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Meu percurso no Programa de Pós Graduação em Servi

ço Social na PUC- SP:

Acessar o mestrado foi um desafio particular O primeiro processo seletivo de mestrado que iniciei foi em 2016, no mesmo momento em que finalizava minha graduação Ler os livros para a seleção do mestrado enquanto finalizava meu TCC e minha pesquisa FAPESP foi um procecsso que iniciei mas percebi que não daria conta, então decidi deixar para um momento posterior. Assim, no ano seguinte estava recém contratada na prefeitura com novos desafios profissionais e pessoais e optei por não prestar e assim o tempo foi passando. Iniciei uma especialização, finalizei a especialização. A ideia de iniciar um mestrado sempre me ocorria, porém para tanto precisaria superar o processo seletivo. E para isso, realizar a leitura de mais de 20 livros e textos Flertei com a ideia inúmeras vezes, iniciei a leitura de um ou dois livros, porém todas as vezes a proporção livros para ler x tempo hábil era algo que me fazia desistir. Em 2021, porém, ao observar a conjuntura do Brasil no desgoverno Bolsonaro, na situação pandemia-pós pandemia, o desmonte das universidades e seu desfinanciamento decidi quase como em um veredito que iria realmente iniciar e terminar o processo seletivo de mestrado, afinal, se não entrasse nesse momento, talvez não haveria mais oportunidade. de fazer um mestrado em universidade pública ou com bolsa. Então, iniciei um processo que se transformaria em três processos seletivos de Mestrado, na Unifesp e na PUC em Serviço Social e na UFABC em Gestão de Políticas Públicas. Esse período vivido no segundo semestre de 2021 foi um tanto adoecedor, com a conciliação de seis horas de trabalho diário, elaboração de projetos de pesquisa e leituras que chegaram a 200, 300 páginas/dia, além da manutenção de casa e outras atividades. Processo esse que se misturou com crises de choro e cansaço extremo. Apesar de ter resultado tanto na aprovação da PUC quanto da UNIFESP e a possibilidade de escolha de onde iria trilhar meus estudos, foi um processo que, com tratamento psicológico me fez refletir sobre meus limites pessoais e respeito ao meu corpo, sobre também parar, respirar e descansar. Ter metas audaciosas mas saber também parar mesmo quando não estiver perfeito. Assim, concluir o primeiro ano de mestrado e me preparar para a qualificação, conciliando com o trabalho na prefeitura e equilibrando com a vida pessoal sem me violentar, nem chegar ao meu esgotamento, foi em si uma vitória

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Estar na PUC e ter aulas com professoras referências do Serviço Social como a professora Carmelita Yasbek, a própria professora Martinelli e a professora Barroco foi deveras privilégio. Ao mesmo tempo foi um tanto desafiador no processo de pensar minha pesquisa do mestrado me deparar com a ausência de disciplinas com a temática de "gênero (para além do recorte da mulher cis-hétero) e sexualidade", e tendo internamente diversas indagações e dúvidas sobre como fundamentar esse tema na minha pesquisa. Gentilmente, a orientação da professora Martinelli para mim foi: converse com algumas pessoas. Nesse caminho fui fazendo costuras com as/os/es pesquisadores que encontrei: Thiago Aranha, Thais Filipe, Rodrigo Leal, Neno Rosa, Aline Fogaça, André Katsuyoshi Misaka dentre outros. Pessoas que dividiram palavras, textos, referências bibliográficas Ainda, tentei complementar esse espaço com lives, cursos livres como cursos ofertados pela Brava com diferentes temáticas, linguagem neutra e não binariedade ofertado pelo Jup77er, Ophelia Cassiane e Nega Preto e cursos sobre Transfeminismo com Hailey Hass e Letícia Nascimento. Assim, fui tentando tatear uma metodologia e referências bibliográficas. Ao assistir a Live "Afrotopias de Bixas Pretas: Epistemologias Para um Futuro Negro Possível" decidi que na produção da minha dissertação haveria uma "comissão" com revisores LGBTQIAPN+ que revisariam o conteúdo produzido

Li Foucault, Letícia Nascimento, Jaqueline Gomes, li diversos artigos, até chegar no Marxismo Queer de Guilherme Gomes Ferreira Ao encontrar as produções de Guilherme Gomes Ferreira identifiquei-me com a possibilidade de abrir diálogo com autores como Foucault, Judith Butler e autoras transfeministas sem abrir mão do marxismo, utilizando-me de suas categorias e conceitos como trabalho, historia, sociabilidade e cotidiano.

Ao compartilhar meu tema de pesquisa, obtive alguns relatos dentro e fora dos muros da PUC uma amiga de graduação, por exemplo, que hoje trabalha em um CREAS do Oeste Paulista compartilhou que ao ter contato com meu tema de pesquisa voltou-se aos prontuários em seu

CREAS e concluiu que não havia nenhuma pessoa LGBTQIAPN+ referenciada, sendo necessárias ações de divulgação do serviço e de aproximação da comunidade.

