Guia Feminista para as Eleições 2012

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Feminista Guia para as Eleições

2012

Um guia de apoio ao voto consciente e em defesa dos direitos das mulheres, da igualdade étnicorracial, da liberdade de orientação sexual e do Estado laico e democrático


Ficha Técnica Guia Feminista para as Eleições 2012 Texto Beth Ferreira Revisão final Nina Madsen Guacira César de Oliveira Projeto gráfico e diagramação Ars Ventura Imagem & Comunicação

APOIO Ministério de Relações Exteriores da Holanda, no âmbito do projeto “Empoderando as mulheres para lutar contra as desigualdades”, executado por consórcio regional das seguintes organizações: CFEMEA, SOS Corpo – Instituto Feminista para a Democracia, Cotidiano Mujer (Uruguai), Centro de Documentación y Estudio (CDE, Paraguai) e Asociación Latinoamericana de Organizaciones de Promoción al Desarrollo (ALOP, México).


Índice 2

Apresentação

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1. Eleições 2012: quem iremos eleger e para quê?

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2. Por que é importante votar em mulheres?

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3. Subsídios para um voto consciente

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3.2. Identificando candidaturas antidireitos das mulheres

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3.3. Para acertar o voto: conhecendo o sistema eleitoral brasileiro

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4. Engajando-se no processo eleitoral

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5. Acompanhando os mandatos

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6. Desafios para o futuro: por uma ampla reforma do sistema político

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7. Política, Democracia e Estado Laico

3.1. Identificando candidaturas comprometidas com os direitos e a emancipação das mulheres


Apresentação Cara eleitora e eleitor, Este Guia Feminista para as Eleições 2012 foi feito para você. Não para lhe dizer em quem você deve votar, mas sim para lhe estimular a investir no seu voto e participar ativamente do processo eleitoral do seu município, acreditando que sua escolha pode sim fazer a diferença! Também para lhe oferecer informações importantes sobre a política e os processos eleitorais e, com isto, ajudar-lhe a votar em candidaturas que de fato representem propostas de mudanças em nossa sociedade. Mudanças dirigidas para torná-la uma sociedade justa, livre, democrática, igualitária, respeitadora da diversidade humana, cuidadora da natureza e do meio ambiente e, especialmente, das pessoas.

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Nestas eleições, elegeremos representantes para as Prefeituras e Câmaras Municipais, daí a importância de votarmos em pessoas comprometidas com mudanças que contribuam efetivamente para fazer de nossas cidades e municípios, e, consequentemente, de nosso país, um lugar melhor de se viver. Um lugar onde seja assegurada qualidade de vida, saúde, segurança, educação, moradia digna e bem estar para todas as pessoas. Em especial, este guia tem como objetivo ajudar você a escolher, se possível (e quase sempre é possível!), uma mulher candidata, contribuindo deste modo para uma maior participação das mulheres na política e nos espaços de poder que definem os rumos da nossa vida.

Cfemea

Setembro de 2012

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“Quando uma mulher entra na política, muda a mulher. Mas quando muitas mulheres entram na política, muda a política.” Michelle Bachelet


1. ELEIÇÕES 2012 – QUEM IREMOS ELEGER E PARA QUE?

Nestas eleições, iremos eleger representantes para duas instâncias do poder público: a Prefeitura Municipal (Poder Executivo) e a Câmara Municipal (Poder Legislativo). São duas instâncias muito importantes. Você sabe a função social e política de cada uma delas? Não? Então vamos saber e entender.

Prefeitura (Poder Executivo Municipal): O Poder Executivo tem a responsabilidade de promover o bem comum da população, sem discriminação de sexo, gênero, raça, etnia, orientação sexual, idade, classe, origem rural ou urbana, nível de educação ou qualquer outra. Ou seja, deve promover o bem comum de todas as pessoas e não apenas de um segmento ou grupo. Isto significa que, ao elegermos uma prefeita ou prefeito, estamos atribuindo a esta pessoa a responsabilidade de “cuidar” para que os direitos de todas e cada uma das pessoas sejam garantidos, respeitados, e que os serviços, as políticas e as finanças do município estejam orientadas a esses objetivos. Como? Assegurando a execução das leis municipais, governando o município (o povo e órgãos públicos) e administrando os negócios públicos da prefeitura. Para fazer isto, são criadas Secretarias – órgãos responsáveis por planejar e executar as políticas públicas de saúde, educação, trabalho, cultura, habitação, agricultura, assistência social, turismo, finanças, dentre outras.

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Esta é uma responsabilidade muito grande! Por isso, é preciso muita atenção na hora de escolher em quem votar para este cargo. Disto vai depender o desenvolvimento do nosso município, a qualidade de vida das pessoas, o bem estar dos animais, a preservação do ambiente. Ou seja, disto depende o nosso presente e nosso futuro. E também, o de noss@s filh@s, net@s, bisnet@s – enfim, das gerações futuras.

Câmara Municipal (Poder Legislativo): O Poder Legislativo Municipal tem a função de elaborar, aprovar, modificar ou revogar as leis responsáveis pela estruturação e organização do município. A Câmara é composta por vereador@s eleit@s diretamente pelo povo para o exercício de um mandato de quatro anos. O número de vereador@s é proporcional ao total de habitantes de cada município. A Câmara Municipal tem duas grandes funções: 1) a legislativa, que consiste na elaboração, aprovação e reformulação de leis referentes ao município;

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2) a fiscalizadora, devendo controlar a administração municipal (prefeitura e suas secretarias) quanto à execução do orçamento público municipal e de políticas públicas de promoção da qualidade de vida e bem estar da população.


As vereadoras e vereadores sãos @s “representantes” do povo, devendo assegurar que as necessidades da população e de seus vários segmentos (mulheres, homens, jovens, idos@s, negr@s, rurais, urban@s, etc.) sejam atendidas. Esta também é uma responsabilidade grande. Por isso, devemos ter muita atenção na hora de votar, para que elejamos pessoas realmente comprometidas em fazer de nosso município e de nossa cidade um lugar bom e digno de se viver.

É importante entender isto, pois, em última instância, a responsabilidade também é sua!

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2. POR QUE É IMPORTANTE VOTAR EM MULHERES?

