CUPULAS DAS FAVELAS

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“Nem um dia se passa sem notícias suas”. Cúpula de Favelas:

Implementação do “Plano de Favelas, para sua inclusão social e econômica” João Paulo dos Reis Velloso

Marilia Pastuk

Coordenadores

Côn. Manuel Manuel Manangão Manangão ee Côn. Mons. Luiz Luiz Antônio Antônio Pereira Pereira Lopes Lopes Mons. Walsey de de Assis Assis Magalhães Magalhães ee Walsey Claudio Cezar Cezar Carvalho Carvalho de de Almeida Almeida Claudio Eduarda La La Rocque Rocque Eduarda Daniel Misse Misse Daniel Maria Gabriela Gabriela Bessa Bessa ee Maria Ruth Jurberg Jurberg Ruth Hilda Alves Alves ee César César Bedran Bedran Hilda Rossino de de Castro Castro Diniz Diniz Rossino

Mônica Santos Santos Francisco Francisco Mônica Luiz Bezerra Bezerra do do Nascimento Nascimento Luiz Sidney Silva Silva (Tartaruga) (Tartaruga) Sidney Jorge Luis Luis da da Costa Costa Silva Silva Jorge Alzira Alzira Amaral Amaral José Ricardo Ricardo Duarte Duarte Ferreira Ferreira José Arley Macedo Macedo Arley Ronaldo Batista Batista do do Nascimento, Nascimento, Ronaldo Antônio Carlos Carlos Firmino Firmino ee Antônio José Martins Martins de de Oliveira Oliveira José


“NEM UM DIA SE PASSA SEM NOTÍCIAS SUAS.” * CÚPULA DE FAVELAS: IMPLEMENTAÇÃO DO “PLANO DE FAVELAS, PARA SUA INCLUSÃO SOCIAL E ECONÔMICA”

* Peça teatral, de Daniela Pereira de Carvalho, Direção de Gilberto Gawronski.

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João Paulo dos Reis Velloso Marilia Pastuk (Coordenadores)

Côn. Manuel Manangão e Mons. Luiz Antônio Pereira Lopes, Walsey de Assis Magalhães e Claudio Cezar Carvalho de Almeida, Eduarda La Rocque, Daniel Misse, Maria Gabriela Bessa e Ruth Jurberg, Hilda Alves e César Bedran, Rossino de Castro Diniz, Mônica Santos Francisco, Luiz Bezerra do Nascimento, Sidney Silva (Tartaruga), Jorge Luis da Costa Silva, Alzira Amaral, José Ricardo Duarte Ferreira, Arley Macedo, Ronaldo Batista do Nascimento, Antônio Carlos Firmino e José Martins de Oliveira

“NEM UM DIA SE PASSA SEM NOTÍCIAS SUAS.” * CÚPULA DE FAVELAS: IMPLEMENTAÇÃO DO “PLANO DE FAVELAS, PARA SUA INCLUSÃO SOCIAL E ECONÔMICA”

* Peça teatral, de Daniela Pereira de Carvalho, Direção de Gilberto Gawronski.

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“Nem um dia se passa sem notícia suas.” Cúpula de favelas: implementação do “plano de favelas, para sua inclusão social e econômica” João Paulo dos Reis Velloso, Marilia Pastuk, Côn. Manuel Manangão e Mons. Luiz Antônio Pereira Lopes, Walsey de Assis Magalhães e Claudio Cezar Carvalho de Almeida, Eduarda La Rocque, Daniel Misse, Maria Gabriela Bessa e Ruth Jurberg, Hilda Alves e César Bedran, Rossino de Castro Diniz, Mônica Santos Francisco, Luiz Bezerra do Nascimento, Sidney Silva (Tartaruga), Jorge Luis da Costa Silva, Alzira Amaral, José Ricardo Duarte Ferreira, Arley Macedo, Ronaldo Batista do Nascimento, Antônio Carlos Firmino e José Martins de Oliveira. – Rio de Janeiro: INAE, 2012 120 p.

1. Desenvolvimento Econômico - Brasil 2. Brasil - Política Econômica 3. Crescimento Econômico - Brasil I. João Paulo dos Reis Velloso, Marilia Pastuk, Côn. Manuel Manangão e Mons. Luiz Antônio Pereira Lopes, Walsey de Assis Magalhães e Claudio Cezar Carvalho de Almeida, Eduarda La Rocque, Daniel Misse, Maria Gabriela Bessa e Ruth Jurberg, Hilda Alves e César Bedran, Rossino de Castro Diniz, Mônica Santos Francisco, Luiz Bezerra do Nascimento, Sidney Silva (Tartaruga), Jorge Luis da Costa Silva, Alzira Amaral, José Ricardo Duarte Ferreira, Arley Macedo, Ronaldo Batista do Nascimento, Antônio Carlos Firmino e José Martins de Oliveira II. Instituto Nacional de Altos Estudos

CDD 338.981 4


Sumário Nem um dia se passa sem notícias suas: Cúpula de Favelas para a sua Inclusão Social e Econômica....................................7 Marilia Pastuk

Favelas e inclusão.......................................................................19 Côn. Manuel Manangão e Mons. Luiz Antônio Pereira Lopes

Apoio do BNDES ao Plano de Desenvolvimento de Favelas....23 Walsey de Assis Magalhães e Claudio Cezar Carvalho de Almeida

Novo impulso à virada do Rio....................................................29 Eduarda La Rocque

Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos: Protagonismo e Desenvolvimento Social como Política Pública............................................................................41 Daniel Misse

A urbanização de favelas de grande porte no Rio de Janeiro.....53 Maria Gabriela Bessa e Ruth Jurberg

Programa SESI Cidadania do Sistema FIRJAN........................65 Hilda Alves e César Bedran

Favela é Cidade...........................................................................75 Rossino de Castro Diniz

Oportunidade não se dá, se cria................................................77 Mônica Santos Francisco

Como se encontra a comunidade do Cantagalo......................81 Luiz Bezerra do Nascimento

Projeto de Desenvolvimento de Estruturas de Negócios Criativos do Maciço do Cantagalo.............................................83 Sidney Silva (Tartaruga)

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Conselho Comunitário de Manguinhos: Uma experiência de gestão participativa do território............85 Jorge Luis da Costa Silva

O desenvolvimento do Brasil depende também do desenvolvimento da favela...................................................97 Alzira Amaral

Rocinha: respeito e dignidade para todos – o triste exemplo do Laboriaux.................................................101 José Ricardo Duarte Ferreira

Um Plano de Inclusão Social de Favela..................................107 José Martins de Oliveira

Rocinha – sobre a Câmara Comunitária.................................109 José Ricardo Duarte Ferreira e Arley Macedo

Rocinha: PROPOSTAS aguardando realização......................115 Ronaldo Batista do Nascimento, Antônio Carlos Firmino e José Martins de Oliveira

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Nem um dia se passa sem notícias suas: Cúpula de Favelas para a sua Inclusão Social e Econômica Marília Pastuk1

Toda ação principia mesmo é por uma palavra pensada. Palavra pegante, dada ou guardada, que vai rompendo rumo João Guimarães Rosa, em Grande Sertão: veredas

1.  Considerações iniciais Na sessão de encerramento do Fórum Especial intitulada “Nem um dia se passa sem notícias suas: Cúpula de Favelas para a sua Inclusão Social e Econômica” foram apresentados resultados das discussões acerca de propostas de inclusão social e econômica de moradores das favelas do Borel, Cantagalo, Manguinhos (Complexo), Pavão-Pavãozinho e Rocinha elencadas na publicação: “Favela como Oportunidade”, coordenada pelo ex-ministro João Paulo dos Reis Velloso, de minha autoria (em parceria com Vicente Pereira), lançada em maio de 2012. Esta sessão foi organizada pelo Fórum Nacional juntamente com a ONG Ação Comunitária do Brasil do Rio de Janeiro (ACB/RJ). A mesma foi de uma riqueza extraordinária pelas trocas que permitiu entre atores diversos, parceiros do Fórum, destacando-se dentre estes dezenas de moradores das comunidades retrocitadas. Quanto à opção do Fórum de continuar o trabalho iniciado nessas favelas (ao invés de realizar um estudo similar em outras como pensado originalmente), visou: i) tentar romper com o paradigma de projetos sociais fragmentados, superpostos e desarticulados; ii) buscar consolidar e dar visibilidade ao que já vem sendo feito nesses territórios por diferentes atores sociais, inclusive pelo poder público mas, principalmente, por moradores e lideranças comunitárias;

1 Marília Pastuk é doutora na área de políticas públicas sociais. Coordenadora da elaboração do Plano de Desenvolvimento de Favelas para sua Inclusão Social e Econômica, iniciativa do Fórum Nacional.

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iii) qualificar as propostas de inclusão socioeconômica apresentadas na publicação em pauta e dotá-las de maior representatividade (ampliando o número de integrantes do respectivo “coletivo de confiança“); iv) trazer novos atores para contribuir com tal processo, que implica no respeito e compromisso com a pluralidade e na construção de consensos, radicalizando o princípio da participação, da solidariedade e da própria democracia. O primeiro procedimento adotado no sentido exposto foi firmar novas parcerias. Com este propósito, foi realizada uma reunião entre os presidentes do BNDES, Luciano Coutinho e do Fórum Nacional, João Paulo dos Reis Velloso, em função da qual o presidente Luciano Coutinho, motivado pelas questões levantadas na publicação e seus potenciais desdobramentos, orientou sua assessoria para que fosse organizada uma palestra sobre o “Favela como Oportunidade” envolvendo a diretoria da casa e demais interessados. Aberta pelo ex-ministro Reis Velloso e por Helena Maria Martins Lastres, Secretária de Arranjos Produtivos e Desenvolvimento Local do BNDES, chamou particularmente atenção nessa palestra o alto grau de interesse de funcionários do Banco com relação à temática debatida manifestando-se dispostos em identificar, em suas respectivas áreas de atuação, onde e de que forma poderiam estar contribuindo para a concretização de propostas de inclusão sócio-produtiva, de relevante interesse comunitário. Daí saiu a decisão do BNDES de formar um grupo de trabalho para discutir, com maior vagar, a participação do Banco no trabalho em questão, grupo este coordenado por Walsey de Assis Magalhães, assessor da presidência. A partir desse evento, foi realizada outra reunião no BNDES contando com a participação de todos os parceiros da publicação “Favela como Oportunidade”. Além de representantes do BNDES e de lideranças comunitárias, participaram igualmente desta representantes da Fundação Oswaldo Cruz e da FAFERJ, os quais passaram a atuar como parceiros da iniciativa à convite do Fórum Nacional. Nesse contexto, uma terceira reunião, coordenada pelo ex-ministro Reis Velloso, foi realizada no IPP (Instituto Pereira Passos) contando com as participações, dentre outros, de Eduarda La Roque, presidente deste Instituto, e respectiva equipe e de representantes da Arquidiocese do Rio de Janeiro; do BNDES, da Secretaria Estadual de Assistência Social e Direitos Humanos (SASDH); 8


dos trabalhos sociais do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento); da Fundação Oswaldo Cruz; da FUNFERJ e da FIRJAN; além de Tatiana Rocha, pesquisadora da ACB/RJ. O principal objetivo da reunião no IPP foi o de formar um “colegiado” de instituições (vinculadas ao poder público, fundações e outras) que atuam nos territórios contemplados pelo “Favela como Oportunidade”. Esta teve como pauta: i) prestar esclarecimentos com relação aos passos dados (pós lançamento da publicação) incluindo a solicitação, por parte do Fórum Nacional, coordenador da iniciativa, de que cada parceiro presente identificasse as ações que já vem realizando nas favelas contempladas (Borel, Cantagalo, Manguinhos, Pavão-Pavãozinho e Rocinha). ii) estabelecer um cronograma de reuniões a serem realizadas em cada uma das favelas, antes da Cúpula de Favelas, em setembro de 2012, debater propósitos afins, procedimentos necessários, competências e atribuições. Ficou acordado que estas reuniões teriam um caráter de re-conhecimento e de maior escuta às lideranças e moradores locais; iii) discutir a participação na Cúpula de Favelas na sessão de encerramento do Fórum Especial e possíveis desdobramentos daí decorrentes. Dessa forma, por iniciativa da presidência do IPP, foi acordado que inicialmente (pós a realização da Cúpula) seriam feitas reuniões entre representantes do poder público que conformam o “colegiado” do “Favela como Oportunidade” para maior troca de informações acerca de suas atividades, busca de sinergia e planejamento de ações conjuntas e complementares nos territórios em questão, a partir do que já vêm realizando nos mesmos e de novas iniciativas consensuadas entre os mesmos. Na reunião do IPP, foi acordado ainda que fossem realizados novos encontros nas favelas do Borel, Cantagalo, Manguinhos, Pavão-Pavãozinho e Rocinha incluindo um necessário reconhecimento de campo (atendendo sugestões de moradores destas favelas neste sentido), pós período eleitoral, a partir de uma metodologia a ser desenvolvida por este mesmo Instituto. Tais reuniões serão fundamentais para a concepção, de forma participativa, de um “Plano de Inclusão Social e Produtiva” para tais favelas a ser apresentado, 9


ainda que preliminarmente, no Fórum Nacional de maio de 2013, dando continuidade ao trabalho iniciado no “Favela como Oportunidade”, o que não impedirá que ações sejam efetuadas desde já no âmbito das mesmas, conforme propostas. O Fórum Nacional ressaltou ainda que no evento de maio de 2013 lançará uma nova publicação da mesma natureza da anterior (da “Favela como Oportunidade”) contemplando outras favelas do Rio de Janeiro, na expectativa de ampliar os resultados e impactos da iniciativa e mostrar, juntamente com seus parceiros do “colegiado” e das favelas envolvidas, que o Rio de Janeiro pode fazer política social de forma diferente. Para tanto, o ex-ministro Reis Velloso ressalta de forma contundente que Favela é Cidade, o que foi repetido várias vezes (como um mantra) na fala de representantes das comunidades durante a Cúpula de Favelas. Mônica Francisco, co-fundadora da Rede de Entidades do Borel, por exemplo, pautou seu discurso nessa afirmativa. Nas suas palavras: “Se dizemos que favela é cidade, não temos que reivindicar direitos. Temos que viver direitos. Temos que elevar os níveis de requerimentos. São pessoas que moram ali. Não queremos mais ser manicures, cabeleireiros, garçons. Temos muita potencialidade e os especialistas aqui presentes sabem que o país precisa de mais que isso. Precisa de profissionais com mais formação”. Já Paulo Raimundo Barbosa, importante liderança comunitária de Manguinhos e da Associação de Moradores da favela do Parque Carlos Chagas, que integra este Complexo, afirmou: “Favela é cidade. Nós somos cidade, mas moramos na favela. Só isso. Se a coisa funciona em Copacabana, tem que funcionar aqui. Se tem pra um, tem que ter pra outro”. 2.  Reuniões nas Favelas Foram realizadas reuniões em todas as comunidades contempladas no “Favela como Oportunidade”, organizadas e coordenadas por lideranças comunitárias em parceria com o Fórum Nacional. Estas contaram com a participação de parceiros institucionais que conformam o chamado "colegiado" destacando-se dentre estes o BNDES, o IPP, a SASDH e a FAFERJ. 10


Essas foram muito proveitosas, traduzindo-se em momentos singulares de alinhamento de expectativas e de re-conhecimento. Tiveram em média três a quatro horas de duração e, dentre as falas recorrentes, destacaram-se os seguintes pontos: • moradores das favelas revelaram sentir-se muitas vezes desprezados e desrespeitados pelo poder público que, segundo eles, chega nas comunidades com “projetos prontos”, “pacotes”, intervenções decididas sem prestar atenção às demandas comunitárias. Chega ainda desarticulado entre suas diversas representações e instâncias, “confuso na sua atuação” etc. Falaram que são percebidos como “curral eleitoral”, “fundo de quintal”, “iscas fáceis”, “ratos de laboratório” para uma série de projetos e iniciativas governamentais e outros que, na maioria dos casos, são temporários e/ ou inconclusos e à cujo montante do gasto ou investimento não têm acesso; tampouco à prestação de contas e/ou resultados e impactos alcançados, cuja real efetividade desconfiam. • manifestaram desejo de equacionar prioridades identificadas pela comunidade com relação ao desenvolvimento do seu território versus intervenções aí realizadas pelo poder público em nome deste desenvolvimento. Exemplificaram tal desejo com a questão do saneamento básico, almejado de forma unânime pelos moradores das favelas, versus obras de engenharia (que muitas vezes, segundo eles, “só beneficiam empreiteiras”) que poderiam ser realizadas em outro momento, caso houvesse uma decisão política favorável à essas. Como compatibilizar interesses? perguntam. Também denunciaram a realização de obras que acabam por trazer novos problemas para a comunidade ao invés de equacioná-los. Neste sentido reclamaram da falta de lógica das intervenções e/ou de uma visão integrada em termos de planejamento. Denunciaram que aquilo que é inicialmente considerado provisório nos seus territórios acaba sempre virando permanente; que já não mais acreditam em “falsas promessas” e tampouco se “iludem com políticos e/ ou com o poder público”. • tais moradores ressaltaram a importância de se organizarem entre si para reivindicar direitos de forma conjunta (já que os deveres têm vindo primeiro como a cobrança de taxas e impostos por serviços não realizados e/ou realizados de forma precária). Seria o caso de acionar a Defensoria Pública? perguntam. Da mesma forma, falaram da importância de participar do jogo político, com candidatos próprios, que tenham compromisso com as comunidades. 11


• foram enfáticos ao declarar que têm projetos e são protagonistas com relação à história de seus territórios, cuja memória fazem questão de resgatar e valorizar. • solicitaram maior respeito às crianças e um voto de confiança para os jovens da comunidade que, segundo eles, uma vez tratados de forma respeitosa e adequada, têm muito a contribuir com o desenvolvimento do território, com criatiovidade, iovação e ousadia. • disseram que iniciativas e projetos sociais governamentais e outros deveriam ter como foco prioritário apoiar/consolidar o que existe e vem dando certo no âmbito da comunidade, protagonizado por moradores, grupos e instituições locais. Citaram novamente a problemática do saneamento básico como urgente (com maior destaque para a questão do lixo) já que está relacionada com saúde e qualidade de vida. Clamaram por uma educação de melhor qualidade, incluindo educação técnica de excelência, denunciando a precariadade daquela que têm acesso. Apontaram igualmente para a necessidade no investimento no esporte e na cultura, que não se limite à realização de eventos pontuais e no apoio às atividades de empreendedorismo. Insistiram na necessidade de dar sustentabilidade às ações realizadas em nome do desenvolvimento comunitário e na clareza do legado deixado por estas. Em termos específicos, representantes dessas favelas, dentre outros objetivos fundamentais relacionados com a atuação do poder público e respectivos pareceiros nos seus territórios, destacaram os seguintes: 2.1 Borel • reconhecer e valorizar o trabalho da Rede de Entidades do Borel e valorizar o que a comunidade já avançou e tem em termos de iniciativas e projetos de inclusão sócio-produtiva • oferecer oportunidades de trabalho a moradores qualificados; • saber se aproximar da juventude local e investir no seu potencial. Considerar o problema da sua baixa escolaridade, a qual que deve ser equacionada de forma devida; • apoiar empreendedores locais e assessorá-los quanto à formalização de seus negócios (se for o caso) ajudando-os inclusive na elaboração de planos de negócios. Evitar a realização de “cursos relâmpagos” e/ou “iniciais, superficiais”; 12


• prestar atenção especial à educação infantil, melhorar a situação das creches comunitárias existentes; • considerar as singularidades das diversas favelas que integram o “Complexo” pensando em projetos específicos relacionados com a realidade de cada uma delas, evitando homogeinizá-las; • estudar a viabilidade de utilizar imóveis desocupados (abandonados) na comunidade do Borel para fundar uma espécie de “Centro de Convivência” dotado de espaços para projetos culturais, eventos gastronômicos, bens e serviços relacionados com a economia criativa e solidária etc; • resolver a questão das remoções, das áreas de risco e da regularização fundiária; • equacionar, de forma definitiva, a questão do lixo na comunidade como um todo e não somente nas vias principais. 2.2. Cantagalo • intervir no CIEP local que se encontra numa situação lamentável, “vergonhosa”, dar prioridade a questão da elevação da escolaridade na comunidade via o acesso a uma educação de melhor qualidade; • resolver o problema da governança do “Brizolão”, priorizar o apoio a atores, grupos e instituições locais que há anos ocupam este espaço desenvolvendo atividades da maior importância para a comunidade, cujo trabalho não é reconhecido e/ou respeitado pelo poder público; • reconhecer/valorizar e dar oportunidades para talentos artísticos e outros; • reconhecer/valorizar e dar oportunidades para iniciativas nas áreas de esporte e arte marcial aí realizadas; • privilegiar a execução de projetos concebidos e protagonizados por moradores locais à exemplo daqueles realizados para a Rio+20; • melhorar os equipamentos e serviços de saúde aí existentes; • equacionar de forma definitiva a problemática do lixo evitando “maquiar” as vias principais; • mellhorar as condições de acessibilidade local; • impedir e/ou denunciar a realização de estudos e pesquisas sobre a comunidade que “mascaram” sua realidade e apresentam dados pouco confiáveis. 13


2.3. Manguinhos • acabar com o desrespeito e o descaso na forma como são tratados moradores da comunidade do Complexo como um todo pelo porder público e pela sociedade em geral que “prefere fazer de conta que não existem”; • dotar todas as comunidades que conformam o mesmo de moradias com condiçõas dignas de habitação; • respeitar os direitos de cidadania dos moradores locais, valorizar suas histórias, lutas e iniciativas em prol do desenvolvimento comunitário; • dar transparência às obras do PAC, apresentar o respectivo projeto executivo às lideranças comunitárias, discutir a natureza das obras e o problema das remoções, “evitar a maquiagem e a obra mal feita”, equacionar problemas criados por estas que resultaram até em perda de bens prejudicando moradores, dar prioridade absoluta à questão do saneamento básico incluindo o acesso a serviços de coleta e destino do lixo, abastecimento de água, esgoto, iluminação pública. Permitir o controle social das obras deste Programa apresentando o montante do investimento realizado vis a vis a obra efetuada e o benefício “teoricamente” alcançado; avaliar a efetividade deste em termos da melhoria das condições de vida da população afetada; • evitar a cobrança abusiva de taxas e impostos relativos a serviços públicos; identificar e resolbver irregularidades; resolver o problema de competências entre os diversos atores do poder público que atuam no territóro no sentido de evitar “que um fique transferindo o problema para o outro”; • não realizar remoções compulsórias e punição aos que resistem e permanecem; • solucionar o caso das famílias que moram em bueiros; • abrir um amplo diálogo sobre a questão da segurança pública em Manguinhos; entender que as comunidades do Complexo precisam estar fortalecidas para receber uma UPP; • evitar protelar a vinda de bens e serviços públicos para o local aguardando a chegada da UPP. Por que não atuar de forma preventiva? Por que não pensar uma política de segurança que abarque comunidades faveladas de forma geral? Por que não buscar uma solução também para os problemas do Jacarezinho?, perguntam; 14


• prestar assistência a moradores que vivem em condições de extrema pobreza e indigência, incluí-los em programas de transferência de renda, à exemplo do Bolsa Família; • dar visibilidade ao enorme problema de usuários de crack em Manguinhos e também Jacarezinhos (muitos migrantes de áreas de UPP onde têm seu consumo reprimido), inclusive crianças; oferecer tratamento adequado e digno aos mesmos; • perceber Manguinhos como um caso de “calamidade pública”, o que pode ser estendido para o Jacarezinho; • respeitar a vida dos moradores locais, oferecer-lhes oportunidades em termos educacionais, de inserção no mercado de trabalho e de incremento de renda; • levar com seriedade a proposta de um “Brasil de Todos” e/ ou “Um País sem Pobreza”; evitar a manipulação política e as promessas não cumpridas. Romper com o assistencialismo; • respeitar a organização comunitária, o papel das lideranças, das associações de moradores e das igrejas no local. Apoiar seu trabalho. 2.4. Pavão-Pavãozinho • priorizar uma educação de qualidade para todos os moradores da comunidade e realizar uma intervenção imediata no CIEP João Goulart que atende também a moradores do Pavão-Pavãozinho; • administrar e tentar evitar conflitos entre moradores e a polícia com relação a questões muito mal equacionadas como o caso do estacionamento, das multas arbitrárias, dos maus tratos, sobretudo relativo aos jovens da comunidade etc; • buscar um atendimento mais adequado na área da saúde privilegiando trabalhos de prevenção com relação às doenças sexualmente transmissíveis, à gravidez precoce, prestar esclarecimentos às famílias; • apoiar o trabalho que vem sendo feito por iniciativa de moradores locais no sentido de construir um Portal na Internet que trate de assuntos que dizem respeito às comunidades do Pavão-Pavãozinho e do Cantagalo, que têm propostas concretas com relação ao desenvolvimento do território; • apoiar iniciativas de empreendedorismo protagonizadas por moradores locais, facilitar seu acesso ao mercado de trabalho, valorizar sua identidade e cultura; 15


• equacionar de forma definitiva o problema do lixo na comunidade bem como o do saneamento básico em termos gerais evitando soluções paliativas; • abrir o diálogo com relação às obras do PAC no sentido de esclarecer dúvidas sobretudo com relação à natureza destas e aos processos de remoção. 2.5. Rocinha • perceber que mesmo após as obras do PAC, lixo, água e esgoto continuam sendo grandes problemas na comunidade, as vezes “camuflados”. Não priorizar a realização de obras como a do teleférico contrária às necessidades e desejos mais imediatos da maoir parte da população da Rocinha. Segundo alguns, a obra do teleférico é inclusive deletéria para a proposta de desenvolvimento endógeno); • investir na educação infantil, apoiar/consolidar e ampliar as creches comunitárias; • promover cursos de educação para a cidadania voltados para moradores locais informações acerca dos respectivos direitos e à acesso aos serviços do judiciário evitando, ao máximo, recorrer a uma autoridade local que não tem esta competência como a polícia; • contribuir para que seja feito o controle social das intervenções públicas ai realizadas inclusive dando transparância aos montantes de recursos envolvidos, às obras inacabadas etc; • respeitar a história da comunidade, a identificação dos seus moradores com o espaço e sua apropriação do território; • resolver o problema das remoções, evitar a “remoção branca” e agilizar a regularização fundiária conscientizando o morador da Rocinha da importância da sua permanência no território; • apoiar iniciativas relacionadas com a cultura, o esporte, o lazer protagonizadas por moradores locais; • perceber a Rocinha como patrimônio da cidade do Rio de Janeiro reconhecendo a luta dos respectivos moradores que ajudaram a construir sua história e identidade. 3.  Resultados Preliminares Dentre os resultados alcançados nessa primeira fase de discussão/ revisão e implantação de propostas apresentadas no “Favela como Oportunidade” destaca-se: 16


– Descrição/análise, em cada uma das comunidades supracitadas, das iniciativas e projetos desenvolvidos pelas entidades que conformam o “colegiado” e a relação destas com as propostas esboçadas na publicação em pauta no sentido de avaliar o respectivo “estado da arte”, revisá-las e melhor qualificá-las. – Apresentação de novas propostas, tais como: • Unificação dos bancos de dados acerca de tais comunidades num Sistema de Informação Único (Exemplo: dados do IPP + dados do PRODERJ); • Criação de um Centro (de Cidadania, de Políticas Públicas, de Referência) em cada uma dessas comunidades o qual serviria como catalisador das atividades aí realizadas por parte de diferentes atores, parceiros do Fórum Nacional; • Concepação de um Portal Comunitário Integrado; • Ampliação do trabalho realizado na comunidade do Borel para a publicação “Favela como Oportunidade” para as demais comunidades que integram o Complexo de mesmo nome; • Elaboração de projetos executivos com relação a cada uma das comunidades ou Complexos estudados, uma vez qualificada a demanda em termos de inclusão socila e econômica; • Concepção de um Plano de Inclusão Social e Econômica para tais comunidades identificando e analisando criticamente o quê se deseja alcançar e como se dará uma outra integração da favela à cidade (diferente daquela já existente e perversa) que seja efetiva e sustentável do ponto de vista dos favelados. •. Maior integração entre atores que atuam nas mesmas entre si e entre estes e os moradores e lideranças desssas. • Maior amadurecimento e aprendizado mútuo. Assim, “ao vencedor, as batatas”, parafraseando uma vez mais Machado de Assis.

