mudou de São Paulo para a Bahia. As plantações de melancia mudam devido às pragas e doenças e, em algumas regiões, os produtores fazem duas pulverizações por semana. Sem dúvida, o que aconteceu com a soja foi gravíssimo, mas quem mexe com isso não enxerga o nosso setor, mesmo que a gente gere muitos empregos. Assim, gostaria de propor, para uma próxima reunião, não somente um levantamento das ameaças fitossanitárias às frutas e hortaliças, mas que fossem encaminhadas sugestões e soluções.

Marcelo Lopes da Silva Embrapa É indubitável que o episódio da Helicoverpa constitui um marco na defesa sanitária nacional. Houve atraso no diagnóstico mas, caso ele fosse mais preciso e mais prematuro, a história seria diferente? O certo é que sem base científica não se faz plano nenhum. É um

voo cego, como mergulhar ignorando a profundidade. Então, a pesquisa preventiva precisa detectar o problema corretamente. O APHIS, nos Estados Unidos, a Austrália e a Nova Zelândia fazem. O Brasil não faz.

Aldo Malavasi Moscamed Brasil Considerando o papel da Sociedade Brasileira de Defesa Agropecuária, criada com forte apoio do Ministério da Agricultura, seria interessante que esse apoio voltasse a se manifestar. A rede não pode acabar. Vamos negociar apoio financeiro do CNPq, mas também é importante que a indústria fabricante, representada pela Associação Nacional de Defesa Vegetal (ANDEF) entre na discussão, no sentido de manter a rede funcionando.

Eduardo Daher Andef O orçamento do Ministério da Agricultura é inferior ao do Ministério do Comércio e Indústria. O Ministério de Ciência e Tecnologia também tem dinheiro disponível a fundo perdido. Devemos, portanto, encaminhar boas propostas, bem planejadas e acredito que os recursos podem ser suportados por todos, em parcerias. Sugiro nos reunirmos com presidentes e os diretores de instituições que financiam pesquisas, como BNDES e Finep e vamos mostrar a eles que estamos sugerindo inovações em benefício do Brasil. Trata-se de um jogo de soma positiva. Precisamos do apoio de todos – entidades, governos, academia e sociedade. Os recursos existem e estamos juntos nessa empreitada.

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AME AÇ AS F I T O SS AN I TÁR I AS: N O VAS PR AG AS C O L O C A M E M R I SC O A PRO D U Ç ÃO D E AL I ME N T O S N O BRA S IL

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

agricultor brasileiro tem sido duramente penalizado por pragas que afetam suas lavouras. Os desafios para controlá-las e até conviver com as diferentes pragas que ocorrem e aquelas que estão para ingressar no País tornam-se cada vez mais complexos. A necessidade premente de maior esforço fitossanitário em países tropicais é uma constatação científica, consagrada pela pesquisa no mundo e no Brasil. De acordo com a FAO, Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação, a tecnologia evita a redução, em média, de 40% na produção dos alimentos. Os prejuízos são ainda maiores em países tropicais como o Brasil, cuja incidência de pragas não tem a proteção natural das baixas temperaturas. As alterações do clima acarretam modificações na incidência de pragas agrícolas, com sérias consequências econômicas, sociais e ambientais. De acordo com a revista Veja (15 de junho, 2011), um estudo realizado pela consultoria Kleffmann avaliou o impacto negativo para o País caso apenas quatro culturas – soja, milho, algodão e cana-de-açúcar – não tivessem a proteção de modernos defensivos agrícolas: as perdas econômicas alcançariam R$ 128 bilhões; a safra da soja, por exemplo, enfrentaria quebra de nada menos do que 99% da produção. As autoridades na pasta de Agricultura nos municípios, estados e no Governo Federal do País nem sempre têm atuado de maneira rápida e eficaz para auxiliar os produtores rurais. Com esta preocupação, a Sociedade Brasileira da Defesa Agrope-

cuária propôs-se a reunir o setor público, empresas privadas do agronegócio, acadêmicos e agricultores com o objetivo de promover o intercâmbio de informações sobre as ameaças fitossanitárias prestes a entrar no País – e, pelo menos uma delas, este ano, já ingressou na Bahia e causou perdas na produção de soja e algodão estimadas em R$ 2 bilhões. Problema recorrente também se verifica na fruticultura e horticultura, onde predominam as plantações com baixo suporte fitossanitário, as chamadas Minor Crops. Dessa forma, a iniciativa propõe-se a desenvolver ações contínuas e eficientes que reduzem os danos às culturas, os prejuízos aos agricultores e à economia brasileira. As palestras e os debates permitiram identificar deficiências no sistema de defesa fitossanitária nacional, entre elas: falta de taxonomista para dar suporte às ações de defesa sanitária vegetal; ausência de uma base integrada de dados em defesa sanitária vegetal; falta de harmonização entre legislações estaduais de defesa sanitária vegetal; necessidade de maior agilidade dos órgãos regulatórios nos pedidos de análise de Novo Ingredientes Ativos. Apesar do cenário de desafios, os especialistas reunidos no Seminário contribuíram com diversas propostas. Elas deverão ser aprofundadas em eventos como este seminário que, conforme aprovado, devem se tornar frequentes, visando reunir massa crítica que leve a uma ampla política fitossanitária, cuja visão sistêmica estabeleça as responsabilidades do setor público e do setor privado.

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>>GERALDO PAPA Há anos no Brasil, a Helicoverpa ainda não fora identificada corretamente. Em duas safras, houve engano na sua identificação. Isso sinaliza um grave despreparo na área da taxionomia. Primeiro, imaginou-se que se tratava da nativa Helicoverpa zea. Depois, cogitou-se da H. gelotopoeon, que embora originária da Argentina, ocorre no Sul desde a década de 70. Só recentemente, em março deste ano, obteve-se a sua determinação exata. São poucos os taxionomistas. Um único dedicava-se à tarefa. Resultado: um prejuízo em torno de R$ 2 bi. A Helicoverpa é uma praga inevitavelmente cosmopolita. Concorrem para isso o seu tamanho e a sua polifagia, além da incrível capacidade migratória e extraordinária adaptação que a caracterizam. A qualquer momento, ela pode simplesmente resolver dar um tempo, e permanecer até seis meses sem comer, nem dormir. Então, de uma hora para outra, ei-la que surge em uma haste, um caule, uma flor, uma vagem... Ao contrário das lagartas que atacam

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