Selfie: em meu autorretrato, a microcefalia é diferença e motivação

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em meu autorretrato, a microcefalia é diferença e motivação


Missão Salesiana de Mato Grosso Universidade Católica Dom Bosco Instituição Salesiana de Educação Superior Chanceler: Pe. Gildásio Mendes dos Santos Reitor: Pe. José Marinoni

Entrevistas, Transcrição das Entrevistas, Fotografias, Redação e Edição Ana Carolina Dias Cáceres Revisão Ana Carolina Dias Cáceres Projeto Gráfico, Arte da Capa e Diagramação Maria Helena Benites Orientação do Projeto Prof. Me. Oswaldo Ribeiro Coordenação do Curso de Jornalismo da UCDB Prof. Me. Oswaldo Ribeiro

Trabalho concluído em 2014


Ana Carolina Dias Cáceres

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em meu autorretrato, a microcefalia é diferença e motivação


sumรกrio


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Dedicatória

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Agradecimento

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Prefácio

Introdução

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Capítulo 2

Capítulo 1

Antes de mim

Minha chegada

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Capítulo 4

Capítulo 3

Os outros da escola

Capítulo 5

Ídolos e a busca por um lugar que me apaixonasse

Capítulo 7

Visita à psicóloga: debatendo amores e marcas

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A descoberta da música e sua influência Capítulo 6

Religiosidade e o papel social da igreja

Capítulo 8

Outros lados de uma mesma moeda

Conclusão


dedicat贸ria


Dedico este livro aos meus pais, amigos, professores e todos aqueles que convivem diariamente com a Microcefalia.


agradecimentos


Pelo apoio dado para que este trabalho saísse, agradeço à Deus primeiramente, meus pais que colaboraram com suas memórias e ajudaram na parte financeira do projeto, aos professores que estiveram do meu lado durante nos quatro anos de curso e me deram a base e o conhecimento necessário para executá-lo, em especial agradeço a professora Cristina Ramos que me ajudou a escrever este livro e a professora Maria Helena que gentilmente o diagramou, a regente do coral UCDB, Edna Martinez, que teve a paciência de entender minhas ausências dos ensaios, aos entrevistados que cederam suas histórias para serem contadas aqui e por fim, agradecer especialmente aos meus amigos, Adriel Mattos, Deborah Caroline, Vinicius Prates e Arlon Blaszaki por terem tido a paciência e estarem do meu lado do começo ao fim. À vocês, o meu muito obrigada!


prefรกcio


Jovem do século XXI, quase não se olha no espelho. Usa outra estratégia para se enxergar. Tira uma selfie. Está pronto e lindo para a balada, tira uma selfie e compartilha nas redes sociais. Acabou de almoçar, quer saber se está com uma alface nos dentes, tira uma selfie e só compartilha se tudo estiver ok. Percebeu que está no lugar com o visual de fundo mais lindo e descolado do mundo, tira uma selfie e joga na rede. E até mesmo no banheiro, ele vê o seu reflexo na imagem que tirou de si mesmo, olhando para o espelho, mero detalhe. A palavra selfie, tão repetida nos últimos dois anos, faz referência ao termo em inglês self-portrait, autorretrato em língua portuguesa. A autora Ana Carolina Dias Cáceres faz parte dessa geração “autorretrato publicado na internet”. Quem a segue nas redes sociais já viu inúmeras selfies publicadas: selfie dos olhos puxados bem delineados de preto, selfie com a boca pintada de batom vermelho, selfie com laço no cabelo, selfie com turbante, selfie de chapéu, selfie com o violino, selfie com o colar de pérolas, selfie caminhando com o amigo, selfie dentro do ônibus e mais montagens em mosaico de selfies e selfies. Tudo dentro dos padrões dos jovens de hoje, que olham para si fixamente por meio dessas imagens digitais e parecem querer se encontrar em dois cliques: o da câmera e o do botão compartilhar. Aos 23 anos e quase jornalista, Ana Carolina, fez a selfie da sua vida. Este livro. Um autorretrato, onde ela pode ultrapassar a imagem codificada em números e que mostra as marcas do que nasceu junto com ela: a microcefalia. Para ir além das cicatrizes físicas a autora fez um resgate jornalístico de si mesma. Se entrevistou. Revirou os armários de si, para entender o significado da microcefalia nessa jovem mulher e quem sabe

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assim diminuir a desinformação sobre a síndrome na sociedade. Mas a personagem principal, Ana, não está sozinha na foto em prosa. Na narrativa desse livro aparecem outros personagens. Os outros, que a amam demais por ela ter microcefalia. Que a agridem demais, por ela ter microcefalia. Os outros, que a fazem amar demais, idolatrar, por ela ter microcefalia. E aqueles outros, que por também serem portadores da microcefalia, sentem tudo isso e muito mais. Selfie é um livro que mostra a personagem Ana, em um mergulho na sua própria história de sobrevivência, adaptação e bravura ao encarar a alteridade. De naturalidade ao enfrentar os desafios. E coragem para barrar a falta de fundamentos do preconceito. No retrato dela mesma, a microcefalia é diferença e motivação. Cristina Ramos da Silva Ribeiro* Jornalista e Ma. Em Estudos de Linguagens. Professora do Curso de Jornalismo da Universidade Católica Dom Bosco (UCDB).

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introdução


O presente trabalho tem por finalidade abordar a Microcefalia. Uma síndrome caracterizada pelo fechamento prematuro das fissuras do crânio. Este fechamento prematuro pode trazer danos ao desenvolvimento cerebral da criança, ocasionando seqüelas cognitivas e/ou motoras, além de outras síndromes associadas como a Paralisia Cerebral, por exemplo. Porém, neste trabalho será possível observar que mesmo com tais seqüelas, a criança pode ser capaz de ter uma vida normal, de acordo com suas possibilidades, fazendo coisas como estudar e conviver socialmente. A Microcefalia está associada a duas formas: Causas primarias ou genéticas. Neste caso a Microcefalia é conhecida pelas designações verdadeira ou Vera. Quem apresenta esta microcefalia pertence a um grupo de distúrbios que geralmente não tem outras malformações ou ligação com algumas síndromes genéticas específicas, como por exemplo, a Síndrome de Down. Causas secundárias ou não-genéticas. Neste caso também conhecida como Microcefalia por Cranioestenose. Este tipo de Microcefalia ocorre devido um grande número de agentes nocivos que atingem o feto intra-útero, principalmente atingindo a mãe no primeiro trimestre de gestação. A exemplo podemos citar o uso de drogas (medicamentos e álcool), desnutrição materna, infecções (rubéola, toxoplasmose, varicela), insuficiência placentária e exposição à radiação. Fora isso, quando se há um processo mais rápido de crescimento cerebral durante o período pós-parto indo até os dois primeiros anos de vida, é possível que a microcefalia ocorra devido a fatores como hipóxia grave, traumatismo crânio-encefálico, acidente vascular cerebral e distúrbios degenerativos do sistema nervoso central. Em suma, nos casos aqui apresentados será possível conhecer as duas classificações: Vera e Cranioestenose. Além dos impactos que a sindrome causa durante a vida da criança. 15