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Favelas e inclusão Côn. Manuel Manangão2 e Mons. Luiz Antônio Pereira Lopes3

Há muitos anos vimos tratando do tema da inclusão das favelas na sociedade. E certamente este tema deve ser observado a partir de todas as dimensões da vida humana. A geração de oportunidades sociais para que cada comunidade de favela possa entrar na rota do desenvolvimento social. Várias propostas têm sido apresentadas no tocante à segurança, moradia, qualidade de vida e outras tantas necessidades das várias comunidades de Favelas de nossa Cidade. Propostas apresentadas pelos vários níveis de governo e a avaliadas quanto ao impacto produzido nas várias comunidades. No entanto, uma coisa tem ficado visível. Lidamos com um problema que se arrasta há muito tempo, ao menos desde o século XIX. Com intervenções pontuais e descontinuadas, os problemas apenas foram-se agravando, e hoje se faz necessária e urgente a busca por soluções diante das graves implicações na vida da população. Na solução, são vários os atores e setores implicados: políticos, econômicos, sociais (saúde, habitação, transporte, etc). A Igreja, também, se sente atraída a participar do processo de discussão por estarem envolvidas questões de justiça, ao menos de justiça social. Se a cidade vive intensa atividade imobiliária com a conseqüente valorização do solo urbano, e isto até mesmo dentro das comunidades de favela, também é verdade que a relação do Estado com estas comunidades tem sido de há muito tempo, e muitas vezes, uma política clientelista. Apesar de que se tem visto tentativas de real interesse em mudar o atual quadro. Mas, ainda, aparece o velho provérbio: “vocês fingem que são atendidos e nós fingimos que atendemos”. Diante do primeiro problema, a velha solução: remover a favela. No fundo, apenas a velha estratégia doméstica de varrer a poeira para debaixo do tapete, afinal o coração não sente o que os olhos não vêem. Mas não percebemos como sociedade, que apenas estamos refavelizando outras áreas sem o devido ordenamento de estruturas sociais que deviam ser prioridade em qualquer planejamento urbano envolvendo todos os setores da sociedade organizada. Sobrevoando a cidade do Rio de Janeiro dá-me a sensação 2 3

Vicariato Episcopal para a Caridade Social. Coordenador da Pastoral de Favelas.

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de que estou numa grande favela, pela desordenação dos espaços urbanos, em que aparecem algumas ilhas de ordenamento urbano. Os círculos vão-se repetindo: favela > “conjunto habitacional” > Déficit habitacional > habitação popular > morador por conta própria (cada um por si) > favela. As pessoas chegam à cidade, fruto das migrações em busca da realização do sonho de uma vida melhor e encontram uma realidade perversa em que são tratados: ou como um mundo exótico ou folclórico ou caso de polícia. No entanto, a cidade com todas as suas forças produtivas, em todos os sentidos, deve se preparar para receber os que a ela chegam em busca de um mundo melhor. A Igreja viveu e ainda vive este grande sonho. Dos primórdios com D. Helder e a Cruzada de São Sebastião como esforço de uma iniciativa de moradia popular num conjunto habitacional planejado, ordenado até a Pastoral das favelas, passando pelo Banco da Providência e demais Pastorais Sociais. Podemos aqui citar , na área educacional , o belo trabalho que instituições como a Puc e o Colégio Santo Inácio fazem de acessórias (alfabetização e pré-vestibular) e bolsas de estudos às comunidades carentes dessa cidade. Além disso nos últimos anos construímos e abrimos vários espaços físicos dentro dessas áreas, não só como espaço de oração, mas também de ação social para o bem das comunidades. Como Igreja, sempre iremos nos posicionar ao lado daqueles que vão vivendo como se verdadeiro rolo compressor os apertasse por todos os lados. Estamos juntos com outras entidades que lutam para que o título de propriedade seja estendido como direito àqueles que moam nessas áreas esquecidas. Iremos sempre estar junto daqueles que se organizam para que a saúde ou educação, o emprego ou “o trabalho por conta própria” façam parte na vida diária de cada morador e sua família. Questões como: onde morar ou como morar? Sempre vão fazer parte da discussão do direito de morar e do tipo de moradia necessária para as pessoas. É um verdadeiro paradoxo a realidade habitacional: de um lado a real necessidade de moradia e do outro uma certa incapacidade do estado de gerar moradia no mesmo movimento dinâmico das necessidades da aglomeração urbana. Precisamos estar juntos na ação de encontrar soluções que possam tornar a vida nas cidades dignas para todas e cada pessoa. Pensar a vida das pessoas no seu conjunto. Não podemos continuar com certa lógica perversa existente há um século que é a 20


separação entre moradia /habitação e os outros elementos da vida. Afinal como já cantamos na música popular: o ser humano não quer só casa, mas também: emprego, saúde, escola, lazer, etc. É necessário um processo de articulação. E esta atitude tem ficado cada vez mais nítida na realização de cada etapa do Fórum Nacional com a apresentação de propostas por parte de tantas instituições do variado universo de nossa cidade e também dos anseios de cada comunidade nele representada. O que procuramos é o eixo articulador que possa levar cada ator social a se integrar num movimento proativo para a reconstrução da cidade. Certamente que a questão da moradia precede todos os anseios por uma vida digna. Afinal, já houve um tempo em que um ditado popular dizia “quem casa, quer casa” estabelecendo uma direta relação entre o constituir família e o lugar para morar. As sociedades foram se organizando e nem sempre esta relação foi sendo realizada. Mesmo nos tempos modernos em que foram reconhecidos os direitos humanos, na pratica nem sempre estes princípios foram levados a sério. Basta ver as constantes situações em que por precariedade econômica das famílias ou por tragédias, as pessoas ficam sem lugar para morar, sem que haja dos que tem o dever moral de cuidar do bem estar das pessoas uma ação eficaz e contundente para resolver de forma digna esta questão. A declaração universal dos direitos humanos nos diz em seu artigo XXV parágrafo 1: “Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência fora de seu controle”. Mas, o que vemos é uma serie de defasagens na produção de habitações, geração de emprego, escolas de qualidade e hospitais para as famílias. E assim, constatamos a completa falta de consideração pela vida e segurança das pessoas. Chegamos a uma situação de calamidade. O Evangelho, que anuncia a mensagem de Cristo que veio trazer vida em abundância, nos instiga a que nos empenhemos em encontrar formas de ajudar encontrar soluções para esta situação. A Igreja tem se colocado ao lado dos moradores para ajudar na reflexão e descoberta de saídas para seus problemas. Creio que diante dos sonhos de todos nós, só podemos dizer: mãos a obra! 21


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Apoio do BNDES ao Plano de Desenvolvimento de Favelas Walsey de Assis Magalhães e Claudio Cezar Carvalho de Almeida4

O Plano de Desenvolvimento de Favelas do Rio de Janeiro converge com as orientações estratégicas do planejamento corporativo do BNDES, as quais enfatisam o desenvolvimento socioambiental, com geração de emprego, e apoio à formulação e implementação das políticas de governo, especialmente nas áreas de inclusão social, fortalecendo a gestão pública, a infraestrutura urbana, a saúde, a educação, a segurança e os empreendimentos de economia solidária. O apoio financeiro do BNDES às iniciativas do plano de desenvolvimento de favelas pode se dar através de diferentes formas e por meio de financiamentos com recursos reembolsáveis e não reembolsáveis. Às empresas o BNDES pode oferecer financiamentos a custos muito baixos para a realização de investimentos sociais (linha ISE – Investimentos Sociais de Empresas), destinados à implantação, expansão e consolidação de projetos e programas, que objetivem a elevação do grau de responsabilidade social empresarial e que sejam voltados para a articulação e o fortalecimento de políticas públicas desenvolvidas nos diferentes níveis federativos. A linha se divide em duas modalidades: apoio a investimentos no âmbito da comunidade e apoio a investimentos no âmbito da empresa. A primeira atende iniciativas que sejam preferencialmente articuladas com o poder público local e/ou que visem somar esforços com programas ou políticas públicas, voltados para ações no ambiente externo com influência local e microssocial (ações que tenham como público-alvo as populações localizadas em comunidades do entorno ou das áreas de influência geográfica das empresas) e/ ou no ambiente macrossocial (ações que beneficiem segmentos da população nacional, não diretamente associados a iniciativas empresariais ou em suas áreas de influência). Quanto aos empreendimentos de menor porte o BNDES quer oferecer condições adequadas de acesso ao crédito e fortalecimen4

Assessores do BNDES.

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to, via inovações financeiras e desenvolvimento institucional, do microcrédito e de incubadoras de cooperativas, tendo como instrumentos a difusão do Cartão BNDES (incluindo a ampliação do número de fornecedores locais) e o apoio a iniciativas coletivas exemplares, mediante seleção pública ou convênios com parceiros estratégicos, seja pela ampliação do capital das cooperativas, seja pelo apoio a projetos com recursos não reembolsáveis do Fundo Social. O Cartão BNDES é voltado para as Micro e Pequenas Empresas e consiste em um crédito pré-aprovado para aquisição de produtos credenciados no seu portal de operações. Atualmente, estão autorizados a emitir o Cartão BNDES os Bancos do Brasil, Banrisul, Bradesco, Caixa Econômica Federal e Itaú. Além de apresentar-se como uma alternativa viável e de baixo custo para acesso das pequenas empresas ao financiamento de longo prazo, o cartão BNDES surge como excelente vitrine para que pequenos produtores, distribuidores e prestadores de serviços (de avaliação de conformidade acreditadas pelo Inmetro) possam expandir suas possibilidades de vendas. O Programa BNDES de Microcrédito, por sua vez, realiza empréstimos de pequeno valor a microempreendedores formais e informais, normalmente sem acesso ao sistema financeiro tradicional. O BNDES atua com o objetivo de promover a economia popular por meio da oferta de recursos para o crédito produtivo, orientado a pessoas físicas e jurídicas empreendedoras de atividades de pequeno porte, visando incentivar a geração de trabalho e renda, inclusão social, complementação de políticas sociais e/ ou promoção do desenvolvimento local. O financiamento é indireto, por intermédio de agentes operadores (instituições financeiras ou OSCIPs – Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público), que repassam os recursos ao microempreendedor. O Procapcred - Programa de Capitalização de Cooperativas de Crédito complementa a ação do microcrédito ao objetivar o fortalecimento da estrutura patrimonial das cooperativas de crédito, por meio da concessão de financiamentos diretamente aos cooperados. O financiamento se dá por intermédio de instituições financeiras credenciadas e os clientes são os cooperados (pessoas físicas dedicadas a atividades produtivas de caráter autônomo, tais como empresários, prestadores de serviços autônomos e microempreendedores) e cooperados pessoas jurídicas (dedicadas a atividades de produção industrial, comércio ou serviços). 24


Há ainda a possibilidade de oferecer recursos não reembolsáveis através do Fundo Social, que é constituído com parte dos lucros anuais do BNDES e apoia projetos de caráter social nas áreas de geração de emprego e renda, serviços urbanos, saúde, educação e desportos, justiça, meio ambiente, desenvolvimento rural e outras vinculadas ao desenvolvimento regional e social. Na modalidade seleção pública são escolhidos projetos de acordo com edital previamente publicado. Para isso são estabelecidas parcerias com entidades que participam da organização do certame. O Apoio a Projetos de Catadores de Materiais Recicláveis é um bom exemplo que, em consonância com o Comitê Interministerial de Inclusão Social dos Catadores de Materiais Recicláveis, contribuiu para a complementação de políticas de desenvolvimento regional e social em convergência com ações federais prioritárias destinadas a população de baixa renda que atua nas atividades de catação de materiais recicláveis em aglomerados urbanos. Foi contratada em dezembro de 2010 a parceria do BNDES com a prefeitura do Rio de Janeiro para inclusão socioprodutiva de catadores de 110 materiais recicláveis. O objetivo da parceria é ampliar a coleta seletiva na cidade do Rio de Janeiro, com benefícios socioambientais para a população e ganhos para a limpeza e para o ordenamento urbano. Os recursos da parceria destinam-se à construção de galpões para o recebimento, triagem e beneficiamento de materiais recicláveis, operados por cooperativas de catadores. Com o Banco do Brasil – Desenvolvimento Regional Sustentável (BB-DRS) a parceria estabelecida desde abril de 2008 é mais ampla, pois visa apoiar projetos produtivos, tecnológicos e de formação de mão de obra. O objetivo é assegurar condições para o desenvolvimento sustentável das regiões mais pobres do país, além de gerar trabalho e renda para populações menos assistidas, através do adensamento de cadeias produtivas locais, do acesso a novos mercados e da melhoria da qualidade de produtos. Para os projetos produtivos, podem ser financiados itens como melhoria de infraestrutura, beneficiamento, armazenagem ou comercialização, acesso a novos mercados, ganhos de escala, redução de custos, incorporação de novas tecnologias e aumento de vantagem competitiva. Já nos projetos de capacitação, os itens passíveis de apoio vão desde a inovação tecnológica até qualificação de mão de obra para setores associados a atividades produtivas, no campo operacional ou em gestão e governança. Com a Fundação Banco do Brasil – FBB outra 25


parceria objetiva estruturar empreendimentos produtivos coletivos em diversas cadeias produtivas; reaplicar tecnologias sociais com foco na geração de trabalho e renda, segurança alimentar e melhoria das condições de saneamento básico; e apoiar ações visando o desenvolvimento integrado com enfoque territorial. No setor da indústria cultural busca a valorização econômica com base em estratégias de diferenciação, desenvolvimento local e preservação do patrimônio com alvo prioritário nas atividades minimizadoras de risco social, valorizando os mecanismos de certame e fomentando a formação de APLs (Arranjos Produtivos Locais) da indústria criativa. Além disso, procura apoiar a capacitação de mão-de-obra especializada, tendo em vista a geração e a formalização do emprego no setor cultural. Um dos exemplos dessa iniciativa é o convênio firmado com o Banco do Nordeste do Brasil (BNB) para operacionalizar o Programa BNB de Cultura, uma linha de patrocínio cultural direto do Banco do Nordeste, por seleção pública de projetos nas áreas de música, literatura, artes cênicas, artes visuais, audiovisual e artes integradas ou não específicas. O objetivo é apoiar a produção e difusão da Cultura do Nordeste, do norte de Minas Gerais e do Espírito Santo. Com a administração pública é destaque o financiamento a Projetos Multissetoriais Integrados Urbanos - PMI (conjuntos de projetos que integram o planejamento e as ações dos agentes municipais em diversos setores a fim de solucionar problemas estruturais dos centros urbanos), que é um modelo alternativo de tratamento dos problemas sociais que abrange soluções para os variados tipos de carências, articulando, no âmbito municipal, investimentos em diversos setores sociais, como, por exemplo, saneamento básico e transportes. Dentre as características especiais do PMI é evidenciado o desenvolvimento de processos de participação das comunidades: o gerenciamento; o acompanhamento e avaliação dos resultados e metas estabelecidas; e a manutenção e sustentabilidade das transformações promovidas. Além dessa, há outras formas de apoio às ações da administração pública para implantação, expansão ou modernização da infraestrutura de serviços públicos, que inclua gastos com obras civis e instalações, compra de máquinas e equipamentos, móveis e utensílios e outras despesas. Com o programa BNDES Qualificação é realizado o financiamento a projetos de implantação, expansão e modernização de instituições públicas que atuem com formação 26


profissional inicial e continuada, educação profissional técnica de nível médio e educação tecnológica. Com o Caminho da Escola há o apoio à renovação e ampliação da frota de veículos de transporte escolar de alunos da educação básica da rede pública, prioritariamente da zona rural. Com o PROUCA (Programa Um Computador por Aluno) apoia a inclusão digital nas escolas das redes públicas de ensino estadual, distrital ou municipal, mediante a aquisição de computadores portáteis novos. Com o BNDES PMAT incentiva a modernização da administração tributária e melhoria da qualidade do gasto público na administração municipal e com o PMAE há o financiamento para o fortalecimento da capacidade gerencial, normativa, operacional e tecnológica das administrações tributárias dos Estados. Com o Ministério da Cultura foi possível apoiar o Programa de Promoção do Artesanato de Tradição Cultural (Promoart), realizado pela Associação Cultural dos Amigos do Museu do Folclore Edison Carneiro (Acamufec), com o objetivo de fortalecer o artesanato de tradição cultural no apoio a 65 pólos de artes localizados em diferentes regiões do país. As ações distribuem-se nas esferas da produção, comercialização e divulgação dos produtos, com iniciativas de formação de mercados qualificados, promovendo a dinamização cultural e econômica desse segmento. Outra modalidade de parceria com entidades do poder público que têm demonstrado potencial vem sendo realizada com os governos estaduais. Refere-se ao aporte de recursos não reembolsáveis em empreendimentos produtivos de baixa renda, concretizado por meio de contratos que complementam o aporte de recursos dos Estados para geração de trabalho e renda, além de desenvolver e adensar atividades produtivas e inovativas. O BNDES apoia até 50% dos valores financiáveis do projeto e recomenda que o beneficiário final apresente contrapartida de, pelo menos, 10% do valor total aportado pelo BNDES e pelo Estado. Os APLs apoiados são escolhidos por meio de seleção pública realizada pelo Estado e um Comitê, formado por representantes do governo do Estado e por parceiros considerados relevantes no processo, é responsável pela definição, implementação e avaliação da ação; uma Comissão Técnica é responsável pelo recebimento, seleção e avaliação dos projetos apresentados. Há exemplos interessantes do uso desse instrumento para, além de promover a geração de emprego e renda, estimular iniciativas com utilização de forma sustentável dos recursos naturais e 27


minimização de impactos ambientais (como a prevenção de acidentes via contenção de encostas e construção de barragens, refloerestamento etc.), fomentar a criação de novos empreendimentos, cooperativas, associações em APLs, para atuação articulada com serviços públicos essenciais (como o fornecimento para escolas, hospitais, repartições públicas, infraestrutura, habitação popular, entre outras) e vinculação a programas do governo federal (como o Plano Brasil sem Miséria e a inclusão de egressos do Bolsa Família, a participação no PAA – Programa de Aquisição de Alimentos, Minha Casa Minha Vida, Luz para Todos, Água para Todos, etc.). Exemplos de atividades passíveis de gerar empreendimentos: bens e serviços de alimentação, confecções (uniformes, cama, mesa e banho), calçados, construção e reparo de equipamentos, mobiliário, instalações elétricas, obras civis, limpeza, manutenção, etc.

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Novo impulso à virada do Rio Eduarda La Rocque5

A discussão “Favela como oportunidade”, que norteou o Fórum Nacional de maio passado e sobre a qual continuamos a refletir na Cúpula de Favelas que encerrou o Fórum Nacional, foi uma escolha extremamente oportuna. Acredito que seja dando oportunidades aos moradores das favelas que conseguiremos trilhar um (longo) caminho rumo ao desenvolvimento sustentável da nossa cidade. Ao falar em favela como oportunidade, na verdade discutimos a construção de políticas públicas capazes de reconhecer, valorizar e potencializar os ativos desses territórios em prol de uma estratégia de desenvolvimento integradora e sustentável, fundamental para injetar ainda mais velocidade à virada, o processo de transformação positiva que dominou a agenda da Cidade do Rio de Janeiro nesses últimos quatro anos. Não se trata de um desafio fácil. Como escreveu Ricardo Henriques, meu antecessor na presidência do Instituto Pereira Passos (IPP) e criador do programa UPP Social, a condução da política pública no Brasil é dificultada por características estruturais que tradicionalmente reduzem a qualidade dos processos de implementação de ações e os seus impactos. Estes obstáculos, que ainda reduzem o ritmo e a amplitude das transformações que queremos realizar, são a fragmentação e a sobreposição de políticas públicas, fenômenos complementares na condução da agenda social. Por outro lado, encontramos também um forte isolacionismo setorial entre os vários agentes de governo. A fragmentação entre as ações públicas não apenas conduz à dispersão de esforços e à sobreposição de iniciativas semelhantes, muitas vezes entre órgãos da mesma esfera governamental, mas produz um ambiente fértil para o clientelismo e o assistencialismo que ainda caracterizam dimensões da política brasileira. Esta redundância é na verdade derivada da dificuldade de coordenação entre as esferas de governo. Os vários agentes oficiais não compartilham informações, análises e experiências, o que acaba resultando em programas menos efetivos, com dificuldades de cobertura e focalização. Presidente do Instituto Pereira Passos e Coordenadora da UPP Social. Ex- Secretária Municipal de Fazenda do Rio de Janeiro, é doutora em Economia pela PUC-RJ e atuou como assessora financeira no BNDES. Foi sócia do grupo BBM e fundou a empresa de tecnologia RiskControl.

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Estes problemas são agravados pelo isolacionismo setorial na máquina pública – a tendência, manifesta entre os vários organismos governamentais, a executarem suas políticas isoladamente, pouco compartilhando com os demais agentes públicos. No Rio de Janeiro, temos em curso um modelo que vai de encontro a esses gargalos – fragmentação, sobreposição e isolacionismo – e também dialoga com os desafios da integração da cidade e da redução da desigualdade: a UPP Social. Esta metodologia, que agora expomos, vem sendo desenvolvida desde 2010, a princípio no âmbito do governo do Estado, e depois na Prefeitura do Rio, por uma equipe que teve como coordenadores Ricardo Henriques, Jose Marcelo Zacchi e Tiago Borba6. Soma-se a este artigo como fonte de informação, o site do programa www.uppsocial.org, com uma rica base de dados sobre os territórios, e que iremos expandir muito no futuro próximo. Parte da minha contribuição, neste curto período de dois meses desde que assumi a presidência do IPP, foi aproveitar a iniciativa do Ministro Reis Velloso, que reuniu neste evento, em volta da mesma mesa, agentes públicos, lideranças comunitárias e iniciativa privada e o diagnóstico feito por Marilia Pastuk e Vicente Pereira no livro Favela como oportunidade para ampliar e consolidar um aspecto fundamental do modelo de atuação da UPP Social: a articulação com outros agentes além dos órgãos municipais. A metodologia do programa e a forma pela qual pretendemos atingir o objetivo da articulação está descrita abaixo. Um programa social para as comunidades pacificadas Em outubro de 2012, a cidade do Rio de Janeiro contabiliza 22 territórios pacificados e 28 UPPs, com um total de 120 comunidades e pouco mais de 400 mil moradores em seu interior. Desde 2008, esses números vêm se expandindo continuamente, com a projeção pelo Governo do Estado da instalação de 40 UPPs até 2014.

