Betão n. 39 - Junho 2018

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Outra questão que é muitas vezes apontada é de cariz ambiental: as pessoas acham que o cimento é um problema para o planeta pelas emissões de CO2 que estão associadas à sua produção. Mas a verdade é que o betão absorve uma parte do anidrido carbónico do cimento através do processo de carbonatação. Não é um equilíbrio total, mas é-o em parte. E a produção do aço, quanta energia consome? O problema está na falta de visão de longo prazo, isto é, em qualquer obra é preciso calcular o custo global do empreendimento. Hoje vive-se numa situação em que os donos de obra não têm competência para compreender que não é minimizando várias parcelas que minimizam a soma total. Fazem concursos para apurarem qual é o projeto mais barato, mas não pensam na manutenção. Deviam pensar no custo durante o período de vida. E o período de vida das estruturas em edifícios correntes é de 50 anos e no caso das obras públicas é de 100 anos.

a execução da obra. É importante ter veículos de pequena dimensão para transportar pequenas quantidades de betão para as obras de reabilitação. Para o betão ter uma posição mais forte é bom que se pense nisso.

Que desafios traz ao betão o incremento da atividade nas áreas da reabilitação de edifícios e estruturas? E qual o papel da prefabricação? Num país com as características sísmicas do nosso não é possível termos uma construção tipo “lego” tendo em vista as preocupações futuras com a sua desconstrução. É preciso haver monolitismo. Quando usamos estruturas pré-fabricadas e chegamos aos nós, temos que criar uma capacidade de ligação porque uma estrutura para o sismo precisa de ter continuidade. O betão tem uma desvantagem em relação a outros materiais: é mais pesado e em termos estruturais isto é importante. Por isso, quando reabilitamos edifícios antigos com necessidade de intervenções mais profundas usamos frequentemente soluções mistas madeira-betão ou aço-betão. Outros problemas nas obras de reabilitação são a dimensão e o acesso dos equipamentos necessários para

obra em Lisboa neste momento, com 75 000 m2 de pavimento em betão armado e betão pré-esforçado, o projeto inclui umas consolas com 8 metros. Conseguimos resolver o desafio: para reduzir o peso optámos por uma estrutura mista aço-betão. Também as concessões rodoviárias nos trouxeram um outro desafio que foi a necessidade de executar com rapidez e controlo de custos. Agora, nas obras antigas, eu tenho encontrado mais dificuldades. Primeiro, temos que compreender o problema. É proibitivo alguém fazer um reforço ou alguma intervenção sem o perceber primeiro o problema. Depois, as intervenções são sempre complexas porque em muitas destas obras os trabalhos têm de ser feitos sem perturbar o funcionamento do empreendimento. Por exemplo, no viaduto Duarte Pacheco substituímos os aparelhos de apoio com o trânsito a passar.

O que é que apresenta maiores desafios num projeto: a realização de uma nova estrutura ou a intervenção numa estrutura já existente? Ambas são desafiantes, os desafios é que diferem. Nas obras novas, os arquitetos vieram trazer novas conceções. Por exemplo, no projeto do Hospital da CUF Tejo, que é a maior

Porque sente necessidade de formar equipas pluridisciplinares para a realização de estudos e projetos de engenharia? Ninguém sabe tudo. A única forma é reunirmos as competências que são necessárias para realizar um bom trabalho. Hoje, um projeto em engenharia implica várias colaborações, quer nas obras públicas quer nos edifícios. Nos edifícios, quem deve assumir a função principal é o arquiteto, deve ser ele o integrador das várias especialidades. Já nas obras públicas normalmente somos nós, engenheiros civis, os coordenadores e integradores de todas as especialidades. Falando agora do seu percurso enquanto docente, que memórias guarda desses tempos? Guardo boas recordações. Comecei a trabalhar com duas grandes figuras da engenharia do século XX. Fui assistente do Professor Arantes e Oliveira e, ao mesmo tempo, do Professor Manuel Rocha. Voltei ao IST depois do doutoramento, relativamente jovem, e tive a sorte de criar um grupo de raiz. Foram muitos anos de trabalho, a criar apontamentos que não existiam. E isso não é tarefa fácil. Tive muito prazer em ser professor, do contacto com os alunos, mas depois de 42 anos a exercer achei que chegava. Que mensagem ou conselho gostaria de deixar a quem deseje seguir Engenharia Civil e que áreas merecem particular destaque? A profissão de engenheiro civil é uma profissão associada à realização. O engenheiro civil é uma pessoa que quer resolver problemas. É uma profissão apaixonante. Eu tive sorte porque vivi num período de oportunidades. Parece-me difícil que a nova geração venha a ter as oportunidades que eu tive em Portugal. Mas há ainda muito para construir, quer em obras públicas e quer no setor imobiliário, onde se assiste atualmente a um grande dinamismo.

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