antes de mim

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Quando nascemos a única certeza que temos é que viemos para um mundo desconhecido. Estamos vivos? Estamos sonhando? não se sabe. Assim como não se sabe se a vida será a mais normal possível ou se teremos que lidar com alguns obstáculos pelo resto dela. Minha mãe, Clara, morena, estatura média, olhos castanhos conheceu meu pai, Erminio, também moreno e de descendência paraguaia em uma festa junina de escola. Na época minha mãe tinha apenas dezesseis anos, enquanto que meu pai, um ano mais velho, possuia dezessete. Na ocasião, minha mãe namorava. Era o então namorado que ela esperava na festa, mas que por alguma ironia do destino, não conseguiu chegar a tempo de uma viagem que fazia. O amor dos meus pais nasceu ao primeiro olhar. Indo para casa onde morava e trabalhava, dona Clara já não conseguia tirar da cabeça o garoto que vira na festa. Porém, um dia, na casa da minha avó, Odezina, que na época morava em outro bairro (lavadeira, baiana forte, daquelas arretada como diriam os próprios baianos), minha mãe avistou meu pai passando. O rapaz da festa e por quem tinha se apaixonado, e que mais parecia um sonho. Até então nem o nome ela sabia. Questionou minha avó sobre o assunto sem revelar seu real interesse no rapaz. E enquanto não havia um segundo encontro, algum tempo se passou e a paixão foi aumentando. Após ter visto, mesmo que de longe o jovem por quem se apaixonara naquela noite de junho, minha mãe começou a ir mais vezes à casa dos pais para poder vê-lo novamente. Isso tudo durou quase um ano. Até que o destino resolveu, mais uma vez, trabalhar a favor deles. Carregando sempre uma carta consigo enquanto aguardava a chance de estar cara a cara com meu pai 17


e se declarar, não se importando se a resposta seria a que ela esperava ou não, minha mãe o encontrou novamente, descobrindo que o nome que disseram a ela, Ferminio, na verdade era Erminio. O segundo encontro ocorreu num domingo. A família do meu pai e da minha mãe tinha amigos em comum. E foi através de um convite para um passeio em uma chácara que Dona Clara pode finalmente encontrar meu pai. E foi neste domingo, no ultimo dia do ano de 1979, que minha mãe, envergonhada, entregou a carta que escrevera à ele, se declarou e foi embora. Sendo que meu pai, após ter lido a carta, a procurou e disse que ocorria o mesmo com ele. E desta forma foi que uma história de mais de trinta anos começou. Com um inicio de namoro enrolado, feito de desencontros, eles resolveram morar juntos, sem muitas condições, já que meu pai tinha acabado de conseguir seu trabalho de funcionário público no Laboratório Central de Campo Grande, no qual permanece até hoje. Trinta e quatro anos no mesmo emprego. Na época minha mãe trabalhava em uma maternidade em Campo Grande. Sendo assim os dois resolveram alugar uma casa quase que sem móveis. Na cama de casal eram dois colchões de solteiro. Mas, tudo isso foi temporário. Em seguida eles compraram um terreno para pagar em cinco anos e com algum esforço foram construindo a casa onde residimos até hoje. Meus pais se mudaram para o nosso lar sem muita infra estrutura. Sem luz, sem água encanada, sem banheiro. Até então não possuíam filhos. Foi só quase sete anos depois que minha mãe começou a se dar conta que não conseguia engravidar. A partir de então começou a fazer um tratamento médico e recebeu o diagnóstico que confir-

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mou suas suspeitas. As possibilidades de engravidar eram mínimas. Porém, no intervalo do tratamento, o médico que a acompanhava morreu em um acidente Após quatro meses de falecimento do doutor, cujo nome era Ivan, minha mãe retornou o tratamento, tendo que começar tudo de novo com o médico Rubens Marques fez um pedido de Ultrason. Foi nesse Ultrason que veio a notícia. Minha mãe finalmente engravidara do seu primeiro filho. E já estava de 18 semanas, o que equivale cinco meses de gravidez. Saiu do exame radiante. Extremamente feliz. O garoto da família, que resolveram dar o nome de Marcos, nasceu no último dia de março em 1987, de parto normal, na maternidade Campo Grande. Passaram-se três anos e minha mãe, para a felicidade dela, engravidou novamente. Desta vez de mim, uma menina.

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minha chegada

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Começou o pré-natal, as consultas periódicas, fez tudo exatamente como se manda o figurino e os médicos. Pois, não era como a primeira gravidez. Era uma criança muito esperada, já que seria a primeira neta, primeira sobrinha, a primeira menina a qual a família toda esperava. Nos exames realizados durante a gravidez nada apontava a Microcefalia que me acompanharia pelo resto da vida. Mas, de qualquer forma minha mãe já tinha acertado com o obstetra que a criança nasceria através de uma cesariana, para que fosse feita uma ligadura das trompas, pois, dois filhos estavam de bom tamanho e não queria mais engravidar. Então, em 6 de março de 1991 minha mãe se despediu do filho Marcos, conversou com ele dizendo que ficaria apenas dois dias fora e que logo voltaria comigo nos braços. Mas não aconteceu assim. Internou-se no dia 9 às sete da manhã e a cesariana ocorreu as três da tarde. Sendo assim, o meu nascimento, como de alguns, foi planejado. Mas só o nascimento, porque o que viria depois pegou a todos de surpresa. Vim para este mundo às três horas da tarde de um sábado. Fruto de uma cesariana que foi interrompida em determinado momento pelo médico responsável para a confirmação da vontade da minha mãe fazer a cirurgia de esterilização. Todo o pré-natal foi absolutamente normal e aparentemente era uma criança normal. Mas, foi no nascimento que o obstáculo a qual tenho que lidar até hoje veio á tona. De início o médico responsável pelo parto, Dr. Wilson Sammi, considerou a existência da Síndrome de Down, até mesmo por conta da minha aparência. Mas essa idéia veio por terra quando o neurocirurgião Janivaldo Nunes Lacerda entrou em cena. Foi dele que veio o diagnóstico final. Meus pais descobriram que 21


tinham uma filha com Microcefalia. Até hoje algo tão raro de se acontecer que até mesmo os médicos se confundem com alguns tipos de síndromes, como a de Down, por exemplo. Contudo, minha aparência apontava algumas características da Microcefalia que ajudaram o neurocirurgião a desconfiar e pedir então a tomografia, que na época era raro encontrar locais que o fizessem em Campo Grande. Minha família conseguiu a realização deste exame, dois dias após meu nascimento, em uma clínica particular que acabava de ser criada, a DIIMAGEM. O exame custou cerca de oitocentos cruzeiros. Na capital de Mato Groso do Sul, o lugar era o único a realizar este exame. O outro local próximo para a tumografia era no interior de São Paulo, em Presidente Prudente. Durante esta tomografia nada aconteceu, exceto eu, ainda bebê, ter saído da sala roxa e com frio devido o ar condicionado do lugar. Quem me acompanhou e autorizou o exame foi minha tia por parte de pai, Ignácia Cáceres, e fui anestesiada para a realização do exame, devido a minha pouca idade. Nasci, pois então, com um afundamento frontal e um entupimento nasal que me impediam de respirar normalmente. Fiquei nove dias internada após o nascimento e neste nono dia de vida já fui submetida à primeira cirurgia. Justamente no dia em que deveria ter nascido se o parto tivesse seguido a sua linha natural. Quem foi comigo na ambulância até o hospital no qual faria esta primeira cirurgia, pois devido a cesariana minha mãe estava impossibilitada de tal ato, foi meu pai ao lado da enfermeira. Esta cirurgia era para a correção do entupimento nasal, correções físicas, já que este entupimento nasal se devia justamente pela aparência desconfigurada que possuía do lado esquerdo da face. O nariz torto era 22