Além do desenvolvimento da metodologia propriamente dita, todos os citados contribuíram com ideias e insumos para a produção deste artigo, no qual também tive a colaboração de Anabela Paiva. A concepção e desenvolvimento da metodologia do programa UPP Social teve a participação de vários outros colaboradores, como Pedro Strozemberg, Silvia Ramos, Jailson Souza e Silva, entre outros.

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1- Andaraí; 2 – Batan; 3-Borel; 4 – Chapéu-Mangueira/Babilônia; 5-Cidade de Deus; 6- Complexo da Penha; 7- Complexo do Alemão; 8-Escondidinho-Prazeres; 9- Fallet/ Fogueteiro/Coroa; 10 – Formiga; 11- Macacos; 12 – Mangueira-Tuiuti; 13- Pavão-Pavãozinho/Cantagalo; 14- Providência; 15- Rocinha; 16 –Salgueiro;17- Santa Marta; 18 – São Carlos; 19- São João; 20 – Tabajaras/Cabritos; 21- Turano; 22 - Vidigal

É este o universo de atuação da UPP Social. Áreas historicamente marcadas pela presença precarizada do poder público, além da informalidade urbana e econômica e da insegurança, e que agora ocupam o centro do foco para a reversão dessas disparidades. Esta não é, no entanto, uma missão para um só agente público, ou mesmo para apenas alguns deles: ao contrário, é tarefa que só pode realizar-se se envolver a todos, de maneira articulada e coordenada. Trata-se de garantir, passo a passo, que cada secretaria e órgão municipal faça-se presente de maneira adequada, desempenhando suas atribuições particulares de acordo com as demandas específicas de cada território. Este objetivo, por sua vez, embute outras duas exigências fundamentais: o planejamento de ações considerando as diferenças nas realidades entre territórios e dentro de cada um deles; e o envolvimento efetivo das comunidades locais neste processo, como requisito para a integração plena e a efetividade dos esforços. Assim, a UPP Social é essencialmente um programa de coordenação: da atuação nas áreas pacificadas de todos os órgãos da Prefeitura e de seus parceiros; da interlocução entre eles e os moradores e organizações das comunidades; da elaboração qualifica31


da de agendas de trabalho adequadas para cada território. A iniciativa consolida um novo espaço de gestão, capaz de corresponder à complexidade do desafio da integração e de semear inovação nas práticas de articulação intersetorial, participação social e gestão de informação no âmbito do Município. Deste esforço, resulta a presença ampliada e aprimorada do poder público nas comunidades, somando velocidade e efetividade às ações já acumuladas nos últimos anos. Desde 2009, foram investidos pela Prefeitura mais de R$ 1 bilhão apenas nas áreas pacificadas, em ações de urbanização, habitação, construção e reforma de equipamentos sociais, melhorias na coleta de lixo e na iluminação pública, entre outras frentes. Programas sociais fundamentais, como "Cartão Família Carioca", de complementação ao Bolsa Família no combate à pobreza; "Espaços de Desenvolvimento Infantil" e "Escolas do Amanhã", de qualificação da educação infantil e fundamental; “Saúde Sempre Presente”, que expandiu o acesso à atenção básica em saúde com base na "Estratégia da Saúde da Família" e das Clínicas da Família",; além de iniciativas diversas de acesso à cultura, esporte e lazer, passaram a alcançar essas áreas, suprindo ausências e reduzindo distâncias acumuladas historicamente. Outras ações municipais complementam este processo, combinando-se com a expansão também da atuação dos governos estadual e federal, da sociedade civil e do setor privado, em leque amplo e necessário de iniciativas que a UPP Social busca cotidianamente apoiar e articular de maneira positiva. Estrutura de Gestão Coordenar é mais do que uma abstração, como tem de ser a atenção aos desafios de intersetorialidade, participação, territorialização e uso qualificado de informações para a efetividade da gestão pública. Por isso, a UPP Social estrutura-se na forma de um ambiente de gestão inovador, com equipe, ferramentas e rotinas de trabalho voltadas a realizar na prática esses objetivos. Estabelecido no âmbito do Instituto Pereira Passos (IPP), órgão de planejamento e informações da Prefeitura, e contando com a parceria do Programa das Nações Unidas para Assentamentos Humanos – ONU-Habitat, este ambiente conta com três unidades principais de atuação: gestão territorial, gestão institucional e gestão de informação. 32


As equipes de gestão territorial distribuem-se por todas as comunidades pacificadas, atuando cotidianamente na interlocução com suas organizações e lideranças, na captação de demandas e informações locais e no apoio e acompanhamento da implantação de ações pelos órgãos da Prefeitura e por outros parceiros. Com isso, ampliam o acesso regular dos moradores ao poder público e fomentam a participação e o exercício da cidadania, ao mesmo tempo em que enriquecem a base de informações do Município sobre demandas da comunidade e ações realizadas em cada território. Em 2012, a equipe territorial ganhou a preciosa adesão de 57 agentes de campo. Moradores de favelas pacificadas, com idades entre 21 e 53 anos, esses homens e mulheres estão participando da agenda pública de forma qualificada, sendo capacitados através de formação contínua proporcionada pelo programa, e também ensinando a nós, gestores públicos. Uma colaboração que estabelece novas possibilidades de interlocução entre o poder público e a população dessas comunidades. Além da presença regular nos espaços de organização e diálogo já existentes nas comunidades, as equipes de gestão territorial promovem reuniões comunitárias regulares da UPP Social para o acompanhamento e discussão coletiva das agendas de trabalho no território, e articulam ações setoriais da Prefeitura com o envolvimento dos moradores. Em paralelo, dedicam-se à produção de informações e diagnósticos, como os Mapas Rápidos Participativos (MRPs)7, que alimentam continuamente um sistema de informações sobre demandas e pontos de atenção nas comunidades. Por fim, oferecem suporte contínuo à realização de ações diversas nos seus territórios de atuação. A unidade de gestão institucional, por sua vez, articula-se com uma rede de gestão formada por um(a) representante de cada órgão da Prefeitura, responsável pela interlocução deste com a UPP Social. Considerando os serviços e ações já existentes ou programados em cada território e as demandas identificadas pelas equipes de gestão territorial, são estabelecidas agendas de trabalho com os órgãos municipais correspondentes. Assim, além de impulsionar a Prefeitura a produzir respostas às demandas, são estabelecidas prioridades e viabilizada a conso7 Metodologia que identifica, a partir de entrevistas, dados e informação de campo, os diferentes graus de urbanização e acesso a bens e serviços públicos entre as diferentes comunidades de um mesmo território, permitindo a focalização de ações para áreas prioritárias.

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lidação de uma atuação coordenada e efetiva nos territórios pacificados. Por sua vez, o monitoramento dos processos e resultados alcançados viabiliza a avaliação da cobertura e qualidade dos serviços prestados pela Prefeitura e colabora para produzir inovações na elaboração e implantação de políticas públicas focadas no território. Por fim, o núcleo de gestão de informação, alimentado pela condição do IPP de repositório principal de informações sobre a cidade, disponibiliza bases de dados e diagnósticos diversos sobre os territórios em foco e apoia a organização das informações sobre demandas e ofertas reunidas pelas unidades de gestão territorial e institucional, permitindo assim o cruzamento qualificado entre elas, o estabelecimento de planos de trabalho bem direcionados e o monitoramento contínuo de esforços e resultados.

Essas três dimensões conjugam-se deste modo em um modelo de atuação que busca articular ações com agilidade e efetividade para atingir metas de integração das comunidades. Um sistema de gestão online abriga e organiza as várias informações produzidas e permite o acompanhamento sistemático do atendimento às demandas, da execução das ações programadas e do alcance das metas, enquanto o site do programa (www.uppsocial.org) difunde publicamente as informações e esforços acumulados. 34


Ciclo de Ação A atuação da UPP Social em um novo território é deflagrada nos dias seguintes à operação policial que dá início à pacificação da área e abre caminho para a instalação posterior da UPP. Já neste momento, assim que a Secretaria de Segurança Pública do Governo do Estado informa haver condições para tanto, a equipe da UPP Social inicia as atividades de pré-implantação do programa, com o estabelecimento de contatos e identificação de demandas nas comunidades, o mapeamento de equipamentos e serviços públicos já disponíveis e a reunião de bases de dados e informações existentes sobre a área. Simultaneamente, é iniciado um esforço intensivo de melhoria das condições de conservação de espaços públicos, limpeza urbana e coleta de lixo e iluminação pública na área, além de outras ações emergenciais identificadas em cada caso. Essas frentes mobilizam o programa até a instalação definitiva da UPP no território, que encerra no âmbito da segurança a fase de estabilização da pacificação e a converte na provisão regular dos serviços de policiamento comunitário. A chegada da UPP é seguida pela realização do "Fórum UPP Social", que reúne lideranças comunitárias e instituições locais, representantes de órgãos diversos da Prefeitura e do Governo do Estado e convidados de organizações da sociedade civil e do setor privado, marcando o lançamento do programa na área e consolidando a presença permanente da sua equipe de gestão territorial. A partir daí, um plano de ações iniciais, resultante da etapa de pré-implantação começa a ser implementado, articulando ações diversas do Município e parceiros no território. O plano é continuamente atualizado com as novas demandas identificadas e esforços mobilizados. Atividades comunitárias e grupos de trabalho temáticos abrigam a colaboração entre órgãos municipais, parceiros e organizações locais na superação de desafios, e a atualização regular das informações ampara o monitoramento de avanços e a formação de novas agendas. Com a UPP Social, a Prefeitura do Rio mobiliza energias e cria instrumentos para atingir uma meta estratégica: prover aos moradores dos territórios pacificados o acesso a bens e serviços públicos com qualidade compatível com as demais áreas da cidade. Uma tarefa a exigir rumo e perseverança, tal como previsto com a inserção do programa UPP Social no Plano Estratégico da Prefeitura para o período entre 2013 e 2016. 35


A favela no mapa Além das ações já descritas, a UPP Social mobilizou suas equipes de campo para o desenvolvimento de mapas sobre os territórios pacificados. Até a década de 1960, as favelas não apareciam nos mapas municipais. Hoje, elas já estão assinaladas, mas apenas as principais vias aparecem. Desde maio de 2012, os agentes de campo da UPP Social estão mapeando as ruas, travessas, becos e praças dos 22 territórios pacificados, em um projeto sob a orientação da Redes de Desenvolvimento da Maré, instituição da sociedade civil que em parceria com o Instituto Pereira Passos (IPP) realizou um censo e acaba de lançar um guia de ruas das 16 comunidades da Maré. É importante ressaltar a inovação que essa ação representa: envolver os próprios habitantes das favelas cariocas na produção de um saber que costumava ser reservado apenas a técnicos especializados permite aproveitar o conhecimento empírico dos agentes sobre o território e a sua capacidade de levantar – em tempo curto e com excelente qualidade – informações sobre as comunidades. Para este projeto, os agentes de campo receberam treinamento dos técnicos do IPP, autarquia responsável pela produção dos mapas oficiais da cidade. Os especialistas do Instituto também estão validando o mapeamento realizado. No Forum Nacional apresentamos como exemplo o mapeamento da área da UPP Pavão-Pavãozinho/Cantagalo.

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O resultado desse mapeamento será disponibilizado para a Prefeitura, para validação dos logradouros, dando início ao reconhecimento de endereços, primeiro passo para a regularização fundiária. Ele também estará disponível para todos os agentes públicos, as comunidades e todos os interessados no Armazém de Dados, portal de informações do IPP, e no site da UPP Social. Plano de desenvolvimento das favelas Após a descrição das atividades da UPP Social, passo a comentar o objetivo estratégico que mobilizou os parceiros convidados para este painel do Forum Nacional: a discussão de um Plano de Desenvolvimento das Favelas para sua Inclusão Social e Econômica com foco em cinco comunidades: Borel, Cantagalo, Pavão-Pavãozinho, Manguinhos e Rocinha. Nessa empreitada, os principais desafios são a integração – assegurar que as várias instituições envolvidas, tanto do setor público quanto do privado, estejam alinhadas na discussão e no planejamento conjunto de ações – e a representatividade – garantir que as principais organizações comunitárias de cada território, com seus vários modos de atuação e propostas, participem, produzam contribuições e sejam corresponsáveis pela sua execução. Este plano, que já está em desenvolvimento, consiste de quatro etapas: 37


 Levantamento geral das demandas locais e da oferta de serviços, programas e projetos;  Qualificação das demandas e cruzamento com a oferta;  Planejamento Integrado;  Implementação do Plano de cada Comunidade. A primeira fase, o levantamento geral das demandas locais e da oferta de serviços, programas e projetos, já foi superada na maioria dos territórios envolvidos. Aos estudos realizados por Marilia Pastuk e Vicente Pereira para o livro Favela como Oportunidade, somam-se ações de diversos entes. Como relatei, a UPP Social, por exemplo, tem realizado desde junho de 2011 o levantamento, qualificação e consolidação das principais demandas de quatro das cinco localidades envolvidas. Apenas em uma – Manguinhos, onde não foi iniciado o processo de pacificação – este levantamento não foi realizado. Sendo assim, precisaremos nos dedicar a qualificar as demandas levantadas em Manguinhos, cruzando-as com informações, dados e análises já existentes sobre o território. Nos outros quatro locais, o processo de qualificação já foi feito pela UPP Social no que diz respeito aos serviços municipais, o que é sempre atualizado por novas informações e interlocuções com os moradores. As demandas precisam, agora, ser comparadas à oferta de bens e serviços, tanto os oferecidos pelo governo municipal, estadual e federal, quanto os disponibilizados pela iniciativa privada, instituições religiosas e ONGs, para o desenho de estratégias de ação. Nesta etapa, é importante um planejamento integrado por parte dos agentes públicos, e o primeiro passo necessário é mapear as responsabilidades e avaliar a legislação existente. A partir desse casamento, será possível formular um plano de ação específico para cada área, conjugando todos os atores sociais relacionados ao território, públicos, privados e da sociedade civil, levando em conta as restrições orçamentárias e elegendo prioridades. Um modelo de atuação articulando todos esses atores está a seguir.

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Com o protagonismo das comunidades locais e o compromisso e articulação dos vários atores, públicos e privados, envolvidos, poderemos então iniciar a implementação de um Plano Integrado para o Desenvolvimento de cada comunidade, construído a partir da mobilização e integração de todos os parceiros do plano. Como uma ferramenta para acelerar e facilitar este processo, o IPP pretende lançar em breve o projeto Rede Comunidade Integrada, do qual participarão os vários agentes municipais e estaduais, além da iniciativa privada e, principalmente, as organizações locais. A iniciativa terá os seguintes objetivos:  Desenvolvimento de portais comunitários para as várias localidades • implantar uma rede virtual das organizações presentes nos territórios: informações, processos e resultados concentrados em um só ambiente; • fortalecer a comunicação, produzindo a rápida troca de informações e a visibilização das iniciativas de cada instituição pelas demais, assim como pela sociedade; • facilitar o casamento de demanda e oferta qualificadas para promover o desenvolvimento das comunidades. 39


 Desenvolvimento local • Promover a prática de empreendedorismo e gestão profissionalizada de organizações da sociedade civil (OSCs); • Capacitar organizações comunitárias e outras instituições para mobilização e captação de recursos, assim como para a prestação de contas sobre os mesmos; • articular a oferta de trabalho voluntário, cursos e projetos sociais. Abaixo, um exemplo do que poderá ser a estrutura do portal, integrando os vários agentes públicos, privados e locais no Borel.

O modelo acima é apenas um primeiro diagrama do conteúdo que estará disponível no portal de cada território de UPP. O site será a ferramenta de interação da rede integrada local, no qual se articularão todas as iniciativas existentes no território. As propostas e ações descritas representam ainda uma fase inicial dos esforços para integração das áreas pacificadas. A superação do legado do controle armado e a efetivação da integração desses territórios exigem tempo, mas representarão mais um legado fundamental para a virada e renovação vividas pelo Rio de Janeiro. 40


Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos: Protagonismo e Desenvolvimento Social como Política Pública Daniel Misse8

Introdução O livro “Favela Como Oportunidade” trouxe diversas questões referentes a cinco comunidades da cidade do Rio de Janeiro: Pavão-Pavãozinho, Cantagalo, Borel, Rocinha e Manguinhos. Como propostas comuns para essas comunidades temos: Regularização Fundiária; Criação de Plano de Inclusão Socioprodutiva; Integração dos serviços públicos e das ações dos entes governamentais; cursos técnicos que atendam às demandas locais; apoio e fomento às atividades de empreendedorismo; melhora da comunicação comunitária; atenção especial à juventude; fortalecimento do protagonismo social; melhoria do acesso e desempenho escolar; e ampliação de atividades de esporte e cultura. O presente artigo tem como objetivo apresentar os principais programas da Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos nas cinco favelas selecionadas pelo Fórum Nacional do Instituto Nacional de Altos Estudos, propondo intervenções com o foco no protagonismo e no desenvolvimento social dessas comunidades como parte de uma política pública. Inicialmente, apresentamos o centro de nossas ações nos territórios, os gestores sociais do Programa Territórios da Paz. Em seguida, descrevemos as diversas ações que temos nos territórios, bem como as que estão sendo implementadas em parcerias com o Ministério da Justiça e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Por fim, na conclusão, fazemos um balanço das principais propostas do “Plano de Favelas” e apresentamos o que vimos realizando no que se refere ao mapeamento apresentado no livro. 1. O Programa de Gestão Social – Territórios da Paz e o Comitê Executivo de Políticas Sociais (CEPS). O Programa de Gestão Social – Territórios da Paz vem atuando desde 2010 em comunidades pacificadas ou em processo Superintendente de Territórios. Subsecretaria de Defesa e Promoção dos Direitos Humanos e Territórios. Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos.

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de pacificação na cidade do Rio de Janeiro. A proposta se iniciou como projeto piloto na Providência e na Cidade de Deus. A idéia era trabalhar com mobilização comunitária buscando o protagonismo social para a promoção do desenvolvimento comunitário de forma participativa. Em abril de 2011 entram mais três equipes em atividade: Complexo do Borel, Complexo do Alemão e Complexo do São Carlos. A proposta é que se trabalhe a partir das experiências da Cidade de Deus e da Providência as temáticas locais, procurando as demandas existentes e promovendo a participação na construção de políticas públicas. Por fim, em novembro de 2011, entram mais 12 equipes em atividade, abrangendo todos os 17 territórios pacificados ou em processo de pacificação, à exceção de Mangueira e Complexo da Penha. Como parte da formação de toda a equipe, é organizado o I Seminário de Gestão Pública em Áreas Pacificadas, tendo a presença na mesma mesa de acadêmicos, políticos e lideranças comunitárias. Nos três dias de evento foram separadas 5 mesas de apresentação e 2 Grupos de Trabalho durante a tarde. Cada mesa teria como temática uma comunidade pacificada onde o programa de gestão atuava até novembro de 2011: Complexo do São Carlos, Borel, Alemão, Providência e Cidade de Deus. Como resultado desse seminário e a partir da entrada das equipes novas em atividade, o programa de Gestão Social – Territórios da Paz passa a se estruturar em cinco eixos fundamentais de ação: mapeamento dos territórios; Integrar ações das superintendências e dos projetos da SEASDH no território; Integrar ações das Secretarias de Estado; Focar em ações para a juventude; e Aumentar a integração com o Município. Esses eixos de ação se configuram em metas traçadas, que preveem outro grupo de ações a serem realizadas para a consecução dessas metas, conforme a tabela a seguir. Metas

Prazo

Ações

Mapeamento dos territórios

23/12/12

Mobilização das equipes de gestão para mapeamento por áreas Realizar pesquisa sobre a juventude nas áreas pacificadas 42


Integrar ações das superintendências da SEASDH e dos projetos no território

permanente

Através do mapeamento de demandas

Integrar ações das Secretarias

permanente

Através do mapeamento de demandas

Focar em ações para a juventude

permanente

Organizar reuniões com jovens para promover a integração através do que os motiva

Através de projetos

Através de projetos

Propor ações conjuntas com os CRJ’s e promover a sua maior integração ao território Aumentar integração com o Municipio

permanente

Encaminhar demandas a UPP Social Encaminhar demandas à prefeitura Encaminhar população ao CRAS, CREAS, CAP, CRE, CAPSad. Criar uma Rede de Assistência Integrada Social (RAIS) em cada comunidade, envolvendo representantes dos serviços públicos locais.

Tratam-se, portanto, de metas focais que planejam a atuação do programa de Gestão Social – Territórios da Paz e são monitoradas e avaliadas através de quatro dispositivos: relatório mensal de atividades; reunião geral mensal das equipes com a coordenação do programa; reunião de cada uma das equipes com a coordenação do programa mensalmente; acompanhamento de coordenadores às principais reuniões comunitárias. Desta forma, a metodologia utilizada é a participativa, construindo uma relação de confiança e mediação. Pensar a gestão pública como propositiva e não somente como resolução de problemas. A própria construção de um orçamento participativo ou de projetos conjuntos com diversos grupos sociais pode ser uma das bandeiras do gestor social. 43


Primeiro, o gestor deve se articular com as superintendências da SEASDH, aumentando sua inserção e ajudando na promoção dos direitos humanos. Em seguida, através do mapeamento por área de serviço público (Educação, Cultura, Saúde, Segurança, Assistência Social, Trabalho e Renda, etc.), articular políticas públicas no âmbito intergovernamental, trazendo soluções às demandas encontradas. Por fim, elaborar junto com a comunidade um plano de desenvolvimento local, propondo pensar o que cada comunidade considera desenvolvimento para a construção de uma política pública participativa de sorte a nortear as ações do Estado nessas áreas da cidade e evitar sobreposição de ações. Apesar de trabalharmos inicialmente com dados populacionais oficiais do IBGE e levantamentos dos Centros de Referência para a Juventude (CRJ) relativos à população jovem nas comunidades cariocas, o trabalho de campo tem revelado grande hiato entre o que os dados oficiais do IBGE indicam e o tamanho real da população em cada território. Há diversos institutos com mapeamentos distintos, indicando uma densidade populacional diversa. O que o programa de Gestão Social – Territórios da Paz vem levantando é o que a própria comunidade indica como limites de onde moram e qual a população reivindicada, segundo suas estimativas locais. Seria uma forma de devolver à população a legitimidade na construção de seu bairro e de sua identidade local. Como os principais objetivos do programa de Gestão Social se dão pela busca do protagonismo e do desenvolvimento social, temos como principais atribuições das equipes de gestão o seguinte esquema:

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Ao longo desse período, as principais conquistas do Programa de Gestão Social – Territórios da Paz foram: • Realização dos Jogos Abertos da Cidade de Deus e da Região Portuária anualmente; Eventos esportivos diversos (Rocinha, Providência, Vidigal e Alemão de Braços Abertos; Copa Claro de Futebol); • Criação em parceria com o SEBRAE de Pólos de Comércio, Gastronômicos e de Turismo na Cidade de Deus, Rocinha, Macacos, Chapéu Mangueira, Babilônia, Cantagalo e Pavão-Pavãozinho; • Integração de projetos públicos e privados às comunidades (projetos esportivos, de emprego e renda, mediação de conflitos e acesso à Justiça, promoção da inclusão social – Exs.: CRJ, Casa de Direitos, Justiça Comunitária, Núcleos de Prevenção à Violência, etc; • Eventos de Integração Favela-Cidade (Realização da Rio +20 nas Comunidades; Comunidade na Praça); • Acesso à informação e promoção da integração intercomunitária (Plano de Comunicação do Conjunto de Favelas do Borel); • Melhoria no relacionamento Polícia-Comunidade (Plano de Formação em Direitos Humanos); • Promoção de Igualdade Racial (Vidigal); Promoção dos Direitos da Mulher e LGBT (Providência); • Grupos de Trabalho que produziram relatórios entregues à Secretaria de Educação sobre o Programa Autonomia e à Ciência e Tecnologia sobre cursos técnicos nas comunidades pacificadas; Projeto Memórias nas Comunidades Pacificadas; • Plano de Mobilização Sócio-Ambiental (Cantagalo e Pavão-Pavãozinho); • Organização de Grupos de Trabalho de Comércio, Educação, Saúde, Esportes, Mulheres, Juventude (inserção de jovens na Conferência para a Juventude), Habitação, dentre outros. 1.1.  O Comitê Executivo de Políticas Sociais (CEPS). Instituído pelo Decreto nº 42.909 de 01 de abril de 2011, tem como objetivo coordenar e integrar as diversas ações a serem realizadas pelos órgãos públicos estaduais nos territórios pacificados em que foram instaladas Unidades de Polícia Pacificadora – UPP’s. 45


São atribuições do CEPS: • Contribuir para a superação da fragmentação das políticas sociais visando à efetividade e à eficiência das ações, ampliando a sustentabilidade e o alinhamento estratégico das ações sociais do Governo do Estado; • Promover a articulação com as políticas públicas das demais esferas de governo e iniciativas da sociedade civil; • Acompanhar a execução dos programas intersetoriais; • Promover o desenvolvimento local e a redução das desigualdades sociais e ampliação dos direitos de cidadania. O CEPS é composto por doze Secretarias de Estado e a Defensoria Pública, sendo coordenado pela Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos (SEASDH). Composição do CEPS: • Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos (Coordenação); • Secretaria de Estado da Casa Civil; • Secretaria de Estado de Educação; • Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico, Energia, Industria e Serviços; • Secretaria de Estado de Habitação; • Secretaria de Estado de Saúde e Defesa Civil; • Secretaria de Estado de Trabalho e Renda; • Secretaria de Estado de Turismo; • Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia; • Secretaria de Estado de Esporte e Lazer; • Secretaria de Estado de Cultura; • Secretaria de Estado de Ambiente; • Defensoria Pública do Estado do Rio do Rio de Janeiro. Como forma de trazer demandas e organizar projetos provenientes de grupos de trabalhos do CEPS, surge o programa Territórios da Paz, programa de gestão social focado principalmente na escuta qualificada e no diálogo com a comunidade, de sorte a melhorar a interlocução entre o Estado e a sociedade civil organizada. Desta forma, os gestores sociais são o braço do CEPS no território. 46