Vamos pensar... As mulheres representam hoje mais da metade da população do Brasil (51,03%) e também mais da metade do eleitorado brasileiro (51,9%). São responsáveis por grande parte da riqueza produzida no país e realizam quase todo trabalho doméstico e as tarefas de cuidado, fundamentais para que as pessoas possam viver bem, sentirem-se protegidas, respeitadas e acolhidas no cotidiano da vida. No entanto, nos espaços públicos, onde são decididos os rumos do país, onde são elaboradas e aprovadas as leis, onde são planejadas e implementadas políticas públicas e definidos os projetos de desenvolvimento, as mulheres são minoria. Não porque não queiram estar ali, mas porque são excluídas desses espaços, uma vez que não são eleitas. Para se ter uma ideia, nas últimas eleições municipais (2008), do total de 5.555 municípios, apenas 504 mulheres (9,7%) foram eleitas prefeitas. E do total de 51.965 cargos nas câmaras municipais, somente 6.508 mulheres (12,5%) foram eleitas vereadoras. Mudar este quadro e eleger mulheres é, sobretudo, uma questão democrática, de justiça de gênero, de justiça distributiva do poder. Se as mulheres constroem a sociedade, produzem riqueza, cuidam das pessoas, cuidam do meio ambiente, educam, cuidam da saúde, é necessário que o poder de gerir o Estado, que gerencia a vida em sociedade, seja dividido igualitariamente entre mulheres e homens.

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Por isso, é essencial que nestas e nas futuras eleições, mais mulheres se candidatem e, principalmente, recebam a confiança e o voto da população.

E que sejam eleitas! Sim, porque ao ocupar os espaços de poder, as mulheres não estão apenas dividindo o poder político com os homens. Estão mudando a própria ideia de mulher na sociedade e, com isto, mudando o lugar ocupado historicamente pelas mulheres nos diversos âmbitos sociais.

A ocupação, pelas mulheres, de um cargo político – a exemplo da Presidenta Dilma Roussef –, estimula as demais mulheres a terem mais confiança na sua capacidade política, intelectual, cultural, econômica. Com isso, mais mulheres transformam sua vida: no trabalho, nas escolas e universidades, na família ou na comunidade. Ou seja, transformam seu lugar no mundo! Mas, para que isto ocorra, é “importantésimo” que as mulheres votem nas mulheres! Sim, pois afinal somos mais da metade do eleitorado. Temos, portanto, um grande potencial para mudar a situação atual de desigualdade na política.

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É preciso romper também com a ideia de que mulheres não confiam em mulheres. Uma aliança “feminina e feminista” neste momento é fundamental! Mulheres votando em mulheres e mudando a política!

Mas atenção! Tão importante quanto eleger mulheres, é conferir se elas estão comprometidas com a transformação da sociedade. Para termos uma sociedade mais justa, solidária e igualitária, precisamos eleger pessoas que assumam compromisso com a luta feminista pela liberdade, autonomia e igualdade para todas as mulheres e todas as pessoas; que se comprometam com a luta contra o racismo e pela igualdade etnicorracial; que se comprometam com a liberdade de orientação sexual; que defendam o Estado laico e democrático. Enfim, precisamos eleger mulheres e homens que assumam o compromisso radical de construir uma nova sociedade: justa, livre, igualitária, democrática, sustentável, saudável! Infelizmente, sabemos, nem todas as mulheres assumem estes compromissos. E aí, como fazer? Como lidar com esta situação um tanto quanto complexa? Vamos pensar?

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Não basta ser mulher! Tem que ter compromisso com a justiça social! Um dilema que surge a cada eleição quando consideramos a importância de se eleger mulheres é: Voto numa mulher (não em qualquer mulher, mas na melhor candidata entre as mulheres) e ajudo a mudar o perfil das mulheres na política ou voto em um homem mais comprometido com as questões e causas que defendo? Mas se voto em um homem, contribuo para a manutenção do patriarcado e o lugar subordinado das mulheres na política e na sociedade... E aí, o que fazer??? Certamente, esta é uma questão importante. É preciso refletir com cuidado, pois muitas vezes este é um falso dilema, que se torna um mero argumento para não se votar em mulheres. Você já reparou que quase nunca esta questão é colocada para os homens? Nunca se diz: “Não basta ser homem, tem que...”. Por que será que apenas no caso da candidatura de mulheres, o fato de “ser mulher” exige outros condicionantes para o voto? Simples! Porque o lugar dos homens na política está institucionalizado há centenas, milhares de anos. A política é vista como atributo “natural” dos homens. E mesmo quando eles não têm experiência nem alto grau de estudo, não se costuma questionar sua capacidade para a política. Com isto, não se quer defender a ideia de que “basta ser mulher” para receber nosso voto. Mas que os outros condicionantes – ser de luta, ter compromisso com a justiça social, defender os direitos das minorias, defender o meio ambiente, entre outros – devem ser exigidos igualmente para mulheres e homens.

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Isto, além de ser mais justo, permite às mulheres (já minoria entre as candidaturas – apenas 30%, dispondo de bem menos recursos que os homens, com menos apoio de figuras importantes na política e no cenário econômico, entre outras desvantagens) ter minimamente condições de concorrer com os homens e alguma chance de se elegerem.

Na verdade, se pensarmos bem e se queremos mudanças na sociedade, estes deveriam ser sempre os critérios para escolhermos em quem votar – independente do sexo, da cor ou raça, orientação sexual, religião, condições econômicas, etc. Seja no Poder Executivo, ou no Legislativo, precisamos de pessoas éticas, honestas, justas, compromissadas com os valores sociais de igualdade, justiça, liberdade, solidariedade. Isto é o mais importante!

E, apesar da banalização atual da política e do pensamento comum colocar tod@s @s polític@s no “mesmo saco”, é possível encontrar sim candidaturas com este perfil – dentre as quais, as de mulheres. E votar nelas é importante.

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Assim como a “lei de cotas”, que obriga os partidos políticos a apresentarem pelo menos 30% de candidaturas de mulheres em eleições proporcionais, votar em uma mulher pode ser visto como uma “ação afirmativa”, visando fortalecer a participação das mulheres na política formal. Precisamos compreender que, sem este tipo de ação, as mulheres têm pouquíssimas chances de se elegerem e reconfigurarem o perfil da política no Brasil. Pense nisto ao decidir seu voto. Ele pode provocar esta e outras importantes mudanças!

Alguns motivos para votar em mulheres: Não entendemos a política apenas como aquela que se refere aos processos eleitorais e à vida partidária. Ela é bem mais ampla. Porém, em um sistema político baseado, em grande medida, na democracia representativa, como é caso do sistema brasileiro, a participação na política partidária e nos processos eleitorais é fundamental para a garantia de direitos e a promoção de algum nível de justiça social. Neste sentido, a candidatura de mulheres aos diversos cargos eletivos no Executivo e no Legislativo se faz importante por vários motivos: ^^

Demonstra que as mulheres querem e podem participar dos espaços de poder que decidem sobre os rumos do país e reafirma que lugar de mulher também é na política;

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As candidatas podem enriquecer os debates, conscientizando eleitor@s e colaborando para a transformação social ao utilizar plataformas de defesa dos direitos humanos, justiça, igualdade e diversidade;

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Como vereadoras ou prefeitas, as mulheres podem formular leis e políticas públicas para construir cidades ambiental e socialmente justas, enfrentando as desigualdades sociais, promovendo a inclusão de mulheres e respeitando a diversidade da população (negr@s, idos@s, homossexuais, indígenas, pessoas com deficiências, dentre outras);

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Como candidatas ou eleitas, as mulheres ganham visibilidade e podem aprofundar o diálogo com os movimentos sociais e as organizações de mulheres e feministas, visando à melhoria de vida para todos e todas e a ampliação da democracia;

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As casas legislativas e os governos têm papel fundamental no aprofundamento da democracia e na garantia de direitos básicos, como o direito à alimentação, à moradia, ao trabalho justo, à educação, à saúde, à livre expressão da sexualidade, à cultura, ao esporte e lazer, ao transporte, à segurança, à livre organização, entre outros. A ocupação desses espaços pelas mulheres é, portanto, estratégica, uma vez que como parlamentares ou gestoras, podem incidir diretamente na qualidade de vida da população, proporcionando legislação e políticas públicas que busquem reduzir e eliminar as desigualdades.