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Meu primeiro ano de vida

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uma delas. Além de também ter sido retirado quarenta por cento da estrutura óssea do crânio na região da fronte até a coroa. Durante este primeiro procedimento cirúrgico, sobrevivi a meu primeiro obstáculo. Duas paradas cardíacas, dois sustos aos médicos e sete horas de cirurgia que me renderam, pela quantidade de sangue perdido durante o processo, uma transfusão de sangue. Isso tudo apenas com nove dias neste, como diria minha avó, mundão de meu Deus. Esta foi a cirurgia, das sete que serão contadas aqui, que levou mais tempo em seu procedimento. Durante todo este tempo da cirurgia, meu pai, até então, segundo as palavras ditas por minha mãe, não parava de chorar. A microcefalia era não só uma questão física, mas abordava alguns outros problemas que poderiam vir, como motores e intelectuais. Todos esses problemas precisaram de paciência para que se revelassem e se confirmassem. Meu pai conta que fez comigo alguns testes depois da cirurgia. Como por exemplo falar perto de mim para ver se ouvia ou fazer movimentos para ver se o olhava. Minha primeira vez em pé, segundo ele, foi por causa de um cachorro. Levantei querendo ir atrás dele. Ali já era indício de que a teoria de que eu possivelmente não andaria foi derrubada. As coisas se seguiram o mais normalmente possível. Porém, aos seis meses, durante uma sessão de fisioterapia, nas mãos da médica que estava cuidando dessa parte, tive a primeira das cinco convulsões que teria até a adolescência. Convulsões estas que me renderam os dois medicamentos que mais tomei: Tegretol e Gardenal. Tá aí duas coisas que gostaria de esquecer pela fama que um dos remédios possui, mas, não podem faltar aqui. Este início de vida foi tão conturbado, que os parentes e familiares tiveram que apelar aos santos de 24

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Registros de momentos do meu cotidiano

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devoção. Minha mãe prometeu na época, a Nossa Senhora Aparecida que deixaria meu cabelo crescer, o cortaria, trançaria e o levaria até o santuário nacional da santa. E foi assim que aconteceu. Aos sete anos, o cabelo foi cortado, trançado e levado ao Santuário Nacional de Nossa senhora Aparecida. Porém, não foi esta a única promessa feita para que Deus desse uma mãozinha, por assim dizer, na minha recuperação da cirurgia e para que logicamente nada de pior acontecesse. A irmã do meu pai, uma outra tia, Claudelina Cáceres, apelou para os irmãos Cosme & Damião, prometendo-lhes que se eu me salvasse e conseguisse progredir normalmente, faria, todo ano no dia em que comemora a data dos santos, uma entrega de doces assim como manda a tradição e eu entregaria as guloseimas em lugares como periferias da cidade, creches e escolas, até meus 10 anos. Porém, mesmo após a promessa cumprida, até hoje ainda entrego doces por aí no dia de São Cosme & Damião. Após a primeira cirurgia e todas as suas complicações, fui pela primeira vez para a casa. Meu irmão, que na época estava com quatro anos de idade, estava ansioso pela chegada. Até então tudo estava indo bem, até que aos três meses foi notado que não possuía força nas pernas. E por este motivo foi recomendado que eu começasse a ter sessões de fisioterapia e que também fosse acompanhada por um psicólogo. E foi numa dessas sessões de fisioterapia, com seis meses, que tive a primeira convulsão. A médica Lurdes, cardiologista, diagnosticou um sopro no meu coração. Sendo que na mesma época também foi receitado os medicamentos que tomaria até meus 14 anos. Aqueles: Tegretol e Gardenal.

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O primeiro dia do índio. A primeira festa junina e Feira de Ciências aos 13 anos

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APÓS A PRIMEIRA CONVULSÃO o houve mais 5. Uma delas, brincando com o cachorro da casa na época juntamente com os vizinhos , foi a mais inusitada de todas. Não pela convulsão, mas pelo lugar. Como havia dito estava brincando com o cachorro da família, e como era bem criança, tinha 4 para 5 anos, e o mesmo animal tinha uma casa feita de tábua, porém por ser um animal de porte grande, a mesma era grande o bastante para uma criança se enfiar lá. E foi o que fiz. Idéia de jerico, óbvio. Mas sempre gostei muito de animal e essa cachorra era meu xodó na época. Pois bem, resolvi brincar lá dentro. Esconder-me na verdade, já que estávamos brincando de pique-esconde. Não tinha internet nem nada, as brincadeiras clássicas como esta eram um passatempo e tanto na época. No meio da brincadeira, tive esta convulsão, dentro da casa do cachorro. Cômico e trágico, ao mesmo tempo. Porque demorou para que minha mãe descobrisse aonde estava. Contudo, apesar das convulsões, já falava , andava. Porém a calcificação óssea prematura ainda inspirava receios quanto ao meu aprendizado e desenvolvimento. E aos nove meses passei por mais uma cirurgia nas mãos do neurologista Lacerda Nunes para retirada de parte da estrutura óssea frontal.