2. Centros de Referência da Juventude e O Programa de Inclusão Social e Oportunidades para Jovens no Rio De Janeiro. 2.1. Os Centros de Referência da Juventude. O desafio de pensar espaços de juventude de modo amplo, crítico e inovador mobilizou a Superintendência de Estado de Políticas Públicas para a Juventude a criar o Centro de Referência da Juventude (CRJ). Atualmente em dez comunidades do Rio de Janeiro, os CRJs tem como objetivo principal apresentar novas perspectivas de futuro para a juventude, através da inclusão social de jovens de comunidades de baixa renda, em situação de risco social e/ou pessoal. O método desenvolvido pelos centros valoriza as especificidades de cada localidade e por isso os equipamentos são montados dentro de cada comunidade, livres de barreiras, privilegiando a criatividade, idéias e gerando oportunidades sociais e econômicas para a juventude desses territórios. Para isso, o Centro de Referência da Juventude executa cursos, atividades esportivas e culturais com estratégias socioeducativas para agir na formação de valores e atitudes, buscando, assim,uma alteração de perspectiva e a ruptura de condutas de risco social e individual. O CRJ também se coloca como facilitador no acesso aos serviços públicos e privados e com a escola em suas demandas e desafios. Os primeiros CRJ`s instalados foram os da Cidade de Deus, Cantagalo, Manguinhos e Jacarezinho. Em 2011, A SEASDH inaugurou quatro novos CRJ`s no Estado. Começou pela comunidade da Providência, seguido pelo do Complexo do Alemão, que funciona na estação do teleférico do Alemão. O programa também chegou à comunidade de Vila Ipiranga, em Niterói, e a Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. O primeiro CRJ inaugurado em 2012 é o de Silva Jardim, na Baixada Litorânea. 2.2. O Programa de Inclusão Social e Oportunidades para Jovens no Rio de Janeiro. A cooperação firmada entre o Governo do Estado do Rio e o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) para a implantação de um programa de atenção integral à juventude, tem como processo inicial beneficiar moradores entre 15 e 29 anos de idade de sete áreas pacificadas. São elas: Complexos do Alemão e da Penha, Borel, Cidade de Deus, Batan, Providência e São Carlos. A ideia é 47


expandir o programa progressivamente para as demais áreas que já tenham recebido Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) até 2014. O objetivo é trabalhar com jovens em situação de risco ou remanescentes do sistema socioeducativo, promovendo o acompanhamento psicossocial realizado por tutores e conselheiros nos Centros de Referência da Juventude (CRJ’s), contando com a ajuda de profissionais para retomarem os estudos e buscarem uma formação profissional. Articuladores comunitários selecionados entre os próprios jovens da comunidade trabalhará junto com os gestores sociais aproximando o programa do seu público e ajudando na capilarização de suas ações. O foco é em promover o acesso dos adolescentes e jovens em situação de vulnerabilidade social às políticas sociais governamentais em territórios pacificados pelas UPPs. Para tanto, está sendo articulada uma cooperação entre várias Secretarias de Estado para a integração de diversos serviços voltados para os jovens, de sorte a dar um suporte às ações dos conselheiros e tutores. A metodologia de trabalho propõe quatro ações estruturais básicas: Atenção Integral ao percurso formativo do jovem; Ampliação e aprimoramento dos serviços e equipamentos já existentes no território; Elaboração de um novo cardápio para o percurso formativo integral do jovem; Ambiente de integração das ações no território. Estima-se que serão beneficiados direta e indiretamente pelo programa, cerca de oitenta mil jovens, com um investimento total de cerca de R$ 180 milhões ao longo de quatro anos. 3. O Programa Justiça Comunitária e os Núcleos de Prevenção à Violência. 3.1. O Programa Justiça Comunitária. O programa Justiça Comunitária é um programa de acesso à justiça, no âmbito do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (PRONASCI), que está sendo implantado no Estado do Rio de Janeiro através de convênio firmado entre o Ministério da Justiça e a Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos. O investimento é de cerca de R$ 2 milhões. Seu principal objetivo é contribuir para a democratização do acesso à justiça, por meio de métodos alternativos de solução 48


de conflitos, baseados em práticas costumeiras e comunitárias de mediação. A mediação atua no conflito com a perspectiva de crescimento humano e a reestruturação dos laços comunitários através do exercício do diálogo. Nesse processo, espera-se que a resposta seja alcançada pelos próprios envolvidos, cabendo ao mediador – nesse caso o agente comunitário capacitado para tal fim, com apoio profissional designado - conduzir o procedimento. Com a participação dos agentes comunitários, capacitados para empregar técnicas de mediação, o propósito do Programa é garantir a autonomia das partes na solução de seus problemas e de suas demandas e promover o empoderamento local. O programa tem como ações norteadoras - resgatar, valorizar, e garantir às comunidades socialmente excluídas o contato com o direito formal, aplicado na sua informalidade dentro do contexto social, econômico e cultural a partir do conhecimento teórico dos operadores do direito e de toda equipe multidisciplinar, em parcerias com os mediadores comunitários. No Estado do Rio de Janeiro, estão sendo implantados 07 (sete) Núcleos de Justiça Comunitária, nas seguintes localidades: Manguinhos, Nova Iguaçu, Complexo do Alemão, São Gonçalo, Borel, Cidade de Deus e Morro da Providência. Cada Núcleo contará com uma Equipe Multidisciplinar constituída por 01 advogado, 01 psicólogo, e 01 assistente social, 01 apoio administrativo, 04 estagiários e 30 mediadores comunitários, contratados através de um processo seletivo de análise curricular e realização de entrevistas. Durante o período de maio e julho de 2011, foram realizadas visitas de mobilização nestes locais e oficinas de sensibilização sobre a proposta do programa à população local. Mais de 300 pessoas participaram destas oficinas que foram conduzidas pela Dra. Juíza Glaucia Foley, idealizadora do projeto em Brasília, e pela equipe da Superintendência de Defesa e Promoção dos Direitos Humanos, com o apoio dos gestores locais e supervisores das ações do PROTEJO e das Mulheres da Paz que atuavam nestas comunidades. Os profissionais foram selecionados e, no final de abril de 2012, passaram por um Curso de Formação em Mediação de Conflitos ministrado pela equipe do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Os primeiros núcleos estão sendo inaugurados em outubro de 2012. 49


3.2. Os Núcleos de Prevenção à Violência. A articulação das ações do Estado nos territórios é feita pelos gestores sociais. A ideia é que eles façam o monitoramento e controle externo de todos os serviços, promovendo sua integração com a população local. Os núcleos estariam, juntamente com o Programa de Gestão Social - Territórios da Paz, no centro das demandas comunitárias, porém focalizando em ações finalísticas em três principais eixos de atuação: Atendimento e encaminhamento de serviços públicos e assistência social básica; mediação de conflitos e promoção de uma justiça restaurativa; estimular o debate das principais questões comunitárias, promovendo a capacitação em direitos humanos. Os objetivos são: Reduzir a sensação de insegurança, propiciando maior integração comunitária; Ocupar espaço na transição de poder que está em curso nas comunidades com políticas públicas estatais, de sorte a promover a emancipação da população ante o medo; Integrar e reforçar políticas públicas do município, estado e governo federal, ampliando o acesso a serviços e equipamentos públicos; Trabalhar a mediação de conflitos de forma a identificar as principais questões locais e promover uma justiça restaurativa. Os Núcleos de Prevenção à Violência serão implantados em todas as comunidades pacificadas, complementando o trabalho dos gestores sociais, como podemos observar na comparação abaixo: •  Gestores Sociais: Controle e Integração; Escuta e organização de projetos conjuntos; pesquisa e diagnóstico social; porta de entrada e ponto focal na comunidade; metodologia participativa (não chegar com nada pronto); construção coletiva das expectativas sociais. Baseado em Demandas •  Núcleos de Prevenção à Violência: Equipamento de atuação e integração dos serviços da SEASDH, estruturado como um Centro de Referência em Direitos Humanos, tendo como foco: Atendimento; Encaminhamento; Mediação de Conflitos; Mapeamento das principais questões da comunidade para proposta de intervenção. Baseado em Ações Finalísticas 50


Conclusão Retornando às propostas levantadas pelo livro “Favela como Oportunidade”, temos ações que vem sendo realizadas em diversas frentes. O programa de Gestão Social – Territórios da Paz e sua vinculação ao CEPS garantem a articulação necessária para o desenvolvimento de políticas públicas em conjuntos com outras Secretarias de Estado, bem como a integração territorial com o municípios e as organizações sociais. Desta forma, é proposto como paradigma de integração dos serviços públicos os Núcleos de Prevenção à Violência e uma Rede de Assistência e Integração Social (RAIS), coordenada pelos gestores sociais em parceria com todas as entidades públicas e privadas de base comunitária. Com relação aos cursos técnicos que atendam às demandas locais, foi elaborado um relatório de cerca de 300 páginas com entrevista a mais de 800 jovens das áreas pacificadas. Esse relatório foi entregue em maio à Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia, que já está avaliando a reformulação de muitos cursos ofertados nas comunidades. O apoio e fomento às atividades de empreendedorismo nas comunidades se dá principalmente por duas frentes: SEBRAE (projeto pólos e formalização quando cabível) e Investe Rio (micro-crédito para pessoas físicas e jurídicas, sem necessidade de formalização). Entretanto, a organização de Grupos de Trabalho (GT`s) com Comerciantes também vem ocorrendo como estratégia de organização e fortalecimento do empreendedor local, criando um clima de associativismo e ajudando na promoção de atividades culturais e esportivas que ampliem a solidariedade entre as diversas redes sociais. A melhora da comunicação intercomunitária está se dando por várias ações: Plano de Comunicação do Borel, Troca de Saberes, Papo Cabeça, dentre outras ações que integram diversas comunidades e equipes de gestão. A atenção especial à juventude e a melhoria do acesso e desempenho escolar se dá em duas etapas: mapeamento de demandas da juventude com formação de GT‘s de Juventude e Educação; Programa de Inclusão Social e Oportunidades para Jovens no Rio de Janeiro. 51


O fortalecimento do protagonismo social se dá através do estímulo à criação de um Plano de Desenvolvimento Local e promoção de reuniões que estimulem os moradores a pensar projetos e ações locais (reuniões propositivas). A ampliação de atividades de esporte e cultura está sendo planejada em quatro frentes: parcerias com a Secretaria de Estado de Esporte e Lazer e com a Secretaria de Estado de Cultura (promovendo eventos como os Jogos Abertos da Cidade de Deus e da Região Portuária em outras áreas da cidade); convênio com o governo federal para trazer programas como o PELC (programa de esporte e lazer da cidade) e Pintando a Cidadania (fábrica de materiais esportivos) para as comunidades cariocas, gerando engajamento em atividades de grupo, bem como emprego e renda; Parceria com a Claro para a realização de uma copa interfavelas; Capacitação para participação de editais públicos (parceria com o SEBRAE e a EGP-Rio). Desta forma, observamos que as principais propostas do Plano de Favelas estão contempladas pela SEASDH em suas ações, tendo ainda o planejamento de políticas públicas consistentes para a juventude, a integração de serviços públicos, bem como a mediação de conflitos e o acesso a direitos com o objetivo de promover o protagonismo e o desenvolvimento social nas comunidades cariocas.

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A urbanização de favelas de grande porte no Rio de Janeiro Maria Gabriela Bessa9 e Ruth Jurberg10

Introdução Para entendermos a importância do Programa de Aceleração do Crescimento e sua versão no âmbito do Estado do Rio de Janeiro, faz-se necessária uma breve contextualização do processo histórico de constituição das cidades brasileiras, da configuração do espaço urbano e das desigualdades sociais, destacando o significado do conceito de território para as intervenções urbanas nas favelas. O Brasil é considerado um país predominantemente urbano. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), a taxa de urbanização passou de 44,1% em 1960 para 84,3% em 2010.

Fonte: IBGE (Censo)

A situação de precarização e favelização agravou-se a partir da década de 60, quando o Brasil viveu uma explosão urbana que levou um grande número de trabalhadores rurais, sem alternativa de subsistência no campo, a viver e morar nas periferias e favelas das cidades em busca de melhores condições de vida e sobrevivência. De acordo com pesquisa feita pelo Ministério das Cidades, as cidades brasileiras são bastante diferenciadas pelo seu porte, 9 Socióloga, especialista em Política e Planejamento Urbano. Coordenadora do Trabalho Técnico Social. EGP/Casa Civil 10 Urbanista, Especialista em Políticas Publicas e Habitacionais. Coordenadora Geral PAC II. EMOP

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densidade populacional, atividades econômicas, formação social e cultural. Dos 5565 municípios existentes, somente 94 são aglomerados metropolitanos com mais de um milhão de habitantes, e apenas 224 municípios concentram 60% de toda a população brasileira (FERREIRA e UEMURA: 2008). Outro aspecto relevante é que os municípios com até 20.000 habitantes representam 73% dos municípios brasileiros e quase metade da sua população (45% ) vive em áreas rurais. O crescimento urbano vivenciado a partir da década de 1960 fez com que aumentasse também o número de aglomerados subnormais. Enquanto as cidades inchavam, as favelas cariocas cresciam vertiginosamente, com pouco ou nenhum investimento ou acompanhamento público. No caso do Rio de Janeiro, o Poder Público passou décadas ignorando a existência dessas regiões, que cresciam de forma completamente desordenada e sem planejamento por todas as partes da cidade. Nos centros urbanos brasileiros se produz e reproduz as desigualdades sociais cotidianamente, e as favelas são o reflexo mais visível dessa desigualdade. Esses espaços foram produzidos através da autoconstrução nos espaços que “sobram” na cidade formal onde não se pode construir regularmente e, por conseguinte, são desvalorizadas e desprovidas de interesse para o mercado imobiliário. Esses espaços da cidade foram sendo construídos e se consolidaram através de um intenso processo de precarização das condições de vida, tendo como principais características: níveis elevados de subemprego e informalidade nas relações de trabalho; indicadores educacionais, sanitários, econômicos e ambientais abaixo da média; alta densidade demográfica; ocupação por parte do narcotráfico nesses territórios, fazendo com que esses espaços apresentassem um grau de vitimização da população muito maior quando comparado ao restante da cidade. A cidade do Rio de Janeiro foi sendo constituída dentro dessa mesma lógica segregacional, de forma que os bairros de classe média e classe média alta são planejados e objeto de ações de embelezamento. Já nos centros proliferavam os cortiços, as habitações coletivas de aluguel e as favelas, onde a população de baixa renda buscava alternativas próprias para morar próximo ao trabalho, ou mesmo nas periferias distantes, onde a população de baixa renda era realocada e onde não havia oferta de empregos, de serviços e de transportes que pudessem garantir a fixação populacional. 54


Como mencionado anteriormente, a precarização e a favelização pioram a partir da década de 60 quando o Brasil vive uma explosão urbana, que levou um grande número de trabalhadores rurais, sem alternativa no campo, a viver e morar nas periferias e favelas das cidades.

Fonte: IBGE. Censo 2010

Vale citar Rolnik (1997), que em seus trabalhos e estudos sobre cidade e legislação urbana conclui que “as formas de apropriação e uso dos espaços permitidos ou mesmo proibidos, acabam por definir territórios dentro e fora da lei, onde a questão da cidadania plena nem sempre é possível”. Nesse contexto, sobressai uma conquista advinda da luta dos movimentos sociais que foi concretizada através do Estatuto da Cidade (Lei 10.257 de 10 de Julho de 2001), que estabelece os marcos para se pensar e planejar as cidades. O Estatuto da Cidade cria mecanismos de enfrentamento para essas “cidades segregadas e partidas” (Ventura: 1994), pois assegura o direito humano fundamental à moradia, conectando-o à promoção do desenvolvimento sustentável, e tendo como premissa a gestão democrática da cidade. Assim, dando consequência ao marco legal, o Governo do Estado do Rio de Janeiro, considerou estratégica a necessidade de implementar um amplo projeto de urbanização integrada com a partici55


pação da sociedade, baseado no diálogo social e adequado as realidades locais pressupondo a compreensão do território como espaço de relações sociais sempre permeado por contrastes e contradições. O PAC que tem abrangência nacional foi lançado em 2007 englobando um conjunto de políticas sociais e econômicas ,tendo como objetivo acelerar o crescimento econômico do Brasil, sendo uma de suas prioridades o investimento em infraestrutura, em áreas como saneamento, habitação, transporte, energia e recursos hídricos, entre outros. No Estado do Rio de Janeiro foram eleitas 15 cidades, sendo 12 em municípios da Região Metropolitana do Rio de Janeiro e 3 em municípios de outras regiões do Estado. No Estado do Rio de Janeiro, as intervenções se concentram nas comunidades de Manguinhos, Complexo do Alemão, Rocinha e Pavão-Pavãozinho/Cantagalo, que ficam na Cidade do Rio de Janeiro, e Preventório, localizada no Município de Niterói.

O objetivo geral do programa é de transformar intervenções físicas de urbanização em processos de Desenvolvimento Territorial, congregando obras que geram a transformação do território com crescimento econômico e participação comunitária. A proposta inovadora do Estado prevê a Urbanização Integrada onde os componentes físico, social e legal trabalham de forma conjunta e interagem durante todo o projeto, otimizando recursos, acelerando etapas e ampliando o conhecimento do território pelo Governo com comprometimento da população. 56


Conceito de Urbanização Integrada

Em uma análise mais ampla, o PAC - Urbanização de Favelas é uma política pública que tem como objetivo a redução das desigualdades sociais no país e busca garantir o direito à cidade aos habitantes dessas comunidades. Particularmente, no caso fluminense, um dos desafios principais nessas comunidades que conviveram com a ausência do Poder Público durante anos, foi recuperar a credibilidade da população em relação à proposta governamental. Ressalte-se que, por muitos anos, o Estado limitava-se a entrar nas favelas através da força policial, sem contribuir para que os direitos mais básicos dessa população fossem assegurados. O resultado era que a população se mostrava incrédula quanto a investimentos públicos nessas áreas, e credita-se a isso a dificuldade inicial para resgatar essa confiança e implementar projetos envolvendo moradores e lideranças comunitárias no processo de construção da proposta, de forma democrática. A escolha das áreas se deu por critérios técnicos e sociais. Os indicadores existentes e produzidos demonstravam que as comunidades escolhidas tinham insuficiente e inadequada infraestrutura, alto índice de desemprego, violência extrema e falta de equipamentos públicos de saúde, de educação, de assistência social, de esportes e de cultura para atendimento à população. 57


O Governo optou por trabalhar fortemente com a questão social aliada às obras de urbanização e também à questão da regularização fundiária, no sentido de garantir o diálogo social permanente e melhorar de forma efetiva a qualidade de vida desta população. Em cada um dos territórios foram montados pontos de atendimento à população como espaço para o diálogo permanente sob os impactos das obras naqueles lugares. Convencionou-se chamar esses espaços de “canteiros sociais”. Tais espaços tornaram-se a base física para a operacionalização das intervenções do trabalho técnico social. A execução do trabalho baseia-se em três principais áreas de atuação: 1. Gestão de Impactos As grandes intervenções físicas suscitam muitos riscos para o empreendimento e questões de natureza social podem dificultar sua realização. Por isso a “Gestão de Impactos” visa minimizar os impactos negativos causados pelas obras, tais como o transtorno à mobilidade, a interrupção de serviços e a realocação de moradores; e maximizar os impactos positivos, como a geração de emprego e renda e melhorias na infraestrutura e nos serviços ao cidadão e ao território, e a ampliação do diálogo social junto às famílias e empresas locais a serem remanejadas buscando soluções capazes de atender as necessidades do território. Através desse eixo do trabalho é realizado todo o acompanhamento para a realocação, a fim de garantir que os direitos dos moradores sejam totalmente assegurados. Cada família pode escolher uma das três modalidades de reassentamento previstas na regulamentação estadual, através do decreto nº 41.395/2012: a) compra assistida; b) indenização da benfeitoria; ou c) nova unidade habitacional. Até a conclusão dos processos e obras, as famílias são beneficiárias do pagamento do aluguel social mensal.

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Processo de Realocação

2. Desenvolvimento Territorial Este eixo se baseia no tripé da sustentabilidade, que tem como elementos o crescimento econômico, o equilíbrio ambiental e a equidade social. No desenvolvimento do Trabalho Social são formados Comitês de Acompanhamento das Obras, de Remanejamento e de Geração de Renda, no sentido de divulgar todas as ações e atividades com o objetivo de minimizar conflitos decorrentes de obras e de estabelecer uma relação de proximidade com o Governo. Outro ponto importante é o apoio às famílias/negócios na adaptação pós-ocupação com capacitações em conservação patrimonial e gestão condominial, além da implementação do Plano de Inserção para o Trabalho e Renda, a fim de garantir a sustentabilidade dessas famílias após terem passado por transformações nas suas vidas ou em seu negócio. Como exemplos da proposta de metodologia participativa, foram realizadas diversas reuniões ampliadas e fóruns com a participação de mais de 1500 moradores e ONGs locais, resultando 59


em Planos de Ações Prioritárias para cada uma das regiões. Podemos considerar como um dos maiores legados dessa metodologia a constituição do Comitê Comunitário de Manguinhos e da Câmara Comunitária da Rocinha, São Conrado e Gávea. Essas instâncias foram fomentadas durante o processo do PAC para que pudessem, após a saída do trabalho técnico social, acompanhar o funcionamento dos equipamentos implantados, bem como articular para que outros serviços e equipamentos pudessem ser implementados. Hoje esses grupos são profundamente reconhecidos e considerados legítimos. Outra etapa importante da metodologia desenvolvida é a educação sanitária e ambiental. A partir deste eixo foram elaboradas campanhas educativas e de sensibilização da população visando minimizar os impactos negativos relativos ao ambiente. A questão ambiental é um dos aspectos mais relevantes e difíceis de serem tratados. Ressalte-se que de uma maneira geral cabia à própria população o manuseio dos resíduos sólidos, na medida em que o Poder Público não realizava coleta regular nessas regiões, e, em alguns casos, nem mesmo possuía uma rotina de coleta de lixo pelas dificuldades de logística e de circulação de veículos próprios para a coleta. Outras vezes, o controle territorial pelos narcotraficantes impedia o trabalho de limpeza urbana pública. Em virtude de tudo isso, tem sido estratégica a realização de campanhas educativas, oficinas de reaproveitamento de material reciclável e parcerias efetivas com a Companhia Municipal de Limpeza Urbana – COMLURB. Além disso, no Pavão Pavãozinho e Cantagalo está sendo executado o mapeamento de uma ecotrilha, onde estarão devidamente identificadas todas as espécies nativas. A difusão de trilhas ecológicas é uma forma eficaz de criar uma maior consciência em relação ao meio ambiente, além de ajudar na valorização do espaço. Outra ação de sucesso na questão ambiental é a coleta seletiva de óleo de cozinha, trocado por produtos de limpeza de forma gratuita. Esta atividade trouxe benefícios concretos ao meio ambiente e economia para a população, além de criar uma maior consciência ambiental e geração de renda aos envolvidos no processo. Na questão do emprego e renda foram estabelecidas parcerias com empresas do entorno das comunidades e ofertados cursos de capacitação para moradores, qualificando-os e requalificando60