3. SUBSÍDIOS PARA UM VOTO CONSCIENTE

3.1 Identificando candidaturas comprometidas com os direitos e a emancipação das mulheres Como já explicitamos, não defendemos a ideia de que “basta ser mulher” para que uma candidata receba nosso voto, mas entendemos que é importante votar em mulheres para provocar mudanças na política e, sobretudo, em mulheres que se proponham a transformar a política. Também é importante, sempre que possível, aliar esta escolha – votar em uma mulher – com outros quesitos de promoção da diversidade de representação política dos vários segmentos populacionais brasileiros: pessoas negras e indígenas, homossexuais e bissexuais, jovens e idos@s, pessoas com deficiência, etc. Neste sentido, seria bom tentar conhecer todas as candidaturas e analisar com atenção especial as candidatas mulheres, identificando a que mais se compromete com as questões de justiça social – igualdade de gênero, igualdade étnicorracial e fim do racismo, democracia e defesa do Estado laico, combate às desigualdades de classe, liberdade de orientação sexual e luta contra a homofobia, novas relações com a natureza, entre outras. Nas capitais, com o grande número de candidaturas e diversidade de partidos e projetos políticos, certamente é possível encontrar candidaturas de mulheres comprometidas com estas questões.

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Ainda mais nestas eleições, onde a cota de 30% é obrigatória. Já no caso dos médios e pequenos municípios, isto é mais difícil. Mas não mais difícil que encontrar candidaturas masculinas também com este perfil. Nos municípios do interior, ainda que com poucas opções, sempre é possível tentar encontrar plataformas que assumam algum nível de compromisso com a defesa dos direitos das mulheres e (se não todas, pelo menos algumas) das bandeiras de luta feminista.

Abaixo, sugerimos alguns requisitos a considerar para identificar uma candidatura (preferencialmente de mulher) comprometida com a construção de uma sociedade justa. Requesitos que devem estar expressos na plataforma d@ candidat@ (escrita ou falada), deixando explícito que:

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Reconhece o patriarcado, o racismo e as desigualdades de classe como estruturantes das injustiças sociais e se propõe a combatê-los e desconstruí-los;

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É feminista e/ou mantem ou busca construir alianças e diálogo permanente com os movimentos feministas e de mulheres, com movimentos negros, movimentos LGBTT e demais movimentos sociais, ouvindo suas demandas e reivindicações;


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Atuará para a superação das várias formas de dominação de gênero e raça/etnia e para combater os preconceitos e discriminações a homossexuais e a outros segmentos;

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Reconhece a dívida social do Estado brasileiro com a população negra e atuará em defesa de sua reparação através de ações afirmativas e políticas públicas específicas;

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Atuará para garantir a criação, nos municípios, de mecanismos de políticas públicas para mulheres: secretarias ou coordenadorias com dotação orçamentária própria e conselhos de direitos com autonomia política e recursos próprios;

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Atuará contra qualquer proposta (de políticas públicas ou leis) que vise suprimir direitos e/ou busque criminalizar as mulheres, a população negra e indígena, homossexuais, trabalhador@s do campo ou os movimentos sociais que lutam pela ampliação da democracia e da cidadania e por justiça social e ambiental.

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Atuará para garantir que os serviços, as políticas e as finanças públicas estejam voltadas ao enfrentamento das múltiplas formas de desigualdades vividas pelas mulheres

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Atuará para democratizar do poder com a participação das mulheres.

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Atuará para defender a democratização dos processos de decisão sobre as finanças e as políticas públicas.

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Pense bem: Dá para votar em quem não assuma minimamente estes compromissos? Um mandato que não adote estes requisitos como referência, pode ser considerado um mandato voltado para construção da igualdade, da justiça, da democracia, da liberdade? Como já dissemos, sabemos que no contexto de alguns municípios, nem sempre é fácil encontrar candidaturas que assumam esses compromissos. Mas em alguns casos, é possível que você (só ou em conjunto com outras pessoas – o que é recomendável, pois a ação ganha mais força) procure @s candidat@s e apresente as condições para o seu voto. Diga-lhes que “seu voto vale muito” e que em troca dele você quer um mandato comprometido com a justiça, que combata a corrupção, que faça bom uso dos recursos públicos e atue para fazer da sua cidade e município um lugar bom e digno de se viver!

3.2 Identificando candidaturas antidireitos das mulheres Se de um lado é importante avaliarmos quais candidaturas são comprometidas com a defesa dos direitos das mulheres e a construção de uma sociedade justa para todos os segmentos sociais, de outro, precisamos nos atentar para o fato de que também existem candidaturas que vão na contramão dessas mesmas propostas. Tanto o Executivo (Prefeituras) como o Legislativo (Câmaras) estão cheios de pessoas que se opõem à democracia, às liberdades, aos direitos humanos, à distribuição de renda e redistribuição da

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riqueza aos direitos trabalhistas, a maiores investimentos públicos no serviço de saúde e na educação etc. Estão cheios de pessoas corruptas e desonestas, que visam apenas “se dar bem”, desviando e surrupiando verbas públicas. Verbas arrecadadas através dos impostos cobrados sobre o nosso trabalho, o que produzimos, o que consumimos, os serviços que utilizamos. Também tem muitas pessoas que, mesmo não sendo desonestas ou corruptas, assumem esses espaços para tentar impor a todo mundo seus valores e princípios (geralmente religiosos). São @s chamad@s fundamentalistas, religios@s conservador@s de diferentes igrejas, pessoas que querem que todas as outras ajam de acordo com as regras da sua igreja, seu modo de pensar e que todo mundo siga à risca seus princípios religiosos. Geralmente, essas pessoas não respeitam nem mesmo toleram a liberdade de pensamento, as escolhas individuais, a diversidade de crenças e de modos de agir. Por isso, atenção: Pessoas corruptas e desonestas não merecem e não devem ocupar os espaços políticos! Por sua vez, a ocupação desses espaços por pessoas fundamentalistas é uma ameaça à democracia e ao Estado laico e de direito. Viver sob as regras de uma religião é teocracia, não é democracia, é autoritarismo. Neste sentido, seu voto (ou não voto) e seu engajamento na contrapropaganda a essas candidaturas são muito importantes para impedir o avanço da participação dessas pessoas no poder público.