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Fase universitária : o inicio na profissão de se contar e ouvir histórias

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os outros da escola

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Passaram-se alguns anos e nada de mais preocupante apareceu. Com quatro anos fui à escola. Por alguma insistência minha já que era curiosa e sempre queria saber o que meu irmão, na época já estudando, tanto fazia. Ir para a escola foi como se um sonho estivesse se realizando. A primeira aula foi incrível Lembro que foi de gramática. Aprender o ABC, aquilo de sempre. Mas era para mim um mundo totalmente novo e aquelas crianças todas falando ao mesmo tempo, eu só observava. Queria entender como podia haver tanta gente em uma sala tão pequena. Só que a realidade não tardava a aparecer. Eu teria um tratamento ali. Se algumas brincadeiras feitas no pátio eu não poderia participar, pelos riscos que havia. E assim o isolamento foi inevitável. O tempo tratou disso. Aruã, um garoto de cabelos bem loiros, um típico capetinha era quem mais me atormentava por ser diferente. A maldade ‘’inocente’’ dele marcou minhas futuras decisões. Mas foi com ele que protagonizei uma cena extremamente bizarra. Minha primeira briga para valer. Na época era fã de filmes como Karatê Kid e alguns do ator Jackie Chan. Aprendia com facilidade gestos do que via e imitava-os. Certo dia minha paciência se extinguiu. Tinha 8 anos e já estava exausta daquele garoto sempre me atormentando e ninguém para fazer nada. Resolvi agir por conta. Levei ele até próximo ao quadro negro e dei-lhe uma rasteira como havia visto em um dos filmes. Caimos numa briga onde só lembro de tê-lo deixado ele todo arranhado com a lapiseira que possuía na mão e um dos olhos roxos. Mas, logicamente que ele não sairia por baixo. Não seria chacota da sala. Ainda mais ele que adorava tirar uma onda de todos que não estavam em seus padrões. Enfim, o fato é que após eu ter dado uns arra31


nhões e um belo olho roxo, ele revoltado pegou uma tampa da lixeira que tinha na sala, e quebrou na minha cabeça. A tampa felizmente era de plástico. Não sei dizer se não senti nada por estar tão enfurecida ou se porque realmente não foi nada. Mas, foi aí que a graça de me fazerem de piada caiu por terra. Ninguém falava comigo, mas também não falaram mais sobre mim nem faziam brincadeiras. Muito pelo contrário, aquele que um dia fez piada de mim teve que pagar os danos que havia feito. Um dia de glória, diria. Os amigos, os primeiros, foram aos 11 anos. Thays foi a primeira amiga que tive. Cabelos cacheados, bem presos, ela morava próximo a minha casa. Puxei papo com ela logo no seu primeiro dia, explicando e dizendo quem cada um era. Dali nasceu uma amizade que até hoje existe. Além dela, havia a Amanda. Morena, bem magrinha. Com esta perdi o contato, mas vinha comigo e com a Thays, além da Beatriz, carioca , sotaque ainda forte de lá, apesar de seus três anos já morando em Campo Grande. Antes da Thays, já existia a Tasmim, mas essa só se tornou amiga mesmo no meu ultimo ano naquela escola. Sempre espontânea não me lembro como comecei a conversar com ela, mas minha primeira ficada com um garoto foi numa saída com essa amiga. O nome dos garotos, nem lembro, confesso. Afinal, simplesmente saímos, ela avistou os dois passeando, conversou, fez amizade, me apresentou e pronto, ficamos cada uma com um. E até hoje ela é assim. Se quer, faz e acontece. Os amigos vieram tarde, mas cada um deles, com exceção da Amanda até hoje mantenho contato. A Thays é a única que ainda vejo pessoalmente, por morar mais próximo de casa e estudar na mesma universidade. AS PULSÕES Havia um procedimento que eu tinha que fazer 32

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após cada cirurgia. Esse procedimento é chamado pulsão. As pulsões eram necessárias, pois, criava um liquido parecido com água na região onde era feita a cirurgia e este liquido tinha que ser retirado. A retirada de tal liquido era feito com seringa. Uma seringa de 20 ml. A pulsão feita após a primeira cirurgia foi a que mais rendeu, pois, foi a que mais liquido foi retirado. O procedimento era feito de tal forma: Com uma seringa, o neurologista que na época me tratava, drenava esse liquido e o retirava pela lateral da fronte. Era um processo dolorido. Criei traumas de agulha graças a essas pulsões. Até hoje um simples exame de sangue me arrepia. Já levei um numero de agulhadas que nem mesmo paciente de acumpultura deve ter levado. Mas, esse era um procedimento necessário. Fazia parte do tratamento que tinha que ter após cada cirurgia. Então não posso reclamar. Porém, seringas e agulhas quanto mais longe de mim, melhor. DA MINHA PROFESSORA FAVORITA Me lembro bem do nome, da sua fisionomia, do seu jeito. Uma professora de História que foi capaz de me dar a maior lição que trago nessa vida. O afeto e seu valor. Quando deixou a escola chorei como se estivesse perdendo alguém da família. E ela era bem assim para mim. Uma segunda mãe naquele lugar. Até a chegada dela a escola era só a escola, mas quando apareceu virou minha segunda casa e História então, minha matéria favorita. Era doce, calma com a molecada e eu a admirava. Cleide, um nome que nunca vou esquecer. Aprendi o valor do afeto com ela e suas aulas. Ao final de uma das suas aulas, fiquei na sala desenhando. Ela chegou e me perguntou sobre a cicatriz. Perguntou se havia tido algum acidente ou algo assim. selfie: em meu autorretrato, a microcefalia é diferença e motivação

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Bom respondi que não. Estranhei o interesse porque ninguém até então não havia vindo me perguntar sobre isso. Contei a história e de admiradora virei admirada. E ali naquele dia encontrei a professora que seria a minha favorita até hoje. Uma pessoa que não esqueço que me tratou como igual. Mas tudo que é bom, dura pouco. Um dia ela me chamou e disse que estava saindo da escola. Chorei muito e pedia pra que ficasse, mas ela não podia. A professora que a substituiu não era doce como ela, mas também não era tão ruim. Mesmo assim, até hoje, não conheci ninguém como ela. Como Cleide e suas aulas cuja a tranqüilidade pairava como uma ave em um fio prestes a entrar em colapso. Cuja aula eu prestava mais atenção e as provas da matéria que lecionava tirava as melhores notas. E por fim, Cleide, minha professora favorita de toda uma vida.

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a descoberta da música e sua influência

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Como descobri minha sensibilidade musical eu sei bem dizer. Aos nove anos se iniciou um coral na escola. O nome da regente era Roseleide Brandão e a primeira música que cantei nele era o tema da família Adams. Na verdade não era bem um coral, mas algo como uma musicalização infantil. Mas, essa musicalização foi importante para que eu descobrisse esse talento para música. Apesar de aos quatro anos ter feito balé. Mas no caso do balé não durou muito. Esse coral me ajudou a descobrir o talento para música que com tempo se transformou em uma forte paixão. No mesmo ano, numa dessas festas de escola, tipo festa da primavera, me apresentei. Cantei sozinha, só eu e Deus, por assim dizer, a música Anjo, da Kelly Key. Sem desafinar uma só vez e sem ter feito uma única aula de canto percebi para o que tinha nascido. Cantar, cantar e cantar, sem ter a vergonha de ser feliz. Minha maior paixão e sonho hoje: o canto. Passado os anos me apresentei novamente, à capela ( só a voz), agora com 18 anos e no ensino médio, em um festival que ocorreu na escola estadual Arlindo de Andrade Gomes, a música casinha de sapê. Fiquei em segundo lugar nesse festival. Foi uma das coisas mais lindas que me aconteceram. Quem diria que eu, após tantas cirurgias e confusões, estaria ali, ganhando, mesmo que em segundo lugar um campeonato musical? Ninguém diria. A gata borralheira havia descoberto sua melhor qualidade. Desde então, a música virou aquela influência máxima. E o que me move em cada decisão absurda ( ou não) que tomo até hoje. Três anos após resolvi partir para o lado teórico da coisa. Fui me meter a besta de aprender a tocar violino. E consegui. Nessas aulas aprendi a ler partitura. Meu lado clássico, já gritante, explodiu com mais esse aprendizado. Me apaixonei ainda mais pelo clássico erudito. E o professor , apesar de ser de violino, 37