-os profissionalmente de forma a inserir-se no mercado de trabalho formal. Tais ações comprovam a relevância da parceria entre o setor público, o terceiro setor e a iniciativa privada, garantida pelo restabelecimento da situação de segurança e de efetivação de direitos da cidadania para a transformação desses territórios. As capacitações que foram ofertadas foram construídas com a participação da população considerando-se estudos sobre as potencialidades e dinamismo econômico do entorno. 3. Regularização Fundiária A Regularização Fundiária consiste em providenciar para que cada família receba a titulação do direito real sobre o solo e/ou a construção em que habita. Esta titulação se dará, grosso modo, através da utilização dos instrumentos de usucapião, utilizado para as áreas de domínio particular, e de concessão de direito real de uso para as áreas de domínio público, possibilitando às famílias atendidas a segurança da posse. Neste sentido e visando sempre o desenvolvimento do território, a proposta vem sendo desenvolvida observando-se a lógica do Urbanismo Participativo, sempre buscando minimizar os impactos negativos no cotidiano da população. Diagnóstico Social Participativo No que se refere ao Trabalho Técnico Social, destacamos as seguintes conquistas: a importância da mobilização dos moradores no processo de decisão sobre as propostas, uma vez que são eles os maiores interessados e conhecedores das necessidades locais. Essa parceria só enriqueceu o trabalho do governo, no intuito de direcionar mais assertivamente as ações necessárias para a urbanização e desenvolvimento desses territórios. Ainda acrescentamos a conquista de credibilidade junto aos moradores que foi acontecendo através de muito apoio local, presença diária, respostas e explicações sobre todo o processo de transformação que estava sendo proposto. Com a experiência adquirida ao longo do PAC, foi identificada a importância da população estar envolvida em todas as etapas da execução, e, sobretudo, participando ativamente do processo de planejamento dos projetos de intervenção. Para isso, o governo 61


realizou diagnósticos sociais participativos a fim de identificar as demandas das comunidades, e com isso construir projetos e pleitear recursos que espelhassem os anseios dos moradores. Essa estratégia tem o intuito de privilegiar as comunidades na busca das definições sócio-espaciais e as colocam como co-gestoras e co-responsáveis pelos espaços trabalhados. Esses diagnósticos foram elaborados em 6 comunidades, entre elas o Complexo da Tijuca, compreendendo o Borel, Formiga e Salgueiro, os Complexos da Penha, do Lins, de Rio das Pedras e do Jacarezinho. Para a realização destes diagnósticos foram levantados diversos tipos de dados quanto à população residente e de que forma vivem, utilizando bases secundárias de dados, além de realização de trabalho de campo aplicando pesquisa amostral que tinha como objetivo mapear como era a percepção do morador sobre as condições de vida na comunidade, e o que era necessário para melhorar a qualidade de vida nesses territórios. Além disso, foram realizadas as Oficinas do Imaginário, onde através de uma dinâmica especifica os moradores podem expressar, por meio de desenhos, o lugar onde sonham viver, demonstrando o que precisaria ser realizado para que a sua comunidade correspondesse ao lugar que gostaria de viver. O produto final desse conjunto de levantamentos é um profundo diagnóstico, através de dados e demandas reais de quem ali vive, que retrata o cotidiano dessas comunidades. A partir desse material, o projeto de intervenção física é formulado e depois aprovado junto à população. Esse trabalho é fundamental para que a população seja efetivamente atendida. No Borel foi realizado um diagnóstico em 2010, e o projeto físico-urbanístico e socioambiental está sendo elaborado. Essa é uma forma que o Governo encontrou de buscar mais eficazmente os recursos através do Ministério das Cidades. Conclusões A experiência que discorremos aqui é de uma política habitacional integrada e direcionada a partir das diretrizes estabelecidas pelo Estatuto da Cidade que possui como égide principal a gestão democrática e participativa das cidades. Além disso, diversos projetos para a geração de trabalho e renda e educação sanitária e ambiental foram implantados, com a preocupação de fortalecer 62


os grupos que já desenvolviam trabalhos nessas regiões para que pudessem ser fortalecidos e se mostrarem sustentáveis após o encerramento dos investimentos do PAC, conseguindo articular-se através de outras parcerias a fim de manter o trabalho iniciado com o apoio do trabalho social do PAC. Através desta metodologia de integração entre projeto urbanístico, social e legal, com a participação da comunidade, o governo do Estado resolveu ampliar os investimentos para outras áreas, aperfeiçoando cada vez mais a metodologia que foi apresentada. Norteada por uma política de inclusão, um dos principais objetivos dos investimentos nestes territórios onde não havia ações, quer seja de caráter social ou através de investimentos em infraestrutura e para construção de equipamentos públicos, é ter a população como parte integrante do processo de transformação da comunidade e da cidade, podendo exercer sua cidadania dignamente, acessando equipamentos de saúde, educação, cultura, lazer e reconquistando o direito de ir vir, propiciado através de investimentos em equipamentos e infraestrutura que proporcionam a mobilidade urbana. Enfim, é reconectar as áreas informais à cidade formal. Bibliografia: BRASIL. Estatuto da Cidade: Lei n. 10.257 de 10 de julho, que estabelece as diretrizes gerais da política urbana. – Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações. 2001. BRASIL. Matriz de indicadores para avaliação do pós-ocupação dos projetos piloto de investimento intervenção em favelas. Brasília: Ministério das Cidades. BONDUKI, Nabil (2007). Articulação de políticas setoriais e ampliação dos recursos para intervenções urbanas socialmente justas e sustentáveis. Conferência Municipal da Cidade de Vitória (ES), Julho. CAIXA Econômica Federal. Sítio Institucional. Disponível em: http://www.caixa.gov.br. Escritório de Gerenciamento de Projetos do Governo do Rio de Janeiro - EGP-Rio. Sítio Institucional. Disponível em: http://www.egprio.com.br. FERREIRA, J.S.W.e UEMURA, Margareth M. (2008). Política Urbana. Curso à Distância: Ações Integradas de Urbanização e Assentamentos Precários. Módulo I. Disciplina I. Brasília: Ministério das Cidades. GOVERNO do Estado do Rio de Janeiro (2012). Plano de Desenvolvimento Sustentável para a Rocinha. Rio de Janeiro: janeiro. IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2012). Censo demográfico: resultados preliminares. Disponível em: http://portalgeo.rio.rj.gov.br/ _pcontrole/sisbann/abrebanner.asp?getcod=163. 63


MINISTÉRIO das Cidades. Sítio Institucional. Disponível em: http://www.cidades.gov.br. PAZ, Rosangela Dias Oliveira da; TABOADA, Kleyd Junqueira (2010). Trabalho social em programas e projetos de habitação de interesse social. Ensino à Distância – EAD. Brasília: Ministério das Cidades, Setembro. ROLNIK, Raquel (1997). A Cidade e a Lei: legislação, política urbana e territórios na cidade de São Paulo. São Paulo: Studio Nobel; FAPESP. VENTURA, Zuenir (1994). Cidade partida. São Paulo: Companhia das Letras.

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Programa SESI Cidadania do Sistema FIRJAN Hilda Alves11 e César Bedran12

O Programa SESI Cidadania é um conjunto de iniciativas integradas do Sistema FIRJAN que tem como objetivo criar e manter um novo ambiente de cidadania e desenvolvimento em comunidades pacificadas do Estado do Rio de Janeiro, antes dominadas pelo tráfico. É composto das seguintes ações: pesquisa contendo o mapeamento das características socioeconômicas e infraestruturais das comunidades pacificadas; facilitação da interlocução com os agentes públicos e a iniciativa privada para atender as necessidades e carências identificadas; e oferta imediata de projetos sociais do SESI-RJ nas áreas de educação, esporte, lazer, saúde, cultura e pequenos negócios, suprindo as lacunas históricas. Trata-se de uma parceria público-privada - por meio dos Governos Estadual e Municipal, autarquias e organizações - na qual o Sistema FIRJAN tem o importante papel de interlocução entre esses agentes para a construção de uma nova geração no Estado do Rio de Janeiro. Espera-se que, por intermédio dessa parceria, seja possível a sustentação da pacificação nessas comunidades, por meio de cidadania e desenvolvimento. A mútua cooperação das partes envolvidas visa a realização de ações no âmbito social, educacional e do desenvolvimento econômico, buscando a melhoria da condição de vida, apoiada no desenvolvimento sustentável, nas comunidades em que haja a presença das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs). Em que pese a inércia do setor público e privado do passado, onde não se resolveu a questão da violência urbana no país e nem no Rio de Janeiro, a situação que se apresenta é de virada. E de reversão das expectativas e esperanças. Se não de um futuro ideal, ao menos digno para uma camada da população antes excluída. O primeiro passo necessário é entender que a pacificação antecede o SESI Cidadania. É pré-condição para uma política de 11 12

Gerente de Pesquisas e Estatística da Diretoria de Desenvolvimento Econômico do Sistema FIRJAN. Chefe Divisão de Pesquisas da Diretoria de Desenvolvimento Econômico do Sistema FIRJAN.

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cidadania com os meios providos pelo setor privado. E também para o desejável desenvolvimento social nesses territórios. O Sistema FIRJAN entende que é preciso ações consistentes e contínuas para tornar os moradores de comunidades em cidadãos. E que para que isso aconteça, deve-se necessariamente acabar com o medo e o caos que advém da violência. Daí o apoio para que o cenário até então vigente seja revertido, em consonância com as políticas estaduais de segurança pública. Neste cenário, as ações do SESI Cidadania são baseadas no eixo segurança plena: pessoal e patrimonial (UPPs), serviços públicos constitucionais e serviços privados legalizados. A partir daí essas ações fizeram o contexto mudar para melhor, principalmente a partir da valorização, na prática, da palavra integração. As UPPs têm caráter especial, já que segurança é o alicerce sobre o qual se constroem todas as outras dimensões constitutivas da qualidade de vida das cidades. Isto dito, a pacificação é essencial, mas não suficiente, para garantir bem estar. Há uma gama de outros bens e serviços aos qual a população deve ter acesso, como infraestrutura urbana, serviços de qualidade em saúde e educação, entre outros. Dentre outras ações do Sistema FIRJAN no contexto das comunidades pacificadas podem ser destacados os diagnósticos socioeconômicos dessas comunidades; estudos técnicos que resultam em soluções de graves problemas como o do lixo; a oferta dos serviços de Educação básica e profissional; e a cobrança de ações do poder público (água e esgoto, por exemplo). Deve-se ressaltar que o diagnóstico socioeconômico é o motor que subsidia o desenvolvimento do projeto SESI Cidadania quanto às dimensões educação, saúde, cultura, esporte e lazer e pequenos negócios. É através dele que espera-se poder contribuir para a elaboração de políticas públicas de desenvolvimento do Estado do Rio de Janeiro. Todas as ações são fundamentadas nos dados e informações do diagnóstico, conduzido pela área de pesquisa da instituição. A proposta do projeto é integrar a comunidade ao próprio Sistema FIRJAN, através do voluntariado dos funcionários para a coordenação da oferta dos serviços nas comunidades e da contratação para trabalhar no SESI de uma pessoa da própria comunidade para mobilizar os moradores a participar dos serviços, o chamado agente SESI Cidadania. 66


A metodologia de trabalho dos coordenadores de comunidade SESI Cidadania consiste no contato com o comandante local (indicado pelo poder público), visita ao local com equipe multidisciplinar, indicação de lideranças comunitárias, mapeamento de possibilidades para inserção de projetos, registro fotográfico, retorno ao grupo de trabalho e monitoramento. O agente SESI Cidadania, por sua vez, pode ser considerado como o indivíduo que faz acontecer dentro das comunidades. Ele é o responsável, dentre outras coisas, pela divulgação dos projetos oferecidos na comunidade; pela mobilização dos moradores das comunidades para participar nas diversas ações, programas e projetos; por receber as inscrições e recolher a documentação necessária às matrículas; por identificar demandas da comunidade relacionadas à educação, esporte, lazer, cultura saúde e pequenos negócios, passíveis de atendimento, considerando o escopo do projeto; por acompanhar os beneficiados das diversas ações ofertadas. É ao agente SESI Cidadania que, após seu recrutamento pelos coordenadores das comunidades, se oferece oportunidade profissional e pessoal, através do gerenciamento in loco do programa SESI Cidadania. Com apoio e capacitação a esse profissional, a relação com a comunidade e Sistema FIRJAN se estreita, ficando mais tangível a entrada do setor privado em um ambiente outrora caótico e agora retomado pelo setor público. Além disso, esse agente é percebido junto a seus pares, adquirindo status dentro da comunidade. Tem, portanto, interesse no sucesso do projeto: quer que as pessoas, seus pares, melhorem de vida. No que tange ao diagnóstico socioeconômico, conduzido pela Gerência de Pesquisas e Estatística do Sistema FIRJAN, foram pesquisadas até o momento 16 comunidades com Unidades de Polícia Pacificadora, em duas ondas pesquisadas. Em 2010 foram pesquisadas as nove comunidades que se seguem: Batam, Cantagalo, Pavão Pavãozinho, Ladeira dos Tabajaras, Cidade de Deus, Providência, Santa Marta, Chapéu Mangueira e Babilônia. Foram pesquisados 2.533 domicílios (representando 8.788 moradores) em aglomerados urbanos de baixa renda na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, entre eles as comunidades pacificadas supramencionadas. 67


Os levantamentos tiveram como fio condutor identificar e mensurar as demandas por serviços de utilidade pública e infraestrutura e o perfil socioeconômico da população. Entre outras características, investigou-se a inserção no mundo do trabalho, educação, saúde, rendimento, empreendedorismo, habitação, acesso a tecnologias da informação e comunicação (TICs) e cultura. Já em 2011 participaram da pesquisa as sete comunidades seguintes: Andaraí, Borel, Formiga, Macacos, Salgueiro, São João/ Matriz-Quieto e Turano. Nesta etapa foram contemplados 2.951 domicílios, representando um contingente de 10.268 moradores. A percepção dos indivíduos acerca de sua própria vida e do entorno é subsídio para tomada de decisões nos diferentes estágios de uma política pública e de iniciativas como o SESI Cidadania. Por este motivo, nos últimos anos, tem se tornado recorrente a realização de pesquisas quantitativas dentro do mesmo ambiente de investigação em busca de soma de esforços positivos para a compreensão de determinada situação. Dado que o processo de pacificação e desenvolvimento das comunidades é ininterrupto, no momento encontra-se em andamento, as tratativas para uma terceira onda em oito comunidades: Mangueira, Vidigal, Complexo do Alemão, Rocinha, Complexo da Penha, São Carlos, Coroa/Fallet/Fogueteiro e Prazeres/Escondidinho. A metodologia das pesquisas é baseada na amostra de domicílios nas comunidades pacificadas. Pesquisas por amostra domiciliar são instrumentos eficazes para a elaboração de diagnósticos populacionais (cálculos de medida de pobreza, acesso a serviços públicos e infraestrutura urbana, entre outros) e têm sido cada vez mais utilizadas para a avaliação de políticas públicas. Quando a amostragem é feita de forma adequada, tornam-se substitutos confiáveis e mais baratos de censos demográficos. As pesquisas foram subdivididas em duas partes: a primeira parte contendo um questionário detalhado sobre os moradores domiciliados nas comunidades selecionadas, com resultados representativos para cada uma das comunidades (margem de erro por comunidade de 5%), estruturado pelos seguintes temas: características socioeconômicas dos membros do domicílio; característica do imóvel; trabalho e renda; segurança; saúde; educação; e características empresariais, quando o chefe do domicílio for trabalhador por conta própria ou empregador; e a segunda consistindo em um 68


questionário curto para avaliar o acesso da população a infraestrutura urbana e serviços públicos, com resultados representativos para cada um dos setores censitários das comunidades (margem de erro de 5%). O método estatístico utilizado foi o da amostra de seleção aleatória sistemática com reposição, baseada na malha dos setores censitários do IBGE/Censo 2000. Para verificar o crescimento do número de domicílios entre 2000 e 2010 foi realizada contagem dos domicílios em cada um dos setores censitários e então foi estimado o tamanho de domicílios e população em cada uma das comunidades. Calculada de forma independente em cada comunidade, assegurando margem de erro individual máxima de 5,0%13. O questionário foi aplicado de forma presencial com moradores de domicílios particulares (chefe da família/responsável pelo domicílio/pessoa de referência com mais de 18 anos). Foi preenchido um único questionário por domicílio onde o entrevistado também respondeu questões referentes aos demais moradores. Quanto aos principais resultados dos diagnósticos socioeconômicos realizados entre 2010 e 2011 nas 16 comunidades pacificadas já mencionadas, podem ser destacados, por dimensão pesquisada, os seguintes. No que diz respeito à escolaridade média das pessoas de 25 anos de idade ou mais, Cidade de Deus e Chapéu Mangueira são as comunidades com mais anos de estudo (7,4 cada) e têm 16,2% menos escolaridade que o Rio de Janeiro Metropolitano (8,6). Esta diferença alcança a 48,3% quando Providência (menos anos de estudo dentre as comunidades - 5,8) é comparada ao Rio de Janeiro Metropolitano14.

13 Utilizando como referência os setores censitários, utilizados no Censo Demográfico de 2000, das comunidades investigadas que fazem parte das UPP, podemos adotar duas abordagens para criar uma população alvo atualizada para o ano de 2011: a) a elaboração de uma listagem de domicílios; ou b) a contagem de domicílio. A listagem dos domicílios consiste em relacionar, ordenadamente, todas as unidades residenciais e não residências existentes em cada setor censitário das comunidades pesquisadas. A listagem compôs o cadastro de unidades domiciliares de onde foram sorteadas aleatoriamente os domicílios entrevistados com o questionário curto e longo. A contagem rápida de domicílios consiste em percorrer os setores censitários pertencentes a cada uma das comunidades e contabilizando o número de domicílios para posterior sorteio dos números dos domicílios que serão escolhidos para serem entrevistados, ignorando a presença de unidades não residenciais (empreendimentos). 14 Fonte: IETS – PNAD/IBGE 2009.

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Todas as comunidades apresentam escolaridade abaixo das Regiões Metropolitanas do Rio de Janeiro (RMRJ), São Paulo, Porto Alegre, Salvador, Belo Horizonte e Recife. Adicionalmente os resultados encontrados também foram abaixo do registrado no país (8,5 anos de estudo). Não houve diferença significativa entre as comunidades da Zona Sul e da Zona Norte, uma vez que esta registrou 6,4 anos de estudo e aquela 6,7. No que tange à ocupação15 dos respondentes, apesar da comunidade ser um espaço marcado pela informalidade, os trabalhos formais são os que prevalecem (60,3% declararam-se como empregados com carteira de trabalho assinada na Zona Norte e 56,5% na Zona Sul, contrapondo-se aos 45,8% da RMRJ). Este resultado pode ser explicado pelo fato da participação dos empregadores, conta própria e funcionários públicos/militares na RMRJ ser superior ao encontrado nas comunidades. Deve-se salientar, contudo, que a presença de vínculos formais de trabalho nas comunidades não significa salários mais elevados. Em relação ao desemprego encontrado, somente as comunidades Pavão-Pavãozinho e Chapéu Mangueira apresentaram taxa de desemprego menor que à registrada no Brasil Metropolitano (6,0%). As médias das comunidades da Zona Norte (11,3%) e da Zona Sul (7,3%) estão acima da registrada no Brasil Metropolitano (6,0%)16. Ladeira dos Tabajaras, por sua vez, tem indicador igual ao Salvador Metropolitano, que registra a maior taxa de desemprego dentre as regiões metropolitanas. Todas as comunidades apresentaram taxa de empregados sem carteira maior que o Recife Metropolitano, que apresentou índice de 13,7% (maior resultado dentre as regiões metropolitanas)17. A única exceção registrada ocorreu no Pavão-Pavãozinho, apesar do resultado ser próximo: 13,4%. As taxas de empregados sem carteira são elevadas quando comparadas às Regiões Metropolitanas: Chapéu Mangueira possui 15 Ocupados são as pessoas classificadas como ocupadas na semana de referência que tinham trabalho durante ou em parte deste período. Estão incluídas como ocupadas as pessoas que não estavam trabalhando por motivo de férias, licença, greve, etc. 16 Fonte: PME/IBGE – médias 2011. 17 Fonte: PME/IBGE – médias 2011.

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o maior índice de empregados sem carteira dentre as comunidades e apresenta resultado maior que o dobro do registrado no Rio de Janeiro Metropolitano. Todas as comunidades possuem taxa de empregados com carteira maior que o Recife Metropolitano, cujos 45,3% apresentados constituem o menor resultado dentre as regiões metropolitanas18. A exceção é a comunidade Chapéu Mangueira, que obteve resultado de 43,8%. O Borel, por sua vez, apresentou 65,7% empregados com carteira assinada. Quando a análise recai sobre a situação ocupacional dos jovens de 15 a 24 anos, percebe-se que há uma maior inserção no mercado de trabalho dos jovens das comunidades da Zona Sul: 52,4% informaram trabalhar e/ou estudar, contra 46,0% dos jovens da Zona Norte. O maior problema dessa faixa etária encontra-se nos jovens que afirmaram não estudar nem trabalhar (23,1% nas comunidades da Zona Norte e 20,2% na Zona Sul). Trata-se da faixa etária cuja inércia mais preocupa em virtude do que esses jovens podem vir a fazer em um ambiente endógeno histórico que invariavelmente conduz à criminalidade. Quatro de seis comunidades da Zona Sul possuem taxa de jovens no mercado de trabalho maior que Belo Horizonte Metropolitano (53,0%) e Porto Alegre Metropolitano (53,0%), maiores resultados dentre as regiões metropolitanas19. São elas: Pavão Pavãozinho (58,5%), Tabajaras (55,7%), Chapéu Mangueira (55,0%) e Santa Marta (54,6%). Quatro de sete comunidades da Zona Norte apresentam indicador acima do Brasil Metropolitano (46,6%), a saber: Macacos (49,6%), Andaraí (48,6%), Borel (47,6%) e Turano (46,8%). Em relação à renda domiciliar per capita das comunidades, um comparativo entre as comunidades da Zona Norte e Zona Sul revela a distorção existente. Se na Zona Sul a renda domiciliar per capita é de R$644,00, na Zona Norte a renda encontrada foi de R$ 422,0020.

Fonte: PME/IBGE – médias 2011. Fonte: PME/IBGE – médias 2011. 20 Nota: INPC/FGV foi usado para atualizar as rendas da pesquisa de 2010. 18 19

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Todas as comunidades apresentam renda domiciliar per capita inferior ao Brasil Metropolitano e a cinco de seis regiões metropolitanas21. Apenas as comunidades Pavão-Pavãozinho, Chapéu Mangueira, Cidade de Deus e Cantagalo possuem renda domiciliar per capita maior que ao Recife Metropolitano (menor renda entre as regiões metropolitanas). A renda domiciliar per capita do Rio de Janeiro Metropolitano é quase três vezes maior que da comunidade São João - Matriz/ Quieto (R$928,00 contra R$361,00). A pesquisa, além disso, procurou identificar a posse de bens e o acesso da população da comunidade as chamadas tecnologias da informação e comunicação (TICs). No que tange ao uso e posse de telefones celulares, Chapéu Mangueira é a única comunidade com penetração de celular nos domicílios (92,2%) maior que as Regiões Metropolitanas avaliadas (variação de 83,4% no Rio de Janeiro a 90,3% em Porto Alegre)22. Apenas as comunidades Chapéu Mangueira (92,2%), Babilônia (88,1%) e Santa Marta (87,0%) possuem penetração de celulares acima da registrada no Rio de Janeiro Metropolitano (menor dentre as seis Regiões Metropolitanas). Quanto ao uso da Internet de casa, todas as comunidades, com exceção do Turano (40,2%), possuem índice de penetração de internet no domicílio abaixo do Brasil Metropolitano (38,3%) e Rio de Janeiro Metropolitano (38,7%)23. Na Zona Sul essa penetração é de 31,7% e na Zona Norte um pouco maior (32,9%). No tocante à televisão por assinatura, seis comunidades possuem penetração nos domicílios maior que o dobro do registrado no Brasil (20,7%)24: Pavão Pavãozinho (52,9%), Chapéu Mangueira (50,5%), Turano (50,2%), Andaraí (45,6%), Babilônia (45,6%) e Salgueiro (43,4%). A Região Sudeste possui a maior taxa de TV por assinatura dentre as cinco regiões brasileiras (30,3%). Ainda assim, 11 das 16 comunidades pesquisadas apresentam maior penetração do que a Região Sudeste. Fonte: PME/IBGE – médias 2011. Fonte: IETS – PNAD/IBGE 2009. 23 Fonte: IETS – PNAD/IBGE 2009. 24 Fonte: ANATEL 2011. 21 22

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Dentre os principais programas e serviços oferecidos pelo Sistema FIRJAN, baseados na pesquisa realizada, podem ser destacados os seguintes:  Programa Atleta do Futuro25 - promove a formação esportiva para dependentes dos trabalhadores da indústria e de comunidades locais, com foco no desenvolvimento de crianças e adolescentes por meio do esporte e na promoção da melhoria da qualidade de vida, estimulando o exercício da responsabilidade social do empresariado e da sociedade. Serviços oferecidos: Aulas de iniciação esportiva, participação em eventos e competições esportivas, reforço alimentar, materiais esportivo, profissionais especializados, abordagem de temas transversais como: orientação sexual, nutrição, saúde, ética, meio ambiente, pluralidade cultural, valores do esporte entre outros.  Programa SESI 3ª Idade26 - Desenvolver atividades para o grupo populacional com idade a partir dos 50 anos, contribuindo para a adoção de um estilo de vida ativo visando melhoria de qualidade de vida e consequentemente um processo de envelhecimento digno e saudável. Serviços oferecidos: Atividades físicas, esportivas e de lazer; ações sócio-culturais, orientação nutricional, orientação psicológica, acompanhamento médico, avaliação física e funcional.  EducaMais – Elevação da escolaridade (educação de jovens e adultos nas UPPs, oferta de ensinos fundamental e médio) e Reforço escolar (alunos do ensino fundamental das escolas municipais e reforço em língua portuguesa e matemática).  Qualificação profissional: qualificação em canteiro-escola, orientação profissional: Feira das profissões, qualificação nas escolas do SENAI: média de 150 vagas por UPP, qualificação por meio de Unidades Móveis.  Unidades móveis: disponibilizam cursos gratuitos nas áreas de Hidráulica, Pneumática, Panificação, Calçados e Bolsas, Informática, Solda e Gráfica para as comunidades Pacificadas. A iniciativa tem como objetivo promover o acesso da população à educação e capacitá-la para o mercado de trabalho. 25 26

Faixa etária: crianças e jovens entre 6 e 17 anos. Faixa etária: a partir de 50 anos.

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 Indústria do conhecimento – bibliotecas públicas, acesso à internet, convênio com Academia Brasileira de Letras, atividades sete dias por semana.  Atendimento médico e odontológico (clínica médica, odontologia e clínica odontológica).  SESI Cultural – ações culturais para todas as idades. É nesse contexto que o programa SESI Cidadania já realizou mais de 300.000 atendimentos, mediante ações contínuas de educação, saúde, esporte, lazer, cultura e qualidade de vida à, por enquanto, 20 comunidades com UPPs instaladas.