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Abaixo apresentamos algumas sugestões e orientações de como identificar essas candidaturas antidireitos, antijustiça, antiliberdade, antidemocracia. Preste atenção: ^^

Em candidat@s com posturas machistas e sexistas, desde as mais explícitas às mais sutis. Candidatos com histórico de violência contra a mulher; candidat@s que defendem a subordinação das mulheres aos homens; que não aceitam a autonomia das mulheres sobre sua vida, seu corpo, sua sexualidade, seu direito de escolher entre ter ou não ter filh@s e quando tê-l@s (direito reprodutivo) .

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Em candidat@s com posturas preconceituosas, homofóbicas e/ou lesbofóbicas. Atenção para quem diz que não tem preconceito, mas não defende nem apoia a luta por direitos e liberdade sexual do segmento LGBTT; quem diz que “não tem nada contra”, mas vive se contradizendo quando lhe convem; sobretudo, atenção a quem defende o tratamento psicológico ou religioso para “curar” a homossexualidade, pois ela não é doença, é apenas uma das formas de expressão da sexualidade.

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Em candidat@s que já exerceram mandatos, mas nunca pautaram as causas feministas e das mulheres, ou da população negra, indígena e LGBTT.


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Em candidat@s com posturas racistas, ainda que não sejam explícitas ou conscientes. Exemplo: Que se posicionam contra as ações afirmativas (como as cotas) e políticas de reparação para o povo negro, argumentando que elas são desnecessárias, pois o Brasil é uma “democracia racial” – se isto fosse verdade, @s negr@s não ganhariam quase metade (57,4%) do que ganham @s branc@s (IBGE, 2010); o número de negr@s nas escolas e universidades, nos bons empregos ou na política seria igual ao de branc@s.

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Em candidat@s que oferecem favores (dinheiro, produtos, benefícios, serviços, etc.) em troca do seu voto, pois este é o primeiro sinal de corrupção e desonestidade. A compra de votos é ilegal, portanto, quem compra (ou vende), é desonest@. Além disso, se um@ candidat@ compra voto é porque espera ter seu “investimento” de volta ao se eleger, o que só é possível através da corrupção e do desvio de verbas.

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Em candidat@s “Ficha Suja”, com histórico de atos criminosos e desonestidade. Candidat@s com denúncia de exploração de trabalho escravo, de trabalho infantil; com denúncias de pedofilia, exploração sexual de crianças e adolescentes; envolvid@s em rede de prostituição; denúncias de corrupção e desvio de verbas públicas, entre outras.

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Em candidat@s com posturas fundamentalistas, de qualquer tipo. Que tentam impor seus valores e princípios religiosos a todo mundo; que querem chegar ao poder para obter privilégios para a sua religião através do Estado e do governo, com dinheiro público, isenções fiscais, concessões de rádio e TV, cargos e etc para os negócios particulares da sua igreja; que visam usar do poder público, quando eleit@s, para prejudicar outras religiões ou pessoas sem religião; que se contrapõem ao Estado laico e de direitos.

3.3 Para acertar o voto: conhecendo o sistema eleitoral brasileiro Mas, para “votar bem”, não precisamos apenas conhecer @s candidat@s e suas propostas individuais e/ou partidárias, mas também saber como funciona o sistema eleitoral no Brasil. Infelizmente, a maioria do eleitorado brasileiro não conhece o sistema pelo qual elege suas/seus representantes. Pelo contrário, a maioria pensa que votar é algo muito simples: Com o título eleitoral, você escolhe um(a) candidat@, vai até a sessão, vota, e pronto, @ candidat@ que conseguir mais votos se elege. Você também pensa que é assim? Pois não é! Vamos ver como funciona?

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Você já observou que nas eleições para vereador@s e deputad@s, tem candidat@ que consegue milhares de votos, e não se elege, e outr@s que com poucos votos são eleit@s? Isto acontece porque no Brasil, o sistema eleitoral permite a coligação entre partidos para as eleições “proporcionais” – para as Câmaras Municipais, Assembleias Legislativas e Câmara Legislativa do Distrito Federal e para a Câmara Federal de Deputada@s –, que funcionam através de um coeficiente eleitoral, a partir do qual os partidos e coligações terão suas/seus representantes eleit@s proporcionalmente ao número de votos obtidos. Para entendermos como funciona o sistema proporcional, precisamos primeiro entender o que é uma “coligação” e como funciona o “coeficiente eleitoral”. Coligação – Em tese, a coligação seria um pacto entre dois ou mais partidos, com ideias e propostas comuns, para governar e administrar um município, um estado ou o País. Na prática, porém, as coligações são usadas mesmo é para aumentar o “poder eleitoral” dos partidos durante as eleições proporcionais. É que, neste caso, a contagem de votos privilegia as coligações. Como isto acontece? Através do coeficiente eleitoral. Coeficiente eleitoral – Imagine que você mora em um município com 39.000 habitantes, que por lei tem direito a uma Câmara com 13 vereador@s. Você divide os 39.000 habitantes por 13 (número de vereador@s na Câmara), o que dá 3.000 votos por vereador(a). Este é o Coeficiente Eleitoral do seu município.

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Como funciona então, a contagem de votos no sistema proporcional? Como dissemos acima, atualmente, a contagem de votos no sistema proporcional é por partido ou coligação. Isto significa que neste município, a cada 3.000 votos que um partido ou coligação conseguir, terá direito a um(a) vereador(a). Trocando em miúdos, funciona assim: A coligação “ X, reúne 5 partidos diferentes e tem 10 candidat@s a vereador@s. Ao fim da votação, @ candidat@ mais votad@ conseguiu 6.000 votos, @ segund@ 1.900 votos, @ terceir@ 1.500 e @ quart@ só conseguiu 650 votos. Mas contando os votos d@s outr@s 6 candidat@s (inclusive de quem só recebeu 2 votos!), a coligação tem mais 1.950 votos. Somando tudo: 6.000 + 1.900 + 1.500 + 650 + 1.950, a coligação obteve 12.000 votos. O que lhe dá o direito a 4 vagas na câmara (12.000 ÷ 3.000 = 4). Ou seja, três candidat@s que tiveram menos de 2.000 votos (um/a com apenas 650 votos) foram eleit@s. Isto porque @ candidat@ mais votada “arrastou” @s demais candidat@s, com a ajuda d@s outr@s candidat@s que conseguiram poucos votos. Você provavelmente lembra de casos como estes no seu município. Mas tem também dois casos muito conhecidos nacionalmente: o de Enéas e do palhaço Tiririca em São Paulo. Ambos conseguiram mais de um milhão de votos cada, bem mais do que precisariam para se eleger. E, com a “sobra” de seus votos, eles elegeram também vários outros deputados que alcançaram pouquíssimos votos.