por muito pouco não me colocou para ser coralista do coral do Estado. Só não fui por que na época uma virose maldita me tirou de cena. Não era para ser. Mas teria sido uma honra e tanto ser coralista do grupo que representa Mato Grosso do Sul. E nessa época também descobri que minha extensão vocal não era qualquer uma. Mas era uma extensão vocal das boas. Algo que segundo meu professor de violino era difícil de se ver. E oito anos depois, agora já na universidade, regente do coral do mesmo lugar, confirmava. Eu poderia atuar nas vozes mais agudas até as mais graves dos timbres femininos. Definitivamente após todos os problemas, hoje ninguém imagina, nem mesmo o médico é capaz de acreditar que mesmo com a microcefalia no meu calcanhar, seria capaz de tanto. De chegar até aqui. De fazer o que faço, de cantar o que canto, tocar o que escolhi tocar e acima de tudo de estar prestes a me formar, como estou. E minha história só é o começo de que o céu é o limite para quem não deixa de acreditar.

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Sem a música a vida seria um erro. A entrada do violino na minha historia

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Ă­dolos e a busca por um lugar que me encaixasse

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Há quem implique com esse meu amor excessivo por artistas. Um comunicador e referência profissional, um ator com uma pegada de músico e uma cantora extremamente louca e fascinante. Assim eu os caracterizo. Pessoas à margem da sociedade, não por serem humildes, mas por pensarem diferente. Por serem diferentes. Os três viraram ídolos por terem algo a ver comigo. Um lance diríamos de identificação. Sempre criticados mas que nunca deixaram de ser o que são e nem pensar como pensam. O primeiro a aparecer e aquele com quem tive a oportunidade de estar frente à frente foi Marcelo Tas. Esse cidadão apareceu quando ainda tinha três anos. Na figura de um professor que todo mundo tinha medo e que eu via algo especial. O professor Tiburcio do programa de Tv, Ra-Tim-Bum. Me identifiquei com excentridade daquele professor que influenciou em parte o meu desejo de ir à escola. Foi o primeiro que me apareceu diferente e que por ser justamente assim, eu gostei. Aos sete anos, já vivendo o preconceito na pele por não ser igual a ninguém e pela cicatriz tão aparente, quem apareceu foi Johnny Depp no papel de Edward Mãos de tesoura que ironicamente, tinha tantas cicatrizes quanto eu. Havia acabado de chegar da escola, chateada ainda com as brincadeiras maldosas que havia escutado, liguei a TV e no passa daqui e dali, numa sessão da tarde dessas, dei de cara com aquele ser pálido e cheio de cicatrizes. Triste e sozinho exatamente como eu. E inocente igual a uma criança. Na época não sabia quem era a criatura, foi lá com 12 , 13 anos que descobri quem era que lhe dava vida. E ao ler percebi que não só o personagem era diferente e tinha a ver comigo, como o ator também. Suas idéias e a superação a qual havia passado para chegar aonde chegou foi algo que me identifiquei de cara. Daí o resultado já era 41


óbvio. Virou um ídolo que ainda pretendo conhecer. A terceira e ultima pessoa a virar minha referência na vida foi Alecia Beth Moore e que é mais conhecida por seu nome artístico, Pink. Essa estranha e aparentemente incrível no que se diz respeito o vocal, entrou na minha vida tão por acaso quanto os outros. Mas o estilo diferente, o apreço por algo de polêmica e sobretudo o fervor com que canta foram definitivos para que eu admirasse e que virasse como alguns chamam, de minha Diva. Ela consegue fazer com que a música em mim se torne tão forte quanto qualquer outra coisa e que o sonho do palco continue tão aceso quanto a chama de uma vela. Os três definiram meu lugar no mundo e me ajudaram a escolher meus valores, defini-los e defender as coisas que acredito, custe o que custar.

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Johnny Depp, Marcelo Tas e Pink: ídolos de toda uma vida

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a religiosidade e o papel social da igreja

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Toda a minha família sempre foi muito religiosa. Minhas avós são daquelas que acendem velas para santo, fazem novenas, rezam o terço e pagam promessas. A fé sempre foi algo presente na minha vida. Mas, esta mesma fé me ajudou muito em momentos onde sentia medo de dar tudo errado nessas cirurgias que tinha que fazer. Para começar, a promessa feita a Nossa Senhora Aparecida assim que vim ao mundo, depois a promessa feita a São Cosme e Damião e por fim a minha dedicação a igreja. A fé me ajudou em vários aspectos com relação à Microcefalia. Acreditar que iria correr tudo bem nas cirurgias ou que a recuperação seria completa sem qualquer surpresa, era uma delas. Estou aqui hoje contando essa história pela competência da medicina e também porque acredito que lá em cima deve haver alguém que gosta muito de mim. Afinal sobreviver a duas paradas cardíacas com poucos dias de nascido não é qualquer um que pode dizer. Mas a fé me levou, anos depois, à igreja. Lá descobri outro mundo. Um mundo onde eu poderia me despir das máscaras que usava, pois ali, não haveria julgamentos, não haveria criticas ou qualquer resquício de preconceito. Descobri no mesmo lugar amigos que estariam comigo durante toda a semana mesmo que nós nos víssemos apenas no domingo. Eu me divertia na igreja e ao mesmo tempo me fortalecia. Ali, comecei a me dedicar, encontrei novos amores, novas paixões, achei uma nova vida, uma nova família. Fiquei por quatro anos em uma comunidade bem perto de casa chamada São Domingos Sávio. Lá me batizei, fiz a minha primeira comunhão e crismei. Hoje frequento outra comunidade, a Maria Mãe da Igreja. Nessa comunidade me encontrei. Fui muito bem 45


recebida pelas pessoas dali. Ganhei um amigo que hoje considero um irmão caçula. Amigo este que me deu o prazer de realizar o sonho antigo de cantar com um guitarrista tocando ao lado. Bem, ele é guitarrista e um dos meus melhores amigos. Afinal, foi ele que me trouxe de volta uma segurança que há muito já tinha perdido devido ao preconceito que enfrentei. Mas, a igreja não me trouxe apenas amizades maravilhosas, como também me deu a chance de me sentir parte de um grupo. Me deu a sensação que fazia parte de algo e que não estava mais sozinha. E sobretudo, não importa o quanto o mundo me julgasse por aparência ou coisas assim, ali naquele lugar, durante duas horas, eu fazia parte de algo. Eu tinha pessoas que poderia contar, que me abraçariam sem que eu precisasse pedir, que me conheceriam, e mais do que isso, me tratariam como igual. Na igreja e na fé, encontrei o que buscava. Um lugar onde eu poderia ser eu mesma. Sem precisar fingir, sem me esforçar para me encaixar. Encontrei finalmente um grupo onde não importa o que fizessem, eu poderia participar.