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Favela é Cidade Rossino de Castro Diniz27

Mesmo excluída, a favela é sim parte viva da cidade do Rio de Janeiro, hoje somando quase dois milhões de “cidadãos sem Estado”. Desde o surgimento da primeira favela no Morro da Providência, lá se vão 100 anos de lutas em busca de melhor qualidade de vida: emprego com salário justo, moradia decente, saneamento básico, saúde, educação, transportes baratos e lazer. Mesmo sem qualquer ilusão com as promessas eleitorais de candidatos sempre à caça do voto da massa favelada, alguns projetos governamentais foram implantados alternadamente, mas sem melhor aproveitamento de continuidade, pois a cada novo governo eleito, tais projetos eram “deixados pra lá” E, se novos eram apresentados vinham sempre de “cima pra baixo”, sem qualquer participação ou consulta dos moradores. Atualmente tal fato se repete com as obras do PAC – Programa de Aceleramento do Crescimento), UPPs e milhares de remoções, sem a devida contrapartida, atendendo projetos voltados para megaeventos com obras faraônicas. Assim sendo, a FAFERJ tem participado do fórum Nacional, nos últimos cinco anos, juntamente com lideranças comunitárias buscando “vez e voz”, ou seja, serem todos ouvidos, consultados e atendidos naquilo que é melhor e mais necessário às comunidades faveladas, Alguns projetos comunitários já apresentados e publicados pelo Fórum Nacional. Identificamos também que as dificuldades e limitações que temos é fruto da falta de oportunidades econômicas, sociais e políticas de uma sociedade injusta e desigual.

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Presidente da Federação de Favelas do Estado do Rio de Janeiro – FAFERJ.

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Oportunidade não se dá, se cria Mônica Santos Francisco28

O mar escuro trará o medo lado a lado com os corais mais coloridos. Valeu a pena, Eh. Valeu a pena,Eh, Sou pescador de ilusões, pescador de ilusões O RAPPA

Hoje se assiste à emergência do reconhecimento da favela como espaço singular e que não necessariamente está descolada da cidade, com uma forma específica de construção, de sociabilidade, de cultura e até de contracultura próprias, porque ela é parte desta cidade tão plural como qualquer outra metrópole cosmopolita do mundo. Mas como qualquer outro lugar do mundo, o diferente é alvo de desconfiança, e por isso a distância do que não se percebe como igual se faz necessária. Por isso, ainda se precisa lutar por direitos nos territórios de pobreza, sejam favelas ou outra denominação que se dê a estes espaços. No momento em que a cidade olha mais de perto para as favelas, hoje ocupadas pelas Unidades de Polícia Pacificadora, e o discurso quase que geral é de que nessas áreas a presença do Estado como efetivador de políticas públicas através de suas secretarias é extremamente urgente, torna-se uma contradição a condição de muitas delas, justo no momento em que se fala do sucesso da retomada dos territórios ocupados antes pelo tráfico. A inserção da discussão sobre o desenvolvimento das favelas no Fórum Nacional, sob a coordenação do ministro Reis Velloso, significa pensar na favela de forma vanguardista, e o desafio para os seus representantes, participantes desta edição extraordinária do Fórum, é unir-se aos representantes do poder público e de instituições, para criarem uma proposta concreta que se materialize em oportunidade real para os que vivem na favela. Há um movimento dialético, de conquistas de um lado e retrocessos de outro, como por exemplo, em áreas básicas, tais como Mônica Francisco é importante liderança comunitária. Fundadora da REDE de Entidades do Borel da ONG Arteiras.

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água, luz e saneamento básico. A organização política interna, em redes articuladas, promotoras de integração entre as instituições locais e moradores, para qualificar o diálogo entre estas áreas e o poder público, além de outras instituições que atuam nestes territórios, é primordial para a conquista de direitos em sua maioria básicos na percepção de um status de cidadania plena. Um novo momento surge na cena carioca, onde se desenha por parte dos que vivem na favela, trabalham ou acompanham de perto seu dia-a-dia, um perfil real do que é a favela hoje. É necessário reconhecer a identidade histórica de cada favela, e que esta identidade se deu em um processo de lutas dos moradores e moradoras destas áreas ao longo do tempo. Não cabe mais à favela estar sempre organizada na lógica da busca ou reivindicação de direitos, pois se defendemos que favela é cidade, que se cumpra neste pedaço a mesma lógica garantida constitucionalmente a todas às demais partes da cidade. Que o desenvolvimento das favelas seja oportunidade para aqueles que construíram a possibilidade de que a cidade hoje pense a favela como oportunidade. É necessário um esforço conjunto, envolvendo Fórum Nacional, BNDES, favelas, PAC, UPP Social, SEASDH, FIRJAN, FIOCRUZ, SEDES e demais secretarias de governo. Ainda é necessário fomentar os empreendimentos comunitários, possibilitando a geração de trabalho e renda, e a consequente circulação de capital, que desenvolva a favela, a capacidade de seus moradores de permanecer no território nesta nova conjuntura. Não há mais lugar para pensarmos na favela ou nos favelados como aqueles que precisam ser beneficiados apenas com cursos de manicure, pedicure, garçom, garçonete e etc., Sem demérito dessas tão importantes funções, mas a favela quer e tem gerado mais do que isso, e é preciso ter olhos argutos para enxergar novas possibilidades. Jane Jacobs, em seu famoso livro “A morte e a vida das grandes cidades”, cita a formação de redes como indispensáveis para o sucesso da relação entre áreas pobres e o poder público, que muitas vezes só vê solução na remoção destas áreas e não as percebe como potencial gerador de crescimento para o todo urbano. Por sua vez, Mike Davis, em seu livro “Planeta favela”, nos chama a atenção de que o mundo muito em breve terá um número extraordinário de favelas e que é necessário considerar estas previsões, baseadas em estudos da UN-Habitat (Órgão das Nações 78


Unidas para a Habitação), da CIA (Agência de Inteligência Americana) e do FMI (Fundo Monetário Internacional) Segundo esse autor, a desigualdade urbana já é maior que a desigualdade rural. São Paulo em 1980 tinha 40% de empregos vindos da indústria, e em 2004 só 15%. De 1996 a 2001, 36 milhões de operários foram demitidos. No Brasil a força de trabalho informal já alcançou 37%. (dados de 2004).Na Índia, durante a década de 90, o PIB cresceu 6%, e o resultado foi 1 milhão de novos milionários e 56 milhões de miseráveis, somando-se a isso o aumento de 58% nos preços dos cereais entre 1991 a 1994. O mais importante é que há urgência na soma de esforços para mudarmos a realidade do país, do nosso estado e de nossa cidade. Fazê-lo sem dar a devida importância às favelas, à força do que se produz nestes locais e em sua potencialidade, ou pensá-las apenas como locus de assistencialismo ou de intervenção coercitiva, é, desculpem-me os tempos de pacificação, dar um tiro no pé.

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Como se encontra a comunidade do Cantagalo Luiz Bezerra do Nascimento29

A Associação de Moradores do Cantagalo informa que a comunidade esta em pleno processo de desenvolvimento, com a implantação de inúmeras iniciativas. Há mais de 6 anos o Instituto Atlântico atua na nossa Comunidade fazendo o trabalho de regularização fundiária para os moradores, junto com o Governo do Estado RJ. Temos também o PAC (Projeto de Aceleração do Crescimento), com a abertura de ruas dentro da comunidade. A UPP (Unidade de Policia Pacificadora) já completou 3 anos, trazendo os Projetos Sociais desenvolvidos pelo Governo do Estado do RJ, e uma parceria junto com a Prefeitura do Rio de Janeiro com os seus projetos sociais. Temos também diversas iniciativas não governamentais atuando na comunidade, como o projeto Criança Esperança, o Afroreggae, o Museu de Favela (MUF), entre outras. Em nossa Associação temos um Balcão de Empregabilidade (BEAR) trazendo varias oportunidades para os moradores da comunidade. Temos uma parceria com a Comlurb, CEDAE e Rio Luz, Também em nossa Comunidade já existe um Banco (Bradesco) e uma Lotérica. Agora estamos querendo um novo Projeto da Prefeitura RJ - o Morar Carioca -, pois ainda temos muitas casas de madeiras (estuque) e muitos problemas com o lixo. Nossa finalidade é realmente transformar o Cantagalo em um Bairro.

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*Presidente da Associação de Moradores do Cantagalo

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Projeto de Desenvolvimento de Estruturas de Negócios Criativos do Maciço do Cantagalo Sidney Silva (Tartaruga)30

Peixes quando se juntam em cardumes, assustam até tubarão! (Acme, grafiteiro, morador do Cantagalo, co-fundador do MUF)

O Museu de Favela – MUF e a Associação de Moradores do Cantagalo firmaram parceria para facilitar a montagem de um Projeto Guarda-Chuva, - em resposta às oportunidades abertas por este XXIV Fórum Nacional, que abrace as melhores iniciativas e vontades das organizações estabelecidas no Maciço do Cantagalo. A simples notícia dessa parceria, firmada há 4 dias após a avaliação da reunião do Fórum em Cantagalo, gerou reações de desconfianças na favela, mas também de esperança. A favela é, por excelência, um espaço de mediações constantes e (in)tensas. Tudo deve ser mediado. E os resultados das mediações precisam ser lembrados e relembrados, constantemente. Em geral é assim, cicatrizes da exclusão e medo. Associação de Moradores do Cantagalo e Museu de Favela vão se reunir com a equipe técnica do BNDES e depois reabrir uma rodada objetiva de re-escuta de organizações interessadas - uma a uma, em incluir propostas no Projeto Guarda-Chuva •  VONTADE de cidadania •  AÇÃO (Entender p/ atuar) •  DESAFIO (Integrar iniciativas para valorizar a vida no território)

PROPOSTA - Projetar, com estratégia - Captar recursos (enquadrar no BNDES) - Empreender aprendendo mais - Prestar Contas

Na reunião preparatória para este Fórum, em 14/09 na Base 1 do MUF, tivemos a presença de 43 representantes e 26 entidades que atuam nas comunidades citadas. A cada reunião, um risco de rediscutir tudo, e por isso resolvemos sair do andar em círculos!

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Liderança comunitária. Fundador do Grupo Corpo e Movimento e co-fundador do MUF.

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RE- ESCUTA DE ANTECEDENDES: 1.  Propostas isolados de diversos de moradores. 2.  Propostas listadas nas iniciativas deste Fórum (em debates, entrevistas, livro...) 3.  Projetos reunidos para apoio da Rio+20, que não se efetivou (avaliar porque) 4.  Propostas da Associação de Moradores do Cantagalo 5.  Projetos do Plano Estratégico do Museu de Favela PRIORIDADES DO MORADOR 1º.  EDUCAÇÃO DE EXCELÊNCIA NO MORRO! 2º.  INTERVENÇÃO NO CIEP DO CANTAGALO, JÁ! 3º.  GESTÃO EFICIENTE DE COLETA E DISPOSIÇÃO DE LIXO. 4º.  VISITAÇÃO CULTURAL EM CIRCUITOS, EMPREENDIDA POR ORGANIZAÇÕES LOCAIS, MEDIADA POR MORADORES 5º.  VALORIZAÇÃO DO JOVEM E DOS ARTISTAS 6º.  INTEGRAÇÃO E VALORIZAÇÃO DE INICIATIVAS CRIATIVAS. 7º.  ALERTA PARA ESPECULAÇÃO IMOBILIÁRIA QUE ESTÁ SUBINDO OS MORROS COM UPPS: CAMPANHA DE REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA CONSCIENTE, JÁ! 8º.  MELHORIA DE ILUMINAÇÃO, SAÚDE, DRENAGEM, FORNECIMENTO DE ÁGUA, MOBILIDADE, ENDEREÇAMENTO

CANTAGALO É UM LUGAR PECULIAR QUE SE AFIRMA DENTRO DO BAIRRO IPANEMA. BAIRRO DO CANTAGALO?!

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Conselho Comunitário de Manguinhos: Uma experiência de gestão participativa do território Jorge Luis da Costa Silva31

Contra a intolerância dos ricos, a intransigência dos pobres. Não se deixar esmagar, não se deixar cooptar. Lutar Sempre! Florestan Fernandes

Introdução A presente pesquisa é produto de uma sistematização elaborada a partir da experiência do Conselho Comunitário de Manguinhos (CCM), que, segundo seu Regimento Interno (2011), é um “organismo autônomo, propositivo e promotor de ações e diálogos entre moradores, instituições privadas, governamentais e sócio-comunitárias”. Tendo em vista facilitar o processo de apropriação desta experiência, o presente artigo se propõe a investigar o CCM a partir de uma pesquisa analítica, e, para tanto, irá se instrumentalizar de uma determinada abordagem teórica, isto é, de um método interpretativo, o materialismo histórico dialético, que, segundo Bueno (2007:14): "é histórico, pois não considera nenhuma relação social, nenhuma forma econômica, nenhum modo de produção, como conjuntos de fatos naturais e positivos; é materialista, pois recusa as formas religiosas, transcendentes, idealistas e abstratas de pensar as formas sociais, os modos de produção, as relações de trabalho e os aparatos políticos, jurídicos e culturais; e é dialético, pois elabora os conceitos sempre de forma a fazer aparecerem as contradições e as mediações, relacionando o universal e o individual, a parte e o todo, o abstrato e o concreto, o superficial e o profundo." Considerando, então, que esta pesquisa olhará para a realidade de Manguinhos sob a ótica do materialismo histórico dialético, é importante, também, ressaltar que ela recorrerá a fontes bibliográficas, tendo em vista dar o suporte teórico necessário para a construção do texto. 31 Bolsista da Coordenadoria de Cooperação Social da Fundação Oswaldo Cruz e Secretário Administrativo do Conselho Comunitário de Manguinhos.

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Municiado destas ferramentas, este estudo pretende analisar os limites e as possibilidades de ação que este colegiado comunitário encontra em sua prática cotidiana, e quais são suas propostas diante dos desafios impostos pelo território. Desta forma, uma discussão sobre o território de Manguinhos introduz o estudo, tendo como base a categoria política “território de exceção”, que diagnostica um estado de exceção não declarado oficial­mente, mas territorializado nas comunidades de favelas da cidade do Rio de Janeiro. São, portanto, territórios de exceção que se mantém em contexto de estado formal de direito do território nacional, seus estados e municípios. Em seguida, há uma breve análise sobre o processo histórico das lutas sociocomunitárias de Manguinhos, explicitando sua importância para a inclusão deste território no Programa de Aceleração do Crescimento, enfatizando as lutas do Fórum do Movimento Social de Manguinhos. Ainda nesta seção há uma breve apresentação do processo de surgimento do CCM. O conflito entre a proposta do CCM e a cultura política local é contemplado na última seção, na qual é apresentada, de forma sucinta, a maneira como o Conselho vem dialogando com a cultura local do imediatismo, produto das demandas sociais reprimidas ao longo de décadas. Ademais, é importante destacar que, com este texto, não se pretende esgotar o tema ou propor soluções mecanicistas e cartesianas, mas desenvolver uma breve exploração da ação deste Conselho, avaliando seus limites e possibilidades, suas fragilidades e potencialidades, de modo a possibilitar a replicação desta experiência intersetorial e indutora de políticas públicas em outros territórios situados nas regiões metropolitanas do país, também marcados pelas inaceitáveis e superáveis iniquidades que interferem diretamente na qualidade de vida dessas populações. TERRITÓRIO DE MANGUINHOS: UMA PRODUÇÃO SOCIOHISTÓRICA Fundamental para compreender a experiência do CCM é começarmos do ponto que talvez seja o mais elementar: o território. “Manguinhos é um microcosmo da desigualdade brasileira” (SOARES, D. p. 19 In: LIMA, C. M.; BUENO, L. B., 2010), esse território vive, hoje, um momento muito singular, em virtude de uma série de 86


modificações de projetos de diversas naturezas, os quais promovem não só intervenções de infraestrutura urbana, mas também alteram relações de poder e mobilizam sujeitos individuais e coletivos inteiros em sua vida e subjetividade (LIMA, C. M.; BUENO, L. B., 2010). Segundo os critérios do Índice de Desenvolvimento Social da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, Manguinhos está colocado em 122º lugar, entre os 126 bairros definidos pela administração municipal. Esta situação está diretamente ligada à sua formação histórica, econômica e social e, portanto, a reversão desse quadro é possível a partir de uma ação que conjugue estes três aspectos de modo positivo e sustentável, considerando-se as oportunidades da realidade atual. A ocupação do solo no Complexo de Manguinhos é marcada por movimentos desordenados, desde o início do século passado. Tal característica foi acentuada, a partir de 1940, ora devido aos processos decorrentes das ações urbanísticas (abertura de vias, aterros), ora em função dos projetos econômicos (Refinaria de Manguinhos) e governamentais (Fundação Oswaldo Cruz). Portanto, o ‘Complexo’ não se constituiu enquanto um espaço urbano planejado e nem enquanto uma única favela. Trata-se de um conjunto delas, associadas pela proximidade, mas distantes pelas particularidades formadoras das suas identidades e das dinâmicas comunitárias. Assim, o que se convencionou chamar de Complexo de Manguinhos é uma área da cidade, situada na Região da Leopoldina, com aproximadamente 50.000 moradores (Censo PAC 2010), distribuídos entre as seguintes comunidades e conjuntos habitacionais: Conjunto Habitacional Nelson Mandela; Comunidade Mandela de Pedra; Parque Carlos Chagas (Varginha); Conjunto Habitacional Samora Machel; Conjunto Habitacional dos Ex-Combatentes, Tiradentes e Vila União; Comunidade Vila Turismo; Centro Habitacional Provisório II (CHP II); Parque João Goulart; Parque Oswaldo Cruz (Amorim); Condomínio EMBRATEL; Condomínio DESUP; e Comunidade Vitória de Manguinhos (CONAB). Se por um lado, a ocupação de Manguinhos é significativamente heterogênea, por outro lado, este território apresenta alguns fatores comuns: restrições materiais essenciais, políticas públicas paternalistas e que criminalizam o território e a violência exercida por instituições detentoras de poder bélico (LIMA, C. M.; BUENO, L. 87


B., 2010). Nesse sentido, Marcelo Lopes de Souza afirma que esta militarização ampliada da (in)segurança e da questão urbana produz a conformação de um estado de medo generalizado (SOUZA, 2008 apud BUENO, L. B., 2010). Analisando este cenário, Leonardo Bueno considera que “a favela na cidade configura o espaço - histórico e desigual – destacado da combinação das mais distintas formas de violência da cidade”, nesse sentido, o autor afirma que estes territórios apresentam “características que nos permitem representá-los enquanto territórios de exceção, onde efetivamente existe a exclusão de direitos civis, políticos e sociais para a maioria de seus moradores” (BUENO, L. B., 2010, p. 42). Nesse sentido, o autor afirma: As favelas da cidade do Rio de Janeiro vivem um estado de exceção, não de­clarado legalmente, mas territorializado no cotidiano de seus moradores e trabalhadores. Além do histórico desrespeito aos direitos essenciais para a sobrevivência e reprodução social – via degradação do ambiente e privação de serviços públicos básicos -, as favelas da cidade sofrem explicitamente formas cotidianas de supressão de direitos civis e políticos (p. 43). Explorando esta categoria política, podemos recorrer ao texto da Carta Magna do país: a Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 1988. Em seu estudo, Bueno (2008) chega a afirmar que, no que diz respeito ao artigo 5º da CF/88, que trata os direitos civis dos cidadãos, nos territórios de exceção a Constituição torna-se “praticamente letra morta”. O que sustenta esta ideia é o cotidiano do morador de favela que assiste, passivamente, o princípio da isonomia – garantia jurídica a todos de tratamento igual perante a lei –, o princípio da inviolabilidade do lar, considerado “asilo inviolável do indivíduo”, e tantos outros serem, sistematicamente, negados pelo Estado. Este flagrante desrespeito à Constituição - afirma o autor - se reproduz e se perpetua sob a indiferença das elites da sociedade, que se reflete diretamente na indiferença dos governantes, que não apenas ignoram a barbárie das vio­lências cometidas dentro dos territórios de favela, como a naturaliza e mesmo glorifica (p. 44). Outra autora, se referindo a esta condição das classes subalternas na cidade do Rio de Janeiro afirma que: “... a condição de subcidadania desses segmentos populacionais [clas­ses subalternas] não deriva apenas da impossibilidade do 88


acesso a bens e serviços que o Estado não garante ou não realiza de forma parcial e limita­da, mas do fato de que sua modalidade de acesso(precário) à cidade ocorre sob o controle e a mediação do poder despótico de quadrilhas do tráfico de drogas sediadas nesses territórios e/ou segundo o arbítrio das forças de segurança pública que usualmente transita do abuso policial à criminaliza­ção dos moradores e de sua ação coletiva” (Leite, 2005, p.43 apud LIMA, C. M.; BUENO, L. B., 2010, p. 44). Atrelado, ainda, a todas estas condições de vida impostas aos moradores de favelas, existe um processo de criminalização do território, o que legitima a permanência da favela enquanto território de exceção e que contribui, em última instância, para a negação das condições fundamentais para a gestão democrática da cidade. A TRAJETÓRIA DAS MOBILIZAÇÕES SOCIAIS EM MANGUINHOS Diante deste cenário, retratado na seção anterior e caracterizado pela pobreza e demais formas de violência social, a capacidade criativa da população na construção de alternativas para mitigação desses fatores merece especial destaque. Haja vista que, se, por um lado, a intervenção do Estado em Manguinhos contribuiu para legitimar um território de exceção, por outro lado, essas condições de vida impuseram, também, aos moradores a difícil tarefa de forjar estratégias para resistir às mais diversas formas de violência. Nesse contexto de resistência e buscando adquirir uma capacidade coletiva de decisão e, ao mesmo tempo, exercer o controle quanto à utilização de recursos existentes em Manguinhos, seus moradores, as lideranças sociocomunitárias, e os mais variados partícipes se envolveram em torno de uma agenda de participação intersetorial. Deste modo, a participação comunitária se apresentou como a principal via de acesso à transformação da realidade local, ou seja, o caminho basilar para resolver problemas que vão da moradia à violência, da cultura à educação, da saúde à geração de trabalho e renda. Uma importante experiência dessa mobilização foi a articulação, a partir de 1999, do Programa de Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável (DLIS), mobilizador de parcerias e lideranças, através de uma alteração substantiva na forma de se relacionar com a comunidade. 89


Com a intenção de superar o assistencialismo e o clientelismo, o DLIS estabeleceu um modo de operar que integrava o desenvolvimento econômico ao social e cultural, e se apoiava nos seguintes fundamentos: 1ª) participação popular na definição das prioridades locais, através de processos participativos de diagnóstico, planejamento e avaliação; 2ª) colaboração intersetorial, através da coordenação do trabalho de diversos setores do governo e da comunidade, visando à formulação de uma agenda comum. O DLIS buscou instituir um processo de decisão que resultasse - por meio de diálogos e negociações com a participação de diversos atores sociais, governamentais e não governamentais, presentes no território - em novos arranjos institucionais e novas arenas de decisão das políticas públicas. A partir dessas experiências, Manguinhos assumiu, ao longo da história, uma posição privilegiada no que diz respeito à movimentação política de seus moradores. No entanto a história mais recente revela um caso raro de organização sociocomunitária das favelas do Rio de Janeiro, o Fórum do Movimento Social para o Desenvolvimento Equitativo e Sustentável de Manguinhos, ou, como popularmente é conhecido: o Fórum Social de Manguinhos (FSM). Constituído em 2007, o Fórum é um espaço que reúne moradores, instituições, movimentos sociais que defendem a cidadania e os direitos sociais, através da participação direta na concepção, construção, execução, monitoramento e controle social (gestão social) das políticas públicas (OLIVEIRA, M.; BUENO, L. B., 2011). Esta contínua mobilização deu condições para que, a partir, principalmente, das reivindicações do Fórum, Manguinhos fosse contemplado na agenda do Programa de Aceleração de Crescimento Urbanização de Favelas, ou PAC Comunidades, como ficou conhecido. Considerando o Fórum como um espaço onde as discussões sobre saneamento básico e moradia assumiram ao longo de muito tempo determinada centralidade, é possível entender que este importante ator social do território teve papel decisivo no processo de reivindicação pela inclusão de Manguinhos na agenda de intervenção deste programa e, além disto, é importante situar a importância do Seminário “Redução da vulnerabilidade socioambiental na Região Maré/Manguinhos na Cidade do Rio de Janeiro”, realizado no dia 18 de dezembro de 2006, na ENSP, que representa um marco da inclusão de Manguinhos no PAC e que foi fruto da mobilização de atores sociais locais que formavam 90


a Agenda Redutora de Violências, apoiada pela Fiocruz. Nesse contexto, Manguinhos tornou-se palco de um dos projetos mais emblemáticos do período, o PAC. Este estudo não se propõe a fazer uma análise das obras de infraestrutura, antes, porém, nós pretendemos analisar outro projeto, apresentado como uma faceta que o PAC Comunidades denomina de Trabalho Social. Resumidamente, as ações da Equipe Técnica do Trabalho Social dividem-se em dois movimentos paralelos: um grupo trata de potencializar os aspectos positivos da obra e minimizar os negativos. É o que se chama de Gestão de Impactos. E o outro grupo trata das ações de Educação Ambiental, Participação Popular e Geração de Trabalho e Renda. É o chamado Desenvolvimento Sustentável. E é exatamente no bojo das ações desse último que Manguinhos retoma o debate sobre o seu desenvolvimento. A proposta apresentada pela Equipe Técnica do Trabalho Social do PAC, a partir de fevereiro de 2011, levou em consideração os erros e acertos contidos no histórico da comunidade. Sem menosprezar a importância da Fundação Oswaldo Cruz no território, os técnicos do PAC realizaram uma série de consultas aos moradores e organizações locais propondo, basicamente, a superação da fragmentação da comunidade e a constituição, através da integração das múltiplas e reduzidas representatividades, de um novo arranjo institucional capaz de permitir a sinergia das vontades coletivas na perspectiva da superação dos problemas sociais. No dia 06 de junho de 2011 é apresentado - no Centro de Referência da Juventude, equipamento público construído pelo PAC - o resultado destas conversas e debates cotidianos, realizados ao longo de quatro meses, que recebeu o nome de Conselho Comunitário de Manguinhos. O primeiro ato público deste Conselho - seu lançamento - contou com a participação de 29 entidades, governamentais e não governamentais, e, na ocasião, foram constituídos os Grupos Temáticos: (a) Comunicação e Turismo; (b) Assistência Social e Direitos Humanos; (c) Saúde, Esporte e Lazer; (d) Urbanismo e Ambiente; (e) Educação e Cultura; (f) Trabalho, Renda e Solidariedade. Estes Grupos passaram a desenvolver suas ações e, no dia 16 de setembro de 2011, é realizada, no Centro Vocacional Tecnológico (CVT Correios/FAETEC/Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia), a primeira reunião do Conselho Comunitário de Manguinhos, onde são apresentadas as atividades e propostas de trabalho de cada um dos Grupos Temáticos. 91