Em 2022, no dia do evento em comemoração do Dia do/da Assistente Social, em São Bernardo do Campo, Abigail Torres ao realizar uma palestra para trabalhadores da política de Assistência Social fez um breve comentário de que a comunidade LGBTQIAPN+ não reconhecia a política de assistência social como uma política protetiva garantidora de direitos

Ao partilhar meu tema de pesquisa em um NEPIencontro, lembro-me de outro compartilhamento sobre a vivência de uma pós graduanda em um CREAS do Estado de São Paulo que presenciou uma situação em que uma usuária foi selecionada para trabalhar em um programa de "Emprego apoiado", e entendendo-se que dentre os equipamentos públicos, a política de assistência social teria mais arcabouço e proximidade com a discussão trans, encaminharam essa usuária, uma mulher trans para trabalhar no CREAS. Ao chegar no CREAS, um profissional passa a demonstrar interesse por ela e flertar com ela com a intenção de consquista-la. E sim, ela chegou a corresponder. Porém, depois foi revelado que tudo consistia em uma aposta entre dois trabalhadores de que um deles conseguiria "conquista-la", objetificando-a, sem a menor consideração por ela e pelos seus sentimentos. Dessa forma, uma política social que deveria garantir a segurança do convívio (dentre outras seguranças) fomentando a autoconfiança, o autorrespeito e a estima social, como afirma Abigail Torres (2013), seus trabalhadores estavam proporcionando seu oposto: humilhação e sofrimento Essa experiência cruel partilha e aponta o despreparo e a perversidade de alguns profissionais que compõem nosso suposto sistema de proteção social, apontando que ao mesmo tempo que ele tem potência protetiva, pode ter uma face perversa transfóbica e violadora de direitos

Outra Nepiana relatou que uma amiga pessoal que mora em uma pequena cidade no noroeste paulista mesmo passando por inúmeras dificuldades (tanto financeira quanto de vínculos e inúmeras situações de transfobia) opta por não buscar o CRAS buscando resguardar-se de olhares preconceituosos e de posicinamentos conservadores das profissionais

Que Ali

atuam.

Na disciplina de Política de Assistência Social, um aluno não binário apontou a falta de referência de outros profissionais trans e travestis atuando em serviços e pensando essa política Essa ausência trouxe insegurança em seu processo de afirmação de gênero enquanto estagiava em um CRAS

Assim, ao longo da trajetória da construção do projeto e do desenvolvimento inicial dele, pude escutar algumas experiências e impressões iniciais sobre o tema

Aline, trabalhadora do SUAS também em São Bernardo do Campo, foi companheira antes mesmo de eu acessar a PUC, lendo meu projeto de pesquisa, me auxiliando no processo seletivo e posterior ao meu acesso uma pessoa de escuta sempre pronta, compartilhando saberes, dilemas e textos

Conversar com Thiago e André, por outro lado possibilitou escutar sobre algumas vivências na Cidade de São Paulo e refletir sobre metodologias e possibilidades de atuação, garantindo um atendimento ético frente a demandas das pessoas LGBTQIAPN+ utilizando-se inclusive da história oral. Iniciamos algumas conversas inconclusas como: É necessário que se tenha, ou não, acolhimentos específicos para pessoas trans e travestis? Ou quartos específicos? Ou qual trabalho social é necessário fazer nos acolhimentos com todes acolhides para impedir situações de violências e preconceitos? Trocamos também, textos e materiais.

Com Thais, pude trocar sobre meus dilemas e reflexões de ser uma pessoa Cis Hetero pesquisando essa temática. Ainda, foi uma pessoa extremamente significativa na troca de textos e de referências bibliográficas em um momento em que estava desnorteada.

Neno foi uma grata parceria no curso, com frutíferos espaços de troca e realizações de atividades conjuntamente como produção e apresentação de artigos, revisão de textos e também a construção de uma capacitação para trabalhadores do SUAS.

Rodrigo por sua vez, foi a pessoa que me aproximou do Marxismo queer, apesar de eu já ter um livro do Guilherme Gomes Ferreira, me apresentando outros artigos e a tese de mestrado desse autor.

Assim, como a Professora Martinelli sempre diz que mesmo quando escrevemos no meio da noite a sós, não estamos sozinhos. Escrevemos e pesquisamos no coletivo

Adentrar a Puc foi um desafio. Lembro-me ainda que os objetivos dos meus primeiros dias de aula foram: acertar o trajeto de 1 hora e meia entre minha casa e a PUC - Confesso que ao logo desse período errei algumas vezes, pegando o ônibus no sentido errado- , e acertar as salas em que ocorreriam as aulas

Lembro-me de adentrar na PUC no primeiro dia de aula, olhar para os prédios, os bancos e as árvores e acha-la bela

Os primeiros dias foram um pouco assustadores, de habitar um novo espaço sem conhecer quase ninguém, com poucos rostos conhecidos. Mas aos poucos, amizades foram construídas e o ambiente de assustador passou a ser acolhedor Descobri a sala do refeitório do 5º andar para almoçar, o colchão da APG para tirar sonecas e a cafeteira para passar os cafés entre as aulas

Ter o acolhimento da professora Martinelli em todo o processo de orientação sempre foi também um lugar seguro cheio de afeto, desde o dia em que fui informada que ela seria minha orientadora, grata surpresa!