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selfie: em meu autorretrato, a microcefalia é diferença e motivação


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visita à psicóloga: debatendo amores e marcas

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Quando passamos por acontecimentos traumáticos é normal que nossa cabeça pire no meio do caminho e que tenhamos que recorrer a ajuda de um profissional. Porém, passei por vários médicos e nunca fui em um profissional de psicologia para que me ajudasse a entender os acontecimentos relacionados à Microcefalia e nem mesmo para compreender algumas características emocionais que possuo hoje e que de alguma forma estão ligadas à minha experiência na escola e a síndrome e suas conseqüências. Em meio ao desenvolvimento deste trabalho e por orientação da professora fui à uma psicóloga falar desses aspectos. Foi na clínica escola da universidade que a conversa ocorreu. Uma sala, só eu e a psicóloga. Alguns alunos passavam uma hora ou outra, mas nada interrompia. O primeiro ponto que abordei com ela foi justamente meus relacionamentos. Os que nunca senti falta como namoros e tudo mais e as decepções amorosas que culminaram nesse meu desinteresse para namoros e até mesmo na descrença de relacionamentos afetivos duradores. Contei a ela todas as histórias. O nome da psicóloga Tânia. Uma senhora simpática, paciente e que escutou cada palavra que eu dizia como se fosse minha melhor amiga. Dos amores mais antigos até os mais atuais e todos os motivos pelos quais nunca acreditei nessa idéia de alma gêmea, porque não me vejo tendo uma. Nem agora e nem muito menos futuramente. Nas palavras dela tudo isso é resultado justamente da insegurança que adquiri nos anos de escola, com todas as coisas que ouvia e pelas vezes que tive que ficar olhando as outras crianças brincarem e ficar de lado. Isso tudo influenciou nos relacionamentos futuros. Seja de amizade, sejam eles os amorosos. E por haver essa insegurança da minha parte ocorre o apego. 49


Colocando assim, tais pessoas em um lugar acima do que deveriam estar. Outro ponto que foi abordado durante uma conversa que durou uma hora foi com relação aos ídolos. Minha paixão por eles. Ela também me disse que com relação a isso há por trás essa forma de preencher algo que aparentemente não me faz falta. Não agora. E que cada um deles tem algo que eu gosto ou que me identifique, como a música, por exemplo. E por último e talvez tenha sido o assunto mais delicado para mim, foi com relação a auto estima e a me ver no outro que também é um fator que interfere em relação aos relacionamentos. Isto de não achar que eu seja boa o bastante para alguém, não por pretensão, mas por me colocar numa posição inferior. A maior parte da conversa foi essa. Ela me disse que eu devia buscar alguém que não se importasse com aparência. Mas em um mundo onde a estética, o visual é o que vale, como buscar alguém assim? É mais racional assumir a própria sina do que sonhar com um caminho que não tem pretensão de existir, rebati. Ela replicou com o seguinte argumento: quando conhecerem a menina por trás disso tudo, as coisas irão acontecer.

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outros lados de uma mesma moeda

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Sarah e Fátima: uma luta diária no Amazonas Fátima Nelmara , 42 anos, casada, mora atualmente em Manaus, no Amazonas. Mãe de Sarah, uma portadora da microcefalia. Atualmente, Sarah está com 23 anos. Ainda na gestação de Sarah, Fátima tentou aborto devido às agressões domésticas que sofria. O marido alcoólatra dificultava as coisas. A história de Sarah e das mudanças que houve em sua vida com sua chegada foi contada por ela através do WhatsApp. Perguntei a Fátima se sua filha tinha outra síndrome associada, como Paralisia Cerebral, por exemplo, e em resposta ela disse que não sabia dizer se Sarah possuía 53


outras síndromes já que só foi feito um Raio X. Porém, aos quatro anos, Sarah apresentou uma característica comum entre os portadores: as convulsões que cessaram após algum tempo sem qualquer uso de medicamento. Sarah, segundo a mãe, não anda, não fala, possui paralisia do lado esquerdo e enxerga com dificuldade. Em sua ultima consulta definiu apenas o claro do escuro, mas sua audição é intacta. Não há problema nenhum. Fátima descobriu a Microcefalia da filha aos quatro anos. Quando mudou-se para Manaus. No início sua obstetra, que fez o parto cesariano de Sarah, deu indícios de que a menina era deficiente visual. Fátima foi aconselhada pelo médico a ir para casa e ter um aborto espontâneo ou ficar internada até o bebe ganhar peso e operar. Optou pela segunda alternativa. Fátima fez uso dos medicamentos Dicorantil e Citotec. Este último é usado para provocar o aborto. Há 20 anos morando em Manaus, natural de Santarém, no Pará, a mãe contou que na cidade em que morava não havia estrutura. As dificuldades então, foram diversas. A menina chorava muito, tinha várias convulsões, passava noites em claro e com o pai a levava na cidade de bicicleta. Isso tudo até se mudarem para a capital Amazonense. Com Sarah nos seus quatro anos e já morando em Manaus, a mãe a levou a um neurologista, que pediu um raio X e a informou que a filha possuía Microcefalia. Além de ter dito também que o cérebro da menina havia parado de se desenvolver juntamente com a caixa craniana já inteiramente fechada. Após esta informação elas ficaram freqüentando instituições e fazendo terapias. Já que a fisioterapia e as cirurgias necessárias para o alongamento dos tendões que possibilitariam Sarah a andar tinham um custo alto na época em que deveriam ter sido feitas. Fátima diz que conviver com Sarah é tranqüilo. E 54

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que fez um curso de enfermagem para lidar com as infecções que a fístula causava. Sua vida passou ser única e exclusivamente dedicada à menina de vinte e três anos e trinta e seis quilos que só dorme com um rádio ligado perto. E ai de quem desligá-lo. O choro é certo. E ainda assim ela acorda várias vezes durante à noite, enquanto que Fátima para cuidar dela acorda às cinco horas da manhã. Aos 21 anos, Fátima teve que lidar com o preconceito em relação à sua filha. Ao se mudar para Manaus a aceitação se tornou mais fácil. Hoje se orgulha da jovem e como toda mãe coruja, até compra briga quando há algum tipo de olhar diferente ou comentário de cunho preconceituoso com relação à Sarah. A família não tem convênio de saúde, vive do benefício pago e às vezes que já tentou usar do SUS nunca conseguiu, mesmo com a lei de prioridade. Devido a situação da filha, Fátima contou ainda que sempre passa datas especiais como Natal e Ano Novo sozinha com ela e que não são convidadas para aniversários. Na opinião dela, por parte das pessoas, ainda falta amor. Com o marido alcoólatra, Fátima cuida da menina sozinha e no dia em que me contou sua história estava pensando em como a levaria para o médico já que o transporte público é inviável e não tem condições de pagar um táxi para levá-las. Fátima não sofreu ao saber da situação da filha. Deram à Sarah sete anos de vida. Hoje ela está com 23 anos e freqüenta a fisioterapia duas vezes por semana. Enquanto que Fátima, com 42 anos lida com a filha com mãos de ferro e uma dedicação ímpar.