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Ou seja, quem votou em Enéas e no Tiririca não elegeu apenas eles. Elegeu, sem saber, vári@s outr@s candidat@s, dos quais sequer conhecia as propostas ou histórico político (se já teve envolvimento com corrupção, por exemplo). Mas, voltando para esse município imaginário, se a tal coligação “X” conseguiu eleger 3 candidat@s com menos de 2 mil votos cada, por outro lado, a candidata “fulana de tal”, de um partido que não fez coligação, conseguiu 2.999 votos, mas não se elegeu. Isto porque faltou um voto para ela atingir o coeficiente eleitoral. Complicado isto, não é? E não é só! O sistema de coligação e coeficiente eleitoral pode fazer com que você ajude a eleger alguém em quem você não votou nem mesmo gostaria que fosse eleit@. Isso mesmo! Se você votar em alguém que conseguir poucos votos, este número de votos pode não ser suficiente para elegê-l@, mas pode contar (serem “transferidos”) para outr@ candidat@ do mesmo partido ou coligação daquel@ que você apoiou. Funciona assim: Você vota em “João Honesto” do partido A, que é coligado com os partidos C e E. O seu candidato, que você conhece e confia, que tem boas propostas, só consegue 200 votos. Ele não se elege, mas os 200 votos que ele recebeu (inclusive o seu) ajudam a eleger o “Zé Malandro”, do partido C, que é conhecido por sua corrupção, falcatruas e desvios de verba, além de ser violento com a esposa.

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Ou seja, é preciso muita atenção na hora de votar! Não basta atentar apenas para as propostas d@ candidat@ que queremos eleger. É preciso observar todo o programa do partido dess@ candidat@ e dos demais partidos com os quais ele estiver coligado. Afinal, estaremos elegendo esse partido/coligação e tudo que eles defendem e propõem.

Por isso, nesta campanha (e nas outras) observe bem a posição do partido político d@ sua/seu candidat@, que propostas este partido defende, quem ele apoia no governo, com que outros partidos, pessoas ou organizações ele faz alianças. Noutras palavras, informe-se bem antes de decidir em quem e em que propostas votar!

Sobre o sistema proporcional Mesmo com estes problemas, a Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político (da qual fazem parte vários movimentos e organizações da sociedade civil, inclusive o Cfemea e Articulação de Mulheres Brasileiras-AMB), defende o sistema

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proporcional de eleições por entender que ele é o que tem maior capacidade de garantir a representação e a diversidade político-partidária, preservando a existência dos pequenos partidos. O problema não está no sistema proporcional ou no uso do coeficiente eleitoral, mas sim nas coligações. Por isso, a Plataforma defende a substituição das coligações por Federações Partidárias, que deveriam ser estabelecidas até quatro meses antes das eleições e funcionar por pelo menos 3 anos, e não apenas durantes as eleições. Além disso, o sistema proporcional abre maiores perspectivas e possibilidades de competição e eleição para mulheres, negr@s, jovens, população rural, homossexuais – ou seja, das “minorias” políticas. Os movimentos sociais já conseguiram uma importante vitória neste sentido. O Supremo Tribunal Federal decidiu que os mandatos parlamentares pertencem aos partidos políticos e não são “propriedade individual particular dess@ ou daquel@ parlamentar. Decorre desta decisão a aprovação recente de uma resolução que determina o fim das coligações para as eleições proporcionais. Mas atenção: Esta mudança só valerá para as próximas eleições (2014). Por enquanto, ela continua valendo e vai reger as eleições deste ano!

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4. ENGAJANDO-SE NO PROCESSO ELEITORAL

Contribuindo com candidaturas feministas e/ou comprometidas com as causas de justiça social Há muitas formas de se colaborar para a eleição de mulheres comprometidas com as causas feministas e demais causas de justiça social. A mais simples é votando em mulheres candidatas. Acima, apresentamos vários motivos pelos quais é importante votar em mulheres. Mas você também pode contribuir apoiando diretamente uma candidatura. Se você confia na proposta de uma determinada candidata e compartilha dessas propostas, você pode: manifestar seu voto publicamente; divulgar o programa de governo (no caso de candidaturas para prefeit@) ou plataforma política da sua candidata a vereadora; apresentar sua candidata para amig@s e familiares e mostrar porque é importante elegê-la. Outra forma, mais engajada, é participar diretamente na construção da campanha e da plataforma política da candidata. Neste caso, você pode procurar o comitê de campanha da candidata e se engajar. Pode discutir o programa de governo ou plataforma política, apresentando ou questionando propostas; ajudar a divulgar essa candidatura, distribuindo material de campanha, apresentando e defendendo a candidatura onde você estiver; contribuir

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financeiramente com a campanha, tanto com doação direta como na captação de recursos junto a outras pessoas e grupos; participando de panfletagens e/ou bandeiraços; organizando reuniões e/ou rodas de conversa; e hoje, com as novas tecnologias digitais e redes sociais na internet, você pode compartilhar o material de campanha, participar de “tuitaços”, acompanhar debates virtualmente e até mesmo produzir pequenas peças de propaganda e divulgar no seu círculo de amig@s. O importante é que você participe (menos ou mais intensamente) do processo eleitoral de forma consciente. Isto é, se informe sobre quais são de fato as propostas de sua/seu candidat@; conheça a história política, pessoal e profissional d@ candidat@ (só é honest@ e étic@ na política quem o é em casa, no trabalho, na família); conheça o programa e plataforma política do partido dest@ candidat@; se informe sobre o programa e plataforma política dos partidos coligados (quando houver). Analise bem o que está em jogo nestas eleições, pois seu voto vale muito! Vale a qualidade de vida da sua cidade e município; vale a segurança; vale moradia digna; vale educação e saúde de qualidade; vale justiça social; vale igualdade de direitos! E lembre-se sempre: “voto não tem preço, tem consequência”!