A EXPERIÊNCIA DO CONSELHO COMUNITÁRIO DE MANGUINHOS Uma vez situado o contexto no qual o CCM foi criado, torna-se fundamental uma reflexão sobre a interface entre as propostas do Conselho e as demandas locais. Assim sendo, é importante pensarmos de que maneira isto se materializa; surge, então, a partir daí, alguns questionamentos: De que forma o CCM dialoga com as iniciativas que já existem no território? Como se processa a relação entre o CCM e os moradores? De que modo este colegiado dialoga com os problemas da comunidade? Como reforçar a cultura política republicana? Nesse sentido, num esforço – certamente limitado – de responder a estas perguntas, esta seção se propõe a apresentar o aparente conflito entre o CCM e a realidade de Manguinhos. No momento em que foi criado, o CCM consolidou sua organização interna, que se dá através dos Grupos Temáticos, os chamados GTs, e também construiu e aprovou, ainda em 2011, seu regimento interno, que o define da seguinte maneira: “[...] um colegiado autônomo, propositivo e promotor de ações e diálogos entre moradores, instituições privadas, governamentais e sócio comunitárias - que tem como objetivo contribuir para o Desenvolvimento Sustentável das comunidades que compõem o território ampliado de Manguinhos de forma integrada à cidade.” Embora este Regimento Interno tenha sido construído e aprovado coletivamente, foi possível perceber, ao longo do tempo, um distanciamento entre essa definição e a prática dos GTs. Tornou-se notável, então, que a tônica dos debates promovidos era referente à gestão de conflitos imediatos e, por conseguinte, as discussões acerca da construção de planos amplos e estruturantes, que propunham uma profunda intervenção social, adquiriram contornos abstratos e sem caráter pragmático. Em virtude disto, a urgência das situações imediatas a sanar tomava a frente e, assim, a proposta inicial do CCM ficou secundarizada. De fato, o CCM se propõe a ser um espaço capaz de ir além do horizonte imediato e de traduzir em projetos coletivos o que de outra forma se apresenta como demandas desagregadas, pontuais e individualizadas. No entanto, o pragmatismo desta intervenção no território ficou limitado pelo caráter abstrato que as propostas assumiram. É, então, a partir deste momento que é anunciado o embrião do conflito entre o CCM e a realidade. Este conflito, que prefiro caracterizar como “aparente”, visto que, na verdade, não existe di92


vergência de interesses nem antagonismo entre grupos, teve dois principais desdobramentos: por um lado, a leitura das propostas como abstrações fez com que os GTs considerassem que elas não deveriam ser contempladas nas suas pautas de discussões; por outro lado, os Grupos que insistiram nestas propostas sem uma abordagem metodológica específica testemunharam um processo de evasão dos atores envolvidos nos debates. Diante deste cenário, os conselheiros, reunidos em assembleia, discutiram o problema e perceberam a existência de uma cultura local que contribui, muitas vezes, para manter tais atores sociais no terreno de luta imediata na qual se haviam constituído. Essa cultura é resultado de um processo histórico, no qual, segundo Fontes (2010:244), “os serviços públicos foram limitados e socialmente seletivos.” Nesse sentido, afirma a autora, que “a universalização de serviços públicos direcionados aos setores populares (como a saúde, educação, transporte ou a previdência) jamais chegou a ser completa.” No caso de Manguinhos, esse cenário recebe contornos específicos que agravam ainda mais as condições de vida no território: “[...] que se caracteriza por violento controle social exercido sobre a maioria de seus moradores; violação de direitos civis e políticos por aparelhos de coerção públicos e privados; pouco acesso a direitos sociais (acesso à educação, saúde/ambiente, habitação, etc.); alto desemprego e precarização acentuada do trabalho; baixa escolaridade e acesso restrito à saúde pública; condições ambientais deterioradas; população empobrecida, desprovida também de capital cultural e social; políticas públicas assistencialistas e paternalistas; cultura de massa incentivando ação individualista e fragmentada; criminalização do território.” (LIMA, C. M.; BUENO, L. B., 2010, p. 14, grifos nossos). Inseridos, portanto, nesse contexto de vulnerabilidade civil e socioeconômica, os atores sociais locais assumem uma postura de recusa diante das reflexões mais aprofundadas sobre a realidade – isto é, que procurassem articular as lutas de cunho corporativo32 a projetos sociais mais amplos e, nesse sentido, educar de forma contra hegemônica esses movimentos populares. Frente a esta conjuntura, o CCM definiu algumas estratégias para dialogar com essa realidade, dentre as quais, é possível des32

Corporativo no sentido do “egoísmo grupal”, como dizia Antonio Gramsci.

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tacar as ações mais recentes deste colegiado. Como forma de legitimar outros espaços do território, o Conselho vem participando de algumas iniciativas já consolidadas, tendo em vista (re)criar uma articulação para a construção de uma política participativa. Além disto, outro recente esforço do CCM é alinhar ações de curto, médio e longo prazo, pois, assim, acreditamos ser possível explicitar a relação entre as ações mais imediatas com os objetivos mais gerais e estruturantes de cada grupo. Para melhor elucidar esta questão, é interessante recorrer à experiência do GT Educação e Cultura, que consegue traduzir o atual momento que o CCM está passando. Alinhado à ideia de legitimar outros espaços do território, este grupo definiu, no sentido mais pragmático, a estratégia de seus membros participarem de reuniões de projetos do setor de educação, como o Território em Transe, o Tecendo Redes, o Bairro Educador, etc. Além disso, este mesmo grupo está compondo, atualmente, seu mapa de ações, que consiste num esforço de sistematizar os objetivos de curto, médio e longo prazo deste grupo. Desta forma, os membros deste GT discutem, por exemplo, quais são as ações mais práticas que eles podem desenvolver para promover uma aproximação entre os pais dos alunos e as escolas; pensam, também, que tipo de atividade pode ser promovida para que os alunos se interessem mais pela escola e, desta maneira, diminua o índice de evasão escolar. É possível considerar, portanto, que o CCM se apresenta como um importante espaço de gestão democrática do território, pois é capaz de condensar não só as demandas imediatas e mais emergenciais, como também a pactuação de propostas mais estruturantes e amplas para o território de Manguinhos. CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante da breve análise promovida pelo presente estudo, é possível considerarmos que as favelas, historicamente, têm a feição de guetos. Aglomerados onde vivem cidadãos indispensáveis ao funcionamento da cidade, integrados economicamente a ela, porém excluídos dos direitos de cidadania desfrutados pelos demais cidadãos, configurando assim verdadeiros territórios segregados ao pleno Estado de Direito Democrático, isto é, territórios de exceção (LIMA, C. M.; BUENO, L. B., 2010). 94


Além disto, constatamos que a experiência do Fórum de Manguinhos, a partir de lideranças populares e de atores institucionais, que foram protagonistas na mobilização e em conquistas como os recursos destinados ao PAC Manguinhos, reforça a importância de considerar a história deste território, seus processos de ocupação e o capital cultural e social para a construção de políticas públicas. É importante considerar, ainda, a sugestão de Daniel Soares, para quem a “solução para a integração cidadã das favelas entre si e a cidade como um todo, passa pela inclusão efetiva de sua população ao Estado de Direito”. Nesse sentido, o autor reforça a ideia e a posição do CCM no que se refere a este tema e continua, afirmando que “cabe, destacadamente, aos movimentos populares locais, levar a discussão de que os moradores de favelas são cidadãos com os mesmos direitos e deveres do que os demais habitantes da cidade” (LIMA, C. M.; BUENO, L. B., 2010. p. 35). Entendendo, portanto, que as possibilidades de construção de uma política solidária e emancipatória nesses territórios e nos projetos contidos em seus moradores, apenas podem se desenvolver caso sejam impulsionadas por políticas que se territorializem a partir de perspectivas críticas e participativas, o CCM tem se apresentado como um espaço de construção de propostas amplas e estruturantes - que são pactuadas e consensuadas entre seus membros - para intervir de forma participativa no território. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BUENO, L. B. Forma e sentido da resistência na cidade do Rio de Janeiro: a luta da ocupação Quilombo das Guerreiras, 2007. Dissertação de Mestrado, Rio de Janeiro: Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (IPPUR), Universidade Federal do Rio de Janeiro. FONTES, V. O Brasil e o capital imperialismo: teoria e história. 2. ed. Rio de Janeiro: EPSJV/Editora UFRJ, 2010. LIMA, C. M.; BUENO, L. B. (org.). Território, participação popular e saúde: Manguinhos em debate. Rio de Janeiro: ENSP/Fiocruz, 2010. 104 p. OLIVEIRA, M.; BUENO, L. B. Análise do Processo Educativo na Luta do Fórum do Movimento Social de Manguinhos. In: Marx e o Marxismo 2011: teoria e prática. Niterói. Anais... Niterói: Núcleo Interdisciplinar de Estudos e Pesquisas sobre Marx e o Marxismo (NIEP-Marx), 2011. 8 p.

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O desenvolvimento do Brasil depende também do desenvolvimento da favela Alzira Amaral33

A favela ou comunidade carente, como melhor soar aos ouvidos de todos, é um pilar IMPORTANTE no alicerce do plano de desenvolvimento do nosso país, pois um país forte depende muito de uma população saudável, bem educada academicamente, preparada para os avanços científicos e tecnológicos, consciente da necessidade de um mundo cada vez mais autossustentável onde o desperdício seja mínimo. Porém olhamos para favela de hoje, e também para a de 20 ou 30 anos atrás e constatamos que o nosso desenvolvimento foi quase nulo, no Pavão-Pavãozinho também, não sendo levianos ao ponto de esquecer das obras que foram feitas em nossa comunidade pelo saudoso humanista e apreciador das causa sociais - o senhor Leonel de Moura Brizola -, que se sensibilizou com o acidente da caixa d’água e resolveu nos agraciar com obras de saneamento básico, pavimentação, unidades habitacionais, abertura de vias carroçáveis, e, o mais importante, construiu um Ciep que chamamos carinhosamente de “Brizolão”, que tinha horário integral e um ótimo ensino acadêmico, além de atividades extracurriculares, era a escola dos sonhos de todos os pais. Contudo, hoje quase 25 anos depois passamos por obras infraestrutura, mas são só obras! Ajudam? Sim, porem o desenvolvimento da favela não gira somente em torno de obras, e sim num conjunto de fatores que somados e executados darão a chance da favela crescer e ajudar no crescimento do País. Os fatores primordiais apontam para: •  Saúde e coleta e descarte do lixo •  Educação de qualidade (ensino fundamental, médio). •  Qualificação profissional SAÚDE e LIXO: Uma favela mais limpa é sinônimo de saúde. O lixo é um problema em quase todas as comunidades, e propicia a transmissão de doenças causadas por insetos e roedores que vivem no seu entorno. 33

Presidente da Associação de Moradores do Pavão-Pavãozinho.

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O lixo que chega ate os contêineres espalhados pela comunidade e nos espaços de recolhimento da Comlurb é retirado, mas o que não chega fica nas vielas, becos, atrás ou em baixo de residências, além dos entulhos de obras que são abandonados. Não queremos culpar somente a Comlurb, no entanto faltam pessoas disponíveis para a limpeza. Ressalto que a culpa é também da má educação dos moradores que insistem em jogar lixo em locais inapropriados. A solução para esse impasse seria a criação do “GARI COMUNITARIO ECOLOGICO”. Esses Garis trabalhariam recolhendo o lixo e os entulhos. Separariam os materiais recicláveis, ajudariam em campanhas sócias educativas, e é claro dariam apoio a Comlurb, e ajudariam na sustentabilidade do país através da reciclagem. Mas os recursos teriam que vir da iniciativa privada, pois os governos estão proibidos por decisão do Supremo Tribunal Federal de reeditarem esse projeto. EDUCAÇÃO: Como já frisei acima, e em falas anteriores, a educação é um fator essencial para o desenvolvimento do Brasil, mas como a nossa comunidade ou as coirmãs podem dar a contribuição necessária para esse feito, se temos uma escola precária, com um ensino muito aquém do aceitável, e professores desestimulados? Pergunto como podemos fazer para estimular professores e alunos do nosso Ciep João Goulart? Como podemos ajudar no desenvolvimento, tendo a escola local o pior desempenho do município? Nos sentimos envergonhados e fazemos um apelo para que as autoridades públicas façam uma intervenção nesse espaço indecente. Segundo pesquisas, os países mais desenvolvidos têm usado a capacitação dos professores como estratégia para o melhor desenvolvimento e produtividade das aulas. Professor capacitado é sinônimo de aumento da média das notas escolares. O reforço escolar que não dá certo aqui no Rio de Janeiro é referencia na Finlândia, onde um professor dá aula para 07 alunos identificados com a necessidade de reforço escolar, e os mesmos têm essas aulas no turno que se contrapõem ao deles, e no seu horário regular assistem a suas aulas com suas respectivas turmas. Só com mais investimento na educação e, principalmente, nas escolas que ficam próximas ou dentro das favelas, poderemos ter uma educação digna de formar cidadãos preparados para aju98


dar nessa árdua tarefa de desenvolver o nosso país. Os países que investem pesadamente na educação têm grandes índices no PIB, e menor taxa de mortalidade infantil. Vejo como é tratada a questão da educação os Estados Unidos, pois é interessante quando assistimos qualquer liga profissional de esporte e vemos a apresentação dos jogadores falando de qual universidade vieram e na sua maioria são formados em alguma disciplina do nível superior. Eu acredito que também devemos incentivar praticas esportivas nas escolas como fonte de incentivos para os alunos. E se todas essas metas forem compridas poderemos dizer “UMA ESCOLA LOCAL FORTE DARÁ BONS FRUTOS PARA O DESENVOLVIMENTO DO PAÍS”. Mas esses maiores gastos tem que ser investidos corretamente, caso contrário é o nosso dinheiro que vai pela janela. QUALIFICAÇÃO: Na minha última apresentação neste Fórum Nacional afirmei que era necessária a criação de escolas técnicas na nossa comunidade e nas demais favelas participantes deste Fórum. Sabemos que a classe alta gera mão de obra com formação de nível superior e qualificada para a indústria, construção civil e comercio, entre outros setores, e também que esta classe é a minoria em nosso país, e por causa deste fator existe uma defasagem, ou seja, falta de pessoas qualificadas nos postos técnicos. Neste sentido, minha ideia é a principio dar oportunidade aos nossos jovens recém-formados no ensino médio, ou ate mesmo cursando. E como transformar essa teoria em pratica? Como acreditar que somos capazes? E muito capazes? Então a ideia é fazer parcerias com as indústrias, comércio, as empresas da construção civil e instituições interessadas em apoiar o projeto. As empresas e instituições firmariam parcerias diretas com as comunidades, dando suporte técnico e financeiro para serem montadas as escolas técnicas, pois acredito que essa estratégia seja importantíssima para que a favela possa de fato ajudar no desenvolvimento humano do país do qual ela faz parte muitas vezes na situação de vítima. No projeto de qualificação que desenvolvi foram identificadas necessidades das empresas da construção civil, como a necessidade de diminuir o desperdício de materiais e tempo no prazo de entrega das obras. As empresas não têm tempo para preparar me99


lhor seus mestres, encarregados, profissionais, e ajudantes, pois apesar de terem os engenheiros de produção supervisionando e comandando as obras, eles não estão a todo o momento à frente da produção e nem todos eles têm a capacidade para dar o padrão de qualidade estabelecido pelas empresas. Esses fatores me fazem enxergar a qualificação profissional técnica como arma para o desenvolvimento do nosso país. Outro dado importante que devo ressaltar aqui é que boa parte das pessoas que trabalhão no setor da construção civil é composta de moradores de comunidades, e eu creio que se vocês da construção civil atentarem para este fato qualificando a mão de obra na sua origem, a favela será bem utilizada no seu potencial para ser um celeiro para o desenvolvimento do país. Ouvi isso ontem aqui nesse Forum e podemos também ajudar no aumento da produção do país. Finalizando, ressalto que saneamento mais educação, qualificação profissional e vaga no mercado de trabalho, respeitando nossos talentos e vocações, são propostas dignas e fáceis de resolver. Peço ao poder público que nos ouça.

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Rocinha: respeito e dignidade para todos – o triste exemplo do Laboriaux José Ricardo Duarte Ferreira34

A Câmara Comunitária Rocinha, São Conrado e Gávea é uma organização democrática, priorizando o diálogo com propostas objetivas que, de forma plural, mapeia as demandas das comunidades envolvidas a exemplo das necessidades urgentes de saneamento básico na Rocinha não contempladas de forma minimamente satisfatória. Parece uma vergonha aos integrantes da Câmara em pleno século XXI, depois de tantos investimentos e tanta propaganda na mídia, esta comunidade ainda estar discutindo problemas de esgoto à céu aberto, falta de água, excesso de lixo etc. enfrentados por seus mais de 100 mil moradores. Mesmo sendo “vitrine” do Rio de Janeiro, recebendo milhares de visitantes mensais e oferecendo mão de obra para toda a zona sul desta cidade, a Rocinha continuará sendo o lugar “exótico”? o contraste nas condições de vida entre esta comunidade e a Gávea e São Conrado interessa para quem? Pois segurança é também qualidade de vida além de uma intervenção militar. E qualidade de vida não se faz com armas. Assim a Câmara entende. Assim o próprio poder público discursa. E a sociedade aplaude. Esperamos uma atitude concreta atendendo nossos maiores anseios. PAC sim, UPP sim, mas junto com saneamento básico, regularização fundiária, saúde e educação de qualidade incluindo o apoio às creches comunitárias e aos pequenos empreendimentos dos moradores locais. Respeito e dignidade SIM. Durante anos os investimentos nas comunidades do Rio de Janeiro, e também na Rocinha, se deram repetidas vezes nas mesmas subunidades da favela (localidades específicas) pela sua maior visibilidade política. Isso se deu em detrimento de outras localidades em geral mais distantes, com menor visibilidade na mídia, ainda que sejam estas últimas as mais necessitadas. Nesse contexto foram se criando grupos de moradores diferenciados no interior da comunidade em função do acesso ou do não acesso aos equipamentos e serviços públicos, o que tem prejudicado um meCoordenador da gestão compartilhada da Câmara Comunitária Rocinha, São Conrado e Gávea e liderança comunitária do Laboriaux.

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lhor convívio comunitário. Na Rocinha temos como exemplo neste sentido a subunidade ou localidade do Laboriaux, situada no alto, cujos moradores vivem em permanente estado de tensão. Temos que priorizar os investimentos em lugares como esse, que muitas vezes são pontos extremos da comunidade, e reverter a chamada “remoção branca” que já está acontecendo principalmente em comunidades com UPP. E na Rocinha esse problema preocupa muito e a todos. Afinal, o território pertence a quem? Quem fez e faz a sua história? O fato de parte significativa dos moradores da Rocinha não estar em condições de arcar com os “deveres” ou os custos da formalização (ainda que sem acesso aos direitos de cidadania correspondentes), além da crescente especulação imobiliária (aumentando o valor dos imóveis e dos aluguéis), agrava a distância social deles entre si, os quais têm condições diferenciadas com relação à renda e à escolaridade. Junte-se a este fato o crescente investimento de capital externo através de pessoas oriundas de outros lugares do Rio de Janeiro, outros estados e até de fora do Brasil que estão de forma ativa e muito rápida ocupando espaços na comunidade para morar de forma provisória ou definitiva, estabelecer relação comercial através das várias oportunidades ofertadas, oportunidades estas que moradores locais não têm condições de usufruir. Essa realidade não é só da Rocinha, mas também de outras comunidades sob processos de intervenção do estado. Em todas, muitas vezes pessoas de fora vêm prestar serviços com qualificações que encontramos dentro da comunidade, não existindo uma política por parte do poder público e de outros agentes de priorizar a mão de obra local, numa tentativa de privilegiar o desenvolvimento endógeno (de dentro para fora da comunidade). Por quê não fazê-lo? Por quê não existe uma política neste sentido? Por que o comércio e os serviços (bancos etc.) de fora que se instalam na comunidade não trazem consigo algum benefício para essa, como responsabilidade social? Por quê as iniciativas já existentes não são melhor apoiadas? O mesmo diríamos com relação aos moradores. Por que não ajudá-los a permanecer no território? As pessoas que residem na Rocinha ainda estão com o peso da desconfiança de ações de governos passados que vinham ao local, prometiam e até iniciavam propostas de melhorias que não eram (e ainda não são) concluídas quase que na unanimidade dos casos, aumentando o descrédito com relação à atuação desses e 102


fazendo com que a comunidade apresente duas “caras” para o público em geral: a maquiada, que esta na grande mídia focando sua rua principal, melhor servida de segurança, transporte, saúde, acessibilidade, serviços básicos, cultura e lazer (caso da estrada da Gávea, na Rocinha); e a outra, de becos, travessas e vielas esburacadas, pouco iluminadas, com esgoto e lixo acumulados, sem ventilação. favorecendo a proliferação de doenças, fornecimento irregular de água, entre outros. Becos por vezes inseguros, com valas à céu aberto ao lado e até embaixo de moradias com enorme quantidade de roedores e insetos afetando à saúde dos moradores que não contam também com acessos para deficientes físicos e para si mesmos, para idosos, por exemplo. Conforme ressaltamos, por décadas o estado investiu nos mesmos lugares nas favelas, naqueles de maior visibilidade (ruas principais…). Na maioria das vezes este já vem com um “pacote pronto” de ações para realizar nesses locais escolhidos, sem olhar pra cima ou para os pontos mais distantes da comunidade; ou mesmo para as especificidades no interior da mesma. O estado, agindo dessa forma, contribui para a existência de um grupo muito grande de pessoas sofridas que, na sua maioria, têm a autoestima abalada pelo meio hostil em que convive, criando filhos sem propostas com relação ao seu futuro. Novamente o Laboriaux é um exemplo triste neste sentido. O Laboriaux é um sub-bairro da Rocinha, fruto de um loteamento feito pela Prefeitura Municipal na década de 80 com a finalidade de reassentar 73 famílias que moravam de forma precária às margens de uma vala, no famoso Largo do Boiadeiro. Essas famílias por décadas têm estado abandonadas à própria sorte, pois se nos anos 80 lhes foi entregue uma moradia composta de sala, banheiro, cozinha e um quintal supostamente para ampliá-la, poucas vezes receberam atenção por parte do poder público, ainda que na atualidade já abrigue em torno de 700 famílias. Muito antes pelo contrário: estas são permanentemente desafiadas por este. Após as fortes chuvas de abril de 2010 o Laboriaux teve problemas pontuais (três pontos críticos de deslizamento). A partir daí, sem apresentar nenhuma justificativa oficial ou abrir um canal de diálogo com moradores locais, todos aí instalados foram notificados pela defesa civil para saída da localidade baseada num laudo anterior à data do acidente e que generalizava a cidade do Rio de Janeiro como um todo. Neste momento começaram a entrar no La103


boriaux funcionários da Secretaria Municipal da Habitação intimando todos os moradores a serem incluídos no programa de aluguel social, o que fez com que se instalasse um misto de revolta e desespero entre os mesmos, mais uma vez desrespeitados e desamparados pelo poder público, o mesmo que lhes colocou lá em cima e nunca lhe ofereceu condições dignas de moradia. A escola local, Abelardo Chacrinha Barbosa, foi fechada assim como as igrejas e creches e a vida passou a ser um “inferno” em um lugar que antes era chamado de ¨cantinho do céu¨. Ironia trágica. Como resultado desse processo, muitos moradores passaram a ter problemas de pressão alta, sendo que um morreu de infarto. Na época organizaram-se em um grupo que articulando junto com os parceiros (Pastoral das Favelas, Núcleo de Terras da Defensoria Pública e lideranças de outras comunidades) mudou a forma de remoção indiscriminada desrespeitando o Art. 429 VI da Lei Orgânica do município. Após esta reação dos moradores, pessoas que realmente precisavam ser retiradas das áreas de risco tiveram como única opção o aluguel social. Hoje moradores do Laboriaux se sentem desmotivados mesmo com 90% das contenções de encosta terem sido realizadas e a escola ter sido reaberta recentemente. Eles sabem que a localidade não é mais uma área de risco e ainda assim a Secretaria de Habitação continua a bater de porta em porta intimando-os a negociarem suas moradias muitas vezes por valores simbólicos pois até os apartamentos oferecidos no bairro da Triagem (mais ou menos 30 km de distância do Laboriaux) não estão mais disponíveis, e a Secretaria, na abordagem a estas pessoas, não explica qual o motivo de querer negociar suas moradias. É a tal da “remoção branca” numa de suas muitas roupagens? O descaso? A falta de articulação entre as instâncias do poder público? Quem responde pelo que sabendo que a vida de pessoas está em jogo? Qual a proposta de segurança para estas? Qual a casa que vai cair? Cadê o direito a ter direitos? O que os moradores do Laboriaux precisam nós mapeamos de forma preliminar: 1. A não remoção dos que não estão em área de risco. 2. A manutenção da Rua Maria do Carmo e José Inácio já, suas principais vias que, pela ação do tempo (30 anos), estão quase que totalmente desgastadas. 104