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As meninas de Goiás 56

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Me espantei quando soube a idade da mãe. Mara Rodrigues, aos 26 anos, tem duas filhas com Microcefalia. Izabel de 3 anos e Joana de 5 anos, são duas meninas de uma esperteza comum a qualquer criança vista como normal. Joana, é a faladeira disse Mara, já sabe o alfabeto e até mesmo dizer o nome de cores em inglês e português. Mara soube da Microcefalia da filha assim que ela nasceu. Mas a confirmação mesmo só veio após os exames feitos com um mês, confirmando também que sua procedência era genética. Na hora em que soube que a primeira filha tinha microcefalia , Mara contou que sentiu medo, mas depois o amor de mãe falou mais alto. Apesar da revolta que sentiu com o preconceito e por estar acontecendo com ela. Ambas não possuem nenhuma sequela, diz a mãe, apesar de o crânio ter um perímetro menor do que o normal e o eletro possuir alterações. Na família, o preconceito existia. Mara se afastou dos familiares por isso. Palavras como Praga, ET e Aberração eram usadas pelos parentes para se referir a sua filha. Mara hoje reside com as crianças em Senador Canedo, Goiás. As dificuldades com Joana e Izabel são pelo nervosismo de ambas e por Izabel não conseguir se comunicar com pessoas diferentes. E justamente por essas características elas não levam uma vida social normal, sendo que a mãe já perdeu emprego e por isso chegou a faltar dinheiro na casa. As meninas tem dois irmãos. A convivência com eles é tranqüila. Se amam muito, contou Mara e elas chamam eles de ‘’meus irmãozinhos’’. Mara depende do sistema público de saúde. A cidade onde morava não tinha neuropediatra, apenas neurologista. Foram encaminhadas para a capital do Esselfie: em meu autorretrato, a microcefalia é diferença e motivação

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tado, mas não tem previsão para quando. Elas tomam Carbamapezina para controlar as crises de convulsão. Isabel e Joana possuem a Microcefalia Vera. Sem danos cerebrais, apenas um fechamento prematuro das fissuras cranianas, o que explica o tamanho menor do que o normal da caixa craniana das crianças.

um sorriso por trás das dificuldades

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O pequeno de São Luis Thays Cristina é das que entrevistei a mãe mais recente. Thalles Ruan recém completou um ano de idade. Thales foi diagnosticado com a Microcefalia ao terceiro mês de nascido. A mãe ao descobrir ficou sem saber o que fazer, além da tristeza que sentiu. Thays nunca havia ouvido falar da Microcefalia, mesmo tendo visto crianças assim. Porém, segundo ela, não havia parado para prestar atenção até então. Quem orientou Thays a procurar um neurologista para ter um diagnóstico foi a fonoaudióloga que a acompanhava. Eles não possuem convênio médico. Por ser ainda um bebê, Thalles não dá tanto trabalho. O dia a dia é tranqüilo. E a maior dificuldade se deve apenas pelo fato dele ainda não conseguir permanecer sentado e ser muito irritado. Uma panelinha de pressão de 5 quilos e 60 centímetros. selfie: em meu autorretrato, a microcefalia é diferença e motivação

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O preconceito na família vem do lado do pai. Thays, disse que há uma indiferença por parte da avó paterna. Fora isso o restante da família é só amor com a criança que por onde passa contagia com um sorriso sempre meigo no rosto. Thalles não tem nenhuma síndrome associada e nem mesmo toma medicamento ou sofreu convulsões, apenas alguns espasmos e dificuldades motoras.

Nada como a familia para dar colo na hora necessária

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Um apaixonado por música de 26 anos Lucas Tavares Somma, 26 anos, filho de Tais Moura Tavares, possui microcefalia e teve uma Síndrome chamada Antifosfiolipidio. Esta síndrome é uma doença autoimune. A neurologista chegou até escrever sobre o caso de Lucas, pois, achou que havia alguma ligação com a Microcefalia. A síndrome causa coágulos e entre 2000 e 2002 Lucas foi internado devido a uma hemiplegia, que consiste em uma paralisia de metade do corpo (direita ou esquerda). Até 2008 fez acompanhamento com uma endocrinologista. Lucas terminou o ensino médio em 2010. Atualmente se prepara para fazer vestibular para tecnólogo em Luteria selfie: em meu autorretrato, a microcefalia é diferença e motivação

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na Universidade Federal do Paraná (UFPR). A universidade tem uma vaga em cada curso para portadores de deficiência. Mas apesar de não parecer, Lucas , contou Tais, possui dificuldades cognitivas e motora. Mas, a legislação assegura currículo adaptado na educação básica e o Conselho nacional de Educação garante também para o ensino superior. Lucas sabe ler e escrever, porém escreve com alguma dificuldade. Não é tão bom com raciocínio matematico, mas isso é uma coisa que ele não é o único, e possui uma memória, que como dizem por aí, é de elefante. Moradora de Curitiba, Paraná, Taís só descobriu a microcefalia do filho após a realização de uma pá de exames e quando a criança já tinha quase um ano. Porém, a duvida começou quando aos seis meses Lucas não sentava. A reação dela ao saber da situação do filho, segundo suas próprias palavras, era como se o mundo tivesse desabado. Ela desceu do consultório da médica que se localizava em um prédio, ficou com a criança no colo em uma praça que ficava em baixo , enquanto o pai foi buscar o carro e abraçava o bebe e chorava, sentindo-se completamente perdida e sozinha, contou. A neurologista de Lucas encaminhou o garoto para fazer fisioterapia, sessões com a fonoaudiólogo e sessões de psicologia na clínica de uma Universidade da região. Mas por ser um campo de estágio, mudavam muito as pessoas responsáveis pelo tratamento de Lucas, então a mãe ao perceber que ele estava regredindo, resolveu tirá-lo. A família nunca criticou, mas lidar com a solidão não foi algo fácil. A ausência de serviços públicos de qualidade também dificultou e foi uma batalha para conseguir pagar os atendimentos. Eu sempre achava que não estava fazendo o suficiente. Queria que aparecesse alguém que me desse algum prognóstico, mas eu só tinha um diagnóstico, a Microcefalia, disse Tais. 62