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5. ACOMPANHANDO OS MANDATOS

Passaram-se as eleições. E agora? Talvez você seja como a maioria das pessoas, que não se envolve na política ou o faz apenas durante o processo eleitoral. Não é? Mas você esquece que a política se faz todo dia e que é por meio dela que se definem muitas das questões relativas à nossa vida? É através da política (no âmbito do Executivo) que se planejam e se implantam políticas públicas de saúde, de educação, segurança, trabalho, urbanização, meio ambiente, desenvolvimento. Através da política (no âmbito do Legislativo), são elaboradas e aprovadas leis que regulam nossas vidas, nossas relações, que determinam nosso acesso a direitos e aos serviços públicos. Por isso, é importante a gente acompanhar de perto os mandatos de quem elegemos para nos representar. E de quem não elegemos também! Pois, quando uma pessoa é eleita para um cargo político (seja como prefeit@ ou vereador/a), ela foi escolhida para representar toda a população do município, e não apenas quem votou nela. Este acompanhamento da ação do poder público e da aplicação, por este, dos recursos públicos é chamado de CONTROLE SOCIAL. Este controle é muito importante, pois afinal de contas, todas as obras, serviços e a própria estrutura da administração pública é

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financiada com nossos recursos – arrecadados através dos impostos, taxas e tributos. Quem administra esses recursos é o Executivo (no caso dos municípios, as prefeituras), mas quem autoriza seu gasto (quanto, onde e como usá-los) é o Legislativo (nos municípios, a Câmara Municipal). Portanto, o controle social deve ser feito sobre estas duas instâncias de poder no município. Fazer controle social é uma das formas de exercermos nossa cidadania. Por meio dele, podemos participar da gestão pública e intervir na formulação, planejamento, monitoramento e avaliação das políticas públicas. Através de um controle social bem feito, podemos evitar a corrupção e o desvio de recursos públicos e garantir que estes sejam aplicados na efetivação de direitos e do bem comum de todas e cada uma das pessoas.

Controle Social no Executivo Um dos espaços primordiais de controle social são os Conselhos Gestores. Alguns deles são instituídos por lei federal e são obrigatórios, como os Conselhos Municipais dos Direitos das Crianças e Adolescentes, Conselhos Municipais de Saúde, Conselhos Municipais de Educação, Conselhos Municipais de Assistência Social. Já outros, dependem do compromisso d@s parlamentares e gestor@s locais. É o caso dos Conselhos Municipais dos Direitos das Mulheres,

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Conselhos Municipais da Juventude, Conselhos Municipais da Igualdade Racial, Conselhos Municipais da Diversidade Sexual. Independente de serem obrigatórios ou não, os conselhos foram criados (a partir de reivindicação popular) para servirem de instrumentos de democratização do poder público. Foram pensados como canais de participação da população nas decisões que dizem respeito a tod@s. Por isso, é muito importante ocuparmos estes espaços – desde, é claro, que eles garantam decisões democráticas. Para tanto, a composição dos conselhos deve ter um maior número de representantes da sociedade civil ou, no mínimo, ser paritária (isto é, composta igualmente por representantes do governo e da sociedade civil). Só assim ele se constitui em espaço aberto para a apresentação, discussão e negociação de propostas de interesse comum à população. Sabemos, porém, que na maioria das vezes, os conselhos municipais não são estes espaços de participação popular, funcionando mais como instrumento de abuso de poder e legitimação de desvios de verbas e recursos públicos. Isto ocorre quando representantes da sociedade civil estão lá, não para representar de fato os interesses da população, mas por interesse particular ou mesmo por interesse do próprio poder Executivo. Mas lembramos: este não é o papel dos conselhos municipais de gestão! Pelo contrário, sua função é conhecer, fiscalizar, aprovar ou desaprovar as propostas de políticas públicas e a aplicação correta dos recursos públicos. Se eles não cumprem este papel, a população pode e deve denunciar, por exemplo, junto ao Ministério Público (Promotoria).

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Controle Social no Legislativo Em relação aos mandatos de vereador@s, há também formas de fazer o controle social. Uma delas é participando das sessões nas câmaras municipais. Desta forma, você saberá quais projetos de lei estão sendo apresentados, aprovados ou não, e por quem – isto é, quem apresenta e quem vota a favor ou contra cada projeto. Esses projetos tanto podem beneficiar como prejudicar a população: Podem promover o bem estar de tod@s ou favorecer os privilégios de algumas pessoas apenas; podem permitir o desvio de verbas públicas ou fiscalizar se sua execução está sendo feita corretamente (lembra do papel da Câmara?). Você também pode acompanhar diretamente o mandato d@ vereador(a) que você elegeu: visitando seu gabinete, propondo projetos de lei, conversando com el@ e discutindo os projetos de lei que el@ apresenta ou que aprova ou desaprova; organizando reuniões ou rodas de conversa no seu bairro, para que sua/seu vereador(a) preste contas a tod@s de como vem sendo seu mandato; lembrando a/ao parlamentar que seu mandato deve ser para o povo que o elegeu e não para seu próprio benefício.

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6. DESAFIOS PARA O FUTURO: por uma ampla reforma do sistema político

Ao escrevermos este Guia, buscamos contribuir para que mais mulheres sejam eleitas e participem da política formal – entendendo que esta é uma ação importante para a promoção da justiça de gênero. Mas queremos também, sobretudo, contribuir para que você, nessas eleições, vote de forma mais consciente e esclarecida do “poder” e “valor” do seu voto e conhecendo um pouco mais do funcionamento do sistema político brasileiro. Sabemos que este sistema está esgotado. A cidadania não tolera mais a ausência de resposta deste sistema político às nossas demandas por garantias efetivas para o exercício dos nossos direitos. Cidadãs e cidadãos estão cansados de tanta corrupção na política, que se perpetua através deste sistema, tal como ele funciona hoje. De fato, entendemos que no atual sistema político brasileiro, e em especial no sistema eleitoral, não é possível haver uma mudança substantiva nas relações de poder desiguais estabelecidas hoje em nossa sociedade: de raça, de gênero ou de classe. O atual sistema é racista, patriarcal e capitalista. Ele privilegia os homens brancos, adultos, dos grandes centros urbanos, detentores do poder econômico e sustentáculos da ordem heteronormativa. Portanto, é um sistema que discrimina as mulheres, as pessoas negras e indígenas, todas aquelas pessoas que exerçam sua

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sexualidade fora da ordem heteronormativa (homossexuais, bissexuais, travestis, transgêneros, intersexuais), jovens, pessoas com deficiência, pessoas do meio rural. Entendemos que para promover mudanças radicais na política, é necessário mais que votar em pessoas comprometidas com a justiça social – sejam mulheres ou homens. É fundamental mudar o próprio sistema político. Por isso, integramos a Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político. A Plataforma foi criada em 2004, por um conjunto de redes e movimentos sociais que defende a democratização do Estado brasileiro, compreendendo que isto só será possível através de uma ampla reforma do sistema político que garanta: ^^

a ampliação e nova regulamentação dos mecanismos de participação direta previstos na Constituição Federal – plebiscito, referendo e iniciativa popular;

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a democratização dos meios de comunicação, hoje na mão de poucos e poderosos segmentos da elite política e econômica do país;

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a ampliação da democracia participativa, através de um sistema integrado de participação popular que assegure a partilha do poder do Estado com a sociedade na gestão das políticas públicas;

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a democratização e transparência do Poder Judiciário;

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^^

a ampliação da participação nos espaços de poder de segmentos excluídos, como as mulheres, a população negra e indígena;

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a liberdade de organização política, pondo fim à perseguição e criminalização dos movimentos sociais.