3. A criação de uma nova rede de esgoto, pois a antiga tem mais de 30 anos e não comporta a carga atual. 4. A retirada do entulho com reflorestamento de toda a área de demolição das edificações. 5. A inclusão do sub-bairro do Laboriaux no PAC (projeto do PAC II). Os governantes e todas as instituições envolvidas têm a obrigação de olhar e atender de forma digna e respeitosa a todas as localidades e respectivos moradores a exemplo dessas que acabamos de citar que, mesmo sendo pequenas em termos relativos, contam com moradores que cumprem seu papel enquanto cidadãos “de bem” dentro de uma sociedade que muitas das vezes não os reconhece; são mães que trabalham em casa de “madames” no Leblon ou Ipanema sem uma creche para deixar seus filhos, pais que trabalham nos bares, restaurantes e hotéis de luxo na zona sul do Rio de Janeiro, e outros. Estes, quando voltam para suas casas, se sentem aflitos e desesperados ante às ameaças constantes de remoção e a realidade de suas famílias convivendo com ratos, insetos e uma infinidade de doenças, de jovens desesperançosos que, por falta de oportunidades, vivem sem perspectiva de futuro melhor; ou mesmo de algum futuro. Sobre este último aspecto vale considerar que nem todo jovem tem inclinação para o esporte ou a para a cultura, áreas da maior parte dos projetos oferecidos na comunidade. Os que não se enquadram neste perfil ficam sem oportunidades dentro da favela. Nessa, é importante saber, a realidade do jovem é diferenciada, muitos esperam na adolescência uma oportunidade no mercado de trabalho seja como aprendiz ou em um estágio para ocupar seu tempo livre e não ser cooptado pela influência negativa de grupos muitas vezes criminosos que se aproveitam da situação “de menor” destes, amparados pelo ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente). Para isso precisavam ter acesso à uma educação de qualidade, o que não acontece. Muito antes pelo contrário. Ela é um absurdo. E nenhum jovem é incentivado a permanecer na escola, que está longe da sua realidade. Agrava o contexto acima o fato dos provedores das famílias de onde esses jovens vêm não conseguirem suprir as necessidades dos mesmos, quanto mais sabendo que a juventude de hoje é imediatista e competitiva (como toda a sociedade). Neste contexto, 105


assistimos - com pesar – alguns jovens caírem na armadilha das drogas (como usuários) e do crime. Enquanto isso se vê na mídia palavras “politicamente corretas” como sustentabilidade, igualdade, oportunidades. Estas e outras palavras deveriam ter sentido e ser dirigidas para todos incluindo os moradores de favela, para não cometermos o erro de criar a favela dentro da favela como já está acontecendo em várias favelas e a Rocinha não foge à regra. Igualdade e oportunidades para quem? Criação de guetos dentro da favela? Remoção branca? Expulsão camuflada? Fala sério… Vamos nos respeitar! Democracia é isso! A regularização fundiária de uma forma mais rápida, diante da urgência da situação, em conjunto a uma legislação especifica poderá ser o inicio de um trabalho de valorização do morador de favela, pois quando ele souber que é realmente dono de sua casa vai passar a dar mais valor não só a sua casa, mas também a todos os serviços, seus direitos, obrigações e deveres assim como à sua comunidade, motivando o exercício de cidadania de forma plena e a devida apropriação do território, patrimônio que lhe pertence e que lhe identifica. Tudo o que foi falado aqui passa primeiro por pessoas e pessoas valorizadas se relacionam, produzem, vivem mais e melhor. Sobretudo se forem percebidas com iguais direitos. Como seres humanos. Indiscriminadamente. Em resumo, que venha a UPP para as favelas e para a Rocinha, mas que venham também todos os bens e serviços que são direitos de cidadania das pessoas que moram do outro lado da “cidade partida” (ou integrada à cidade de forma perversa), saneamento básico, saúde e educação básica de qualidade, esporte, lazer, cultura acessibilidade para os deficientes físicos, segurança e muito mais, para que no futuro o termo cidade partida seja esquecido. Apartheid social chega! Está na hora de deixar a hipocrisia de lado e olhar a favela de forma integrada, respeitosa e digna. A Rocinha quer ser olhada como ela é; com a “cara” que os moradores lhe dão. Afinal, favela é cidade. Esta aí o Fórum Nacional, a publicação Favela como Oportunidade repetindo isso o tempo todo. Que seja o mantra nosso de cada dia…Que a mídia e o poder público cheguem junto. Entendam nosso contexto. Isso é o que queremos. Essa é a nossa luta.

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Um Plano de Inclusão Social de Favela José Martins de Oliveira35

Entendemos que num plano com essas características não podem faltar obras de saneamento, aproveitando os talvegues canalizados para abertura de ruas visando maior acessibilidade e melhoria no meio ambiente, contenção de encostas e coleta de lixo permanente. Faz-se necessária também a melhoria habitacional com assistência técnica e regularização fundiária, com uma legislação específica que proíba o desmembramento de lotes e gabarito no máximo com 04 andares, creche com capacidade para todas as crianças da comunidade, cursos técnicos nas áreas de informática, edificações saúde, cultura e turismo/gastronomia. Estas obras devem ser feitas com transparência para que a comunidade possa acompanhar, evitando o que aconteceu nas obras do PAC I na Rocinha. Em dezembro de 2010 tudo parou, deixando de serem executados mais ou menos 300 metros de canalização de um valão, restando ainda uma creche inacabada, o mercado popular e um plano inclinado só iniciados. Não sabemos o motivo da paralisação e o que foi feito com o recurso previsto para a execução da mesma.

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Agente social da Fundação Bento Rubião / coordenador do grupo Rocinha sem Fronteiras

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Rocinha - sobre a Câmara Comunitária José Ricardo Duarte Ferreira e Arley Macedo36

Apresentação Rio de Janeiro. Cidade em redesenho. Cidade em transformação. Na cidade integrada os diferentes estabelecem pactuações. Daí surge a cidade democrática. Tem que haver o princípio de dignidade do uso do espaço público. Morar na mancha urbana é diferente que morar na cidade. Por isso é necessário construir a cidade integrada. O bem público ser de uso de todos. A Câmara Comunitária surge a partir da necessidade do diálogo entre bairros que se conectam territorialmente e também da necessidade do diálogo entre as pessoas, o poder publico, as instituições públicas e privadas, trabalhadores, donas de casa, estudantes, juventude, associações de moradores, Ongs, Ocips e OS. Em 2009, Comitês de Acompanhamento das Obras do PAC foram os percussores deste movimento onde as pessoas, lideranças e moradores se reuniam para debater e propor demandas. Esta história se encontra no Livro Plano de Desenvolvimento Sustentável da Rocinha. Após término das obras, houve um refluxo quanto à continuidade das reuniões e a necessidade do diálogo permanecia. Foi quando incentivado pela Casa Civil/RJ e MPU Consultoria em exaustivos encontros passamos a interagir com os bairros de São Conrado e Gávea. Entretanto, novo refluxo se impôs. Perseverantes, decidimos agir e passamos a convidar todas as lideranças engajadas no processo de mudanças da cidade, buscamos o diálogo com todos os agentes representativos desta mesma cidade e a partir de quatro pessoas, fundamos a Câmara Comunitária e sua primeira reunião oficial acontece em agosto de 2011. A Câmara Comunitária da Rocinha, São Conrado e Gávea é composta por 10 GTs - Grupos Temáticos, a saber: 1 - Educação; 2 - Esporte/Lazer; 3 - Saúde; 4 - Comunicação; 5 - Juventude; 6 - Turismo; 7 - Trabalho/Renda; 8 - Urbanismo/Meio Ambiente; 9 - Direitos Humanos/Cidadania; 10 - Cultura.

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Coordenadores da gestão compartilhada da Câmara Comunitária da Rocinha, São Conrado e Gávea

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Por meio da Câmara Comunitária foram lançadas publicações sobre as demandas da Rocinha, destacando-se: 1 - Plano de Desenvolvimento Sustentável da Rocinha, 2 - Livro “A Favela e a Cidade Integradas - Plano Local de Desenvolvimento Sustentável”; CD com as Atas da Câmara Comunitária. Resultados dos Grupos de Trabalho GT Direitos Humanos/Cidadania: • Palestra e Diálogos com Comandante da UPP Rocinha. • Ônibus da Justiça Itinerante, gratuito foi a maior conquista da Câmara Comunitária. O ônibus fica estacionado em frente ao CRAS Rinaldo Delamare, todas as terças-feiras, até dezembro de 2012. • A luta por um JECRIM, com Mediadores, Conciliadores e Juiz para atendimento a população da Rocinha e entorno continua. • Diálogo com a Polícia Pacificadora, com o 23°BPM, com a 14ª DP e 15ªDP. • Diálogo com o Conselho Comunitário de Segurança CCS. GT Educação: • Palestra e Diálogos: com Pró Reitor do IFRJ. • Em busca de uma Escola Técnica. • A possibilidade de instalação do IFRJ na Rocinha: foi encaminhado pela Casa Civil, aguardando resposta. • Programa SEJA de Ensino a distância, funcionando. GT Esporte/Lazer: • Maior diálogo junto à gestão do Complexo Esportivo da Rocinha e do Instituto Reação. GT Saúde: • Realização do Ciclo Palestra e Diálogos. • Tema: Crack Pesadelo sem Fim • Maior diálogo com os gestores deste setor estratégico para a comunidade GT Juventude: • Realizada uma reunião com os jovens da Rocinha em parceria com a SASDH/RJ liderada pela Gestão Social dos Territórios da Paz 110


GT Trabalho/Renda: • Realizada feira de artesãos na Rocinha Rio+20 liderada pela SASDH/RJ em parceria com a Câmara Comunitária GT Urbanismo/Meio Ambiente: • O Parque Ecológico da Rocinha – importante conquista que vem desde as reuniões dos Comitês de acompanhamento das obras do PAC1 - e que será entregue a população até dezembro/2012. • PAC1 –Já se encontram na CEF os procedimentos para liberação das obras de complemento do PAC1. • PAC2, ainda em estudos. • Inauguração da Fábrica Verde em parceria e articulação da Câmara Comunitária com a SEA. GT Cultura: • Inauguração da C4 Biblioteca Parque da Rocinha, conquista oriunda das demandas dos Comitês de acompanhamento das obras do PAC1. • Participação dos artistas, artesãos e articuladores culturais na Rocinha Rio+20. Principais Parceiros da Câmara Comunitária: • Governo do Estado do Rio de Janeiro • Governo Municipal da Cidade do Rio de Janeiro • Governo Federal • Secretaria Geral da Presidência da República • ODM - Objetivos do Milênio • Instituto Federal de Educação do Rio de Janeiro • Casa Civil/RJ-EGP – Principal parceiro • Imprensa Oficial/RJ • Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos/RJ • Secretaria Municipal de Assistência Social da Cidade do Rio de Janeiro • Secretaria Estadual de Educação do Rio de Janeiro • Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro • Secretaria Estadual de Cultura do Rio de Janeiro • Secretaria Estadual do Ambiente do Rio de Janeiro • Secretaria de Segurança Pública/RJ 111


• Comando Geral da Policia Militar/RJ • Unidade de Polícia Pacificadora • 23° BPM • 14ª DP • 15ª DP • Conselho Comunitário de Segurança - CCS ISP • Guarda Municipal Rio – GM Rio • Empresa de Obras Públicas - Emop • CRAS Rinaldo Delamari • CIEP Airton Sena • Instituto Reação • Complexo Esportivo da Rocinha • Instituto Pereira Passos • UPP Social • TV Tagarela • Territórios da Paz • Viva Rio • OS. Viva Comunidade • Associação de Moradores de São Conrado • Associação de Moradores Alto Gávea • Associação dos Moradores da Gávea • União Pró Melhoramentos dos Moradores da Rocinha • Associação de Moradores do Bairro Barcellos - Rocinha • Kadu Eventos Esportivos • Fórum Cultural da Rocinha • Gaespa • Rocinha Sem Fronteiras • Museu Sankofa da Rocinha • Firjan • Sebrae • Sesi Cidadania • 27ª Administração Regional • Posto de Saúde Albert Sabin • Clínica da Família Rinaldo Delamari • Casa das Artes da Rocinha • Escola de Surf da Rocinha 112


Conclusão/Legado Apesar de importantes conquistas, o principal legado é a consolidação da Câmara Comunitária da Rocinha, São Conrado e Gávea como espaço plural, democrático, articulador, reivindicador e integrador dos bairros e das diferentes representações presentes, onde qualquer pessoa independente de sua condição pode ter vez e voz. “Quando passo pela Rocinha e olho aquelas casinhas coladas umas nas outras, vejo gente morando nelas!” Oscar Niemeyer

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Rocinha: PROPOSTAS aguardando realização Ronaldo Batista do Nascimento37, Antônio Carlos Firmino38 e José Martins de Oliveira39

EDUCAÇÃO Segundo dados do IBGE 2010, a Rocinha tem quase 2000 moradores entre 15 e 49 anos analfabetos. Nesta faixa etária encontra-se a população economicamente ativa. De acordo com dados do SEBRAE 2011 (baseados em dados do IPP) a Rocinha tem apenas 50 moradores cursando Mestrado ou Doutorado. Se considerarmos que as grandes decisões sobre desenvolvimento (educação, saúde, emprego, urbanização, etc.) podem ser propostas por pessoas com estes graus concluímos que é importante a participação da Rocinha com moradores nessa faixa educacional, que se inicia na educação básica, cuja responsabilidade é da Prefeitura, portanto seguem abaixo sugestões para melhoria no atendimento: • Ampliação do Projeto Escola do Amanhã para todos os moradores da Rocinha. • Fortalecimento da rede entre creches e as escolas municipais da comunidade. • Realização de diagnóstico/estudo sobre as condições atuais das creches, que sirva como base para implementação de melhorias e direcionamento dos investimentos. • Criação de vagas para o ensino fundamental na área circunscrita à AP 2.1, a fim de reduzir a demanda reprimida, (da creche ao 9° ano). Criação de novos equipamentos educacionais que atendam a comunidade. • Combater altas taxas de evasão escolar no ensino fundamental com programas de incentivos, melhoria e adequação do ensino. • Criação da Escola de Cidadania (de Pais), em parceria com SMAS, SME, Poder Judiciário e SMTR. A Rocinha, pós-ocupação militar tem experimentado uma outra realidade que requer choque de cidadania, direitos e deveres, com Liderança comunitária, integrante da Câmara Comunitária da Rocinha, São Conrado e Gávea. Liderança comunitária, integrante da Câmara Comunitária da Rocinha, São Conrado e Gávea. 39 Agente social da Fundação Bento Rubião / coordenador do grupo Rocinha sem Fronteiras 37 38

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projeto a ser desenvolvido por instituições especializadas e preferencialmente a nível local. • Educação Integral que de fato se integre às diversas ações que também são de ensino: como as diferenças culturais... e não a educação integral que vem acontecendo. Mais tempo na escola que não integra! CULTURA • Criação de uma biblioteca itinerante que percorra toda comunidade, dada sua extensão e topografia. • Incentivo à criação da Casa de Bamba, com projetos voltados para disseminação de tal estilo musical. • Criação do centro de tradições nordestinas, com possível tombamento da “feira do Caminho do Boiadeiro”. • Apoio às iniciativas do Museu da Rocinha que vem sendo construído a partir dos projetos sobre coleta de ampliação do acervo e construção da memória e história da Rocinha, junto aos parceiros que apóiam a iniciativa. • Projetos de cultura nas praças. TRABALHO E RENDA É Importante salientar que a Rocinha, segundo dados do IBGE 2010, tem um rendimento mediano entre os mais baixos da cidade. Este (incluindo os sem rendimentos) é de R$ 1.020,00 por mês, que se equipara ao de Manguinhos, Jacarezinho, Complexo do Alemão, Maré e Parada de Lucas entre outros. Vigário Geral e Cidade de Deus têm rendimentos medianos mais altos do que a Rocinha localizada entre São Conrado (rendimento mediano de R$9.000, ou 9 vezes mais alto do que a Rocinha e Gávea (rendimento mediano de R$6.000, ou seja 6 vezes mais do que a Rocinha). Na expectativa de melhoria de renda média, sugerimos os pontos abaixo: • Criação de cooperativas e/ou associações que trabalhem com reciclagem de resíduos sólidos para que possam agregar valores ao produto de forma direta com as empresas. • Criação de grupo de produção para área da construção civil voltado para novas conceitos e tecnologias sócio-ambientais. • Realização de estudo para conhecimento das demandas do mercado e levantamento das necessidades de capacitação. 116


• Criação de uma agência de empregos em parceria com grandes empresas para divulgação de oportunidades de trabalho e encaminhamento de candidatos da Rocinha. ESPORTE E LAZER • Ampliação, construção e manutenção dos espaços de esporte e lazer existentes na Rocinha. • Transformação das quadras esportivas em mini ginásios poli-esportivos e cobertos com acústicas de alguns. • Criação de novos equipamentos esportivos nas escolas públicas do entorno da Rocinha. • Criação de espaços e projetos para a formação de atletas da Rocinha para alem de 2016. • Esporte e lazer nas praças. • Desenvolvimento de projetos esportivos para portadores de necessidades especiais, em ambientes preparados para recebê-los. • Espaços físicos para 1ª infância discutidos com os grupos locais envolvidos com este segmento. CIDADANIA Segundo os dados do PAC de 2009, o correio não chega em 56,7% das moradias ou não se sabe dizer se chega. No inicio da ocupação militar uma das ações da UPP Social, coordenada pelo Instituto Pereira Passos, era oficializar os logradouros e numerar os domicílios, ainda não concluída. Solicitamos sua conclusão. A Rocinha precisa de logradouro para melhorar a comunicação e identificar melhor o morador. E entre outras ações sugerimos essas abaixo: • Efetivar a criação do Conselho Tutelar para atender o bairro da Rocinha, a fim de desafogar o Conselho que atende toda Zona Sul. • Garantir a aplicação do Estatuto das Cidades no âmbito da Prefeitura, nas áreas de interesse social de forma a controlar a especulação e garantir o acesso à propriedade. • Criar Centro de Reabilitação e integração social para pessoas com deficiência. • Através da Assistência, encaminhar pessoas portadoras de deficiência aos benefícios sociais. 117


• Criar acessos nas áreas de circulação de pedestres para deficientes físicos. • Qualificar profissionais de transportes coletivos e alternativos no trato de deficientes físicos, estudantes e idosos, com sansão sobre instituições empresariais. • Criar processo que contribua para que haja integração entre os serviços públicos: SME, SMA, SMS e SMTR. • Regularização Fundiária, propomos sua continuidade, conforme informações do PAC-Rocinha e Fundação Bento Rubião. TRANSPORTE O fluxo intenso e desordenado na Estrada da Gávea causa transtornos e engarrafamentos, por esta transitam linhas de ônibus, vans, mototaxis, além de veículos de entrega e particulares. Segundo dados do PAC 2009 apenas 10% das residências da Rocinha se encontram em áreas onde carros podem passar. Isto dificulta o acesso aos serviços básicos como ambulâncias, corpo de bombeiros, segurança pública entre outros. Alem de outras, a presentamos as sugestões abaixo: • Ligar a rua 2(via de acesso veicular) com a rua do Canal, que havia sido projetado pelo PAC Rocinha e foi não executado. • Controle do trânsito na Estrada da Gávea. Trecho que compreende a Rocinha. • Controle e fiscalização das vias de circulação na Rocinha, ordenando locais de descarga, pontos de parada do transporte publico e alternativo com vistas a recuperação do espaço público, principalmente na Estrada da Gávea. O acesso da população a bens e serviços é semelhante às periferias mais distantes, com o sistema de transporte apontando unicamente para o lucro das empresas, com poucos ônibus na hora de maior frequência de passageiros e raros em outros horários, cerceando o direito de ir e vir. O transporte alternativo mostra-se menos humano e tão injusto, ora com vans lotadas oferecendo lugares em pé, com risco para vida dos usuários, sem nenhuma fiscalização por parte da Prefeitura, entregues a própria sorte, assim sendo solicitamos: • Efetivar fiscalização dos transportes públicos e alternativos. OBRAS E INFRAESTRUTURA As redes de serviços básicos prestados pelo poder público ainda são incipientes considerando a extensão territorial da Roci118


nha e a não existência de uma rede de esgoto oficial, sabe-se que existem pequenas redes que desembocam em valas à céu aberto e em drenagens muito antigas que serviam a Estrada da Gávea. Esta deformação nas redes de esgoto e drenagens possibilita a aparição de doenças endêmicas que fazem crescer a demanda por saúde pública hoje caótica na cidade, no estado e na federação. Assim solicitamos alguns serviços que poderão contribuir melhoria na qualidade de vida e sustentabilidade, a seguir: • Implantação de redes de esgoto. • Implantação de redes de drenagem com levantamento das calhas naturais que têm origem nas encostas florestais. • Planejamento e construção de conjunto habitacional em local próximo a área onde reside o proposto remanejado. • Realização de obras de contenção de encostas nos locais mapeados pela GEO-RIO para eliminar áreas de risco e evitar remanejamento de moradores destes locais. • Criação de gerência da COMLURB para melhorar a coleta bairro da Rocinha, Vidigal, Parque da Cidade e Vila Canoas, tendo em vista a quantidade de lixo que é recolhida diariamente. • Manutenção da rede de iluminação pública existente, assim como implantação de nova para toda Rocinha. • Melhoria habitacional para população em risco social com assistência técnica da Prefeitura • Empréstimo a juros baixo para melhoria habitacional para famílias com baixa renda. • Plano de Estruturação Urbana para Rocinha • Plantio de árvores nas praças e reflorestamento de áreas de encostas, onde houver remanejamento de moradores para local seguro. É do conhecimento geral que a Rocinha e outras favelas foram contempladas com Programa de Aceleração do Crescimento – PAC. Na Rocinha estava previsto um conjunto de ações de urbanização, digamos pontuais, dada a extensão territorial da Rocinha, são elas: • Complexo Esportivo da Rocinha, com atividades de esporte e lazer; • Centro Integrado de Atenção à Saúde, formado por uma UPA-24 h, uma Clínica da Família e um CAPS; • Centro de Convivência, Comunicação e Cultura – C4, espaço que integraria a Rocinha com Cultura, Educação e Cidadania; 119


• Creche Referência; • Unidades habitacionais, para atender famílias realocadas devido às obras do PAC, totalizaram 144 apartamentos; • Reconstrução da passarela existente; • Alargamento e urbanização da Rua 4; • Recuperação e pavimentação da Caminho do Boiadeiro, Servidão Leste e Rua Dois; • Implantação de mercado popular e recuperação do Largo do Boiadeiro; • Plano inclinado da Roupa Suja e outro ligando a Rua 2 ao “Lajão” com acesso a Rua do Canal. O que foi executado: • Complexo Esportivo da Rocinha, com atividades de esporte e lazer. • Centro Integrado de Atenção à Saúde, formado por uma UPA-24 h.s, uma Clínica da Família e um CAPS (atenção à saúde mental). Sofreu alteração do espaço físico, cuja previsão era 6.000 m² e o executado foi 3.500 m². • Centro de Convivência, Comunicação e Cultura – C4, espaço que integraria a Rocinha com Cultura, Educação e Cidadania. Ainda faltando o Cine teatro e laboratórios. • Creche Referência, ainda na estrutura, sem previsão de conclusão, já registrando ocupação por pessoas. • Unidades habitacionais para atender famílias realocadas devido as obras do PAC, totalizaram 144 apartamentos. Concluído. • Reconstrução da passarela existente. Concluída. • Alargamento e urbanização da Rua 4. Concluída. • Recuperação e pavimentação da rua Caminho do Boiadeiro, Servidão Leste e Rua Dois. Parte da rua 2 concluída, Caminho do Boiadeiro e Servidão Leste sem informação. • Implantação de mercado popular e recuperação do Largo do Boiadeiro. Esta obra começou com parceria entre a Igreja Batista da Rocinha e o Governo do Estado. A obra foi iniciada e não concluída e a igreja sem espaço. • Plano inclinado da Roupa Suja. Obra iniciada não concluída. e outro ligando a Rua 2 ao “Lajão” com acesso a Rua do Canal. Ocorreram desapropriações e as obras não iniciaram. 120



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