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Mas o lado musical de Lucas foi incentivado mesmo pelo cunhado de Tais, que também músico, estimulou esse gosto que o menino já possuía antes mesmo de falar, o levando para concertos, o qual quieto, ouvia. Além do gosto pela música, o menino é alegre , feliz, muito sociável, define a mãe. E ela ainda contou que ele está na fase de querer fazer tudo sozinho. Mas com relação a música, Tais me contou que Lucas tem aula em uma escola com um professor que faz um programa especial para ele. Nessa escola ele aprende a história, elementos da música, notação musical e a tocar alguns instrumentos de percussão e teclado. Porém, apesar de aprender muita coisa ele aprende mais devagar que os outros alunos. Ele também cursou duas disciplinas na faculdade com um professor de música que topou incluí-lo na turma mesmo sem matricula, declarou Tais. Conforme Taís vinha me contando da ligação e habilidades do filho com a música, fui percebendo similiaridades entre nós. Mas, teve algo que me chamou a atenção. Quando ela me contou que Lucas possuia uma memória auditiva muito desenvolvida e que ele é capaz de conhecer peças só pelos primeiros acordes e que discrimina o som de cada instrumento em uma música, cogitei a hipótese dele ser ouvido absoluto. Em outras palavras conseguir tirar qualquer tipo de música sem o auxilio de partituras, tablaturas e etc, apenas de ouvido. E Taís me disse que os professores dele também já chegaram a levantar esta hipótese. O caçula de dois irmãos, Lucas foi o portador de Microcefalia mais velho que achei aqui. Com 26 anos, prestes a se iniciar na universidade, o rapaz, apesar de suas limitações, mostra a partir do seu amor pela música que pode ser sim capaz de grandes feitos.

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Uma história de oito anos de vida Marta Sandei, 34 anos, é a mãe de Murilo, oito anos, portador da síndrome o qual este livro tem a finalidade de abordar. O diagnóstico de Murilo foi aos seis meses. No final da gravidez, conta Marta, o médico que a atendia percebeu que a criança havia parado de se desenvolver. Devido a isso, decidiu trazer Murilo ao mundo com 36 semanas de gestação. O menino não fez nenhuma cirurgia craniana, porém, ao cinco anos fez uma plástica nos olhos, já que 64

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havia nascido com Ptose e nos testículos que estavam no abdomem. A reação de Marta ao saber da Microcefalia do filho foi de medo de perdê-lo. Ficou assustada e só pensava porque tinha que estar passando por isso, declarou. Mãe de duas meninas, além de Murilo, Marta contou ainda que as filhas, na época com 16 anos, não gostavam quando chamavam o irmão de especial. E que até hoje não curtem o rótulo dado a ele por alguns. Mas na família, ele não só é adorado pelas irmãs, como pela familia toda. Diferente dos outros casos contados até aqui, o único preconceito que Marta diz ter visto foi nas ruas e na escola quando ele começo a estudar. Hoje Murilo faz praticamente tudo sozinho, exceto tomar banho que ela ainda ajuda, contou Marta. Com relação a escola, perguntei a ela como é o rendimento dele e ela me disse que ele é hiperativo, então devido a isso possui dificuldades no aprendizado. Além do distúrbio no comportamento, que antes dava até muito trabalho, mas que agora com o auxilio dos medicamentos está acompanhando bem. Apesar do preconceito de algumas crianças, Murilo não pode reclamar de solidão. Segundo a mãe, ele possui muitos amigos. Murilo tem convênio desde bebê, mas faz acompanhamento também em Botucatu, na UNESP. Toma Ritalina, 10mg, Pamelor, 10 mg e Captoropril 12,5 mg. Para o acompanhamento na UNESP eles tem auxílio da prefeitura com a condução, já que a família não possui veículo particular. Murilo faz fisioterapia, fono e uma espécie de aula particular, duas vezes por semana. Fazia equoterapia, mas já obteve alta. Marta paga no convênio 120 reais mais uma taxa de 20 reais por consulta. E os medicamentos Ritalina e Captopril o governo fornece gratuitamente, porém o Pamelor é por conta de Marta. selfie: em meu autorretrato, a microcefalia é diferença e motivação

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Apaixonado por Vídeo Game, computador, adora brincar e tem que ter sempre um amiguinho por perto, Murilo não se diferença nesses aspectos de outras crianças. Exceto pelo pavio curto e de não gostar de jogar futebol com outras crianças, mas neste último por receio de cair ou que o derrubem, já que seu equilíbrio é sua maior dificuldade. Timidez não é característica desse menino. Adora fazer amizades, conversa com quem quer que seja e não se esquece da pessoa tão fácil. Muito alegre, define o filho, Marta. Murilo foi submetido a um exame de pesquisa de anomalias cromossômicas e descobriu-se microdeleções para cinco síndromes. Mas a geniticista explicou que ele não possui nenhuma delas. Caçula, Murilo é irmão de duas gêmeas que hoje estão com 24 anos e está prestes a completar nove anos. A gravidez de Marta ocorreu sem qualquer complicação, o que aponta que a Microcefalia de Murilo pode vir a ser genética. Ou seja, as fissuras cranianas fecharamse ainda durante a gestação, prematuramente.

Murilo mostrando o quanto a Medicina também é capaz de errar quando o assunto é romper barreiras e vencer desafios 66

selfie: em meu autorretrato, a microcefalia é diferença e motivação


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conclus達o


Após toda a pesquisa feita para que esse trabalho pudesse ser concluído percebi que além do meu caso ser raro, descobri em alguns casos que entrevistei, que mesmo com sequelas causadas pela Microcefalia, é possível que o indivíduo tenha uma vida relativamente normal. O caso que mais me chamou a atenção, justamente por ser em partes parecido com o meu, foi o de Lucas Tavares, de Curitiba. Prestes a fazer vestibular, já finalizou o ensino médio, graças a uma vaga destinada a pessoas especiais. O rapaz é influenciado e apaixonado por música. E essa paixão o ajuda, pelo que percebi, a enfrentar as barreiras que surgem pelo caminho. Além da dedicação familiar, comum nos cinco casos que conheci. Porém, algo ficou evidente. A Microcefalia para mim não se tornou um problema maior somente porque tive a sorte de ter um médico que conhecia bem a síndrome. E agiu da forma mais rápida e precisa possível. O papel do neurocirurgião ou neurologista neste caso é fundamental. Cabe a ele informar a família dos desafios que o individuo portador da Microcefalia pode vir a ter. Meu caso foi uma exceção, mas não há que se negar que existem casos de pessoas que durante a formação no ventre materno têm danos no cérebro devido a esse fechamento prematuro do crânio. A Microcefalia não tem cura, porém, tem tratamento. Os mais diversos tratamentos de acordo com as necessidades de cada portador. Alguns, ainda fazem fisioterapia, outros acompanhamento psicológico e até mesmo fonoaudiologia, mas cada um deles tem o esforço e o apoio da família para isso. E a base familiar é mais importante que qualquer acompanhamento médico.

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Contudo, a minha conclusão final depois de todo o trabalho para que este livro conseguisse sair do forno, é que não importa a barreira que tenhamos que quebrar, somos capazes. Uma dose de vontade e tudo é possível. Até mesmo de surpreender aqueles que um dia disseram que não seriamos capazes de fazer qualquer coisa por sermos diferentes dos demais.

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selfie: em meu autorretrato, a microcefalia é diferença e motivação


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