Para entender melhor estas e outras propostas na Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político, acesse o site: www.reformapolitica.org.br.

Projeto de Lei de Iniciativa Popular Na Constituição Federal está previsto o direito da população apresentar diretamente ao Congresso Nacional Projetos de Lei de Iniciativa Popular – isto é, de iniciativa do povo. Um Projeto de Lei (PL) consiste na proposição de normas que podem vir a ter caráter jurídico (lei), caso seja aprovado pel@s parlamentares (senador@s, deputad@s federais, deputad@s estaduais ou distritais e vereador@s). Se aprovado no Legislativo, o PL deve ser sancionado pelo Poder Executivo (president@, governador@ ou prefeit@).

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Para apresentar um PL de Iniciativa Popular no âmbito federal, são necessárias as assinaturas de 1% d@s eleitor@s do país, distribuíd@s por no mínimo cinco estados, com pelo menos 0,3% d@as eleitor@s de cada um1. Desde o ano passado, a Plataforma dos Movimentos Sociais está colhendo assinaturas para apresentar ao Congresso Nacional um Projeto de Lei de Iniciativa Popular, propondo mudanças no sistema político. O PL da Plataforma dos Movimentos Sociais defende:

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^^

Fim dos privilégios @os parlamentares, como por exemplo: fim das férias de 60 dias e 14º e 15º salários; e fim do foro privilegiado e da imunidade parlamentar para que estes não sejam usados como instrumentos para a impunidade.

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Mudança na definição de “decoro parlamentar”, que passa a ser todo fato de não conhecimento público ao longo da vida do parlamentar.

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Participação da sociedade no conselho de ética que julga @s parlamentares.

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Nova regulamentação do art. 14º da Constituição Federal que trata do plebiscito, referendo e iniciativa popular.

Para apresentar PL de Iniciativa Popular em âmbito estadual deve-se observar a Constituição Estadual de cada estado; e para PL de Iniciativa Popular em âmbito municipal, observar a Lei Orgânica Municipal de cada município.

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^^

Que determinados temas só possam ser decididos pelo povo, através do plebiscito e referendo, exemplo: aumento dos salários dos parlamentares, megaobras, etc.

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Diminuição das exigências para a iniciativa popular, menos assinaturas e um rito próprio no Congresso Nacional.

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Reformas no sistema eleitoral que possibilitem aos segmentos subrepresentados nos espaços de poder (mulheres, população negra e indígena, em situação de pobreza, do campo e da periferia urbana, da juventude e da população homoafetiva, etc.) a disputa em pé de igualdade com os demais.

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Democratização e transparência dos partidos, com votação em lista pré-ordenada com alternância de sexo e critérios de inclusão destes segmentos e financiamento público exclusivo com punições severas para quem desrespeitar.

Se você quer conhecer a íntegra da proposta, acesse: http://www.reformapolitica.org.br. Importante: Para se configurar em Projeto de Lei de Iniciativa Popular, esta proposta precisa alcançar 1 milhão e 500 mil assinaturas. O que exige muito trabalho dos movimentos sociais e organizações que integram a Plataforma. Por isso, convidamos você a participar e se engajar na campanha! Não só assinando o PL de Iniciativa Popular, como também colaborando na coleta de assinaturas.

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Como disse Frei Betto em um artigo recente, “É ingenuidade pedir ao poder para se autorreformar. Poder e governo são que nem feijão, só funcionam na panela de pressão. O fogo que o aquece e provoca modificações em seu conteúdo tem que vir de baixo. Da pressão popular”. Junte-se a nós: bote pressão nessa panela!

Encontre mais informações sobre como participar, acessando o site da Plataforma.

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7. POLÍTICA, DEMOCRACIA E ESTADO LAICO

Hoje, quando se fala em política, muita gente associa logo o termo a algo negativo. Não é? Você também pensa assim? Provavelmente sim. Mas sabe por que isto acontece? Porque a maioria das pessoas associa a política apenas aos partidos políticos, aos processos eleitorais e às gestões governamentais. E, como nesses espaços existe um alto índice de corrupção, as pessoas tendem a desqualificar a política, como se ela fosse o próprio sinônimo de corrupção e desonestidade. Mas para nós, a política não se reduz a esses processos, nem entendemos que tudo que envolve a política termine em corrupção – ou “em pizza”, como todo mundo diz. Nós compreendemos a política como a ação individual e, sobretudo, a ação coletiva pela qual buscamos transformar o mundo no sentido da igualdade, da justiça, da liberdade e da solidariedade. É através da política que transformamos ideias, valores e práticas e, assim, transformamos as pessoas e as relações sociais que constituem e movimentam a nossa vida em sociedade. Se pensarmos a política em um sentido amplo, veremos que ela diz respeito a todas as formas de interação necessárias entre os seres humanos para uma vida em grupo. Ela tem a ver com as relações estabelecidas na sociedade e as formas construídas pela humanidade para ordenar e organizar a vida em comum. Isto é: para produzir bens materiais e imateriais (como a arte e a cultura) e distribuí-los,

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para reproduzir-se, conhecer, explicar e representar as realidades vividas e, permanentemente, transformá-las. O espaço da política é, portanto, o espaço “comum” (de tod@s), construído social e historicamente, seja ele de caráter público ou privado. Pensando deste modo, vemos que agimos politicamente em todo lugar e a todos os momentos. Fazemos política no sindicato, nos movimentos sociais, nas manifestações públicas, nos partidos políticos, nas casas legislativas e nos governos. Mas também fazemos política no trabalho, na comunidade, na escola, na igreja, na família, na roda de amig@s, na relação com vizinh@s e até nas nossas relações amorosas. É por compreender a política deste modo que o feminismo, há muito tempo, vem afirmando que “o privado é político”, pois o que é público (geralmente entendido como o político) interfere e ordena também as relações domésticas e privadas, as relações pessoais, familiares, amorosas. Pensando de uma forma um pouco mais complexa, podemos dizer que a política é, acima de tudo, uma atividade “conflitiva”. Por que conflitiva? Porque a política se faz pela disputa de ideias e de poder sobre quais são (ou deverão ser) os objetivos, sentidos e a direção de determinada ação. Esta ação pode ser individual (minha, sua ou de qualquer outra pessoa), de um coletivo (grupo, empresa, movimento) ou, e principalmente, do poder público (governos, parlamento, Judiciário, etc.).

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No que se refere ao poder público, a responsabilidade com a atuação política ganha maiores proporções, porque as decisões que se tomam ali interferem ou podem interferir na vida, não de uma ou outra pessoa, mas de toda a população. Neste caso, faz-se mais necessário ainda o aprofundamento do sentido ético da política, isto é, a promoção da justiça social, econômica e política; a construção da igualdade étnico-racial, de gênero e de classe e o fim de toda forma de exploração, discriminação e dominação. Ou seja, é preciso o compromisso ético com a construção de uma sociedade justa, livre e democrática para todas as pessoas.

Estado laico e democracia Um dos princípios fundamentais do Estado democrático e de direitos é a sua “laicidade”. O que quer dizer isto? Você sabe? Primeiro, vamos entender o que é Estado, para então entendermos melhor o que é (e porque deve ser) o Estado laico. É comum as pessoas confundirem Estado com governo, mas estas são coisas distintas. O Estado representa, ao mesmo tempo, o povo (as pessoas, populações, comunidades) e os poderes políticos de um país. Este país, constituído como nação, ocupa um determinado território (geográfico, político, cultural) e é administrado por um governo próprio (que no caso do Brasil, elegemos a cada 4 anos), se configurando em “pessoa jurídica de direito público”, reconhecido mundialmente por outros países e órgãos internacionais. Ou seja, num

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sentido amplo, o Estado é o próprio país e tudo e tod@s que fazem parte dele. Mas na prática, há uma distinção (não devendo nunca ser uma separação) entre o povo e os poderes políticos e o governo de um país. Normalmente chamamos de Estado “os poderes políticos e o governo”, que devem estar a serviço do bem estar do “povo”. Já o povo, por sua vez, é quem financia o Estado (através dos impostos que pagamos) e tem o papel de escolher (através das eleições) o governo e @s legislador@s e de fiscalizá-los. Portanto, embora o Estado envolva tanto o povo como os poderes políticos de um país, quando nos referimos a Estado, geralmente estamos nos referindo mais especificamente aos poderes políticos (Executivo, Legislativo e Judiciário) e à estrutura administrativa do país: órgãos de governo, como ministérios, secretarias, departamentos; as redes de serviço (de saúde, de educação, segurança, moradia, etc.); e às instituições públicas. É importante sabermos disso para compreendermos porque é necessário um Estado laico, para que ele seja de fato um Estado democrático e de direitos para todas e todos. O termo “laico” vem do latim laikos e do grego laos, que significam povo, em sua unidade, sem privilégios para quem quer seja. Neste sentido, quando nos referimos a um Estado laico, estamos nos referindo a um Estado fundamentado na lei sobre o que é de interesse do povo, ou seja, de interesse comum a todas as pessoas.

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Isto, por sua vez, significa que não pode haver qualquer dominação fundada em princípios, valores, crenças ou religiões que seja imposta por um grupo ou indivíduo a todas as pessoas. Noutras palavras, podemos dizer que a Laicidade, em sentido amplo, significa a garantia da democracia, ou, a garantia de um “governo do povo” para o “povo”. O princípio da laicidade vem sendo usado, sobretudo, para estabelecer a separação entre o Estado e as religiões, de modo que o Estado não exerça nenhum poder religioso, nem as igrejas exerçam poder político de qualquer tipo. E, diferente do que @s fundamentalistas andam afirmando por aí, a laicidade do Estado não significa que este seja contra as religiões ou o direito de credo das pessoas. Pelo contrário, a laicidade protege o direito à liberdade religiosa na medida em que assegura que o Estado não privilegie nenhuma religião específica ou discrimine qualquer outra. Na sociedade brasileira, convivemos com várias culturas, diversos grupos étnicos e raciais, distintas religiões, muitos imigrantes... uma grande mistura que se realiza num terreno de enormes desigualdades. O atrito inevitavelmente gerado pelo encontro de todas essas diferenças, de tanta diversidade e profundas desigualdades, nós defendemos que deva ser processado política e democraticamente para promover justiça, assegurar direitos e superar a violência. A violência é a arma da dominação, dos poderosos, é avessa à política democrática. A política democrática é aquela que consegue abrir espaço para enfrentar e processar os conflitos, para a gente

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reivindicar os nossos direitos. A política radicalmente democrática é avessa à submissão, ao autoritarismo, à violência do poder patriarcal para subordinar as mulheres, do poder racista para manter a supremacia branca, do poder econômico para atender a fome de lucro do capital. É democrático reconhecer que não há um pensamento único, mas sim a pluralidade de ideias e posições. A constituição de um Estado democrático deve, por isso, garantir a convivência respeitosa entre pessoas e grupos com ideias, crenças e valores diferentes, assegurando tanto a liberdade religiosa, como garantindo a prática de outras liberdades – sociais, culturais, políticas. Por isso, defendemos o Estado laico (livre de orientações religiosas), por entendermos que só assim podemos ter de fato um Estado de direitos – diversificados, amplos e universais – para todas as pessoas. Porém, no Brasil, o Estado laico (instituído desde 1891) tem sido ameaçado pela prática política de grupos religiosos fundamentalistas que vem ocupando os poderes do Estado (Executivo, Legislativo e Judiciário) e tentando impor a tod@s seus valores e convicções religiosas através de leis e políticas públicas. A ação desses grupos ameaça, sobretudo, os direitos das mulheres de autodeterminação sobre os nosso próprio corpo e reprodução e o direito de mulheres e homens expressarem livremente sua sexualidade. No exercício de um mandato político democrático é fundamental que se saiba separar posições e valores pessoais (em especial, as de caráter religioso) da atuação para a definição de direitos – que

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dizem respeito a tod@s. Um@ governante ou parlamentar não deve e não pode atuar em causa própria nem de seu grupo religioso, mas sim na defesa do bem comum e da liberdade para todas as pessoas. Por isso, pense bem na hora de votar. Não vote em pessoas que querem fazer uso do poder político para privilegiar sua religião ou grupo religioso e prejudicar as demais. Um(a) candidat@ comprometid@ com a democracia respeita todas as religiões e aquel@s que não seguem nenhuma religião; respeita a individualidade de cada pessoa e a liberdade de expressão dessa individualidade, em todas as suas formas. Acima de tudo, respeita e aceita @ outr@ – sem distinção, e muito menos discriminação, de gênero, de raça, etnia, classe, orientação sexual, idade ou religião.

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Material bibliográfico base de consulta e referência:

Cartilha Participação e Controle Social: desafios para os movimentos de mulheres. Redação de Beth Ferreira. Fórum Cearense de Mulheres; Fortaleza, 2005. CFEMEA – Dados estatísticos: Eleições 2010 e 2008. Disponível em: www. cfemea.org.br. _______ Plataforma Feminista: em defesa da igualdade e da cidadania feminina. Redação de Beth Ferreira. Cfemea; Brasília, 2010. Documento “Frente de Luta pela Reforma do Sistema Político”. Sistematizado por Beth Ferreira. AMB - Articulação de Mulheres Brasileiras, 2010. Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político, 2007. Disponível em: www.reformapolitica.org.br.



Feminista Guia para as Eleições

2012



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